Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ00028131 | ||
| Relator: | MARTINS DA COSTA | ||
| Descritores: | EXECUÇÃO PENHOR MERCANTIL IMPOSTO CONTRIBUIÇÃO PARA A SEGURANÇA SOCIAL GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS | ||
| Nº do Documento: | SJ199509260873031 | ||
| Data do Acordão: | 09/26/1995 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Referência de Publicação: | BMJ N449 ANO1995 PAG339 | ||
| Tribunal Recurso: | T REL PORTO | ||
| Processo no Tribunal Recurso: | 286/93 | ||
| Data: | 09/15/1994 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA. | ||
| Decisão: | CONCEDIDA A REVISTA. | ||
| Área Temática: | DIR PROC CIV - PROC EXEC. | ||
| Legislação Nacional: | CCIV66 ARTIGO 666 N1 ARTIGO 733 ARTIGO 736 ARTIGO 745 ARTIGO 749 ARTIGO 822. DL 103/80 DE 1980/05/09 ARTIGO 10 N1 N2. DL 437/78 DE 1978/12/28 ARTIGO 7. | ||
| Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO RC DE 1990/03/27 IN CJ ANOXV T2 PAG96. ACÓRDÃO STJ DE 1990/11/28 IN BMJ N401 PAG583. ACÓRDÃO STAP DE 1984/04/11 IN BMJ N336 PAG412. ACÓRDÃO STJ DE 1989/11/29 IN BMJ N391 PAG618. | ||
| Sumário : | I - No caso de concurso de créditos do Estado por impostos, de créditos por contribuições devidas à Segurança Social e de créditos pignoratícios, a sua graduação deve ser feita por essa ordem (artigos 749 n. 1 alínea a) e 666 do C.CIV e 10 do Decreto-Lei 103/80, de 9 de Maio. II - O n. 2 do citado artigo 10 não deve ser objecto de interpretação restritiva, no sentido de se aplicar apenas ao concurso entre aqueles dois últimos créditos. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça: I - Declarada a falência de A, foram reclamados diversos créditos. Por sentença de 9 de Dezembro de 1992, procedeu-se ao reconhecimento e verificação dos créditos e à sua graduação, tendo esta, no que respeita aos bens móveis, sido feita do seguinte modo: 1 - os créditos do Estado; 2 - os créditos do Centro Regional de Segurança Social (C.R.S.S.); 3 - os créditos pignoratícios (da Caixa Geral de Depósitos); 4 - os créditos comuns, em rateio. Em recurso de apelação interposto pela C.G.D., limitado a essa parte da sentença, o acórdão da Relação, de folhas 318 e seguintes, alterou aquela graduação e fixou-a assim: 1 - os créditos pignoratícios da Caixa; 2 - os créditos do Estado; 3 - os créditos de C.R.S.S.; 4 - os créditos comuns, em rateio. Nos presentes recursos de revista interpostos pelo Estado e pelo C.R.S.S., estes pretendem a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição pela sentença da 1. instância com base, em resumo, nas seguintes conclusões: - as regras dos artigos 10 do Decreto-Lei 103/80 e 747 n. 1 alínea a) do Código Civil prevalecem sobre as do artigo 749 do mesmo Código; - nada justifica a interpretação restritiva do n. 2 daquele artigo 10; - foi violado o disposto nos artigos citados bem como nos artigos 7, 9 e 666 do C.CIV. A recorrida C.G.D., por sua vez, sustenta a improcedência do recurso, com o fundamento de o citado artigo 10 n. 2 dever ser interpretado no sentido de dispor apenas para o caso de concurso entre o crédito do C.R.S.S. e o crédito garantido por penhor, em aplicação do "postulado da coerência intrínseca do ordenamento" e do "pensamento unitário" das normas jurídicas. II - Situação de facto: No acórdão da Relação, não se fez a descrição da matéria de facto, decerto por se considerar que sobre ela não havia divergências susceptíveis de influenciarem o sentido da decisão. De qualquer modo, e com base na sentença da 1. instância, importa salientar os seguintes pontos: - a falência de A foi declarada por sentença de 22 de Fevereiro de 1991, já transitada em julgado; - foram constituídos pelo falido, a favor da C.G.D., penhores mercantis em 21 de Março de 1985, 24 de Maio de 1985 e 29 de Julho de 1986, sobre os bens móveis das verbas ns. 1 a 8, 9 a 11 e 12 a 37, respectivamente; - os créditos do Estado respeitam a diversos impostos; - e os créditos do C.R.S.S. correspondem a contribuições devidas à segurança social. III - Quanto ao mérito dos recursos: Os dois recursos devem ser apreciados em conjunto, por serem idênticas as questões neles suscitadas e as posições assumidas pelos recorrentes. Não é aqui aplicável o novo regime da falência, aprovado pelo Decreto-Lei 132/93, de 23 de Abril, dado tratar-se de acção pendente na data da entrada em vigor desse diploma (seu artigo 8 n. 3). Os créditos da Caixa estão garantidos por penhor, o que lhes confere o direito à sua satisfação "com preferência sobre os demais credores", pelo valor das coisas empenhadas (artigo 666 n. 1 do C.CIV.). Os créditos do Estado gozam de privilégio mobiliário geral, que lhes atribui a faculdade "de serem pagos com preferência a outros" e com prioridade sobre os demais da mesma natureza, salvo os privilégios por despesas de justiça (artigos 733, 736 e 745 e seguintes do citado Código). No concurso entre esses dois tipos de créditos, e no domínio do C.CIV., tem preferência o crédito pignoratício, por gozar de direito real de garantia oponível ao exequente (artigos 749 e 822 do mesmo Código). Entretanto, foi concedido aos créditos por contribuições devidas à segurança social "privilégio mobiliário geral, graduando-se logo após os créditos referidos na alínea a) do n. 1 do artigo 747 do C.CIV.", ou seja, entre outros, aqueles créditos do Estado, e que "prevalece sobre qualquer penhor, ainda que de constituição anterior" (artigo 10 ns. 1 e 2 do Decreto-Lei 103/80, de 9 de Maio, que reproduziu o disposto no artigo 1 ns. 1 e 2 do Decreto-Lei 512/76, de 3 de Julho). Com essas novas disposições, surgiu o problema de graduação na hipótese de concurso dos três aludidos créditos, o qual tem sido resolvido, em diversas decisões, em sentido idêntico ao do acórdão recorrido, por interpretação restritiva do n. 2 do citado artigo 10, que se limitaria ao concurso entre os créditos pignoratícios e os da segurança social, com o fundamento da unidade intrínseca do ordenamento jurídico, que impõe a prevalência do regime geral definido no citado artigo 749 sobre o regime especial daqueles diplomas, e pelos resultados inaceitáveis e incertezas a que conduziria outra interpretação (assim, entre outros, o acórdão da Relação de Coimbra de 27 de Março de 1990, na Col. XV, 2., p. 96, e o acórdão deste tribunal de 28 de Novembro de 1990, no Bol. 401, p. 585). A questão reveste alguma complexidade, susceptível de dúvidas, dada a contradição, pelo menos aparente, entre as normas legais em causa, e a circunstância de a graduação relativa dos créditos pignoratícios e do Estado ficar dependente apenas da intromissão de um terceiro crédito, o da segurança social, mas entende-se que a solução mais rigorosa é outra, ou seja, a adoptada na sentença da 1. instância. Desde logo, o resultado negativo que advém para o crédito pignoratício, por aplicação directa do citado artigo 10 (a sua graduação em último lugar e depois do crédito do Estado), verificar-se-ia, naquela primeira solução, para o crédito do C.R.S.S. (seria graduado depois daquele, apesar de sobre ele ter preferência no concurso entre ambos). A decisão deve pois abstrair desse resultado, na medida em que não pode ter em conta o efeito benéfico ou prejudicial para um ou outro dos credores, devendo basear-se apenas na interpretação da lei. A letra do citado artigo 10 abrange, directamente, a hipótese de concorrência dos três créditos em causa: depois de determinar que os créditos da segurança social se graduam "logo após" os do Estado (n. 1), manda graduá-los também "sobre" ou antes dos créditos pignoratícios (n. 2); e não pode dizer-se que o legislador não terá previsto essa hipótese, uma vez que ela está subjacente àquela norma, se não mesmo aí claramente expressa. Concorre no mesmo sentido o espírito da lei, que foi o de "acautelar mais eficazmente os interesses da população beneficiária" do regime da segurança social (relatório do citado Decreto-Lei 512/76). Acresce tratar-se de um regime especial, que deve prevalecer sobre o regime geral do C.CIV. e que aliás, foi adoptado também quanto aos créditos por apoios financeiros concedidos pelo Gabinete de Gestão do Fundo de Desemprego (artigo 7 do Decreto-Lei 437/78, de 28 de Dezembro). Nada justificaria assim a interpretação restritiva do citado artigo 10, no sentido da sua aplicação apenas ao caso de concorrência entre os créditos pignoratícios e os da segurança social: a "unidade do sistema jurídico" não pode ser apreciada apenas em função do regime geral do C.CIV.; aquela interpretação está afastada pela vontade manifestada pelo legislador e, além de conduzir a um esvaziamento parcial do conteúdo da norma em causa, não teria "na letra da lei um mínimo de correspondência verbal" (artigo 9 do C.CIV.). É esta ainda a solução que se afigura ter alguma predominância (cfr. sentença de 4 de Março de 1985, na Col., X, 1., p. 355, acórdão do S.T.A., tribunal pleno, de 11 de Abril de 1984, no Bol. 336, p. 412, e acórdão deste tribunal de 29 de Novembro de 1989, no Bol. 391, p. 618). Em conclusão: No caso de concurso de créditos do Estado por impostos, de créditos por contribuições devidas à Segurança Social e de créditos pignoratícios, a sua graduação deve ser feita por essa ordem (artigos 747 n. 1 alínea a) e 666 do C.CIV. e 10 do Decreto-Lei 103/80, de 9 de Maio). O n. 2 do citado artigo 10 não deve ser objecto de interpretação restritiva, no sentido de se aplicar apenas ao concurso entre aqueles dois últimos créditos. Pelo exposto: Concede-se a revista. Revoga-se o acórdão recorrido, subsistindo a sentença da 1. instância. Custas dos recursos pela C.G.D. Lisboa, 26 de Setembro de 1995. Martins da Costa. Pais de Sousa. Santos Monteiro. |