Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
080579
Nº Convencional: JSTJ00016335
Relator: RAMIRO VIDIGAL
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
CASO JULGADO
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: SJ199210130805791
Data do Acordão: 10/13/1992
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: BMJ N420 ANO1992 PAG507
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Área Temática: DIR CIV - DIR RESP CIV.
Legislação Nacional: CE54 ARTIGO 68.
CPC67 ARTIGO 496 ARTIGO 498.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1976/06/29 IN BMJ N258 PAG220.
ACÓRDÃO STJ DE 1977/11/24 IN BMJ N271 PAG172.
Sumário : I - A proporção de culpas fixada em sentença transitada que atribuiu indemnização por acidente de viação, constitui caso julgado noutro processo que venha a correr entre os mesmos intervenientes no acidente, e em que se venham a provar os mesmos factos causais do acidente.
II - O ressarcimento dos danos não patrimoniais e feito equitativamente, ponderando-se o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso que o justifiquem.
III - A indemnização por danos patrimoniais decorrentes da incapacidade permanente parcial para o trabalho, deve em primeira linha traduzir-se num capital que se extingue no fim da vida activa do lesado e seja susceptivel de garantir durante ela, as prestações periódicas correspondentes às suas perdas de ganho.
IV - A indemnização devida por destruição completa de um automóvel que deixou de ser comercializado não deve limitar-se a cobrir o valor do veículo sinistrado, nem ser excessivamente onerosa para o devedor, impor o pagamento de um veículo novo do modelo mais recente da respectiva marca, antes deve corresponder à actualização do valor que o veículo tinha à data do acidente.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
I- Relatório
1- A, no Tribunal Judicial de Anadia, propôs contra B, motorista, C e D, acção de responsabilidade civil emergente de acidente de viação que ocorreu em 20 de
Setembro de 1980 na E.N. 235 entre o veículo de passageiros ... propriedade do autor e por si conduzido, e o veículo pesado de mercadorias ... propriedade do segundo réu, conduzido pelo primeiro, sob a direcção efectiva e no interesse daquele, e segurado na terceira demandada.
No acidente faleceu E, passageiro do veículo do autor, tendo a viúva deste intentado uma acção na qual, por decisão transitada foi fixada em igual medida (cinquenta por cento) as culpas do autor e do réu B, no acidente.
Vem agora o autor alegar que sofreu vários danos patrimoniais e não patrimoniais e pedir a condenação solidária dos réus (sendo a terceira até ao limite do seguro) em 1584000 escudos correspondente a 50% dos danos totais que teria sofrido.
2- Todos os réus contestaram.
A seguradora invocou a prescrição dado que a acção foi instaurada em 24 de Julho de 1985. Acrescenta que, estando o seguro limitado a 1500000 escudos e tendo já pago 1421502 escudos de indemnização por força da anterior sentença, restam 78498 escudos. Como ao autor foi atribuida metade da culpa, propôs contra ele acção de regresso em que lhe exige o pagamento de 710751 escudos, a qual corre termos, e, sem prejuízo desta, invoca a compensação de créditos até àquele montante.
Por seu turno os outros dois réus, além de invocarem igualmente a prescrição, dão uma versão própria do acidente questionando a percentagem de culpa referida pelo autor.
A excepção de prescrição foi julgada improcedente em recurso para o Tribunal da Relação.
3- Prosseguindo a acção, veio a realizar-se a audiência de julgamento no decurso da qual o autor deduziu ampliação do pedido em mais 714235 escudos e cinquenta centavos que foi admitida.
A sentença julgou parcialmente procedente a acção, condenando solidariamente os réus a pagar ao autor a quantia de 1700000 escudos, sendo a responsabilidade da seguradora tão só até ao montante do capital disponivel, dado já ter efectuado um pagamento ao autor.
4- Os réus C e B apelaram, tendo a Relação concedido parcial provimento ao recurso, e fixou a indemnização devida em 1585425 escudos.
5- Os mesmos, não se conformaram e voltaram a recorrer, agora de revista, para o que alegaram sustentando as seguintes conclusões:
1- O acórdão recorrido violou o disposto nos artigos
496 e 498 do C.P.C., ao considerar haver caso julgado que, notoriamente imputa aos recorrentes responsabilidade em medida que, por excessiva, é injusta.
2- Violou o disposto nos artigos 659 n. 3 e 661 n. 2 do mesmo Código ao considerar factos que não estão provados, como ele afirma ao transcrever a matéria apurada.
3- Apoiou-se assim, em matéria não apurada e que não podia considerar, arbitrando excessiva indemnização em violação dos artigos 483, 562 e 566 n. 2 do Código Civil.
4- Violou ainda o disposto no artigo 566 n. 2 e 562 e gerou contradição insanável, ao condenar sem considerar a actualização do montante há muito pago ao autor - - isto é, arbitrou indemnização actualizada e não actualizou o montante entregue, nem procedeu à actualização do que tenha ficado a ser devido a partir do pagamento pelos réus de 710751 escudos há mais de sete anos.
5- Violou ainda o artigo 661 n. 2 da lei processual, por só poder liquidar-se em execução de sentença a indemnização para atender ao anteriormente referido.
O recorrido pugna pela manutenção do acórdão.
Tudo visto, cumpre decidir.
II- Fundamentos
1- Foi dado como provado pelo Tribunal da Relação:
Da especificação:
No dia 20 de Setembro de 1980 pelas 23 horas, na E.N.
235 entre Oliveira do Bairro e Oiã, numa recta de estrada a seguir ao lugar de Silveiro, ocorreu um acidente de viação que envolveu um veiculo ligeiro misto de passageiros, de matrícula ... propriedade do autor e o veículo pesado de mercadorias de matrícula ... propriedade do 2, réu conduzido na altura do acidente pelo 1 réu (A).
Em consequência desse acidente veio a falecer E que, na altura da colisão entre os veículos, seguia como passageiro no veículo do autor
(B).
Intentada acção especial nos termos do artigo 68 do
Código da Estrada pela viúva do falecido E que correu seus termos pela 2. Secção do 1 Juízo de Anadia, sob o n. 212/82, e discutida a causa, proferiu o tribunal sentença já transitada em julgado considerando, (sic) que: "o acidente se deve a convergência das condutas, ambas culposas dos réus A (condutor do auto ligeiro NP) e B (condutor do pesado LH), o que é do conhecimento oficioso deste Tribunal por virtude do exercicio das suas funções (artigo 514 n. 2 do Código de Processo Civil), (C).
Acabando por fixar, em igual medida, a contribuição de cada um deles para o acidente (D).
À responsabilidade dos dois condutores, acresceu a do segundo réu, como proprietário do pesado LH e presumivelmente detentor da sua direcção efectiva e a da ré Seguradora por força do contrato de seguro que havia celebrado com o réu C e titulado pela apólice n. 438588 (E).
Do questionário:
Mercê do acidente, o autor sofreu fractura e luxação da coxa femural direita (1).
Para tratamento de tais lesões foi o autor submetido a uma intervenção cirúrgica no Centro Hospitalar Aveiro-Sul onde esteve internado até 20 de Outubro de 1980 (2).
Já depois de ter alta, continuou o autor em regime de tratamento externo, vindo a ser dado como incapaz para todo o serviço activo da P.S.P., em 11 de Setembro de 1981 (3).
Pelo que o periodo total de doença do autor, causado pelo acidente, foi cerca de um ano (4).
Ainda hoje, após ter sido dado como incapaz, o autor tem dores fortissimas à flexão da perna direita, apresentando notável diminuição de resistência da mesma, tendo ficado a coxear e com os músculos da perna atrofiados (5).
À data do acidente, o autor era agente da P.S.P, com idade de 40 anos, auferindo mensalmente o vencimento liquido de 17062 escudos (6).
Existe assim uma diferença salarial entre aquilo que o autor ganha e o que poderia ganhar caso não tivesse sido vítima do acidente, na ordem de 5000 escudos, o que equivale a um rendimento anual de 70000 escudos
(8).
Em virtude do acidente, o autor destruiu completamente o veículo automóvel ligeiro de passageiros ..., sua propriedade, que havia adquirido em 29 de Setembro de 1979 à Auto Comercial pelo preço de 268395 escudos, veículo que deixou de ser comercializado, passando a sê-lo em sua substituição o "UNO 45" pelo preço de 607579 escudos (9).
2- Passemos à análise de recurso.
A 1 questão diz respeito à alegada violação das disposições sobre o caso julgado.
Aconteceu que, por via do mesmo acidente, os familiares do falecido E passageiro que seguia no carro do autor, accionaram este, e os três ora réus com fundamento em culpa de ambos os condutores. A sentença que foi proferida e transitou em julgado decidiu que ambos os condutores (que nessa acção eram demandados e reciprocamente se imputavam as culpas) contribuiram em igual medida para o evento e fixou em cinquenta por cento a culpa de cada um.
O primeiro réu é o autor desta acção e os três restantes são os réus da mesma.
O ora autor baseou o seu pedido de indemnização nessa sentença, relativamente à partilha de responsabilidades, aceitando-a como caso julgado.
Os demandados C e B pretendem reapreciar, com base nos mesmos factos, o grau de culpa de cinquenta por cento fixada naquela sentença, com a alegação de que o auto pesado dos recorrentes tinha os refletores da rectaguarda em bom estado e destapados e o autor não invocou o cruzamento com outro veículo, pelo que deveria ser o exclusivo ou principal culpado.
Ao considerar-se haver caso julgado, imputa-se aos recorrentes responsabilidade que por excessiva, é injusta.
Ora, os factos relativos ao acidente de que os recorrentes se socorrem, ficaram todos provados no anterior processo, e são por eles aceites. O que discutem é a proporção de responsabilidades que na anterior sentença foi atribuida aos intervenientes, pretendendo discuti-la neste processo.
Para o efeito argumentam que o autor dessa acção cível não é parte nesta acção e um réu dessa acção, é agora autor.
Mas não pode negar-se que todos os interessados nesta acção, tiveram intervenção no anterior processo e oportunidade de discutir, como discutiram, as causas do acidente e as respectivas responsabilidades, embora um deles fosse ali réu e aqui autor. Mas esta circunstância não constitui inidentidade de sujeitos como pretendem os recorrentes porque a identidade exigida pelo caso julgado diz respeito à qualidade jurídica das partes quanto à relação substancial controvertida e não relativamente à sua posição processual ou relação jurídica adjectiva. É este o sentido do n. 2 do artigo 498 do Código de Processo Civil (confere por exemplo J. A. Reis, Código de Processo Civil Anotado III - 101).
O que pode ser discutido é se a questão da proporção de responsabilidades no acidente, fixada na 1 sentença como pressuposto da sua decisão de indemnização, deve valer como caso julgado neste processo em que foi formulado pedido de indemnização por virtude do mesmo acidente - o que tem a ver com a extensão do caso julgado.
Existindo como existe no caso vertente, identidade de sujeitos e ainda de causa de pedir - de pedidos pois as pretensões de indemnização provêm do mesmo facto lesivo e resultando que estão assentes nos dois processos os mesmos factos concretos explicativos ou causais do acidente, tem de admitir-se que se formou caso julgado quanto à culpa e respectiva proporção no desencadear dos eventos.
O caso julgado, em principio, reside na decisão proferida sobre o objecto da acção, não se entendendo os raciocinios que a justificam, bem como questões incidentes ou prejudiciais, mas pode abranger a decisão de questão preliminar inerente ao encadeamento lógico da decisão final, desde que, como no caso dos autos, tenha sido esgotado o "thema decidendum" com intervenção de todos os interessados no acidente,
(confere J. A. Reis, Código de Processo Civil Anotado volume III, página 139 e seguintes; Rodrigues Bastos,
Notas ao Código de Processo Civil volume III, 253;
Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 1976 Boletim 258, 220 e de 24 de Novembro de 1977
Boletim 271 e 172 anotados por Vaz Serra na R.L.J. anos 110, 223, e 111 198). Não houve, assim, violação dos artigos 496 a), 497 e 498 do Código de Processo
Civil.
3- Outra das questões postas pelos recorrentes é a de que nem a sentença nem o acórdão recorrido se podiam ter baseado em factos não alegados nem provados, designadamente valorizando um desgosto não alegado.
Quer isto dizer que pretendem seja alterada a matéria de facto que baseou a decisão das instâncias.
Mas esse objectivo não pode ter sucesso. O Supremo, como tribunal de revista julga de direito e não pode censurar a matéria de facto fixada a não ser em casos excepcionais de erro na apreciação das provas ou fixação de factos materiais com ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova (n. 2 do artigo 722 Código de
Processo Civil), o que não é o caso. Trata-se aliás de jurisprudência pacífica como resulta por exemplo (dos
Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Abril de 1975, Boletim 246 - 131; de 21 de Novembro de 1978
Boletim 281 - 241; de 9 de Julho de 1982, Boletim 319 -
234; de 10 de Abril de 1984, Boletim 336 - 372).
Fica afastada deste modo a arguição de violação dos artigos 659 n. 3 e 661 n. 2 do mesmo Código.
4- Sustentam ainda os recorrentes que o acórdão arbitrou indemnização excessiva. a) No que respeita aos danos não patrimoniais, há que ponderar que para o autor resultou fractura e luxação da coxa; para o tratamento foi submetido a uma intervenção cirúrgica do que resultou ficar internado por um mês; após a alta continuou em tratamento externo, vindo a ser dado como incapaz cerca de um ano depois, ainda hoje tem dores fortissimas à flexão da perna cuja resistência está diminuida, ficando com os músculos atrofiados e a coxear; tinha 40 anos à data do acidente e era agente da P.S.P.; o desgosto de ter sofrido com a aposentação (que a Relação considerou facto notório e normal).
O autor na petição computou estes prejuizos em 2000000 escudos, tendo, quer a sentença, quer o acórdão recorrido, entendido justa a quantia de 1500000 escudos e como ele contribuiu para o acidente em igual proporção à dos réus teria apenas direito a metade,
750000 escudos.
Os recorrentes computam o dano em 750000 escudos de que só seriam devidos 375000 escudos e decidindo de modo diferente, dizem, infringindo os artigos 483, 562 e 566 n. 2 do Código Civil.
Antes de mais, não se pode pôr em dúvida que a violação ilicita de direitos e interesses de outrem obriga a indemnizar e que nessa obrigação está incluida a lesão de danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (artigos 483 e 496 n. 1 do
Código Civil).
Os factos descritos e, mais concretamente, a idade do autor, dores sofridas, prejuízo estético, incapacidade parcial permanente, desgosto pela aposentação, traduzem perdas sofridas tanto no bem estar físico como no equilíbrio psíquico, a justificar que sejam pecuniariamente compensadas, e de tal modo que se lhe devolva, quanto possivel, o optimismo da existência.
O montante da indemnização deve ser fixado segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado, e às demais circunstâncias do caso que o justifiquem (artigos 496 n. 3 referido ao artigo 494 do citado Código).
O facto de não ser possivel calcular a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente, e a que teria nessa data se não existissem danos, em termos monetários, não releva porque isso mesmo se encontra ressalvado no n. 2 do artigo 566, funcionando nessa hipótese como se viu, a equidade. Esta tem que ver essencialmente, com a justiça do caso concreto, mas sem se perderem de vista factores sociais e económicos
(confere Almeida Costa, Direito das Obrigações, 5 edição, 1991, página 646; Ribeiro de Faria Direito das Obrigações, volume I, página 492; Vaz Serra Rev. Leg.
Jur. 113,104).
A importância arbitrada pelas instâncias de 750000 escudos, respeita o direito, pelo que é de manter.
No que respeita aos danos patrimoniais, são pedidas duas parcelas: b) No que concerne a diferenças salariais provou-se que o autor sofre um prejuizo de 5000 escudos mensais ou seja 70000 escudos anuais (5000 escudos vezes 14 meses) por causa do acidente, correspondente à desigualdade entre aquilo que ele ganha e o que poderia ganhar se não tivesse sido vítima dele, que implicou a sua reforma compulsiva.
O autor computou este dano, à data da petição (24 de
Julho de 1985) em 560000 escudos correspondente ao capital que se extinga no fim da vida activa conferindo prestações periódicas correspondentes à perda de ganho, abatido de 20% pelo facto de ser pago de uma só vez.
A folhas 118 ampliou o pedido referindo que os valores que ofereceu se encontram substancialmente divorciados da realidade e acrescentou outro dano que não se provou.
A 1 instância, por sentença de 13 de Julho de 1989 entendeu fixar o quantitativo das diferenças salariais; e ponderada ainda a desvalorização monetária em 800000 escudos a ser reduzido a metade. A Relação confirmou ponderando por um lado as regras dos juros passivos praticados na banca, o tempo medio de vida previsivel de cerca de 70 anos, e tendo em atenção por outro o nivel a que se encontra a inflação no nosso Pais.
Segundo os artigos 562 e 566 - do Código Civil, quem estiver obrigado a reparar um dano, deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação; a indemnização é fixada em dinheiro sempre que possivel, não repare integralmente ou se torne excessivamente onerosa para o devedor; tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos; e, se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente nos limites que tiver por provados.
No que respeita aos danos patrimoniais decorrentes da incapacidade permanente parcial para o trabalho, o critério que a jurisprudência vem adoptando é o de a indemnização dever representar um capital que se extinga no fim da vida activa do lesado e seja susceptivel de garantir durante ela, as prestações periodicas correspondentes às suas perdas de ganho.
Concretamente esse capital pode ser encontrado nas tabelas financeiras usadas para a determinação do capital necessário à formação de uma renda periódica correspondente à perda de ganho.
A esse montante deve abater-se uma importância que traduza o beneficio que representa o recebimento imediato e integral desse capital, como normalmente acontece. Além de se dever compensar a desvalorização da moeda que decorre entre a entrada da petição em juizo e o encerramento da discussão em 1 instância
(data mais recente que pode ser considerada), quando seja caso disso.
Os operadores empregados não envolvem valores matemáticos rigorosos, porém, mas antes simples indicadores, até porque a decisão final terá que ser, a maior parte das vezes segundo a equidade.
Aplicando os factores, referidos à situação factica dos autos tem-se como razoável o valor encontrado pelas instâncias, não se justificando a sua alteração para menos propugnada pelos recorrentes, aliás sem quantificação. É de manter pois o montante de 400000 escudos. c) Restam os danos que resultaram da destruição completa do automóvel do autor.
Era um "Fiat 127" que ficou completamente destruido. O seu custo um ano antes do acidente tinha sido de
268395 escudos.
O veículo deixou de ser comercializado e passou a sê-lo em sua substituição, o "FIAT UNO 45" pelo preço de
607579 escudos.
Entretanto o preço deste subiu para 1082450 escudos, o que levou o autor a formular a correspondente ampliação do pedido em 18 de Outubro de 1988.
A sentença da 1 instância considerando que na sua data o preço ainda seria mais elevado, computou-o em 1100000 escudos pelo que fixou os danos em metade desse valor
(550000 escudos) atento o grau de responsabilidade do lesado.
A 2 instância rejeitou esta tese porque isto equivaleria a substituir um carro usado de modelo que atingiu o seu termo, pelo equivalente de um carro novo do último modelo.
Assim, calculou o valor do veículo à data do acidente em 225000 escudos (desvalorização de 15% sobre o preço de compra, por ter um ano de uso) e depois entrou em linha de conta com a desvalorização monetária (até ao ano do encerramento da discussão e da sentença na 1 instância) encontrando, não 1100000, mas 870850 escudos em que computou o valor de que atribuiu ao autor 435425 escudos (ou seja metade).
O que está em causa é apenas apurar se o valor fixado não deverá ser inferior, como querem os recorrentes, dado que o lesado não interpôs recurso pedindo montante superior.
Não pode esquecer-se que funcionam aqui as regras já acima apontadas e que avaliam o dano na diferença entre a situação patrimonial real do lesado e a hipotética em que estaria se não lhe tivesse sobrevindo o dano, visto não haver lugar a reconstituição natural nem a reparação (artigos 562 e 566 do Código Civil).
Mas a reparação em dinheiro, que é a adequada, não pode também ser excessivamente onerosa para o devedor, o que aconteceria se, por não haver disponivel aquele modelo, se procurasse compensá-lo com um veículo novo de modelo mais recente; nem apenas cobrir o valor do sinistrado.
É de considerar que o autor, com o seu pedido de ampliação, pretendeu actualizar o montante indemnizatório a que se reputa com direito; por outro lado não há que falar em salvados; nem está provado que em 1985, o carro sinistrado já estava substituido; e o aumento correspondente à inflação não se destina a beneficiar o autor, mas a repor o poder aquiritivo da moeda ao nivel do momento em que ocorreu o dano.
Ora, resulta que o valor encontrado pela Relação responde aos diversos interesses em jogo e enquadra-se dentro dos parâmetros legais acima referidos, não sendo de reduzir. Corresponde pois o dano no automóvel ao montante indemnizável de 435425 escudos.
5- Pretendem finalmente os recorrentes que, tendo a seguradora pago ao autor ou pago pelo autor a quantia de 710751 escudos e havendo compensação até esse montante, tal valor deveria ser corrigido de acordo com os índices de inflação, o que o acórdão recorrido não fez.
Acontece que, em referência a esta matéria há apenas alusões nos autos de que a seguradora pagou a indemnização devida pelo falecimento do passageiro, no montante de 1421502 escudos estando o capital limitado a 78498 escudos, e em acção de regresso, accionou o autor como responsável por metade, exigindo-lhe 710751 escudos.
Isto nada tem que ver com a indemnização pedida pelo autor aos réus, nem faz sentido corrigir o valor de
710751 escudos segundo os índices da inflação, neste processo, nem envolve qualquer contradição dentro do acórdão recorrido, o não se ter tornado em conta tal inflacção. Trata-se de direitos e responsabilidades distintas, discutidas em processos diferentes.
Uma vez que a Relação obteve elementos que lhe permitiram condenar em quantia certa, não havida razão para relegar o valor para liquidação em execução de sentença, pelo que não foi igualmente violado o n. 2 do artigo 661 do Código de Processo Civil.
III- Decisão
Nos termos expostos, não se verificando a existência de violação de lei, nega-se a revista com custas pelos recorrentes.
Lisboa, 13 de Outubro de 1992
Ramiro Vidigal
Santos Monteiro
Miguel Montenegro
Decisões impugnadas:
I - Sentença de 13 de Julho de 1989 da Anadia;
II - Acórdão de 6 de Novembro de 1990 da Relação de
Coimbra.