Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
02B2281
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: FERREIRA DE ALMEIDA
Descritores: NULIDADE PROCESSUAL
NULIDADE DE SENTENÇA
NULIDADE SANÁVEL
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
FALTA DE ADVOGADO
Nº do Documento: SJ200209260022812
Data do Acordão: 09/26/2002
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL PORTO
Processo no Tribunal Recurso: 923/01
Data: 11/08/2001
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Área Temática: DIR PROC CIV.
Legislação Nacional: CPC67 ARTIGO 153 N1 ARTIGO 193 ARTIGO 194 ARTIGO 195 ARTIGO 196 ARTIGO 197 ARTIGO 198 ARTIGO 199 ARTIGO 200 ARTIGO 201 ARTIGO 202 ARTIGO 203 ARTIGO 204 ARTIGO 205 ARTIGO 668 N1 A B C D E ARTIGO 716 ARTIGO 721 N3.
Sumário : I - Não há que confundir "nulidades da sentença" com "nulidades processuais".
II - Aquelas só ocorrerão, como causa invalidante típica, nas diversas hipóteses taxativamente contempladas no n. 1 do art. 668º do CPC, possuindo um regime próprio de arguição plasmado nos arts. 668º, n. 3, 716º e 721º n.3 do mesmo diploma.
III - Já quanto às nulidades processuais propriamente ditas e respectivos regimes, efeitos e prazos de arguição, encontram-se as mesmas elencadas e reguladas nos arts. 193º e ss 201º e ss do mesmo corpo normativo.
IV - O regime de arguição das nulidades processuais principais, típicas ou nominadas vem contemplado nos arts. 193º a 200º a 202º a 204º do CPC, sendo que as nulidades secundárias, atípicas ou inominadas -, genericamente contempladas no nº 1 do art. 201º -, só produzem nulidade quanto a lei expressamente o declare ou quando a irregularidade possa influir no exame e discussão da causa, possuindo o respectivo regime de arguição regulado pelo art. 205º do mesmo diploma.
V - A nulidade - por ausência de devida representação oficiosa na audiência de julgamento através de causídico designado pela Ordem dos Advogados - integra nulidade processual secundária, sujeita «qua tale» ao regime legal de arguição do art. 205º do CPC.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. "A", residente na Av. Gago Coutinho nº..., Gulpilhares, Vila Nova de Gaia, propôs em 1-7-96 acção ordinária contra B e mulher C, residentes na Casa de Juste, Santa Cristina, Lousada, solicitando a condenação destes a verem resolvido o contrato promessa celebrado em 29-6-9 e a restituírem ao Autor a importância de 21.000.000$00, acrescida de juros calculados nos termos do mesmo contrato até efectivo pagamento.
2. Por sentença de 29-6-00, o Mmo Juiz da 1ª Vara Mista da Comarca de Vila Nova de Gaia julgou a acção parcialmente procedente, condenado, em consequência, os RR a verem resolvido o contrato-promessa em causa e a restituir ao A. a importância de 21.000.000$00 acrescida de juros à taxa legal contados desde 12-4-96.

3. Inconformado, apelou o Réu o qual, na respectiva alegação, concluiu além do mais, pelo seguinte:
- A audiência de julgamento realizou-se sem que os RR estivessem devidamente representados por advogado, uma vez que a nomeação de patrono oficioso requerida pelos RR foi tardia e extemporânea -.
Teriam sido violados os princípios fundamentais do contraditório e da igualdade das partes, sendo por isso, o acórdão recorrido nulo nos termos da al. d) do nº 1 do artº 668º do CPC.
Acresce ainda que a decisão proferida pelo Colectivo enferma de outra nulidade prevista na al. a) do nº 1 do artº 668º do CPC, por apenas ter sido assinada por um dos três ilustres magistrados que intervieram no julgamento.

4. O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 8-11-01, negou provimento ao recurso, rejeitando, em consequência, os invocados vícios da sentença e as sugeridas nulidades processuais.
Por um lado, porque apenas podendo ser aquela 1ª aventada nulidade uma mera nulidade processual, deveria ter sido imediatamente suscitada perante o tribunal «a quo» (artº 205º do CPC) e depois, quanto à segunda sugerida nulidade, só ao juiz presidente cabia competência para a prolação da sentença final, só a ele pois cabendo assinar essa sentença.
5. Inconformado agora com tal aresto, dele veio o Réu recorrer de revista para este Supremo Tribunal, em cuja alegação formulou conclusões, nas quais «deixou cair» a pretensa nulidade por falta de assinatura dos vogais do colectivo, assim restringindo a arguição e âmbito do recurso à alegada falta de advogado na audiência;
6. O Autor não contra-alegou.
7. Colhidos os vistos legais, e nada obstando, cumpre apreciar e decidir.
8. Espécie de recurso.
Convém adiantar desde já que o presente recurso, porque exclusivamente atinente à relação processual, deve ser qualificado como de - agravo - e não como de - revista -, espécie em que foi erradamente enquadrado - conf. artºs 721º e 713º do CPC, o que, desde já se determina.
9. Conforme acima se deixou esclarecido, o âmbito do presente agravo circunscreve-se à questão de saber se foi ou não cometida a nulidade processual alegadamente residente na - realização da audiência de julgamento, num processo em que a constituição de mandatário é obrigatória, sem que a decisão fosse notificada à patrona oficiosa e Réu e sem que esta tenha tido intervenção na mesma - (sic).
Advirta-se, entretanto, que o recorrente confunde manifestamente - nulidades da sentença - com - nulidades processuais -.
Aquelas só ocorrerão, como causa invalidante típica, nas diversas hipóteses taxativamente contempladas no nº 1 do artº 668º do CPC, sendo que as mencionadas nas alíneas b) a e) desse inciso normativo só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário e, se o admitir, o recurso poderá ter como fundamento qualquer dessas nulidades conf. nº 3 desse artº 668 º e ainda o nº 3 do artº 721º nº 3 do mesmo diploma, este possibilitando, no próprio recurso de apelação, a invocação acessória de alguma das nulidades previstas nos artºs 668º e 716 º, ainda do mesmo diploma.
Já quanto às nulidades processuais propriamente ditas e respectivos regimes, efeitos e prazos de arguição, encontram-se as mesmas elencadas e reguladas nos artºs 193º e ss 201º e ss do mesmo corpo normativo.
Algumas dessas nulidades processuais - as principais, típicas ou nominadas - são especificamente reguladas nos artºs 193º a 200º e 202º a 204º do CPC, sendo que aquelas a que se reportam os artºs 193º a 199º só podem ser arguidas até à contestação ou neste articulado, enquanto que as previstas nos artºs 194º e 200º podem ser suscitadas em qualquer estado do processo, enquanto não devam considerar-se sanadas.
As restantes - ou seja as secundárias, atípicas ou inominadas -, genericamente contempladas no nº 1 do artº 201º -, só produzindo nulidade quanto a lei expressamente o declare ou quando a irregularidade possa influir no exame e discussão da causa, possuem o respectivo regime de arguição regulado no artº 205º do mesmo diploma, a saber: se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o acto não terminar; se não estiver presente ou representada o prazo (de 10 dias - artº 153º nº 1 do CPC) para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso, só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.
Ora, pretende-se que a invocada nulidade - por ausência da devida representação oficiosa do ora recorrente na audiência de julgamento através de causídico designado pela Ordem dos Advogados tenha sido cometida na data da realização dessa audiência, ou seja em 29-5-00, tal como vem processualmente adquirido.
O recorrente, pela pena da sua ilustre mandatária, afirma nos autos que a nomeação oficiosa desta havia sido «comunicada aos autos no próprio dia da realização dessa audiência».
A ter sido assim, deveria o tribunal ter comunicado, desde logo, à ilustre patrona do recorrente a sua nomeação para o respectivo patrocínio, passando a proceder às notificações na sua pessoa e adiando se necessário, os actos pendentes, designadamente o da audiência de discussão e julgamento. E, desse modo ao realizar a dita audiência sem a presença da mandatária da parte, terá incorrido numa nulidade processual secundária, sujeita «qua tale» ao sobreadito regime legal de arguição.
Só que também o recorrente e a ilustre mandatária nomeada, logo naquela data ou mesmo antes dela, terão sido notificados da processada nomeação de patrono directamente pela Ordem dos Advogados, cumprindo-lhes desde logo providenciar pela extracção das devidas ilações processuais.
Seja como for, quer tendo tido conhecimento atempado da nomeação, quer após as notificações subsequentes de actos processuais, inclusive da própria sentença final, teve a parte ensejo de, no aludido prazo supletivo de 10 dias a contar do conhecimento da comissão da nulidade, proceder à arguição autónoma desse vício processual, e não seguir a via de interposição do recurso, «mascarando» tal nulidade processual com «nulidade da sentença» e assim deixando exaurir o prazo legal de arguição.

10. Assim havendo decidido neste pendor, não merece o acórdão recorrido qualquer censura.
II. Decisão:
Em face do exposto, decidem:
- negar provimento ao agravo;
- confirmar, em consequência, o acórdão recorrido.
Custas pelo recorrente.

Lisboa, 26 de Setembro de 2002
Ferreira de Almeida (Relator)
Abílio Vasconcelos
Duarte Soares