Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | SALVADOR DA COSTA | ||
| Descritores: | MARCAS INSÍGNIA DE ESTABELECIMENTO CONFUSÃO ALEGAÇÕES DE RECURSO JUNÇÃO DE DOCUMENTO | ||
| Nº do Documento: | SJ2008032707297 | ||
| Data do Acordão: | 03/27/2008 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | NEGADA | ||
| Sumário : | 1. Sendo determinados documentos necessários para a prova de factos articulados pelas partes como fundamento dos respectivos pedidos, já não pode ser admitida a sua junção com as alegações do recurso de apelação sob o argumento de a mesma se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância. 2. A susceptibilidade de erro ou confusão em relação a marcas e a insígnias de estabelecimentos deve ser aferida em face do consumidor, em termos de este só as poder distinguir depois do seu exame atento ou de confronto. 3. Embora se reportem a sandes ou sanduíches ou a estabelecimentos onde são comercializadas, não se configura a susceptibilidade de erro ou confusão dos consumidores entre as marcas com a expressão PC acompanhadas do elemento figurativo representativo de parte de uma baguete e a insígnia de estabelecimento com a expressão CS acompanhada do elemento figurativo representativo de uma baguete completa | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I GA SA intentaram, no dia 14 de Junho de 2002, acção declarativa constitutiva, com processo ordinário, contra a CS, Ldª, pedindo a anulação do registo da insígnia nº 11170 propriedade da ré. Fundamentaram a sua pretensão, por um lado, em ser a primeira titular do registo das marcas internacionais nºs 596 186 e 606 675 e das marcas nacionais nºs 303.489 e 303.490, todas caracterizadas pela expressão “PC” e por um desenho que constitui uma criação protegida por direitos de autor que a segunda autorizou a primeira a registar. E, por outro, ter a ré registado uma insígnia que tem um aspecto figurativo muito semelhante às suas marcas e desenhos, com a consequência de os consumidores a tomarem pelas marcas e desenhos das autoras, criando-se situações de erro ou confusão fácil. A ré, em contestação, arguiu as excepções do erro na forma do processo e da caducidade, afirmou desconhecer os factos respeitantes à existência de uma criação artística e negou haver entre os sinais a semelhança que as autoras referem. As autoras replicaram no sentido da improcedência das excepções invocadas pela ré. No despacho saneador, foram julgadas improcedentes as excepções invocadas pela ré, esta interpôs recurso de apelação daquele despacho na parte que julgou a excepção de caducidade improcedente, o processo prosseguiu com especificação e base instrutória, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 9 de Junho de 2006, por via da qual a ré foi absolvida do pedido. Apelaram as autoras, que apresentaram com as alegações um documento consistente em alegada avaliação de imagem e posicionamento da marca PC, e a Relação, por acórdão proferido no dia 18 de Outubro de 2007, recusou a sua junção, negou-lhes provimento ao recurso e não conheceu do recurso de apelação interposto pela ré sob o argumento da sua desnecessidade. Interpuseram as apelantes recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - ao ordenar o desentranhamento do documento junto com as alegações de apelação, a Relação violou, por incorrecta aplicação o artigo 706º, nº 1, parte final, do Código de Processo Civil, porque a sua razão de ser é permitir que ao julgar a causa o tribunal actue segundo critérios de justiça material, aproximando a decisão emergente da lei à realidade material; - ao decidir que o elemento figurativo que compõe as marcas das recorrentes não está protegida pelo regime dos direitos de autor, a Relação violou, por desaplicação, os artigos 1º, nº 1, 2º, nº 1, alínea g), do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos que protegem as obras de desenho, categoria em que o mesmo se inclui, bem como os artigos 9º, 12º, 14º e 64º do mesmo diploma, que protegem tais obras, ainda que estrangeiras, independentemente do registo; - a Relação violou os artigos 27º, nº 2, do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos, 350º, nº 2 e 344º, nº 1, ambos dos Código Civil, na medida em que as recorrentes, tendo feito prova da comunicação pública da obra em causa por parte do seu autor, beneficiam de presunção juris tantum de titularidade não ilidida pela recorrida; - dada da data do registo das marcas e da insígnia, aquelas são prioritárias em relação a esta; - os produtos e serviços assinalados pelas referidas marcas são os mesmos que são vendidos e efectuados no estabelecimento a que se refere a mencionada insígnia; - os sinais são gráfica, figurativa e conceptualmente semelhantes entre si, gerando no público situações de erro ou confusão fácil, bem como associação indevida; - usa-se a técnica de identificar um produto pans/sandes, e, acima da palavra o mesmo desenho, concebido da mesma forma estilizada, e a mesma expressão por extenso e abreviada companhia / C.ª.; - o elemento figurativo apresentado com a configuração própria de uma baguette em contorno manual com traços grossos e finos, com os respectivos sulcos apresentados de forma muito pronunciada tem configuração repetida na mencionada insígnia; - sem prejuízo de repetir o conceito subjacente às marcas das recorrentes, a concreta configuração do desenho que constitui a parte característica das mesmas foi também repetido; - ao recusar a anulação da insígnia, a Relação violou, por desaplicação, os artigos 167º, nº 1, 193º e 231º, nº 1, alínea f), do Código da Propriedade Industrial de 1995; - ao recusar a anulação da insígnia com fundamento no direito de autor das recorrentes, a Relação violou os artigos 1º, nº 1, 2º, nº 1, alínea g), 9º, 12º, 14º, 27º, nº 2 e 64º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos; - deve ser anulado o registo da insígnia nº 11 170. Respondeu a recorrida, em síntese de conclusão de alegação: - está definitivamente assente em sede de matéria de facto não terem as recorrentes demonstrado serem titulares dos direitos de autor que invocaram; - face ao disposto no artigo 722º, nº 2, do Código de Processo Civil, a resposta aos quesitos 1º a 9º da base instrutória não pode ser alterada no recurso de revista; - indemonstrados os direitos de autor das recorrentes, estão prejudicados os outros fundamentos do recurso de revista; - a existência de semelhança e eventual confusão entre as marcas e a insígnia constitui matéria de facto e, por isso, subtraída à censura em sede de revista; - inexiste semelhança entre os elementos figurativos invocados pelas recorrentes e a insígnia da recorrida, não sendo o elemento figurativo de uma baguette monopólio de ninguém; - a baguette estilizada da marca das recorrentes não contende com a insígnia da recorrida representativa de forma desenhada semelhante à real da aludida espécie de pão; - a expressão "P" é castelhana que sugere o pão sem qualquer acompanhamento, associando-se mais facilmente a um estabelecimento de padaria do que a um estabelecimento de cafetaria, pastelaria ou venda de sandes; - a expressão sandes é tipicamente portuguesa, constituindo uma corruptela do termo sanduíches, por seu turno derivado do termos inglês sandwinches e que não é utilizado em qualquer outra língua; - a expressão Cª , abreviatura da palavra Companhia, é usada para referir empresas, associações ou sociedades, com raízes antigas, por exemplo, a Cª das Índias; - procedendo o recurso, deve o processo baixar à Relação para conhecer do recurso de apelação que interpôs do despacho saneador. II É a seguinte a factualidade considerada assente no tribunal recorrido: 1. Gesfor Aktiengesellschaft é titular do registo das seguintes marcas internacionais: 596 186 “PC”, pedido em 4 de Fevereiro de 1993 e concedido em Portugal por despacho de 16 de Fevereiro de 1994 para assinalar serviços da classe 35ª: "Services d'aide à l'organisation et la conduite des affaires, en particulier services relatifs aux affaires de franchise; services d'étude de marché et d'information statistique; services de relations publiques et d'engagement de personnel" e por despacho de 24 de Maio de 1996 para assinalar serviços da classe 42ª: "Services de restauration"; 606.675 “PC”, pedido em 6 de Setembro de 1993 e concedido em Portugal por despacho de 27 de Setembro de 1994, destinada a assinalar produtos e serviços das classes 30ª: "café, the, cacao, sucre, riz, tapioca, sagou, succedanes du café; farines et preparations faites de cereales, pain, patisserie et confiserie, glaces comestibles; miel, sirop de melasse; levure, poudre pour faire lever; sel, moutatarde; vinaigre, sauces (a l'exception des sauces à salade); epices; glace à refraichir", 35ª: " Services d'aide à l'organisation et la conduite des affaires, en particulier concernant de marché et d'information statistique; services de relations publiques et d'engagement de personnel" e 42ª: "Services de restauration ». 2. A primeira referida marca é composta pela expressão "PC", impressa em letra de imprensa maiúscula, surgindo a palavra ""P"" impressa em tamanho maior por cima da expressão "& "C"" e pelo desenho representativo da parte de cima de uma baguete, aposto sobre a palavra ""P"", tudo dentro de um quadro cuja linha inferior é composta por três filas de quadrados pretos e brancos, alternados. 3. A segunda referida marca é composta pela expressão "PC", impressa em letra de imprensa maiúscula de cor preta, surgindo a palavra ""P"" impressa em tamanho maior por cima da expressão "& "C"" e pelo desenho representativo da parte de cima de uma baguete de cor vermelha, aposto sobre a palavra "P", tudo dentro de um quadro amarelo cuja linha inferior é composta por três filas de quadrados pretos e brancos, alternados. 4. Gesfor Aktiengesellschaft é titular do registo das seguintes marcas nacionais: 303.489 “PC”, pedido em 21 de Setembro de 1994 e concedido por despacho de 8 de Setembro de 1995, destinada a assinalar serviços da classe 35ª - "Serviços de ajuda na organização e exploração de negócios, especialmente em negócios em regime de franchising"; e 303 490 “PC”, pedido em 21 de Setembro de 1994 e concedido por despacho de 8 de Setembro de 1995, destinada a assinalar serviços da classe 42ª - "Serviços de restaurante, pizzaria, cafetaria e bar. 5. As marcas referidas sob 4 são compostas pela expressão "PC", impressa em letra de imprensa maiúscula de cor preta, surgindo a palavra ""P"" impressa em tamanho maior por cima da expressão "& "C"" e pelo desenho representativo da parte de cima de uma baguete de cor vermelha, aposto sobre a palavra ""P"", tudo dentro de um quadro amarelo cuja linha inferior é composta por três filas de quadrados pretos e brancos, alternados. 6. No dia 15 de Setembro de 1994, a ré requereu o registo da insígnia nº 11 170 "CS" para assinalar um estabelecimento relacionado com "sandes, produtos de hotelaria e similares", composta pelo desenho de uma baguete por baixo da qual está impressa em letra maiúscula de imprensa a expressão "CS", requerimento que foi deferido por despacho de 14 de Outubro de 1996. 7. As autoras usam as marcas referidas sob 1 e 4 em vários estabelecimentos comerciais existentes em Portugal nos quais são comercializadas sobretudo sanduíches. 8. A ré usa a insígnia referida sob 6 num estabelecimento de restauração sito no Centro Comercial Monumental, em Lisboa, no qual também se comercializam sanduíches. 9. O desenhador gráfico WR declarou: ter sido por si concebido o elemento figurativo das marcas descritas sob 1 e 4 e que a concepção do elemento figurativo referido em 1 ocorreu em Novembro de 1991; trabalhar na altura para a sociedade Adisson España, AS, e que a autora Agrolimen, SA lhe solicitou a concepção do referido elemento figurativo; ter cedido a Agrolimen SA, por venda, os direitos de exploração do referido desenho em todo o mundo, e a sua utilização total e parcial para todo o tipo de suportes ou meios de comunicação, e que ela podia registar o aludido desenho como marca; e poder Agrolimen SA ceder todos os direitos respeitantes ao desenho a outras pessoas. III A questão essencial decidenda é a de saber se deve ou não ser anulado o registo da insígnia de que a recorrida é titular inscrita. Tendo em conta o conteúdo do acórdão recorrido e das conclusões de alegação formuladas pela recorrente e pela recorrida, a resposta à referida questão pressupõe a análise da seguinte problemática: - devia ou não a Relação manter no processo o documento junto pela recorrente com as alegações do recurso de apelação? - objecto das marcas e da insígnia em confronto; - o elemento figurativo componente das marcas da recorrente está ou não protegido pelo regime dos direitos de autor? - estrutura jurídica das marcas e das insígnias; - ocorrem ou não factos integrantes de causa de anulação do registo da insígnia registada na titularidade da recorrida? Vejamos, de per se, cada uma das referida sub-questões. 1. Comecemos pela análise da subquestão de saber se Relação devia ou não manter no processo o documento junto pelas recorrentes com as alegações do recurso de apelação. As recorrentes juntaram com as alegações do recurso de apelação um documento relativo a um estudo sobre a confundibilidade dos sinais distintivos da actividade empresarial. A Relação não admitiu a junção do mencionado documento sob o fundamento da sua extemporaneidade, e as recorrentes entendem que tal junção se justificava em virtude da decisão proferida no tribunal da primeira instância. Elas consideram que a razão de ser do nº 1 do artigo 706º do Código de Processo Civil é a de facultar ao tribunal dos meios para que a decisão seja a correcta expressão da lei em face da realidade material existente, ou seja, a realização da justiça material. Os recorrentes que tenham direito a juntar documentos com o instrumento de alegação no recurso de apelação podem fazê-lo até ao início dos vistos aos juízes adjuntos (artigo 706º, nº 2, do Código de Processo Civil). Eles podem juntar documentos às alegações, nos casos excepcionais a que se refere o artigo 524º do Código de Processo Civil ou no caso de a junção apenas se tornar necessária em virtude do julgamento no tribunal da primeira instância (artigo 706º, nº 1, do Código de Processo Civil). O artigo 524º do Código de Processo Civil reporta-se aos documentos cuja apresentação não tenha sido possível até ao encerramento da discussão no tribunal da primeira instância e aos destinados a provar factos posteriores aos articulados ou que se tenham tornado necessários por virtude de ocorrência posterior. O caso vertente não envolve a impossibilidade ou a necessidade a que o referido artigo se reporta, pelo que apenas importa confrontar a junção do documento em causa com a situação prevista na segunda parte do nº 1 do artigo 706º do Código de Processo Civil – junção de documento apenas tornada necessária em virtude do julgamento proferido no tribunal da primeira instância. O conteúdo do mencionado documento não revela a sua necessidade para a prova de algum facto que tenha sido objecto da base instrutória, e a expressão apenas constante do aludido normativo envolve um elemento restritivo não condizente com o entendimento de que basta o julgamento negativo de algum ponto da matéria de facto para justificar a junção de documentos com as alegações do recurso de apelação. Se os documentos já eram necessários para a prova de algum facto articulado pelas partes a título de fundamento das suas pretensões, naturalmente na audiência de discussão e julgamento, não pode funcionar o disposto no artigo 706º, nº 1, do Código de Processo Civil. Assim, a necessidade de documentos de prova de factos em virtude do julgamento proferido no tribunal da primeira instância só é susceptível de ocorrer por virtude de específicas diligências probatórias oficiosas. Ora, no caso vertente, pelo exposto, não ocorre o circunstancialismo especial justificativo da faculdade de junção pelas recorrentes, com as alegações do recurso de apelação, do mencionado documento. A conclusão é, por isso, no sentido de que a Relação, ao não admitir a continuação no processo do documento apresentado pelas recorrente, se limitou a cumprir o disposto nos artigos 523º e 706º, nº 1, do Código de Processo Civil. 2. Prossigamos com a análise do objecto e da configuração das marcas e da insígnia em confronto. Os factos provados revelam que a recorrente Gesfor Aktiengesellschaft é titular do registo de duas marcas internacionais caracterizadas pela expressão "PC", com os nºs 596 186 e 606 675, e de duas marcas nacionais, com os nºs. 303 489 e 303 490, caracterizadas pela expressão “PC” As primeiras foram pedidas em 4 de Fevereiro e 6 de Setembro de 1993 e declaradas protegidas em Portugal por despachos de 16 de Fevereiro e de 27 de Setembro de 1994; as últimas, por seu turno, foram pedidas no dia 21 de Setembro de 1994 e declaradas protegidas em Portugal por despacho proferido no dia 8 de Setembro de 1995. A recorrida é, por seu turno, titular da insígnia que se caracteriza pela expressão "CS", pedida no dia 15 de Setembro de 1994 e declarada protegida em Portugal por despacho proferido no dia 8 de Setembro de 1996. Temos, assim, que esta insígnia foi pedida posteriormente ao pedido das referidas marcas internacionais e anteriormente ao pedido das aludidas marcas nacionais. A marca “PC” assinala serviços da classe 35ª, ou seja, "Services d'aide à l'organisation et la conduite des affaires, en particulier services relatifs aux affaires de franchise; services d'étude de marché et d'information statistique; services de relations publiques et d'engagement de personnel", da classe 42ª:, isto, é, "Services de restauration". A marca “PC”, concedida por despacho de 27 de Setembro de 1994, assinala produtos e serviços da classe 30ª, isto é, "café, the, cacao, sucre, riz, tapioca, sagou, succedanes du café; farines et preparations faites de cereales, pain, patisserie et confiserie, glaces comestibles; miel, sirop de melasse; levure, poudre pour faire lever; sel, moutatarde; vinaigre, sauces (a l'exception des sauces à salade); epices; glace à refraichir", da classe 35ª, ou seja, « Services d'aide à l'organisation et la conduite des affaires, en particulier concernant de marché et d'information statistique; services de relations publiques et d'engagement de personnel", e, da classe, 42ª, relativa a "Services de restauration. A marca nº 596 186 é composta pela expressão "PC", impressa em letra de imprensa maiúscula, sendo que a primeira das referidas palavras está impressa em tamanho maior por cima da expressão & "C" e pelo desenho representativo da parte superior de uma baguete, aposto sobre a palavra ""P"", tudo dentro de um quadro cuja linha inferior é composta por três filas de quadrados pretos e brancos, alternados. A marca nº 606 675 é, por seu turno, composta pela expressão "PC", impressa em letra de imprensa maiúscula de cor preta, surgindo a palavra ""P"" impressa em tamanho maior por cima da expressão "& "C"" e pelo desenho representativo da parte de cima de uma baguete de cor vermelha, aposto sobre a palavra ""P"", tudo dentro de um quadro amarelo cuja linha inferior é composta por três filas de quadrados pretos e brancos, alternados. A insígnia da requerida, por sua vez, é composta pelo desenho de uma baguete por baixo da qual está impressa em letra maiúscula de imprensa a expressão CS 3. Atentemos agora sobre se o elemento figurativo componente das marcas da recorrente está ou não protegido pelo regime dos direitos de autor. Deve ser recusado o registo de insígnias quando sejam integradas por sinais que constituam infracção de direitos de autor ou de propriedade industrial (artigos 239º, alínea g), e 285º, nº 1, alínea f), do Código da Propriedade Industrial). Expressa o Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos, por um lado, serem obras as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas (artigo 1º). E, por outro, que as referidas criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, quaisquer que seja o género, a forma de expressão, o mérito, o modo de comunicação e o objectivo, compreendem nomeadamente livros, folhetos, revistas, jornais e outros escritos (artigo 2º, alínea a)). As recorrentes entendem que o elemento figurativo que compõe as suas marcas está protegido por direitos de autor, não obstante o tribunal da primeira instância e a Relação haverem considerado não provada a titularidade de tal direito. Com efeito, o tribunal da primeira instância e a Relação, analisando os documentos juntos pelas recorrentes para provarem a titularidade dos mencionados direitos de autor, consideraram só ter ficado provado que determinada pessoa declarou perante um notário espanhol ter criado o referido elemento figurativo a solicitação da recorrente Agrolimen, SA e que lhe cedeu todos os direitos sobre o mesmo, mas não a própria criação e titularidade. Assim, a Relação fixou a matéria de facto em termos de não abranger a titularidade pela recorrente Agrolimen, SA do direito de propriedade sobre o aludido elemento figurativo. A regra é a de que cabe às instâncias apurar a factualidade relevante para a decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito. Este Tribunal, em regra, não tem competência funcional para alterar, designadamente ampliar a matéria de facto, certo que, em regra, só conhece de matéria de direito (artigos 26º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais e 729º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). A referida excepção apenas ocorre se a Relação, na fixação dos factos disponíveis, infringir alguma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência de algum facto ou fixe a força probatória de determinado meio de prova (artigos 722º, nº 2 e 729º, nº 2, do Código de Processo Civil). A autenticidade dos documentos em causa não implica que se deva considerar provado para além do que WR declarou perante o notário espanhol. Não se trata de declarações de cariz confessório, ou seja, não podem ter relevo de prova plena, pelo que o referido documento não têm a virtualidade de provar a sua veracidade. Estamos, assim, apesar de se tratar de declarações inseridas num documento autêntico, perante matéria de prova de livre apreciação, da competência exclusiva das instâncias. Assim, não pode este Tribunal sindicar o juízo da Relação ao fixar o quadro de facto relevante para a causa em termos de não concluir pela titularidade por parte da recorrente Agrolimen, SA do direito de propriedade sobre o questionado elemento figurativo. Em consequência, inexiste fundamento legal para a conclusão no sentido de que o elemento figurativo componente das marcas da recorrente está o protegido pelo regime dos direitos de autor. Por conseguinte, ao invés do que as recorrentes alegaram, não revelam os factos provados ter a Relação infringido o disposto nos artigos 1º, nº 1, 2º, nº 1, alínea g), 9º, 12º, 14º e 64º do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos. 4. Vejamos agora, em breve síntese, a estrutura jurídica das marcas e das insígnias. Considerando o tempo em que foram declarados protegidos os títulos de propriedade industrial em causa – marcas e insígnia – é aplicável no caso o disposto no Código da Propriedade Industrial de 1995 (artigo 12º, nº 1, do Código Civil). A marca, a insígnia e o nome do estabelecimento são sinais distintivos do comércio e integram os títulos de propriedade industrial. A marca individualiza os produtos ou serviços objecto da actividade do empresário, enquanto a insígnia e o nome do estabelecimento revelam-no e individualizam-no. A insígnia de estabelecimento é qualquer sinal externo composto de letras ou desenhos, simples ou combinados com os nomes, contando que o conjunto apresente uma forma ou configuração específica, como elemento distinto e característico (artigo 230º, n.º 1, do Código da Propriedade Industrial). Quem tiver legítimo interesse, designadamente, industriais, comerciantes e demais empresários, domiciliados ou estabelecidos no território português, têm o direito de adoptar um nome e uma insígnia para designar ou tornar conhecidos os seus estabelecimentos (artigo 228º do Código da Propriedade Industrial). Não podem, porém, integrar o nome ou insígnia de estabelecimento, além do mais, os elementos constitutivos da marca protegidos de outrem para os produtos que fabricam ou vendem no estabelecimento a que se pretende dar o nome ou a insígnia e os nomes, designações, figuras ou desenhos que sejam reprodução ou imitação de nome ou insígnia já registados por outrem no território nacional (artigo 231º, n.º 1, alíneas f) e g), do Código da Propriedade Industrial). A susceptibilidade de erro ou confusão deve ser aferida em face do consumidor, em termos de este só poder distinguir os sinais depois de exame atento ou de confronto (artigos 193º e 268º, n.º 2, do Código da Propriedade Industrial). A propriedade e o exclusivo do nome e insígnia de estabelecimento são, em regra, garantidos pelo seu registo nacional (artigo 232º do Código da Propriedade Industrial). Aquele que adopta uma marca para distinguir os produtos ou serviços de uma actividade económica ou profissional goza da propriedade e do exclusivo dela, desde que satisfaça as prescrições legais, designadamente a relativa ao registo (artigo 167º, n.º 1, do Código da Propriedade Industrial). O registo da marca confere ao seu titular o direito de impedir a terceiros, sem o seu consentimento, o uso na sua actividade económica de qualquer sinal idêntico ou confundível com essa marca para produtos ou serviços idênticos ou afins àqueles para os quais foi registada, ou que, em consequência da identidade ou semelhança entre os sinais ou da afinidade dos produtos ou serviços, crie no espírito do consumidor o risco de confusão que compreenda o de associação entre o sinal e a marca (artigo 207º do Código da Propriedade Industrial). A susceptibilidade de erro ou confusão em relação a marcas deve ser aferida em face do consumidor, em termos de este só poder distinguir os sinais depois de exame atento ou de confronto, sendo este o regime aplicável à definição da imitação do nome e da insígnia do estabelecimento. Os títulos de propriedade industrial são total ou parcialmente anuláveis quando o titular não tiver direito a eles nomeadamente quando tiverem sido concedidos com preterição dos direitos de terceiros fundados em prioridade ou outro título legal (artigo 33º, n.º 1, alínea b), do Código da Propriedade Industrial). Do referido regime resulta que a imitação ou usurpação do nome ou da insígnia do estabelecimento registado depende, por um lado, da prioridade de um dos sinais e de este e o sinal em confronto visarem assinalar estabelecimentos idênticos ou afinidade manifesta. E, por outro, que a semelhança gráfica, figurativa ou fonética envolva a fácil indução do consumidor em erro ou confusão ou o risco de associação com o nome ou a insígnia anteriormente registados, em termos de aquele não conseguir distinguir entre os dois sinais senão por via de um exame atento ou de confronto. O consumidor a que a lei se refere, não é o perito nem o ignaro na matéria, mas o chamado consumidor médio ou padrão, ou seja, o que consegue captar a proveniência dos produtos por via de sinais distintivos. A lei não proíbe que determinada denominação social, marca, nome de estabelecimento ou insígnia insira algum elemento já constante de idêntico título de propriedade industrial alheio, desde que, pela sua natureza, estrutura ou composição, seja insusceptível de gerar o erro ou a confusão no referido consumidor médio ou padrão. O que ela proíbe é que uma pessoa adopte na sua actividade empresarial um sinal característico, tendente a individualizá-la, idêntico ou semelhante a outro relativo a actividade empresarial de outra pessoa, susceptível de induzir em erro ou confusão o publico consumidor, em termos de atribuir os produtos existentes no mercado a entidade diversa daquela de que provêm, tendo presente que mais releva a eventual semelhança do que a mera dissemelhança dos pormenores envolventes. 5. Atentemos agora na questão de saber se ocorrem ou não factos integrantes de causa de anulação do registo da insígnia registada na titularidade da recorrida. Está em causa o confronto entre as marcas internacionais da titularidade da recorrente Aktiengesellschaft e a insígnia da titularidade da recorrida. As referidas marcas destinam-se a assinalar, entre outros, serviços de restauração e a sua titular usa-as em vários estabelecimentos comerciais existentes em Portugal nos quais são comercializadas sobretudo sanduíches. Por seu turno, a recorrida assinala com a referida insígnia um estabelecimento de restauração inserido no Centro Comercial Monumental de Lisboa, no qual se comercializam sanduíches. Assim, os produtos que a recorrida comercializa no estabelecimento assinalado pela mencionada insígnia estão contidos nos serviços que as aludidas marcas internacionais visam assinalar. Adquirido tal facto, importa verificar se a insígnia de que a recorrida é titular integra ou não os elementos constitutivos das marcas acima referidas da titularidade da recorrente Gesfor Aktiengesellschaft, o mesmo é dizer se ocorre ou não uma situação de imitação. Os requisitos da imitação são, essencialmente, ter a marca prioridade registal em relação à insígnia, serem ambas destinadas, em última análise, a assinalar os mesmos produtos ou manifestamente afins e terem tal semelhança gráfica, figurativa ou fonética, que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda, a segunda, um risco de associação com a primeira, de forma a que o consumidor não possa distinguir as duas senão depois de exame atento ou confronto (artigo 245º do Código da Propriedade Industrial). O juízo conclusivo sobre a imitação ou não deve decorrer mais da semelhança dos elementos constitutivos das marcas e da insígnia do que dos que são dissemelhantes, tendo em conta o comportamento do consumidor médio do produto, ou seja, o estrato da população em que ele se insere. Com efeito a cultura do estrato social a que o produto se destina é susceptível de influir na maior ou menor predisposição para a confusão sobre marcas ou insígnias em função dos elementos que as compõem Estamos, no caso vertente, perante sinais mistos, certo que inserem elementos verbais escritos e figurativos, isto é, fonéticos e gráficos, o que implica que, na envolvente operação de análise se atenda ao conjunto, sem prejuízo da consideração de qual é o preponderante, ou seja, se é o nominativo ou o figurativo. Comecemos pelos elementos nominativos. Temos, no confronto, por um lado "PC" e, por outro, "CS", os quais evocam a ideia de sanduíches, ou seja, há entre eles afinidade ideográfica. A expressão “"P"” é uma palavra castelhana que sugere o pão sem qualquer acompanhamento, associando-se mais facilmente a um estabelecimento de padaria do que a um estabelecimento de cafetaria, pastelaria ou venda de sandes. Por seu turno, a expressão sandes é tipicamente portuguesa, constituindo, uma corruptela do termo sanduíches, por seu turno derivado do termo inglês sandwiches. A expressão “C. ª” consiste na abreviatura da palavra “"C"”, que na linguagem corrente é usada para referir empresas ou sociedades, que, por ser genérico, não assume eficácia distintiva. Do ponto de vista fonético e gráfico não há similitude entre os mencionados sinais, certo que se escrevem de maneira distinta e assumem diversidade fonética. Atentemos agora nos elementos figurativos. O significado da expressão baguete, escrita em francês com duas letras t, é o de pau delgado e comprido, mais ou menos flexível, de forma redonda (“Larousse de poche”, Librairie Laronsse, Paris, 1979). A referida expressão passou, pela atracção da similitude de forma, a representar uma espécie de pão francês, cujo desenho de parte dele a recorrente Gesfor Aktiengesellschaft e a recorrida inseriram nas aludidas marcas e insígnia, respectivamente. O referido desenho que faz parte das aludidas marcas corresponde à parte superior uma baguete, enquanto a insígnia da titularidade da recorrida reproduz o desenho de uma baguete completa. Assim, mesmo em relação ao elemento figurativo baguete, ocorre a distinção entre o que consta da insígnia da titularidade da recorrida e o que está inserido nas referidas marcas da titularidade da recorrente Gesfor Aktiengesellschaft. Dir-se-á que, quer se considerem os referidos sinais de modo isolado ou em conjunto, ocorre a sua distinção, mesmo sem considerar que as marcas em análise inserem outros elementos figurativos com relevo derivado das cores utilizadas e pela imagem que o xadrez transmite. Assim, ao invés do que as recorrentes alegaram não há, em termos de razoabilidade, possibilidade de confusão entre as referidas marcas e a insígnia da titularidade da recorrida. Com efeito, envolvem as aludidas marcas e a insígnia potencialidade individualizadora própria, que lhes advém do conjunto dos elementos que as envolvem, podendo coexistir no mercado sem fácil confusão entre si ou em relação aos produtos e estabelecimento que visam assinalar. Não ocorre, por isso, fundamento legal para que se conclua pela existência de semelhanças gráficas ou fonéticas entre as referidas expressões que impliquem um juízo de eventualidade de erro ou de confusão por parte dos consumidores no quadro do específico mercado em causa. Dir-se-á, em síntese, não se vislumbrar, em termos de razoabilidade, que o consumidor médio, no confronto, não atento e pormenorizado, entre as expressões lato sensu das marcas e da insígnia do estabelecimento em causa possa ser induzido em erro ou confusão sobre a proveniência dos produtos industrializados e comercializados por uma e outros. Em consequência, inexiste fundamento legal para operar a anulação do registo da insígnia da titularidade da recorrida, a que alude o artigo 285º, nº 1, alínea g), do Código da Propriedade Industrial). 6. Finalmente a síntese da solução para o caso, decorrente dos factos provados, da dinâmica processual envolvente e da lei. Não havia fundamento legal para a admissão da junção no recurso de apelação do documento que as recorrentes apresentaram com as alegações, por virtude da sua necessidade não resultar do julgamento proferido no tribunal da primeira instância. Dado o tempo em que as marcas e a insígnia obtiverem protecção em Portugal são essencialmente aplicáveis as pertinentes normas Código da Propriedade Industrial de 1995. Este Tribunal não pode sindicar o juízo de prova que as instâncias formularam sobre o documento notarial que inseriu as declarações de WR por se tratar de prova de livre apreciação. Os factos provados não permitem a conclusão de que o elemento figurativo componente das marcas da recorrente Gesfor Aktiengesellschaft esteja protegido ao abrigo do Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos. A insígnia da titularidade da recorrida não contém elementos de imitação das marcas da recorrente Gesfor Aktiengesellschaft, em termos de gerar o erro ou confusão do consumidor médio dos produtos em causa. Não ocorrem os factos integrantes de causa de anulação do registo da insígnia registada na titularidade da recorrida. Improcede, por isso, o recurso. Vencidas, são as recorrentes responsáveis pelo pagamento das custas respectivas (artigo 446º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). IV Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso e condenam-se as recorrentes no pagamento das custas respectivas. Lisboa, 27 de Março de 2008. Salvador da Costa (relator) Ferreira de Sousa Armindo Luis |