Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3167/17.5T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: LEONOR CRUZ RODRIGUES
Descritores: NULIDADE
OPOSIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO
CUSTAS
PARTE VENCIDA
Data do Acordão: 04/14/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I. A nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão contemplada no artigo 615.º, n.º 1, al. c), do Código de Processo Civil pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la: a contradição geradora de nulidade ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto ou, pelo menos, de sentido diferente.
II. Consiste tal nulidade na contradição entre os fundamentos exarados pelo juiz na fundamentação da decisão e não entre os factos provados e a decisão.
III. A regra geral em matéria de custas, consagrada no artigo 527.º do Código de Processo Civil, é a de que, paga as custas quem tiver ficado vencido na lide, a parte que perdeu a ação, que nela decaiu, e na proporção do respetivo decaimento.
IV. A condição de vencido e a correspondente responsabilização pelo pagamento de custas, decorre e é definida pela decisão da causa, pela decisão de mérito ou decisão que lhe ponha termo, pela sentença ou acórdão, e não pela decisão em matéria de facto que em si não é uma sentença, mas a decisão prévia à sentença em cuja fundamentação se integra, que fixa o acervo factual que constitui a base necessária à decisão de mérito.
Decisão Texto Integral:




Processo n.º: 3167/17.5TBLSB.L1.S1
4ª Secção

LCR/JG/CM

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

I

1 - Relatório


1. No Juízo do Trabalho......... AA intentou contra “FIDELIDADE - Companhia de Seguros, S.A.”, acção declarativa com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, formulando os seguintes pedidos:
-  a anulação da avaliação de desempenho da A. efectuada em 2015, referente ao ano de 2014;
 - a anulação da avaliação de desempenho da A. efectuada em 2016, referente ao ano de 2015;
- a condenação da R. no pagamento dos benefícios e prémios decorrentes de uma avaliação em conformidade com parâmetros semelhantes aos dos seus colegas de departamento, em montante a apurar em liquidação de sentença, mas que deverão corresponder no mínimo à aplicação ao ordenado da A. da percentagem do maior prémio atribuído no contexto do seu departamento, em referência à prestação de trabalho dos anos de 2014 e 2015;
- a condenação da R. no pagamento dos aumentos salariais referentes aos anos de 2015 e 2016, com a devida actualização da retribuição da A. e pagamento dos respectivos retroactivos até à data de efectivo pagamento, e que no mínimo corresponderão aos maiores aumentos percentuais que tiveram lugar no respectivo departamento, em cada um dos anos;
- a condenação da R. no pagamento à A. da indemnização de €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros), por violação de danos não patrimoniais na pessoa da A. e em benefício desta.

Alegou, para tanto, em síntese, que, é trabalhadora da Ré desde 18.9.1999, sendo aplicável à relação laboral entre as partes o Contrato Colectivo de Trabalho da Actividade Seguradora, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 2, de 15/01/2012, e o Acordo Colectivo de Trabalho publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 4 de 29/01/2016; que a avaliação de desempenho de 2014 viria a ser efectuada em 3 de Marco de 2015, vindo a. a reclamar da avaliação em 13 de Abril de 2015, sem que a R., apesar de já existir uma comissão interna de acompanhamento das avaliações efectuadas, e nomeadamente dos recursos/reclamações interpostos, lhe tenha dado qualquer resposta, ou feito qualquer apreciação ou qualquer tipo de referência específica, e que em relação à avaliação de desempenho referente ao ano de 2015, dada a conhecer a 29 de Março de 2016, o recurso por si interposto, já ao abrigo da cláusula 5.ª, n.º 2, al. c), do Acordo Colectivo de Trabalho para a Actividade Seguradora, não obteve  resposta formal da R. no prazo previsto naquele mesmo instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, entendendo a. que as avaliações de desempenho efectuadas pela R., às funções por si exercidas, nos anos de 2014 e 2015 são anuláveis, por se encontrarem assentes em critérios clara e inequivocamente discriminatórios, violadores de princípios laborais integradores de direitos da personalidade da A. e inclusivamente princípios previstos constitucionalmente, e que em consequência da anulabilidade das avaliações deverão ser-lhe atribuídos os benefícios que decorreriam de avaliações equitativas e assentes em pressupostos semelhantes ou equiparáveis aos restantes colaboradores.

2. Por sentença de 16 de Agosto de 2020 quanto à impugnação judicial da avaliação de desempenho de 2014 foi julgada verificada a excepção dilatória inominada de intempestividade, e, nessa parte, a R. absolvida da instância, e quanto à avaliação do desempenho relativamente ao ano de 2015 a acção parcialmente procedente, finalizando a sentença com o seguinte dispositivo:
“Por todo o exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e em consequência:
- Declaro a ineficácia, em relação à A. AA, da avaliação realizada pela R. FIDELIDADE - Companhia de Seguros, S.A., reportada ao trabalho por aquela prestado no ano de 2015;
- Julgo improcedentes os demais pedidos formulados pela A., absolvendo a R. dos mesmos.
Custas por ambas as partes, na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em 3/4 para a. e 1/4 para a R., a calcular nos termos da Tabela I-C, anexa ao RCP, tal como se deixou consignado no despacho de fls. 2193.

Registe e Notifique”.

3. Inconformada com a decisão dela apelou a Autora, impugnando a decisão relativa à matéria de facto e invocando erro de julgamento, vindo o Tribunal da Relação, por acórdão de 24.6.2020, a decidir como segue:

“i. no que concerne à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto:

• alterar o facto provado n.º 7, que ficará assim: "7 - Em 13-04-2015, a. apresentou reclamação à avaliação indicada em 6)".

• adicionar aos provados os seguintes factos:

"2-E - Nos anos de 2015 e de 2016 (em que foram efectuadas as avaliações de 2014 e 2015), e como consequência das avaliações efectuadas a autora não recebeu qualquer prémio de desempenho.

2-F - Relacionado com as avaliações, a ré processou e pagou prémios de produtividade aos restantes trabalhadores da equipa em que a autora está integrada".

"6-A - A. teve em 2012 e 2013, anos em que foi avaliada pelo Dr. BB, avaliações com médias de respectivamente, 4 e 4.1";

"7-A - Cumprindo as ordens da ré, a autora passou a exercer as suas funções na Multicare em 20-10-2014, só regressando à Fidelidade em 11 de Fevereiro de 2015";

• no mais, manter tal decisão;

ii. quanto às questões jurídicas:
• no que concerne à qualificação do processo como de especial complexidade, negar provimento à apelação e confirmar a decisão apelada;
• relativamente à avaliação do desempenho da apelante no ano de 2014, negar provimento à apelação e confirmar a sentença recorrida;
• quanto à do ano de 2015, julgar verificada a excepção dilatória inominada de intempestividade da impugnação judicial e, em consequência, absolver a apelada da instância.

Custas pela apelante, efectuando-se também na apelação o cálculo nos termos da Tabela I-C, anexa ao RCP”.

4. Deste acórdão interpõe a Autora o presente recurso de revista que finaliza formulando as seguintes conclusões:

“1– A decisão proferida pelo Tribunal a quo é recorrível, o recurso mostra-se interposto tempestivamente, o Recorrente têm interesse e manifesta legitimidade para tal, encontrando-se paga a taxa de justiça correspondente;

2– A decisão ora recorrida é nula nos termos do disposto no art. 615º, nº 1, alínea c), do C.P.C., por contradição entre a fundamentação e a decisão ali proferida, porquanto a decisão dá como provada a existência da avaliação da A. relativamente ao ano de 2015 e na fundamentação conclui-se pela sua inexistência;

3– O Acórdão impugnado não teve em conta, na subsunção dos factos ao direito vigente, a matéria de facto dada como provada sob os nºs 1, 2, 3, 3, 5, 6, 7, e 8 e 2E da sentença proferida pela 1ª instância, matéria que se manteve inalterada com excepção do ponto 2E, da qual se pode concluir que a avaliação da A., relativamente ao ano de 2015, foi levada a cabo pela R. e existe, permanecendo como tal na ordem jurídica;

4– A circunstância de a R. não ter dado resposta à reclamação da A. relativamente à avaliação referente ao ano de 2015, não significa que a avaliação não exista e como tal, não possa ser objecto de impugnação, tal como decidiu o acórdão impugnado, mas somente que a R. não deu resposta à reclamação da A., persistindo a avaliação da A. nos termos levados a cabo pela R. e expressos na contestação da R.

5– Não se verifica a intempestividade da impugnação judicial da avaliação da A., referente ao ano de 2015 e levada a cabo pela R., pelo que deve ser julgada e declarada improcedente tal excepção, mantendo-se na integra a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância de julgar ineficaz, relativamente à A., a avaliação levada a cabo pela R. referente ao ano de 2015;

6- A decisão proferida pelo acórdão impugnado, no que se refere às custas processuais, deveria refletir o vencimento da A., ainda que parcial no que se refere à matéria de facto e não o refletiu, tendo o Acórdão condenado a. a pagar a totalidade das custas, em violação do disposto no art. 527º, nº 1 e 2 do C.P.C.

7- A sentença recorrida não aplicou da melhor forma o direito vigente face ao caso concreto e, bem assim, aos factos dados como provados pela sentença recorrida, tendo violado, multiplamente, o disposto nos arts. 527º, nº 1 e 2, 615º, nº 1, alínea c) do C.P.C. e arts. 578º, 595º, nº 3 todos do C.P.C.

Termos em que,
e nos melhores em Direito que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, só assim se fazendo Justiça”.

5. A Ré apresentou contra-alegações, pugnando pela confirmação do acórdão recorrido e formulando a final as seguintes conclusões:

“1. Pretende a Autora que seja revogado o douto Acórdão recorrido, na parte em que decidiu absolver a Ré da Instância, por extemporaneidade de impugnação da Avaliação de 2015 (elaborada em 2016), por no entendimento da Autora e ora Recorrente – mas mal – o douto Acórdão ter entrado em contradição, padecendo do vício da nulidade, porquanto não poderia ter por um lado considerado a Avaliação de 2015 como “tendo tido lugar” e por outro lado considera-la como “inexistente”.

2. A Recorrente não tem razão.

3. O que o douto Acórdão recorrido afirma é que a “decisão” sobre a avaliação de 2015, não existe.

4. O douto Acórdão não afirma que a “Avaliação de 2015” não existe.

5. A Recorrente baralha as palavras, como se o que o Acórdão recorrido tivesse decidido, fosse que a Avaliação de 2015 não existe, quando na realidade – e lendo detalhadamente as fls. 80, 81 e 82 do douto Acórdão – o que no mesmo se escreve é que a decisão (sobre a reclamação da Avaliação de 2015) não foi proferida, pelo que não existe.

Como resulta do próprio texto do Acórdão recorrido, quanto à Avaliação de 2015 (cfr. fls. 81 e 82), consta que:

“Assim, não tendo a apelada proferido decisão acerca da avaliação da apelante, não se pode dizer que esta é ineficaz em relação à apelada mas também não pode ser anulada, por que não existe. E por isso não pode a apelação ser provida nem a decisão mantida, restando absolver a ré apelada da instância pois que também quanto à avaliação do desempenho da apelante no ano de 2015 se verifica a excepção dilatória inominada de intempestividade da impugnação judicial. Do que pode a relação conhecer ex officio, nos termos dos artºs 578º e 595º, nº 3 do Código de Processo Civil.”

6. Assim, ao contrário do alegado pela Recorrente, o douto Acórdão recorrido não sofre da

nulidade invocada.

7. Acresce que ao decidir que a Ré, ao não ter proferido a decisão (sobre a reclamação da Avaliação de 2015) em 90 dias, não está impedida de ainda vir a proferi-la (ao contrário do decidido na primeira instância, cujo entendimento foi o de que o prazo de 90 dias é peremptório e por isso o incumprimento definitivo), decidiu bem o douto Acórdão recorrido, ao ter absolvido a Ré da instância, por ser extemporânea a impugnação judicial deduzida pela Autora (por não existir fixação de qualquer prazo razoável, após a mora, para o cumprimento da obrigação). (cfr, fls. 80 e 81 do Acórdão recorrido)

8. Pretende também a Autora que seja revogado o douto Acórdão recorrido, na parte em que decidiu condenar a Autora e Recorrente pela totalidade das custas.

9. Todavia, mais uma vez sem razão.

 

10. Com efeito, tendo a Ré sido absolvida da instância, a responsabilidade pelas custas recai inteiramente sobre a Autora, pelo que, também bem decidiu o douto Acórdão recorrido, que também nesta parte, não merece reparo e deve ser mantido.

Termos   em   que   deve   ser   negado provimento ao recurso interposto”.

6. Cumprido o disposto no artigo 87º, nº 3, do C. P.T., a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido da improcedência da revista, parecer que, notificado às partes não foi objecto de resposta.

II

2 - Delimitação objectiva do recurso

Delimitado o objecto do recurso pelas questões suscitadas pela recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nº 3 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil) sem prejuízo da apreciação das que são de conhecimento oficiosa (artigo 608º, nº 2, do Código de Processo Civil), as questões jurídicas trazidas à apreciação deste Supremo Tribunal são as de saber se o acórdão recorrida enferma da nulidade, por contradição entre os fundamentos e a decisão, prevista no artigo 612º, nº 1, al. c), do Código de Processo Civil, se não se verifica a intempestividade da impugnação judicial da avaliação da Autora relativamente à avaliação do desempenho do ano de 2015, e se a decisão proferida pelo Tribunal da Relação, no que se refere às custas processuais deve refectir o vencimento da Autora, no que se refere à impugnação da matéria de facto.

III

3 – Fundamentação de Facto

Vindo na presente revista suscitadas unicamente questões de direito, remete-se, de conformidade com o disposto no artigo 663º, nº 6, aqui aplicável por força do disposto no artigo 679º, ambos do Código de Processo Civil, para a decisão em matéria de facto proferida pela 1ª instância, com os aditamentos introduzidos pelo Tribunal da Relação.
4- Fundamentação de direito

Para melhor compreensão das questões objecto da presente revista importa, antes de mais, delinear o quadro normativo aplicável e sintetizar a posição e decisões das instâncias. Assim,


À relação jus laboral entre as partes é aplicável o Contrato Colectivo de Trabalho (CCT) para a actividade seguradora celebrado entre a Associação Portuguesa de Seguradores (APS) e o Sindicato dos Trabalhadores da Actividade Seguradora (STAS), onde, respectivamente aquelas se encontravam filiadas, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego nº 2, de 15.1.2012, seguido do Acordo Colectivo de Trabalho (ACT) publicado no Boletim do Trabalho e Emprego nº 4, de 29.1.2016.

A cláusula 5ª do CCT de 2012, aplicável à avaliação do desempenho da Autora, ora recorrente, referente ao ano de 2014, sob a epígrafe avaliação do desempenho, dispunha que:
 1 — As empresas deverão instituir sistemas de avaliação de desempenho profissional.
2 — O sistema de avaliação de desempenho deverá contemplar, obrigatoriamente, os seguintes aspetos:
a) Conhecimento prévio do trabalhador;
b) Existência de mecanismos de recurso do resultado da avaliação.
3 — O resultado da avaliação deverá ser tido em conta, entre outros critérios, nas promoções facultativas, na atribuição de remunerações que excedam os mínimos obrigatórios, bem como na atribuição de eventuais prémios facultativos.

Por seu turno, também com a epígrafe avaliação do desempenho, a cláusula 5ª do ACT de 2016, já aplicável à avaliação do desempenho referente ao ano de 2015, passou a dispor que:
1- As empresas deverão instituir sistemas de avaliação de desempenho profissional.
2- O sistema de avaliação de desempenho deverá contemplar, obrigatoriamente, os seguintes aspetos:
a) Conhecimento prévio do trabalhador;
b) Existência de mecanismos de recurso do resultado da avaliação;
c) Decisão do eventual recurso no prazo máximo de 90 dias, com a respetiva comunicação ao recorrente.
3- O resultado da avaliação deverá ser tido em conta, entre outros critérios, nas promoções facultativas, na atribuição de remunerações que excedam os mínimos obrigatórios, bem como na atribuição de eventuais prémios facultativos.

Esse regime de avaliação de desempenho consagrado nas disposições citadas, de base contratual, decorrente dos irct sucessivamente aplicáveis, é complementado com o “Modelo de Gestão de Desempenho” em vigor na Ré, que prevê a existência de diversos intervenientes, designadamente o Comité de Gestão de Desempenho, ao qual cabe analisar e decidir sobre as reclamações dos avaliados.

Resulta da matéria de facto provada que a Autora reclamou das avaliações de desempenho respeitantes aos anos de 2014 e 2015. A reclamação contra a avaliação relativamente ao desempenho do ano de 2014 veio a ser decidida pelo Presidente do Conselho Executivo da Ré, e sobre a reclamação respeitante á avaliação do desempenho do ano de 2015 não foi proferida decisão.

À luz do enquadramento normativo enunciado, quanto à avaliação do desempenho da recorrente referente ao ano de 2014, a que era aplicável o CCT de 2012 e o sobredito “Modelo de Gestão de Desempenho”, editado pela Ré, de natureza regulamentar, convergiram as instâncias no entendimento de que a decisão sobre a reclamação apresentada pela Autora é inválida, por ter sido proferida por órgão que, nos termos do “Modelo de Gestão de Desempenho” não tinha competência para tal, com a consequente incompletude do processo avaliativo, convergindo, igualmente, no entendimento de que, não estando previsto prazo para que fosse proferida decisão final, a obrigação que impendia sobre a Ré é uma obrigação sem prazo, pelo que, de conformidade com o disposto no artigo 777º, nº 2, do Código Civil, se torna necessário que, não acordando as partes na fixação do mesmo, teria o prazo que ser fixado judicialmente, através da acção prevista no artigo 1026º do Código Civil, convergindo, enfim, na decisão, acompanhada pelo Tribunal da Relação, de que, não prevendo o irct aplicável prazo para a prolação de tal decisão, enquanto a mesma não for proferida o processo avaliativo não se mostra concluído, não existindo ainda, por conseguinte, decisão final sobre o resultado da avaliação da recorrente, e, não estando a Ré em mora, nem em situação de incumprimento definitivo quanto à obrigação de proferir a decisão, não podia a A. impugnar judicialmente avaliação do seu desempenho atinente ao ano de 2014, concluindo, em consequência, que a propositura da acção é intempestiva e pela verificação de excepção dilatória inominada que impõe a absolvição da Ré da instância.

Já quanto à avaliação do desempenho referente ao ano de 2015, sendo aplicável o ACT de 2016, enquanto a 1ª instância, considerou que o prazo de 90 dias para decisão da reclamação da avaliação, fixado na cláusula 5ª, nº 2, al. c), tem natureza peremptória, decorrido o qual se extinguiu o direito de praticar o acto, tornando definitivo o incumprimento do dever de prolação de decisão pela entidade empregadora, traduzindo-se tal incumprimento na inexistência de decisão de atribuição de notação à A. pelo seu desempenho profissional relativo a esse ano, concluiu não ser oponível à A., e como tal ineficaz, a decisão provisória sobre a sua notação, o Tribunal da Relação foi de entendimento que a decisão da avaliação do desempenho não foi proferida e, por isso, não existe, e, considerando que não se mostra definitivamente incumprida a obrigação da Ré de avaliar a., uma vez que esta ainda é objectivamente possível, acarretando apenas a constituição da Ré em mora, nos termos do artigo 804º, nº 2, do Código Civil, restando à A. fixar um prazo razoável para a devedora cumprir a obrigação (o que, nos autos, não foi pedido), daí concluindo que também quanto à avaliação do desempenho da A. referente ao ano de 2015 se verifica a excepção dilatória inominada de intempestividade da impugnação.

Feito este breve enquadramento há que prosseguir com a apreciação das questões objecto da presente revista que, como se disse, são as de saber se o acórdão recorrida enferma da nulidade, por contradição entre os fundamentos e a decisão, prevista no artigo 612º, nº 1, al. c), do Código de Processo Civil, se não se verifica a intempestividade da impugnação judicial da avaliação da Autora relativamente à avaliação do desempenho do ano de 2015, e se a decisão proferida pelo Tribunal da Relação, no que se refere às custas processuais deve refectir o vencimento da Autora, no que se refere à impugnação da matéria de facto.

Vejamos:
a) Da nulidade, por contradição entre os fundamentos e a decisão, prevista no artigo 612º, nº 1, al. c), do Código de Processo Civil.

Dispõe o artigo 615º, nº 1, al. c) do C.P.C. “é nula a sentença quando (…) os fundamentos estejam em oposição com a decisão (…)”.

É pacífico na doutrina e jurisprudência o entendimento segundo o qual a nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão aí contemplada pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la: a contradição geradora de nulidade ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto ou, pelo menos, de sentido diferente (cf. nesse sentido, na doutrina Professor Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, , Vol. V, pág. 141, Coimbra Editora, 1981, Amâncio Ferreira, Manual de Recursos no Processo Civil, 9ª edição, pág. 56 e Lebre de Freitas e Isabel Alexandra, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª edição, pág. 736-737, e na jurisprudência, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Secção Social, de 28.10.2010, Procº nº 2375/18.6T8VFX.L1.S3, 21.3.2018, Procº nº 471/10.7TTCSC.L1.S2, e 9.2.2017, Procº nº 2913/14.3TTLSB.L1-S1).

É igualmente pacífico o entendimento de que a divergência entre os factos provados e a decisão não integra tal nulidade reconduzindo-se a erro de julgamento.

Neste sentido afirmou-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30.5.2013, Procº nº 660/1999.P1.S1, que:
“I- A contradição a que a lei impõe o efeito inquinatório da sentença como nulidade, é a oposição entre os fundamentos e a decisão – art.º 668º, nº 1, al. d) do CPC.
II- Porém, para que tal ocorra, não basta uma qualquer divergência inferida entre os factos provados e a solução jurídica, pois tal divergência pode consubstanciar um mero erro de julgamento (error in judicando) sem a gravidade de uma nulidade da sentença. Como escreve Amâncio Ferreira «a oposição entre os fundamentos e a decisão não se reconduz  a uma errada subsunção dos factos à norma jurídica nem, tão pouco, a uma errada interpretação dela. Situações destas configuram-se como erro de julgamento» (A. Ferreira, Manual de Recursos em Processo Civil, 9ª edição, pg. 56).

III- A contradição entre os fundamentos e a decisão prevista na alínea c) do nº 1 do art.º 668º, ainda nas palavras do citado autor, verifica-se quando «a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos referidos pelo Juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente».

Mais recentemente, em sentido idêntico, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Secção Social, de 18.1.2018, Procº nº 25106/15.8T8LSB.L1.S1, afirmou-se que “a nulidade prevista no artº 615º, nº 1, al. c), do CPC consiste na contradição entre os fundamentos exarados pelo juiz na fundamentação da decisão e não entre os factos provados e a decisão”.

No caso vertente a incorreta valoração da matéria de facto provada na fundamentação da decisão que vem invocada pela recorrente quando sustenta que foi dado como provado que a avaliação da A. referente ao ano de 2015 teve lugar e foi levada a cabo pela Ré e que a fundamentação da decisão, em contradição com esse facto, fez constar que tal avaliação não existe, não integra nem se reconduz à nulidade invocada mas a erro de julgamento, sendo que, de todo o modo, não existe qualquer contradição entre a fundamentação e a decisão. Na verdade,

Na apreciação da apelação, no concernente à questão da avaliação do desempenho da Autora relativamente ao ano de 2015, na sua fundamentação o acórdão recorrido começa por reproduzir a fundamentação da decisão de 1ª instância, dizendo:

“Tendo isso em conta, a sentença recorrida considerou o seguinte:

"Ao contrário do que se defendeu a propósito da avaliação de 2014, para a qual o IRCT não fixava qualquer prazo de decisão, parece-nos que a utilização da expressão 'prazo máximo', deve ser entendida como a fixação de um prazo de natureza peremptória para a entidade empregadora.

Seguindo a definição de prazo peremptório constante do CPC (art.º 139 n.º 3), o decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto, ou seja, no caso dos autos, torna definitivo o incumprimento do dever de prolação de decisão pela entidade empregadora.

A avaliação valora a atitude geral do trabalhador e desempenho ao longo de um período - aquele a que se reporta a avaliação.

Isto significa que naturalmente a avaliação tem de obedecer a uma periodicidade (é anual) e tem um prazo para ser realizada.

(…)

Do descrito resulta, em qualquer caso, que a avaliação é um processo, ou seja, um conjunto de actos cuja prática visa precisamente atingir o resultado que consiste na notação do desempenho do trabalhador, por referência a um determinado período temporal.

Neste conjunto de actos insere-se, como não podia deixar de ser, a decisão final sobre a impugnação da notação que o trabalhador apresente, por não se conformar, quer com os critérios seguidos na avaliação, quer com o resultado da mesma.

Enquanto não for proferida, ou se não for proferida decisão final em termos que se possam considerar de incumprimento definitivo, em rigor, não há decisão de avaliação, ou seja, decisão de notação do trabalhador.

Em consequência e no caso dos autos, verificando-se o incumprimento definitivo da obrigação que sobre a R. impendia de proferir decisão de apreciação da impugnação apresentada pela A., as consequências deste incumprimento traduzem-se na inexistência de decisão de atribuição de notação à A. pelo seu desempenho profissional no período temporal compreendido entre 1 de Janeiro de 2015 e 31 de Dezembro de 2015, não sendo oponível à A., e como tal ineficaz, a decisão provisória sobre a sua notação, constante da ficha de avaliação de fls. 209 a 213.

Esta decisão tem que se considerar provisória precisamente porque podendo ser objecto de recurso e tendo sido apresentado recurso pela A., não se converteu em definitiva com a impugnação formulada pela A..

Em síntese e em resposta à primeira das questões de que cumpre conhecer, a avaliação plasmada na ficha de avaliação final, a fls. 209 a 213 dos autos, não é nula, mas é ineficaz em relação à A., por não ter sido, em devido tempo, concluída e objecto de decisão final.

Como é referido no Ac. da Relação do Porto de 05-01-2004 (P. 0313997, disponível em www.dgsi.pt):

'I - O poder de avaliação do mérito profissional conferido no instrumento da regulamentação colectiva aplicável ao superior hierárquico do trabalhador é exercido por delegação da entidade empregadora.

II - Tal avaliação só produzirá efeitos na esfera da entidade empregadora, se o superior hierárquico tiver observado os procedimentos por ela estabelecidos para o processo de avaliação.'.

Aplicando a jurisprudência citada com as devidas adaptações ao caso dos autos, temos que não tendo a R. cumprido o disposto na cláusula 5.ª n.º 2 al. c) do IRCT de 2016, a avaliação de 2015 não pode produzir efeitos na esfera jurídica da A.".

Seguidamente, prosseguindo na sua apreciação, afirma-se no acórdão recorrido:

“Que a avaliação do desempenho da apelante no ano de 2015 não foi concluída é a todos os títulos uma verdade apodíctica pois que, como vimos, tampouco passou o segundo patamar processual previsto no Modelo de Gestão de Desempenho dos trabalhadores instituído pela apelada (vale dizer, a apreciação da reclamação apresentada pela apelante ao Comité de Gestão de Desempenho, que era o mecanismo de recurso previsto) quando, como sabemos, aqueloutro prevê, como de resto seria normal, que a decisão final seja (fosse) proferida pelo seu Conselho de Administração.

Neste ponto, portanto, também concordamos com a sentença recorrida, pelo que se não pode dizer que a decisão de avaliação do despenho da apelante seja nula, pois pura e simplesmente ainda não foi proferida e por isso não existe. Daí que já não acompanhamos a sentença recorrida quando, algo contraditoriamente, diga-se, afirma que a decisão não é eficaz por não ter sido concluído o processo avaliativo já que, como dissemos, nenhuma decisão ainda foi proferida pela apelada, ou seja, por quem conformava a sua vontade neste domínio e que vimos ser o seu Conselho de Administração.

Por outro lado, também não subscrevemos a tese sufragada na sentença em dissídio ao considerar definitivamente incumprida a obrigação da apelada avaliar a apelante com o fundamento do decurso do prazo peremptório para a apelada se pronunciar acerca da reclamação desta e a característica do imediatismo na decisão. É verdade que a rapidez ou mesmo o imediatismo decisório assinalado na sentença recorrida não deixa de ser conveniente para a avaliação, mas a verdade é que tendo os dados conformativos dela sido colhidos por escrito a obrigação ainda era objectivamente possível, como de resto assinalou o acórdão da Relação de Lisboa, de 12-06-2019, no processo n.º 22065/17.6T8LSB.L1-4, publicado em http://www.dgsi.pt, embora com inevitáveis consequências como se vê do texto nele colhido: "A violação daquele dever [de avaliação do desempenho de trabalhador] acarreta apenas a constituição da ré em mora, nos termos do art.º 804.º, n.º 2 do Código Civil, uma vez que, por causa que lhe é imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido. O incumprimento definitivo – diz-nos o art.º 808.º, n.º 1 do CC – só tem lugar na hipótese do credor perder (objectivamente), o interesse na realização da prestação, em consequência da mora, ou se a prestação não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado por aquele".

Assim sendo e uma vez que a credora apelante mantém o interesse na avaliação, o que conclui da circunstância de não só ter instaurado a acção como após prolatada a decisão dela ter apelado, restar-lhe-á fixar um prazo razoável para a devedora (a apelada) cumprir a obrigação em mora; o que de todo o modo se não pode decidir desde logo porque a apelante não formulou tal pedido na acção (art.º 609.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).

De todo o modo, em certo ponto concordando com a sentença recorrida, com ela diremos que "o facto da R. não ter proferido decisão final no prazo previsto no IRCT e de consequentemente a avaliação de 2015 não produzir efeitos em relação à A. não conduz, nem pode conduzir, a uma presunção de atribuição de notação máxima e imediata atribuição dos benefícios, prémios e aumentos salariais que resultam de forma directa e necessária dessa avaliação". É que, como vimos decidido no citado acórdão da Relação de Lisboa, de 12-06-2019, no processo n.º 22065/17.6T8LSB.L1-4, publicado em http://www.dgsi.pt, "(…) 'O facto de não ter feito a avaliação em momento próprio não conduz, nem pode conduzir, a uma presunção de atribuição de notação máxima e imediata progressão ao escalão. (…).' A violação daquele dever acarreta apenas a constituição da Ré em mora, nos termos do art.º 804.º, n.º 2 do Código Civil, uma vez que, por causa imputável ao devedor (a aqui Ré), a prestação, ainda possível (e que acabou por ser realizada em 2017), não foi efectuada no tempo devido".

Assim, não tendo a apelada proferido decisão acerca da avaliação da apelante, não se pode dizer que esta é ineficaz em relação à apelada mas também não pode ser anulada, porque não existe”.

Da antecedente fundamentação concluiu o acórdão recorrido que “por isso não pode a apelação ser provida nem a decisão mantida, restando absolver a ré apelada da instância pois que também quanto à avaliação do desempenho da apelante no ano de 2015 se verifica a excepção dilatória inominada de intempestividade da impugnação judicial. Do que pode a relação conhecer ex officio, nos termos dos art.os 578.º e 595.º, n.º 3 do Código de Processo Civil”.

Sustenta a recorrente que o acórdão enferma da apontada nulidade, por contradição entre a fundamentação e a decisão, porquanto dá como provada que a avaliação da A. respeitante à prestação do trabalho em 2015, teve lugar e foi levada a cabo pela R., ao passo que, na respectiva fundamentação, fez constar que tal avaliação “não existe” com fundamento na falta de decisão da R. relativamente à reclamação da A., decidindo a procedência da excepção inominada da alegada intempestividade da impugnação judicial de tal avaliação

Da fundamentação do acórdão recorrido, com o teor anteriormente transcrito, ressalta à evidência que nela se não afirma que a avaliação do desempenho profissional da recorrente relativamente ao ano de 2015 não existe, pois que o que na mesma se afirma é que a decisão final da avaliação não foi proferida, e, portanto, não existe. O que aí se diz não existir é a decisão final da avaliação e não a avaliação, enquanto procedimento, uma sequência de actos ordenado a determinada finalidade, no caso, a notação final, definitiva, mediante a decisão do recurso da avaliação do desempenho profissional da recorrente relativamente ao ano de 2015, decisão que efectivamente não existe, não enfermando, por conseguinte, a fundamentação de qualquer contradição com a matéria de facto provada.

Sem fundamento, pois, a nulidade por contradição entre a fundamentação e a decisão imputada ao acórdão recorrido.
b) Aplicação do direito aos factos provados - Erro de julgamento

A recorrente insurge-se contra o acórdão recorrido dizendo “a A. não aceita que, face à matéria de facto dada como provada, o mesmo tenha decidido absolver a R. da Instância quanto à avaliação do desempenho de 2015, por julgar verificada a excepção de intempestividade da impugnação da avaliação da A. levada a cabo pela R. no que se refere ao ano de 2015, pelo facto de concluir que tal avaliação não existe e que, o que não existe não pode ser impugnado”.

Pugnando para que a excepção de intempestividade da impugnação da avaliação relativa ao ano de 2015 sustenta a recorrente que o acórdão recorrido não teve em conta os factos dados como provados sob os nºs 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, e 2-E da matéria de facto provada, dos quais se pode concluir que a sua avaliação, relativamente ao ano de 2015, foi levada a cabo pela R. e existe, permanecendo como tal na ordem jurídica, e que a circunstância de a R. não ter dado resposta à sua reclamação, no prazo em que estava obrigada a decidir a mesma, não significa que a avaliação não exista e não possa ser objecto de impugnação como decidiu o acórdão recorrido, acrescentando que não se verifica a intempestitivade da impugnação porquanto aguardava a decisão que até hoje não existiu.

A errada interpretação do direito e/ou subsunção da factualidade provada ao mesmo em que consiste o erro de julgamento decorre, na alegação da recorrente, de o acórdão recorrido não ter ponderado os pontos da matéria de facto provada que identifica dos quais se conclui que a sua avaliação relativamente ao desempenho profissional do ano de 2015, levada a cabo pela Ré, existe e permanece na ordem jurídica.

Parte tal alegação da premissa, sustentada pela recorrente, de que foi entendimento do acórdão recorrido que a avaliação em causa não existe, o que vimos já não se verificar, pelo que, é insubsistente e infundada a crítica que a recorrente dirige ao acórdão recorrido, pois que,

Diferentemente o que o acórdão recorrido considerou foi que a avaliação levada a cabo pela Ré ao desempenho profissional da recorrente relativamente ao ano de 2015 ainda não está concluída por não ter sido proferida, pela Ré, decisão sobre a reclamação apresentada pela recorrente – cabendo à recorrente, cujo interesse na prestação, na decisão da reclamação, se entendeu manter-se, fixar à recorrida um prazo razoável para cumprir a obrigação em mora, de conformidade com as disposições conjugadas dos artigos 804º, nº 2, e 805º, nº 1, [este não expressamente citado] ambos do Código Civil – pelo que, não existindo decisão acerca da avaliação da recorrente não é possível declarar a sua ineficácia em relação à recorrente nem a sua anulação, daí concluindo pela verificação da excepção dilatória inominada de intempestividade do impugnação judicial.

A decisão de direito proferida no acórdão recorrido resultou, assim, da consideração de que  não existindo decisão acerca da avaliação da recorrente não é possível declarar a sua ineficácia em relação à recorrente nem a sua anulação, e da aplicação aos pertinentes factos provados das disposições citadas, que regulam a falta de cumprimento e mora imputáveis ao devedor, do Código Civil, sem que, quanto à subsunção dos factos ao direito aplicável operada pelo acórdão recorrido, a recorrente manifeste adequada divergência ou invoque erro, v.g., por não ser aquele mas outro o regime leal aplicável, que demonstre o desacerto da decisão proferida, sendo novamente de registar que a alegação da recorrente de foi entendimento do acórdão recorrido que a avaliação em causa não existe é infundada.

A circunstância, provada e constante da matéria de facto provada, do seu ponto 2-E aditado pela Relação, de que “nos anos de 2015 e 2016 (em que foram efectuadas avaliações de 2014 e 2015), e como consequência das avaliações efectuadas a autora não recebeu qualquer prémio de desempenho”, que, numa primeira abordagem, poderia apontar no sentido, defendido pela recorrente, de que a avaliação em causa existe e permanece na ordem jurídica, não resiste à consideração de que, se a recorrente não recebeu prémio de desempenho, tal se deve porventura ao facto de a avaliação não se mostrar concluída, de nela ainda não ter sido proferida decisão sobre a reclamação, sendo, por ora, prematuro antecipar do direito à atribuição de tal prémio.

Não deixará de se notar, no entanto, que não existindo decisão final do procedimento avaliativo nenhuma das partes, recorrente ou recorrida, se pode prevalecer do resultado provisório da avaliação, da notação/avaliação proposta mas até à data em discussão, de conformidade com o mecanismo de recurso previsto no instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que as vincula. 

Por todo o exposto, não resta se não julgar improcedente este fundamento da revista.
c) Responsabilidade pelo pagamento das custas

O acórdão recorrido, tendo negado provimento à apelação da Autora quer no que concerne à qualificação do processo como de especial complexidade quer relativamente à avaliação do desempenho no ano de 2014, confirmando a sentença de 1ª instância, e julgando verificada a excepção dilatória de intempestividade da impugnação judicial relativamente ao ano de 2015, condenou, a final, a recorrente nas custas.

Insurgindo-se contra a condenação em custas defende a recorrente que a proporção em que ficou vencida no recurso de apelação não é de 100%, já que obteve vencimento no que se refere à impugnação da matéria de facto, pelo que a decisão proferida quanto a custas deveria reflectir esse vencimento, ainda que parcial, e não o reflectiu, em violação do disposto no artigo 527º, nº 1 e 2, do C.P.C.

O artigo 527º do Código de Processo Civil dispõe que:
Artigo 527.º
Regra geral em matéria de custas
1 - A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.
2 - Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.

3 - No caso de condenação por obrigação solidária, a solidariedade estende-se às custas.

A regra geral sobre a responsabilidade do pagamento de custas consagrada nesse preceito assenta, a título principal, no princípio da causalidade, em virtude do qual deve pagar as custas o vencido na respectiva proporção, e, subsidiariamente, no princípio do proveito ou vantagem processual, caso em que deve pagar as custas quem dela se aproveitou.
Sobre a disposição do nº 2 afirma Salvador da Costa, “As Custas Processuais”, 2017, 6ª edição, pág.6-7, que “Prevê o n.º 2 a regra sobre quem dá causa às custas do processo, e estatui ser a parte vencida, na proporção em que for. Trata-se do referido princípio da causalidade, em que um nexo objetivo liga conduta de quem aciona ou é acionado à lide respetiva.

Dir-se-á que a condição de vencido é que determina a condenação no pagamento de custas. Imputa-se legalmente a lide a quem aciona ou a quem é acionado, ou a ambos, se por ação ou omissão própria a poderiam ter evitado; a parte que agiu em conformidade com o direito não deve ser responsabilizada pelo custo do litígio.»

Em suma, como afirmam Lebre de Freitas e Isabel Alexandra, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, 3.ª ed., pág. 419, o critério para determinar quem dá causa acção, incidente ou recurso prescinde, em princípio, de qualquer indagação autónoma: dá-lhe causa tem perde. Quanto à acção, perde-a o réu quando é condenado no pedido; perde-a o autor quando o réu é absolvido do pedido ou da instância.

Por outras palavras, a regra geral em matéria de custas, consagrada no artigo 527º do Código de Processo Civil, é a de paga as custas quem tiver ficado vencido na lide, a parte que perdeu a acção, que nela decaiu, e na proporção do respectivo decaimento.

A condição de vencido, e a correspondente responsabilização pelo pagamento de custas, decorre e é definida pela decisão da causa, decisão de mérito ou decisão que lhe ponha termo, pela sentença ou acórdão, e não pela decisão em matéria de facto que em si não é uma sentença, mas a decisão, prévia à sentença em cuja fundamentação se integra, que fixa o acervo factual que constitui a base necessária à decisão de mérito.

No caso em apreço, independentemente de a recorrente ter obtido parcial provimento na impugnação da decisão em matéria de facto, a decisão da causa pelo acórdão recorrido foi-lhe totalmente desfavorável, pelo que, reflectindo a respectiva condenação em custas o vencimento total da recorrente de conformidade com o disposto no artigo 527º, nº 1 e 2, do Código de Processo Civil, o acórdão recorrido não merece censura.

Improcede, assim, também este fundamento do recurso.

IV - Decisão
Em face do exposto, acorda-se em negar a revista e em confirmar o acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.
Anexa-se sumário do acórdão.


Nos termos e para efeitos do disposto no artigo 15º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de março (aditado pelo artigo 3º do Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de maio) consigna-se que o presente acórdão foi aprovado por unanimidade, sendo assinado apenas pela relatora.


Lisboa, 14 de Abril de 2021


Leonor Maria da Conceição Cruz Rodrigues (Relatora)