Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
03B2509
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: FERREIRA GIRÃO
Descritores: CONTRATO-PROMESSA
CONDIÇÃO SUSPENSIVA
CONDIÇÃO RESOLUTIVA
INCUMPRIMENTO DO CONTRATO
BOA-FÉ
Nº do Documento: SJ200310230025092
Data do Acordão: 10/23/2003
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 3758/02
Data: 12/03/2002
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Sumário : I - O contrato-promessa subordinado a condição suspensiva produz efeitos, logo após a sua outorga, quanto aos deveres secundários e aos deveres acessórios de conduta.
II - Saber se uma condição é suspensiva ou resolutiva é uma questão de interpretação do negócio jurídico, de averiguar a vontade real das partes.
III - Viola o principio geral da boa fé no cumprimento das obrigações, estabelecido no nº. 2 do artigo 762º do Código Civil, a promitente cessionária de quotas de uma sociedade que, durante todo o prazo fixado para a outorga da escritura definitiva, não faz qualquer diligência no sentido de averiguar se uma terceira sociedade concede ou não a autorização - condição suspensiva do contrato-promessa - para a prometida cessão, incumprindo, assim, um dever acessório de conduta, decorrente do facto de lhe competir a marcação da data da escritura definitiva.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Em 25 de Março de 2000, "A, S.A." celebrou com "B, Lda.", "C, Lda.", "D, Lda." e "E, Lda." um contrato-promessa pelo qual a "B, Lda.", a "C, Lda." e a "D, Lda." (integradoras do "Grupo F") prometeram ceder à "A, S.A." as quotas que detinham na "E, Lda.", desde que a sociedade "G" autorizasse essa cessão.
Com o fundamento de esta autorização não ter sido dada, a "A, S.A." propôs, perante um Tribunal Arbitral (conforme o acordado na cláusula 7ª do contrato-promessa), a presente acção em que pede que as rés sejam condenadas - conforme o estipulado, para essa hipótese, na cláusula 3ª do contrato-promessa - a restituirem-lhe os 10.000.000$00, que lhes entregara a título de sinal e principio de pagamento, com juros legais a partir da citação,
As rés contestaram, alegando, em síntese, que a autorização tinha sido dada, pelo que defendem a improcedência da acção, considerando-se perdida a seu favor a peticionada quantia.
Realizada a instrução, o Tribunal Arbitral, por decisão maioritária, julgou a acção improcedente, o que veio a ser confirmado pela Relação de Lisboa, que negou provimento à apelação interposta pela autora.
Inconformada, insiste a recorrente na sua tese, pedindo agora revista do acórdão da Relação, com as seguintes e textuais conclusões:
1. O acórdão recorrido não decidiu correctamente ao confirmar o acórdão proferido pelo Tribunal Arbitral que absolveu as recorridas do pedido formulado pela recorrente quanto à devolução do sinal entregue no momento da celebração do contrato-promessa de cessão de quotas.
2. Antes do mais importa notar que havia que distinguir a natureza da condição em dois contratos - o contrato-promessa e o contrato prometido. Com efeito enquanto no contrato prometido, a cessão de quotas, a condição era suspensiva, no contrato-promessa a mesma era resolutiva.
3. Pois não pode deixar de se considerar que o contrato-promessa começou a produzir os seus efeitos a partir da sua outorga. Ficando as partes vinculadas a obrigações, nomeadamente, quanto às promitentes cedentes, na obrigação de devolver o sinal se ocorresse determinado evento.
4. Eram esses efeitos, na verdade, que a não verificação da condição faria cessar.
5. Nos termos do artigo 270º do Código Civil as partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção ou a resolução do negócio jurídico, sendo que no primeiro caso existe uma condição suspensiva e no segundo uma condição resolutiva.
6. O negócio sob condição suspensiva não produz efeitos desde a sua realização mas apenas a partir da verificação da condição enquanto o negócio celebrado sob condição resolutiva produz imediatamente os seus efeitos que cessam quando se verificar a condição.
7. A condição resolutiva da cláusula segunda do contrato-promessa de cessão de quotas celebrada entre a recorrente e as recorridas não pode ser senão uma condição resolutiva, de acordo com a qual a falta de autorização implicava a cessação dos efeitos do contrato.
8. No caso «sub-judice» não se pretende que uma parte seja condenada a outorgar um contrato mas, apenas, com a cessação dos seus efeitos que uma parte devolva à outra o sinal recebido.
9. A tese do acórdão quanto à classificação da condição como suspensiva esbarra numa contradição fundamental que é a do negócio não produzir efeitos até à verificação da condição sendo certo que, como se referiu, da outorga nasceram obrigações para as partes, a cumprir antes de verificar a condição.
10. Sendo a condição resolutiva não podem restar dúvidas quanto à obrigação das recorridas na devolução do sinal, nos termos do artigo 343º do Código Civil. E tendo sido fixado um prazo de sessenta dias para a celebração da escritura - prazo que o Tribunal reputou de essencial - seria contraditório que se viesse a considerar aquela condição como suspensiva pois tal implicava que a não ocorrer a mesma, a recorrente, decorridos os sessenta dias, perderia o interesse no contrato mas continuava vinculada à verificação da condição.
11. Igualmente não pode considerar-se que a "G" tivesse emitido qualquer declaração ou que a mesma fosse eficaz. Nos termos do artigo 224º do Código Civil a declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chegue ao seu poder.
12. Ficou provado na presente acção que não chegou ao poder da recorrente "A, S.A." qualquer declaração da "G" ou que a mesma fosse daquela conhecida. O que significa que a ter havido declaração ela não seria eficaz para produzir quaisquer efeitos, pelo que estava comprovada a não verificação da condição.
13. Sendo aliás do senso comum concluir que não houve qualquer autorização pois, a ter havido, o "Grupo F" teria dado conhecimento da mesma à recorrente.
14. Não existiu, pois, qualquer declaração eficaz que tivesse chegado ao conhecimento da "A, S.A." até 25.05.2001, pelo que não se verificou a condição que as partes tinham subordinado a produção nos efeitos do contrato.
15. Não pode, assim, deixar de concluir-se que ocorreu a resolução do contrato-promessa devendo as recorridas ser condenadas a devolver à recorrente "A, S.A." a quantia de 10.000.000$00.
As recorridas contra-alegaram no sentido da confirmação do julgado.
Corridos os vistos, cumpre decidir.

Vêm provados os seguintes factos:
1º- A autora é uma sociedade que se dedica à comercialização de equipamentos e serviços de informática e de escritório;
2º- Em 25/3/2000 foi celebrado entre autora e rés o contrato-promessa de cessão de quotas nos termos e com as cláusulas indicadas a fls. 27;
3º- Em 24/5/2000, a autora remeteu às três sociedades do "Grupo F" as cartas de fls. 35, 36 e 37 nas quais lhes comunicava que, por não haver recebido até essa data a autorização da "G" e por terminar no dia imediato o prazo para a celebração da escritura de cessão de quotas, o sinal pago pela autora teria de ser devolvido, em virtude de aquela autorização ser condição essencial do negócio e de se dever considerar caduco o contrato-promessa de 25/03/00;
4º- Por carta registada com aviso de recepção de 26/06/00, as três sociedades do "Grupo F" notificaram a autora para comparecer no cartório notarial no dia 10/07/00 e para enviar a documentação necessária, a fim de ser celebrada a prometida escritura de cessão de quotas, sob pena de resolução do contrato-promessa e da perda do sinal de 10.000.000$00, não havendo a autora entregue a documentação pedida, nem comparecido no cartório notarial;
5º- Segundo a cláusula 5ª do contrato-promessa, a escritura de cessão de quotas teria de ser efectuada até ao dia 25/5/2000, em virtude de a autora apenas estar interessada na outorga da escritura até essa data, atentas as consequências prejudiciais que para ela decorriam do disposto na cláusula 4.3 do contrato de distribuição, referido no artigo 4º da p.i. e apenas junto durante a audiência de julgamento;
6º- Entre os dias 25/3/2000 e 25/5/2000, ninguém comunicou à autora, por palavras, escrito ou qualquer outro meio de manifestação de vontade, que a "G" autorizara a cessão de quotas, ou que a não autorizara, e, durante o mesmo período de tempo, a autora não efectuou diligência alguma tendente a averiguar se a "G" consentira na referida cessão de quotas;
7º- Não se apurou se, entre os dias 25/3/2000 e 25/5/2000, a "G" autorizou, ou não, a cessão de quotas;
8º- Os documentos de fls. 63 a 78 traduzem operações realmente efectuadas.

Para uma melhor compreensão do thema decidendum convém ainda transcrever o teor:
- da cláusula 2ª do contrato-promessa em causa: «Pelo presente contrato a Primeira Outorgante promete adquirir e o "Grupo F" promete ceder as quotas identificadas na cláusula anterior, sujeito à obtenção da respectiva autorização dada pela "G", como estipulado no Contrato de Distribuição»;
- e do parágrafo 1º da cláusula terceira do mesmo contrato: «O pagamento do preço da cessão de quotas do presente contrato será feito do seguinte modo:
a) Esc. 10.000.000$00 na data da realização do contrato promessa de cessão de quotas, a título de sinal e principio de pagamento, que será restituído em singelo, caso se não verifique a autorização prevista na cláusula 2ª.».
- da cláusula 5ª do contrato-promessa em causa: «A escritura de cessão de quotas será celebrada no prazo de 60 dias a partir da presente data, entre a Primeira Outorgante e o "Grupo F" ou quem este indicar, em Cartório Notarial de Lisboa, ficando a sua marcação a cargo da Primeira Outorgante, que com a antecedência mínima de oito dias e por carta registada com aviso de recepção, notificará o "Grupo F" e a Quinta Outorgante da data, hora e local da celebração da mesma».

O acórdão do Tribunal Arbitral, para cujos fundamentos remeteu o confirmativo acórdão da Relação sob recurso, decidiu julgar improcedente o pedido da autora "A, S.A.", ora recorrente - no sentido de reaver das recorridas os 10.000.000$00, que lhes entregara como sinal e principio de pagamento - basicamente porque a demandante não logrou provar, conforme lhe competia, nos termos do artigo 342º, nº. 1 do Código Civil, a causa petendi da restituição dessa quantia, por si alegada e traduzida na falta de autorização, por parte da "G", para a efectivação do prometido contrato de cessão de quotas.
Reproduzindo essencialmente o que já alegara no recurso de apelação, a "A, S.A." insiste agora, neste recurso de revista, em qualificar como resolutiva - e não como suspensiva casual, conforme qualificação dada pela instâncias - a condição consubstanciada pela referida autorização por parte da "G", o que determinaria a pretendida restituição do sinal, porquanto:
- por um lado, a não comprovação da verificação da condição redundaria em desfavor das rés recorridas, uma vez que, por força do disposto na segunda parte do nº. 3 do artigo 343º do Código Civil, lhes caberia o ónus probatório da verificação da condição;
- por outro lado, resulta da prova não ter existido, provinda da "G", qualquer declaração eficaz, nos termos do artigo 224º do Código Civil, que tivesse chegado ao conhecimento da recorrente, pelo que, não se tendo verificado, assim, a condição em apreço, o contrato-promessa tem que se considerar resolvido, com a consequente devolução do sinal a seu favor.
Vejamos.

Nos termos do artigo 270º do Código Civil, as partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso, diz-se suspensiva a condição, no segundo, resolutiva.
Saber se uma condição é suspensiva ou resolutiva é uma questão de interpretação do negócio jurídico, de averiguar qual a vontade real das partes - cfr. a anotação ao referido normativo no CPCivil Anotado de P. de Lima e A. Varela e Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª ed. Actualizada, página 559.
Segundo este último ilustre e saudoso civilista, a lei - salvo o caso excepcional previsto no artigo 2234º do Código Civil - não formula qualquer presunção geral, nem é legítimo propor qualquer presunção natural ou de facto como validade geral (obra e página citadas).
O acórdão arbitral-absorvido in toto pelo acórdão da Relação, como se disse - qualificou a condição em apreço como condição suspensiva casual (casual, por estar na dependência de acto de terceiro, conforme os ensinamentos da melhor doutrina).
Efectivamente, lê-se no acórdão e sobre o assunto o seguinte:
«Estando assim o contrato-promessa celebrado entre as partes dependente do consentimento de terceiro, a autorização da "G" assume, aos olhos da lei civil, a natureza de uma condição suspensiva casual (por lapso ostensivo consta do texto o termo causal).
...
Donde resultam as seguintes consequências de ordem prática:
- o contrato-promessa só produz efeitos quando a sobredita autorização for concedida;
- se o consentimento for negado, não se produzem os efeitos definitivos a que o negócio tendia, tudo se passando como se o contrato-promessa não tivesse sido concluído, havendo, pois, que restituir o sinal passado.».
E mais adiante lê-se ainda:
«Logo, perante os supramencionados ensinamentos da doutrina, afigura-se que os outorgantes pretenderam que a condição suspensiva se verificasse dentro do prazo de 60 dias, mormente por ser esse o sentido normal das declarações constantes das cláusulas 5ª e 3ª/1º/a), tais como estas devem ser hoje vistas à luz do artº. 236º/1 do CC.».
Portanto, na interpretação que fizeram dos factos apurados - maxime das cláusulas do contrato-promessa outorgado entre as partes -, concluíram as instâncias que a vontade real das partes contratantes foi condicionar «os efeitos definitivos» do contrato-promessa à verificação da autorização da sociedade "G" (terceira no negócio) para a prometida cessão de quotas.
Até lá estes «efeitos definitivos» ficavam suspensos.
Estamos, assim, segundo a interpretação das instâncias, perante uma condição suspensiva.
E a interpretação das instâncias da declaração negocial, no que concerne ao apuramento da vontade real das partes, é soberana.
Conforme consabido e firme entendimento jurisprudencial, dado o âmbito de matéria de facto em que se insere, tal interpretação não pode ser objecto de censura por parte do Supremo Tribunal de Justiça, atento o disposto nos artigos 722º, nº. 2 e 729º, ambos do Código de Processo Civil.
Os poderes de sindicância do Supremo nesta matéria restringem-se à eventual violação das regras de interpretação da declaração negocial previstas nos artigos 236º e seguintes do Código Civil.
Violação essa que a recorrente não invocou expressamente na sua alegação, nem vislumbramos verificar-se.
O que a recorrente argumenta contra a qualificação da condição como suspensiva é que ela «esbarra numa contradição fundamental que é a de o negócio não produzir efeitos até à verificação da condição», quando é certo que o contrato-promessa começou a produzir os seus efeitos a partir da sua outorga, designadamente a obrigação das promitentes cedentes devolverem o sinal se ocorresse determinado evento.
Daí concluir que é preciso distinguir a natureza da condição nos dois contratos:
- resolutiva no contrato-promessa;
- suspensiva no contrato prometido.

Esta argumentação da recorrente assenta, no entanto e salvo o devido respeito, em alguns equívocos conceituais.
Por um lado, só se poderá falar num negócio sob condição (suspensiva ou resolutiva) quando o negócio já exista juridicamente.
Na verdade, o negócio, embora condicionado, pressupõe sempre a sua existência com todos os respectivos elementos integrantes e formalizadores exigidos por lei; apenas a produção (na condição suspensiva) ou a resolução (na condição resolutiva) dos seus efeitos é que ficam dependentes da verificação do acontecimento futuro e incerto que consubstancia a condição.
Consequentemente, não faz sentido dizer que um contrato ainda juridicamente inexistente - como é caso do contrato definitivo, objecto de um contrato-promessa - está sujeito a qualquer condição.
Por outro lado, não é correcto afirmar, como a recorrente, que os negócios sob condição suspensiva produzem todos os seus efeitos só a partir da verificação da condição.
Isso é verdade no que concerne aos efeitos principais do negócio.
Mas já não é no que concerne quer aos efeitos secundários, destinados à boa consecução dos efeitos principais, quer aos chamados deveres acessórios de conduta, os quais, embora não respeitando directamente nem à preparação, nem à correcta realização da prestação principal, interessam ao regular desenvolvimento da relação, conforme os ditames da boa fé, como determina o principio geral da boa fé no cumprimento das obrigações, estabelecido no nº. 2 do artigo 762º do Código Civil (Cfr. Vaz Serra, RLJ 109º-119, citado no acórdão do STJ, de 16/12/93, CJSTJ, ano I, Tomo III, página 188).
Na lição de Mota Pinto - ob. cit., página 570 -:
«Constata-se, portanto, que, «pendente conditione», os efeitos do negócio sob condição suspensiva estão em suspenso, não tendo existência actual. O negócio produz, todavia, dados efeitos provisórios e preparatórios, na expectativa da produção dos efeitos definitivos; trata-se, sobretudo, de efeitos prodrómicos ou cautelares que têm em vista garantir a integridade dos efeitos finais, de modo a evitar que estes venham a ser meramente platónicos.».
Ora, a prestação principal, o efeito principal do contrato-promessa de cessão de quotas de uma sociedade é um facere, traduzido no compromisso assumido pela partes em outorgarem a escritura pública do contrato definitivo.
In casu, portanto, o contrato-promessa só produziria este efeito principal a partir da verificação da condição de a "G" dar o seu assentimento à prometida cessão de quotas.
Mas já quanto aos efeitos secundários e aos deveres acessórios de conduta, eles começaram a produzir-se logo que o contrato-promessa foi outorgado.
Como a própria recorrente admite, apontando, como exemplo, a obrigação das recorridas restituírem o sinal se a condição não se verificasse.
E podemos nós apontar, como exemplo de dever acessório de conduta, o dever da recorrente, salientado pelas instâncias, de diligenciar saber, antes de terminado o prazo de 60 dias para a celebração da escritura definitiva e junto da "G", se esta dava ou não a autorização que condicionava o contrato-promessa.
Conclui-se, desta forma, ser suspensiva a condição a que foi subordinado o contrato-promessa em causa e que daí não resulta qualquer contradição com o facto de o contrato, logo que foi outorgado, ter produzido os seus efeitos secundários, ficando ainda as partes adstritas, também desde esse momento, ao cumprimento dos respectivos deveres acessórios de conduta.
Resta apreciar o argumento alegado pela recorrente de resultar da prova não ter existido, provinda da "G", qualquer declaração eficaz, nos termos do artigo 224º do Código Civil, que tivesse chegado ao seu conhecimento, o que, no fundo, equivale, na opinião da recorrente, a ter-se provado a não verificação da condição.
Donde conclui que, não se tendo verificado a condição em apreço, o contrato-promessa tem que se considerar resolvido, com a consequente devolução do sinal a seu favor.
Esta inteligente construção argumentativa esbarra, no entanto, com tudo o que a esse propósito consta da decisão da matéria de facto - cujo controle, como é consabido e já acima se referiu sobre a outra questão, escapa aos poderes do Supremo, fora das situações excepcionais previstas no nº. 2 do artigo 722º do Código de Processo Civil (que aqui também não se verificam).
E o que consta dos factos elencados supra sob os números 6º e 7º é que, se é certo que, entre 25/3/2000 e 25/5/2000, a recorrente não recebeu qualquer comunicação sobre a autorização, ou a falta dela, da "G", também é verdade que a recorrente, durante, esse período, nada fez para averiguar disso, pelo que não ficou apurado se existiu ou não essa autorização.

O nº. 7 dos factos provados é expresso e claro:
«Não se apurou se, entre os dias 25/03/00 e 25/05/00, a "G" autorizou, ou não, a cessão de quotas».
Perante este comprovado e inultrapassável non liquet sobre o essencial facto da verificação ou não verificação da condição, a decisão não podia ter sido outra que não a improcedência da acção, como bem decidiram as instâncias, porquanto a autora, ora recorrente não logrou fazer a prova - como lhe competia, nos termos do nº. 1 do artigo 342º do Código Civil - da não verificação da condição, facto integrador da causa de pedir por si alegada.
Acresce ter ainda a recorrente violado o disposto no nº. 2 do artigo 762º do Código Civil, por ter deixado decorrer todo o prazo (60 dias), fixado para a outorga da escritura definitiva da prometida cessão de quotas, sem nunca se ter preocupado em averiguar junto da "G" se esta dava ou não autorização ao negócio, incumprindo assim um seu dever acessório de conduta, decorrente do facto de lhe caber, contratualmente, a marcação da data para a outorga da escritura.

DECISÃO
Pelo exposto decide-se negar a revista, com custas pela recorrente.

Lisboa, 23 de Outubro de 2003
Ferreira Girão
Luís Fonseca
Lucas Coelho