Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06S1732
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: PINTO HESPANHOL
Descritores: TRÂNSITO EM JULGADO
PRAZO PEREMPTÓRIO
CONTAGEM DOS PRAZOS
PRAZO DE PROPOSITURA DA ACÇÃO
REGIME APLICÁVEL
CRÉDITO LABORAL
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA
INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA
Nº do Documento: SJ20611150017324
Data do Acordão: 11/15/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : 1. O prazo máximo de condescendência para a prática de acto processual com o pagamento de multa, fixado no n.º 5 do artigo 145.º do Código de Processo Civil, não constitui um alargamento do prazo peremptório de que a parte legalmente dispõe para a prática do acto, antes configura um prazo suplementar, o aditamento de um novo prazo dentro do qual as partes têm ainda o direito de praticar o acto.
2. Nesta conformidade, aquele prazo suplementar só poderá contar para efeitos de determinação do trânsito em julgado da decisão se o direito de praticar o acto dentro desse prazo for efectivamente exercido ou, dito de outra forma, só o exercício do direito de praticar o acto dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo peremptório obsta à ocorrência do trânsito em julgado da decisão após o termo deste prazo.
3. A norma do n.º 4 do artigo 144.º do Código de Processo Civil não determina a submissão dos prazos para a propositura de acções previstos naquele Código às regras dos prazos processuais, mas tão só ao regime dos n.os 1 a 3 daquele artigo 144.º, sendo que nesse regime não se incluem as regras fixadas nos n.os 5 a 7 do artigo 145.º do mesmo Código.
4. A definição conceitual de «motivo processual não imputável ao titular do direito», explicitado no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil, deve alicerçar--se, essencialmente, na ideia de culpa.
5. Assim, para a absolvição da instância ser imputável ao titular do direito basta que este tenha agido com mera culpa, a qual deve ser apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.
6. Atendendo ao condicionalismo próprio da primeira acção intentada, é de imputar ao autor o vício da incompetência absoluta de que padecia a acção e, portanto, a absolvição do réu da instância, já que não empregou a diligência normal que seria de exigir a um profissional do Direito na ponderação dos pressupostos processuais relativos ao tribunal - a competência em razão da matéria -, face à evidência dos elementos característicos do contrato de trabalho, por isso, não se verifica o pressuposto de que depende a aplicação da norma prevista no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I

1. Em 14 de Abril de 2000, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra BANCO DE PORTUGAL, adiante designado por Banco, formulando cinco grupos de pedidos:
- 1.º Grupo:
(i) Se declare válido e em vigor o contrato concluído entre as partes em 21 de Maio de 1974;
(ii) Se caracterize esse contrato como de prestação de serviços, no interesse de ambos os contraentes;
(iii) Se considere como cláusulas dele, entre outras:
a) A que reconhecia ao autor a independência e autonomia indispensáveis ao exercício da profissão de advogado;
b) A que concedia ao autor «pulso livre» para continuar a exercer a sua profissão e o obrigava a manter o seu escritório, com a condição apenas de o Banco, entre os seus clientes, haver de ser considerado cliente privilegiado;
c) A que dispensava o autor de horário de trabalho e apenas lhe exigia a permanência no Banco, em certas circunstâncias e termos a estabelecer, por acordo com os colegas;
d) A que atribuía ao autor, a título de remuneração, além de todas as regalias que o Banco concedia aos empregados de nível superior, um ordenado a rever, em termos de aumento, condicionado apenas ao desempenho das funções, logo ao fim do primeiro ano e, depois, de dois em dois anos.
(iv) Se defina que entre as regalias que o Banco concedia aos empregados de nível superior e, consequentemente, concedeu ao autor, figuravam:
a) A de receberem os seus ordenados 16 vezes por ano;
b) A de os receberem precípuos de encargos fiscais;
c) A de terem direito a um empréstimo, a longo prazo, para aquisição de habitação própria, até ao montante de 1.000 contos ao juro de 1,5% ao ano, logo após perfazerem 3 anos de serviço;
d) A de terem direito a assistência total na doença, tanto médica, como medicamentosa, e não só para si como para o seu agregado familiar;
e) E o direito à reforma, por inteiro, após os 65 anos de idade.

- 2.º Grupo:
Se declarem nulas e de nenhum efeito as alterações introduzidas pelo Banco, sem o seu consentimento, no referido contrato, nomeadamente:
(i) As que pretenderam incluir o autor no corpo dos empregados do Banco e todas as que pressupunham essa integração;
(ii) As que submetiam o autor a outros juízos de valor profissional que não assentassem apenas no desempenho das suas funções;
(iii) A que reclassificou o autor, em 1 de Julho de 1977, no Quadro Técnico do Banco, como Assistente Técnico III;
(iv) A que, em 1987, atribuiu ao autor a notação «C» na classificação de mérito para a comparticipação nos lucros;
(v) A que lhe recusou, em 1988, a antecipação da reforma;
(vi) A que, em 1990, lhe negou o empréstimo para aquisição do material informático;
(vii) E a que, em 1977, lhe alterou as condições do empréstimo para a aquisição de habitação própria.

- 3.º Grupo:
Se condene o Banco de Portugal a pagar ao autor:
(i) A diferença que se vier a apurar entre os ordenados pagos e os que, nos termos do contrato, lhe devia ter pago, tendo em consideração, como limite mínimo, os ordenados que o Banco pagou e tem vindo a pagar ao colega Dr. RR, admitido em 1 de Julho de 1977, logo com o nível 16, ou, pelo menos, ao colega Dr. DD, que entrou com o autor e nas mesmas condições do autor, e a quem foi atribuído, na reclassificação de 1977, o nível 15, tendo em conta nesse apuro, ainda, tanto o não pagamento desse ordenado 16 vezes por ano, como o seu pagamento precípuo de impostos;
(ii) A diferença entre o que o Banco pagou ao autor, como participação nos lucros de 1987, e o que lhe devia ter pago de acordo com o contrato inicial;
(iii) O prejuízo de 6.000 contos, resultante da alteração introduzida pelo Banco nas condições do empréstimo para a aquisição de habitação própria;
(iv) O prejuízo de 10.000 contos decorrente dos encargos fiscais que teve de suportar, por o Banco, unilateralmente, a partir de 1/1/1989, o ter integrado no quadro dos seus empregados;
(v) O prejuízo de 2.625 contos por o Banco não ter concedido ao autor a antecipação da sua reforma;
(vi) O pagamento de todas as despesas, médicas e medicamentosas que despendeu e venha a despender consigo ou com familiares na sua dependência;
(vii) O pagamento a título de reforma, da retribuição que vier a ser fixada ao autor, com a integração do chamado complemento remuneratório, que lhe seja devido, das diuturnidades, dos subsídios de Natal e de férias, e da sua comparticipação anual nos lucros;
(viii) E mais ainda, no fornecimento do material informático nas condições que lhe foram recusadas.

- 4.º Grupo:
Se condene o Banco de Portugal a pagar ao autor, a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de, pelo menos, 50.000.000$00:
(i) Pelo sofrimento moral que o autor suportou, pela desconsideração a que foi votado durante 17 anos ao serviço do Banco;
(ii) Pelo sofrimento moral que o autor suportou com a propositura de acção que correu termos na 2.ª Secção do 8.º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, registada sob o n.º 11.180/94, incluindo a sua tramitação posterior, presença física durante o julgamento, a frustrante sentença proferida e recursos durante 6 anos;
(iii) Pelo sofrimento moral que está e virá a sofrer com a presente acção.

- 5.º Grupo:
Tudo com juros de lei a partir das datas de constituição em mora de cada uma das parcelas que integram o pedido.

Alegou, no essencial, que entrou ao serviço do Banco de Portugal, em 21 de Maio de 1974, por deliberação do seu conselho de administração, de 17 de Maio de 1974, como consultor jurídico e em regime análogo ao dos outros consultores.

O regime em que tinham sido admitidos outros consultores era o regime de prestação de serviços por avença consoante tradição do Banco, tendo sido contratado como advogado para ser prestador de serviços como advogado adjunto.
Todavia, embora como prestador de serviços, tinha regalias semelhantes aos empregados das categorias superiores do Banco.

O réu contestou, por excepção, invocando que estavam prescritos os créditos reclamados pelo autor, e por impugnação, apresentando uma versão diferente sobre a ocorrência dos factos referidos na petição inicial, tendo concluído pela procedência da excepção de prescrição ou, se assim não se entendesse, pela improcedência da acção, com a sua consequente absolvição de todos os pedidos contra si formulados.

O autor respondeu, defendendo a improcedência da invocada excepção de prescrição e a condenação do réu como litigante de má fé.

Posteriormente, foi proferido despacho saneador, que julgou o tribunal do trabalho incompetente, em razão da matéria, atendendo à natureza do contrato de prestação de serviços em que o autor alicerçava os pedidos formulados na acção, e que decidiu absolver o réu da instância.

Interpostos recursos de agravo por ambas as partes, a Relação, considerando a questão da qualificação do contrato em causa definitivamente assente por acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, concluiu que, nessa parte, sempre seria de julgar improcedente o pedido do autor (caso julgado), porém, havia que «conhecer dos demais pedidos formulados e decorrentes do contrato de trabalho, os quais deverão ser apreciados e decididos a seu tempo», pelo que, dando provimento aos recursos, revogou a decisão recorrida e ordenou o normal prosseguimento dos autos.

Recebido o processo na primeira instância, o tribunal do trabalho elaborou despacho saneador que julgou improcedente a excepção de prescrição invocada pelo réu e, doutro passo, julgou procedente a excepção de caso julgado, «no que concerne ao pedido deduzido pelo Autor de que se caracterize o acordo que celebrou com o Réu, em 21 de Maio de 1974, como um contrato de prestação de serviços no interesse de ambos», absolvendo, nesta parte, o réu da instância, tendo operado, em seguida, a selecção da matéria de facto relevante para a decisão da causa.

Inconformado com a decretada improcedência da excepção da prescrição, o réu interpôs recurso de apelação, que foi admitido com subida diferida.

Realizado julgamento, foi exarada sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência:

(i) Declarou válido o contrato concluído entre as partes, em 21 de Maio de 1974, e que o Supremo Tribunal de Justiça qualificou como um «contrato de trabalho»;
(ii) Condenou o réu a reconhecer que faziam parte daquele contrato as seguintes cláusulas:
a) A que reconhecia ao autor independência e autonomia indispensáveis ao exercício das funções de advogado;
b) A que autorizava o autor a continuar a exercer advocacia em escritório próprio e mediante a qual o autor se comprometeu a não dever aceitar como clientes entidades que tivessem com o réu relações que a tal desaconselhassem, bem como a colocar em primeiro lugar as tarefas do Banco de Portugal;
c) Aquela mediante a qual o autor, integrado no corpo de consultores jurídicos do Banco, não tinha horário de trabalho rígido, devendo o seu trabalho ser prestado de acordo com os moldes de distribuição de períodos de tempo, acordados entre os consultores, por forma a manter um número adequado de consultores no local da Direcção de Serviços de Contencioso, ou noutro, do Banco, em que tal se impusesse, durante o período de funcionamento dos serviços daquele ou em permanência dos membros do seu Conselho de Administração para além daquele;
d) Aquela mediante a qual o réu se comprometeu a atribuir ao autor regalias idênticas às que pelo CCT dos Bancários e pelos seus regulamentos internos fossem asseguradas a empregados do quadro bancário, das categorias superiores, salvo, no tocante a diuturnidades ou outra forma de beneficiação compensadora da prolongada permanência ao serviço do Banco numa mesma categoria;
(iii) Declarou que, em Maio de 1974, autor e réu acordaram que:
a) O montante referido em R) [montante mensal de 17.500$00] também era devido a título de subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de Páscoa;
b) O réu arcaria com o pagamento dos impostos profissional e complementar e das contribuições para o Fundo de Desemprego que fossem devidos em função das remunerações que o primeiro auferia;
c) O autor, ao fim de três anos de serviço, tinha direito a um empréstimo a longo prazo até ao montante de 1.000.000$00, ao juro de 1,5% ano para aquisição de habitação própria nas condições de qualquer empregado;
(iv) Declarou ainda nula a reclassificação do autor, operada em 1977, que o reclassificou como Assistente Técnico III;
(v) Condenou o réu a pagar ao autor uma indemnização no valor de 8.500 euros por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, devidos desde a data da citação até integral pagamento.

2. Inconformadas, ambas as partes apelaram da sentença, tendo a Relação julgado procedente a apelação interposta pelo réu do despacho saneador, na parte em que julgou improcedente a excepção peremptória da prescrição, revogando-o nesse preciso segmento, julgando procedente a referida excepção e absolvendo o réu dos pedidos formulados, considerando prejudicado o conhecimento dos demais recursos.
É contra a enunciada decisão que o autor interpôs recurso de revista, em que pede a revogação do acórdão recorrido ao abrigo das seguintes conclusões:

1) Na interpretação literal do artigo 323.º do Código Civil, a prescrição dos direitos em causa nesta acção interrompeu-se com a citação do réu para a primeira acção e essa citação tem-se por verificada em 9.3.94;
2) A primeira acção terminou com a absolvição do réu da instância, por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de Fevereiro de 2000, notificado por aviso do correio de 29 do mesmo mês, pelo que, o seu trânsito em julgado, conjugados os preceitos dos artigos 677.º, 668.º, 669.º, 153.º, 685.º, n.º 1, 144.º e 145.º do Código de Processo Civil, ocorreu em 16 de Março de 2000;
3) A segunda acção foi proposta em 14 de Abril de 2000 (sexta feira), por correio registado dessa data (artigo 150.º, n.º 1, do Código de Processo Civil);
4) A citação do réu, à luz do disposto no n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil, para efeitos da interrupção da prescrição, nesta segunda acção, deve considerar-se feita em 19 de Abril de 2000;
5) E como o prazo de 30 dias contemplado na parte final do n.º 2 do artigo 289.º do Código de Processo Civil para a propositura da segunda acção, tendo em consideração as férias da Páscoa desse ano e as referidas disposições dos artigos 144.º e 145.º, só terminava em 26 de Abril de 2000, é manifesto que têm-se plenamente por verificados os requisitos da parte final do referido n.º 2 do artigo [289.º];
6) Além disso, a absolvição da instância na primeira acção não pode ser imputável, por motivo processual, ao ora recorrente, enquanto titular dos direitos em causa, porque a absolvição decorreu, não de razões de processo, mas de razões substantivas que tinham a ver com a qualificação do contrato, e pela lei que vigorava eram os tribunais civis da comarca de Lisboa os competentes para procederem à sua qualificação, conforme decorre do citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de Fevereiro de 2000;
7) Assim sendo, pelo que está expresso na primeira parte do n.º 2 do artigo [289.º] do Código de Processo Civil, a concessão do prazo de 30 dias da sua parte final não repele, mas pelo contrário adiciona o regime dos n.os 2 e 3 do artigo 327.º do Código Civil, pelo que, nesta perspectiva e de acordo com o artigo 9.º deste Código, a prescrição dos direitos do Autor nunca se pode considerar completada antes de findarem dois meses após o trânsito em julgado da absolvição da instância;
8) E dois meses a contar do trânsito em julgado da absolvição da instância que, como dissemos, ocorreu em 16 de Março de 2000, permitiriam que a acção pudesse ter sido intentada até 16 de Maio de 2000;
9) O tribunal a quo não teve em consideração ou interpretou mal as disposições legais referidas; e, com as interpretações que fez delas, mormente, as dos n.os 2 e 3 do artigo 327.º do Código Civil, inviabilizou a garantia constitucional de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva do ora recorrente, bem como os princípios da proporcionalidade e da tutela da confiança de todos os cidadãos na resolução jurisdicional dos seus litígios (artigos 20.º, n.os 1, 4 e 5, e 202.º, n.º 2, da CRP);
10) O acórdão sob recurso, por violação das disposições legais citadas, deve ser revogado e substituído por outro que, julgando improcedente a invocada excepção da prescrição, ordene o prosseguimento dos autos.

Em contra-alegações, o recorrido veio defender a confirmação do julgado.

Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta pronunciou-se no sentido de que, em 14 de Abril de 2000, data em que deu entrada em juízo a petição inicial que originou a presente acção, já se havia esgotado o prazo fixado no n.º 2 do artigo 289.º do Código de Processo Civil, daí que o autor, na presente acção, não beneficia da interrupção da prescrição resultante da citação do réu na primeira acção; por outro lado, considera que o recorrente beneficia do prazo de dois meses previsto no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil, donde, o prazo de prescrição fixado no artigo 38.º, n.º 1, da LCT, só terminava em 13 de Maio de 2000, e uma vez que o autor intentou a segunda acção em 14 de Abril de 2000, conclui pela improcedência da excepção peremptória da prescrição invocada, devendo a revista ser concedida.

As partes, notificadas do parecer do Ministério Público, nada responderam.

3. No caso vertente, as questões suscitadas são as que se passam a enunciar:

- Se a interrupção da prescrição resultante da citação do réu ocorrida na primeira acção se mantém na presente acção por aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 289.º do Código de Processo Civil (conclusões 1.ª a 5.ª);
- Se subsiste na presente acção o benefício da interrupção da prescrição, decorrente da citação do réu feita na primeira acção, terminada por absolvição da instância, por aplicação da norma prevista no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil (conclusões 6.ª a 8.ª);
- Se a interpretação operada no acórdão recorrido quanto às disposições legais referidas, mormente as dos n.os 2 e 3 do artigo 327.º do Código Civil, inviabilizou a garantia constitucional de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva do recorrente, bem como os princípios da proporcionalidade e da tutela da confiança de todos os cidadãos na resolução jurisdicional dos seus litígios, contemplados, respectivamente, nos artigos 20.º, n.os 1, 4 e 5, e 202.º, n.º 2, da CRP (conclusão 9.ª).

Corridos os vistos, cumpre decidir.

II

1. A primeira instância considerou provada a seguinte matéria de facto:
1) Em 2 de Março de 1994, no Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, o autor propôs contra o réu uma acção declarativa, com processo ordinário, que correu termos sob o n.º 11.180/94, na 2.ª Secção do 8.º Juízo Cível da Comarca de Lisboa (encontrando-se apensa aos presentes autos cópia integral da mesma);
2) A acção referida em 1) teve a petição inicial constante de fls. 2 a 55 da cópia do processo, que se mostra apensa aos autos;
3) No âmbito do processo referido em 1), em 30 de Julho de 1998, em 1.ª instância, foi proferida a sentença constante de fls. 898 a 933 da cópia do processo apensa aos autos;
4) No âmbito do processo referido em 1), em 24 de Junho de 1999, o Tribunal da Relação de Lisboa veio a proferir o acórdão constante de fls. 1056 a 1084 da cópia do processo apensa aos autos;
5) No âmbito do processo referido em 1), em 24 de Fevereiro de 2000, o Supremo Tribunal de Justiça veio a proferir o acórdão constante de fls. 1135 a 1140 da cópia do processo apensa aos autos;
6) O autor nasceu em 11 de Março de 1928 e casou em 9 de Maio de 1953;
7) O autor é pai de BB, nascido em 20 de Fevereiro de 1954, e de CC, nascida em 6 de Maio de 1958, sendo certo que, em 1 de Maio de 1974, ambos os filhos estavam a seu cargo;
8) Em 21 de Maio de 1974, o A. havia sido advogado e jurista de 1.ª classe da Auditoria do Ministério da Educação Nacional;
9) O A. abandonou a actividade de jurista referida em 8) para entrar no réu;
10) Ao concorrer ao réu, o A. apresentou o seguinte curriculum: licenciatura pela Faculdade de Direito de Coimbra com 15 valores; curso complementar da mesma Faculdade com 16 valores; estágio e prática de advocacia; cumprimento de serviço militar; ingresso na Magistratura Ultramarina; delegado do procurador da República nas comarcas de Cabinda e Bié e por inerência conservador dos Registos Predial e Comercial, nessas mesmas comarcas; juiz interino da Comarca do Lobito e da Comarca de S. Tomé; promovido a juiz e colocado na Comarca de Cuanza; nomeado inquiridor e sindicante à Junta de Povoamento Agrário de Cela; colocado por motivo de saúde fora do quadro; assistente no Instituto de Estudos Sociais; admitido em 1965, a título eventual, primeiro como técnico de 2.ª e depois como técnico de 1.ª classe no Gabinete de Estudos e Planeamento da Acção Educativa; nomeado em 1972, jurista de 1.ª Classe da Auditoria do Ministério da Educação Nacional; advogado com escritório na Avenida dos Defensores de Chaves, n.º 3, 2.º Esq., em Lisboa, desde Março de 1967;
11) No mesmo concurso do A., foi seleccionado o Ex.mo Sr. Dr. DD, que entrou ao serviço do réu, em 8 de Junho de 1974;
12) Em 16 de Maio de 1974, o Sr. Dr. EE, então Director dos Serviços do Contencioso do réu, remeteu ao Administrador da classe do contencioso do réu a informação cuja cópia constante de fls. 79 a 81 dos autos aqui se dá por integralmente transcrita;
13) Em 17 de Maio de 1974, o Conselho de Administração do réu, sob proposta do Sr. Administrador Dr. MM, deliberou conceder autorização para o autor ser admitido ao serviço do Banco, em «regime análogo ao dos outros Consultores Jurídicos e com o ordenado inicial de 17.500$00», nos termos constantes de fls. 64 do processo, que aqui se dá por integralmente transcrita;
14) O autor passou a trabalhar para o réu, em 21 de Maio de 1974;
15) O réu contratou o autor como Advogado Adjunto;
16) O trabalho do autor para o réu era processado com independência técnica;
17) Após começar a trabalhar para o réu, o autor manteve um escritório particular de advocacia para atender a sua clientela particular;
18) Inicialmente, o autor recebia um montante mensal de 17.500$00;
19) Em Maio de 1974, autor e réu acordaram que o montante referido em 18) também era devido a título de subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de Páscoa;
20) Em Maio de 1974, A. e réu acordaram que este último arcaria com o pagamento dos impostos profissional e complementar e das contribuições para o Fundo de Desemprego que fossem devidos em função das remunerações que o primeiro auferia;
21) A partir de 1 de Janeiro de 1975, invocando o estatuído no DL 375/74, de 20/8, o réu deixou de arcar com as despesas referidas em 20);
22) A partir de 1 de Janeiro de 1975, o réu deixou de pagar subsídio de Páscoa ao autor;
23) A partir de 1976, o réu deixou de pagar ao autor qualquer quantia a título de comparticipação nos lucros;
24) O réu fundou as condutas referidas em 22) e 23) no estatuído no DL 292/75, de 16/6;
25) O autor passou ao réu recibos verdes de todas as importâncias que o mesmo lhe pagou até 31 de Dezembro de 1988;
26) Em 23 de Junho de 1972, o conselho de administração do réu adoptou a deliberação constante de fls. 77 e 78 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita;
27) Em 16 de Maio de 1974, o Advogado-Director do Contencioso do réu prestou ao Administrador da classe do Contencioso a informação constante de fls. 79 a 81 do processo, que aqui se dá por integralmente reproduzida;
28) Em 29 de Dezembro de 1971, o Advogado Director do Contencioso do réu prestou ao Administrador da Classe do Pessoal do réu uma informação nos termos constantes de fls. 82 a 109 dos autos dos autos, que aqui se dão por inteiramente transcritos;
29) Em 1 de Julho de 1977, o Secretário do Conselho de Administração do Réu emitiu a comunicação n.º 94/77 com o teor constante de fls. 149 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida;
30) Em 1 de Julho de 1977, o Secretário do Conselho de Administração do Réu emitiu a Comunicação do Conselho n.º 95/77, com o teor constante de fls. 130 a 132 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, através da qual deu a conhecer que, em sessão de 1 de Junho de 1977, o Conselho de Administração havia deliberado reclassificar os elementos do Quadro Técnico, tendo reclassificado os advogados do Contencioso nos seguintes moldes: «Advogados-Consultores: Dr. FF - Técnico-Consultor I; Dr. GG - Técnico-Consultor I; Advogado Director-Adjunto - Dr. HH - Técnico-Assessor I; Advogado-Adjunto - Dr. II - Técnico-Assessor I; Dr. JJ- Assistente-Técnico I; Dr. DD - Assistente-Técnico I; Dr. KK - Assistente-Técnico III; Dr. LL - Assistente--Técnico III»;
31) Em 1 de Julho de 1977, o Secretário do Conselho de Administração do Réu emitiu a Comunicação do Conselho n.º 102/77 que teve o teor constante de fls. 133 e 134 dos autos, que aqui se dá por inteiramente reproduzida;
32) Em 6 de Julho de 1977, o Director dos Serviços Jurídicos do réu remeteu ao autor a carta cuja cópia, constante de fls. 147 dos autos, aqui se dá por reproduzida;
33) Em 20 de Julho de 1977, cinco advogados do réu remeteram ao Conselho de Administração do réu uma carta com o teor constante de fls. 145 e 146 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita;
34) Em 1 de Agosto de 1977, o autor remeteu ao Conselho de Administração do réu uma exposição com o teor constante de fls. 135 a 144 dos autos, que aqui se dá por inteiramente reproduzida;
35) Em 3 de Agosto de 1977, a Comissão de Trabalhadores do réu remeteu ao autor a carta cuja cópia, constante de fls. 155 dos autos, aqui se dá por integralmente reproduzida;
36) Em 7 de Setembro de 1977, o Conselho de Administração do réu aprovou o «Regulamento do Quadro Técnico» aplicável às categorias de técnicos economistas e juristas;
37) O que deu origem à Comunicação do Conselho n.º 151/77 que teve o teor constante de fls. 121 e 122 dos autos, que aqui se dá por inteiramente reproduzida;
38) Em 21 de Outubro de 1977, os Técnicos Juristas do réu, entre eles o autor, remeteram ao Conselho de Administração do réu uma carta/exposição cuja cópia, constante de fls. 317 do processo, aqui se dá por inteiramente reproduzida;
39) Em 26 de Outubro de 1977, a Comissão Executiva Geral do réu emitiu a nota cuja cópia, constante de fls. 318 dos autos, aqui se dá por transcrita destinada aos signatários do documento referido em 38);
40) Em 20 de Março de 1978, o autor remeteu ao Sr. Administrador do Pelouro do Pessoal do réu a carta cuja cópia, constante de fls. 156 e 157, aqui se dá por integralmente reproduzida;
41) Em 14 de Agosto de 1978, o autor remeteu ao Conselho de Administração do Banco de Portugal a carta cuja cópia, constante de fls. 158 a 163 dos autos, aqui se dá por inteiramente reproduzida;
42) Em 29 de Fevereiro de 1988, o autor solicitou à Administração do réu a passagem à reforma, ao abrigo da CI n.º 165/87, de 3 de Dezembro de 1987, a partir do dia 31 de Dezembro de 1988, nos termos constantes de fls. 173 dos autos, que aqui se dão por reproduzidos;
43) Em 9 de Setembro de 1988,o autor remeteu ao Director do Departamento de Serviços Jurídicos a carta cuja cópia, constante de fls. 174 a 183 dos autos, aqui se dá por integralmente transcrita;
44) Em 16 de Março de 1988, o autor tomou conhecimento que o réu entendia que ele não reunia as condições para a passagem à reforma nos termos da comunicação interna constante de fls. 184, que aqui se dá por reproduzida;
45) Em 8 de Agosto de 1988, o Departamento de Pessoal e Relações de Trabalho do réu remeteu ao Departamento de Serviços Jurídicos a informação constante de fls. 187 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida;
46) Em 30 de Março de 1989, o réu publicou o «Regulamento de Carreiras do Grupo I», constante de fls. 319 a 321 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido;
47) Em 28 de Maio de 1987, o Conselho de Administração do réu adoptou deliberação que consta de Circular Informativa, datada de 15 de Julho de 1987, constante de fls. 164 a 166 dos autos, que aqui se dá por inteiramente reproduzida;
48) Em consequência, o réu voltou a pagar ao autor um montante a título de participação nos lucros;
49) No que respeita a técnicos de nível 15 e superior - onde se situava o autor - o pagamento da participação nos lucros passou a estar condicionado a factores subjectivos de mérito e de assiduidade e mesmo em função do comportamento disciplinar de cada trabalhador podendo atingir 133,3%, 100% ou 70% da remuneração mensal;
50) Para efeitos do pagamento referido em 48) foi atribuída ao autor a notação «C» não obstante o seu Director de Departamento haver proposto para o autor e todos os seus colegas a notação «A»;
51) Em 26 de Janeiro de 1989, o Departamento de Pessoal do réu remeteu ao Director de Serviços Jurídicos o ofício constante de fls. 67 dos autos, que aqui se dá por inteiramente reproduzido;
52) Em 30 de Janeiro de 1989, o réu deu a conhecer ao autor a Comunicação de Serviço Interno n.º 67/DPTRB/PR, com o teor constante de fls. 66, que aqui se dá por integralmente transcrita, segundo a qual, a partir de 1 de Janeiro desse ano, o autor passava a ser considerado empregado do mesmo em regime de trabalhador por conta de outrem para efeitos fiscais;
53) Em 17 de Janeiro de 1990, o réu emitiu a Circular Informativa constante de fls. 367 a 371 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita, através da qual divulgou que havia deliberado conceder empréstimos sem juros até 36 meses e comparticipar 1/3 do valor da aquisição do valor do equipamento informático que os seus empregados quisessem adquirir nos moldes ali referidos;
54) Em 22 de Janeiro de 1990, o autor apresentou o boletim de inscrição relativo à concessão de empréstimo tendente à aquisição de equipamento informático nos termos constantes de fls. 197 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrito;
55) O réu desatendeu a pretensão de empréstimo do autor para adquirir equipamento informático;
56) Em 3 de Abril de 1990, o autor remeteu ao DPT - Serviço de Administração do réu a carta constante de fls. 200, que aqui se dá por integralmente transcrita, na qual se propunha a pagar o financiamento do equipamento informático, não em 3 anos, mas pelo tempo que lhe faltava para atingir os 65 anos;
57) O réu, a partir da publicação da Lei Orgânica, aprovada pelo DL n.º 644/75, de 15 de Novembro, entendeu estar desobrigado da concessão do empréstimo para aquisição de casa própria;
58) Em 22 de Dezembro de 1976, o Advogado-Director do Contencioso do réu remeteu ao Ex.mo Administrador do Pelouro do Contencioso o parecer constante de fls. 201 a 224 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrito;
59) Em 31 de Agosto de 1977, o autor assinou o pedido de empréstimo para habitação constante de fls. 225 e 226 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrito;
60) Em 6 de Fevereiro de 1986, o autor outorgou a escritura de compra, venda e mútuo com hipoteca, constante de fls. 228 a 235 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita, através da qual contraiu um empréstimo para aquisição de casa própria no valor de 4.500.000$00 amortizáveis em doze anos e a um juro de 15%;
61) O réu aprovou um Regulamento de Constituição do Fundo de Pensões do Banco de Portugal;
62) Em Julho de 1977, o autor atingiu o nível 14;
63) Em 1980, o autor passou ao nível 15;
64) Em 1983, o autor atingiu o nível 16;
65) Em 1 de Janeiro de 1985,o autor atingiu o nível salarial 17 que mantinha à data da reforma;
66) Quando atingiu os 65 anos de idade, o autor auferia mensalmente: vencimento base - 296.000$00; diuturnidades - 14.550$00; complemento remunerativo - 165.000$00;
67) Após se ter reformado, o autor ficou a receber do réu a título de reforma: 268.180$00, em correspondência ao vencimento base; 19.380$00 em correspondência às diuturnidades;
68) O réu aprovou um Regulamento de comparticipações em despesas de doença e funeral dos seus empregados;
69) A relação laboral entre autor e réu cessou em 10 de Março 1993;
70) Em 5, 13 e 18 de Julho de 1997, o Administrador do Pelouro do Contencioso do réu enviou ao autor as cartas cujas cópias, constantes de fls. 150 a 154 dos autos, aqui se dão por reproduzidas;
71) Em 4 de Outubro de 1987, o então Director do Contencioso do réu remeteu ao então Vice-Presidente do Banco uma carta com o conteúdo constante de fls. 169 e 170 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita;
72) O autor enviou ao então Vice-Governador do réu, Dr. NN, carta datada de 20 de Outubro de 1987, que teve o teor constante de fls. 167 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita;
73) Em resposta à comunicação de serviço interno referida em 52), o autor dirigiu ao Director dos Serviços Jurídicos do réu uma carta com o teor constante de fls. 185 e 186 dos autos, que aqui se dá por reproduzido;
74) Em 19 de Fevereiro de 1993, o autor dirigiu ao Conselho de Administração do réu uma exposição com o teor constante de fls. 398 a 425 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita;
75) O administrador [do réu] escreveu e enviou ao autor as cartas constantes de fls. 150 a 154 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas;
76) Em 21 de Maio de 1974, o réu comprometeu-se a atribuir ao autor regalias idênticas às que pelo CCT dos Bancários e pelos seus regulamentos internos fossem asseguradas a empregados do quadro bancário das categorias superiores, salvo no tocante a diuturnidades ou outra forma de beneficiação compensadora da prolongada permanência ao serviço do Banco numa mesma categoria;
77) Em 21 de Maio de 1974, o réu acordou com o autor que no âmbito do serviço a prestar, integrado no corpo de consultores jurídicos do Banco, este último teria «pulso livre» na medida consentida pelo cumprimento das obrigações assumidas para com o Banco - inclusivamente num plano deontológico de incompatibilidades -, designadamente a de permanência - sem horário de trabalho rígido, mas segundo moldes de distribuição de períodos de tempo, acordada entre os consultores, de um número adequado de consultores no local da Direcção de Serviços de Contencioso, ou noutro, do Banco, em que tal se impusesse, durante o período de funcionamento dos serviços daquele ou em permanência dos membros do seu Conselho de Administração para além daquele;
78) Mais acordaram que o autor devia manter actualizados e em bom nível os seus conhecimentos profissionais nos vários ramos do direito comummente atribuídos aos advogados de uma empresa como era o Banco (sem limitação de elementos de estudo que fosse possível reunir por conta do mesmo e dentro do sistema de organização da biblioteca deste) e ainda de especialização em algum ou alguns ramos de Direito, menos cultivados mas de peculiar interesse perante as circunstâncias de actuação do Banco;
79) No âmbito das negociações que levou a cabo com o autor, o Advogado--Director dos Serviços do Contencioso do réu ventilou a possibilidade de nos tempos mais próximos poder surgir a conveniência de um dos advogados do Banco ter de aprofundar conhecimentos do novo Direito Sindical e de Trabalho ou de ramos com estes conexos;
80) Em 1974, o réu via com bons olhos que os seus advogados continuassem a exercer advocacia nos respectivos escritórios;
81) O autor assumiu perante o réu o compromisso do mesmo ser considerado um cliente privilegiado (no sentido de o autor não dever aceitar como clientes entidades que tivessem com o réu relações que tal desaconselhassem, bem como no de que devia pôr as tarefas do Banco de Portugal em primeiro lugar);
82) Em 1974, o réu concedia a alguns dos seus empregados uma comparticipação anual nos lucros do Banco que não podia ser em valor inferior ao montante que os trabalhadores auferiam mensalmente;
83) Em 21 de Maio de 1974, autor e réu assentaram que o primeiro, ao fim de três anos de serviço, tinha direito a um empréstimo a longo prazo até ao montante de 1.000.000$00, ao juro de 1,5% ano, para aquisição de habitação própria nas condições de qualquer empregado;
84) Na década de 1970, o réu procedeu a aumentos aos seus trabalhadores;
85) A reclassificação referida em 30) causou sofrimento psicológico ao autor;
86) Na sequência da reclassificação referida em 30), os Advogados que faziam parte do Contencioso do réu, em 20 de Julho de 1977, subscreveram a carta constante de fls. 145 e 146, que aqui se dá por integralmente reproduzida;
87) A reclassificação referida em 30) foi levada a cabo sem os Advogados do Contencioso, nomeadamente o autor, serem ouvidos;
88) A reclassificação referida em 30) foi levada a cabo sem ter sido ouvido o Director dos Serviços Jurídicos [do réu];
89) Em 3 de Agosto de 1977, a Comissão de Trabalhadores do Banco de Portugal - Sede remeteu ao autor uma carta cuja cópia, constante de fls. 155 dos autos, aqui se dá por integralmente transcrita;
90) O autor sempre foi reputado como um profissional competente pelos colegas do Contencioso do Banco de Portugal;
91) O réu nunca deu qualquer satisfação ao autor acerca dos requerimentos referidos em 40) e 41);
92) O autor fez diligências junto da Administração do réu tendentes a mostrar o desagrado que a notação C, que lhe foi atribuída, lhe causou, nomeadamente junto do Administrador Sr. Dr. OO;
93) Em Outubro de 1987, o autor elaborou a carta constante de fls. 167 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida, que foi entregue ao senhor Vice-Governador NN, que superintendia no Departamento dos Serviços Jurídicos;
94) O autor fez diligências tendentes a mostrar o seu desagrado pela notação C que lhe fora atribuída junto do Governador do Banco de Portugal Sr. Dr. PP;
95) Mesmo após a recusa referida em 44), o autor insistiu na sua saída;
96) Após a recusa referida em 44), o autor fez junto do DPT do réu exposições, informações e comunicações escritas nas quais alertava para o facto de se considerar como trabalhador por conta própria;
97) Em consequência das recusas que recebeu, o autor levou o assunto da sua reforma à Administração do réu;
98) O DPT do réu assumiu posição no sentido de que no caso de opção imediata pela antecipação da reforma pelo autor, ao abrigo da CI n.º 165/87, devia ser-lhe garantida a reforma por inteiro, mas à mesma devia ser abatida a pensão atribuída pelo tempo de serviço prestado na função pública, por entender que lhe era aplicável o estabelecido na cláusula 138.ª do ACT em conjugação com o n.º 5 do artigo 9.º do Contrato de Constituição de Fundo de Pensões do Banco de Portugal;
99) Em 1988, havia incentivos de antecipação da reforma, sendo certo que o réu os negociava com os seus trabalhadores, caso a caso, e que era usual estes últimos receberem um montante de incentivo e a atribuição de um nível superior;
100) O autor sentiu-se desconsiderado com a reclassificação referida em 30);
101) O autor sentiu-se desconsiderado com a notação C;
102) O autor ficou contrariado com o facto do réu lhe recusar a antecipação da reforma;
103) O autor sempre reivindicou para si o estatuto de advogado entendendo que não era trabalhador do réu;
104) A reclassificação referida em 30), bem como a notação C referida na resposta ao quesito n.º 34 [«O autor sentiu-se desconsiderado com a notação C que lhe foi atribuída para efeitos de comparticipação nos lucros?»] causaram sofrimento psicológico ao autor;
105) Com a decisão referida em 52), o autor deixou de poder considerar as remunerações que recebia mensalmente do réu como provenientes da sua advocacia;
106) No período decorrido entre Janeiro de 1989 e Março de 1993, o autor passou a pagar mais impostos do que pagava anteriormente como consequência de a partir de 1 de Janeiro de 1989 sobre as suas remunerações terem passado a incidir os encargos fiscais dos trabalhadores por conta de outrem;
107) A consideração do direito à concessão de empréstimo para aquisição de casa própria pesou na decisão do autor de entrar ao serviço do réu;
108) O autor recorreu ao empréstimo referido em [60)];
109) Em 6 de Fevereiro de 1986, o autor outorgou a escritura de compra, venda e mútuo com hipoteca constante de fls. 228 a 235 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita, através da qual contraiu um empréstimo para aquisição de casa própria no valor de 4.500.000$00 amortizáveis em doze anos e a um juro de 15%, sendo certo que em 1977 a taxa de juros anual de um empréstimo bancário era de 5,5%;
110) Os preços de mercado dos imóveis em 1986 eram superiores aos praticados em 1977;
111) A inscrição no Serviço de Assistência Médico Social dos Empregados Bancários (SAMS) é obrigatória para os trabalhadores bancários, sendo certo que o autor entendia que não tinha que descontar para tal entidade;
112) Desde 21 de Maio de 1974, o réu assumiu a condição de principal cliente do autor;
113) Após 21 de Maio de 1974, o autor fez parte de duas Comissões de revisão do CPC, dirigidas pelo Professor Dr. QQ;
114) Após 21 de Maio de 1974, o autor leccionou na Faculdade de Direito de Lisboa, entre 1977 e 1986, ministrando a cadeira de Teoria Geral de Direito Civil, sendo certo que o fez em horário nocturno;
115) Em 4 de Maio de 1984, o autor foi eleito membro do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados;
116) O réu teve interesse em integrar o autor no seu quadro de Contencioso; os advogados do réu dispunham de um espaço de trabalho próprio nas instalações do Banco de Portugal, sendo certo que o réu lhes facultava meios de trabalho; o réu pretendia ter sempre advogados nas suas instalações para qualquer eventual consulta;
117) Os advogados do réu tinham um horário flexível. Era possível proceder à distribuição de tempo entre os consultores conforme as necessidades, tendo em atenção que o Banco pretendia sempre ter alguns advogados nas suas instalações;
118) A maior parte dos advogados do Banco de Portugal - por deferência - comunicavam ao Director do Contencioso quando precisavam sair por motivo de clientes particulares;
119) A distribuição das tarefas, bem como dos períodos de permanência, estava subordinada ao Director dos Serviços do Contencioso que procurava conciliar os interesses de todos eles;
120) O autor encontrava-se integrado no Contencioso do réu que tinha os seguintes graus: Director do Contencioso, Director Adjunto do Contencioso e Adjunto do Contencioso, todos eles Advogados;
121) O autor não cobrava honorários fundados, especificamente, em serviços que fosse prestando;
122) O pagamento da retribuição ao autor não dependia do volume ou tipo de tarefas que lhe eram cometidas pelo réu nem do seu resultado;
123) A comparticipação que o autor recebesse nos lucros do réu era em montante a definir em cada ano;
124) O réu dispõe de gabinetes e de secretariado e biblioteca de apoio para os advogados que integram o seu quadro de contencioso e não necessita para o seu serviço dos escritórios privados dos seus advogados;
125) O autor usava os gabinetes do réu, bem como, por vezes, o seu secretariado;
126) O autor apresentou um pedido de reclassificação em Quadro Técnico, tendo ressalvado nos termos de carta que, em 1 de Agosto de 1977, remeteu ao Conselho de Administração do Banco Portugal constante de fls. 135 a 144 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita, que o fazia apenas para equiparação de remuneração;
127) O réu procedeu à integração no ordenado mensal do autor do subsídio de Páscoa, da comparticipação nos lucros bem como da parcela correspondente ao pagamento dos seus impostos;
128) Foi atribuída a tal integração eficácia retroactiva a 1 de Janeiro de 1975;
129) Em 1 de Janeiro de 1975, a retribuição mensal do autor passou a ser de 21.850$00 em catorze meses;
130) Na reclassificação levada a cabo em 1977, por forma a reconduzir os técnicos aos escalões e terminologia do Regulamento referido em 36), o Conselho de Administração do réu utilizou como critério a apreciação do mérito, tendo em atenção o valor relativo de cada elemento avaliado por meio da qualidade e quantidade de trabalho produzido, a capacidade de resposta às solicitações e a capacidade de aperfeiçoamento técnico. Em 5 de Julho de 1977, o Sr. Dr. SS remeteu ao Autor a carta constante de fls. 150 e 151 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita. Foi adoptado o critério mencionado na Comunicação do Conselho n.º 102/77, de 1 de Julho de 1977, constante de fls. 133 e 134 dos autos, que aqui se dá por integralmente transcrita.
131) Antes de 1988, o autor, em consequência de orientação do Sr. Dr. TT, teve menos trabalho distribuído, a nível da prolação de pareceres, do que os colegas advogados;
132) O autor cumpriu uma comissão de serviço política-administrativa respeitante ao território de S. Tomé e Príncipe. Essas funções tiveram início em Junho de 1974 e termo em Julho de 1975 e durante esse lapso de tempo esteve naquele território por duas vezes, sendo certo que uma delas ocorreu durante um período de férias judiciais;
133) Inicialmente, a Fundição de Oeiras era um cliente do Sr. Dr. SS;
134) Este advogado veio a ausentar-se para a Alemanha, tendo deixado essa avença ao Professor QQ e ao autor, sendo certo que também veio a colaborar no âmbito da mesma o Sr. Dr. VV, que regressou das ex--colónias em finais de 1975;
135) Entre 21 de Maio de 1974 e 1 de Julho de 1977, o autor deu assistência jurídica a alguns «retornados» do ex-ultramar português, sendo certo que deu instruções à funcionária do seu escritório para encaminhar muitos dos que o procuravam para o Sr. Dr. VV por não dispor de tempo para acompanhar os respectivos processos;
136) Aos advogados do réu não era vedado utilizar as instalações do Banco, nem o tempo que lá estavam, para fazerem trabalhos da sua advocacia particular;
137) O autor recebeu, pelo menos, um cliente particular nas instalações do réu;
138) O Sr. Dr. AAA foi admitido a trabalhar para o réu em Junho de 1977;
139) Antes de ser admitido a trabalhar para o réu, o Sr. Dr. RR pertencia a um escritório de advocacia, que integrava entre outros advogados os Srs. Drs. XX, ZZ e YY, tendo continuado a fazer parte do mesmo, mas sem ali exercer qualquer actividade profissional;
140) O Sr. Dr. RR falava fluentemente francês e inglês, tendo vasta experiência em seguros e Direito Sindical. Quando começou a trabalhar para o réu continuou a colaborar com uma seguradora para a qual elaborava algumas peças processuais;
141) O Sr. Dr. RR interessou-se pelo Direito Comunitário, sendo certo que veio a ser nomeado «Coordenador de Núcleo» do Direito Comunitário do réu;
142) Tal núcleo era composto pelo Sr. Dr. RR, pela Sr.ª Dr.ª BBB e pelo Sr. Dr. CCC;
143) O Sr. Dr. RR acompanhava com assiduidade o Vice- -Governador do Banco de Portugal num Comité de Consulta da Comissão Europeia, denominado de Comité Consultivo Bancário (para matérias de supervisão providencial) em que eles e um representante do Ministério das Finanças eram os representantes de Portugal;
144) E foi co-autor do projecto do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras;
145) O Sr. Dr. RR participou em revisões da Lei Orgânica do Banco de Portugal;
146) O Sr. Dr. RR foi representante do réu no Comité referido em 143), fez parte de grupos de trabalho na Comissão Europeia e actualmente é representante do réu no Comité de Assuntos Jurídicos no Banco Central Europeu;
147) A proposta de reclassificação dos advogados feita em 1977 partiu do Administrador do Pelouro;
148) O Administrador do Pelouro prestou esclarecimentos pessoais ao autor sobre a reclassificação referida em 30);
149) Esteve uma técnica de inspecção fiscal do [Ministério] das Finanças no Banco de Portugal que após analisar a situação do autor e outros considerou tratar-se de «trabalho dependente» e aconselhou a que a respectiva tributação fosse feita como tal;
150) A técnica do [Ministério] das Finanças disse ainda que se assim não se fizesse levantaria um auto em próxima inspecção que lá fosse fazer;
151) O réu pôs termo aos recibos verdes que alguns empregados seus lhe passavam, nomeadamente advogados;
152) Tal fiscalização foi feita com o conhecimento do autor;
153) A reforma antecipada do autor dependia do acordo entre o réu e o autor, cabendo a decisão final ao Banco;
154) Em 29 de Fevereiro de 1988, o autor solicitou a passagem à reforma nos termos constantes de fls. 173 do processo, que aqui se dão por integralmente transcritos;
155) Em 16 de Março de 1988, o Departamento de Assuntos Jurídicos do réu deu nota ao autor da comunicação de serviço interno constante de fls. 184 do processo, que aqui se dá por reproduzida;
156) O autor já era reformado pela Caixa Geral de Aposentações pelo tempo de serviço prestado na função pública;
157) O autor não aceitou a dedução dessa pensão;
158) Em 13 de Setembro de 1988, no ISP constava um projecto de contrato constitutivo do «Fundo de Pensões do Banco Portugal» cujos termos mereceram a aprovação daquele instituto;
159) A atribuição de incentivos à aquisição de equipamento informático pelos empregados do réu referida em 53) teve em vista a autoformação e valorização pessoal e profissional dos empregados do Banco;
160) A atribuição do incentivo estava sujeita a decisão do réu em relação a cada caso;
161) O ré[u] entendeu que os candidatos ao empréstimo para aquisição de material informático que atingiam o limite da idade de reforma, antes de decorridos três anos, não satisfaziam o interesse da respectiva concessão;
162) Pelo que não os concedeu a todos os candidatos que atingissem a idade da reforma antes de três anos decorridos sobre a sua eventual concessão;
163) As campanhas para atribuição do incentivo à aquisição de material informático tiveram uma dotação orçamental limitada;
164) Por deliberação de 23 de Novembro de 1977, o réu atribuiu ao autor um crédito de 1.050.000$00 para aquisição de habitação própria;
165) O autor não usou esse crédito;
166) Na primeira metade da década de 1980, o então Director do Contencioso, Dr. TT, deixou de atribuir ao autor a emissão de pareceres por entender que o mesmo dava sempre pareceres em sentido contrário àquele que era aflorado nas reuniões com os colegas;
167) A partir de 1988, o Director do Contencioso, Sr. Dr. JJ passou a distribuir pareceres ao autor com mais frequência;
168) O Sr. Dr. JJ pensou em criar condições para propor que o autor passasse a integrar o nível 18;
169) Dentro do horário de funcionamento do Banco, o réu facilitava aos seus advogados a intervenção em diligências judiciais e junto de entidades oficiais e até particulares para tratar dos seus clientes privados;
170) O Sr. Dr. DD teve um escritório de advocacia entre 1975/1976, e deu aulas, mas dedicava-se quase exclusivamente ao Banco;
171) E com frequência levava trabalho para casa;
172) A partir de 1988 e até Dezembro de 1996, o Sr. Dr. DD exerceu as funções de Director Adjunto;
173) A partir de Dezembro de 1996, o Sr. Dr. DD passou a desempenhar funções no Banco relacionadas com a União Europeia;
174) O Sr. Dr. DD, que tem obra publicada em Direito Bancário, era especialmente solicitado para dar pareceres ao Banco o que fazia com interesse e sem atrasos;
175) O Conselho de Administração do réu fixava em cada ano contingentes de promoções que tinham de ser geridas pelas hierarquias;
176) Ao longo dos anos as promoções no réu têm sido levadas a cabo por diversas formas;
177) Das promoções havia a faculdade de recurso para uma Comissão, o que o autor nunca fez;
178) A determinação do valor do complemento retributivo resultava de vários factores, nomeadamente a política retributiva do Banco para cada ano, o nível de conteúdo do posto de trabalho, o nível do ACT, a avaliação e classificação anual do mérito em graus: A', A, B, C e D;
179) Qualquer trabalhador podia ser objecto de classificação diferente em cada ano;
180) A distribuição pelos graus era feita em percentagens até à soma de 100% podendo da aplicação das percentagens a determinado grau resultar a exclusão de outros;
181) O autor foi integrado no Quadro de Técnicos Juristas do réu;
182) Em Maio de 1974, o autor ficou com a convicção que o montante da sua remuneração havia de ser periodicamente revisto, no sentido do seu aumento e não só no da sua actualização;
183) Entre Janeiro de 1983 e Dezembro de 1992, o autor auferiu do réu as remunerações referidas nos recibos constantes de fls. 455 a 521 dos autos, que aqui se dão por reproduzidos.

Para além da matéria de facto já enunciada, extrai-se, ainda, dos autos, com interesse para o conhecimento do objecto do recurso, a factualidade seguinte:

a) Na acção proposta pelo mesmo autor contra o mesmo réu, em 2 de Março de 1994, que correu termos sob o número 11.180/94, na 2.ª Secção do 8.º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, «foi expedida carta registada com A/R para citação do Réu, em 23 de Março de 1994, tendo o mesmo Réu contestado, em 2 de Maio de 1994, não [se] certificando a data da citação do Réu, por o A/R não se encontrar junto aos autos» (certidão de fls. 525 e seguintes);
b) Na dita acção, em sede de despacho saneador, foi julgada improcedente a excepção de incompetência em razão da matéria do tribunal cível, tendo o réu interposto recurso de agravo, com subida diferida, e após o julgamento foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, declarando «válido o contrato concluído entre A. e R. em 21 de Março de 1974» e «improcedente o segundo pedido, por não provado, dele absolvendo o R., em consequência julgando prejudicada a apreciação dos demais pedidos, dele dependentes», sendo que o autor interpôs recurso de apelação da sentença final (certidão de fls. 525 e seguintes);
c) Na sequência dos referidos recursos, o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu que «[s]endo o contrato celebrado entre o A. e o R. um contrato de trabalho, o Tribunal Cível da Comarca de Lisboa é materialmente incompetente para esta acção, sendo materialmente competentes os tribunais do trabalho (artigo 64.º, alínea b), da LOTJ)», e decidiu «conceder provimento ao agravo [interposto pelo réu do despacho saneador] e, em consequência, absolver o R. da instância», julgando «prejudicada a apreciação dos restantes recursos» (certidão de fls. 525 e seguintes);
d) Inconformado, o autor interpôs recurso de agravo para este Supremo Tribunal, que negou provimento ao agravo, por acórdão de 24 de Fevereiro de 2000, «tendo este sido devidamente notificado e transitado em julgado no dia 13 de Março de 2000» (certidão de fls. 525 e seguintes);
e) A petição inicial respeitante à presente acção deu entrada na secretaria--geral do Tribunal do Trabalho de Lisboa, em 17 de Abril de 2000, tendo sido remetida pelo correio, sob registo, no dia 14 de Abril de 2000, sendo certo que, nessa peça processual, o autor formula os mesmos pedidos deduzidos na mencionada acção proposta no 8.º Juízo Cível da Comarca de Lisboa e a causa de pedir é também a mesma (fls. 1 a 63, 265 e 526 a 531);
f) O Banco réu foi citado para os termos da presente acção, em 15 de Maio de 2000 (fls. 269).

Este é o acervo factual disponível para resolver as questões suscitadas.

2. O acórdão recorrido considerou que o prazo prescricional de um ano previsto no n.º 1 do artigo 38.º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, anexo ao Decreto-Lei n.º 49.408 de 24 de Novembro de 1969, designado adiante por LCT, se completara antes da propositura da presente acção, não podendo o autor beneficiar do prazo de 30 dias previsto no n.º 2 do artigo 289.º do Código de Processo Civil, nem do prazo de dois meses estipulado no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil, neste caso, por lhe ser imputável o motivo processual que deu causa à absolvição da instância na primeira acção proposta no Tribunal Cível de Lisboa.

Por sua vez, o recorrente sustenta que, por força das disposições conjugadas dos artigos 677.º, 668.º, 669.º, 153.º, 685.º, n.º 1, 144.º e 145.º do Código de Processo Civil, o trânsito em julgado do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de Fevereiro de 2000, proferido na primeira acção, ocorreu em 16 de Março de 2000, pelo que, sendo a presente acção proposta em 14 de Abril de 2000 (sexta-feira), por correio registado dessa data [artigo 150.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil], devendo a citação do réu, nesta segunda acção, considerar-se feita em 19 de Abril de 2000 (artigo 323.º, n.º 2, do Código Civil), e atendendo a que o prazo de 30 dias previsto no n.º 2 do artigo 289.º do Código de Processo Civil para a propositura da acção, tendo em conta as férias da Páscoa desse ano e as disposições dos artigos 144.º e 145.º do mesmo Código, só terminava em 26 de Abril de 2000, verificam-se plenamente os requisitos de aplicação do regime do n.º 2 do artigo 289.º citado.

Por outro lado, o recorrente defende que beneficia do prazo de dois meses previsto no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil, porquanto o motivo que conduziu à absolvição do réu da instância na primeira acção não lhe pode ser imputável, em termos de negligência, dado que essa absolvição não decorreu de razões de processo, mas antes de razões de índole substantiva relacionadas com a qualificação do contrato, e segundo a lei em vigor eram os tribunais civis os competentes para procederem à sua qualificação, como decorre do citado acórdão deste Supremo Tribunal, de 24 de Fevereiro de 2000.

2.1. Estando em causa a prescrição de créditos resultantes do incumprimento ou defeituoso cumprimento do contrato de trabalho celebrado entre as partes em 21 de Maio de 1974 e que cessou em 10 de Março de 1993, portanto, em data anterior à entrada em vigor do Código do Trabalho (dia 1 de Dezembro de 2003 - n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto), aplica-se o disposto no n.º 1 do artigo 38.º do LCT, de harmonia com o estipulado no n.º 1 do artigo 8.º da Lei n.º 99/2003.

O n.º 1 do artigo 38.º citado dispunha que «[t]odos os créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, quer pertencentes à entidade patronal, quer pertencentes ao trabalhador, extinguem-se por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho [...]».
Esta regra, que corresponde ao n.º 1 do artigo 381.º do Código do Trabalho, é justificada, como refere ROMANO MARTINEZ (Direito do Trabalho, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2005, p. 770), «pelo facto de, na pendência da relação laboral, o trabalhador poder encontrar-se constrangido a intentar uma acção judicial contra o empregador(-)» e «implica duas alterações em relação ao regime do Direito Civil. Primeiro, nos termos do artigo 306.º do Código Civil, por via de regra, a prescrição tem início com o vencimento da obrigação, enquanto nos créditos resultantes da retribuição devida no contrato de trabalho, o início da prescrição relaciona-se com o termo do contrato. Por outro lado, e nesta sequência, a prescrição não corre durante a vigência do contrato de trabalho(-). Trata-se, no fundo, de uma suspensão da prescrição, tal como vem previsto no artigo 318.º, alínea e), do Código Civil, apresentada com outras vestes jurídicas(-).»

Não sofre dúvida que o prazo de um ano previsto no n.º 1 do artigo 38.º do LCT é de prescrição, atenta a expressa qualificação legal, aplicando-se-lhe as regras do Código Civil relativas ao cômputo do termo (artigo 279.º) e à prescrição (artigos 300.º a 327.º), nomeadamente quanto à suspensão e interrupção da prescrição.

No caso em apreço, tendo-se provado que «[a] relação laboral entre autor e réu cessou em 10 de Março 1993» (n.º 69 dos factos assentes), decorre do estatuído no n.º 1 do artigo 38.º do LCT que o correspondente prazo prescricional iniciou-se em 11 de Março de 1993 e completar-se-ia às 24 horas do dia 11 de Março de 1994.

Todavia, a prescrição, conforme reza o n.º 1 do artigo 323.º do Código Civil, «interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente».

Uma vez que, «[e]m 2 de Março de 1994, no Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, o autor propôs contra o réu uma acção declarativa, com processo ordinário, que correu termos sob o n.º 11.180/94, na 2.ª Secção do 8.º Juízo Cível da Comarca de Lisboa» (n.º 1 dos factos assentes), em que deduziu os mesmos pedidos que formula nos presentes autos, e em que a causa de pedir é também a mesma, verificando-se que a citação do réu, nessa primeira acção, ocorreu posteriormente ao prazo de cinco dias após ter sido requerida, por causa não imputável ao autor, tem-se a prescrição prevista no n.º 1 do artigo 38.º do LCT, e invocada pelo réu, por interrompida logo que decorreram aqueles cinco dias, ou seja, às 24 horas do dia 7 de Março de 1994, nos termos do preceituado no n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil.

Assim, aquando da data ficta do acto interruptivo ocorrido naquela primeira acção ainda não se completara o prazo prescricional referido (11 de Março de 1994).

O n.º 1 do artigo 326.º do Código Civil determina que «[a] interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.os 1 e 3 do artigo seguinte».

Com efeito, segundo o n.º 1 do artigo 327.º do Código Civil, «[s]e a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo».

No caso, a interrupção da prescrição resultou de citação e, portanto, nos termos do n.º 1 do artigo 327.º citado, estaria vocacionada para se prolongar até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, caso não se verificasse qualquer das situações prevenidas no n.º 2 do mesmo artigo.

De acordo com o estipulado no n.º 2 do artigo 327.ºdo Código Civil, quando «se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo».

Isto é, ocorrendo algum desses casos, repõe-se o regime previsto no artigo 326.º citado em relação aos efeitos da interrupção da prescrição.

Ora, na primeira acção instaurada, verificou-se a absolvição do réu da instância, o que preenche, precisamente, um dos casos contemplados no n.º 2 do artigo 327.º transcrito, por conseguinte, o prazo de prescrição reiniciou-se logo a seguir a 7 de Março de 1994, data ficta do acto interruptivo, ou seja, voltou a correr em 8 de Março de 1994.

Assim, quando o autor instaurou a presente acção já há muito se completara o prazo prescricional previsto no n.º 1 do artigo 38.º do LCT (8 de Março de 1995).

Mas será que o efeito interruptivo da prescrição resultante da citação do réu ocorrida na primeira acção se mantém na presente acção por aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 289.º do Código de Processo Civil ou, ainda, por aplicação da norma prevista no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil?

É que, caso tenham aplicação as normas enunciadas, os efeitos civis da citação do réu retrotraem-se à data em que este facto se produziu na primeira acção.

2.2. O artigo 289.º do Código de Processo Civil, na parte que aqui releva, dispõe que «[a] absolvição da instância não obsta a que se proponha outra acção sobre o mesmo objecto» (n.º 1) e que, «[s]em prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, os efeitos civis derivados da proposição da primeira causa e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível, se a nova acção for intentada ou o réu for citado para ela dentro de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância» (n.º 2).
A este propósito, pondera ANSELMO DE CASTRO (Direito Processual Civil Declaratório, vol. II, Almedina, Coimbra, 1982, p. 274):

«Com a absolvição da instância extingue-se a relação jurídica processual; mas como a sentença nada decidiu quanto à relação jurídica substancial, isto é, não atribuiu a qualquer das partes direito algum substancial, visto que o tribunal se viu impossibilitado de conhecer do mérito da causa, essa relação ficou intacta e, portanto, em condições de ser objecto de nova acção, sem que seja oponível por parte do réu a excepção peremptória de caso julgado [na sistematização processual anterior à reforma de 1995, o caso julgado era qualificado como excepção peremptória pela alínea a) do artigo 496.º do Código de Processo Civil]. A mais disso, se a nova acção foi intentada ou o réu for citado para ela dentro de trinta dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância, os efeitos civis derivados da proposição da primeira causa e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível (artigo 289.º, n.º 2).»

Importa, assim, antes de mais, determinar a data em que ocorreu o trânsito em julgado do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido, em 24 de Fevereiro de 2000, na primeira acção instaurada e que absolveu o Banco réu da instância, com fundamento na incompetência material do tribunal cível para conhecer da causa, por considerar o contrato celebrado entre as partes como de trabalho.

2.2.1. Tal como, aliás, consta da certidão de fls. 525 dos autos, o sobredito acórdão deste Supremo Tribunal transitou em julgado no dia 13 de Março de 2000.

No entanto, o recorrente sustenta que o trânsito em julgado daquele acórdão, notificado por serviço postal registado, em 29 de Fevereiro de 2000, considerando o disposto nos conjugados artigos 677.º, 668.º, 669.º, 153.º, 685.º, n.º 1, 144.º e 145.º do Código de Processo Civil, ocorreu em 16 de Março de 2000 e não, em 13 de Março do mesmo ano, aduzindo, para tanto, que a noção de «trânsito em julgado» que é dada pelo artigo 677.° do Código de Processo Civil implica que ao prazo de 10 dias fixado para a interposição do recurso ou dedução de reclamação, se adicionem os três primeiros dias úteis subsequentes ao seu termo, conforme decorre do n.º 5 do artigo 145.º do mesmo diploma legal.

Mas não tem razão.

Segundo o artigo 677.º do Código de Processo Civil, a decisão considera-se passada ou transitada em julgado, logo que não seja susceptível de recurso ordinário, ou de reclamação nos termos dos artigos 668.º e 669.º do mesmo Código.

Tratando-se a decisão em causa de um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, já não era admissível recurso ordinário (artigos 676.º, n.º 2, 678.º, 691.º, 721.º, 733.º e 754.º todos do Código de Processo Civil).

Ora, sendo o mencionado acórdão proferido em 24 de Fevereiro de 2000 e tendo sido notificado por serviço postal registado, em 29 de Fevereiro de 2000, nos termos do n.º 3 do artigo 254.º do Código de Processo Civil, presume-se feita a notificação em 3 de Março de 2000.

Logo, o prazo para deduzir reclamação nos termos dos artigos 668.º e 669.º do Código de Processo Civil expirou em 13 de Março seguinte, isto é, 10 dias após a notificação daquele acórdão, conforme o prazo-regra estabelecido no n.º 1 do artigo 153.º do mesmo Código.

Uma vez que o autor não apresentou qualquer reclamação nos termos dos artigos 668.º e 669.º citados, o trânsito em julgado daquele acórdão do Supremo Tribunal de Justiça ocorreu, efectivamente, em 13 de Março de 2000.

É certo que o n.º 5 do artigo 145.º do Código de Processo Civil permite que, independentemente de justo impedimento, o acto processual sujeito a prazo peremptório possa ainda ser praticado depois de decorrido esse prazo, desde que a prática do acto ocorra dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo peremptório, ficando a sua validade dependente do pagamento de multa.

Porém, conforme se afirmou no acórdão deste Supremo Tribunal, de 10 de Fevereiro de 2004, proferido na Revista n.º 4156/03, da 6.ª Secção, «o prazo de três dias concedido pelo artigo 145.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, é um mero prazo de tolerância que não afecta a contagem do prazo para interposição do recurso, nem para apresentação de reclamações, nem, portanto, para o trânsito em julgado da decisão, prazo esse que é de apenas dez dias nos termos dos artigos 685.º, n.º 1, ou 153.º [ambos] do Código de Processo Civil, e que não é alargado por aquele n.º 5 do artigo 145.º» (em sentido contrário, cf. ABÍLIO NETO, Código de Processo Civil Anotado, 18.ª edição, Ediforum, Lisboa, 2004, p. 928, anotação ao artigo 677.º).

De facto, como se salienta no apontado aresto deste Supremo Tribunal, o texto do n.º 5 do artigo 145.º citado refere-se, expressamente, ao «termo do prazo» para a prática do acto processual, o que «mostra claramente que o legislador continua a considerar o prazo inicialmente fixado para a prática dos actos processuais, nomeadamente para a interposição de recurso ou reclamação, como um prazo autónomo, que se mantém inalterado, apenas concedendo por mera tolerância condicional um outro, subsequente, em condições que indica, mas que não impede que o primeiro se extinga».

Assim, o prazo máximo de condescendência para prática de acto processual mediante pagamento de multa, fixado no n.º 5 do artigo 145.º do Código de Processo Civil, não constitui um alargamento do prazo peremptório de que a parte legalmente dispõe para a prática do acto, antes configura um prazo suplementar, o aditamento de um novo prazo dentro do qual as partes têm ainda o direito de praticar o acto.
Nesta conformidade, aquele prazo suplementar só poderá contar para efeitos de determinação do trânsito em julgado da decisão se o direito de praticar o acto dentro desse prazo for efectivamente exercido ou, dito de outra forma, só o exercício do direito de praticar o acto dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo peremptório obsta à ocorrência do trânsito em julgado da decisão após o termo deste prazo.

No caso, o recorrente não praticou qualquer acto processual dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo de dez dias fixado para deduzir reclamação nos termos dos artigos 668.º e 669.º do Código de Processo Civil e daí que se imponha concluir que o trânsito em julgado do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de Fevereiro de 2000, ocorreu no dia 13 de Março seguinte.

2.2.2. Conforme resulta do disposto no n.º 2 do artigo 289.º do Código de Processo Civil, para que se mantenham os efeitos civis derivados da propositura de uma primeira acção, com citação do réu, em que este foi absolvido da instância, a nova acção deve ser intentada ou o réu citado para ela dentro de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância.

Ora, aos prazos para a propositura de acções previstos no Código de Processo Civil é aplicável o regime do artigo 144.º daquele mesmo Código (cf. n.º 4 do citado artigo 144.º), segundo o qual, esses prazos são contínuos, «suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticar em processos que a lei considere urgentes» (n.º 1).

Estas normas aplicam-se, subsidiariamente, nos processos de natureza laboral, em conformidade com o disposto no artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho.

Tendo o referido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça transitado em julgado em 13 de Março de 2000 e devendo considerar-se a presente acção proposta em 14 de Abril de 2000, já que a petição inicial respectiva foi remetida pelo correio, sob registo, naquela data [artigo 150.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil], não pode deixar de se entender que esta segunda acção foi instaurada para além do prazo de 30 dias previsto no n.º 2 do artigo 289.º do Código de Processo Civil, o qual expirou às 24 horas do dia 12 de Abril de 2000.

Por isso, sendo a citação do réu efectuada em data posterior à instauração da acção (14 de Abril de 2000), sempre esse acto interruptivo se produziu numa altura em que já se tinha completado o atinente prazo prescricional.

Sendo assim, e tal como bem salienta a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta neste Supremo Tribunal, «impõe-se concluir, como se concluiu no douto acórdão recorrido, que em 14.04.2000, data em que deu entrada em juízo a petição inicial que originou a presente acção, já se havia esgotado o prazo fixado no n.º 2 do artigo 289.° citado e daí que o Autor não possa beneficiar nesta acção da interrupção da prescrição resultante da citação do Banco Réu efectuada na 1.ª acção que correu termos na 2.ª Secção do 8° Juízo Cível de Lisboa».

2.2.3. Refira-se, enfim, que carece de apoio legal a reclamada aplicação do prazo máximo de três dias úteis subsequentes ao termo do prazo para propositura da presente acção, nos termos dos n.os 5 a 7 do artigo 145.º do Código de Processo Civil, fundada na pretensa submissão do prazo de propositura da segunda acção às regras dos prazos processuais, por via do disposto no n.º 4 do artigo 144 do mesmo Código.

Em matéria de interpretação das leis, o artigo 9.º do Código Civil consagra os princípios a que deve obedecer o intérprete ao empreender essa tarefa, começando por estabelecer que «[a] interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada» (n.º 1); o enunciado linguístico da lei é, assim, o ponto de partida de toda a interpretação, mas exerce também a função de um limite, já que não pode «ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso» (n.º 2); além disso, «[n]a fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados» (n.º 3).

O n.º 4 do artigo 144.º do Código de Processo Civil estabelece que os prazos para a propositura de acções previstos naquele Código, como é o caso do prazo de 30 dias estipulado no n.º 2 do seu artigo 289.º, seguem o regime dos números anteriores, ou seja, o regime dos n.os 1 a 3 do artigo 144.º referido.

Conforme já se explicitou supra, nos termos dos n.os 1 a 3 do artigo 144.º do Código de Processo Civil, esses prazos são contínuos, «suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticar em processos que a lei considere urgentes» (n.º 1) e quando se verifique que o prazo para a prática do acto processual termina «em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte» (n.º 2), devendo considerar-se, para esses efeitos, «encerrados os tribunais quando for concedida tolerância de ponto» (n.º 3).

Ora, o sentido da expressão «[o]s prazos para a propositura de acções previstos neste Código seguem o regime dos números anteriores», empregue no preceito em exame, pelo seu exacto teor literal e pela sua inserção sistemática em capítulo intitulado «Dos actos processuais», só pode ser entendido como referindo-se à submissão daqueles prazos ao concreto regime estabelecido nos n.os 1 a 3 do artigo 144.º do Código de Processo Civil, e não a outras regras pertinentes aos prazos processuais, nomeadamente, as dos n.os 5 a 7 do artigo 145.º do mesmo Código.
Se o legislador pretendesse a submissão dos prazos para a propositura de acções previstos no Código de Processo Civil às regras dos prazos processuais, certamente que o consagraria, expressa e literalmente, no inciso em apreciação.

Não podendo o intérprete considerar o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 9.º, n.º 2, do Código Civil), conclui-se que a norma do n.º 4 do artigo 144.º do Código de Processo Civil não determina a submissão dos prazos para a propositura de acções previstos naquele Código às regras dos prazos processuais, mas tão só ao regime dos n.os 1 a 3 daquele artigo 144.º, sendo que nesse regime não se incluem as regras fixadas nos n.os 5 a 7 do artigo 145.º do mesmo Código.

Tudo para concluir que o autor não beneficia na presente acção da eficácia interruptiva da prescrição da citação do réu ocorrida na primeira acção, uma vez que não observou o prazo previsto no n.º 2 do artigo 289.º do Código de Processo Civil.

Improcedem, pois, as conclusões 1.ª a 5.ª da alegação do recurso de revista.

2.3. O recorrente defende, por outro lado, que beneficia do prazo de dois meses, para se completar a prescrição, previsto no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil, porquanto o motivo que conduziu à absolvição do réu da instância na primeira acção não lhe pode ser imputável, em termos de negligência, dado que essa absolvição não decorreu de razões de processo, mas antes de razões de índole substantiva relacionadas com a qualificação do contrato, e segundo a lei em vigor eram os tribunais civis os competentes para procederem à sua qualificação, conforme decorre do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Fevereiro de 2000.

O n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil prevê: «[s]e, por motivo processual não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o compromisso, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes dois meses».

O normativo transcrito tem por objectivo evitar a perda do direito quando, exercido ele a tempo, os efeitos desse exercício tenham sido afectados pela absolvição da instância, devido a motivo processual não imputável ao titular do direito, concedendo a lei a esse titular um novo prazo para exercer o direito.

Mantêm-se, assim, no caso de não imputabilidade do motivo da absolvição da instância ao autor, o impedimento da prescrição resultante da eficácia interruptiva da citação do réu na primeira acção.

Em anotação ao n.º 3 daquele artigo 327.º, PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA (Código Civil Anotado, vol. I, Coimbra Editora, 1967, p. 213) referem que, sobre os fundamentos que podem determinar a absolvição da instância há que atentar no artigo 288.º do Código de Processo Civil, afirmando, em seguida, que «[s]e esta absolvição se der por motivo imputável ao titular do direito, a doutrina aplicável é a do n.º 2 e não a do n.º 3 do artigo 327.º».

Portanto, se o motivo processual da absolvição da instância for imputável ao autor, repõe-se o regime previsto nos artigos 326.º, n.º 1, e 327.º, n.º 2, do Código Civil, começando a correr um novo prazo prescricional logo após o acto interruptivo.

Mas qual é o sentido rigoroso da imputabilidade ao autor do motivo da absolvição da instância?

Imputar significa atribuir um facto concreto ao seu agente.

Contudo, a imputação de um facto envolve dois momentos distintos: um objectivo, em que se relaciona a acção ao seu agente, e um outro subjectivo, em que se opera a delimitação da culpa ou da responsabilidade de um acto, ajuizando sobre a eventual censura do comportamento, doloso ou negligente, do agente.

No dizer de ANSELMO DE CASTRO (ob. cit., p. 274), «[d]ifícil será, na verdade, o caso em que seguramente possa dizer-se que a absolvição da instância não seja imputável ao autor».

Já para VAZ SERRA («Prescrição Extintiva e Caducidade», em Boletim do Ministério da Justiça, n.º 106, Maio, 1961, p. 257, nota 1010, 3.º §), pode não ser imputável a negligência do titular do direito o facto de se ter proposto a acção num tribunal incompetente, por exemplo, «por ser difícil a interpretação da lei sobre a competência».

E prossegue este AUTOR na nota citada, «[p]arece, pois, de dispor que, se o pedido judicial é rejeitado por algum motivo processual, não imputável ao autor, tem este um prazo suplementar de sessenta dias para fazer valer o seu direito, caso o prazo da prescrição tenha findado entretanto, contando-se aquele prazo da publicação ou notificação da sentença, conforme ela não deva ou deva ser notificada».

Ora, tendo sobretudo em conta considerações teleológicas ligadas à razão de ser da norma (ratio legis) e ao fim visado pelo legislador ao consagrar o princípio da manutenção do efeito interruptivo da prescrição em nova acção, quando ocorra absolvição da instância na primeira acção, entende-se que a definição conceitual de «motivo processual não imputável ao titular do direito», explicitado no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil, deve alicerçar-se, essencialmente, na ideia de culpa - é este, aliás, o comando legal implícito na solução da lei.

Resulta, pois, do exposto que para a absolvição da instância ser imputável ao titular do direito basta que este tenha agido com mera culpa, a qual deve ser apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.

No caso vertente, a absolvição da instância na primeira acção proposta pelo autor teve como fundamento a incompetência absoluta do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, em razão da matéria, uma vez que o contrato celebrado entre as partes se tratava de um contrato de trabalho, sendo materialmente competentes para conhecer da causa os tribunais do trabalho.

A quem é, pois, imputável a absolvição da instância?

Na acção proposta, em 2 de Março de 1994, no Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, o autor alicerçou a causa de pedir no não cumprimento por parte do Banco réu de um contrato que designou por «contrato misto, resultante da conjugação de um contrato de prestação de serviço por avença, com subordinação económica e a garantia da segurança de qualquer empregado bancário, com um contrato individual de trabalho, sem a subordinação jurídica do empregado», sendo certo que, entre os factos articulados na petição inicial, o autor invocou que «[...] o Banco, sem qualquer explicação, deu a conhecer ao Autor, pela Comunicação de Serviço Interno n.º 67/DPTRB/PR, de 3 de Janeiro de 1989, que a partir de 1 de Janeiro desse ano o Autor passava a ser considerado empregado do Banco, em regime de trabalhador por conta de outrem para efeitos fiscais», factualidade que provou documentalmente (cf. documentos n.os 2 e 3 juntos com a petição inicial).

Ora, se o próprio autor reconhecia a sua subordinação económica em relação ao Banco réu, com «a garantia da segurança de qualquer empregado bancário», e admitia que o contrato ajustado entre as partes compreendia prestações características do contrato individual de trabalho, e se o réu, por sua parte, considerava que o autor, a partir de 1 de Janeiro de 1989, estava juridicamente vinculado ao Banco por um contrato de trabalho e não por um contrato de prestação de serviço, isto com pleno conhecimento do autor, era elementar o dever de instauração da acção no tribunal materialmente competente para conhecer das questões emergentes de relações de trabalho subordinado, isto é, no tribunal de trabalho, tanto mais que, quanto aos créditos resultantes do contrato de trabalho, a LCT, afastando-se do regime instituído no Código Civil, estabelecia um prazo de prescrição curto, de apenas um ano.

Acresce que, tal como se decidiu no acórdão da Relação de Lisboa, de 24 de Junho de 1999, confirmado pelo acórdão deste Supremo Tribunal, de 24 de Fevereiro de 2000, os factos apresentados a julgamento naquela primeira acção «integram, sem margem para dúvidas, os elementos fundamentais caracterizadores do contrato de trabalho», permitindo «ver que o que importava para o agravante [o Banco réu] não era propriamente o resultado do trabalho do A., mas antes a actividade deste trabalhador, segundo as directivas que aquele, a todo o momento, entendesse dar--lhe», sendo que «os factos provados não nos deixa dúvidas quanto à verificação de um vínculo de subordinação jurídica do A. ao R., pelo que o contrato entre eles celebrado é um verdadeiro contrato de trabalho».

Assim, atendendo ao condicionalismo próprio da primeira acção proposta, é de imputar ao autor o vício da incompetência absoluta de que padecia a acção e, por conseguinte, a absolvição do réu da instância, uma vez que não empregou a diligência normal que seria de exigir a um profissional do Direito na ponderação dos pressupostos processuais relativos ao tribunal - a sua competência em razão da matéria -, face à evidência dos elementos característicos do contrato de trabalho.

Neste sentido, cf. os acórdãos deste Supremo Tribunal de 21 de Outubro de 1993 (Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, ano I, tomo III, 1993, pp. 79-81) e de 2 de Outubro de 1996 (Revista n.º 8/96, da 4.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt/jstj - documento n.º SJ199610020000084).
Aliás, como se afirma na contra-alegação do Banco recorrido:

«O recorrente, advogado em causa própria, não pode alegar ser possuidor de apenas um discernimento próprio de um bónus paterfamilias para efeitos de interpretação e qualificação dos contratos. Ele tem uma formação académica e profissional - não de um jovem iniciado, mas de um profissional experiente com largos anos de carreira [...] - que o torna num indivíduo especialmente apto para qualificar, correctamente, o seu contrato de trabalho. E só a especial persistência que pretende fazer passar para o exterior o pode ter levado a instaurar a primeira acção no Tribunal Cível, persistência que se mantém, após todas as decisões e demonstrações, como o documenta a seguinte passagem, a fls. 24, in fine, das alegações a que se responde:
"O recorrente até pede vénia para confessar que ainda não está convencido da qualificação que o Tribunal fez do seu contrato."
Tendo em consideração a fundamentação de todas as decisões proferidas nas várias instâncias e as qualificações do recorrente, o caso afigura-se não ser apenas de culpa, mas de dolo e este nem como (sic) referência ao discernimento de um bonus paterfamilias, de instrução média, é desculpável.»

Não se verifica, assim, o pressuposto de que depende a aplicação da norma prevista no n.º 3 do artigo 327.º do Código Civil.

Nesta conformidade, à data em que o autor instaurou a presente acção no Tribunal do Trabalho de Lisboa (14 de Abril de 2000), para fazer valer os direitos invocados na anterior acção proposta no Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, já esses direitos resultantes do contrato de trabalho celebrado entre as partes estavam abrangidos pela prescrição invocada pelo réu.

Apenas se acrescentará, porque o recorrente alega que «o motivo que conduziu à absolvição do réu da instância na primeira acção não lhe pode ser imputável, em termos de negligência, dado que essa absolvição não decorreu de razões de processo, mas antes de razões de índole substantiva relacionadas com a qualificação do contrato, e segundo a lei em vigor eram os tribunais civis os competentes para procederem à sua qualificação, conforme decorre do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Fevereiro de 2000», que, por um lado, a dita absolvição do réu da instância ocorreu, claramente, por falta de um pressuposto processual relativo ao tribunal - a competência em razão da matéria -, geradora da incompetência absoluta do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, e, por outro lado, que nem a questão da qualificação do contrato celebrado pelas parte se revelava, no caso, como uma questão complexa, face à evidência dos elementos característicos do contrato de trabalho, nem era difícil a interpretação da lei sobre a competência, que estabelecia a competência dos tribunais do trabalho para conhecer, em matéria cível, das questões emergentes de relações de trabalho subordinado, tudo a apontar no sentido de carecer de suporte fáctico e de apoio legal a alegada necessidade de prévia apreciação pelos tribunais civis da qualificação do contrato ajustado entre as partes.

Improcedem, pois, as conclusões 6.ª a 8.ª da alegação do recurso de revista.

3. Em derradeiro termo, o recorrente sustenta que o acórdão recorrido interpretou mal as disposições legais referidas, e que essa interpretação, mormente as dos n.os 2 e 3 do artigo 327.º do Código Civil, inviabilizou a garantia constitucional de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva do recorrente, bem como os princípios da proporcionalidade e da tutela da confiança de todos os cidadãos na resolução jurisdicional dos seus litígios, contemplados, respectivamente, nos artigos 20.º, n.os 1, 4 e 5, e 202.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

Tal asserção consta já, em termos idênticos, no corpo da alegação do recurso de revista, consubstanciando uma mera afirmação conclusiva.
Na verdade, a recorrente não cuidou de explicitar no corpo da alegação do recurso, nem na síntese conclusiva, qual a censura concreta que pretendia dirigir ao acórdão recorrido nesse exacto domínio, não demonstrando em que termos é que o decidido pelo tribunal recorrido afronta as anteditas normas da Lei Fundamental.

Ora, se o recorrente não fundamenta, nem esclarece em que termos é que a interpretação daqueles preceitos «inviabilizou a garantia constitucional de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva do recorrente, bem como os princípios da proporcionalidade e da tutela da confiança de todos os cidadãos na resolução jurisdicional dos seus litígios», não é possível apreciar tal questão.

De todo o modo, sempre se dirá que não se descortina a invocada violação do artigo 9.º do Código Civil, nem se vê como pode a interpretação operada no acórdão recorrido quanto às disposições legais referidas, inviabilizar os sobreditos princípios e garantias constitucionais.

Improcedem, pois, as restantes conclusões da alegação do recurso de revista.

III

Pelo exposto, decide-se negar a revista e confirmar o acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 15 de Novembro de 2006
Pinto Hespanhol
Vasques Dinis
Fernandes Cadilha