Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
07B4233
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: PEREIRA DA SILVA
Descritores: GRAVAÇÃO DA PROVA
NULIDADE PROCESSUAL
PRAZO DE ARGUIÇÃO
Nº do Documento: SJ200801170042332
Data do Acordão: 01/17/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : I - Consubstancia nulidade processual secundária (art. 201º nº1 e 204º, " a contrario", do CPC), a arguir mediante reclamação, nos termos do art. 205º nºs 1 e 3 do supracitado diploma legal, a deficiência (ou mesmo inexistência) de gravação da prova prevista no art. 9º do DL nº 39/95, de 15 de Fevereiro.
II - Não constando dos autos a data da entrega da cópia a que alude o art. 7º nº 2 do nomeado DL, deve ter-se por tempestiva a arguição da nulidade processual radicada no vertido em I., operada nas alegações do recurso de apelação.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I. A) AA, intentou acção declarativa, com processo comum, ordinário, contra BB, pedindo, por mor do que fls. 3 a 7 mostram, na procedência da acção:
1. Que seja declarada nula e de nenhum efeito a justificação notarial titulada por escritura pública outorgada a 19-09-01, exarada de fls. 87 a 88 v. do livro de notas para escrituras diversas e testamentos nº 860-A do Cartório Notarial de Montalegre.
2. A condenação da ré a pagar-lhe indemnização, a liquidar em execução de sentença, por danos não patrimoniais.
b) Contestou BB, como decorre de fls. 92 a 96, pugnando pela justeza da improcedência da acção e procedência da deduzida reconvenção, com consequente condenação de AA a:

1. Reconhecer a reconvinte como proprietária dos prédios identificados na escritura pública por ela outorgada, a que se alude em a) 1.
2. Abster-se de, "por qualquer forma ou modo", perturbar o direito da recorrente sobre esses prédios.
c) Na réplica, propugnou AA o acerto do decreto do naufrágio da reconvenção.
d) Prolatado despacho saneador tabelar, foi seleccionada a matéria de facto tida como assente e organizada a base instrutória.
e) Observado o demais de lei, procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, com gravação dos depoimentos, em cumprimento do ditado no art. 522º-B do CPC.
f) Sentenciada a improcedência da acção e a procedência da reconvenção, com absolvição de BB do pedido por AA e:
1. Declaração de que "a ré é a proprietária de todos os prédios identificados na escritura de justificação notarial lavrada em 19/09/2001, a fls. 87 a 88 verso do Livro de notas para escrituras diversas número 860-A do Cartório Notarial de Montalegre, e certificada a fls. 34 a 38, por tê-los adquirido por usucapião".
2. Condenação do "autor a reconhecer esse direito da ré e a abster-se por qualquer forma ou modo de perturbar esse direito" de BB, apelou o autor-reconvindo.
g) Junto ao processo documento comprovativo do falecimento da ré-reconvinte, foi suspensa a instância, como impõe o art. 277º nº 1 do CPC.
h) Proferida decisão declarando CC e DD como únicas e universais herdeiras de BB, "prosseguindo elas, na posição de demandadas/ reconvintes" a acção, cessada a suspensão da instância (art. 284º nº 1 a) do CPC), após incidências processuais cujo relato é, em absoluto, desinteressante para o julgamento deste recurso, alegou AA a apelação, a 1ª conclusão, em tal sede, tirada tendo sido do teor seguinte:

"... O julgamento deverá ser anulado por falta de gravação do depoimento da testemunha EE que serviu de fundamento para dar resposta positiva aos quesitos 3, 12, 14, 15 e 16 e por ser impossível proceder à impugnação do mesmo".
i) O TRP, por acórdão de 15-03-07, como flui de fls. 508 a 526, julgou improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida, no seguinte tendo filiado o não acolhimento do vertido na predita conclusão:
"... IV - 1) A primeira questão suscitada é a da falta de gravação do depoimento de EE.
A falta de gravação de algum depoimento, quando requerida, constitui omissão de acto prescrito por lei e, porque susceptível de influir no exame e decisão da causa, tem por efeito a anulação do julgamento e actos subsequentes dependentes (artigo 201º/1, 522º-B, 522º-C do CPC), para se repetir o depoimento cujo registo magnetofónico se omitiu ou foi feito de forma deficiente que inviabiliza a sua apreciação (art.s 690º-A / 1 e 2, e 712º / 1 e 4, do CPC).

As audiências finais, os depoimentos, informações e esclarecimentos nelas prestados são gravados quando alguma das partes o requeira ou o tribunal o ordene oficiosamente, sendo a gravação efectuada, em regra, por sistema sonoro, nos termos dos art.s 522º-B e 522º-C do CP Civil (normas introduzidas pelo DL 39/95, de 15/02).
O registo da prova tem a utilidade de permitir ao tribunal, em caso de dúvida no momento da decisão da matéria de facto, a reconstituição do conteúdo do acto de produção de prova e a função de permitir às partes o recurso dessa decisão, que de outro modo escapa ao controlo do Tribunal da Relação. Se a gravação não se mostrar feita de forma que permita percepcionar o depoimento da testemunha, poder apreciar-se na sua globalidade, não só impede a parte discordante da decisão da matéria de facto de motivar fundadamente o recurso que interponha para dar cumprimento ao ónus que sobre ela recai nos termos do artigo 690º-A/ 1 e 2, do CPC, como impossibilita o tribunal de recurso de reapreciar a questão de facto, quanto aos pontos desta de cujo julgamento o recorrente discorda, nos termos do artigo 712º/1, al. a), 2 e 4, do CPC).
Sucede que não é qualquer omissão que importa a repetição do depoimento, omitido na gravação ou em relação ao qual haja deficiência de gravação. É necessário que a omissão afecte a possibilidade de aferir do sentido do depoimento, que impossibilite a sua reapreciação.
No caso da omissão da gravação de depoimento ou da sua deficiência, que constitua nulidade, anular-se-ia a decisão da matéria de facto e todos os actos subsequentes dependentes para repetir a prestação do depoimento omitido na gravação ou com gravação deficiente, sem que se tenham de repetir os demais depoimentos que se encontrem gravados (o que não inibe o tribunal de renovar o ou os que entenda necessários).

Na espécie, da audição da gravação do depoimento da testemunha EE (inquirida por teleconferência) verifica-se que este se encontra gravado, ao contrário do que é referido pelo Exmo recorrente e é perceptível o sentido do depoimento - se bem que, por o som ser demasiado baixo (a denotar alguma menor atenção na realização da gravação), algumas das expressões proferidas pela testemunha, por inaudíveis, não se decifram. Porém, na generalidade, consegue entender-se o depoimento e, sobretudo, o sentido global e essencial do mesmo. Daí que não se vê necessidade, para se poder apreciar esse depoimento, de ordenar a sua repetição, com consequente anulação do julgamento para esse efeito.

"Improcede a questão."
j) A 19-03-07, foi expedida carta registada ao mandatário do autor/reconvindo notificando-o do supracitado acórdão, deste lhe tendo sido enviada fotocópia (cfr. fls. 528).
k) A 12-04-07, interpôs AA recurso, para o STJ, da nomeada decisão do TRP (cfr. fls. 530).
l) O recurso instalado para este Tribunal foi admitido por despacho de 03-05-07 (cfr. fls. 541), notificado ao recorrente por carta registada expedida a 04-05-07 (vide fls. 542).
m) Por requerimento apresentado a 01-06-07, AA impetrou prazo para alegar, aduzindo existir justo impedimento para tal, prazo esse nunca inferior a 30 dias após a notificação da transcrição, pelo TRP, da "quarta cassete", "ainda que a expensas do recorrente", já que, mais alegou, em abono de tal pretensão:
Ter solicitado "cópias das cassetes áudio que constam dos autos para proceder à elaboração das alegações" para o TRP, tendo-lhe sido enviadas quatro cassetes.
"Conforme consta da acta de audiência de julgamento é referido que na cassete nº 4 lado A, consta o depoimento da testemunha EE".
Ter o recorrente verificado, após a audição dessa cassete, que não constava nenhum depoimento na cassete nº 4 lado A ou B, "conforme cassete que se junta".
Ter recorrido "tendo como base, entre outras, a anulação da audiência de julgamento por não constar o depoimento da testemunha, já referido".
Acontecer que quando o TRP se pronunciou "sobre esse facto referiu expressamente que de facto estava gravado o depoimento em causa, apesar de ter partes inaudíveis."
Ter a mandatária do recorrente, após tal facto, com o intuito de pessoalmente "verificar se de facto constava algum depoimento nessa cassete nº 4", efectivado deslocação ao Tribunal da Relação.
Constar, de facto, embora "com grandes lacunas, sobretudo quanto à voz da depoente", o referido, na cassete nº 4, lado A.
Ter, entretanto, o recorrente, já solicitado a uma empresa para que certificasse que na cassete que tem em seu poder, enviada pelo Tribunal de Montalegre, nada consta, certificação essa que foi realidade, de harmonia com o constante de doc. junto como nº 1.

n) Por despacho de 06-06-07, do Exmo Sr. Desembargador relator, foi indeferido o requerido, enunciado em m) - cfr. fls. 565 -, despacho esse de que, sem êxito, embora, reclamou AA para a conferência - cfr. requerimento apresentado a 22-06-07 (fls. 583 a 586) e acórdão de 20-09-07 (vide fls. 597 e 598), decisão esta não impugnada.
o) A 05-06-07, apresentara o irresignado autor / reconvindo as alegações do recurso interposto para este Tribunal, as seguintes conclusões tendo formulado:
" 1) Embora a audiência de julgamento tenha sido gravada, foram omitidas partes essenciais do depoimento prestado pela testemunha EE que serviu de fundamento a respostas positivas aos quesitos 3, 12, 14, 15 e 16 da base instrutória;
2) A cópia da gravação desse depoimento facultada à recorrente encontrava-se totalmente em branco;
3) É insuficiente que o Tribunal recorrido tenha considerado entender a generalidade do depoimento e sobretudo o seu sentido global e essencial;
4) Foi violado o direito ao recurso e á impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, previstos nos artigos 712º, nº 1, al. a) e 690º-A, nº 1, do Código de Processo Civil;
5) Termos em que deverá ser concedida a revista e revogado o douto Acórdão recorrido, ordenando-se a repetição do julgamento com nova prestação do depoimento da testemunha EE".
p) Contra-alegações não houve.
q) Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. Eis como se configura a materialidade fáctica dada como provada na decisão sob recurso, doravante tão só, como "acórdão", denominada:
a) Em escritura lavrada no dia 19 de Setembro de 2001, na casa de residência de FF, sita na freguesia de Fiães do Rio, concelho de Montalegre, pelo 1º ajudante do Cartório Notarial de Montalegre, que consta a fls. 87 a 88 verso do Livro de notas para escrituras diversas número 860-A do referido Cartório Notarial, foi declarado, pela ora ré BB, que ali interveio como primeira outorgante, que era dona, com exclusão de outrem, dos seguintes bens imóveis, situados na freguesia de Contim, concelho de Montalegre:
1º . prédio rústico situado no lugar do Vale do Forno de Dentro, em Vilaça, composto de cultura arvense de sequeiro, com a área de 360 m2, a confrontar do Norte e Nascente com GG, do Sul com HH e do Poente com II, inscrito na respectiva matriz sob o art. 1554, em nome da ré e não descrito na Conservatória do Registo Predial de Montalegre;
2º. prédio rústico situado no lugar da Fontela, em Vilaça, composto de cultura arvense de sequeiro, com a área de 4.800 m2, a confrontar do Norte e Nascente com JJ, do Sul com KK e do Poente com o caminho, inscrito na respectiva matriz sob o art. 1568, em nome da ré, e não descrito na Conservatória do Registo Predial de Montalegre;
3º. prédio rústico situado no lugar das Touças, em Vilaça, composto de mata mista, com a área de 19.800 m2, a confrontar do Norte com BB, do Sul com o ribeiro, do Nascente com o caminho e do Poente com o rio Cávado, inscrito na respectiva matriz sob o art. 1677, em nome da ré, e não descrito na Conservatória do Registo Predial de Montalegre;
4º. prédio rústico situado no lugar do Penedo, em Vilaça, composto de cultura arvense de sequeiro, com a área de 520 rn-, a confrontar do Norte com LL, do Sul com MM, do Nascente com NN e do Poente com o caminho, inscrito na respectiva matriz sob o art. 1721º, em nome da ré, e não descrito na Conservatória do Registo Predial de Montalegre;
5º . prédio rústico situado no lugar da Cortinha, em Vilaça, composto de cultura arvense de regadio, com a área de 1.350 rn-, a confrontar do Norte, Sul e Poente com caminho e do Nascente com OO, inscrito na respectiva matriz sob o art. 1736, em nome da ré, e não escrito na Conservatória do Registo Predial de Montalegre;
6º. prédio rústico situado no lugar de Palheiros, em Vilaça, composto de lameiro, com a área de 1.500 rn-, a confrontar do Norte com PP, do Sul com QQ, do Nascente com caminho e do Poente com RR, inscrito na respectiva matriz sob o art. 1615º, em nome da ré, e não descrito na Conservatória do Registo Predial de Montalegre. (a) (2)

b) Mais declarou a ré, na referida escritura: «Que não tem qualquer título donde resulte pertencer-lhe o direito de propriedade desses prédios, mas iniciou a sua posse em 1970, ano em que os adquiriu por compra meramente verbal a SS, viúva, residente que foi no referido lugar de Vilaça». (b)
c) E declarou ainda que: «desde essa data, sempre tem usado e fruído os prédios, cultivando-os e colhendo os seus frutos, pagando todas as contribuições por eles devidas e fazendo essa exploração com a consciência de ser a sua única dona, à vista de todo e qualquer interessado, sem qualquer tipo de oposição, há mais de vinte anos, o que confere à sua posse a natureza de pública, pacífica, contínua e de boa fé, razão pela qual adquiriu o direito de propriedade sobre os ditos prédios por USUCAPIÃO, que expressamente invoca para efeitos dos mesmos no registo predial». (c)
d) Em 1970, a SS, referida na dita escritura como tendo sido a pessoa a quem a ré comprou os prédios aí identificados, estava casada, no regime da comunhão geral de bens, com TT. (d)
e) O casamento da SS com TT foi celebrado civilmente em 29/11/1961 e só foi dissolvido por óbito do marido em 22/10/1984.(e)
f) O autor é filho dos referidos TT e SS. (f)
g) Por morte do TT, sucederam-lhe, como únicos herdeiros, a SS, cônjuge sobrevivo, e o autor, na qualidade de filho. (g)
h) No processo de imposto sucessório instaurado por óbito de TT, o ora autor apresentou uma relação de bens, que integrava, entre outros, os seguintes prédios:

. 2/54 da propriedade da Cancela, composta de lameiro da cancela, monte das Touças, lameiro Novo e terra Nova, com os artigos matriciais nº 2005, 2007, 2008, 2334 e 2335, que no seu todo confronta do Nascente com o caminho, do Norte e Poente com o rio e do Sul com UU;
. 1/4 da terra da Cortinha, inscrita na matriz predial sob os artigos 2173º e 2174º, que no seu todo confronta do Nascente com VV, do Norte e Sul com caminho e do Poente com XX;
. 1/3 do lameiro de Palheiros, inscrito na matriz predial sob o artigo 1975, e que no seu todo do Nascente com caminho, do Norte, com ZZ, do Poente com AA' e do Sul com BB'. (h)

i) Ainda em vida TT, a ora ré interveio em escritura lavrada em 13/08/1980, no Cartório Notarial de Montalegre, na qualidade de procuradora de CC' e esposa DD', na qual declarou vender ao referido TT, que declarou comprar, uma terça parte indivisa do prédio rústico denominado "Terra ou Cortinha" por cima do "Poço ou Fonte", que no seu todo confrontava do Norte com caminho público, do Sul e Nascente com EE' e do Poente com FF' e GG', inscrito na matriz predial rústica da mesma freguesia de Contim, do concelho de Montalegre, sob o artigo 2148º. (i)
j) A SS faleceu em 10/04/99, no estado de viúva, sucedendo-lhe, como único e universal herdeiro, o autor, seu filho. (j)
1) Em 1 de Janeiro de 1997, entrou em vigor no concelho de Montalegre o novo cadastro matricial rústico, que alterou a numeração dos artigos matriciais e actualizou as respectivas descrições. (1)
m) No ano de 1985, por acordo meramente verbal, SS, com o conhecimento e o consentimento do autor, seu filho, declarou vender à ré BB, sua irmã, que aceitou comprar, os prédios rústicos identificados supra na al. a) sob os nºs 1 (prédio no vale do Forno de Dentro), 2º (prédio na Fontela), 5º (prédio na Cortinha) e 6º (lameiro nos Palheiros) e ainda 1/3 do prédio das Touças, ali identificado sob o número 3º. (3) (3).
n) O prédio da Cortinha, supra identificado na al. a) sob o nº 5, foi comprado pelos pais do autor, em 1976, a CC' e Celeste'. (7)
o) Os artigos matriciais mencionados na relação de bens a que alude a al. h) supra, apresentada para efeitos do imposto sucessório por óbito de TT, pai do autor, são os que vigoraram até 31/12/1996. (9)
p) Após a vigência das novas matrizes prediais, os prédios identificados supra na al. a) sob os nºs 1, 2, 3 e 5, com os artigos matriciais nº 1554º, 1568º, 1677º e 1736º, respectivamente, estiveram inscritos na matriz em nome da mãe do autor, SS, até 16/08/2001. (10)
q) Os prédios referidos na alínea anterior com os artigos matriciais nº 1554º, 1568º, 1677º e 1736º, passaram a figurar na matriz em nome da ré após o pagamento do imposto de sisa por esta, em 16/08/2001. (11)
r) A ré vem agricultando, arando, fertilizando, irrigando, plantando árvores, cortando lenha e madeira neles produzida, cultivando batatas e couves, semeando milho e centeio, cultivando produtos hortícolas diversos, tais como cebola, feijão e abóboras, e colhendo os respectivos frutos e produções, nos seis prédios rústicos supra identificados na al. a), desde há mais de 20 anos consecutivos no prédio do Penedo, ali identificado sob o nº 4, e em parte correspondente à fracção de 2/3 do prédio nas Touças, ali identificado sob o nº 3, e a partir do ano de 1985, após a sua compra à mãe do autor, conforme supra referido na al. 1), também nos prédios do Vale do Forno de Dentro, da Fontela, da Cortinha e dos Palheiros ali identificados sob os nºs 1º, 2º, 5º e 6º, e em todo o prédio das Touças, ali identificado sob o nº 3 (12).
s) Os actos descritos na alínea anterior, nos períodos temporais aí referidos, têm sido praticados pela ré consecutivamente, dia após dia e ano após ano (14).
t) Têm sido praticados à vista de toda a gente e sem oposição de alguém (15).
u) Na convicção de estar a utilizar-se de coisa sua e sem lesar interesses e direitos alheios (16).

III. 1. Também, já que urge não obliterar, desde logo, as questões de conhecimento oficioso, as conclusões da alegação do recorrente balizando o âmbito do recurso (art.s 684º nº 3 e 690º nº 1 do CPC, Corpo de Leis este a que pertencem os ditames legais que se vierem a chamar à colação sem indicação de proveniência outra), o tecer das seguintes considerações, a título introdutório, como pertinente se antolha, tais conclusões sopesadas:
a) Após o fecho da audiência final, qual o prazo de arguição do vício de natureza processual, nulidade (art. 201º nº 1), a levar a cabo mediante reclamação a que se reporta o art. 205º nº 1 (cfr. Alberto dos Reis, in "Comentário ao Código de Processo Civil", vol. 2º, pág. 507, e, entre muitos outros, acórdãos do STJ, de 09-07-02, in CJ/Acs. STJ, Ano X-tomo II, págs. 153 a 155, e de 12-04-05, proferido nos autos de revista registados sob o nº 621/05-6ª), consistente na gravação deficiente (ou mesmo inexistente) dos depoimentos, informações e esclarecimentos nela prestados, impeditiva, em termos puramente fácticos, da reapreciação da prova já produzida em sede de recurso para tanto interposto?
Duas orientações se debatem, relativamente a tal questão, como noticiado em acórdão deste Tribunal, de 12-05-05 (agravo nº 4530/04-7ª), aresto em que, quanto à temática em dissecação, se deixou dilucidado o seguinte:
A primeira tese, "sustentando que o prazo de arguição do vício de deficiência de gravação, é de dez dias" (art. 153º nº 1), e que se inicia "imediatamente após o termo da audiência de discussão, ou, pelo menos, após a data de entrega à parte da cópia da gravação (a parte deve então diligenciar, dentro do aludido prazo, pela audição dos registos magnéticos, presumindo-se um comportamento negligente da mesma parte -ou do respectivo mandatário- caso não efectue esta audição) ", surge-nos sufragada em acórdãos do STJ de 22-02-01 (revista nº 3678/00-7ª), 24-05-01 (revista nº 1362/01-7ª), 20-05-03, 08-0703, 29-01-04, 13-01-05 (todos publicados in WWW.dgs.pt/jstj), enquanto que a segunda corrente jurisprudencial, "defendendo que não é exigível à parte -ou ao seu mandatário- que proceda à audição dos registos magnéticos antes do início do prazo de recurso (relativo à reapreciação da decisão sobre a matéria de facto), sendo no decurso deste prazo que surge a necessidade de uma análise mais cuidada do conteúdo dos referidos registos e, com ela, o conhecimento de eventuais vícios da agravação que podem ser alegados na própria alegação do recurso entretanto interposto", essa, é seguida em acórdãos deste Tribunal de 23-10-01 (agravo nº 3235/01-6ª), 12-03-02 revista nº 4057/01-1ª), 24-10-02 (publicado em WWW.dgsi.pt/jstj), 05-06-03 (agravo nº 1242/03-2ª), 20-06-03 (revista nº 1583/03-2ª), 20-11-03 (revista nº 3607/03-2ª) e já invocado, de 09-07-02.

Pois bem, em retorno à hipótese vertente:
b) Perfilhamos, deixa-se consignado, a segunda orientação.
Em qualquer circunstância, "in casu", como sublinhado nos citados acórdãos de 09-07-02 e 12-05-05, uma vez que, compulsados os autos, se não divisa qual a data da entrega da cópia da gravação ao recorrente, sendo impossível afirmar que tal aconteceu mais de dez dias antes da apresentação das alegações da apelação, há que ter como atempada a arguição do vício da gravação, consistente na invocada falta daquela, no atinente ao depoimento da testemunha EE, vício esse que AA veio a reconhecer não ser um facto (cfr. II.m).
Não assim, porém, no tocante à invocada ausência de gravação do depoimento de tal testemunha na "cópia da cassete áudio", nº 4, lado A "ou, mesmo B, que lhe foi enviada pelo Tribunal Judicial de Montalegre.
Não arguiu qualquer nulidade, frise-se, no prazo legal, o de dez dias, contado a partir da data em que deve considerar-se notificado do "acórdão". Nulidade prevista no art. 201º nº 1, entenda-se, secundária (art. 204º, a contrario), repousante, insiste-se, na 2ª omissão à liça trazida. Que foi serôdia a invocação da omissão citada em II. m), brota inequívoco do plasmado nos art.s 153º nº 1 e 205º nº 1.
Não pode, sob pena de violação, desde logo, do art. 145º nºs 1 e 3, para além de ausência de arguição pelo meio processualmente adequado, o já expresso, encontrar salvatério, ser suprida, através da invocação da omissão em sede de alegação do recurso para este Tribunal, independentemente da veracidade do alegado.
c) Quanto à, só na alegação da revista, sustentada deficiência da gravação do depoimento da testemunha EE (conclusões 1), 3), 4) e 5)):
Vindo assente pelo TRP, apreciando a matéria de facto, num raciocínio puramente prático (não normativo), que o depoimento da testemunha EE, sem embargo do demais enunciado em II. j), é perceptível, conseguindo entender-se na generalidade, sobretudo o seu sentido essencial, tal desaguando na desnecessidade, ao arrepio do pretendido por AA, da repetição a que se alude na conclusão 5), falece, de igual sorte, a pretensão recursória, ancorada no sintetizado nas conclusões nesta alínea em causa, indúbio como é que pelo STJ não são sindicáveis tais meros factos materiais, tal-qualmente resulta dos art.s 722º nº 2 e 729º nº 2 - cfr. referido acórdão de 12-05-05 e acórdão do STJ, de 19-09-02 (doc. nº SJ200209190024122, disponível in WWW.dgsi.pt/jstj).

2. Enfim:
Não colhendo, em absoluto, o levado às conclusões enunciadas em I.o), em ordem à evidenciação do mérito do recurso, não sendo cabido o desencadear a aplicação dos art.s nº 2 e 729º nº 3, a factualidade que como definitivamente fixada se tem e a descrita em II., a qual se não impõe reescrever.
Por assim ser, em crise não estando a bondade da encontrada solução de direito, ante tal acervo factual, não esquecido o âmbito do recurso, este não merece provimento, também pelos fundamentos expostos no "acórdão, não paradigma de violação dos preceitos legais invocados pelo autor / reconvindo, aqueles se acolhendo, na íntegra, e para os mesmos se remetendo, com justo arrimo no art. 713º nº 5, "ex vi" do disposto no art. 726º.

IV. CONCLUSÃO:
Termos em que, sem necessidade de outras considerações, se nega a revista, confirmando-se o "acórdão".
Custas pelo recorrente (art. 446º nºs 1 e 2).

Lisboa, 17 de Janeiro de 2008

Pereira da Silva
Rodrigues dos Santos
João Bernardo
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(2) Entre parênteses a alínea correspondente dos factos assentes.
(3) Entre parênteses o número do quesito correspondente.