Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
16368/04.7TJPRT.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: OLIVEIRA ROCHA
Descritores: ALEGAÇÕES DE RECURSO
CONCLUSÕES
DECISÃO LIMINAR DO OBJECTO DO RECURSO
AUDIÇÃO PRÉVIA DAS PARTES
DESPACHO DE APERFEIÇOAMENTO
DESPACHO DO RELATOR
REQUESITOS
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 01/07/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRVO
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO AO AGRAVO
Sumário : I - O erro na admissão do recurso por parte do tribunal recorrido não é a única circunstância abrangida pela previsão do art. 704.º do CPC: a não de apresentação de alegações por parte do recorrente, depois de notificado da admissão do recurso, o desrespeito do convite do relator para formular conclusões ou completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, e a falta de indicação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e dos meios probatórios que impõem uma decisão diversa da recorrida ou, quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, a não indicação dos depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, são situações que, nos termos do citado artigo, também impõem ao relator a audição das partes.
II - O despacho do relator que convidou “(…) o recorrente o apresentar, em 5 dias, as conclusões de recurso em falta, de forma sintética e com as especificações legais, sob pena de não se conhecer do recurso - art. 690.º, n.ºs 1 , 2 e 4, do CPC”, quando nos autos foram interpostos dois recursos - um de agravo, na sequência da prolação do despacho de adjudicação da propriedade da parcela expropriada à entidade expropriante, e outro de apelação, reportado à sentença que fixou a indemnização devida pela expropriação -, sem que às alegações se seguissem as respectivas conclusões, não cumpre o imperativo constitucional (art. 205.º da CRP) que obriga a que a fundamentação das decisões judiciais, para além de clara, coerente e suficiente, tenha de ser expressa.
III - Tendo o recorrente, na sequência do citado despacho, apresentado apenas as conclusões da apelação e declarado manter interesse no agravo, não podia a Relação, sem mais, julgar este findo pelo não conhecimento do seu objecto.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

1.
Nos autos de expropriação, em que é expropriante o Município AA e expropriado BB, foi proferido despacho de adjudicação da propriedade da parcela expropriada à entidade expropriante.
O expropriado interpôs recurso desta decisão, que foi admitido como agravo e com subida diferida.
O agravante apresentou alegações.
Inconformado com a sentença que fixou a indemnização devida pela indemnização, o expropriado apelou da mesma.
Recebidos os autos na Relação do Porto, o Relator proferiu despacho convite, nos termos do disposto no art. 690º, nºs 1, 2 e 4, do CPC, tendo o recorrente, na sequência do mesmo, apresentado as conclusões da apelação e declarando manter interesse no conhecimento do agravo.
Todavia, como não apresentou as conclusões deste recurso, foi julgado findo pelo não conhecimento do seu objecto.
Em conferência, aquele Tribunal Superior proferiu acórdão, confirmando o despacho do relatar de 16.10.2008, indeferindo as pretensas nulidades processuais arguidas pelo agravante, bem como a pretensa inconstitucionalidade das normas processuais aplicadas naquele despacho na interpretação dada.
Nesse acórdão refere-se o seguinte:
«…Isto posto, entendemos que não foram cometidas as pretensas nulidades processuais secundárias antes da prolação do referido despacho do relator, que considerou precludido o direito processual do agravante apresentar as conclusões de recurso de agravo em falta e, em consequência, julgou findo o recurso pelo não conhecimento do seu objecto, nos termos do art. 700º, nº1, al. e), do CPC.
Com efeito, recebidos os autos nesta Relação e aberta a primeira conclusão ao relator, em 22.09.2008, foi por este proferido despacho do seguinte teor: "Convido o recorrente o apresentar, em 5 dias, as conclusões de recurso em falta, de forma sintética e com as especificações legais, sob pena de não se conhecer do recurso - art. 690º, nº1 ,2 e 4, CPC".
Da devida leitura dos autos, que se impunha à parte recorrente, frise-se única recorrente, impunha-se diligenciar para dar o devido cumprimento a tal despacho, ou seja, apresentar apenas as conclusões em falta das alegações da apelação interposta por si da sentença da primeira instância e nada dizer quanto ao interesse no conhecimento do agravo anteriormente interposto e retido nessas conclusões, daí resultando o não conhecimento desse recurso de agravo, nos termos do art. 748º CPC ou nas conclusões da apelação especificar que mantém interesse nesse recurso de agravo e, concomitantemente, apresentar as conclusões em falta desse recurso nas suas alegações apresentadas antes nos autos.
Ora, o agravante-apelante apenas acatou o despacho convite do relatar de 22.09.2008 quanto à apresentação das conclusões da apelação, não o tendo feito quanto às conclusões do agravo e não deve beneficiar de novo convite para o efeito, conforme referido no despacho do relatar de 16.10.2008, por a tal obstarem os princípios do processo civil da preclusão e da auto responsabilidade das partes.
O despacho proferido pelo relator em 16.10.2008 não constitui decisão surpresa, proibida pelo art. 3º, nº 3, CPC, nem a situação dos autos é enquadrável no disposto no art. 704º, nºI, CPC, antes constitui a decisão possível e esperada face ao incumprimento pelo agravante do despacho convite de 22.09.2008.
O principio do contraditório foi plenamente assegurado, atento o despacho convite proferido pelo relator em 22.09.2009, que o recorrente poderia ou não acatar ou, ainda, requerer que sobre o mesmo fosse proferido acórdão em conferência, nos termos do art. 700º, nº 3, CPC.
Assim, não foram cometidas, a coberto daquele despacho, as pretensas nulidades secundárias arguidas pelo recorrente.
Acresce que o despacho do relator proferido ao abrigo do disposto nas disposições conjugadas dos arts. 690º, nº 4 e 700º, nº1, al. e), CPC, fez uma correcta interpretação e aplicação da lei processual aplicável.
As referidas disposições legais, interpretadas desta forma não ofendem as normas da Constituição da República Portuguesa de 1976 que protegem a propriedade privada - art. 62º - e a tutela jurisdicional efectiva – art. 20°- como infundadamente alega o recorrente…».
Irresignado, agravou para o STJ, tendo concluído a alegação do recurso pela seguinte forma:
O acórdão recorrido, tal como o despacho do Relatar, de 16.10.2008, violou e aplicou erradamente a lei de processo (art. 755°, nº1, b, do CPC), pois, para além de dar cobro a duas nulidades processuais (arts. 704°, n°1, e 690°, nº 4, do CPC), violando os princípios do contraditório (art. 3°, nº 3, do CPC) e da colaboração do Tribunal para com as partes (art. 266° do CPC), deu primazia a aspectos puramente formais, em prejuízo de uma justiça material, que permitisse o conhecimento de um recurso (de agravo) em que se discute um dos principais direitos fundamentais dos cidadãos: o direito fundamental de propriedade privada (art. 62° da Constituição);
As nulidades processuais cometidas (art. 201°, nº1, do CPC) - o art. 704°, nº1, do CPC: antes de proferido o despacho de 16.10.2008 (agora confirmado pelo acórdão recorrido), o tribunal não deu oportunidade ao recorrente de se pronunciar sobre a questão de não conhecimento do recurso de agravo nos termos dos arts. 690°, nºs 1, 2 e 4, e 700°, n°1, al. e), CPC, pelo que se violou a prescrição estabelecida no art. 704°, n°1, do CPC;
Da leitura daquele despacho não resulta, com evidência, que o convite se estendia às alegações da apelação e, simultaneamente, às alegações do agravo pendente: apenas se fala em "recurso" (singular) e não em "recursos" (plural): " ... sob pena de não se conhecer do recurso", pelo que nada mais era exigível ao recorrente de acordo com critérios de diligência normais e aceitáveis, não podendo, consequentemente, afirmar-se que estamos perante uma "decisão possível e esperada";
E se era outra a intenção do Relator, então, ao abrigo do princípio da colaboração que deve existir entre as partes e o tribunal (art. 266° do CPC) - que não é, nem pode ser, olvidado com fundamento no princípio da auto-responsabilidade das partes -, e dos princípios da certeza e da segurança jurídico-processuais, deveria, no referido despacho de 16.10.2008, ter-se prescrito expressamente que o convite respeitava aos dois recursos pendentes;
Deste modo, porque antes de proferido o despacho de 16.10.2008 (agora confirmado pelo acórdão recorrido), o Relator não cumpriu o disposto no art. 704°, nº1, do CPC, e porque do despacho-convite não resulta clara a interpretação defendida pelo tribunal recorrido, verifica-se a omissão de uma formalidade legalmente imposta pelas exigências do princípio fundamental do contraditório ou da proibição de indefesa (art. 3°, n° 3, do CPC, e arts. 20° e 268°, nº 4, da Constituição) que influiu decisivamente no exame/decisão da causa e que, por essa razão, consubstancia uma nulidade processual, nos termos do art. 201°, nº1, do CPC;
As nulidades processuais cometidas (art. 201°, n°1, do CPC) - o art. 690°, nº 4, do CPC: o convite às partes para apresentação de conclusões, nos termos do art. 690°, nº 4, do CPC, representa um acto/formalidade que a lei prescreve como um ónus do tribunal ad quem, pelo que, para que esta formalidade se tivesse como cumprida, o Relator deveria ter referido expressamente naquele despacho que o mesmo respeitava aos dois recursos interpostos e pendentes. Não o tendo feito, deveria ter proferido um novo despacho-convite nos termos daquele preceito legal, agora só para o recurso de agravo. Trata-se de uma exigência legal, decorrendo igualmente dos princípios da cooperação, da confiança, da segurança e certeza jurídico-processuais;
Porque aquele despacho do Senhor Relator de 22.09.2008, fls. 106 dos autos, só se referiu ao recurso de apelação (sem referir ou pressupor o agravo pendente) e porque o Relator não cumpriu a formalidade prescrita no art. 690°, n° 4, do CPC, optando, desde logo, pelo não conhecimento do recurso (em violação, aliás, do disposto no art. 704°, n°1, do CPC, como se referiu supra), teremos de concluir que também quanto a esta matéria foi cometida uma nulidade processual, nos termos do art. 201°, nº1, do CPC;
A violação dos princípios fundamentais da lei processual civil e da Constituição: o acórdão recorrido comporta uma interpretação do CPC que não respeita alguns dos mais elementares princípios da nossa lei processual civil e que determinam uma decisão diversa da proferida. Por outro lado, saíram igualmente violados os direitos fundamentais do recorrente à propriedade privada e à tutela jurisdicional efectiva, previstos nos arts. 62° e 20° da Constituição;
A decisão do despacho de 16.10.2008 de não conhecimento do recurso de agravo - agora reiterada pelo acórdão recorrido proferido em conferência - é manifestamente desproporcionada, face aos seus efeitos e restritiva dos direitos fundamentais do recorrente à propriedade privada e à tutela jurisdicional efectiva (arts. 62° e 20° da Constituição), não existindo, no caso concreto, outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que justifiquem esta solução restritiva e onerosa do despacho do Relator de 16.10.2008 e do acórdão recorrido (art. 18°, nº 2, da Constituição);
O Tribunal recorrido, perante dois cenários possíveis na interpretação do regime consagrado no Código de Processo Civil, deveria ter optado por aquela que melhor servisse a tutela constitucional, ou seja, neste caso, o direito fundamental de propriedade privada e o efectivo acesso aos tribunais, à justiça processual e a uma tutela jurisdicional efectiva, pelo que só uma decisão no sentido de ser conhecido o agravo pendente, favorecendo o conhecimento desse recurso, permitiria alcançar uma correcta interpretação e decisão conforme à Constituição, o que não foi cumprido;
Por outro lado, só uma interpretação e aplicação material dos arts. 690° e 700°, nº1, e), do CPC, no sentido de permitirem o conhecimento do recurso de agravo interposto pelo recorrente satisfaz o propósito da reforma processual operada pelo Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, que deu alento a um dos princípios estruturantes do processo civil: o princípio da prevalência do fundo sobre a forma e a verdade material, o que também não foi observado pelo Tribunal recorrido;
Por último, neste contexto, pode afirmar-se ainda que o Relator ignorou por completo o princípio da adequação formal (art. 265°-A do CPC) que, se necessário fosse e devidamente aplicado, superava facilmente as razões de ordem formal que se invocaram para impedir o conhecimento do recurso de agravo.
2. Os factos com relevo para a decisão são os constantes do relatório.
3. O Direito.
Considerou a Relação que não foram cometidas as nulidades processuais secundárias antes da prolação do despacho do relator, que considerou precludido o direito processual do agravante apresentar as conclusões de recurso de agravo em falta e, em consequência, julgou findo o recurso pelo não conhecimento do seu objecto.
Essas nulidades consistiriam na violação do dever de ouvir cada uma das partes (art. 704º do CPC - diploma a que pertencerão as demais disposições legais a citar sem menção em contrário ), com consagração genérica no art. 3º, nº 3, e na ausência de convite ao recorrente para apresentar as conclusões da alegação do recurso de agravo (art. 690º, nº 4) e integrariam a nulidade contemplada no art. 201º, geradora da nulidade de todos os termos do processo subsequentes à falta da prática dessas formalidades, já que as irregularidades cometidas são susceptíveis de ter influído na decisão tomada.
Para a lei são vistas como questões prévias a conhecer pelo relator o erro na espécie do recurso (art. 702º), o erro quanto ao efeito do recurso (art. 703º) e o erro na admissão do recurso (art. 704º).
O não conhecimento do recurso ocorre quando o juiz, no tribunal a quo, recebeu indevidamente o recurso, ou porque a decisão é irrecorrível, ou porque o recurso foi interposto fora de tempo ou porque o recorrente não se encontra em condições de recorrer (art. 687º, nº 3).
Não é, contudo, o erro na admissão do recurso por parte do tribunal recorrido a única circunstância abrangida pelo art. 704º.
Com efeito, como refere Amâncio Ferreira (Manual dos Recursos em Processo Civil, 6ª ed., pag. 207), “o recurso pode ter sido recebido correctamente e sobrevir um acontecimento que impeça o seu conhecimento. Como nos seguintes casos: falta de apresentação de alegações por parte do recorrente, depois de notificado da admissão do recurso, a implicar a deserção deste, que pode ser decretada pelo relator, se o juiz a quo, por lapso, não o tiver feito (art. 291º, nºs 2 e 4); o desrespeito do convite do relator para o recorrente apresentar conclusões ou completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las (art. 690º, nº 4); em recurso interposto da decisão sobre a matéria de facto, a falta de indicação pelo recorrente dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e dos meios probatórios que impõem uma decisão diversa da recorrida ou, quando os meios probatórios probatórios invocados tenham sido gravados, a não indicação dos depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta (arts. 690º-A, nºs 1 e 2, este na redacção do DL. nº183/2000, de 10 de Agosto)”.
Daqui decorre que, mesmo na hipótese configurada nos autos, havia que dar cumprimento ao disposto no art. 704º.
A outra nulidade processual secundária invocada pelo recorrente consiste, como se disse, na ausência de convite ao recorrente para apresentar as conclusões da alegação do recurso de agravo (art. 690º, nº 4).
Tem alguma doutrina defendido que, actualmente, não há razão nenhuma para o convite prévio, porquanto os mandatários das partes não desconhecem que têm de formular conclusões, face à antiguidade da norma que o impõe, provinda do CPC39” (cfr. Amâncio Ferreira, obra cit., pag. 170).
Este mesmo Autor, citando Lopes Navarro, escreve:
“É que o sistema actual do convite é muitas vezes utilizado pelos recorrentes para obterem um novo prazo, ou então para obrigarem a parte contrária a responder a uma alegação sem conclusões, ou ainda, o que é pior, passam as conclusões a mascarar uma espécie de réplica à contraminuta”.
Com a recente alteração do CPC (cfr. art. 685-A, nº 3, do DL. nº 303/2007), foi esta questão definitivamente resolvida, deixando de estar consagrado o convite ao recorrente, no caso de falta absoluta de conclusões.
Situando-nos, agora, na lei aplicável ao caso ajuizado, dispõe-se no nº 4 do art. 690º que “quando as conclusões faltem, sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações exigidas pela impugnação da matéria de direito, o relator do tribunal superior deve convidar o recorrente a apresentá-las, completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, sob pena de não se conhecer do recurso na parte afectada…”.
O acórdão recorrido, confirmando o despacho do Relator, entendeu que esse convite foi feito.
Não está em causa que foi lavrado, pelo Relator, o seguinte despacho:
"Convido o recorrente o apresentar, em 5 dias, as conclusões de recurso em falta, de forma sintética e com as especificações legais, sob pena de não se conhecer do recurso - art. 690º, nº1 ,2 e 4, CPC".
Mas será que este despacho contém um convite ao recorrente para apresentar as conclusões das alegações dos recursos de apelação e de agravo?
A decisão proferida em processo judicial constitui um verdadeiro acto jurídico, a que aplicam as regras reguladoras dos negócios jurídicos (art. 295º do C.Civil).
As normas que disciplinam a interpretação da declaração negocial são, pois, igualmente válidas para a interpretação de uma sentença. O que significa que a sentença tem de ser interpretada com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do seu contexto (art. 236º do C.Civil).
Para interpretarmos correctamente a parte decisória de uma sentença, temos de analisar os seus antecedentes lógicos que a tornam possível e a pressupõem, dada a sua íntima interdependência.
A interpretação da sentença exige, assim, que se tome em consideração a fundamentação e a parte dispositiva, factores básicos da sua estrutura.
No dizer incisivo de Carnelutti, a sentença não é “nem dispositivo sem motivos, nem motivos sem dispositivo, mas a fusão deste com aqueles”.
Por outras palavras, a identificação do objecto da decisão passa pala definição da sua estrutura, constituída pela correlação teleológica entre a motivação e o dispositivo decisório, elementos que reciprocamente se condicionam e determinam, fundindo-se em síntese normativa concreta (cfr. Castanheira Neves, RLJ 110º, pags. 289 e 305).
De realçar, ainda, que, embora o objecto da interpretação seja a própria sentença, a verdade é que, nessa tarefa interpretativa, há que ter em conta outras circunstâncias, mesmo que posteriores, que funcionam como meios auxiliares de interpretação, na medida em que daí se possa retirar uma conclusão sobre o sentido que se lhe quis emprestar (Vaz Serra, RLJ, 110-42).
Analisando a decisão aludida, e tendo em conta os critérios interpretativos referidos, verifica-se que o Relator se limitou a convidar o recorrente a apresentar, em 5 dias, as conclusões de recurso em falta, de forma sintética e com as especificações legais, sob pena de não se conhecer do recurso.
Não é certamente a proposição “de” que será suficiente para levar ao conhecimento do recorrente de que estava em causa a falta de conclusões em dois recursos, pois logo se concluiusob pena de não se conhecer do recurso” e não dos recursos.
Ou seja, nenhuma referência expressa é feita aos dois recursos interpostos pelo recorrente e nos quais se verificava a ausência absoluta de conclusões.
Ora, como é sabido, por imperativo constitucional (art. 205º da CRP), a fundamentação das decisões judiciais, para além de clara, coerente e suficiente, tem de ser expressa.
“…uma opção que deixe ao destinatário a descoberta das razões da decisão não cumpre a exigência constitucional da fundamentação, justamente porque “fundamentar é pôr em comunicação” e “o próprio acto de pôr em comunicação não pode deixar de ser comunicado”.
E isto quer se trate de decisões judiciais interlocutórias, quer finais.
A única excepção admitida na Constituição respeita às decisões de mero expediente, ou seja, àquelas que, sem bulir com direitos das partes ou de terceiros, têm por objecto a tramitação do processo, como, por exemplo, as que se limitam a fixar as datas para a prática de actos processuais (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, in Constituição Portuguesa Anotada, Tomo III, pags. 71 e 72).
4.
Face ao exposto, decide-se conceder provimento ao agravo e, em consequência, ordena-se que os autos baixem à Relação, para que este Tribunal profira decisão a convidar o recorrente nos termos e para os efeitos do disposto no art. 690º, nº 4, do CPC.
Sem custas.

Lisboa, 7 de Janeiro de 2010
Oliveira Rocha (Relator)
Oliveira Vasconcelos
Serra Baptista