Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
687/17.5T8PNF.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ROSA TCHING
Descritores: AUTORIDADE DO CASO JULGADO
EXTENSÃO DO CASO JULGADO
TERCEIRO
ABSOLVIÇÃO DO PEDIDO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
SOCIEDADE
SÓCIO
Data do Acordão: 09/13/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA E BAIXA DOS AUTOS À RELAÇÃO
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / ARTICULADOS / CONTESTAÇÃO / EXCEÇÕES / REQUISITOS DA LITISPENDÊNCIA E DO CASO JULGADO.
Doutrina:
- Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, Anotado, Volume III, 3.ª Edição, reimpressão, Coimbra Editora, 1981, p. 139 ; Eficácia do Caso Julgado em Relação a Terceiros, Boletim da Faculdade de Direito, Vol. XVII, 1940-1941, p. 208;
- António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, II Volume, 3.ª Edição, p. 341;
- Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2.ª Edição, 1985, p.726 a 729;
- Castro Mendes, Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, Edições Ática, p. 43 e 44;
- Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, p. 305, 306, 312 a 314, 318 e 356;
- Miguel Teixeira de Sousa, Objecto da Sentença e Caso Julgado Material, BMJ, n.º 325, p. 171 a 179.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 581.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TIRUBNAL DE JUSTIÇA:


- DE 21-10-1993, IN CJSTJ, ANO I, TOMO II, P. 84;
- DE 12-01-1995, IN CJSTJ, ANO III, TOMO I, P. 19;
- DE 14-03-2002, PROCESSO N.º 02B428, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 13-12-2007, PROCESSO N.º 07ª3739, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 06-03-2008, PROCESSO N.º 08B402, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 23-11-2011, PROCESSO N.º 644/08.2TBVFR.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 20-06-2012, PROCESSO N.º 241/07.0TLSB.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 15-01-2013, PROCESSO N.º 816/09.2TBAGD.C1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 02-06-2016, PROCESSO N.º 116/11.3TBVVD.G2.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 22-02-2018, PROCESSO N.º 3747/13.8T2SNT.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I. A autoridade de caso julgado formado por decisão proferida em processo anterior, cujo objecto se insere no objecto da segunda, obsta que a relação ou situação jurídica material definida pela primeira decisão possa ser contrariada pela segunda, com definição diversa da mesma relação ou situação, não se exigindo, neste caso, a coexistência da tríplice identidade mencionado no artigo 581º do Código de Processo Civil.

II. No que concerne à extensão do caso julgado a terceiros, importa distinguir:

i) – os terceiros juridicamente indiferentes, a quem a decisão não produz nenhum prejuízo jurídico, porque não interfere com a existência e validade do seu direito, mas pode afetar a sua consistência prática ou económica, ficando, por isso, abrangidos pela  eficácia do caso julgado;

ii) – os terceiros juridicamente prejudicados, titulares de uma relação jurídica independente e incompatível com a das partes ( definida pela sentença), os quais não são atingidos pelo caso julgado alheio;

iii) – os terceiros titulares de uma relação ou posição dependente da definida entre as partes por decisão transitada, a quem se tem reconhecido a eficácia reflexa do caso julgado;

iv) – os terceiros titulares de relações paralelas à definida pelo caso julgado alheio ou com ela concorrentes, considerando-se, quanto às primeiras, que o caso julgado só se estende às partes e, quanto às segundas que, se a lei não exigir a intervenção de todos os interessados, só lhes aproveita o caso julgado favorável.

III. Não tendo o ora autor intervindo em ação anterior, intentada por uma sociedade da qual era sócio, contra uma das ora rés, a decisão absolutória, nela proferida e transitada em julgado, e que negou à sociedade autora o reconhecimento do direito de propriedade sobre metade de um prédio rústico, não tem força nem autoridade de caso julgado na ação posterior, proposta pelo autor contra esta mesma ré e outros e em que a questão decidenda consiste em saber se o autor é titular do direito de propriedade sobre o prédio urbano, entretanto edificado sobre o mesmo prédio rústico e que alterou a sua natureza jurídica.

IV. É que, não sendo o ora autor “parte” na referida ação, apresentando-se, antes, como um terceiro, estranho ao processo e titular de uma relação jurídica independente e incompatível com a das partes, não pode o mesmo ser atingido pelo caso julgado alheio.

V. A condenação por litigância de má fé só deverá ocorrer quando se demonstre, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu dolosamente ou com grave negligência, com o objetivo de impedir ou a entorpecer a ação da justiça.

Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

2ª SECÇÃO CÍVEL


I – Relatório


1. AA instaurou ação com processo comum contra BB e mulher, CC; DD e mulher, EE; FF - Sociedade Imobiliária, Lda e GG - Imobiliária, S.A., pedindo que seja:

a) Declarada nula ou anulada a venda feita pela escritura referida na alínea d) do artigo 7 da petição inicial por violação do disposto no artigo 1º do DL 281/99 de 26/7 e por simulação e, subsequentemente a venda do mesmo imóvel feita na execução fiscal nº 17…7;

b) Ordenado o cancelamento do registo de aquisição a favor dos réus DD e mulher e da sua antecessora, a ré FF, sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número 6… de …, L….

c) Reconhecido que o autor tem direito a 50% da sociedade FF, Ldª, bem como a 50% dos lucros pela mesma distribuídos aos sócios desde 2002,

Subsidiariamente se assim não for entendido:

d) Condenados os réus BB e mulher a pagarem ao autor o valor correspondente a metade do valor da sociedade FF, Ldª, lucros distribuídos e dinheiros pagos aos sócios em valor a apurar até à sentença ou, se tal não for possível, em momento ulterior em incidente de liquidação.


2. Citados, os réus contestaram, por exeção e por impugnação.

Excecionaram, relativamente a todos os pedidos formulados pelo autor, a autoridade do caso julgado formado pela sentença absolutória proferida na ação nº 474/01, proposta pelo ora autor contra a ora ré “FF” e que não reconheceu ao autor a qualidade de “sócio oculto” desta sociedade nem o direito a exigir, para si ou para terceiro por si indicado, a titularidade de 50% do seu capital social, ou, em alternativa estabelecida no seu próprio interesse, a exigir a transferência da propriedade de metade indivisa de cada um dos referidos imóveis, nas descrições que tivessem à data da formulação da pretensão.

Mais excecionaram a ilegitimidade dos réus, BB, CC, DD e EE; a ilegitimidade do autor para peticionar os pedidos formulados nas alíneas a) e b) da petição inicial; a ineptidão da petição inicial, por incompatibilidade substancial dos pedidos formulados; a caducidade do direito do autor pedir a anulação da venda feita em execução fiscal e a incompetência material do tribunal comum para conhecer deste mesmo pedido.


3. Na sua resposta, o autor pugnou pela improcedência das invocadas exceções.


4. Foi proferido despacho que indeferiu o pedido de intervenção principal provocada do “Liquidatário da sociedade GG, SA, formulado pelo autor, admitindo, porém, a ampliação do pedido formulado na alínea a), no sentido de ser também declarada nula ou anulada a venda feita por escritura de 10.02.2000 a fls. 82 do Livro 43-C do Segundo Cartório Notarial do Porto, por violação do disposto no artigo 1º do DL nº 281/99, de 26.07.   


 5. Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho saneador que:

a) Considerando eficaz a autoridade do caso julgado formado pelas sentenças transitadas em julgado e proferidas na ação nº 474/01, do 3º Juízo do Tribunal Judicial de …, e na ação nº 1373/06.7T8FLG, do 1º Juízo do Tribunal Judicial de …, julgou a presente ação improcedente quanto a todos os réus “FF - Sociedade Imobiliária, Lda.”, BB e mulher CC, DD e mulher EE e “GG, S.A.” e, em consequência, absolveu os mesmos de todos os pedidos contra si deduzidos nesta ação, ficando preteridas as demais questões invocadas pelos réus.

b) Condenou o autor, por litigância de má fé, numa multa de montante igual a duas vezes o valor da taxa de justiça devida na ação declarativa, bem como numa indemnização a pagar aos réus, consistente no reembolso das despesas que os mesmos tiveram que efetuar, incluindo os honorários dos mandatários, cuja liquidação relegou para momento posterior.


6. Inconformado com esta decisão, o autor dela interpôs recurso per saltum para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

«I. O autor na presente ação acumulou duas pretensões distintas:

a) Uma de reivindicação (implícita por nunca lhe ter sido desapossado) de propriedade do prédio da alínea d) do artigo 7º da petição, cuja usucapião alegou nos artigos 29º a 33º da petição, pedindo a anulação da escritura referida na alínea d) do artigo 7º e o cancelamento do registo de aquisição do prédio a favor dos réus DD.

b) Outra com vista ao reconhecimento da sua participação na ré FF Imobiliária, Ldª, como sócio oculto, concluindo no pedido de reconhecimento dessa participação e na condenação dos RR BB e mulher a pagarem ao autor o valor correspondente a metade do valor da sociedade FF, Ldª, lucros distribuídos e dinheiros pagos aos sócios em valor a apurar até à sentença ou se tal não for possível em momento ulterior em incidente de liquidação.

II. O decesso da ação de reivindicação pela sociedade, HH - Sociedade de Vinhos, Lda, ainda que representada pelo autor, de acordo com a orientação técnica do seu mandatário, em face dos elementos registrais apresentados, nomeadamente por falta de prova no âmbito da pessoa coletiva dos atos possessórios tendentes a tal prova, nomeadamente por o tribunal não valorizar os atos possessórios como atos da sociedade, mas do sócio, não extingue o direito do autor de revindicar a propriedade da casa que construiu há mais de vinte anos num terreno que adquiriu há mais de vinte anos e está na sua posse desde 1995 e onde habita desde a sua construção.

III. O decesso da referida sociedade na referida ação, ainda que representada por mandatário designado pelo autor, não faz com que por via disso o autor não seja o proprietário do prédio nem torna o reu DD o seu proprietário, nem seus proprietários antecessores os demais réus.

IV. A improcedência da referida ação, que apenas foi objeto de contestação, produz o efeito de caso de julgado que o prédio não pertencia à sociedade.

V. Se uma sociedade reivindica, a propriedade de um imóvel, sem título ou adquirido do sócio sem título válido, o insucesso dessa ação, não pode fazer precludir o direito do sócio, afinal seu proprietário na decorrência da posse e da nulidade do título.

VI. A preocupação do número de entidades que se possam opor à aquisição pelo réu DD, ou contra o mesmo reivindicar o imóvel, não é preocupação que deva caber ao tribunal, mas ao próprio réu DD ou seus sogros réus, BB e mulher, ou sua sociedade FF, que entendendo ter razão e querendo ver a questão resolvida, deveriam ter formulado pedido reconvencional, o que nem sequer na presente ação fizeram, apesar de não estarem na posse do prédio.

VII. O decesso do autor na ação de execução específica do contrato promessa de compra e venda não constitui caso julgado para exclusão da pretensão do autor do reconhecimento da qualidade de sócio oculto da ré FF, Ldª, de que o contrato promessa pudesse constituir um instrumento.

VIII. A esse decesso nada acrescenta a denegação liminar, da pretensão da ex mulher do autor, com a repetição da mesma ação, com fundamento em entendimento técnico denegado, que a mesma deveria ter sido parte da ação.

IX. Errou a sentença recorrida ao concluir que o decesso da sociedade HH - Sociedade de Vinhos, Ldª, ainda que representada por advogado designado pelo autor, na ação de reivindicação anterior sob o numero 1373/06.7T8FLG do 1º Juízo do Tribunal Judicial de …, constitui caso julgado para ao autor, pessoalmente, ser vedado individualmente o reconhecimento do seu direito de propriedade e da consequente legitimidade para a formulação e procedência dos pedidos das alíneas a) e b).

X. Errou também ao concluir que a ação 474/01 do 3º Juízo do Tribunal Judicial de …, de execução específica de contrato promessa de compra e venda, constitui caso julgado de modo a afastar a pretensão do autor decorrente da sua participação como sócio oculto na sociedade FF, Ldª.

XI. Errou ainda a sentença recorrida ao condenar o autor como litigante de má fé em relação a cada uma das pretensões, não estando verificados os pressupostos para essa condenação, até porque, salvo melhor opinião em contrário, assiste razão ao autor, quanto ao sentido e alcance do caso julgado dos referidos processos em oposição à decisão recorrida.

XII. Violou a decisão recorrida entre outros o disposto nos artigos 619º , 621º e 542º n.º 2 do Código do Processo Civil.

XIII. Termos em que deve ser revogada a sentença recorrida e substituída a mesma por outra que ordene o prosseguimento dos autos».


7. O réu BB e outros, responderam, terminando as suas  contra alegações  com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

« a) Da verificação da autoridade de caso julgado:

1 - Na análise do caso julgado, há que distinguir duas realidades distintas, a exceção de caso julgado, e a autoridade de caso julgado, pois as mesmas não se confundem.

2 - A exceção de caso julgado tem em vista o efeito negativo de obstar à repetição de causas, implicando a tríplice identidade a que se refere o artº 581º do CPC -, ou seja a identidade de sujeitos, pedido e a causa de pedir.

3 - A autoridade de caso julgado visa o efeito positivo de impor a força vinculativa da decisão antes proferida [e transitada em julgado] ao próprio tribunal decisor ou a qualquer outro tribunal (ou entidade) a quem se apresente a dita decisão anterior como questão prejudicial ou prévia em face do «thema decidendum» na ação posterior, podendo atuar independentemente da mencionada tríplice identidade.

4 - No caso dos autos, é invocável e patente a figura da autoridade de caso julgado.

5 - Com efeito, no processo nº 474/2001, que correu termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de …, ficou definitivamente assente que o aqui Autor, também ali autor, não provou ter sido celebrado qualquer acordo ou contrato entre o Autor e a Ré “FF Imobiliária, Lda.”, de que o Autor fosse um sócio oculto da referida sociedade, e que tivessem celebrado um contrato de promessa onde se reconhecesse ao Autor a titularidade de 50% do capital social da referida sociedade.

6 - Sucede que, na presente ação, o Autor peticionou nas alíneas c) e d), o reconhecimento de que tem direito a 50% da sociedade FF, bem como a 50% dos lucros pela mesma distribuídos aos sócios desde 2002 e, a título subsidiário, pede a condenação dos Réus BB e mulher CC (sócios da referida sociedade FF), a pagarem ao Autor o valor correspondente a metade do valor da referida sociedade, lucros distribuídos e dinheiros pagos aos sócios em valor a apurar até à sentença ou se tal não for possível em momento ulterior em incidente de liquidação.

7 - Dúvidas não subsistem, que intercedem entre o objeto dos processos em concurso (anterior e posterior) a aludida relação de prejudicialidade e de condição prévia, pelo que é invocável a força vinculativa da autoridade de caso julgado.

8 - Pelo que, todos os argumentos que o Autor podia deduzir e não deduziu relativamente a essa situação ficam precludidos.

9 - Além disso, é irrelevante, o facto de os sujeitos processuais não serem exatamente iguais, e ainda o facto de na presente ação, os pedidos não assumirem as características de uma execução específica, uma vez que a figura da autoridade de caso julgado, dispensa a tríplice identidade prevista no art.581º do CPC, como vimos.

10 - O mesmo acontece, relativamente ao pedido formulado pelo autor na alínea a), de que fosse declarada nula ou anulada a venda feita pela escritura referida na alínea d) do artigo 7º da petição por violação do disposto no artigo 1º do DL 281/99 de 26/7 e por simulação e subsequentemente a venda do mesmo imóvel, feita na execução fiscal n.º 1791200401010727, uma vez que o Autor fundamenta tais pedidos no facto de ser proprietário de tal prédio e, em virtude de ser sócio oculto na sociedade “FF” e, pelo facto de terem celebrado um contrato de promessa onde se reconhecesse ao autor a titularidade de 50% do capital social da referida sociedade.

11 - É inequívoco que a causa de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo Autor na alínea a) da presente ação, coincide com questão já dirimida no processo nº 474/2001, pelo que não pode o douto tribunal pronunciar-se quanto a este pedido, verificada que está a autoridade de caso julgado material.

12 - O mesmo se diga, aliás, quanto ao facto de o Autor na presente ação, alegar ser proprietário do aludido imóvel por usucapião, sendo certo que, a sociedade “HH – Sociedade de Vinhos, Lda.”, representada pelo autor, no processo nº 1373/06.7T8FLG, que correu termos no 1º Juízo do Tribunal Judicial de …, instaurou ação com processo ordinário, contra o Estado Português e contra os Réus “FF”, DD e EE, peticionando, o reconhecimento do direito de propriedade daquela Autora, sobre o referido prédio.

13 - Como o objeto do litígio, designadamente, o direito de propriedade sobre o aludido imóvel foi manifestamente apreciado e dirimido na sobredita ação, constitui questão prévia ou prejudicial, que o tribunal corre o risco de contrariar por meio da prolação da oportuna sentença a proferir nestes autos.

14 - Aliás, o Autor, não contente com o desfecho da aludida ação nº 474/01, incentivou a sua ex-mulher II a intentar uma outra ação contra a Ré “FF”, que correu termos sob o nº 3070/03.6TBFLG, no 3º Juízo do Tribunal Judicial de …, tendo por base o mesmo e acima referido contrato promessa e pretendia, além do mais, reconhecê-la como co-adquirente e legítima dona da quota de compropriedade de 50% sobre os prédios cuja titularidade está inscrita a favor da 1ª Ré, identificados sob o artigo 28º da petição, sendo que, a Ré “FF” foi absolvida da instância, por a Autora ter sido considerada parte ilegítima.

15 - Portanto, o Autor foi intentando sucessivas ações, utilizando diferentes sujeitos processuais, e formulando pedidos distintos, com o intuito protelado de contornar o efeito do caso julgado formal, e conseguir assim provar o alegado acordo em que o mesmo seria sócio oculto da sociedade “FF”, sendo titular de 50% do património da referida sociedade , e ser ainda declarado proprietário do prédio melhor identificado na alínea d) do artigo 7º da p.i..

16 - Com este comportamento, o Autor violou a figura da autoridade de caso julgado material, que determina a inadmissibilidade de qualquer posterior verificação sobre a relação material controvertida em anterior decisão definitiva.

17 - Pelo que, bem andou o douto tribunal da primeira instância, ao julgar a ação improcedente contra todos os Réus, por verificação da autoridade de caso julgado material.

b) Da verificação dos pressupostos da litigância de má fé:

18 - A responsabilização e condenação da parte como litigante de má-fé (art.542º do CPC), só deverá ocorrer quando se demonstre nos autos, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu, conscientemente, com dolo ou negligência grave, de forma manifestamente reprovável, com vista a impedir ou a entorpecer a ação da justiça, ou, a deduzir pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar.

19 - A litigância de má-fé exige a consciência de que quem pleiteia de certa forma, tem a consciência de não ter razão (veja-se a este propósito o Ac. do STJ, de 18/02/2015, do relator Silva Salazar, proc. nº 1120/11.1TBPFR.P1.S1, disponível em (www.dgsi.pt ).

20 - Ora, o douto despacho saneador concluiu, sem margem para quaisquer dúvidas, pela existência de má fé por parte do Autor/recorrente, por ter entendido que este procurou perturbar a ação da justiça.

21 - Com efeito, nos presentes autos, o Autor submeteu a nova discussão, matéria já anteriormente discutida e apreciada pelo tribunal com sentenças transitadas em julgado, que sempre lhe foram desfavoráveis.

22 - Indubitavelmente, que o Autor usou de artifício, intentando sucessivas ações, com alteração dos sujeitos processuais e dos pedidos formulados, de modo a tentar enganar e manipular o douto Tribunal, com o propósito obstinado de contornar o efeito do caso julgado formal, e obter sentença favorável.

23 - Assim, forçosamente, se tem de concluir que a previsão legal resulta preenchida e a conduta censurável do Autor/recorrente, não pode deixar de ser punida, como foi.

24 - Justifica-se, portanto, sem qualquer dúvida, a condenação do Autor como litigante de má-fé, havendo que manter o despacho recorrido.

25 - Pelo que, a sentença recorrida, que assim decidiu, não merece censura.

26 - Improcedem, pois, todas as conclusões de recurso

Nestes termos, e nos que Vossas Excelências mui doutamente suprirão, não deixarão de negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar, integralmente, a douta sentença recorrida, fazendo, como sempre, inteira e sã Justiça! »


8. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.



***



II. Delimitação do objecto do recurso


Como é sabido, o objeto do recurso determina-se pelas conclusões da alegação do recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 3 a 5, 639.º, n.º 1, do C. P. Civil, só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, a não ser que ocorra questão de apreciação oficiosa[1].


Assim, a esta luz, as únicas questões a decidir consistem em saber se:

1ª- as sentenças transitadas em julgado e proferidas no âmbito das anteriores ações com processo ordinário nº 474/01, do 3º Juízo do Tribunal Judicial de …, e nº 1373/06.7T8FL, do 1º Juízo do Tribunal Judicial de …, constituem caso julgado obstativo do conhecimento de mérito da presente ação.


2º- existe fundamento para a condenação  do autor por litigância de má fé.



***



III. Fundamentação


3.1. Fundamentação de facto


Com base nas certidões juntas a fls. 56 a 61 e 72 a 89 dos presentes autos, consideram-se assentes os seguintes factos:

1º- AA intentou contra “FF – Imobiliária, Ldª” ação declarativa com processo comum ordinário, que correu termos pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de …, com o nº 474/2001, pedindo a condenação da ré a reconhecer o autor como adquirente e legítimo dono da quota de compropriedade de 50% sobre os prédios identificados no artigo 19º da petição inicial, com todas as suas partes integrantes e componentes.

Alegou, para tanto e em síntese, que acordou com o sócio gerente da ré, BB, constituir uma sociedade comercial por quotas, destinada à compra e venda de imóveis, construção civil e revenda dos adquiridos e transformados, em que as participações e partilhas de resultados seriam iguais para ambos os sócios; dado que o autor tinha alguns contenciosos de ordem financeira que poderiam implicar eventuais penhoras e alienação desta sua quota a terceiros, ficou acordado entre eles que o autor seria “um sócio oculto”, que a ré nasceria como uma sociedade familiar entre o referido BB e a sua mulher, CC e que, para segurança do autor, a sociedade ré celebraria com o autor um contrato promessa a elaborar após a sua constituição; assim, em 12.01.2001, o autor e a ré celebraram um contrato promessa, estabelecendo, para além do mais, na respetiva cláusula 4ª, que o primeiro outorgante, BB, na qualidade de representante da ré, reconhece ao autor o direito a exigir, para si ou para terceiro por si indicado, a titularidade de 50% do seu capital social, ou em alternativa, estabelecida no seu próprio interesse, a exigir a transferência da propriedade de metade indivisa de cada um dos referidos imóveis, nas descrições que tenham à data da formulação da pretensão; o autor exercitou tempestivamente o seu direito de opção estabelecida na referida cláusula 4º e, através de notificação judicial, notificou a ré para comparecer no dia 7.06.2001, pelas 14 horas no Cartório Notarial de … para a realização da escritura pública, que não se efetuou por falta de comparência dos representantes da ré.

 2º- No processo nº 474/2001 e em 15.07.2003, foi proferida sentença, transitada em julgado em 29.09.2003, que, considerando não ter o autor logrado provar, tal como lhe competia, a «  matéria de facto de onde fosse possível inferir ter sido celebrado um qualquer acordo ou contrato entre o Autor  e a Ré, nomeadamente o invocado na petição inicial (…)», julgou a ação totalmente improcedente  e, em consequência, absolveu a ré do pedido.


3º- HH-Sociedade de Vinhos, Ldª intentou contra o Estado Português - Ministério das Finanças, “FF – Imobiliária, Ldª, DD e EE, ação declarativa com processo comum ordinário, que correu termos pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de …, com o nº 1373/06.7TBFLG, pedindo que seja reconhecido:

a) à autora o direito de propriedade sobre os prédios referidos no artigo 1º da petição inicial, ou seja:

- prédio urbano, composto de casa de rés do chão, primeiro andar e logradouro com a superfície coberta  de 450 m2, terraço com a área de 90 m2, arrumos com a área de 110 m2 e quintal, sito no lugar de …. da freguesia de … do concelho de Felgueiras, descrito na Conservatória do Registo Predial de Felgueiras sob o nº 0…1/14…5 de …, com registo de aquisição a seu favor em G-5 aps 02/140598 e 04/070798, inscrito na matriz sob o artigo 1022 urbano;


- prédio rústico, sito no lugar de … da freguesia de … do concelho de Felgueiras, descrito na Conservatória do Registo Predial de Felgueiras sob o número 0…/2…4 de Airães, com registo de aquisição a seu favor em G3. Ap. 01/140598 e ap. 05/070798, inscrito na matriz sob o artigo 359.


b) que a autora é possuidora de forma pacífica e pública, como quem exerce poderes sobre coisa que lhe pertence e nessa convicção, da propriedade referida no artigo 2, que os prédios referidos no artigo 1º integram  desde 1998; 


c) que o artigo 1048 urbano de … constitui uma duplicação do artigo 1002 urbano de …;


d) que a casa de habitação aí referida se situa totalmente na freguesia de … do Concelho de Felgueiras;


f) que a ré FF nunca possuiu o que quer que fosse  da propriedade referida no artigo 2º;


g) que a descrição predial 006… de …, provém de terrenos anteriormente pertencentes a JJ ou Casa KK;


h) que da propriedade referida no artigo 2º o referido JJ, apenas foi proprietário da parcela referida no artigo 37 e, consequentemente, caso se entenda que o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número 006…0 do …, compreende parte da propriedade referida no artigo 2º e caso se entenda que a Ré FF adquiriu essa parcela, reconhecido que da referida propriedade o terceiro réu apenas comprou a parcela referida no artigo 37º;


E que:


i) os  réus sejam condenados a absterem-se de praticar qualquer ato que perturbe a posse da autora sobre a propriedade referida no artigo 2º sob pena de multa e mantida a autora na posse da mesma, ou no caso de se verificar a hipótese referida na última parte da alínea anterior, com exclusão da parcela referida no artigo 37;


j) seja ordenado o cancelamento  do registo efetuado na C. R. Predial de F…, em 01.03.2012, ap. 366, sobre ficha 6…0 de ….

 

4º- No processo nº 1373/06.7TBFLG, estava em causa decidir quem era o titular do direito de propriedade sobre o seguinte prédio penhorado e vendido em execução fiscal ao réu DD: prédio misto sito no lugar de …, freguesia de …, Lousada, inscrito na matriz  predial urbana sob o art. 1048, com a área coberta de 549,50 m2, e oito divisões assoalhadas, uma cozinha, quatro casa de banho, três corredores, três despensas, cinco varandas, anexo destinado a garagem, e logradouro, inscrito na matriz  predial rústica sob o art. 1088, sendo o terreno a mato com a área de 20.600 m2, a confrontar do Norte com caminho público, sul e poente com “FF, Imobiliária, Ldª, nascente com limite do Concelho e HH, descrito na C. R. Predial de Lousada sob o nº 6…0/18…9.

 

5º- Neste processo nº 1373/06.7TBFLG e em 19.04.2013, foi proferida sentença, transitada em julgado em 02.02.2014, que, considerando resultar da factualidade provada que o supra identificado prédio, penhorado e vendido na execução fiscal, e registado na Conservatória do Registo Predial de Lousada, a favor da ré “FF”, correspondia ao prédio urbano e ao prédio rústico, registados a favor da autora “HH – Sociedade de Vinhos, Ldª ” e supra descritos no ponto 3, sob as nas alíneas a) e b), e que, perante esta situação de dupla descrição predial, nenhuma prova foi feita pela autora que legitimasse a conclusão de aquisição por qualquer forma de aquisição originária do direito de propriedade, julgou improcedente a ação, absolvendo os réus dos pedidos.



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3.2. Fundamentação de direito



3.2.1. Conforme já se deixou dito a primeira das questões objecto do presente recurso consiste em saber se das decisões proferidas nos processos nºs 474/01, do 3º Juízo do Tribunal Judicial de …,  e nº 1373/06.7T8FL,  do 1º Juízo do Tribunal Judicial de …, decorrem efeitos de caso julgado, que obstem ao conhecimento do objeto da presente ação.


No sentido afirmativo pronunciou-se a decisão recorrida, considerando, essencialmente, que, não tendo o ora autor, no processo nº 474/2001, logrado provar ter celebrado com a ré “FF- Sociedade Imobiliária, Ldª ”, qualquer acordo no sentido de o mesmo ser “sócio oculto” desta sociedade, nem o alegado contrato promessa (através do qual tal sociedade reconheceu ao autor o direito a exigir, para si ou para terceiro por si indicado, a titularidade de 50% do seu capital social, ou, em alternativa estabelecida no seu próprio interesse, o direito a exigir a transferência da propriedade de metade indivisa de cada um dos referidos imóveis, nas descrições que tivessem à data da formulação da pretensão) e tendo a ora a ré, por sentença transitada em julgado, proferida naquele mesmo processo, sido absolvida do pedido de condenação a reconhecer o ora autor como adquirente e legítimo dono da quota de compropriedade de 50% sobre os identificados prédios, com todas as suas partes integrantes e componentes, tal sentença formou caso julgado material, que impede o tribunal de reapreciar estas mesmas questões.

E porque o autor invoca estes mesmos acordos como causa de pedir dos pedidos formulados na petição da presente ação sob a alínea c) (seja reconhecido que  o autor tem direito a 50% da sociedade FF, Ldª, bem como a 50% dos lucros pela mesma distribuídos aos sócios desde 2002), bem como o pedido, formulado a título  subsidiário na alínea d) (condenação dos  réus BB e mulher a pagarem ao autor o valor correspondente a metade do valor da sociedade FF, Ldª, lucros distribuídos e dinheiros pagos aos sócios em valor a apurar até à sentença ou se  tal não for possível em momento ulterior em incidente de liquidação), a força ou autoridade de caso julgado formada pela sentença proferida no processo nº 474/2001, obsta ao conhecimento destes pedidos, sendo irrelevante a diversidade de sujeitos, na medida em que, diferentemente do que acontece com a exceção de caso julgado, a autoridade do caso julgado não requer a identidade de sujeitos prevista no art. 581º do C.P.C..

Mais considerou que o efeito da força do caso julgado material da sentença absolutória proferida no processo nº 474/2001 abrangia ainda o pedido formulado pelo autor na presente ação sob a alínea a) [ que seja declarada nula ou anulada, por simulação e por violação do disposto  no art. 1º do DL nº 281/99, de 26.07 (falta de licença de construção), a venda, datada de 03.08.2000, feita pela sociedade “GG, Imobiliária, S.A.”, de que o autor era administrador único, à ré “FF” da HH identificada na al. d) da petição inicial] e, em ampliação do pedido [ que seja declarada nula ou anulada a venda, datada de 10.02.200, do referido imóvel da sociedade” LL - Imobiliária, S.A..”, igualmente  por violação do disposto no artigo 1º do DL  281/99 de 26.07], porquanto o autor, para além de invocar, como causa de pedir destes pedidos, a simulação e a falta de licença de construção, alicerça também estes pedidos no facto de ser proprietário do referido prédio por força dos acordos celebrados com a ré “FF”,  por via dos quais tornou-se sócio oculto desta mesma sociedade e titular de 50% do seu capital social, e, nessa medida, em causa de pedir que não pode ser reapreciada pelo tribunal sob pena de violação de caso julgado.

Por outro lado e no que respeita ao pedido formulado no presente processo sob a alínea b) (ordenado o cancelamento do registo de aquisição a favor dos réus DD e mulher e da sua antecessora a ré FF sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número 6…0 de …, Lousada), considerou a decisão recorrida que, não tendo a sociedade “ HH-Sociedade de Vinhos, Ldª”, representada pelo ora autor, logrado provar, no processo nº 1373/06.7T8FLG que instaurou contra contra o Estado Português - Ministério das Finanças, “FF – Imobiliária, Ldª, DD e EE, quaisquer factos demonstrativos da aquisição originária do direito de propriedade sobre o referido prédio, e tendo os réus, por sentença transitada em julgado, proferida naquele mesmo processo, sido absolvidos de todos os pedidos, designadamente do pedido de reconhecimento do direito de propriedade daquela autora sobre este mesmo prédio, daqui se infere que o ora «autor alicerça, ainda, a sua causa de pedir num alegado direito de propriedade que já foi objecto de discussão na referida ação e que não foi reconhecido à HH, representada pelo próprio autor», pelo que a autoridade de caso julgado formada pela referida sentença obsta a que se discuta, de novo, a questão da propriedade do referido prédio, «sendo irrelevante que os sujeitos processuais não sejam exactamente iguais ou que os pedidos, na presente acção, não coincidam  com os pedidos nas referidas ações».    


Diversamente, sustenta o recorrente que o decesso da ação de reivindicação nº 1373/06.7T8FLG instaurada pela sociedade, HH - Sociedade de Vinhos, Lda, ainda que representada pelo autor, não extingue o direito do autor de revindicar a propriedade da casa que construiu há mais de vinte anos num terreno que adquiriu há mais de vinte anos e está na sua posse desde 1995 e onde habita desde a sua construção, porquanto apenas produz o efeito de caso de julgado que o prédio não pertencia à sociedade.

Mais argumenta que o decesso do autor na ação nº 474/01 de execução específica do contrato promessa de compra e venda não constitui caso julgado para exclusão da pretensão do autor do reconhecimento da qualidade de sócio oculto da ré FF, Ldª, de que o contrato promessa pudesse constituir um instrumento.


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Trata-se, pois, de questão que tem a ver com o conteúdo e alcance do caso julgado material, na sua vertente positiva, ou seja, com a eficácia da autoridade do caso julgado formado pelas sentenças proferida nas referida ações nº 1373/06.7T8F e nº 474/0, no que respeita à sua extensão a ações posteriores, e, em especial, a terceiros, pelo que importa analisá-la à luz do art. 619º, nº 1[2] do C.P. Civil, o qual dispõe que « Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580º e 581º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696º a 702º ».

Segundo a noção dada por Manuel de Andrade[3], o caso julgado material «consiste em a definição dada à relação jurídica controvertida se impor a todos os tribunais (e até a quaisquer outras autoridades) – quando lhes seja submetida a mesma relação, quer a título principal (repetição da causa em que foi proferida a decisão), quer a título prejudicial (acção destinada a fazer valer outro efeito dessa relação). Todos têm que acatá-la, julgando em conformidade, sem nova discussão».

A força obrigatória reconhecida ao caso julgado material, ainda segundo o mesmo autor[4], assenta na necessidade de garantir o prestígio dos tribunais, que ficaria seriamente comprometido « se a mesma situação concreta, uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente».

Impõe-se por razões de «certeza ou segurança jurídica», pois, sem a força do caso julgado, cairíamos « numa situação de instabilidade jurídica (instabilidade das relações jurídicas) verdadeiramente desastrosa - fonte perene de injustiças e paralisadora de todas as iniciativas».

E tem por finalidade, no dizer do mesmo Professor[5], obstar a decisões concretamente incompatíveis (que não possam executar-se ambas sem detrimento de alguma delas), a que em novo processo o juiz possa validamente estatuir de modo diverso sobre o direito, situação ou posição jurídica concreta definida por anterior decisão e, portanto, desconhecer no todo ou em parte os bens por ela reconhecidos e tutelados.

Dito de outro modo e nas palavras de Miguel Teixeira de Sousa[6], «quando vigora como autoridade de caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade do caso julgado é o comando de acção ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão antecedente».

De realçar não ser unânime o entendimento de que, quanto à autoridade de caso julgado, tem que verificar-se a tríplice identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir estabelecida no art. 581º do CPC.

 Com efeito, enquanto para alguns doutrinadores, designadamente para Alberto dos Reis[7], a autoridade de caso julgado requer a verificação da tríplice identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, outros há que defendem que a autoridade de caso julgado pode funcionar independentemente da verificação desta tríplice identidade, podendo estender-se a outros casos, designadamente quanto a questões que sejam antecedente lógico necessário da parte dispositiva do julgado.

Nesta última linha e quanto à identidade objetiva, escreve Castro Mendes[8] que «(…) se não é preciso entre os dois processos identidade de objecto ( pois justamente se pressupõe que a questão que foi num thema decidendum seja no outro  questão de outra índole, máxime fundamental, é preciso que a questão se renove no segundo processo em termos idênticos».

Do mesmo modo, considera Lebre de Freitas que « (…) a autoridade do caso julgado tem (…) o efeito de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito (…). Este efeito positivo assenta numa relação de prejudicialidade: o objecto da primeira decisão constitui questão prejudicial na segunda acção, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há-de ser proferida».

Também sustenta Miguel Teixeira de Sousa[9], que «não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge estes fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão».

Assim, nesta linha de entendimento, na qual que se posiciona a maioria da jurisprudência, escreveu-se no Acórdão do STJ, de 15.01.2013 (processo nº 816/09.2TBAGD.C1.S1)[10], que «o alcance e autoridade do caso julgado não se pode limitar aos estreitos contornos definidos  nos arts. 580 e 581º do CPC, para a exceção do caso julgado, antes se devendo tornar extensivos  a situações em que, não obstante a ausência formal da identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir, o fundamento e razão de ser daquela figura jurídica estejam notoriamente  presentes».

E afirmou-se, no recente acórdão do STJ, de 22.02.2018 (revista nº 3747/13.8T2SNT.L1.S1) [11], que « a autoridade do caso julgado implica o acatamento de uma decisão proferida em ação anterior cujo objeto se inscreve, como pressuposto indiscutível, no objeto de uma ação posterior, obstando assim a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa» e  abrange, «para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado».

Por outro lado e no que concerne à extensão do caso julgado a terceiros, importa distinguir, segundo a doutrina[12]:

i) – os terceiros juridicamente indiferentes, a quem a decisão não produz nenhum prejuízo jurídico, porque não interfere com a existência e validade do seu direito, mas pode afetar a sua consistência prática ou económica, ficando, por isso, abrangidos pela eficácia do caso julgado[13];

ii) – os terceiros juridicamente prejudicados, titulares de uma relação jurídica independente e incompatível com a das partes ( definida pela sentença), os quais não são atingidos pelo caso julgado alheio[14];

iii) – os terceiros titulares de uma relação ou posição dependente da definida entre as partes por decisão transitada, a quem se tem reconhecido a eficácia reflexa do caso julgado[15];

iv) – os terceiros titulares de relações paralelas à definida pelo caso julgado alheio ou com ela concorrentes, considerando-se, quanto às primeiras, que o caso julgado só se estende às partes e, quanto às segundas que, se a lei não exigir a intervenção de todos os interessados, só lhes aproveita o caso julgado favorável.


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Vejamos, então, neste contexto jurídico e perante a factualidade dada como assente no ponto 3.1, se as decisão definitivas proferidas na ação nº 474/01 e na ação  nº 1373/06.7T8FLG, constituem  caso julgado obstativo do conhecimento de mérito da presente ação.


E a este respeito, diremos, desde logo, assistir razão ao recorrente ao sustentar que, contrariamente ao decidido na decisão recorrida, a sentença absolutória proferida na ação de reivindicação nº 1373/06.7T8FLG instaurada pela sociedade, HH - Sociedade de Vinhos, Lda, representada pelo ora autor, contra o Estado Português - Ministério das Finanças, “FF – Imobiliária, Ldª”, DD e EE, não preclude o direito de autor, através da presente ação, peticionar o « cancelamento do registo de aquisição a favor dos réus DD e mulher e da sua antecessora a ré FF sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número 6…0 de …, Lousada» - ( «pedido formulado na alínea b) da petição inicial) – com fundamento na aquisição do respetivo direito de propriedade por usucapião (cfr. artigos 29 a 33 da petição inicial).

É que, não sendo o autor “parte” na referida ação, apresentando-se, antes, como um terceiro, estranho ao processo e titular de uma relação jurídica independente e incompatível com a das partes, não pode o mesmo ser atingido pelo caso julgado alheio.

Daí termos por certo que o efeito de autoridade de caso julgado formado pela sentença absolutória proferida na referida ação nº 1373/06.7T8FLG não pode fazer precludir o direito do autor formular o pedido constante da alínea b) nem obstar ao seu conhecimento.

E nem tão pouco decorre da qualidade de sócio do autor da sociedade autora, HH-Sociedade de Vinhos, Ldª, que o mesmo tenha que acatar a sentença proferida na dita ação nº 1373/06.7T8FLG, pois, como é consabido, a sociedade é uma entidade distinta dos seus sócios e/ou representante.

Como refere Alberto dos Reis[16], «estender a eficácia da sentença a terceiros, estranhos ao processo, que não intervieram nele, que não foram ouvidos nem convencidos, que não foram colocados em condições de dizer da justiça, de alegar as suas razões, de exercer qualquer espécie de influência na formação da convicção do juiz – é uma violência que pode redundar numa iniquidade

Daí não acompanharmos, nesta parte, a argumentação tecida na decisão recorrida.


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Todavia, já quanto à eficácia do caso julgado formado pela sentença absolutória proferida na ação nº 474/01, que o ora autor intentou contra a ora ré “FF – Imobiliária, Ldª ”, julgamos assistir-lhe apenas parcialmente razão.

Desde logo porque perfilhamos o entendimento seguido na decisão recorrida de que a autoridade de caso julgado formado pela sentença absolutória proferida naquela ação abrange os pedidos formulados na presente ação sob as alíneas c) [seja reconhecido que o autor tem direito a 50% da sociedade FF, Ldª, bem como a 50% dos lucros pela mesma distribuídos aos sócios desde 2002]  bem como do pedido formulado, a titulo subsidiário, na alínea d) [ condenação dos réus BB e mulher a pagarem ao autor o valor correspondente a metade do valor da sociedade FF, Ldª, lucros distribuídos e dinheiros pagos aos sócios em valor a apurar até à sentença ou se  tal não for possível em momento ulterior em incidente de liquidação].

Com efeito, basta ter em conta a factualidade alegada pelo autor nos artigos 1º a 7º, 13º, 14º, 15º, 16º, 14º e 15º da petição inicial para facilmente se constar que o autor funda os referidos pedidos formulados contra os réus também no acordo celebrado entre o autor e a ré “FF- Sociedade Imobiliária, Ldª ”, por via do qual, o mesmo tornou-se “sócio oculto” desta sociedade bem como no contrato promessa, através do qual tal sociedade reconheceu ao autor o direito a exigir, para si ou para terceiro por si indicado, a titularidade de 50% do seu capital social, ou em alternativa, estabelecida no seu próprio interesse, a exigir a transferência da propriedade de metade indivisa de cada um dos identificados imóveis, nas descrições que tivessem à data da formulação da pretensão, acordos estes que foram dados como não provados na anterior ação nº 474/01, que o ora autor intentou contra a ora ré “FF – Imobiliária, Ldª ”, o que ditou a improcedência desta ação, com a consequente absolvição da ré “FF- Sociedade Imobiliária, Ldª ” do pedido.

Ora, não tendo a decisão absolutória, proferida na ação nº 474/01 e transitada em julgado, reconhecido ao autor a qualidade de sócio da ré FF – Imobiliária, Ldª nem o direito a exigir a titularidade de 50% do capital social desta sociedade, ou em alternativa, a exigir a transferência da propriedade de metade indivisa de cada um dos identificados imóveis, nas descrições que tivessem à data da formulação da pretensão, e sendo os pedidos contidos nas referidas alíneas c) e d) da presente ação decorrências deste direito, que foi negado na ação nº 474/01, dúvidas não restam que tal decisão absolutória traduz-se em decisão de questão fundamental que constitui precedente lógico indiscutível destes dois pedidos, pelo que, à luz das considerações teóricas acima expostas, não podemos deixar de se considerar o seu efeito de autoridade de caso julgado material relativamente a estes mesmos pedidos.

E, nem a isso obsta a circunstância de a presente ação ter sido proposta contra outros réus, para além da ré FF, pois, conforme já se deixou dito, a autoridade de caso julgado não exige a total identidade de sujeitos.

Condição essencial é que o objecto de uma anterior ação se inscreva como pressuposto indiscutível, no objecto da uma posterior ação.

E porque é precisamente isto que acontece, no que concerne aos dois referidos pedidos, forçoso é concluir que a autoridade de caso julgado da referida sentença absolutória impõe o seu acatamento, obstando a que a relação jurídica ali discutida (ou seja, a questão de saber se o autor é, ou não, sócio da ré FF e/ou tem, ou não, o direito a exigir a titularidade de 50% do capital social desta sociedade, ou em alternativa, a exigir a transferência da propriedade de metade indivisa de cada um dos identificados imóveis, nas descrições que tivessem à data da formulação da pretensão), venha a ser apreciada, de novo, na presente ação.

Mas, se isto assim acontece com os pedidos formulados na presente ação sob as alíneas c) e d), o mesmo já não se verifica, relativamente aos pedidos contemplados na presente ação sob a alínea a) [ que seja declarada nula ou anulada, por simulação e por violação do disposto no art. 1º do DL nº 281/99, de 26.07 ( falta de licença de construção), a venda, datada de 03.08.2000, feita pela sociedade “GG, Imobiliária, S.A.”, de que o autor era administrador único, à ré “FF” da HH identificada na al. d) da petição inicial] e em ampliação do pedido[17] [ que seja declarada nula ou anulada a venda, datada de 10.02.200, do referido imóvel da sociedade” LL - Imobiliária, S.A..”, igualmente  por violação do disposto no artigo 1º do DL  281/99 de 26.07], bem como ao pedido formulado na presente ação sob a alínea b) [cancelamento do registo de aquisição a favor dos réus DD e mulher e da sua antecessora a ré FF sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número 6…0 de …, Lousada”][18]

É que, contrariamente ao afirmado na decisão recorrida, tais pedidos já não decorrem da pretensa qualidade de sócio da ré FF nem da arrogada titularidade do direito do autor de exigir a titularidade de 50% do capital social desta sociedade, ou em alternativa, do direito a exigir a transferência da propriedade de metade indivisa de cada um dos identificados imóveis, nas descrições que tivessem à data da formulação da pretensão, assentando, antes, na factualidade alegada pelo autor nos artigos 7, al. d), 24º a 51, da qual resulta que o autor invoca como sua causa de pedir de tais pretensões a aquisição do direito de propriedade do autor sobre o dito prédio, por usucapião (por, entre 1994 e 1995 ter negociado os terrenos, numa área inicial de cerca de 1500m2, onde, entre 1996 e 1997, construiu uma habitação, adquirindo entre 1998 e 2001, os terrenos envolventes, passando a residir nesta casa com o seu agregado familiar, desde 1997 até pelo menos à presente data e fazendo uso da referida da parte rústica, “como quem exerce poderes sobre a coisa que lhe pertence e nessa convicção, ininterruptamente, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja e na ignorância de lesar direitos ou interesses alheios - cfr. artigos 29º a 33º da petição inicial) – a simulação dos negócios celebrados através das ditas escrituras e a celebração das mesmas em violação do disposto no art. 1º do DL nº 281/99, de 26.07, por o prédio urbano (a referida casa de habitação) delas objecto não dispor de licença de construção, utilização ou de habitabilidade (cfr. artigos 7, al. d), 24º a 28, 34º a 51).

Ou seja, diferentemente do que aconteceu na ação nº 474/01, em que o autor pugnava pela titularidade do direito de propriedade sobre metade indivisa do prédio rústico, sito no lugar de …, freguesia do Concelho de Lousada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lousada sob o número 006…0 de …, inscrito na matriz sob o art. 1088, na presente ação, está em causa a aquisição que o autor alega ter feito da totalidade deste prédio rústico bem como do direito de propriedade sobre a casa de habitação que nele edificou e que, por isso, passou  a ter a natureza de prédio misto, inscrito na matriz urbana de … sob o artigo 1048 e na rústica sob o artigo 1088º, tendo sido o réu BB quem, em 12.02.2002, “participou  tal construção urbana à matriz” (cfr. factos alegados no artigo 7º, al. d) da petição inicial).

Assim sendo e porque os fundamentos das pretensões formuladas pelo ora autor nas alíneas a) e b) da presente ação radicam em fundamentação de facto e jurídica diversa da subjacente à decisão proferida na ação nº 474/01, não se verificando, por isso, nenhuma coincidência entre os pedidos e as causa de pedir numa e noutra acção, fácil se torna concluir que a autoridade de caso julgado formado pela sentença absolutória prolatada na referida ação nº 470/01 não se estende aos pedidos formulados na presente ação sob as alíneas a) e b).

Termos em que procedem também, neste particular, as razões do recorrente, impondo-se, por isso, a revogação da decisão recorrida, nesta parte, com o consequente prosseguimento dos autos para apreciação destes pedidos, devendo o tribunal recorrido pronunciar-se sobre as demais exceções invocadas pelo réus.


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3.2.2. Apreciando, agora, a questão da má fé, diremos que a condenação por litigância de má fé é uma sanção estabelecida para a violação do dever de cooperação contemplado no art. 7º, nº 1 do C. P. Civil e dos deveres de verdade, lealdade e probidade consagrados no art. 8º do mesmo diploma legal.

De acordo com o estatuído no n.º 2 do art.542º do C. P.C, «Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:

a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;

b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa,

c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;

d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão».

À luz do regime legal pré-vigente, vinha sendo entendimento uniforme na doutrina e na jurisprudência, que não bastava a culpa, ainda que grave, exigindo-se antes uma actuação dolosa ou maliciosa[19]

Porém, atualmente e tal como refere António Santos Abrantes Geraldes[20] ”... o legislador deixou ainda clara a desnecessidade quanto à prova da consciência da ilicitude do comportamento e da intenção de conseguir objectivos ilegítimos (actuação dolosa), bastando que seja possível formular um juízo de censurabilidade .....”, que no dizer do Acórdão do STJ, de 14.03.2002 ( proc. nº 02B428)[21], «postula uma equação da situação concreta, com fundamento em elementos sustentados, avaliados com qualificada prudência, em função do conflito de interesses subjacente e do desvalor ético-jurídico em que se traduz a condenação por litigância de má fé».

Dito de outro modo e na expressão do Acórdão do STJ, de 02.06.2016 ( processo nº 116/11.3TBVVD.G2.S1)[22], a condenação por litigância de má fé só deverá ocorrer «quando se demonstre, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu dolosamente ou com grave negligência, com o fito de impedir ou a entorpecer a acção da justiça».

A decisão recorrida condenou o autor, como litigante de má fé, numa multa de montante igual a duas vezes o valor da taxa de justiça devida na ação declarativa, bem como numa indemnização a pagar à parte contrária, «consistente no reembolso das despesas que a má fé do litigante a tenha obrigado, incluindo os honorários dos mandatários, cuja liquidação se relega para momento posterior».

Justificou-se essa condenação do modo seguinte:

«Na situação sub judice, atesta-se que o autor pretende perturbar a ação da justiça, submetendo a nova discussão matéria já exaustivamente apreciada pelo tribunal com sentenças transitadas em julgado mas que foram sendo desfavoráveis ao autor, agindo com clara litigância de má fé».

A verdade é que, reconhecendo-se assistir razão ao autor no que respeita à ausência de autoridade eficácia do caso julgado formado por anteriores ações quanto aos pedidos formulados na presente ação sob as alínea a) e b) da petição inicial, não se vislumbra, por ora, fundamento para acompanhar a afirmação da 1ª instância e censurar a atuação processual do autor, pelo que entende-se inexistirem motivos para a proferida condenação do autor como litigante de má fé.


Procedem também, nesta parte, as conclusões de recurso do autor.



***



IV – Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Supremo Tribunal em conceder parcial provimento à revista e, consequentemente:

A - Confirmar a decisão recorrida quanto ao segmento decisório que julgou procedente a autoridade do caso julgado, relativamente aos pedidos formulados pelo autor nas alíneas c) e d), deles absolvendo os réus;

B - Revogar, em tudo o mais, a decisão recorrida e determinar o prosseguimento do processo para o julgamento da causa no que respeita aos pedidos formulados nas alínea a) e b) da petição inicial e à admitida ampliação do pedido.


Custas a cargo do recorrente e recorridos, na proporção do decaimento.


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Supremo Tribunal de Justiça, 13 de setembro de 2018

Maria Rosa Oliveira Tching (Relator)

Rosa Maria Ribeiro Coelho

João Luís Marques Bernardo

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[1] Vide Acórdãos do STJ de 21-10-93 e de 12-1-95, in CJ. STJ, Ano I, tomo 3, pág. 84 e Ano III, tomo 1, pág. 19, respetivamente.
[2] Que reproduz, com  a mera atualização das remissões, o anterior art. 671º, na redação do DL nº 303/2007, de 24.08.
[3] In Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, 305, 
[4] In, “ Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, pág. 306.
[5] Neste sentido, vide, Manuel de Andrade, in, Noções Elementares, Coimbra Editora, 1979, 318.
[6] In, “Objecto da Sentença  e Caso Julgado Material”, publicado no BMJ, nº 325, págs. 171ª 179.
[7] In, “ Código de Processo Civil, Anotado, Vol. III, 3ª edição, reimpressão, Coimbra Editora, 1981, pág. 139.
[8] In,  “ Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil”, Edições Ática, págs. 43 e 44.
[9] In  obra e local citados.
[10] No mesmo sentido, cfr. Acórdãos do STJ, de 13.12.2007 ( processo nº 07ª3739); 06.03.2008 ( processo nº 08B402)  e de 23.11.2011 ( processo nº 644/08.2TBVFR.P1.S1), todos publicados in www dgsi.pt/stj.
[11] No sentido exposto, vide, a título de exemplo, o acórdão do STJ, de 20/06/2012 (processo 241/07.0TLSB.L1.S1), acessível na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj.
[12] Neste sentido, cfr. Manuel Andrade, in, “ Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, págs. 312 a 314 e Antunes Varela e outros, in, “Manual de Processo Civil”,Coimbra Editora, 2.ª Edição, 1985, págs.726 a 729.
[13] Segundo Manuel Andrade, é o caso dos credores relativamente às sentenças proferidas nos pleitos em que seja parte o seu devedor. 
[14] Segundo Manuel Andrade, é o que acontece quando a sentença julgando procedente uma acção de reivindicação de certo prédio intentada por A contra B, e reconhecendo, portanto a A a propriedade desse prédio, não pode precludir de nenhum modo a eventual propriedade de C no mesmo prédio.
[15] Segundo Manuel Andrade, é o caso da fiança ou da hipoteca constituída por um terceiro: julgada improcedente a acção proposta contra o devedor, pode o fiador defender-se com esta sentença favorável (cfr. art. 635, nº1 do C. Civil). Porém, segundo este mesmo autor, já não é forçoso que a sentença desfavorável tenha que prejudicar o terceiro, porque a existência da relação principal  não implica a da subordinada.
[16] In, “Eficácia do Caso Julgado em Relação a Terceiros, in Boletim da Faculdade de Direito, Vol. XVII (1940-1941), pág. 208.
[17] Requerida a fls. 34 a 36 e admitida pelo despacho constante de fls. 116 e 117 dos presentes autos. 
[18] Que o recorrente sustenta, face aos factos por ele alegados nos artigos 29º a 33º da petição inicial, consubstanciar uma pedido de reivindicação, mas que em nosso entender não pode ser considerado como tal, na medida em que é o própria autor a admitir que está na posse do prédio, alegando, no artigo 31 da petição inicial, que «Nunca a posse da referida habitação e propriedade envolvente, lhe foi estorvada nem reivindicada por quem quer que seja».
[19] Cfr. Manuel de Andrade, in, Noções Elementares de Processo Civil, ed. 1979, pág. 356 .
[20] In, Temas da Reforma do Processo Civil, II vol., 3ª ed., pág 341.
[21] Citado na decisão recorrida e publicado in ww.dgsi.pt/stj.
[22] Acessível in www.dgsi.ps/stj.