Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
6753/22.8T8PRT-A.P1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: PEDRO DE LIMA GONÇALVES
Descritores: INTERPRETAÇÃO DE SENTENÇA
INTERPRETAÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL
ATO JURÍDICO
TEORIA DA IMPRESSÃO DO DESTINATÁRIO
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Data do Acordão: 02/27/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Sumário :
I - Uma sentença judicial constitui um verdadeiro ato jurídico a que se aplicam as regras reguladoras dos negócios jurídicos - pelo que as normas que disciplinam a interpretação da declaração negocial são igualmente válidas para a interpretação de uma sentença (art. 295.º do CC).

II - Sendo a sentença um ato jurídico, formal e reptício, subtraído à liberdade negocial, na sua interpretação não se procura a reconstituição de uma declaração pessoal de vontade do julgador, que possa ser entendida na base da determinação de um propósito subjetivo, assente numa determinada expressão verbal descontextualizada da fundamentação, mas sim o correto entendimento do resultado final e objetivo de um percurso pré-ordenado à obtenção da dita decisão.

III - A interpretação da sentença deve fazer-se de acordo com o sentido que um declaratário normal, colocado na situação do real declaratário, possa deduzir do conteúdo nela expresso, ainda que menos perfeitamente (arts. 236.º, n.º 1, e 238.º, n.º 1, do CC).

IV- Sendo as decisões judiciais atos formais - amplamente regulamentados pela lei de processo e implicando uma “objetivação” da composição de interesses nelas contida - tem de se aplicar à respetiva interpretação a regra fundamental segundo a qual não pode a sentença valer com um sentido que não tenha no documento ou escrito que a corporiza um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

V - Na interpretação da decisão judicial ter-se-á que atender à parte decisória propriamente dita (ao dispositivo final), aos seus antecedentes lógicos, ao contexto, a toda a fundamentação que a suporta e mesmo à globalidade dos atos que a precederam (quer se trate de atos das partes, ou de atos do tribunal), bem como às demais circunstâncias que se revelem pertinentes, mesmo posteriores à sua prolação, sempre garantindo que o sentido apurado tem a devida tradução no texto.

Decisão Texto Integral:

Acórdão


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I – Relatório

1. Victória Seguros, S.A. veio deduzir os presentes embargos de executado contra AA, invocando para tanto, em suma, que o título não é exequível quanto aos juros peticionados, pois que os acórdãos proferidos quer pelo Tribunal da Relação do Porto, quer pelo Supremo Tribunal de Justiça são omissos quanto à obrigação do pagamento de juros, pugnando desta forma pela extinção da execução.

2. Notificado, o embargante veio contestou, concluindo pela improcedência dos embargos.

3. Foi proferido saneador-sentença, sendo o dispositivo do seguinte teor: “Pelo exposto, julgo improcedentes por não provados os presentes embargos de executado, e consequentemente determino o prosseguimento da execução para pagamento das quantias peticionadas pelo exequente. “.

4. Inconformada com esta decisão, a Embargante interpôs recurso de apelação.

5. O Tribunal da Relação do Porto proferiu Acórdão, sendo o dispositivo do seguinte teor:

“Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto, em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão da primeira instância, e em consequência julgando-se procedentes os embargos, com a consequente extinção da instância executiva”.

6. Inconformado, o Embargante veio interpor recurso de revista, formulando as seguintes (transcritas) conclusões:

1.ª Entende o recorrente/exequente que do título dado à execução (decisão de 1ª instância, Acórdão da Relação do Porto e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça) perpassa com toda a clareza a condenação da executada/embargante a pagamento de juros sobre os danos patrimoniais liquidados pelo Douto Acórdão proferido pelo S.T.J.

2.ª O autor/exequente (assim como o Tribunal de 1ª Instância) não partilha do entendimento propugnado no acórdão recorrido, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de “a condenação em juros de mora não pode valer sobre o montante indemnizatório fixado pelo Supremo Tribunal de Justiça a título de danos futuros, id. Sob o ponto de facto 1.63, no montante de 350.860,00.

3.ª Sendo inelutável, e por isso merecendo a adesão do autor/exequente o segmento do acórdão recorrido em que este declara (pág.24) que, “Aplicando às decisões da acção declarativa, primeira instância, Tribunal da Relação do Porto e Supremo Tribunal de Justiça, as regras da interpretação, parece de meridiana clareza, que às quantias a que a R. companhia de seguros, agora recorrente e embargante, foi condenada, acresce a condenação em juros de mora, tal qual decorre do decidido pela primeira instância.”

4.ª Destarte, e salvo o devido respeito, não se compreende a destrinça que perpassa do Acórdão recorrido e proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, em que num segmento aceita e defere a obrigação do pagamento de juros devidos a título de danos patrimoniais futuros, e ao mesmo tempo noutro segmento repudia e não concede o pagamento de juros relativos a outros danos patrimoniais futuros, sem que daí não perpasse, em obediência critérios de equidade, uma desigualdade de tratamento, e suscite a interrogação do sentido reparador teria o julgado que serve de título se, por mero acaso, de todo incompreensível se retirasse da alçada obrigacional da executada/embargante o pagamento de juros a título danos patrimoniais futuros, tomando em consideração que no caso concreto a obrigação de indemnização da executada/embargante resulta da sua condenação em responsabilidade civil extracontratual, decorrente de contrato de seguro celebrado, que encontra consagração, ao nível do direito positivo, no artigo 562.º do Código Civil – “quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação” – estabelecendo-se neste preceito o dever de reposição das coisas ao estado em que estariam, se não se tivesse produzido o dano.

5.ª Neste conspecto, e trazendo à colação o tramitado e decidido na acção declarativa decorre que tanto do pedido formulado pelo autor/exequente, bem como da causa de pedir, e ainda debruçando-nos sobre uma análise global da fundamentação jurídica do título executivo (sentença e acórdãos) dado á execução, tanto nos segmentos decisórios como nas suas motivações (como infra se refere), decorre a obrigatoriedade de pagamento de juros por parte da executada/embargante relativamente aos danos patrimoniais futuros (nos quais se incluem os danos futuros, identificados sob o ponto de facto 1.63, no montante de 350.860,00), bem como o direito do exequente, aqui recorrente, em exigir daquela o pagamento dos juros peticionados no requerimento executivo inicial.

6.ª No seguimento do propugnado pela Doutrina e Jurisprudência (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 03.02-2011, Lopes do Rego, Proc. n.º 190-A/1999.E1.S1 - in Acórdão da Relação de Guimarães, 14.06-2017, Maria João Matos, Proc. n.º 426/11.4TBPTL-A.G1) e consubstanciado ao caso concreto,

7.ª Nos autos de execução o Exequente apresentou como título executivo, a Sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto e o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça.

8.ª Analisada no seu todo a acção declarativa onde a sentença e acórdãos foram proferidos, verifica-se que: logo na petição inicial e no requerimento de ampliação do pedido, o ali autor, exequente/embargado nos presentes autos, deixou claro o pedido de condenação da ré/embargante no pagamento de juros relativos a todos os danos patrimoniais futuros (nos quais se inclui os danos patrimoniais futuros, identificados sob o ponto de facto 1.63, no montante de 350.860,00)

9.ª Isto é, no processo n.º 1436/15.8..., que correu termos no Juízo Central Cível ... – Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca do Porto a Autora, aqui exequente, pediu a condenação da Ré, aqui executada a pagar-lhe juros de mora, à taxa legal, desde a citação – porquanto e conforme. decorre do art.º 805.º, n.º 3, do Código Civil, há sempre mora desde a citação, quando o fundamento é a responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco – vide ainda Acórdão de fixação de jurisprudência do STJ n.º 4/2002.

10 - Em 1.ª Instância, por Douta sentença já transitada em julgado foi a Executada (Victória Seguros, S.A.) condenada a pagar ao Exequente (AA), indemnização nos seguintes termos

a) A quantia de € 336.132 a título de danos patrimoniais, à qual deverá se deduzido o valor total das prestações mensais de € 700,00 que a mesma Ré vem pagando no cumprimento da transação alcançada nos autos de providência cautelar apensa;

b) Ainda a título de danos patrimoniais o valor a liquidar ulteriormente correspondente aos custos com a manutenção e substituição periódica das próteses (incluindo componentes e outros materiais de desgaste associados a tais equipamentos médicos) e equipamentos de apoio, mencionados nos pontos 61), 63), 65), 66) e 67) da matéria de facto provada, bem como aos custos com consultas e tratamentos de medicina de reabilitação e fisioterapia que o Autor venha a carecer no futuro, em consequência das lesões resultantes do acidente dos autos e com os transportes a eles associados;

c) A quantia de € 250,000.000 a título de compensação por danos não patrimoniais;

d) Juros de mora, sobre as quantias acima referidas, desde a data desta decisão relativamente à quantia referida em c) e desde a data da citação relativamente à referida em a), à taxa de 4%, desde a presente data, até integral pagamento, aplicando-se qualquer alteração que venha a ser introduzida a esta taxa de juro até aquela data.

11.ª O Tribunal de 1ª Instância condenou a Ré no pagamento de juros relativamente aos danos patrimoniais futuros que liquidou, desde a data da citação.

12.ª Aliás, tal como decorre da fundamentação da sentença, proferida pelo Tribunal de 1ª instância, no âmbito do processo declarativo que correu termos no Juízo Central Cível ... – Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca do Porto.

13.ª Em 2ª Instância, após interposição de recurso pelo Autor, aqui Exequente, foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto, no qual foi a Ré, aqui executada, condenada a pagar as quantias de € 521.418,05 (danos patrimoniais) e de € 300.000,00 (danos não patrimoniais) mantendo-se a decisão proferida quanto ao mais - isto é, também quanto aos juros devidos pela condenação em danos patrimoniais futuros que se encontravam liquidados.

14.ª A indemnização a título de danos patrimoniais futuros vence juros de mora, desde a data da citação, à taxa de 4%, desde a data da citação até integral pagamento, e a indemnização a título de danos não patrimoniais desde a data da decisão até integral pagamento.

15.ª Por fim foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça, relativamente à liquidação dos danos patrimoniais futuros referidos nos pontos 1.61 a 1.67 dos factos dados por provados, que decidiu concedendo provimento parcial da Revista excecional (art.º 672.º C.P.C.) do autor, e condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 350.860,00, correspondente aos danos patrimoniais futuros constantes do ponto 1.63. dos factos provados, mantendo-se o mais decidido pelo Tribunal da Relação.

16.ª Isto é, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça liquidou os danos patrimoniais futuros constantes do ponto 1.63. dos factos provados, (mantendo o mais decidido pelo Tribunal da Relação) – pelo que também sobre estes danos patrimoniais futuros, já liquidados, são devidos juros desde a data da citação.

17.ª O Douto Acórdão proferido pelo STJ, - na passagem, sob epígrafe, “3. Recurso do Autor – Liquidação dos danos patrimoniais futuros referidos nos pontos 1.61 a 1.67 dos factos provados” - é elucidativo a demonstrar que correspondem aos danos constantes do ponto 1.63 dos factos provados, a danos patrimoniais futuros e que neste momento foram dados por liquidados.

18.ª Dir-se-á assim, sem margem para qualquer dúvida, trazendo à colação o tramitado e decidido na acção declarativa, da conjunta ponderação do pedido formulado na petição inicial, dos factos selecionados como assentes e como controvertidos, da prova que estes últimos mereceram após o julgamento respectivo e da fundamentação de facto e de direito da sentença proferida, em conjugação com os Acórdãos proferidos tanto pelo Tribunal da Relação do Porto como pelo Supremo Tribunal de Justiça, - resulta que, sobre o montante de € 350.860,00, correspondente aos danos patrimoniais futuros mencionados no ponto 1.63 dos factos dados por provados, assim desta forma liquidados no Acórdão proferido pelo S.T.J., são devidos juros de mora - , considerando ainda que, estamos no âmbito da responsabilidade civil por facto ilícito, e o que consta da Sentença de 1ª Instância quanto a juros, tanto na fundamentação de direito como na parte decisória, é inelutável que sobre todas as indemnizações arbitradas a título de danos patrimoniais futuros pelas Instâncias incidem juros de mora contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

19.ª No processo executivo ao atribuir-se eficácia executiva a uma sentença, quis-se abranger nesta designação todas as sentenças em que o juiz, expressa ou tacitamente, impõe a alguém determinada responsabilidade.

20.ª Não pode, por isso, aceitar-se a posição assumida pelo Tribunal “ a quo”, e por isso deverá o Acórdão recorrido ser revogado, por traduzir e corresponder a uma menos completa ponderação, quer da globalidade do título dado à execução – e mesmo entre cada um dos dispositivos (insertos na decisão de 1ª Instância, Acórdão da Relação do Porto e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça) -, e na carência de conjugação com os seus próprios fundamentos, bem como, inclusivamente, com a generalidade dos actos que precederam a decisão (do STJ), consubstanciando uma interpretação sincrética e isolada daquela, que, salvo o devido respeito, altera todo anterior e coerente juízo de mérito compreendido na globalidade do título dado à execução.

21.ª Concluindo-se assim, que o título apresentado à execução pelo exequente/embargado é, pois, exequível relativamente a juros sobre o montante de € 350.860,00, correspondente aos danos patrimoniais futuros mencionados no ponto 1.63 dos factos dados por provados, e em consequência deverão ser julgados improcedentes os embargos de executados deduzidos e consequentemente determinado o prosseguimento da execução para pagamento das quantias peticionadas pelo exequente.

22.ª Conforme decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, nos presente autos de embargos de executado, que de forma inelutável e lapidar, conjugou, interpretou e emitiu coerente juízo de mérito sobre o título dado à execução e concluiu que sobre todas as indemnizações arbitradas a título de danos patrimoniais futuros pelas Instâncias (incluindo o ponto 1.63 dos factos dados por provados), incidem juros de mora contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Ainda sem prescindir,

23.ª No seguimento do exposto e corroborando a exequibilidade do titulo dado á execução decidiu o Tribunal de 1ª Instância, concatenando os factos dados por provados e fundamentação de facto e de direito, proferiu sentença, na qual julgou “improcedentes por não provados os presentes embargos de executado, e consequentemente determino o prosseguimento da execução para pagamento das quantias peticionadas pelo exequente”.

24.ª Em conclusão, e trazendo à colação o tramitado e decidido na acção declarativa assim como o determinado pelo Tribunal de 1.ª Instância, decorre que tanto do pedido formulado pelo autor/exequente, bem como da causa de pedir, e ainda debruçando-nos sobre uma análise global da fundamentação jurídica do título executivo (sentença e acórdãos) dado á execução, tanto nos segmentos decisórios como nas suas motivações, decorre a obrigatoriedade de pagamento de juros por parte da executada/embargante relativamente aos danos patrimoniais futuros (nos quais se incluem os danos futuros, identificados sob o ponto de facto 1.63, no montante de 350.860,00), bem como o direito do exequente, aqui recorrente, em exigir daquela o pagamento dos juros peticionados no requerimento executivo inicial.

Sem prescindir,

25.ª Sucede que, no que respeita aos danos patrimoniais futuros, pese embora, a condenação no pagamento em juros desde a data da citação até integral pagamento (vidé, Sentença de 1ª instância, Acórdão da Relação e Acórdão do STJ), a executada/embargante não pagou os juros relativos danos patrimoniais futuros referidos nos pontos 1.63 dos factos dados por provados.

26.ª Os juros moratórios exercem, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, uma função de indemnização pelo retardamento no integral ressarcimento do lesado, visando a compensação dos danos decorrentes do intempestivo cumprimento da obrigação e da desvalorização monetária entretanto ocorrida.

27.ª Isto porque os juros moratórios exercem a função de indemnização pelo retardamento de uma prestação pecuniária, sendo assim, devidos a título de indemnização.

28.ª Assim, peticiona o Exequente o pagamento pela Executada do valor de € 94.741,82 (sendo relativo ao período de 24.11.2015 a 05.12.2021, correspondente a 2203 dias de mora a taxa de 4% de juros, no montante de € 84.706,26; e relativo ao período de 06.12.2021 a 01.04.2022 correspondente a 116 dias de mora a taxa de 4% + 5% de juros, no montante de € 10.035,56), dos juros relativos aos danos patrimoniais futuros referidos nos pontos 1.63 dos factos dados por provados, juros a calcular com base no montante € 350.860,00, desde a data da citação até integral pagamento, e que neste momento se computam no valor de € 94.741,82.

29.ª Mais peticiona o Exequente à Executada, nos termos do artigo 829.º-A, n.º 4 do Código Civil, juros à taxa legal de 5%, calculados desde o trânsito em julgado até efectivo e integral pagamento.

30.ª As Instâncias (na acção declarativa), bem como o Tribunal de 1ª Instância nos presentes autos de embargos, pronunciaram-se quanto aos juros, decidindo que os danos não patrimoniais vencem juros desde a data da decisão até efectivo e integral pagamento e que os danos patrimoniais vencem juros desde a citação até efetivo e integral pagamento.

31.ª Nenhuma das instâncias refere que os juros se vencem com o trânsito em julgado, até porque tal interpretação contraria o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2002.

32.ª Acresce mencionar que a veneranda Instância (S.T.J.), no referido Acórdão nunca afirma que o valor de € 350.860,00 é um valor actualizado à data em que foi proferido.

33.ª Tal como o dano biológico (dano patrimonial futuro) vence juros desde a citação, e é devido desde o momento do acidente, também o dano patrimonial futuro (relativo à prótese - ponto 1.63), que também é devido desde a data do acidente (“desde a data do acidente até perfazer 77 anos de vida”) vence juros desde a data da citação.

34.ª E, sendo devido desde a data do acidente, é um dano patrimonial que existe na esfera jurídica do exequente desde esse momento. Aliás, o facto causador dos danos (todos) é o acidente de que foi vítima. É esse o momento em que nasce a obrigação de indemnização.

35.ª De resto e adivinhando uma eventual alusão da embargante ao facto do executado ter percebido a indemnização de 350.860,00, por danos futuros, antecipadamente e sem redução, subscrevemos as palavras precisas do Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro, Urbano Dias, no Douto Acórdão do S.T.J., de 08.06.2010, no proc. 25.163/05.5YYLSB.L1.S1, e que aqui parcialmente se transcreve:

“…

Uma última palavra.

Diz respeito à ideia defendida, pela recorrente, do “desconto” na fixação do quantum indemnizatório, à conta de o lesado perceber a indemnização “por antecipação”.

Confessamos a nossa dificuldade, o nosso embaraço, em percebê-la: então o lesado tem algum privilégio em receber tudo de uma vez? Ou, antes, não teria sido ele um privilegiado se o acidente não tivesse ocorrido? Ou será que o lesante exerceu algum direito e a Seguradora faz algum favor ao pagar a indemnização a que está adstrita, por mor do contrato de seguro que outorgou?

Em boa verdade, há cousas que não se devem dizer, sob pena de ofender o que, para nós, é sagrado, a ideia de direito (id quod iustum est).

Improcede, de todo, a pretensão da Recorrente. …”

Por fim,

36.ª O acórdão do Excelentíssimo Tribunal da Relação, na opinião do Recorrente, não opera à correcta aplicação do disposto nos artigos 236.º e 238.º, 483.º, 564º e 566º e ainda dos artigos 805º e 806º, todos do Código Civil e dos artigos 607º, 615.º e 674.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil.

37.ª Conclui-se, pois, que o douto Acórdão da Relação recorrido violou os preceitos legais supra identificados nestas conclusões devendo, por isso, ser revogado, julgando-se improcedente os embargos de executado e mantendo-se a Douta sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, determinado o prosseguimento da execução para pagamento das quantias peticionadas pelo exequente/recorrente.

7. A Embargante contra-alegou, concluindo pela improcedência do recurso.

8. Cumpre apreciar e decidir.

II. Delimitação do objeto do recurso

Como é jurisprudência sedimentada, e em conformidade com o disposto nos artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil, o objeto do recurso é delimitado em função das conclusões formuladas pelo recorrente, pelo que, dentro dos preditos parâmetros, da leitura das conclusões recursórias formuladas pelo Exequente/Embargado, ora Recorrente, decorre que o objeto do presente recurso está circunscrito à questão de saber da exequibilidade da decisão dada à execução, no que concerne aos juros de mora que o Exequente reclama e que respeita ao montante dos danos que o Acórdão do STJ liquidou na quantia de €350 860,00.

III. Fundamentação

1. As instâncias deram como provados os seguintes factos:

1.1. O exequente intentou contra a executada aqui embargante, a execução a que estes autos se encontram apensos, dando como título executivo a sentença proferida no processo n.º 1436/15.8T8PVZ, que correu termos no Juízo Central Cível ... – Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, transitada em julgado em 02-12-2021, tendo a sentença proferida em 1.ª instância o seguinte segmento decisório:

Pelo exposto, o Tribunal julga a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condena a Ré «Victória Seguros, SA» a pagar:

I - ao Autor AA:

a) A quantia de €336.132,61 (trezentos e trinta e seis mil, cento e trinta e dois euros e sessenta e um cêntimos) a título de danos patrimoniais, à qual deverá ser deduzido o valor total das prestações mensais de €700,00 (setecentos euros) que a mesma Ré vem pagando no cumprimento da transacção alcançada nos autos de providência cautelar apensa;

b) Ainda a título de danos patrimoniais o valor a liquidar ulteriormente correspondente aos custos com manutenção e substituição periódica das próteses (incluindo componentes e outros materiais de desgaste associados a tais equipamentos médicos) e equipamentos de apoio, mencionados nos pontos 61), 63), 65), 66) e 67) da matéria de facto provada, bem como aos custos com consultas e tratamentos de medicina de reabilitação e fisioterapia que o Autor venha a carecer no futuro, em consequência das lesões resultantes do acidente dos autos e com os transportes a eles associados;

c) A quantia de €250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) a título de compensação por danos não patrimoniais;

d) juros de mora, sobre as quantias líquidas acima referidas, desde a data desta decisão relativamente à quantia referida em c) e desde a data da citação relativamente à referida em a), à taxa de 4%, desde a presente data, até integral pagamento, aplicando-se qualquer alteração que venha a ser introduzida a esta taxa de juro até àquela data.


*


Em 2ª Instância, após interposição de recurso pelo Autor, foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto, com o seguinte segmento decisório:

Nestes termos, dá-se, em parte, provimento ao recurso, e em consequência conceda-se a Ré a pagar ao A. condenada a pagar as quantias de € 521.418,05 (danos patrimoniais) e de €300.000,00 (danos não patrimoniais) mantendo-se a decisão proferida quanto ao mais.


*


Na sequência de recurso de Revista interposto pela ali R, o Supremo Tribunal de Justiça, proferiu Acórdão com o seguinte segmento decisório:

Posto o que precede, acorda-se:

- Em conceder parcialmente a revista do Autor e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia de €350 860,00, correspondente aos danos constantes do ponto 1.63. dos factos provados, mantendo-se o mais decidido pelo Tribunal da Relação;

- Em conceder parcialmente a revista da Ré, fixando-se a indemnização por ajuda de terceiras pessoas em €65 000,00, mantendo-se o mais decidido pelo Tribunal da Relação;

Tudo nos demais termos constantes da certidão junta aos autos e atinente à sentença e Acórdão proferidos, cujo teor no mais se dá aqui por integralmente reproduzido.

1.3. A execução deu entrada em juízo em 1.4.2022, e nessa o exequente [reclama]o pagamento pela Executada do valor de € 94.741,82 (sendo relativo ao período de 24.11.2015 a 05.12.2021, correspondente a 2203 dias de mora a taxa de 4% de juros, no montante de € 84.706,26; e relativo ao período de 06.12.2021 a 01.04.2022 correspondente a 116 dias de mora a taxa de 4% + 5% de juros, no montante de € 10.035,56), dos juros relativos aos danos patrimoniais futuros referidos nos pontos 1.63 dos factos dados por provados, juros a calcular com base no montante € 350.860,00, desde a data da citação até integral pagamento, e que neste momento se computam no valor de € 94.741,82.

1.4. Posteriormente, invocando erro de cálculo nos juros o exequente veio, por requerimento aos autos de execução reduzir a quantia exequenda para o montante de € 86.845,95, nos termos do requerimento junto aos autos a 17.6.2022.“

2. Apreciação do recurso

A Executada veio deduzir embargos de executado, invocando que o título não era exequível quanto aos juros peticionados, pois que os acórdãos proferidos quer pelo Tribunal da Relação do Porto, quer pelo Supremo Tribunal de Justiça são omissos quanto à obrigação do pagamento de juros.

E, assim, reclamou a extinção da execução.

O Tribunal de 1.ª instância veio a julgar improcedentes os embargos, determinando o prosseguimento da execução para pagamento das quantias peticionadas pelo Exequente.

Inconformada, a Embargante/Executada interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação do Porto, pelo Acórdão ora recorrido, revogado a decisão do Tribunal de 1.ª instância e, em consequência, veio a julgar procedentes os embargos com a consequente extinção da instância executiva.

Vejamos.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º1 do artigo 703.º do Código de Processo Civil, as sentenças condenatórias são título executivo.

Por sua vez, prescreve o n.º2 do referido 703.º do Código de Processo Civil que “consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante”.

E o n.º3 do artigo 805.º do Código Civil preceitua que “se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que haja então mora, nos termos da primeira parte deste número”.

Como se referiu, o que se discute nestes autos é se o título dado à execução (sentença/acórdão) é exequível, no que respeita aos juros de mora reclamados pelo Exequente/Embargado, tendo as instâncias dado resposta diferente.

Para concluir pela procedência dos embargos de executado, o Acórdão recorrido apreciou o Acórdão da Relação e o Acórdão do STJ, concluindo que não consta a condenação em juros de mora reclamados.

No Acórdão recorrido foi feita uma extensa indagação na doutrina e na jurisprudência acerca da forma de interpretação de uma sentença/acórdão, tendo o Juiz Desembargador Relator elaborado o sumário de acórdão do seguinte teor (concordando-se com o seu conteúdo):

I – Uma sentença judicial constitui um verdadeiro acto jurídico a que se aplicam as regras reguladoras dos negócios jurídicos – pelo que as normas que disciplinam a interpretação da declaração negocial são igualmente válidas para a interpretação de uma sentença (artigo 295.º do Código Civil).

II – Sendo a sentença um acto jurídico, formal e reptício, subtraído à liberdade negocial, na sua interpretação não se procura a reconstituição de uma declaração pessoal de vontade do julgador, que possa ser entendida na base da determinação de um propósito subjectivo, assente numa determinada expressão verbal descontextualizada da fundamentação, mas sim o correcto entendimento do resultado final e objectivo de um percurso pré-ordenado à obtenção da dita decisão.

III - A interpretação da sentença deve fazer-se de acordo com o sentido que um declaratário normal, colocado na situação do real declaratário, possa deduzir do conteúdo nela expresso, ainda que menos perfeitamente (artigos 236.º, n.º1, e 238.º, n.º1, do Código Civil).

IV) Sendo as decisões judiciais actos formais - amplamente regulamentados pela lei de processo e implicando uma “objectivação” da composição de interesses nelas contida – tem de se aplicar à respectiva interpretação a regra fundamental segundo a qual não pode a sentença valer com um sentido que não tenha no documento ou escrito que a corporiza um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

V) - Na interpretação da decisão judicial ter-se-á que atender à parte decisória propriamente dita (ao dispositivo final), aos seus antecedentes lógicos, ao contexto, a toda a fundamentação que a suporta e mesmo à globalidade dos actos que a precederam (quer se trate de actos das partes, ou de actos do tribunal), bem como às demais circunstâncias que se revelem pertinentes, mesmo posteriores à sua prolação, sempre garantindo que o sentido apurado tem a devida tradução no texto.

No caso presente:

O Exequente AA instaurou ação declarativa de condenação, sob a forma comum, contra «Victória – Seguros, S.A.», pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe:

a) A quantia de €435,00, correspondente ao vestuário e pertences que trazia consigo e ficaram destruídos em consequência do acidente;

b) A quantia de €468,45, correspondente a despesas com consultas, tratamentos médicos, assistência médica e medicamentosa e transportes;

c) A quantia de €420.000,00, a título de indemnização por perda de capacidade de ganho;

d) A quantia de €27.907,41, a título de danos salários e dos Subsídios de Férias e de Natal não recebidos desde a data do acidente, bem como os salários e subsídios vincendos a liquidar ulteriormente

e) As quantias de €542.399,80, €133.666,00 e €18.921,00, a título de danos patrimoniais futuros a que alude nos artigos 105º, 107 e 109º da petição inicial;

h) A quantia de €750.000,00, a título de compensação por danos não patrimoniais;

i) A quantia de €70.000,00, ainda a tútulo de dano futuro, correspondente aos transportes que necessitará ao longo de toda a sua vida;

j) A quantia de €170.000,00, a título de indemnização por despesas com o apoio de terceira pessoa que necessita para a realização das tarefas inerentes às lides domésticas;

k) As quantias que se vierem a determinar ulteriormente correspondentes a todos os danos patrimoniais e não patrimoniais, presentes e futuros, ainda não apurados;

l) Os juros de mora, contados a partir da citação.

Realizada a audiência, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Ré «Victória Seguros, SA» a pagar:

“I - ao Autor AA:

a) A quantia de €336.132,61 (trezentos e trinta e seis mil, cento e trinta e dois euros e sessenta e um cêntimos) a título de danos patrimoniais, à qual deverá ser deduzido o valor total das prestações mensais de €700,00 (setecentos euros) que a mesma Ré vem pagando no cumprimento da transacção alcançada nos autos de providência cautelar apensa;

b) Ainda a título de danos patrimoniais o valor a liquidar ulteriormente correspondente aos custos com manutenção e substituição periódica das próteses (incluindo componentes e outros materiais de desgaste associados a tais equipamentos médicos) e equipamentos de apoio, mencionados nos pontos 61), 63), 65), 66) e 67) da matéria de facto provada, bem como aos custos com consultas e tratamentos de medicina de reabilitação e fisioterapia que o Autor venha a carecer no futuro, em consequência das lesões resultantes do acidente dos autos e com os transportes a eles associados;

c) A quantia de €250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) a título de compensação por danos não patrimoniais;

d) juros de mora, sobre as quantias líquidas acima referidas, desde a data desta decisão relativamente à quantia referida em c) e desde a data da citação relativamente à referida em a), à taxa de 4%, desde a presente data, até integral pagamento, aplicando-se qualquer alteração que venha a ser introduzida a esta taxa de juro até àquela data”.

Inconformado, o ora Exequente/Embargado, interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação do Porto proferido Acórdão, julgando o recurso parcialmente procedente e condenou a “ré a pagar ao autor as quantias de €521.418,05 (danos patrimoniais) e de €300.000,00 (danos não patrimoniais, mantendo-se a decisão proferida quanto ao mais”.

Não se conformando com esta decisão:

o Embargado/Exequente interpôs recurso de revista excecional do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, “no que respeita aos danos patrimoniais futuros, designadamente, os pedidos relativos à liquidação da prótese biónica e períodos de substituição, da prótese de banho e períodos de substituição, cadeira de rodas e períodos de substituição e dos respectivos materiais consumíveis e suas substituições e indeferiu os pedidos de liquidação, desde já, desses danos”, recurso que foi admitido pela Formação de Juízes a que alude o n.º3 do artigo 672.º do Código de Processo Civil;

a Embargante/Executada interpôs recurso de revista, recurso admitido;

o Embargado/Exequente interpôs recurso subordinado, que não foi admitido.

O Supremo Tribunal de Justiça, proferiu Acórdão com o seguinte segmento decisório:

“Posto o que precede, acorda-se:

- Em conceder parcialmente a revista do Autor e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia de €350 860,00, correspondente aos danos constantes do ponto 1.63. dos factos provados, mantendo-se o mais decidido pelo Tribunal da Relação;

- Em conceder parcialmente a revista da Ré, fixando-se a indemnização por ajuda de terceiras pessoas em €65 000,00, mantendo-se o mais decidido pelo Tribunal da Relação”.

Ora, da análise destas três decisões resulta que o Tribunal de 1.ª instância condenou a Ré, ora Executada/Embargante, no pagamento dos juros de mora sobre as quantias constantes nas alíneas a) e c) do dispositivo, tendo expressamente referido que os juros de mora era devidos desde a citação quanto às quantias líquidas (e que já constavam da alínea a)).

O Tribunal da Relação do Porto, no Acórdão proferido, em consequência do recurso interposto pelo Autor, ora Embargado/Exequente, condenou a Ré (ora Embargante/Executada) no pagamento das quantias de €521 418,05 (danos patrimoniais) e de €300 000,00 (danos não patrimoniais), mantendo a decisão do Tribunal de 1.ª instância quanto ao mais.

O STJ veio a condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia de €350 860,00, “correspondente aos danos constantes do ponto 1.63 dos factos provados, mantendo o mais decidido pelo Tribunal da Relação”.

Estes danos constavam da alínea b) do dispositivo da sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.

Contudo, reportavam-se a danos que o Tribunal de 1.ª instância considerava como não sendo possível liquidar no momento em que foi proferida a sentença, e que o STJ considerou que já era possível liquidar o dano referido no ponto 1.63 dos factos provados.

De tudo o que se refere, conclui-se que o Tribunal de 1.ª instância não condenou em juros estes danos (os referidos no ponto 63 dos factos provados e referidos na alínea b) do dispositivo) por, no seu entendimento, ainda não era possível apurar o montante líquido, o que veio a ser contrariado pelo Acórdão do STJ, que relativamente a determinados danos considerou que já era possível proceder à fixação dos danos.

Daí que resulta do todo o exposto que a Ré havia sido condenada no pagamento de juros em todos os danos que se mostrassem possíveis de apurar, pois nem outro sentido teria o decidido na alínea d) do dispositivo da sentença proferida pelo tribunal de 1.ª instância quando refere que são devidos “juros de mora sobre as quantias líquidas…”.

Aliás, como refere o Tribunal de 1.ª instância do processo de execução, na sentença proferida na ação declarativa, escreveu-se relativamente aos juros, “Quanto ao mais, não se justifica (porquanto não se procedeu a qualquer actualização monetária) a exclusão do pagamento dos juros moratórios desde a data da citação até à “decisão actualizadora”. O mesmo é válido quanto ao pedido ilíquido, pois que tal decorre do art. 805.º, n.º3, do C. Civil: há sempre mora desde a citação, quando o fundamento é a responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco.”

Isto é, nos Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação e do STJ não houve pronúncia expressa sobre os juros, por não ser questão colocada pelos Recorrentes, mas a sentença proferida pelo tribunal de 1.ª instância continha uma condenação em juros em todas as quantias líquidas e que as partes não colocaram em crise (pelo que essa decisão transitou em julgado).

Deste modo, não se pode deixar de discordar do Acórdão recorrido, de que a ora Executada/Embargante não foi condenada a pagar juros de mora sobre todas as quantias líquidas, inclusive sobre a quantia de €350 860,00 que foi liquidada no Acórdão do STJ, pelo que o recurso tem de proceder.

IV. Decisão

Posto o que precede, acorda-se em conceder a revista, e, consequentemente, em revogar o Acórdão recorrido, devendo a execução prosseguir os seus termos.

Custas pela Recorrida.

Lisboa, 27 de fevereiro de 2024


Pedro de Lima Gonçalves (Relator)

Jorge Leal

Manuel Aguiar Pereira