Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06B1835
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: OLIVEIRA BARROS
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
CENTRO NACIONAL DE PENSÕES
SUB-ROGAÇÃO
UNIÃO DE FACTO
DIREITO A ALIMENTAÇÃO
DANO
MORTE
INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: SJ200607110018357
Data do Acordão: 07/11/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : I - O subsídio de funeral pago pelo Centro Nacional de Pensões constitui prestação a coberto do art.495º, nº1º, C.Civ., tem a natureza de indemnização dum dano, e representa verba exigível ao lesante pelos titulares do direito à indemnização, pelo que há lugar à subrogação prevista no art.16º da Lei nº28/84, de 14/8.

II - Conquanto não envolva deveres jurídicos de entreajuda, a união de facto comporta-os de ordem moral e social, pelo que a convivência marital de longa duração, mais a mais se cimentada com a criação de filhos, bem que não determinando obrigação legal, gera obrigação natural de prestação de alimentos ao companheiro/a, em termos de cabimento da previsão do art.495º, nº3º, C.Civ.

III - Há lugar à indemnização do dano previsto no art.495º, nº3º, independentemente da necessidade efectiva de alimentos, e tão só determinados nesse preceito os titulares da indemnização a que se refere, isto é, a quem é devida, o seu montante não é balizado pela medida de prestação alimentar reportada ao disposto nos arts.2003º, nº1º, e 2004º, nº2º, todos do C.Civ.

IV - O direito de indemnização atribuído aos lesados indirectos na hipótese prevenida no art.495º, nº3º, tem, como qualquer outro, a medida estabelecida nos arts.562º ss, devendo o quantum dessa indemnização repor a situação que existia no momento da lesão, conforme arts.562º, 564º e 566º, todos do C.Civ.

V - A norma excepcional do nº2º do art.496º C.Civ. não é aplicável ao denominado cônjuge de facto.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça :

Em 10/1/2000, na EN 333, em Á-dos-Ferreiros, concelho de Águeda, ocorreu um acidente de viação que vitimou AA, BB e mulher CC, e DD, que seguiam como passageiros no veículo de matrícula XZ, conduzido no sentido Talhadas-Águeda por este último, que tinha transferido a responsabilidade pela circulação desse veículo para a Empresa-A.

O predito veículo foi embatido pelo pesado de mercadorias de matrícula VU conduzido por EE sob as ordens e direcção da proprietária do mesmo, Empresa-B , cuja responsabilidade civil por danos causados a terceiros tinha sido transferida para a Empresa-C, através de contrato titulado pela apólice nº 4101579514.

Seguindo em sentido oposto ao do veículo primeiro mencionado, aquele veículo pesado galgou o eixo da via e invadiu parcialmente a hemifaixa contrária, onde ocorreu o embate.

"FF", que vivia em união de facto com a falecida AA, e os filhos de ambos, GG, HH e II, todos ...., solteiros, menores, representados pelo pai, e JJ, KK, LL, MM e NN, todos também ...., moveram às Companhias de Seguros referidas acção declarativa com processo comum na forma ordinária destinada a exigir a responsabilidade civil emergente deste sinistro, que foi distribuída ao 1º Juízo da comarca de Águeda.

Dita demandada a Europeia por cautela, com vista a salvaguardar o direito à indemnização, atribuíram ao condutor do pesado a culpa do acidente, por seguir desatento e com velocidade inadequada. Reclamaram despesas com o funeral no montante global de 229.500$00. Alegaram que, saudável e trabalhadora, a falecida tinha 54 anos de idade e auferia, na sua actividade agro-pecuária, um rendimento (mensal) superior a 60.000$00, com que contribuía para o sustento da família, o que, tendo em conta o tempo provável de vida activa da mesma, representa um prejuízo de 10.080.000$00, devendo a privação do direito à vida computar-se em 10.000.000$00, e terem todos os AA sofrido muito com esta perda, devendo ser compensados com o montante individual de 3.500.000$00. Pediram a condenação das Rés a pagar-lhes a quantia global de 51.809.500$00 (€ 258.424,69), acrescida de juros de mora a contar da citação.

Ambas as Rés contestaram, excepcionando a 1ª (Empresa-C ) a ilegitimidade do 1º A. Mais impugnando parte dos factos articulados, alegou, em síntese, que o pesado invadiu a hemi-faixa contrária em virtude de avaria ocorrida na respectiva direcção, não tendo o seu condutor conseguido evitar a colisão, e o exagero dos montantes peticionados. A 2ª Ré (Europeia) aceitou a descrição do acidente feita na petição, de que não constam factos de que resulte a responsabilidade do condutor do veículo por si seguro, e impugnou, por desconhecimento, os danos sofridos.

Houve réplica em que se fundou a legitimidade do 1º A. no facto de a finada contribuir para o seu sustento e alimentos e se impugnou a versão do acidente adiantada pela 1ª Ré (Empresa-C ).

O Centro Nacional de Pensões deduziu contra as demandadas pedido de reembolso do montante de 569.490$00, sem prejuízo da eventual actualização desse valor no decurso da audiência, relativo aos valores pagos a título de subsídio por morte e pensões de sobrevivência no período de Fevereiro de 2000 a Janeiro de 2001.

A Ré Tranquilidade contestou esse pedido, alegando, em resumo, que o acidente ocorreu em virtude do bloqueio da direcção do pesado, que o levou a ultrapassar o eixo da via, apesar da tentativa de tal evitar por parte do condutor.

Por sua vez, OO, PP, QQ, todos ...., e RR, SS, e TT, ambos ..., e UU, moveram às mesmas seguradoras acção declarativa com processo comum na forma ordinária, que foi distribuída ao 2º Juízo da mesma comarca, destinada a exigir a responsabilidade civil emergente do predito acidente, de que, como referido, foram igualmente vítimas BB e mulher CC, de que estes AA. são filhos, tal como VV, de que requereram a intervenção provocada

Referindo-se ao acidente em termos idênticos aos alegados na acção primeiro referida, aditaram ter efectuado despesas com o funeral, no montante global de 420.000$00, que os falecidos tinham, respectivamente, 52 e 51 anos de idade, e eram saudáveis e trabalhadores, devendo a privação do direito à vida computar-se individualmente em 10.000.000$00, e terem todos sofrido muito com a perda dos pais, pelo que devem ser compensados com o montante individual de 5.000.000$ 00.

Pediram a condenação das Rés a pagar-lhes a quantia global de 52.920.000$00 ( € 263.963,85 ), acrescida de juros de mora a contar da citação.

Estas deduziram, ambas, contestação, em termos idênticos aos das oferecidas na acção primeiro mencionada.

O Centro Nacional de Pensões ( CNP ) deduziu contra a Ré Empresa-C um pedido de reembolso no montante de 154.500$00, relativo aos valores que pagou por morte do falecido, seu beneficiário, a título de despesas de funeral.

Houve réplica, com impugnação da versão do acidente apresentada por aquela Ré.

A mesma contestou o pedido do CNP em termos idênticos aos adiantados na predita acção anterior, alegando que apenas poderia responder pelo risco.

Foi admitido o chamamento da referida VV, que interveio, fazendo seus os articulados apresentados pelos AA e pedindo para si iguais valores.

A Ré Empresa-C contestou também este pedido, em termos idênticos aos da contestação do articulado inicial.

A interveniente VV apresentou réplica, impugnando a versão da contestante. Finalmente :

XX e ZZ e AAA, ambos ...., viúva e filhos de DD, moveram acção declarativa com processo comum na forma ordinária à Empresa-C, que foi distribuída ao 3º Juízo da comarca referida.

Descrevendo o acidente em termos idênticos aos adiantados nas acções mencionadas, aditaram ter a A. efectuado despesas com o funeral no montante global de 260.000$00 e ter o veículo, que valia 600.000$00, ficado irrecuperável ; que o falecido, com 46 anos de idade, era saudável e trabalhador e exercia a actividade de motorista, auferindo o vencimento de mensal de 99.150$00, além de executar outros trabalhos, devendo os danos computar-se, a esse título, na quantia de 19. 630.800$00 ; dever a privação do direito à vida estimar-se em 10.000.000$00 ; e que todos eles sofreram muito com a perda do marido e pai, pelo que devem ser compensados com o montante individual de 3.000.000$00.

Pediram a condenação da Ré a pagar-lhes a quantia global de 39.515.800$00 ( € 197.103,98 ), com juros de mora a contar da citação.

O Centro Nacional de Pensões deduziu contra a Ré um pedido de reembolso no montante de 477. 080$00, relativo ao pago a título de subsídio por morte.

A Ré contestou esse pedido em termos idênticos aos adiantados nas acções já referidas.

Houve réplica, com impugnação da versão apresentada pela Ré.

Foi ordenada a apensação das três acções mencionadas, relativas ao mesmo acidente.

No saneador relegou-se para final o conhecimento da excepção de ilegitimidade do A. FF.

Então indicados os factos assentes e fixada a base instrutória, no decurso da audiência de discussão e julgamento, o Centro Nacional de Pensões requereu a ampliação dos pedidos relativos às prestações por morte dos beneficiários falecidos DD e AA, para os montantes de € 10.725,89 e € 18.039,02, respectivamente.

Após julgamento, foi, em 11/10/2004, proferida sentença do Círculo Judicial da Anadia que julgou o A. FF parte ilegítima quanto ao pedido de condenação das Rés a pagar-lhe a quantia de 3.500.000$00 a título de danos não patrimoniais próprios que a morte de AA lhe causou, absolvendo-as, nessa parte, da instância, e absolveu a Ré Empresa-A, de todos os demais pedidos contra ela deduzidos.

A Ré Empresa-C, foi, ainda, absolvida do pedido, deduzido na acção atrás mencionada em segundo lugar, de reembolso de subsídio de funeral pago pelo Centro Nacional de Pensões, no montante de € 770,64 ( 154.500$00 ) e competentes juros de mora.

Essa Ré foi, porém, condenada a pagar : - aos AA FF e filhos GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM e NN o montante global de € 193.117,24, já deduzido o valor recebido do CNP a título de pensões de sobrevivência, com juros de mora, à taxa legal sucessivamente vigente, desde 13/10/ 2000, data da citação, até integral pagamento, absolvendo-a do mais pedido na acção primeiro mencionada ; - aos AA OO, PP, QQ, RR, SS, TT e UU e à interveniente VV o montante global de € 280.843,43, já deduzido o valor recebido do CNP a título de subsídio de funeral, com juros de mora, à taxa legal sucessivamente vigente, desde 29/9/2000, data da citação, até integral pagamento, tendo sido absolvida do mais pedido na acção atrás mencionada em segundo lugar ; - aos AA. XX, ZZ e BBB, o montante global de € 159.324,95, já deduzido o valor recebido do CNP a título de pensões de sobrevivência, com juros de mora, à taxa legal sucessivamente vigente, desde 9/10/2000, data da citação, até integral pagamento, tendo sido absolvida do mais pedido na última das acções supramencionadas.

A mesma seguradora foi, ainda, condenada a reembolsar o Centro Nacional de Pensões das quantias de € 15.174,94 e de € 8.346,23 pagas a título de pensões de sobrevivência, com juros de mora, à taxa legal sucessivamente vigente, a contar da notificação para contestar esses pedidos, que ocorreu, respectivamente, em 1/3/2001 e em 20/11/2000, tendo sido absolvida do mais pretendido pelo mesmo.

Aquela Ré e o Centro Nacional de Pensões (CNP) interpuseram recurso de apelação dessa sentença, tendo os AA das três acções referidas interposto recurso subordinado.

Por acórdão de 18/10/2005, a Relação de Coimbra julgou improcedentes os recursos da Ré seguradora e, subordinados, dos AA, com, porém, absolvição da Ré, em vez de, nessa parte, da instância, do ( próprio ) pedido do A. FF no tocante à parcela indemnizatória relativa aos danos não patrimoniais próprios reclamados por morte da companheira falecida (1) , e o esclarecimento de que a indemnização por danos patrimoniais referida na terceira das acções aludidas cabe apenas à A. XX, incidindo sobre ela as deduções do que foi pago a título de pensões de sobrevivência.

Julgou, mais, procedente, em parte, a apelação do CNP, em consequência do que condenou a Empresa-C, a pagar-lhe € 770, 54 a título de reembolso do subsídio de funeral.

É dessa decisão que esta seguradora pede, agora, revista, tendo os AA, que litigam com benefício de apoio judiciário, interposto recurso subordinado.

Para além do subsídio de funeral e do direito, ou não, do A. FF à indemnização prevista no art.495º, nº3º, C.Civ., está, de novo, em discussão no recurso principal o montante das parcelas indemnizatórias relativas ao dano da morte, ao da perda de alimentos, e aos danos morais próprios.

As questões (2) por sua vez propostas no recurso subordinado são a da legitimidade - processual, segundo a 1ª instância, visto que absolveu da instância, substantiva, no modo de ver da 2ª, posto que absolveu do pedido - do A. FF no tocante à compensação relativa aos danos não patrimoniais próprios reclamados por morte da companheira falecida, e, também, a da quantificação das parcelas indemnizatórias relativas à perda de alimentos e ao dano da morte, relativamente ao qual é uniformemente reclamado o montante de 10.00.000$00.

Houve contra-alegações, e, corridos os vistos legais, cumpre decidir.

A matéria de facto fixada pelas instâncias é, convenientemente ordenada (3), como segue :

A ) - Quanto ao acidente :

- Em 10/1/2000, pelas 18,50 horas, ao Km 29,550 da EN 333, na localidade de Á-dos-Ferreiros, concelho de Águeda, ocorreu um sinistro rodoviário em que foram intervenientes os veículos automóveis pesado de mercadorias de matricula VU, na ocasião pertencente à Empresa-B, e conduzido por EE, com o conhecimento e autorização da sua proprietária, e sob as ordens, direcção, e fiscalização desta, e o ligeiro de passageiros de matricula XZ, registado em nome de DD, e por ele conduzido.

- Este último seguia com as luzes acesas nos médios, a velocidade não superior a 50 Km/hora, e pela sua mão de trânsito, ou seja, pela hemi-faixa de rodagem direita, atento o sentido de marcha Talhadas-Águeda.

- Na ocasião do sinistro, seguiam como passageiros no veículo ligeiro referido AA, BB e CC.

- No local em que ocorreu, a estrada configura-se em recta, plana, com várias centenas de metros de extensão.

- Aos utentes dessa via é facultada plena visibilidade da faixa de rodagem, em toda a sua largura, numa distância de centenas de metros, o pavimento é asfaltado, e, no local, a via tem 6,10 metros de largura e bermas de ambos os lados da via com 1 metro cada, dispondo de duas hemi-faixas de rodagem e dois sentidos de marcha, delimitados no eixo da via por um traço contínuo.

- No sentido de marcha Águeda - Talhadas, e a anteceder o local onde ocorreu o sinistro, existe um sinal vertical que proíbe a circulação a mais de 60 Km/hora, e, ainda, um outro sinal vertical que avisa da aproximação de entroncamento.

- Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas, estava bom tempo e o piso da via encontrava-se em bom estado de conservação, enxuto e aderente.

- Aquando da ocorrência do sinistro, anoitecia ; havia iluminação pública no local ; a noite estava clara ; existia razoável visibilidade ; e processava-se na via aludida diminuto tráfego de automóveis, pessoas ou animais.

- O veículo pesado de matrícula VU circulava em sentido oposto ao do veículo ligeiro referido, ou seja, no sentido de marcha Águeda - Talhadas.

- Na ocasião, o condutor desse veículo não conhecia a EN 333, por onde circulava em viagem de reconhecimento do percurso, acompanhado de um sócio da proprietária do mesmo.

- O condutor do pesado imprimia-lhe uma velocidade superior a 90 Km/hora e a velocidade imediatamente antes do acidente era de 80 Km/hora.

- Seguia com menos atenção à estrada e ao trânsito e, por isso, ao Km 29,550 da EN 333 deixou que os rodados do lado esquerdo do pesado transpusessem a linha que separa as duas meias faixas de rodagem.

- O condutor do pesado deixou que os rodados do lado esquerdo invadissem parcialmente a hemi-faixa de rodagem esquerda considerado o sentido Águeda-Talhadas.

- Tendo então travado abruptamente o veículo que conduzia, de que perdeu o controlo, atrapalhando-se, guinou a direcção desse veículo para a esquerda, e, seguindo em derrapagem, em sentido oblíquo ao eixo da via, invadiu toda a hemi-faixa de rodagem esquerda, atento o sentido de marcha Águeda-Talhadas, e cortou a trajectória do veículo ligeiro referido.

- O pesado deixou no pavimento um rasto de travagem de 28,60 metros, após o que embateu no ligeiro como referido em seguida.

- O sinistro traduziu-se no embate do veículo pesado aludido, com a sua parte da frente do lado direito, na frente do ligeiro mencionado, e ocorreu na hemi-faixa de rodagem direita, atento o sentido de marcha Talhadas-Águeda, por onde este circulava, a cerca de 0,70 metros da berma direita, atento esse mesmo sentido de marcha.

- Após o embate, o pesado continuou a sua marcha, arrastando o ligeiro à sua frente e invadiu a berma direita da estrada, atento o sentido de marcha Talhadas-Águeda, vindo a imobilizar-se sobre um terreno agrícola que margina a EN 333 pelo lado direito, atento esse sentido de marcha.

- O pesado esmagou totalmente o ligeiro, deixando-o numa amalgama de chapas e ferros retorcidos.

- O condutor e os passageiros do veículo ligeiro foram vítimas mortais do sinistro.

- O veículo pesado referido foi sujeito a inspecções periódicas obrigatórias e a outras a que a proprietária procedeu, de moto próprio, com frequência, visando a manutenção do bom estado da viatura.

B ) - Quanto ao seguro :

- A proprietária do predito veículo pesado tinha transferido a responsabilidade civil emergente da circulação rodoviária desse veículo para a Ré Empresa-C, por contrato de seguro titulado pela apólice n° 4101579514, válido e vigente à data do sinistro.

- O proprietário do predito veículo ligeiro tinha transferido a responsabilidade civil emergente da circulação rodoviária desse veículo para a Ré Empresa-A, por contrato de seguro titulado pela apólice n° 00142583, válido e vigente à data do sinistro.

C ) - Quanto aos danos :

- AA nasceu em 8/4/45 e faleceu em 10/1/2000, no estado de solteira, com 54 anos de idade.

- Os AA. JJ, KK, LL, MM, NN, HH, GG e II nasceram, respectivamente, em 4/10/76, 4/2/78, 7/2/79, 9/10/80, 30/12/81, 16/6/83, 21/9/84, e 15/10/85, e são filhos da falecida AA e do A. FF.

- DD faleceu em 10/1/2000, com 46 anos de idade, no estado de casado no regime da comunhão geral de bens com a A. XX.

- Os AA ZZ e BBB nasceram, respectivamente, em 2/11/ 78 e 13/9/82, e são filhos do falecido DD e da A. XX.

- BB nasceu em 25/12/47 e faleceu em 10/1/2000, no estado de casado com CC.

- CC nasceu 1/6/48 e faleceu em 10/1/2000, no estado de casada com BB.

- Os AA. OO, PP, QQ, RR, SS, TT, UU, e VV nasceram , respectivamente, em 13/5/67, 13/4/68, 31/12/71, 13/2/73, 27/3/75, 10/3/76, 15/2/77, e 26/7/78, e são filhos dos falecidos BB e CC.

- AA era beneficiária da Segurança Social com o n° 116205112.

- Em consequência da morte de AA, o Centro Nacional de Pensões pagou a FF, por si e em representação de seus filhos menores NN, HH, GG e II, a titulo de pensões de sobrevivência e subsídio por morte, no período de Fevereiro de 2000 a Janeiro de 2001, o montante global de 569.490$00, e continuará a pagar a pensão de sobrevivência aos filhos dessa beneficiária enquanto estes se encontrarem nas condições legais, com inclusão de um 13° mês de pensão em Dezembro e 14° mês em Julho de cada ano, pensões essas cujo valor mensal actual é de 8.710$00 para cada filho.

- DD era beneficiário da Segurança Social com o n° 1116238254.

- Em consequência da morte de DD, o Centro Nacional de Pensões pagou à viúva XX, por si e em representação do filho menor BBB, a título de subsídio por morte, a importância de 477.080$00.

- BB era beneficiário da Segurança Social com o n° 116190467.

- Em consequência da morte de BB, o Centro Nacional de Pensões, pagou a QQ, a título de despesas de funeral, o montante de 154.500$00.

- Em virtude do sinistro, o corpo de AA ficou totalmente esmagado e irreconhecível no amontoado de chapas retorcidas do veículo ligeiro referido, com partes dos membros e vísceras espalhados pelo veículo, pelo solo e agarrados aos ferros do pesado.

- AA vivia com o A. FF, em comunhão de cama, mesa e habitação, fazendo uma vida e economia familiar como se casados fossem, há mais de 27 anos.

- Faleceu sem deixar legado, testamento ou outra disposição de última vontade.

- Não tinha outros filhos para além dos atrás identificados.

-Vivia com o seu companheiro, FF, ora A., e com os filhos de ambos.

- Era uma mulher forte, robusta, saudável, trabalhadora, bem constituída e jovial.

- Era respeitada, tendo um feitio sociável, expansivo, alegre, gozando de grande estima e carinho de quantos a rodeavam, que com ela adoravam conviver.

- Tinha uma vida harmoniosa com o companheiro e filhos, dando-se muito bem e sendo muito amigos.

- Era uma mulher digna, frontal, honesta, sendo o enlevo de seu companheiro e filhos.

- Generosa e franca, sempre se esforçou por tirar partido das suas capacidades de trabalho e por proporcionar aos seus familiares o prazer de a terem junto deles, sendo o amparo dos mesmos.

- Da sua morte resultou um profundo vazio em quantos a conheciam.

- Entre o A. FF e os AA. GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN e a falecida AA existia uma extrema proximidade e envolvência afectiva, constituindo uma família unida por fortes laços de amor, amizade, ternura e um elevado espírito de entreajuda.

- A morte de AA, deixou o companheiro e filhos, ora AA., em profunda dor e angústia.

- O óbito da mãe deixou os demais AA. privados da fonte de carinhos que aquela representava na altura em que mais dela precisavam, tendo afectado em especial os filhos menores GG, HH, DD, II e NN, que viviam ainda na dependência económica dos pais, tendo ficado afectado o são crescimento, o apoio social, moral e a formação para a vida que a mãe lhes proporcionaria.

- À data do sinistro, a falecida AA dedicava-se à actividade agro-pecuária, tendo várias terras de lavoura.

- Cultivava, produzia e colhia produtos agrícolas, milho, batata, feijão, cereais, frutas e outros produtos hortícolas, para o sustento do seu lar, podava a vinha, sulfatava-a, preparava o vinho e vendia-o, tinha um tractor e carta de condução de tractores, utilizando esse veículo para amanhar as suas terras e as de terceiros que a rogavam, e criava animais, nomeadamente gado bovino, suíno, coelhos, galinhas, patos e outros, para consumo do seu agregado familiar e para venda, o que tudo lhe proporcionava um rendimento superior a 60.000$00 mensais.

- Contribuía com aquelas importâncias para o sustento do companheiro, FF, ora A., e dos filhos, os AA., GG, HH, DD, II, e NN.

- Com a morte da companheira, AA, o A. FF passou a ter graves dificuldades económicas.

- O A. FF não é casado.

- É titular de créditos laborais.

- Quatro dos filhos do A. FF auferem rendimentos provenientes do seu trabalho.

- À data do acidente, tinha 3 filhos menores, estudantes, e uma filha maior, estudante, também a seu cargo, e agora tem, pelo menos, 2 filhos a estudar.

- Os demais filhos não reúnem quaisquer condições económicas ( para o ajudar ), estando endividados.

- Não tem outros familiares, ascendentes ou irmãos que reúnam condições para lhe proporcionar sustento.

- A falecida AA contribuía para sustentar os 4 filhos menores, designadamente com despesas de alimentação e roupa.

- O A. FF despendeu 154.500$00 na agência funerária que tratou do funeral de AA, gastou 25.000$00 em palmas de flores, 10.000$00 com ornamentações e velas, 10.000$00 para o coveiro, e 30.000$00 na compra de uma saia, uma blusa, um casaco e uns sapatos para vestir o corpo.

- DD faleceu sem deixar legado, testamento ou outra disposição de última vontade e deixou a suceder-lhe apenas a esposa e filhos atrás identificados.

- Mercê do acidente, o corpo do DD ficou totalmente esmagado no amontoado de chapas retorcidas do veículo ligeiro referido e com partes dos membros e vísceras espalhados pelo solo e também agarrados aos ferros do pesado.

- Era um homem forte, robusto, saudável, trabalhador e jovial.

- Era respeitado, tendo um feitio sociável, expansivo, alegre, gozando de grande estima e carinho de quantos o rodeavam, que com ele adoravam conviver.

- Vivia com a esposa XX e os filhos ZZ e BBB, com quem tinha uma vida harmoniosa, dando-se muito bem e sendo muito amigos.

- Era um homem digno, frontal, honesto, sendo o enlevo da esposa e filhos.

- Generoso e franco, esforçou-se sempre por tirar partido das suas capacidades de trabalho e por proporcionar aos seus familiares o prazer de o ter junto deles, sendo o amparo dos mesmos.

- Da sua morte resultou um profundo vazio em quantos o conheciam.

- Entre os AA. XX, ZZ e BBB e o falecido DD existia uma extrema proximidade e envolvência afectiva, constituindo uma família unida por fortes laços de amor, amizade, ternura e um elevado espírito de entreajuda.

- A morte de DD deixou a esposa e filhos, ora AA., em profunda dor.

- O óbito do pai deixou os filhos AAA e BBB, ora AA., privados da fonte de carinhos que aquele representava, na altura em que mais dele precisavam, o que afectou o são crescimento, o apoio social, moral e a formação para a vida que aquele lhes proporcionaria.

- À data do sinistro, DD exercia a sua actividade como motorista, ao serviço da firma Empresa-D, auferindo o vencimento médio mensal de 99.150$00.

- Além disso, ajudava a esposa no estabelecimento de café, trabalhava na construção da sua casa e no quintal da casa, cultivando e colhendo produtos agrícolas, o que lhe proporcionava um rendimento não inferior a 30.000$00 mensais.

- Em consequência da morte de DD, a A. XX viu-se privada daquelas importâncias, passando a ter graves dificuldades económicas.

- Essa A. despendeu 180.000$00 na agência funerária que tratou do funeral do DD, transladação do corpo e outros, 20.000$00 em palmas de flores, 10.000$00 com ornamentações e velas, 10.000$00 para o coveiro, e 40.000$00 na compra de um fato, uma camisa e uns sapatos para vestir o defunto.

- O veículo de matrícula XZ era um Citroen AX que antes do sinistro se encontrava em estado de novo, nunca tendo sofrido outro acidente, tendo o valor de 600.000$00.

- Por força do sinistro, sofreu grandes estragos, sendo a sua reparação totalmente inviável.

- Com o reboque desse veículo do local do sinistro para uma oficina de sucata, a A. XX gastou 25.000$00.

- BB e mulher CC faleceram sem deixar legado, testamento, ou outra disposição de última vontade e não tinham outros filhos para além dos atrás identificados.

- Mercê do sinistro, os corpos dos mesmos ficaram totalmente esmagados e irreconhecíveis no amontoado de chapas retorcidas do veículo ligeiro referido, com partes dos membros e vísceras espalhados pelo veículo, pelo solo e agarrados aos ferros do pesado.

- O falecido BB era um homem forte, robusto, saudável, bem constituído, trabalhador e alegre.

- Era respeitado, tendo um feitio sociável, expansivo, alegre, gozando de grande estima e carinho de quantos o rodeavam, que com ele adoravam conviver.

- A falecida CC era uma mulher forte, robusta, saudável, trabalhadora, bem constituída e jovial.

- Era respeitada, tendo um feitio sociável, expansivo, alegre, gozando de grande estima e carinho de quantos a rodeavam, que com ela adoravam conviver.

- Os falecidos BB e CC tinham com os filhos uma vida harmoniosa, dando-se muito bem e sendo muito amigos.

- Eram pessoas dignas, frontais, honestas, sendo o enlevo dos filhos.

- Generosos e francos, esforçaram-se sempre por tirar partido das suas capacidades de trabalho e por proporcionar aos seus familiares o prazer de os ter junto deles.

- Ajudavam os filhos moral, social e economicamente.

- Das suas mortes resultou um profundo vazio em quantos os conheciam.

- Entre os filhos de BB e CC, ora AA, existia uma extrema proximidade e envolvência afectiva, constituindo uma família unida por fortes laços de amor, amizade, ternura e um elevado espírito de entreajuda.

- A morte de BB e CC deixou os filhos, ora AA, em profunda dor e angústia.

- O óbito de BB deixou os filhos, ora AA., privados da força e confiança que lhes incutia e do apoio que representava.

- Os AA, filhos de BB e CC, despenderam 300. 000$00 na agência funerária que tratou do funeral dos pais, 20.000$00 para compor a urna e vestir o corpo, 20.000$00 com o coveiro para abrir as sepulturas, 30.000$00 em palmas de flores, e 50. 000$00 na compra de roupas para vestir e amortalhar os corpos.

São do C.Civ. todos os preceitos citados ao diante sem outra indicação.

A) - Recurso principal :

1ª questão : pedido do Centro Nacional de Pensões : subsídio de funeral :

A seguradora recorrente, insiste em que, como entendido na 1ª instância, se trata de prestação de natureza meramente social que nada tem de compensação por danos, limitando-se a ser uma atribuição patrimonial em função da morte do beneficiário que abstrai por completo da causa dessa morte (4) .

O art.16º da Lei nº28/84, de 14/8, em vigor ao tempo (5), dispunha que " no caso de concorrência, no mesmo facto, do direito a prestações pecuniárias dos regimes de segurança social com o de indemnização a suportar por terceiros, as instituições de segurança social ficam subrogadas nos direitos do lesado, até ao limite do valor que lhes cabe conceder ".

Pressuposto da subrogação legal, conforme art.592º, que recaia sobre o lesante a obrigação de indemnização face aos preceitos que regulam a responsabilidade civil, o subsídio de funeral é prestação a coberto do art.495º, nº1º, e tendo, como efectivamente tem, a natureza de indemnização dum dano, representa verba exigível ao próprio lesante pelos titulares do direito à indemnização.

Aliás, como notado em acórdão destes mesmos juízes de 25/9/2006, no Proc.nº1611/03, tem prevalecido neste Tribunal o entendimento de que a satisfação de prestações de segurança social concedidas em consequência de facto ilícito de terceiro civilmente responsável pelas consequências danosas que determinaram essas prestações gera, desde que já efectivamente pagas, sem restrição, o direito ao seu reembolso. Na realidade :

As prestações de segurança social não são cumuláveis com a indemnização a pagar por terceiro civilmente responsável : num tal caso, a segurança social, como referido no preâmbulo do DL 59/ 89, de 22/2, assegura provisoriamente a protecção do beneficiário, cabendo-lhe, em conformidade, exigir a quem for civilmente responsável o valor dos subsídios e pensões pagos. Irrestritivo o art.16º da Lei nº28/84, de 14/8, os serviços de previdência só se encontram efectivamente adstritos ao pagamento das prestações de segurança social enquanto compensatórias de perda fortuita : não quando resultem de factos imputáveis a terceiro geradores da obrigação de indemnizar. Como assim, no caso de concorrência de direito a essas prestações com o de indemnização por facto ilícito de terceiro, havendo um responsável pela prática de acto gerador de responsabilidade civil que seja causa também de prestações da segurança social, essas prestações não constituem encargo normal do Centro Nacional de Pensões : funcionam, em tal caso, como antecipação pela segurança social da indemnização pelo responsável, com o fim de imediata e provisória protecção dos beneficiários, e são da responsabilidade de quem praticou aquele acto - cfr., nomeadamente, arts.495º, nº1º, 562º e 564º. Mostra-se, por conseguinte, preenchida a previsão do art.593º, nº1º.

2ª questão : união de facto e dano da perda de alimentos (art.495º, nº3º ) :

Conquanto não envolva deveres jurídicos de entreajuda, não sofrerá dúvida séria que a união de facto os comporta de ordem moral e social.

Daí o entendimento de ARE de 21/4/95, BMJ 443/ 461 e do Ac.STJ de 14/10/97, CJSTJ, V, 3º, 61 (- VI e 65, 1ª col.) citados no acórdão recorrido, de que a convivência marital de longa duração, mais a mais se cimentada com a criação de filhos, bem que não determinando obrigação legal, gera obrigação natural de prestação de alimentos ao companheiro/a (6) .

É, nesta base, efectivamente de concluir pelo cabimento da previsão do art.495º, nº3º, em relação ao A. FF.

3ª questão : montante das parcelas indemnizatórias relativas ao dano da perda de alimentos, ao dano da morte e aos danos morais próprios :

Em contrário da tese da recorrente sublinhada na alegação respectiva a fls.816, penúltimo par., não são a necessidade da prestação alimentar e a sua medida - que reporta ao disposto nos arts. 2003º, nº1º, e 2004º, nº2º - que efectivamente balizam a indemnização do dano previsto no art. 495º, nº3º.

O direito de indemnização atribuído aos lesados indirectos na hipótese prevenida nesse preceito tem, como qualquer outro, a medida estabelecida nos arts.562º ss. .

Só determinados no art.495º, nº3º, os titulares da indemnização a que se refere, isto é, a quem é devida, o quantum dessa indemnização deve, conforme arts.562º, 564º e 566º, repor a situação que existia no momento da lesão.

Assim, e desde logo em vista dos arts.562º a 564º, em que se consagra a denominada teoria da diferença, o direito de indemnização de que são titulares as pessoas referidas no art.495º, nº3º, é, como, aliás, a própria letra desse preceito inculca (7), independente da necessidade efectiva de alimentos (8) .

Como, nomeadamente, estipulado no art.563º, - e bem que a tal limitada, como determina o advérbio " só " omitido na transcrição que segue -, " a obrigação de indemnização (...) existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão ".

Quer isto dizer que também aos lesados indirectos quer a lei que se atribua o que na realidade perderam : e vem isso, muito claramente, a ser tudo aquilo com que o lesado directo efectivamente os vinha beneficiando e provavelmente continuaria a beneficiar se não tivesse falecido

Com a morte do lesado directo ocorre efectiva perda patrimonial, em termos de previsíveis danos futuros, correspondente ao que o falecido vinha efectivamente prestando, ou, quando não assim, poderia eventualmente vir a prestar, à família.

Não fora a lesão do direito à vida do lesado directo, os ora recorridos, lesados indirectos ( ou por reflexo ) com essa morte, podiam sempre contar, com toda a probabilidade, beneficiar no futuro da parte dos rendimentos daquele que o mesmo lhes vinha habitualmente atribuindo ou poderia eventualmente vir a atribuir-lhes.

Os danos indemnizáveis ora em questão são, desde logo, constituídos por tudo quanto, independentemente do montante de alimentos eventualmente exigível, - e sem com tal, enfim, qualquer correlação -, o lesado directo efectivamente prestava, e com toda a probabilidade continuaria a prestar, à família, incluindo o cônjuge de facto, se fosse vivo.

De modo nenhum, enfim, se justifica a pretendida aplicação do disposto no art.729º, nº3º, CPC.

Quanto à medida desta indemnização, observa-se ser notório, nos termos e para os feitos do art.514º, nº1º, CPC, que o trabalho na agricultura se prolonga normalmente para além dos 65 e até aos 70 anos de idade ; mas não também até aos 75, dado o esforço físico que dum modo geral envolve. Bem sabido é, ainda, que os filhos dependem cada vez mais até mais tarde dos pais.

A decisão das instâncias no âmbito do disposto no art.495º, nº3º, ajusta-se aos critérios de determinação da indemnização que vêm sendo utilizados neste Tribunal, e não se vê que, nesta parte, mereça qualquer censura.

No respeitante ao dano moral constituído pela privação do direito à vida ( dano da morte ), observar-se-á que na mais recente jurisprudência deste Tribunal a compensação atribuída pela perda desse direito vai sendo com frequência fixada em 10.000.000$00 ( = € 50.000 ), valor correspondente ao considerado em decisão do Provedor de Justiça de 19/3/2001, publicada no DR, II Série, nº96, de 24/4/2000 (Parte VIII, nº56.).

Valendo em relação aos danos não patrimoniais os factores mandados considerar pelo art.494º, para que remete a 1ª parte do nº3º do art.496º, nada, em todo o caso, também neste plano bem se vê que efectivamente cumpra censurar ao conforme entendimento das instâncias. E também em sede de danos morais próprios de modo nenhum se revelam exorbitantes as verbas indemnizatórias consideradas pelas instâncias, antes equilibradas, de harmonia com os padrões jurisprudenciais comuns.

Dirigidas as conclusões 14ª e 15ª da alegação da seguradora recorrente, a fls.822 dos autos, à sentença apelada, de que se reclama a nulidade prevista na al.e) do nº1º do art.668º, de óbvio modo relacionada com a proibição da condenação ultra vel extra petitum adiantada no art.661º, nº1º, e obscuridade, em relação à qual se recorda o início do nº1º do art.669º, todos do CPC, a redacção dessas conclusões esquece que o que está agora em recurso não é aquela sentença, mas sim o acórdão sob revista.

Este, nas respectivas págs.32 ( 2ª parte ) e 33, a fls.726 e 727 dos autos, esclareceu perfeitamente inexistir a nulidade arguida, - de que também ele de modo algum enferma, nem de qualquer obscuridade -, dizendo claramente que a verba global constante da parte dispositiva da sentença era devida nos termos antes referidos na mesma, ou seja, tomando em conta o devido a cada um dos AA, tudo conforme discriminação feita dos valores pretendidos, só quanto à parcela indemnizatória relativa à perda de alimentos, pedida em conjunto pelo companheiro sobrevivente e os filhos menores da falecida ( artigo 128º da petição) se tendo optado por atribuí-la, também como pedido, sem destrinça, a todos os AA que a reclamaram.

B ) - Recurso subordinado :

Sendo certo que a questão a resolver em sede de legitimidade é a da titularidade do direito, logo, porém, em face da petição era de concluir pela inexistência do direito do A. FF a compensação pelos danos não patrimoniais próprios reclamados por morte de AA, com quem vivia em união de facto.

Como assim, teve, parece, razão, a 1ª instância, face ao disposto no nº3º do art.26º CPC, ao absolver as demandadas da instância em relação a esse pedido, menos bem se tendo julgado na 2ª estar-se perante questão de fundo.

Institucionalmente protegido o casamento enquanto plena e solenemente assumida comunhão de vida, vem-se mantendo recusada a equiparação plena da união de facto àquele outro instituto.

Desta sorte, logo o art.11º proibiria a aplicação, por analogia, da norma excepcional do nº2º do art.496º ao denominado cônjuge de facto, tanto em relação aos danos não patrimoniais próprios, como aos surgidos na esfera da própria vítima e depois adquiridos nos termos desse preceito. Mas assim afastada, nos termos do art.9º, nº2º, a própria interpretação extensiva, revela-se, afinal, intencional a omissão da Lei nº 7/2001, de 11/5, a esse respeito, não tendo, na verdade, tido seguimento o art.31º do Projecto de Lei nº 384/VII, do PCP, em que expressamente se previa a equiparação referida para efeitos de atribuição de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais fundada em responsabilidade civil.

Os tribunais superiores - v., v.g., Acs. STJ de 23/4/98, CJSTJ, VI, 2º, 149, e de 4/11/2003, CJ STJ, XI, 3º, 133 e e ARC de 19/10/2004, CJ, XXIX, 4º, 28, citados pelas instâncias - têm afastado a inconstitucionalidade da norma do art.496º,nº2º, por não serem as uniões de facto equiparáveis, para esse efeito, ao casamento, não assistindo direito a indemnização por danos não patrimoniais a quem vivia em união de facto, ainda que estável e duradoura, com a vítima de acidente de viação. E bem, realmente, não se vê que esse entendimento importe efectiva violação do princípio constitucional da igualdade, visto que na verdade se trata de situações diferentes.

No estado actual da lei e dos costumes, não tem tido acolhimento a degradação do casamento a " pressuposto meramente formal ".

Da quantificação das parcelas indemnizatórias relativas à perda de alimentos e ao dano da morte disse-se já quanto baste.

Destarte analisadas as questões suscitadas pelas partes, alcança-se a decisão que segue :

Nega-se provimento tanto ao recurso principal, como ao recurso subordinado.

Custas pelos respectivos recorrentes, sem prejuízo do benefício concedido nesse âmbito.

Lisboa, 11 de Julho de 2006
Oliveira Barros - relator
Salvador da Costa
Ferreira de Sousa
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(1) Foi requerido e prestado esclarecimento nesse sentido.
(2) E só tal há que referir, conforme arts.713º, nº2º, e 726º CPC.

(3) V., com apropósito, Antunes Varela, RLJ, 129º/51.
(4) A Relação julgou, quanto a este subsídio, de harmonia com a doutrina de ARP de 11/5/2004, CJ, XXIX, 3º, 175.

(5) Foi revogada pela Lei nº17/2000, de 8/8 ( art.118º), por sua vez revogada pela Lei nº32/2002, de 20/12 ( art.132º). O art.16º da Lei nº28/84 está hoje substituído pelo art.71º da Lei nº32/2002, que mantém o mesmo texto.
(6) Pronunciou-se em contrário ARL de 17/3/92, CJ, XVII, 2º, 167, mas em contexto diferente, anterior à densidade conferida à união de facto pelas Leis nºs 153/99, de 28/8, e 7/2001, de 11/5.

(7) Na verdade, o art.495º, nº3º, refere tão-somente a possibilidade de exigir alimentos.

(8) V. Vaz Serra, RLJ, 108º/183-1.