Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
189/12.6TBHRT-A.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: SILVA GONÇALVES
Descritores: PRESCRIÇÃO
QUOTAS DE AMORTIZAÇÃO
CAPITAL
JUROS
Apenso:
Data do Acordão: 03/27/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / NEGÓCIO JURÍDICO / TEMPO E SUA REPERCUSSÃO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS.
Doutrina:
- Ana Filipa Morais Antunes, “Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia”, volume III, p. 47.
- Aníbal de Castro, A caducidade, p. 28.
- Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, II, pp. 445-446, 452.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 298.º, N.º1, 304.º, N.º1, 309.º, 310.º, ALÍNEA E).
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 19.06.2012, EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :
1. O prazo ordinário da prescrição é de vinte anos (art.º 309.º do C.Civil); todavia, prescrevem no prazo de cinco anos as quotas de amortização do capital pagáveis com os juros - art.º 310.º, alínea e), do C. Civil.

2. O débito concretizado numa quota de amortização mensal de 24 prestações (iguais, mensais e sucessivas) referentemente ao capital de 7.326.147$00, enquadra -se na previsão legal do disposto no art.º 310.º, alínea e), do C. Civil.
Decisão Texto Integral:

                 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

     Por apenso aos autos de execução comum em que é exequente “AA, SA” e executados BB e Outros, vieram estes deduzir oposição à execução, pedindo que se declarem os executados parte ilegítima na instância executiva e absolvidos da mesma, ou caso assim não se entenda, deverá improceder a execução por inexigibilidade da dívida exequenda, ou caso assim também não se entenda, deve proceder a excepção de prescrição da mesma dívida, absolvendo-se os executados da mesma.

     A fundamentar a oposição alegam, em síntese:

A execução foi intentada contra os herdeiros de CC, quando é certo que a herança ainda não foi partilhada.

O exequente demandou todos os herdeiros do falecido, mas a dívida invocada é da herança, não obstante não tenha título contra a mesma.

Mesmo que se verificasse legitimidade passiva, a dívida exequenda sempre seria inexigível.

A dívida nunca foi comunicada aos herdeiros, nem à herança indivisa, nem nunca aqueles foram interpelados do incumprimento, nem interpelados para pagar.

A citação para a execução não pode ser tida como interpelação para pagamento, não sendo, pois, a dívida em causa líquida, certa e exigível para a herança.

Em todo o caso, tendo-se a dívida vencido em 1.8.2003, e nada tendo a exequente feito para a cobrar, mostra-se a mesma prescrita, por força do disposto no art. 310°, ais. e) e g) do CC.

Notificado, o exequente contestou, propugnando pela improcedência da oposição, pedindo a condenação dos opoentes como litigantes de má fé em indemnização em valor nunca inferior a € 2.500,00.

Foi proferido despacho saneador, no qual se julgaram improcedentes as excepções de ilegitimidade passiva e inexigibilidade da obrigação e procedente a excepção de prescrição e, em conformidade, declarou-se prescrito o crédito da exequente, com as consequências legais em termos de execução.

     Inconformado, desta sentença recorreu o exequente para a Relação de Lisboa que, por acórdão de 17.9.2013 (cfr. fls.87 a 94), julgou improcedente a apelação e manteve a decisão recorrida.

    Irresignado, o exequente “AA, SA” recorre agora para este Supremo Tribunal - revista excecional admitida por acórdão de 23.1.2014 (cfr. fls.175 a 181).

     Circunscrevendo-as à questão da prescrição do direito invocado pelo Banco exequente (saber qual o prazo de prescrição a aplicar a um contrato de empréstimo praticado por uma instituição financeira), apresenta o recorrente as seguintes conclusões:

     1. O presente recurso vem interposto do douto Acórdão proferido em 17 de Setembro 2013, a fls. 175 e segs. dos autos de Apelação - 1.ª que correu termos na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa sob o n.° 189/12.6TBHRT-A.L1, extraída dos autos de Oposição à Execução Comum que correu termos na Secção Única do Tribunal Judicial da Horta, sob o número 189/12.6TBHRT-A;

     2. Estando em discussão o prazo de prescrição a aplicar a um contrato de empréstimo de instituição financeira, que tem implícito o cumprimento de uma única obrigação pecuniária, não pode, com o devido respeito, o ora Recorrente concordar com o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal "a quo", na parte respeitante à questão da prescrição da totalidade da dívida referente ao contrato de empréstimo;

     3. O ora Recorrente celebrou em 30 de Setembro de 1998 um contrato de empréstimo para reestruturação de uma dívida, designado por "Contrato de reestruturação de crédito", com o Sr. CC e sua esposa Sra. BB;

     4. Contrato esse que, por sua vez foi alvo de um aditamento em menos de um ano, ocorrido em 31 de Março de 1999, no qual se prorrogava o prazo de pagamento por quinze anos;

     5. Não obstante o interesse do Recorrente em ser ressarcido do montante financiado, certo é que demonstrou flexibilidade e colaboração com os seus clientes para efeitos de regularização da dívida sem recurso às vias judiciais;

     6. Ora, o Sr. CC faleceu em 07 de Setembro de 2001 ficando como herdeiros, a sua esposa como viúva e filhos, que ao não repudiarem a herança se tornaram legítimos responsáveis pelo cumprimento da dívida, razão que motivou o Recorrente a recorrer às vias judiciais para satisfação do seu crédito face a novo incumprimento;

     7. Em consequência, vê-se agora o Recorrente incompreensivelmente acusado de negligente quanto à recuperação do seu crédito e com pretensão de exigir maior valor a título de juros;

     8. Decidiu assim o Tribunal da 1.ª instância que, o crédito do ora Recorrente se encontrava prescrito nos termos e por efeitos de aplicação do prazo de prescrição de 5 anos previsto no artigo 310.º, alínea e) do C.C., por semelhança entre as prestações referentes ao financiamento e as quotas de amortização de capital pagáveis com juros;

     9. Naturalmente inconformado com a decisão do Tribunal de 1.ª Instância que implicava a extinção dos autos com as respectivas consequências legais, o ora Recorrente apresentou recurso de Apelação para o Douto Tribunal da Relação, esclarecendo de forma devidamente fundamentada que o prazo aplicável seria o prazo ordinário de 20 anos, previsto no artigo 309.º do C.Civil;

     10. Cumpre salientar que um contrato de financiamento celebrado por uma instituição financeira tem por base, dada a sua natureza, uma única obrigação pecuniária cujo pagamento diferido no tempo não pode ser equiparado a um simples plano de amortização de capital e respectivos juros por prestações periódicas;

       11. Face a necessária distinção entre obrigações únicas com pagamentos fraccionados e prestações periódicas, o prazo de prescrição aplicável não poderia ser nunca de 5 anos, mas sim de 20 anos;

     12. Deste modo, o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, considerou que muito embora concordasse que a " (...) a restituição de capital mutuado configura uma situação de prestação única, embora de reembolso fraccionado por acordo das partes. ", já não concordava "(...) que o artigo 310.º do C.C. apenas se refere ou é aplicável às obrigações de natureza duradoura, onde se integram as obrigações periodicamente renováveis";

     13. Ora, ainda que por mera hipótese académica, se aceitasse a aplicação pelo douto Acórdão recorrido, da alínea d) do artigo 310.º do C.P.C, para efeitos de prescrição dos juros;

     14. Não se poderá conceber a aplicação da alínea e) do artigo 310.º do C.P.Civil, para efeitos de prescrição do capital financiado;

    15. Ao contrário da aplicação do douto Acórdão de que ora recorre, manifesta-se a doutrina em "Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia, volume III, página 47, 1.º, 2.º e 3.º parágrafos do ponto IV.", que:

" Em síntese, o preenchimento da situação contemplada na alínea e) do artigo 310° do C.C. obriga a que se atenda às circunstâncias do caso concreto. Em particular, será relevante, para aquele efeito, o facto de o reembolso da dívida ter sido objecto de um plano de amortizações, composto por diversas quotas, que compreendam uma parcela de capital e uma parcela de juros remuneratórios.

Este dado tem, como observado, importantes reflexos em matéria de prazo prescricional, na medida em que permite suportar a conclusão de que será aplicável a referida prescrição quinquenal, e não o prazo ordinário prescricional, previsto no artigo 309°do C.C. Na verdade, na situação prevista no artigo 310.º, alínea e), não estará em causa uma única obrigação pecuniária emergente de um contrato de financiamento, ainda que com pagamento diferido no tempo, a que caberia aplicar o prazo ordinário de prescrição, de vinte anos (...)." Sublinhado e negrito nosso.

     16. Inquestionável e urgente se torna a apreciação do Supremo Tribunal de Justiça quanto à aplicação ou não da alínea e) do art. 310.º do CC aos contratos de mútuo, contratos de reestruturação de créditos cujo financiamento constitui uma única obrigação passível de ser fraccionada mas que,

     17. Não pode ser equiparada a uma prestação periódica, renovável e cuja constituição depende do decurso do tempo;

     18. O prazo de prescrição tem de ser claro e inquestionável, visto que só assim pode permitir uma boa e correcta aplicação de direito e consequentemente evitar o alarme social que pode motivar a insegurança geral da sociedade que diariamente está presente e sujeita a contratos de mútuos;

19. Assim, e por toda a ordem de razões já expostas, deverá o douto Acórdão ser revogado, por violação substantiva consistente em erro de interpretação e aplicação dos artigos 309.º e 310.º, alíneas d) e e) do C.C., nos termos do artigo 672.º, n.º 1, alíneas a) e b) e n.º 2 alíneas a) e b) do Código de Processo Civil.

Termina pedindo que seja concedido provimento ao presente recurso.

Contra-alegaram os recorridos/oponentes pedido a manutenção do julgado.

     Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

     As instâncias consideraram provados os factos seguintes:
1) CC faleceu no dia … de … de 20…, no estado de casado com BB.
2) Os executados DD, EE, FF e GG são filhos de CC e de BB.
3) Por contrato outorgado em 30.09.1998 e seu aditamento de 31.03.1999, foi concedido pela exequente a BB e marido, o falecido CC, um empréstimo no montante global de € 39.016,11, o qual foi creditado na conta de depósitos à ordem dos membros do casal.
4) Em garantia deste empréstimo foi constituída e manteve-se válida hipoteca sobre os prédios nomeados à penhora na presente execução.

          5) As prestações contratadas deixaram de ser pagas a partir de 1 de Agosto de 2003.

          6) Apesar de instados para o respectivo pagamento, BB e o marido jamais o efectuaram.

Nos termos do disposto no art. 659°, n° 3 do CPC aplicável ex vi do art. 713°, n° 2 do mesmo diploma legal, consideram-se, ainda, assentes os seguintes factos constantes dos contratos dados à execução:
7)  Consta do n° 1 da cláusula 2a do contrato outorgado em 30.09.1998 que "o montante em dívida após os pagamentos parciais mencionados no n° 3 da cláusula anterior é de PTE 7.326.147$00 (...) e será amortizado em 24 prestações iguais, mensais e sucessivas, pagas pelos 2°s outorgantes ao B…, vencendo-se a primeira no último dia do 1.o mês posterior à assinatura do presente contrato".
8)  Consta do n° 2 da cláusula referida em 7) que "os juros, contados dia a dia, nos termos da cláusula seguinte, vencem-se mensal e postecipadamente, no último dia do mês respectivo, iniciando-se a sua contagem na data da assinatura do presente contrato".

9)  Consta da cláusula 2a do aditamento ao contrato outorgado em 31.3.1999 que "o empréstimo reestruturado de 7.600.000$00 é prorrogado pelo prazo de 15 anos, mantendo o reembolso em prestações mensais, iguais de capital e juros, que serão pagas por débito da mencionada conta D/O, ...".



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     Por contrato celebrado, em 30.09.1998, entre o Banco/exequente e a executada BB e seu falecido marido, CC, aditado em 31.03.1999, o primeiro concedeu aos segundos o empréstimo de € 39.016,11, que foi creditado na conta de depósitos à ordem dos membros do casal, que deveria ser amortizado em 24 prestações iguais, mensais e sucessivas.

     Deixando de serem pagas as contratadas prestações a partir de 1 de Agosto de 2003, pretende o Banco/exequente que os executados satisfaçam o quantitativo mutuado ainda em débito.

    Ambas as instâncias ajuizaram que o crédito exequendo se encontrava já prescrito, por aplicação ao caso do estatuído no art.º 310.º do C.Civil (prazo de prescrição de cinco anos).

   Contra este entendimento reage o Banco/exequente, sustentando que ao caso ora em apreciação se aplica o disposto no art.º 309.º do C.Civil (prazo geral de prescrição de 20 anos).

     É esta a problemática que havemos de dirimir no presente recurso.


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     I. Desde há muito tempo que a doutrina e a jurisprudência vêm explicitando que a razão da “prescrição” se vai buscar à praticada negligência do titular de discriminado direito, consubstanciada na omissão do seu exercício durante certo tempo, que o legislador contabiliza e durante o qual se faz presumir a renúncia ao direito, ou, torna aquele indigno de protecção jurídica (Prof. Manuel de Andrade; Teoria Geral da Relação Jurídica; II; pág. 445-446); constituindo a prescrição um facto extintivo do direito, tem o seu fundamento específico na situação antijurídica de negligência (Aníbal de Castro; a caducidade; pág. 28).

     A prescrição, tal como a caducidade e o não uso, exprimem a relevância do tempo (do seu decurso sobre as relações jurídicas), visando a certeza e a segurança do tráfego jurídico, tendo como fundamento a consideração de que não merece a protecção do ordenamento jurídico quem descura o exercício dos direitos que lhes assistem, porque a paz social não se compadece com a inércia, para lá de limites temporais impostos pelo legislador (Ac. STJ de 19.06.2012; Relator o Ex.mo Cons. Dr. Fonseca Ramos; www.dgsi.pt).

     II. O prazo ordinário da prescrição é de vinte anos (art.º 309.º do C.Civil).

     Todavia, prescrevem no prazo de cinco anos as quotas de amortização do capital pagáveis com os juros - art.º 310.º, alínea e), do C. Civil.

     Esta prescrição legal, compreendida nas designadas prestações periodicamente renováveis, é comummente defendida pela circunstância de, através dela, se obviar a que o credor, adiando a exigência do pagamento de prestações de abreviado quantitativo, deixe amontoar o seu crédito a tal ponto que torne demasiado dificultada a prestação do devedor - Prof. Manuel de Andrade; ob. Citada; pág. 452.

    Nos termos do que está proposto no n.º 1 do art.º 304.º do C.Civil, verificada a prescrição pelo decurso do prazo prescricional, é conferida ao devedor, seu beneficiário, a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito; e estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição (art.º 298.º, n.º 1 do C.Civil).

     III. Como comprovado está, o exequente “AA, SA” emprestou à executada BB e seu falecido marido CC o montante global de € 39.016,11, obrigando-se estes a amortizar o quantitativo de 7.326.147$00 (ainda não pago) em 24 prestações iguais, mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira no último dia do 1.o mês posterior à assinatura do contrato (30.09.1998).

     Foi pactuado também entre o exequente/mutuante e os mutuários subscritores deste contrato de empréstimo que os juros, contados dia a dia, se venciam, mensal e postecipadamente, no último dia do mês respectivo, iniciando-se a sua contagem na data da assinatura do presente contrato (n.º 2 da cláusula 2.ª).

     Ainda, em aditamento do contrato inicialmente acordado e materializado em 31.3.1999, assentaram as partes contraentes que "o empréstimo reestruturado de 7.600.000$00 é prorrogado pelo prazo de 15 anos, mantendo o reembolso em prestações mensais, iguais de capital e juros, que serão pagas por débito da mencionada conta...".

     Quer isto dizer que o débito dos executados se concretizou, desde a subscrição do contrato de empréstimo operada em 30.09.1998, numa quota de amortização mensal de 24 prestações (iguais, mensais e sucessivas) referentemente ao capital de 7.326.147$00, circunstancialismo contratual que se manteve após o seu aditamento realizado em 31.03.1999, no qual se consignou que o capital em dívida de 7.600.000$00 era prorrogado pelo prazo de 15 anos, mantendo o reembolso em prestações mensais, iguais de capital e juros…

     Ora, se é assim, dúvidas não poderemos ter de que a atitude do Banco exequente se enquadra na previsão legal do disposto no art.º 310.º, alínea e), do C. Civil, e, por isso, assiste aos executados o privilégio de poderem recusar o cumprimento da prestação pedida na execução contra eles movida.

     Foi este, outrossim, o entendimento professado pelas instâncias.

   

     IV. Louvando-se nosEstudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia; volume III; página 47, 1.º, 2.º e 3.º parágrafos do ponto IV", assevera o recorrente que a alínea e) do art.º 310.º do C.Civil se não aplica ao caso “sub judice”, mercê de estarmos em presença de uma única obrigação que, embora passível de ser fraccionada, jamais poderá ela ser equiparada a uma prestação periódica, renovável e cuja constituição depende do decurso do tempo.

     Ultima o recorrente que neste dispositivo legal apenas cabem as obrigações pecuniárias com natureza de prestações periódicas, pagáveis em prestações sucessivas e que correspondam a duas frações distintas: uma de capital e outra de juros, em proporção variável, a pagar conjuntamente.

    

    Não acompanhamos esta dedução argumentativa expendida pelo Banco/recorrente.

    Na verdade, se é certo que a disciplina legal estatuída na alínea e) do art.º 310.º do C.Civil se não estenderá aos casos em que se verifica “uma única obrigação pecuniária emergente de um contrato de financiamento, ainda que com pagamento diferido no tempo”, o certo é que a realidade circunstancial que envolve o relacionamento contratual estabelecido entre o exequente e os executados se não propaga nesta realidade jurídico-substancial.

   

    Convenhamos que das considerações, difundidas por Ana Filipa Morais Antunes, insertas nos Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia; volume III; página 47” se retira lição diferente daquela que o recorrente pretende divulgar.

     Como nelas se contêm “…na situação prevista no artigo 310.º, alínea e), não estará em causa uma única obrigação pecuniária emergente de um contrato de financiamento, ainda que com pagamento diferido no tempo, a que caberia aplicar o prazo ordi­nário de prescrição, de vinte anos, mas sim, diversamente, uma hipótese distinta, resultante do acordo entre credor e devedor e cristalizada num plano de amor­tização do capital e dos juros correspondentes, que, sendo composto por diver­sas prestações periódicas, impõe a aplicação de um prazo especial de prescrição, de curta duração. O referido plano, reitera-se, obedece a um propósito de agilização do reembolso do crédito, facilitando a respectiva liquidação em presta­ções autónomas, de montante mais reduzido. Por outro lado, visa-se estimular a cobrança pontual dos montantes fraccionados pelo credor, evitando o diferimento do exercício do direito de crédito para o termo do contrato, tendo por objecto a totalidade do montante em dívida (sublinhado nosso).

     Prosseguindo nesta análise, completa este estudo que constituirão, assim, indícios reveladores da existência de quotas de amor­tização do capital pagáveis com juros: em primeiro lugar, a circunstância de nos encontrarmos perante quotas integradas por duas fracções: uma de capital e outra de juros, a pagar conjuntamente; em segundo lugar, o facto de serem acordadas prestações periódicas, isto é, várias obrigações distintas, embora todas emergentes do mesmo vínculo fundamental, de que nascem sucessivamente, e que se vencerão uma após outra”.

     A obrigação assumida pelos signatários do contrato, confirmamos nós, compartimentada num mútuo e respetivos juros, converteu-se numa prestação mensal de fraccionada quantia global que, desta forma, iria sendo amortizada na medida em que se processasse o seu cumprimento; e esta facticidade está abrangida pelo regime jurídico descrito no artigo 310.º, alínea e), do C. Civil.

           Concluindo:

     1. O prazo ordinário da prescrição é de vinte anos (art.º 309.º do C.Civil); todavia, prescrevem no prazo de cinco anos as quotas de amortização do capital pagáveis com os juros - art.º 310.º, alínea e), do C. Civil.

     2. O débito dos executados concretizou-se, desde numa quota de amortização mensal de 24 prestações (iguais, mensais e sucessivas) referentemente ao capital de 7.326.147$00, circunstancialismo contratual que se manteve após o seu aditamento realizado em 31.03.1999, no qual se consignou que o capital em dívida de 7.600.000$00 era prorrogado pelo prazo de 15 anos, mantendo o reembolso em prestações mensais, iguais de capital e juros.

     3. Ora, se é assim, dúvidas não poderemos ter de que a atitude do Banco exequente se enquadra na previsão legal do disposto no art.º 310.º, alínea e), do C. Civil, e, por isso, assiste aos executados o privilégio de poderem recusar o cumprimento da prestação pedida na execução contra eles movida.

     Pelo exposto, nega-se a revista e confirma-se o acórdão recorrido.


                          Custas pelo Banco/recorrente.


                  Supremo Tribunal de Justiça,
27 de março de 2014.


Silva Gonçalves (Relator).

Pires da Rosa

Maria dos Prazeres Beleza