Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
58/22.1JACBR.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: LOPES DA MOTA
Descritores: CONCURSO DE INFRAÇÕES
CÚMULO JURÍDICO
MEDIDA CONCRETA DA PENA
PENA ÚNICA
REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
PENA ACESSÓRIA
PENA DE EXPULSÃO
PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO
PRINCÍPIO DA NECESSIDADE
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Data do Acordão: 01/17/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO EM PARTE
Sumário :
I – Pretendendo ver reduzidas as penas parcelares e a pena única e beneficiar do regime especial aplicável a jovens adultos (DL n.º 401/82), recorre o arguido do acórdão da 1.ª instância que o condenou na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão, pela prática de quatro crimes de violação, quatro crimes de roubo e dois crimes de gravações e fotografias ilícitas, bem como na pena acessória de expulsão do território nacional.

II – Estando em causa uma situação de concurso de crimes (artigos 30.º, n.º 1, e 77.º do CP), pode o STJ conhecer de todas as questões de direito relativas à pena única aplicada aos crimes em concurso e às penas aplicadas a cada um deles, englobadas naquela pena única, inferiores àquela medida, se impugnadas (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 5/2017, DR I, de 23.6.2017), como sucede no caso presente.

III – A determinação das penas singulares e da pena única reflete e responde proporcionalmente à gravidade dos factos, na consideração dos fatores relevantes por via da culpa e da prevenção, nos termos dos artigos 71.º e 77.º, n.º 1, do CP.

IV – A idade do arguido à data da prática do facto constitui um requisito formal de aplicação do artigo 4.º do DL n.º 401/82, o qual impõe ao tribunal, com a mais ampla margem de apreciação, sob pena de nulidade não o fazendo, o dever de averiguar se estão ou não verificados os requisitos de que depende a atenuação especial da pena (artigo 72.º do CP).

V – Da matéria de facto provada não é possível retirar elementos que permitam constituir base (“sérias razões”) para fazer “crer” que a redução da pena de prisão por via da atenuação especial possa contribuir para a reintegração do arguido na sociedade, pelo que se mostra justificada a não aplicação do artigo 4.º do DL n.º 401/82.

VI – O artigo 151.º da Lei n.º 23/2007 distingue três situações de aplicação da pena acessória de expulsão, relativamente às quais impõe requisitos diversos: o n.º 1 diz respeito a estrangeiros não residentes, o n.º 2 a estrangeiros residentes – estrangeiros com residência temporária (artigos 74.º e 75.º), estrangeiros com residência permanente (artigos 74.º e 76.º) e estrangeiros residentes de longa duração (artigos 126.º a 133.º) – e o n.º 3, cumulativamente com o n.º 2, a estrangeiros com residência permanente.

VI – A pena acessória de expulsão do território nacional constitui uma verdadeira pena; embora esteja dependente da aplicação da pena principal, não resulta direta e imediatamente da cominação desta, no sentido de que não é seu efeito automático, o que constitui imposição constitucional, decorrente do n.º 4 do artigo 30.º da Constituição, que estabelece, tal qual o faz o n.º 1 do artigo 65.º do CP, que nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos.

VII – Na aplicação das penas acessórias, devem estar presentes princípios que presidem à aplicação das penas, pelo que é imprescindível a mediação de um juízo que avalie os factos praticados e pondere a adequação e a necessidade de sujeição do condenado a essas medidas, que não podem resultar ope legis da simples condenação penal.

VIII – A determinação da sua duração, em concreto, “por período até 5 anos”, que corresponde ao período de duração da interdição de entrada em território nacional (artigo 144.º, n.º 1 da Lei n.º 23/2007), há de levar em conta, no caso de aplicação a estrangeiros residentes, os critérios a que se refere o n.º 2 do artigo 151.º: a gravidade dos factos praticados pelo arguido, a sua personalidade, a eventual reincidência, o grau de inserção na vida social, a prevenção especial e o tempo de residência em Portugal.

IX – Dos factos provados resulta evidente um percurso de vida do arguido, ainda muito jovem, oriundo de um meio carenciado, centrado na educação e formação, sempre com apoio material e afetivo da sua mãe – o único apoio ao longo da vida que vem noticiado –, a qual, com esse objetivo, lhe proporcionou cuidados para suprir problemas de saúde e dificuldades de aprendizagem e decidiu a sua vinda para Portugal, aos 16 anos, para estudar, e que, pouco tempo após a prática dos crimes, fixou residência em Portugal em união de facto com um cidadão nacional, estabelecendo uma estrutura sociofamiliar com aparente organização e estabilidade para estar próxima e continuar a apoiar o arguido, seu único filho, circunstância que, no quadro conhecido, pode desempenhar um papel crucial na realização das finalidades de reinserção que no caso se fazem sentir.

X – Apesar da elevada gravidade dos factos praticados, identificam-se elementos com aptidão para contribuírem ativa e efetivamente para a necessária ressocialização do arguido, inscrita na realização da finalidade da pena (artigo 40.º do CP), perante as muito elevadas necessidades de prevenção especial e desvaliosas qualidades de personalidade, ainda em estruturação, reveladas na prática do crime, que, num razoável juízo de prognose, não deverão neutralizar-se pela expulsão (temporária) para o país de origem, com o qual perdeu as ligações familiares, após a reclusão imposta pelo cumprimento da pena de prisão.

XI –  Assim, ponderando conjuntamente os fatores de aplicação da pena de expulsão indicados no n.º 2 do artigo 151.º da Lei n.º 23/2007, em conjugação com o artigo 40.º do CP, em respeito pelos critérios de necessidade, adequação e proporcionalidade, justifica-se que, tendo em conta o comportamento anterior aos crimes, as necessidades de prevenção especial e as condições de ressocialização em território nacional, que não ocorrem no país de origem, não deva ser aplicada a pena acessória de expulsão.

Decisão Texto Integral:

Acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:


I. Relatório

1. AA, arguido, com a identificação que consta dos autos, interpõe recurso do acórdão de 10.02.2023, proferido pelo tribunal coletivo do Juízo Central Criminal de Coimbra - Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, que o condenou pela prática, em concurso efetivo e coautoria com o arguido BB, de:

a) 4 (quatro) crimes de violação previstos e punidos pelos artigos 164.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), na pena de 4 anos para cada um deles;

b) 4 (quatro) crimes de roubo, previstos e punidos pelo artigo 210.º n.ºs 1 e 2 alínea b), na pena de 1 ano e 9 meses para cada um deles

c) 2 (dois) crimes de gravações e fotografias ilícitas, previstos e punidos pelo disposto no artigo 199.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 8 meses para cada um deles; e

Em cúmulo jurídico, na pena única de 8 e 6 meses de prisão.

2. Discordando do decidido, apresenta motivação que termina com as seguintes conclusões (transcrição):

“1.ª O presente recurso vem interposto do acórdão que condenou o arguido, ora recorrente, como coautor material e em concurso real de: 4 crimes de violação, previstos e punidos pelo artigo 164º nºs 1 e 2 alínea a) do Código Penal; 4 crimes de roubo, previstos e punidos pelo artigo 210º nºs 1 e 2 alínea b) do Código Penal; 2 crimes de gravações e fotografias ilícitas, previstos e punidos pelo disposto no artigo 199º nº 2 alínea a) do Código Penal, em cúmulo jurídico na pena única de oito anos e seis meses de prisão efetiva, e nas penas acessórias de proibição de exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual e de confiança de menores, prevista nos artigos 69º-B, n.º 1 e 2 e 69º-C, nº 2 e 4 do Código Penal, pelo período de 10 anos e ainda na pena de expulsão do país, prevista no artigo 151º da Lei º23/2007 de 4 de Julho, por não se poder conformar com o mesmo.

2.ª O presente recurso versa sobre matéria de direito, concretamente, sobre a determinação do quantum punitivo, relativamente às penas parcelares e à pena única, por se considerar serem manifestamente excessivas, quanto ao regime especial para jovens, da não suspensão da execução da pena de prisão e à pena acessória de expulsão do país.

3.ª No caso em apreço, o Tribunal recorrido deu como provado os factos elencados no acórdão, sob os artigos 1.º a 25.º; 28.º a 31.º; 33.º (1. a 15º) e 35.º.

4.ª É indubitável que o Tribunal aprecia a prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador (cfr. Artigo 127º do Código de Processo Penal). Todavia, livre convicção não significa livre-arbítrio. Por isso, se exige que na fundamentação da decisão se indiquem e examinem criticamente as provas que serviram de base a essa convicção (cfr. Artigo 374º nº 2 do Código de Processo Penal). No entanto, tal convicção tem de ser motivada objetivamente para assim afastar, o mais possível, os índices de subjetividade a que a mesma está sempre submetida.

5.ª E, como se encontra adquirido pela doutrina e jurisprudência e insistentemente se repete, na determinação da medida concreta da pena o Tribunal deve atender, em primeira linha, à culpa do agente, que constitui o limite superior e inultrapassável da pena a aplicar, sob pena de, ultrapassando-o, se afrontar a dignidade humana do delinquente. Por seu turno, o limite mínimo da moldura concreta há de ser dado pela necessidade de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto e pretende corresponder a exigências de prevenção positiva ou de integração. Isto porque:

O recorrente confessou os factos.

O recorrente mostrou-se arrependido.

O recorrente não tem antecedentes criminais.

O recorrente tem 20 anos de idade.

6.ª Venerandos Juízes Desembargadores, o recorrente, logo no primeiro interrogatório para aplicação das medidas de coação, perante o Meritíssimo Juiz de Instrução, confessou os factos. Não pode ser outro o entendimento, o arguido AA contribuiu para a descoberta da verdade.

7.ª Em sede de audiência de discussão e julgamento, o recorrente, revelou arrependimento, embora fosse notório não ter capacidade de expressar autocensura e sentido critico, contudo, tal arrependimento também se extrai do relatório social para determinação da sanção, elaborado pelos serviços da DGRS, no capítulo “III - Impacto da situação jurídica-penal”, quando refere “Sinto-me mal. A minha mãe ficou triste”.

8.ª Relativamente aos antecedentes criminais, nada consta do certificado do registo criminal.

9.ª O recorrente tem 20 anos de idade, sendo notório um atraso cognitivo, que, no nosso entender, limita as suas capacidades de compreensão e de discernimento, facto que, não sendo desculpante, autoriza a olhá-lo com prudência, aliás, na introdução do referido relatório social (dá-se por integralmente reproduzido o seu conteúdo, que por uma questão de economia e celeridade processuais não se transcreve dada a sua extensão), está a nota “Nas entrevistas realizadas, o arguido revelou dificuldades em expressar-se e em localizar no tempo alguns acontecimentos da sua vida”.

10.ª E, neste particular, não podemos deixar de pedir ainda emprestadas parte das Conclusões “IV” no referido relatório social, onde constam as impressões colhidas pela Exma. Sra. Técnica de Reinserção Social: “Além das dificuldades cognitivas, evidenciadas sobretudo na apreensão de conteúdos escolares teóricos, é referenciado como uma pessoa introvertida, imatura e influenciável. Revela ainda dificuldades de expressão na comunicação interpessoal.”

11.ª De facto, é pertinente referir que à data a que se reportam os factos pelos quais está pronunciado/acusado e condenado, o recorrente estava, praticamente, entregue à sua sorte, vivendo num quotidiano de algum facilitismo, facto este que permitiu influenciar-se por um círculo de amizades, partindo, assim, sem rédeas, para os perigos da vida mundana.

12.ª Contudo, o comportamento anterior do recorrente não indicava perturbações comportamentais assinaláveis, o relatório social diz-nos isso.

13.ª O que revela, Venerandos Juízes Desembargadores, na esteira inclusive do que vem referido naquele relatório social, nas Conclusões “IV”: “O afastamento à família, nomeadamente ao tio, a distância geográfica relativamente à mãe e num contexto de adolescência e das já referidas vulnerabilidades pessoais, colocaram-no numa situação de especial necessidade de reconhecimento e integração em grupos de pares”.

14.ª Por conseguinte, não obstante, o recorrente ter consciência da ilicitude dos seus atos, o recorrente AA, embora mais velho, surge à parte deste “esquema”, pelo que da voluntariedade das ações, à intencionalidade das mesmas, não partiam de si.

15.ª Na senda do que se acaba de dizer, conclui-se, salvo o devido respeito, que o Tribunal a quo ao condenar o recorrente na pena de prisão de 8 anos e 6 meses, fê-lo, friamente, afastando definitivamente a possibilidade de aplicação do regime do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro, Regime Penal aplicável a jovens delinquentes, sem que se sopesassem devidamente: a personalidade do agente, as suas condições atuais de vida, a sua conduta.

16.ª Diga-se que é compreensível o afastamento do Regime Penal aplicável a jovens delinquentes ao arguido BB cuja reincidência é uma realidade, mas no que respeita ao recorrente, insistimos que importa valorar decisivamente o facto de deste não ter antecedentes criminais pela prática de quaisquer crimes.

17.ª Mais importa notar que o recorrente, naturalmente, não quer menosprezar ou dirimir a gravidade da sua atuação, mas tão só referir, porque não pode aceitar o rótulo de violador, não passando de um jovem, no primeiro contacto com o sistema judicial.

18.ª Entendemos, e ressalvado o devido respeito, que o Tribunal não levou em linha de conta a confissão e a idade do arguido, bem como a ausência de antecedentes criminais.

19.ª Mais, concordamos com a jurisprudência que vai no sentido de que o juízo de aplicabilidade não pode atender de forma exclusiva à gravidade da ilicitude ou da culpa do arguido. Tem de considerar a globalidade da atuação e da situação do jovem e, por isso, o conhecimento da sua personalidade, das suas condições pessoais e conduta anterior e posterior ao crime, pelo que não se pode aderir ao sentido com que o Tribunal recorrido interpretou e aplicou o Regime Penal aplicável a jovens delinquentes.

20.ª Por conseguinte, adere-se ao entendimento constante no Acórdão do STJ, de 7-11-2007, Proc.07P3214, 7-11-2007, Proc.07P3214. “A aplicação do regime penal relativo a jovens entre os 16 e os 21 anos não constitui, pois, uma faculdade do juiz, mas antes um poder-dever vinculado que o juiz deve (tem de) usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos; a aplicação é, em tais circunstâncias, tanto obrigatória, como oficiosa. (…) “Para avaliar da verificação dos respectivos pressupostos – determinar se pode ser formulado um juízo de prognose benigno quanto às expectativas de reinserção de um jovem –, perspectiva em que o relatório social deve ser considerado um elemento da maior relevância.”

21.ª Ora, o recorrente socorre-se do relatório social. Relembre-se que o mesmo foi elaborado também com recurso a consulta documental importante sobre o recorrente, apresentada pela mãe deste, nomeadamente:

- Declaração passada pela Direção Nacional da Educação de ... de 6/04/2022;

- Declaração do Serviço de Psiquiatria do Hospital Universitário ... - Extensão da ... (...) de 7/04/2022;

- Declaração assinada pela psicóloga CC (...) de 7/04/2022. (destacados nossos)

22.ª Neste conspecto, tem de se concluir que o Tribunal recorrido andou mal ao não lhe atribuir outro valor, mas sendo por isso evidente que o seu conteúdo é absolutamente determinante para o recorrente AA, que, salvo o devido respeito, também foi o alvo fácil e o sujeito débil.

23.ª Portanto, não pode resignar-se com o Tribunal quando diz: “O tribunal não vislumbra qualquer vantagem na atenuação especial, apesar da idade dos arguidos, sendo que não consegue realizar o juízo de prognose sobre o desempenho futuro da personalidade do jovem, pela avaliação global dos factos apurados no caso concreto, a natureza e modo de execução do crime, a personalidade do arguido, a sua conduta anterior e posterior ao facto, bem como as suas condições de vida,

Ambos os arguidos apresentam dificuldades nos estudos e na actividade laboral, demonstrando uma personalidade pouco conscienciosa dos deveres jurídico penais e da necessidade de os cumprir.

São extremamente graves os factos praticados pelos arguidos, seguidos no tempo, o que não permite a sua justificação pela sua idade e juventude.

Pelo que se afasta a aplicação deste regime.”

24.ª O mesmo juízo de prognose para ambos os arguidos?

25.ª Ficamos sem saber porquê, na medida em que apenas se faz a afirmação do afastamento daquele regime, mas não se faz qualquer demonstração relevante e individual para sustentáculo do sentenciado. Não basta dizer, é indispensável dar-se a conhecer a análise crítica dos meios probatórios, para daí se poder compreender e inferir o juízo feito pelo Tribunal recorrido.

26.ª Não existindo esta análise do exame crítico não se está habilitado a apreciar a bondade da decisão, por forma a apurar-se, neste concreto ponto, da sua correção e cumprimento dos critérios impostos legalmente.

27.ª Venerandos Juízes Desembargadores, salvo o devido respeito a douta opinião diferente, relativamente ao recorrente AA o Tribunal recorrido não interpretou nem aplicou o DL n.º 401/82, de 23 de Setembro, pelo que fez uma errada interpretação e aplicação daquele normativo.

28.ª Aqui chegados não se pode deixar de equacionar o excesso das penas parcelares que lhe foram aplicadas, e se mostram distantes do limite mínimo das respetivas molduras.

29.ª Nos termos do artigo 71.º do Código Penal, a determinação da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, sendo que na determinação concreta da pena, o tribunal atende a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do arguido ou contra ele, considerando, nomeadamente o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos, entre outras circunstâncias.

30.ª Relativamente aos crimes aos 4 crimes de violação, previstos e punidos pelo artigo 164º nºs 1 e 2 alínea a) do Código Penal, tendo em consideração o que anteriormente se disse no que concerne, mormente, quanto à limitação cognitiva do recorrente, o facto não ter antecedentes criminais pela prática de quaisquer crimes, a sua idade e arrependimento, não podemos deixar de considerar que a pena de 4 anos de prisão aplicada a cada um dos crimes se mostra desadequada e desproporcional no caso em concreto. Assim, deve entender-se que o Tribunal recorrido deveria ter aplicado uma pena próxima do mínimo da moldura abstratamente aplicável. Aplicação que se reclama.

31.ª No que tange aos 4 crimes de roubo, previstos e punidos pelo artigo 210º nºs 1 e 2 alínea b) do Código Penal, o recorrente foi condenado na pena de 1 ano e 9 meses de prisão por cada um deles, na verdade, importa referir que esta punição é excessiva e para além da culpa e exigências de prevenção.

32.ª Assim, salvo o devido respeito, a pena aplicada de 1 ano e 9 meses de prisão, por cada um dos crimes, deve ser reduzida para o mínimo da moldura abstratamente aplicável.

33.ª No que concerne aos 2 crimes de gravações e fotografias ilícitas, previstos e punidos pelo disposto no artigo 199º nº 2 alínea a) do Código Penal, o recorrente foi condenado a 8 meses por cada um deles, tendo em consideração o que oportunamente se disse antes e, reputando que a moldura penal é de prisão até 1 ano e que em regra a pena de prisão tem a duração mínima de um mês, conforme preceitua o n.º 1 do artigo 41.º do Código Penal, a pena em concreto a aplicar ao recorrente deve ficar próxima deste limite mínimo.

34.ª Assim, concluímos que mal andou o douto Tribunal ao não considerar os artigos 71.º, 72.º 73.º do Código Penal, por haver razões para crer que da atenuação especial resultam vantagens para a reinserção social do jovem AA.

35.ª Nestas circunstâncias e, após a aplicação das penas parcelares no quantum propugnado, o cúmulo jurídico deve ser reformulado.

36.ª Julga-se assim que a pena única deve ser fixada em medida não superior a cinco (5) anos de prisão, devendo ser suspensa na sua execução, nos termos do artigo 50º Código Penal.

37.ª Pena de prisão suspensa na sua execução que se reclama para o recorrente, mediante regime de prova nos termos do artigo 53º do Código Penal, que inclua a obrigação de frequência de programas específicos de prevenção, e acompanhamento de consultas de psiquiatria.

38.ª O recorrente AA foi condenado na pena acessória de expulsão do país.

39.ª De facto, e salvaguardado o respeito devido, não se percebe, a relutância do Coletivo de Juízes, neste concreto ponto, em condená-lo na medida acessória de expulsão do país. E, ao que cremos ser entendimento corrente, a pena assessória nada tem a ver com o efeito da pena, enquanto consequência automática e necessária do crime.

40.ª Na verdade, é compreensível a preocupação de o Tribunal recorrido procurar considerar provado o teor do artigo 35.º do libelo acusatório, todavia, não o pode fazer pura e simplesmente, se a matéria constante naquele concreto ponto é conclusiva e não factual, salvo o devido respeito por opinião diversa, o Tribunal não pode colmatar a ausência de menção de factos naquela, por muito boa vontade que tenha.

41.ª Qual é a matéria fática que permite extrair a conclusão de que o recorrente tem personalidade “criminógena”?!

42.ª Com efeito, não encontramos na acusação proferida pelo Ministério Público, neste concreto ponto, qualquer elemento probatório que fundamente esta matéria, pelo que salva a devida vénia, elencá-lo teríamos apenas o certificado do registo criminal do arguido, que à data - nesta data - não regista qualquer contenda com a justiça.

43.ª Portanto, não deixa de suscitar sérias reservas e justificadas interrogações face à ausência de indicadores fácticos não só bastantes como indispensáveis para o correto ajuizar da justeza e da legalidade da mesma expulsão.

44.ª Acresce dizer, que o Tribunal recorrido não indexou, a esta decisão de expulsão, o prazo durante o qual o recorrente ficaria interdito de entrada em Portugal, pelo que transformou a pena acessória de expulsão aplicada em pena de duração ilimitada ou indefinida, ou mesmo suscetível de ser interpretada como pena perpétua, violando o disposto no art.º 30º nº 1 da CRP.

45.ª Não obstante, em nosso modesto entendimento, existir uma nulidade, nos termos do art.º 379º, nº. 1 c) do CPP, é hipoteticamente admissível opinião diversa.

46.ª Assim, vale ainda dizer que o recorrente tem apenas a mãe como referência familiar e que, em boa verdade, transferiu a sua vida de ... para Portugal - ... - para assim puder apoiar o filho.

47.ª Mãe que espera em absoluto sofrimento, isto porque: “suportar é o tempo mais comprido”.

48.ª Assim, pugna o recorrente por outro entendimento, por entender que reúne as condições necessárias, para após a sua libertação continuar com a sua formação profissional, reinserindo-se na sociedade.

49.ª Assim, pugna o recorrente por outro entendimento, por entender que reúne as condições necessárias, para após a sua libertação continuar com a sua formação profissional, reinserindo-se na sociedade.

50.ª O Tribunal a quo errou na interpretação e aplicação do direito e, assim, violou as disposições dos artigos 127.º e 374.º, n.º 2, 379.º, nº. 1 c) do Código Processo Penal. Dos art.º 40.º n.º2, 50.º e 51.º, 70.º, 71.º, nº1 72.º e 73.º do Código Penal, DL n.º 401/82, de 23 de Setembro; 151º da Lei 23/2007 de 4 de Julho e art.º 30º nº 1 da CRP.

Nestes termos e nos mais e melhores de direito aplicável, […] deve ser concedido provimento ao presente recurso, nos termos que se tem vindo a propugnar, com o que assim se fará sã, serena e douta Justiça.»

3. O Ministério Público, pela Senhora Procuradora da República no tribunal recorrido, apresentou resposta, no sentido da improcedência do recurso, dizendo, em conclusões (transcrição):

«1- A gravidade da actuação do arguido AA, a moldura penal dos quatro crimes de violação agravada, dos quatro crimes de roubo e dos dois crimes de gravação e fotografias ilícitas praticados, a violência reiteradamente exercida sobre as vítimas, bem como as demais circunstâncias descritas no acórdão condenatório, não permitiam, ao douto Colectivo Julgador, aplicar-lhe o regime jurídico dos jovens delinquentes.

2- Apesar de não ter experiência criminal, o ora recorrente revelou-se decidido e capaz de, não só, cometer actos de elevada violência física sobre outrem, mas de manifestar desprezo pela dignidade humana, de forma persistente.

3- Razões pelas quais bem andou o douto Colectivo de Juízes quando decidiu pela não aplicação, do regime jurídico dos jovens delinquentes, previsto no DL n.º 401/82, de 23 de Setembro.

4- Tendo presente as finalidades da punição, a culpa do arguido e as exigências de prevenção, sem haver deixado de atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depunham a favor e contra aquele, o Tribunal determinou, com bondade, quer as penas parcelares concretamente a aplicar, quer, decorrente do cúmulo jurídico operado, a respectiva pena única imposta ao arguido.

5- Pena única essa que, desde logo pela sua medida, não poderia ser declarada suspensa na execução, mas que, ainda que assim legalmente inviável, nunca essa suspensão poderia ter lugar, por a tal se oporem intensíssimas exigências de prevenção criminal.

6- Estão verificados os requisitos previstos no artigo 151.º., n.º 2, da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho na versão da lei n.º 29/12, de 9 de Agosto,

7- O douto acórdão recorrido fez devida interpretação dos preceitos legais que havia a aplicar, não se mostrando ofendido qualquer normativo, apontado na motivação do recorrente-

Nestes termos e pelo mais que, Vossas Excelências, Senhores Juízes Conselheiros, segura e sabiamente não deixarão de suprir, negando-se provimento ao recurso interposto e, consequentemente, confirmando-se o acórdão condenatório proferido, far-se-á Justiça.»

4. Recebidos, foram os autos com vista ao Ministério Público, para os efeitos do disposto no artigo 416.º do CPP, tendo o Senhor Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitido parecer nos seguintes termos (transcrição):

«(…)

Inconformado com [a] decisão dela interpôs recurso o arguido, no qual, em síntese muito apertada, coloca em causa a medida concreta das penas parcelares e da pena única e a aplicação da medida acessória de expulsão, reportando-se ainda explicitamente à existência da nulidade prevista na al. c) do nº 1 do artigo 379º do Código de Processo Penal.

A este Recurso respondeu a nossa Exma. Colega junto da primeira instância, em peça processual muito bem estruturada e fundamentada, a qual acompanhamos, com a única exceção a que adiante nos reportaremos.

Com efeito, parece-nos evidente a falta de razão do Recorrente no que concerne à medida concreta das penas parcelares e única – as quais apenas poderiam merecer censura pela sua brandura… - e, bem assim, quanto à aplicação da medida de expulsão.

Por isso e pelo muito respeito ao precioso tempo de V. Exªs, nada mais se acrescentará quanto a essas matérias.

Contudo, parece-nos assistir razão ao Recorrente no que concerne à existência da apontada nulidade.

Na verdade, no douto acórdão o Tribunal a quo limitou-se a aplicar a pena de expulsão, sem tomar qualquer decisão quanto ao período durante o qual fica vedada a entrada e permanência do arguido em Portugal.

No nosso entendimento, estava obrigado a fazê-lo, pelo que a falta de pronúncia sobre essa matéria constitui omissão de pronúncia, o que configura a nulidade a que se reporta a alínea c) do nº 1 do artigo 379º do Código de Processo Penal.

Com efeito:

O aludido artigo 151º da Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho insere-se na sessão III do Capítulo VIII do aludido diploma legal, o qual tem por epígrafe “Afastamento do território nacional”.

Na secção I desse capítulo – cuja epígrafe é “Disposições gerais” – insere-se o artigo 144º, o qual dispõe o seguinte:

Artigo 144.º

Prazo e âmbito territorial do dever de abandono e da interdição de entrada e de permanência

1 - Ao cidadão estrangeiro sujeito a decisão de afastamento é vedada a entrada e a permanência em território nacional por período até cinco anos, podendo tal período ser superior quando se verifique existir ameaça grave para a ordem pública, a segurança pública ou a segurança nacional.

2 - A medida de recusa de entrada e de permanência é graduada a partir da mera permanência ilegal e pode ser agravada atento o período da estada não autorizada, quando, com a permanência ilegal se afira:

a) A violação dolosa das normas aplicáveis em matéria de entrada e permanência; ou

b) A prática de ilícitos criminais ou a violação grave dos deveres inerentes às medidas de coação enumeradas no artigo 142.º; ou

c) Que o cidadão estrangeiro tenha sido sujeito a mais do que uma decisão de retorno ou tenha entrado em violação de indicação de recusa de entrada e permanência; ou

d) A existência da ameaça referida no número anterior.

3 - Quando o cidadão estrangeiro não esteja habilitado, por qualquer forma, a permanecer no território dos Estados membros da União Europeia e no dos Estados onde vigore a Convenção de Aplicação, o dever de abandono, o afastamento ou a expulsão e a indicação de recusa de entrada e de permanência abrangem também o território daqueles Estados, devendo a especificação do âmbito territorial da medida de interdição constar expressamente das notificações legalmente previstas para o respetivo procedimento.”

Portanto, esta norma também se aplica no caso de aplicação da pena acessória de expulsão prevista no aludido artigo 151º.

Aliás, nem se vê que pudesse ser de outra forma, e por várias razões:

Desde logo porque no nº 1 do artigo 30º, da Constituição da República Portuguesa se estabelece que “(n)ão pode haver penas nem medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade com carácter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida.”

Ou seja, uma interpretação do artigo 151º que viabilizasse a aplicação da pena acessória de expulsão sem qualquer limite temporal parece-nos que seria claramente inconstitucional.

Nesse sentido veja-se, a título de mero exemplo, o que escrevem Jorge Miranda e Rui de Medeiros, em anotação ao artigo 33º (Constituição da República anotada, Vol. 1, pág. 542):

“A expulsão, enquanto medida judicial ou administrativa, não denomina verdadeiramente o “conteúdo” da medida: traduz tão-só o efeito material de um ato, pois que os efeitos jurídicos da medida consubstanciam-se, do mesmo modo, numa proibição de retorno ao território nacional por determinado período (todavia, nunca perpétuo ou indeterminado)”

Depois porque, embora inserido numa outra seção do aludido capítulo - mas em sede de medida autónoma de decisão judicial de expulsão –, no artigo 157º do mesmo diploma legal se estabelece o seguinte:

Artigo 157.º

Conteúdo da decisão

1 - A decisão judicial de expulsão contém obrigatoriamente:

a) Os fundamentos;

b) As obrigações legais do expulsando;

c) A interdição de entrada e de permanência em território nacional e de recusa de entrada e permanência no território dos Estados membros da União Europeia e no dos Estados onde vigore a Convenção de Aplicação, quando aplicável, com a indicação dos respetivos prazos;

d) A indicação do país para onde não deve ser encaminhado o cidadão estrangeiro que beneficie da garantia prevista no artigo 143.º

2 - A execução da decisão implica a inscrição do expulsando, no SIS e no Sistema Integrado de Informação do SEF pelo período de interdição de entrada e de permanência, nos termos do disposto no artigo 33.º-A.

3 - A inscrição no Sistema de Informação Schengen é notificada ao expulsando pelo SEF.

Aliás, no regime anterior – Dec. Lei 264-B/81, de 3 de setembro – expressamente se previa na al. c) do nº 1 seu artigo 48º que tal decisão tinha de conter obrigatoriamente “(o) prazo, não inferior a um ano, durante o qual é vedado ao estrangeiro a entrada em Portugal”.

E as duras crítica que se fizeram a essa norma nada tinham a ver com o aludido segmento legal, mas sim com o caráter automático que o corpo do artigo atribuía à decisão de expulsão (Veja-se, a esse propósito, Figueiredo Dias “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, págs. 175 e sgs.).

Finalmente e para além do (muito mais) que ficou exposto, faz todo o sentido que à decisão de expulsão se adite a decisão sobre o prazo da proibição de entrada no país pois que, não admitindo o nosso sistema jurídico medidas de conteúdo indeterminado ou perpétuo, a decisão de expulsão ficaria “incompleta”, já que, em si mesmo, apenas determina o ato de saída do território nacional.

Uma nota final para referir que, ainda que de forma indireta, tem sido esse o entendimento expresso pelo Supremo tribunal de Justiça

Nesse sentido vejam-se os seguintes arestos:

“1 - Para efeito de aplicação da sanção acessória de expulsão, cidadão estrangeiro residente em Portugal é o habilitado com título válido de autorização de residência.

2 - Não estando demonstrado se o arguido estava, ou não, habilitado com tal título, mostra-se insuficiente a matéria de facto provada para a aplicação da pena acessória de expulsão, impondo-se o reenvio do processo, a fim de que, em novo julgamento, se apure e se averigue da factualidade indexada à própria legalidade da aplicação de tal pena acessória, que, a ser aplicada, tem de ser complementada com a indicação do prazo de interdição de entrada no país nos termos do art. 114.º, n.º 1, al. c), do DL 244/98, de 08/08, com referência ao art. 105.º do mesmo diploma.” Ac. do STJ de 18-10-2006 – Proc. 06P2825 in www.dgsi.pt

“E consequentemente, porque se considera insuficiente e não devidamente esclarecedora a factualidade que esteve subjacente à aplicação da pena acessória de expulsão decretada, cuja correcção legal, nem sequer se perfila como de todo indubitável, declara-se nulo o acórdão recorrido, mas apenas no que diz respeito à aplicação da pena referida dando-se por verificado o vício prevenido na al. a) do n.º 2 do art. 410 do CPP e determinando-se a remessa dos autos ao tribunal a quo afim de que em novo julgamento, confirmando-se a situação do arguido, se apure e se averigue da factualidade acima referenciada e indexada à própria legalidade da aplicação de tal pena acessória que, a ser aplicada, tem de ser complementada com indicação do prazo de interdição de entrada no país nos termos do art. 114,n.º 1, al. c), do DL 34/03, com referência ao art. ° 105 do mesmo diploma (art.ºs 116, n.º1. c) e 106 do DL 4/01) (sublinhado também nosso). Ac. do STJ de 02-04-2003 - Proc. 03P614 i www.dgsi.pt

Face a todo o exposto e salvo melhor opinião, entende-se que o acórdão recorrido merece censura, por não se ter pronunciado quanto ao prazo durante o qual o arguido não pode entrar Portugal, o que constitui a nulidade a que alude a al. c) do n.º 1 do art. 379.º do Código de Processo Penal.»

5. Notificado para responder, nos termos do artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o arguido nada disse.

6. Colhidos os vistos e não tendo sido requerida audiência, o recurso foi à conferência – artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP.

II. Fundamentação

Factos provados

7. O tribunal coletivo deu como provados os seguintes factos (transcrição):

«1.º Em cumprimento de um plano prévia e conjuntamente traçado, BB e AA decidiram efectuar vários assaltos, com o intuito de se apoderarem da maior quantia monetária e/ou objectos de valor que conseguissem, bem como de forçarem diversas mulheres a consigo manterem relações sexuais não consentidas, com o fito de satisfazerem os seus ímpetos libidinosos.

2.º Pelas 21:00 do dia 8 de Janeiro de 2022, avistando DD a circular sozinha junto às bilheteiras do Parque ..., no ..., em ..., abeiraram-se desta, taparam-lhe a cara com um pano embebido numa substância de odor intenso, manietaram-na e cobriram-lhe os olhos com o capuz do casaco que vestia.

3.º Como DD ofereceu resistência, AA empunhou uma navalha junto à sua cara, enquanto BB lhe tirou a carteira do casaco.

4.º Na posse da carteira, contendo os documentos pessoais de DD, um cartão bancário em seu nome e outro em nome de EE, seu namorado e algumas moedas, no valor de dois euros e cinquenta cêntimos (2,50€), puseram-se em fuga, na direcção da ponte pedonal ....

5.º Pelas 21:30h do dia 13 de Janeiro de 2022, viram FF a deambular sozinha no Parque ..., em ... e, quando esta se encontrava junto ao final da ponte pedonal, já na zona do ..., AA abordou-a e tapou-lhe o nariz e a boca com uma luva de cor escura, impregnada com álcool.

6.º Aproveitando o facto de FF ter ficado atordoada, apoderaram-se dos seus auriculares sem fios da marca JBL, no valor de cerca de oitenta euros (80€) e, quando esta começou a gritar, tentaram sufocá-la, colocando as mãos a tapar-lhe o nariz e a boca e intimidaram-na, com o auxílio de uma navalha, encaminhando-a para um túnel, através do qual acederam às traseiras do posto de abastecimento da CEPSA, em ....

7.º Aí, puxaram-lhe as calças e as cuecas para baixo, colocaram-na com os joelhos e as mãos apoiados na relva e introduziram-lhe, à vez, o pénis na vagina, enquanto, contra vontade desta, filmavam e tiravam fotografias.

8.º BB forçou-a ainda a praticar sexo oral, enfiando-lhe o pénis na boca e beijou-a nos lábios.

9.º De seguida, puseram-se em fuga.

10.º Como resultado da sua actuação, FF apresentava, à data do exame pericial, lesões traumáticas a nível da superfície corporal em geral, que denotam ter sido produzidas por traumatismo de natureza contundente, o que é compatível com a informação prestada, que lhe determinam, em condições normais, um período de doença fixável em três dias.

Para além das referidas lesões, evidenciava lesões traumáticas de características recentes a nível da região genital, compatível com cópula. Foi ainda revelada a presença de sémen na zaragatoa vulvar e vaginal, de um haplótipo do cromossoma Y na zaragatoa vaginal e um perfil genético de mistura na zaragatoa vulvar e cuecas, compatíveis com haplótipos de BB e AA (cfr. perícia de natureza sexual em direito penal de fls. 585 a 587 e de criminalista biológica de fls.466 a 471, que se dá aqui por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais).

11.º Pelas 20:30h, no dia 17 de Janeiro de 2022, abordaram GG e HH, enquanto caminhavam na zona Pedonal do Parque..., ..., em ...,

12.º Empunhando um objecto que se assemelhava a uma navalha, agarraram-nos e encaminharam-nos para um local escuro e ermo, por trás do restaurante “Piscinas do ...”.

13.º Aí, colocaram-lhes uma luva impregnada com álcool na cara, para os atordoar e subtraíram cerca de trinta euros (30€) e um maço de tabaco da marca Camel, no valor de cerca de quatro euros e cinquenta cêntimos (4,50€) a GG e dez euros (10€) a HH.

14.º Ordenaram, então, a HH que permanecesse imóvel deitado no chão com a cara para baixo, enquanto se afastaram um pouco com GG.

15.º De seguida, forçaram-na a tirar a roupa, colocaram-na de joelhos e mãos no chão e, também, em decúbito dorsal e ambos mantiveram com a ofendida, de modo alternado, relações sexuais, inserindo os seus pénis na vagina e boca desta, tentando ainda penetrá-la analmente, enquanto, contra vontade desta, filmavam e tiravam fotografias.

16.º BB igualmente a obrigou a beijá-lo na boca diversas vezes.

17.º Em consequência da sua actuação, GG exibia, à data do exame pericial, lesões traumáticas observadas na superfície corporal em geral, que denotam ter sido produzidas por traumatismo de natureza contundente ou actuando como tal, sendo compatíveis com o mecanismo de agressão sexual descrito, que lhe determinaram para se curar um período de quatro dias, todos com afectação da capacidade para o trabalho em geral e das actividades escolares.

A pesquisa de material biológico de origem masculina foi positiva nas zaragatoas da mama, vulvar, vaginal, no casaco, calças e cuecas. Nas zaragatoas vulvar, vaginal e das cuecas foram identificados haplótipos do cromossoma Y de, no mínimo, dois contribuintes compatíveis com haplótipos de BB e AA. Tais resultados são concordantes com a história relatada pela examinada (cfr. perícia de natureza sexual em direito penal de fls. 97 a 99 e 595 a 601 e de criminalista biológica de fls.466 a 471, que se dá aqui por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais).

18.º No dia 3 de Fevereiro de 2022, entre as 7:30h e as 08:20h, no decorrer de uma busca em casa de BB, sita Rua do ..., n.º13, no Bairro ..., em ... foi-lhe apreendido um telemóvel da marca Apple, modelo Iphone 8, com o IMEI .............. 3, contendo um cartão SIM da operadora NOS, correspondente ao n.º .......74.

19.º Guardava, à data, no referido aparelho, numa pasta classificada com o nome “Oculto”, três vídeos de cariz sexual, nos quais figuram crianças do sexo feminino, algumas com menos de catorze anos a praticarem sexo oral a indivíduos adultos.

20.º Actuaram da forma descrita, em comunhão de esforços, visando intimidar os ofendidos, por forma a que estes lhe entregassem todos os objectos de valor que possuíssem, para os fazerem seus, como fizeram

21.º Bem sabendo que não lhes pertenciam, que o faziam contra a vontade daqueles e causando prejuízo patrimonial aos seus proprietários.

22.º Não se inibindo de utilizar luvas impregnadas em álcool para enfraquecer os ofendidos, bem como navalhas que sabiam adequadas a produzir receio e inquietação para concretizar os seus intentos.

23.º Agiram também com o propósito concretizado de introduzir os seus pénis na vaginas e bocas de FF e de GG, contra vontade destas e pondo em causa a sua liberdade sexual, bem sabendo que as navalhas que utilizavam e as luvas impregnadas em álcool as intimidavam e demoviam de oferecer resistência.

24.º Sabiam ainda que FF e GG não queriam ser fotografadas ou filmadas e que, assim, ao fotografá-las e filmá-las actuavam contra a vontade das mesmas.

25.º Não obstante, não se abstiveram de as fotografar e filmar, enquanto mantinham relações sexuais com as mesmas.

[26 e 27 – factos relativos ao arguido BB]

28.º Actuaram sempre de forma consciente, livre e voluntária.

29.º Bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.

30.º AA tem nacionalidade cabo-verdiana, país onde nasceu, encontrando-se em Portugal com autorização temporária de residência, para estudar,

31.º Assim, face, além do mais, à gravidade dos factos imputados, à sua fraca inserção social, à circunstância de possuir autorização temporária de residência em território nacional e à sua personalidade criminógenas deverá o mesmo ser expulso de Portugal.

[Condições pessoais]

Mais se provou:

32.[Factos relativos ao arguido BB]

33. Em relação ao arguido AA:

1. O arguido é natural de Cabo Verde (...), oriundo de uma família de condição socioeconómica humilde, fruto da relação de namoro de seus pais que durou cerca de 10 anos. A mãe assumiu e liderou a prestação de cuidados e a educação do arguido. O pai visitava-o com regularidade até por volta dos 8 anos do arguido, mas o arguido nunca conheceu a família paterna que residiam na ....

2 O afastamento do pai coincidiu com a ocasião em que a mãe do arguido foi trabalhar para uma outra cidade, vindo a casa apenas aos fins-de-semana, ficando o arguido entregue aos cuidados da avó e tia maternas na cidade da ....

3. O exercício laboral da mãe (...) ocupava a maior parte do seu tempo, o que pode ter contribuído para uma frágil supervisão do dia-a-dia do arguido, que geria o seu dia-a-dia em função dos seus interesses sem vigilância de adultos e com vivências de rua.

4. AA tem 4 irmãos consanguíneos, a residir em ..., com quem passou a contactar esporadicamente através das redes sociais depois do falecimento do pai, ocorrido há 3 anos.

5. Segundo a mãe, o processo de desenvolvimento de AA ficou marcado, na primeira infância, por algum atraso ao nível do andar e da linguagem que se iniciou por volta dos 2 anos de idade. Na escola, apresentou igualmente dificuldades em acompanhar os programas teóricos tendo ficado retido em quase todos os anos.

6. Em contraponto, revelava especial gosto pelas atividades ocupacionais e práticas formativas. Ainda segundo a mesma, ao nível comportamental nunca ocorreram problemas disciplinares no contexto escolar seja na relação com os adultos, ou com pares.

7. Devido a estas dificuldades de aprendizagem, a mãe proporcionou-lhe consultas de psicologia e fonoaudiologia em .... Beneficiou ainda de atendimento educativo especializado, no seu país de origem, onde concluiu o 6.º ano de escolaridade.

8. Em 2018, por decisão da mãe, AA veio sozinho para Portugal para estudar. Integrou inicialmente o agregado familiar do tio II e sua companheira em Coimbra. Nessa altura, também integrava este agregado a avó materna, entretanto regressada a ... depois de ter sido sujeita a intervenção cirúrgica em Portugal. A dificuldade de o arguido cumprir algumas regras impostas pelos tios, nomeadamente ao nível da cooperação nas tarefas domésticas, resulta em parte do modelo cultural de algumas comunidades de ... que preserva o homem de certas tarefas atribuídas à mulher, segundo o tio do arguido. Esta resistência do arguido gerou algum desgaste no relacionamento familiar que se foi intensificado ao longo do tempo. Quase dois anos depois de viver com os tios, a mãe optou por pagar um quarto ao filho, tendo AA residido sozinho durante algum tempo na zona de .... Posteriormente, o tio, II conseguiu que AA integrasse a residência de estudantes da Escola que frequentava.

9. Em Portugal, AA frequentou inicialmente a Escola EB 2, 3 ..., mas as dificuldades de aprendizagem levaram a que optasse pela via profissionalizante na Escola Profissional ... de ....

10. À data dos factos de que vem acusado, AA morava há mais de um ano, numa residência para estudantes em Coimbra, sita numa zona sem conotação com problemáticas sociais.

11. Frequentava o curso de restaurante/bar, para obtenção do 12.º ano, com dupla certificação (académica e profissional), na Escola Profissional ... de ... para onde se deslocava diariamente. Pontualmente em horário pós-escolar e nas férias escolares o arguido realizava com algumas atividades laborais remuneradas, nomeadamente lavagem de viaturas num rent-a-car.

12. O arguido referiu ainda ter executado tarefas de ajudante de ... durante um curto período em .... Estas atividades permitiam-lhe alguma autonomia económica relativamente à família. Pontualmente a mãe enviava-lhe algum valor monetário, mas pouco expressivo. Não apresenta vinculação a atividades estruturadas e pro-sociais ao nível da ocupação dos tempos livres e de lazer.

13. Em 9 de Setembro do corrente ano, JJ, mãe do arguido, deslocou-se para Portugal com a finalidade de fixar residência no país, para estar mais próximo e apoiar AA na situação, seu único filho. Verifica-se envolvimento afetivo da mãe e preocupação pelo bem-estar do arguido. A mãe vive maritalmente com KK, de nacionalidade portuguesa, de 51 anos, bate-chapas numa oficina de automóveis, em ..., estando em curso as diligências para o casamento. Residem em casa da mãe de KK, na Rua ... n.º 133- 1.º Esq- 2415-455 — ... — .... A situação económica é estável. A mãe refere contar com o apoio económico do companheiro e de outros familiares, nomeadamente um tio residente em ... e um irmão residente nos ....

14. AA conheceu BB (coarguido) há cerca de três anos, quando ambos frequentavam a Escola Profissional de .... Desde então que mantinham algum convívio social.

15. As diversas fontes contactadas são unânimes em salientar o carácter influenciável do arguido. Esta característica pode estar associada a algumas dificuldades cognitivas, à imaturidade e à necessidade de pertença social.

34. [Factos relativos ao coarguido BB]

35. O arguido AA é primário.»

Âmbito e objeto do recurso

8. O recurso tem, pois, por objeto um acórdão proferido pelo tribunal coletivo que aplicou uma pena de prisão superior a 5 anos.

Limita-se ao reexame de matéria de direito (artigo 434.º do CPP), não vindo invocado qualquer dos vícios ou nulidades referidos nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º do CPP, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 432.º, na redação introduzida pela Lei n.º 94/2021, de 21 de dezembro, que passou a admitir recurso da 1.ª instância para o Supremo Tribunal de Justiça com estes fundamentos.

O âmbito do recurso, que circunscreve os poderes de cognição deste tribunal, delimita-se pelas conclusões da motivação (artigos 402.º, 403.º e 412.º do CPP), sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso, se for caso disso, em vista da boa decisão do recurso, de vícios da decisão recorrida a que se refere o artigo 410.º, n.º 2, do CPP (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95, DR-I, de 28.12.1995), de nulidades não sanadas (n.º 3 do mesmo preceito) e de nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do CPP, na redação da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro).

Estando em causa uma situação de concurso de crimes (artigos 30.º, n.º 1, e 77.º do Código Penal), pode este tribunal conhecer de todas as questões de direito relativas à pena conjunta aplicada aos crimes em concurso e às penas aplicadas a cada um deles, englobadas naquela pena única, inferiores àquela medida, se impugnadas (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 5/2017, DR I, de 23.6.2017), como sucede no caso presente.

9. Em síntese, tendo em conta as conclusões da motivação do recurso, este Tribunal é chamado a apreciar e decidir:

(a) Se as penas aplicadas – penas parcelares e pena única – se encontram individualizadas com respeito pelos critérios gerais de determinação das penas (artigos 71.º e 77.º do Código Penal) e pelo regime especial aplicável a jovens adultos e se a pena única aplicada deve ser suspensa na sua execução;

(b) Se se justifica a aplicação da pena acessória de expulsão e se a não determinação da duração de interdição em território nacional constitui nulidade da decisão.

Quanto às penas de prisão

10. O acórdão recorrido, em decisão que não merece censura quanto à qualificação jurídica dos factos – que constitui o primeiro momento de determinação das penas pelo estabelecimento das respetivas molduras abstratas, a partir das quais se procede à determinação das penas –, concluiu que o arguido praticou 10 crimes: 4 crimes de violação previstos e punidos pelos artigos 164.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do Código Penal, 4 crimes de roubo, previstos e punidos pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), do Código Penal, e 2 crimes de gravações e fotografias ilícitas, previstos e punidos pelo artigo 199.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal

Em consequência do que lhe aplicou as penas de 4 anos de prisão por cada um dos crimes de violação, 1 ano e 9 meses de prisão por cada um dos crimes de roubo e a pena de 8 meses de prisão por cada um dos crimes de gravações e fotografias ilícitas e, realizando o cúmulo jurídico destas penas, condenou o arguido na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão.

Fundamentou a decisão de determinação destas penas nos seguintes termos:

“De acordo com a estatuição legal do n.º 1 e 2 do art.º 40 “a aplicação de penas…visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” sendo que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.

O texto deste artigo exprime um compromisso entre a prevenção geral e a prevenção especial concebidos como fundamento da decisão de punir e a culpa, funcionando como limite da medida da pena, de modo a compatibilizar o princípio da necessidade da pena.

“O direito penal é um direito de protecção de bens jurídicos de que a culpa é tão só limite da pena mas não seu fundamento, e a de que a socialização é a finalidade de aplicação da pena” (cfr. Anabela Rodrigues, RPCC, pág. 155).

A finalidade primordial visada pela pena é a protecção de bens jurídicos associado à prevenção geral positiva ou de integração. Esta visa a necessária tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada, ou seja o restabelecimento da paz jurídica abalada pela prática do crime. Visa o reforço da consciência jurídica comunitária e do sentimento de segurança, face à violação da norma jurídica ocorrida, aquilo que o Prof. Figueiredo Dias (Consequências jurídicas do crime, pág. 72) define por “estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias da validade da norma violada”. É necessário determinar as exigências comunitárias que ressaltam do caso, no complexo da sua forma concreta de execução, da sua específica motivação e das consequências que dele resultam (vd. Prof. Figueiredo Dias, Sobre o estado Actual da Doutrina do crime, RPCC, vol.I).

Dentro da moldura da prevenção geral positiva deve actuar a prevenção especial de socialização do agente, a necessidade de conformação com o quadro de valores vigentes, em particular com aqueles que tutela o bem jurídico atingido, bem como, excepcionalmente, a advertência individual (cfr. Figueiredo Dias, Temas Básicos da Doutrina Penal, pág. 104 e ss, Consequências Jurídicas do Crime, pág. 215). Traduz-se, pois, na necessidade de sensibilização do arguido para a necessidade de conformar a sua conduta com os valores jurídico-penais.

A determinação em concreto da pena a atribuir, tendo em atenção o ilícito praticado, e conforme estipula o art.º 71, n. 1, do CP, far-se-á dentro dos limites da moldura penal abstracta fixada na lei, tendo em conta a culpa do agente (limite inultrapassável – art.º 40, n.º 2 do CP) e as exigências de prevenção de futuros crimes, de harmonia com os factores ínsitos no n.º 2 do art.º 71, que deponham a favor ou contra o arguido, desde que tais elementos não constituam elementos do tipo ou elementos qualificativos do crime.

Importa, no entanto, ter em conta a idade dos arguidos à data dos factos, e equacionar, a eventual aplicação do regime penal especial para jovens, previsto no DL n.º 401/82, de 23 de Setembro.

Dispõe o seu art.º 4.º que “se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos previstos no art.º 73 e 74 do CP, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do Jovem condenado”.

O tribunal não vislumbra qualquer vantagem na atenuação especial, apesar da idade dos arguidos, sendo que não consegue realizar o juízo de prognose sobre o desempenho futuro da personalidade do jovem, pela avaliação global dos factos apurados no caso concreto, a natureza e modo de execução do crime, a personalidade do arguido, a sua conduta anterior e posterior ao facto, bem como as suas condições de vida,

Ambos os arguidos apresentam dificuldades nos estudos e na actividade laboral, demonstrando uma personalidade pouco conscienciosa dos deveres jurídico penais e da necessidade de os cumprir.

São extremamente graves os factos praticados pelos arguidos, seguidos no tempo, o que não permite a sua justificação pela sua idade e juventude

Pelo que se afasta a aplicação deste regime.

Quanto à medida concreta da pena, tem de se ter em conta a medida concreta da pena abstratamente aplicável a cada um dos crimes.

Assim:

a) O crime de violação previstos e punidos pelos artigos 164.º n.ºs 1 e 2 alínea a) do Código Penal, é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos;

b) O crime de roubo, previstos e punidos pelo artigo 210.º n.ºs 1 é previsto e punido com pena de prisão de 1 a 8 anos;

c)O crime de gravações e fotografias ilícitas, previstos e punidos pelo art.º 199, n.º 2, al. a) do CP é punido com pena de prisão até 1 ano e com multa até 240 dias;

d) O crime de pornografia de menores, previsto e punido pelo artigo 176.º n.º1 alínea b) e 5 do Código Penal é punido com pena de até 2 anos de prisão.

Relativamente ao crime de gravações e fotografias ilícitas, previstos e punidos pelo disposto no artigo 199.º, n.º 2 alínea a), do Código Penal, tendo em conta que o mesmo é punível em alternativa com pena de prisão ou pena de multa, entende-se que pela gravidade dos factos a pena de multa não satisfaz as exigências punitivas que o caso impõe, pelo que se afasta a sua aplicação.

[…]

O arguido AA é primário.

Em concreto, importará não olvidar as já mencionadas necessidades preventivas de ressocialização e reinserção social dos arguidos.

São grandes as exigências de prevenção geral que se fazem sentir neste tipo de criminalidade, quer quanto aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, quer contra o património e a tudo o que a estes se encontra associado, não sendo de escamotear a sensibilização comunitária cada vez mais crescente para a questão dos direitos (também sexuais) dos mais desprotegidos e indefesos.

Os arguidos causaram grande alarme social e sentimentos de insegurança na comunidade que se impõe restabelecer.

A forma de execução dos factos aproveitando-se da circunstância das vítimas circularem em lugares mais escuro, três delas sozinhas, bem como o facto de não terem qualquer tipo de pudor em praticar actos sexuais em locais públicos, e mesmo contra a vontade das vitimas, as filmarem enquanto praticavam os actos ilícitos. Ademais é evidente a forma “desinibida” e não hesitante como se acercaram das ofendidas, em pleno espaço das artérias desta cidade de Coimbra, a eficácia dos concretos meios utilizados, com o uso de uma faca e em horário nocturno.

Importa também as consequências da prática dos factos, sendo que o valor dos bens subtraídos é de reduzida dimensão, os ferimentos físicos provocados, e a circunstância de ainda registarem os actos ilícitos, através de filmagem dos mesmos, demonstrando total insensibilidade pelos sentimentos e sofrimento das vítimas.

O dolo (directo) dos arguidos, pois que actuaram sempre ele de modo consciente, determinado e orientado por uma vontade de preenchimento dos tipos de ilícito em questão;

Releva a idade dos arguidos no momento da prática da factualidade em causa, mas, ao mesmo tempo, a personalidade, principalmente no tocante ao foro sexual, que parece estar já bem “colada” à sua menoridade;

Assim, o tribunal colectivo deliberou aplicar aos arguidos as seguintes penas: - Quanto ao arguido BB em co-autoria material e concurso real:

a) 4 (quatro) crimes de violação, previstos e punidos pelos artigos 164.º n.ºs 1 e 2 alínea a) do Código Penal, na pena de 5 anos de prisão por cada um deles;

b) 4 crimes de roubo, previstos e punidos pelo artigo 210.º n.ºs 1 e 2 alínea b), na pena de 2 anos de prisão para cada um deles;

c) 2 (dois) crimes de gravações e fotografias ilícitas, previstos e punidos pelo disposto no artigo 199.º, n.º 2 alínea a), do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão para cada um deles.

d) 1 (um) crime de pornografia de menores, previsto e punido pelo artigo 176.º n.º 1 alínea b) e 5 do Código Penal na pena de 1 ano de prisão.

Em cúmulo jurídico condenar na pena única de 12 anos de prisão efectiva.

- Quanto ao arguido AA em co-autoria material e concurso real:

a) 4 (quatro) crimes de violação previstos e punidos pelos artigos 164.º n.ºs 1 e 2 alínea a) na pena de 4 anos para cada um deles;

b) 4 (quatro) crimes de roubo, previstos e punidos pelo artigo 210.º n.ºs 1 e 2 alínea b), na pena de 1 ano e 9 meses para cada um deles

c) 2 (dois) crimes de gravações e fotografias ilícitas, previstos e punidos pelo disposto no artigo 199.º, n.º 2 alínea a), do Código Penal, na pena de 8 meses para cada um deles.

Em cúmulo jurídico na pena única de 8 e 6 meses de prisão efectiva.»

11. Dispõe o artigo 40.º do Código Penal que “a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” e “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”, a qual se delimita pela conjugação dos fatores relevantes nos termos do artigo 71.º.

Seguindo o que repetidamente se tem afirmado em acórdãos anteriores (por todos, o acórdão de 21.06.2023, Proc. n.º 257/13.7TCLSB.L1.S1, em www.dgsi.pt, que agora se segue de perto), o n.º 1 do artigo 71.º estabelece que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei (moldura abstrata), é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias relacionadas com o facto praticado (facto ilícito típico) e com a personalidade do agente manifestada no facto, relevantes para avaliar da medida da pena da culpa e da medida da pena preventiva, que, não fazendo parte do tipo de crime (proibição da dupla valoração), deponham a favor do agente ou contra ele, nomeadamente, as indicadas no respetivo n.º 2.

Para a medida da gravidade da culpa há que, de acordo com este preceito, considerar os fatores reveladores da censurabilidade manifestada no facto, nomeadamente, nos termos do n.º 2, os fatores capazes de fornecer a medida da gravidade do tipo de ilícito objetivo e subjetivo – fatores indicados na alínea a), primeira parte (grau de ilicitude do facto, modo de execução e gravidade das suas consequências), e na alínea b) (intensidade do dolo ou da negligência) – e os fatores a que se referem a alínea c) (sentimentos manifestados no cometimento do crime e fins ou motivos que o determinaram) e a alínea a), parte final (grau de violação dos deveres impostos ao agente), bem como os fatores atinentes ao agente, que têm que ver com a sua personalidade – fatores indicados na alínea d) (condições pessoais e situação económica), na alínea e) (conduta anterior e posterior ao facto) e na alínea f) (falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto).

Na consideração das exigências de prevenção, a levar a efeito no momento da aplicação da pena, destacam-se as circunstâncias relevantes em vista da satisfação de exigências de prevenção geral – traduzida na proteção do bem jurídico ofendido mediante a aplicação de uma pena proporcional à gravidade dos factos, reafirmando a manutenção da confiança comunitária na norma violada – e, sobretudo, de prevenção especial, as quais permitem fundamentar um juízo de prognose sobre o cometimento de novos crimes no futuro, e assim avaliar das necessidades de socialização. Incluem-se aqui as consequências não culposas do facto [alínea a), v.g. frequência de crimes de certo tipo, insegurança geral ou pavor causados por uma série de crimes particularmente graves], o comportamento anterior e posterior ao crime [alínea e), com destaque para os antecedentes criminais] e a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto [alínea f)]. O comportamento do agente [circunstâncias das alíneas e) e f)] adquire particular relevo para determinação da medida concreta da pena em vista da satisfação das exigências de prevenção especial, em função das necessidades individuais e concretas de socialização do agente, devendo evitar-se a dessocialização.

Como se tem sublinhado, é na determinação e na consideração destes fatores que deve avaliar-se a concreta gravidade da lesão do bem jurídico protegido pela norma incriminadora, materializada na ação levada a efeito pelo arguido pela forma descrita nos factos provados, de modo a verificar se a pena aplicada respeita os critérios de adequação e proporcionalidade que devem pautar a sua aplicação, constitucionalmente impostos (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição; cfr., entre outros, os acórdãos de 8.6.2022, Proc. 430/21.4PBPDL.L1.S1, de 26.06.2019, Proc. 174/17.1PXLSB.L1.S1, de 9.10.2019, Proc. 24/17.9JAPTM-E1.S1, e de 3.11.2021, Proc. 875/19.0PKLSB.L1.S1, cit.).

12. Nos termos do artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, que estabelece as regras da punição do concurso de crimes (artigo 30.º, n.º 1), quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena, formada a partir da moldura do concurso, para cuja determinação, seguindo-se os critérios da culpa e da prevenção atrás mencionados (artigo 71.º), são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente (n.º 1 do artigo 77.º, in fine), com respeito pelo princípio da proibição da dupla valoração. Aqui se incluem, designadamente, as condições económicas e sociais, reveladoras das necessidades de socialização, a sensibilidade à pena, a suscetibilidade de por ela ser influenciado e as qualidades da personalidade manifestadas no facto, nomeadamente a falta de preparação para manter uma conduta lícita (Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, 3.ª reimp., 2011, p. 248ss; por todos, o acórdão de 8.6.2022, Proc. 430/21.4PBPDL.L1.S, cit. e de 16.2.2022, Proc. 160/20.4GAMGL.S1).

Citando e seguindo o afirmado em decisões anteriores: “Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido a atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta». «A personalidade do agente – a personalidade manifestada no facto – é um factor da mais elevada importância para a medida da pena e que para ela releva, tanto pela via da culpa como pela via da prevenção» (Figueiredo Dias, loc. cit., p. 291).

13. Dispõe o artigo 72.º, n.º 1, do Código Penal que o tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.

Sempre que houver lugar a atenuação especial, o que implica uma apreciação da verificação, em concreto, das circunstâncias do caso que a justificam, observam-se as regras de redução dos limites mínimo e máximo da pena aplicável do n.º 1 do artigo 73.º, havendo que determinar a medida concreta dentro da moldura assim definida, observados os critérios gerais concorrendo por via da culpa e da prevenção a que se refere o artigo 71.º.

Um dos casos previstos na lei, que justifica a ponderação da atenuação especial, diz respeito às penas aplicáveis aos jovens com idade compreendida entre 16 e 21 anos, cujo regime, por remissão do artigo 9.º do Código Penal («Aos maiores de 16 anos e menores de 21 são aplicáveis normas fixadas em legislação especial», diz o preceito), se encontra estabelecido no Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de setembro, que aprovou o denominado «regime penal dos jovens delinquentes».

Dispõe o artigo 4.º deste diploma que «Se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73.º e 74.º do Código Penal [que correspondem aos atuais artigos 72.º e 73.º, após a revisão de 1995], quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado».

Como se extrai do respetivo preâmbulo, o Decreto-Lei n.º 401/82 tratou, «em suma, de instituir um direito mais reeducador do que sancionador», tendo em conta as caraterísticas próprias do período de transição da adolescência para a idade adulta, «sem esquecer que a reinserção social, para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, e de exigir, sempre que a pena prevista seja a de prisão, que esta possa ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção.»

Densificando os fatores de atenuação especial, a Proposta de Lei n.º 275/VII (DAR II Série - A, n.º 59, de 5.5.1999, p. 1724ss), que, na mesma linha de orientação, em coerência com a Proposta de Lei que originou a Lei Tutelar Educativa, de 1999, e com a revisão do Código Penal de 1995, e colhendo a experiência da jurisprudência, visava aperfeiçoar e aprofundar o regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 401/82, estabelecia no artigo 4.º, n.º 1, reproduzindo os critérios gerais do artigo 72.º, n.º 1, do Código Penal, que «o tribunal atenua especialmente a pena quando considerar que a idade do agente, no momento da prática do facto, por si ou associada a outras circunstâncias, anteriores ou posteriores ao crime ou contemporâneas dele, diminui por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena».

14. Em jurisprudência reiterada e uniforme vem este Supremo Tribunal de Justiça de há muito reafirmando que a idade do arguido à data da prática do facto constitui um mero requisito formal de aplicação do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82, o qual impõe ao tribunal, com a mais ampla margem de apreciação de todas as circunstâncias relativas ao facto e ao agente, relevantes por via da culpa e da prevenção, sob pena de nulidade não o fazendo, o dever de averiguar se estão ou não verificados os requisitos para a aplicação da atenuação especial, que devam eleger-se como “sérias razões” que lhe permitam “crer” que daquela atenuação resulte vantagem para uma mais fácil reinserção social do jovem condenado. O que alerta para a necessidade de considerar as condições pessoais, sociais e familiares, no exterior da prisão, que poderão contribuir para facilitar a reinserção, na consideração e respeito pelas necessidades de prevenção geral, justificando, assim, o encurtamento da pena de prisão, por via da atenuação especial, para que a reintegração social presente na finalidade prosseguida pela aplicação da pena se possa realizar mais adequadamente em liberdade [assim, entre outros, salientando este ponto, o acórdão de 8.9.2016 (Helena Moniz), Proc. 610/15.1PCLSB.S1, em www.dgsi.pt].

A aplicação do regime penal especial para jovens não é obrigatória nem automática, «sendo necessário que se tenha estabelecido positivamente que há razões para crer que dessa atenuação especial resultem vantagens para a reinserção social do jovem sem ser afetada a exigência de prevenção geral, isto é, de proteção dos bens jurídicos e da validade das normas», pelo que o juízo a formular sobre as vantagens da atenuação especial para a reinserção social tem de assentar em condicionalismo que, não se reduzindo à idade do agente, atenda a todas as circunstâncias do cometimento do crime. Assim, não será de aplicar o regime dos jovens delinquentes quando do conjunto dos factos praticados e a sua gravidade o desaconselham em absoluto, por não se mostrar passível de prognose favorável à reinserção social do arguido. Na síntese do acórdão de 13.10.2021 (Manuel Augusto Matos), Proc. 733/17.2JAPRT.G2.S1 (em www.dgsi.pt, que agora se segue), citando abundante jurisprudência: «A adequada reinserção social do arguido depende necessariamente de considerações de natureza preventiva, particularmente especial, cuja avaliação deve ter presente, designadamente, a gravidade do facto ou factos perpetrados e as suas consequências, o tipo e a intensidade do dolo, os fins que subjazem ao ilícito, o comportamento anterior e posterior e a personalidade do arguido à luz dos factos, isto é, neles manifestada e reflectida. (…) As medidas propostas no regime penal especial para jovens, como resulta do próprio preâmbulo do DL n.º 401/82, de 23-09 (ponto 7), não deverão ser aplicadas quando, em concreto, se mostre necessário defender a comunidade e prevenir a criminalidade, que será à partida, embora carecendo de apreciação, o caso de a pena aplicável ser de prisão superior a dois anos. (…) Assim, razões atinentes às necessidades de reprovação e de prevenção do crime poderão levar à não aplicação daquele regime, designadamente quando a ele se opuserem considerações de prevenção geral sob a forma de exigência mínima e irrenunciável de defesa do ordenamento jurídico. (…) Um juízo de prognose, como o que está ínsito no mencionado regime penal dos jovens, pressupõe uma valoração do conjunto dos factos e da personalidade do arguido, quanto a saber se, em termos prospectivos, a imagem global indicia positivamente uma esperança fundada de que da atenuação especial da pena resultem vantagem para a reinserção do arguido. (…) A avaliação das vantagens da atenuação especial para a reinserção do jovem tem de ser equacionada perante as circunstâncias concretas do caso e do percurso de vida do arguido, e não por considerações abstratas desligadas da realidade; do julgamento do caso concreto tem de resultar claramente a convicção do juiz sobre a natureza expressiva das [sérias] vantagens da atenuação para a reinserção do jovem condenado» [no mesmo sentido, na jurisprudência mais recente, de entre outros, os acórdãos de 9.12.2020 (Nuno Gonçalves), Proc. 1289/08.2PHLRS.L2.S1, e de 11.10.2023 (Sénio Alves), Proc. 988/22.0S6LSB.S1, em www.dgsi.pt].

15. É, pois, na presença deste quadro normativo que deve apreciar-se da adequação e proporcionalidade da pena aplicada, de modo a responder-se à primeira das questões suscitadas no recurso.

16. Na alegação do recorrente, o acórdão recorrido não valorou devidamente a seu favor as circunstâncias de ter confessado os factos, contribuindo para a descoberta da verdade, se mostrar arrependido, não ter antecedentes criminais e ter apenas 20 anos de idade, com “atraso cognitivo”, bem como a sua personalidade e as suas condições pessoais, sociais e familiares. Razões por que entende que as penas aplicadas aos crimes em concurso deveriam ser fixadas em medida próxima do mínimo legal, beneficiando do regime de atenuação especial do Decreto-Lei n.º 401/82 e, consequentemente da aplicação dos artigos 72.º e 73.º do Código Penal, sendo, a final, a pena única fixada em medida não superior a 5 anos de prisão, suspensa na sua execução, nos termos do artigo 50.º do mesmo diploma.

17. Como se extrai da fundamentação da determinação da medida das penas, o tribunal a quo, convocando devidamente o regime aplicável e partindo da moldura das penas correspondentes aos tipos de crime, considerou as circunstâncias de o arguido ser “primário” (não ter antecedentes criminais), a forma e circunstâncias de execução dos crimes, em coautoria com o outro arguido, em particular «aproveitando-se da circunstância das vítimas circularem em lugares mais escuro, três delas sozinhas, bem como o facto de não terem qualquer tipo de pudor em praticar actos sexuais em locais públicos, e mesmo contra a vontade das vitimas, as filmarem enquanto praticavam os actos ilícitos», a forma «como se acercaram das ofendidas, em pleno espaço das artérias desta cidade de Coimbra, a eficácia dos concretos meios utilizados, com o uso de uma faca e em horário nocturno», «os ferimentos físicos provocados, e a circunstância de ainda registarem os actos ilícitos, através de filmagem dos mesmos, demonstrando total insensibilidade pelos sentimentos e sofrimento das vítimas», «os ferimentos físicos provocados, e a circunstância de ainda registarem os actos ilícitos, através de filmagem dos mesmos, demonstrando total insensibilidade pelos sentimentos e sofrimento das vítimas», e a elevada intensidade e persistência do dolo, bem como a idade do arguido, embora afastando a aplicação do regime penal dos jovens adultos, e a sua personalidade «principalmente no tocante ao foro sexual, que parece estar já bem “colada” à sua menoridade».

18. As penas aplicadas aproximam-se dos mínimos legais correspondentes aos crimes em questão: 4 anos por cada um dos 4 crimes de violação, a que corresponde a pena de 3 a 10 anos de prisão; 1 ano e 9 meses por cada um dos 4 crimes de roubo, a que corresponde a pena de 1 a 8 anos de prisão; 8 meses de prisão por cada um dos 2 crimes de gravações e fotografias ilícitas, a que corresponde a pena de prisão até um ano, afastando a aplicação da pena de multa.

Considerou o acórdão recorrido particularmente elevadas as necessidades de prevenção geral face aos tipos de crime praticados e às respetivas circunstâncias de tempo, lugar e modo de ação, em avaliação que se considera adequada.

Embora não lhe seja feita referência expressa na fundamentação relativa à determinação da pena, militam contra o arguido as circunstâncias relativas às condições de vida e socioeconómicas e familiares (ponto 33 dos factos provados), não favoráveis ao desenvolvimento de uma personalidade estruturada por respeito aos valores da vida em sociedade, revelando elevadas necessidades de prevenção especial a realizar por via da aplicação da pena (supra, 11).

Estas circunstâncias, aliadas à elevada gravidade dos factos praticados, justificam a afirmação, no acórdão recorrido, de que «o tribunal não vislumbra qualquer vantagem na atenuação especial, apesar da idade (…), sendo que não consegue realizar o juízo de prognose sobre o desempenho futuro da personalidade do jovem, pela avaliação global dos factos apurados no caso concreto, a natureza e modo de execução do crime, a personalidade do arguido, a sua conduta anterior e posterior ao facto, bem como as suas condições de vida», assim afastando a aplicação do regime penal de jovens adultos. Com efeito, da matéria de facto provada não é possível retirar elementos que permitam constituir base para fazer crer que a redução da pena de prisão por via da atenuação especial possa contribuir para a reintegração do arguido na sociedade, nos termos anteriormente explicitados (supra, 13 e 14).

Finalmente, a consideração dos factos no seu conjunto, a repetição de condutas gravemente violadoras de idênticos bens jurídicos, com formas de execução essencialmente idênticas obedecendo a planos previamente acordados, revelam qualidades de personalidade, projetada nesses factos, particularmente desvaliosas, reveladoras de falta de preparação para manter uma conduta lícita, a considerar na determinação da pena única, em conformidade com o disposto no artigo 77.º do Código Penal (supra, 12).

A determinação das penas singulares e da pena única reflete e corresponde proporcionalmente à gravidade dos factos, na consideração dos fatores relevantes por via da culpa e da prevenção, nos termos do artigo 71.º do Código Penal (supra, 11). Neste contexto, não assumiriam particular relevância a alegada confissão dos factos, que não surge referenciada como particularmente determinante para a descoberta da verdade, nem o invocado arrependimento, desacompanhado de qualquer ato visando a atenuação das consequências dos crimes ou demonstrativo de efetiva interiorização do desvalor das graves condutas imputadas ao arguido.

Assim, tendo em conta a moldura da pena aplicável aos crimes em concurso, com o limite mínimo de 4 anos, correspondente à pena mais grave, e o máximo de 24 anos e 4 meses, correspondente à soma das penas concretamente aplicadas (artigo 77.º, n.º 2, do Código Penal), não se encontra fundamento para afastar a aplicação da pena única de 8 anos e 6 meses de prisão, por violação dos critérios, que se mostram respeitados, de adequação e proporcionalidade que devem presidir à determinação das penas, em vista da sua realização das finalidades de proteção dos bens jurídicos ofendidos com a prática dos crimes e de integração do agente na sociedade.

Sendo a pena única superior a 5 anos de prisão, prejudicada se mostra a possibilidade da suspensão da respetiva execução por a tal se opor o artigo 50.º do Código Penal, que a admite apenas relativamente a penas não superiores àquele limite.

19. Pelo exposto, improcede o recurso na parte relativa à determinação das penas singulares e da pena única, incluindo na parte respeitante à não aplicação do regime penal aplicável aos jovens (Decreto-Lei n.º 401/82).

Quanto à pena acessória de expulsão

20. Insurge-se o recorrente quanto à pena de expulsão por considerar que não se mostra fundamentada a sua aplicação, pois que um facto provado no que respeita à sua “personalidade criminógena”, além de conclusivo não está demonstrado, e, para além disso, que não está fixado o prazo de expulsão.

21. Por sua vez, em seu parecer, o Senhor Procurador-Geral Adjunto considera que «no douto acórdão o Tribunal a quo limitou-se a aplicar a pena de expulsão, sem tomar qualquer decisão quanto ao período durante o qual fica vedada a entrada e permanência do arguido em Portugal». Porém, em seu entender «estava obrigado a fazê-lo, pelo que a falta de pronúncia sobre essa matéria constitui omissão de pronúncia, o que configura a nulidade a que se reporta a alínea c) do nº 1 do artigo 379º do Código de Processo Penal.»

22. O acórdão recorrido apreciou e decidiu a questão da aplicação da sanção acessória de expulsão nos seguintes termos:

«O arguido AA encontra-se ainda incurso na pena acessória de expulsão do país, prevista no artigo 151.º da Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho.

Na verdade, dispões esse preceito legal do seguinte modo:

“1 - A pena acessória de expulsão pode ser aplicada ao cidadão estrangeiro não residente no País, condenado por crime doloso em pena superior a seis meses de prisão efetiva ou em pena de multa em alternativa à pena de prisão superior a seis meses.

2 - A mesma pena pode ser imposta a um cidadão estrangeiro residente no País, condenado por crime doloso em pena superior a um ano de prisão, devendo, porém, ter-se em conta, na sua aplicação, a gravidade dos factos praticados pelo arguido, a sua personalidade, eventual reincidência, o grau de inserção na vida social, a prevenção especial e o tempo de residência em Portugal.

3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a pena acessória de expulsão só pode ser aplicada ao cidadão estrangeiro com residência permanente, quando a sua conduta constitua perigo ou ameaça graves para a ordem pública, a segurança ou a defesa nacional.

Resultando dos autos que o arguido AA tem nacionalidade cabo-verdiana, país onde nasceu, encontrando-se em Portugal com autorização temporária de residência, para estudar. Assim, tendo em conta a gravidade dos factos imputados, a sua fraca inserção social, à circunstância de possuir autorização temporária de residência em território nacional e à sua personalidade criminógena deverá o mesmo ser expulso de Portugal.

Pelo que se decide a aplicação da acessória de expulsão do país, prevista no artigo 151.º da Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho.»

Lendo-se no dispositivo:

«O arguido AA é condenado na pena acessória de expulsão do país, prevista no artigo 151.º da Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho.»

23. O artigo 151.º da Lei n.º 23/2007 distingue três situações de aplicação da pena acessória de expulsão, relativamente às quais impõe requisitos diversos: o n.º 1 diz respeito a estrangeiros não residentes, o n.º 2 a estrangeiros residentes – estrangeiros com residência temporária (artigos 74.º e 75.º), estrangeiros com residência permanente (artigos 74.º e 76.º) e estrangeiros residentes de longa duração (artigos 126.º a 133.º) – e o n.º 3, cumulativamente com o n.º 2, a estrangeiros com residência permanente.

No caso do n.º 2 a aplicação da pena acessória de expulsão depende de uma ponderação a efetuar pelo juiz sobre a gravidade dos factos praticados pelo arguido, a sua personalidade, a eventual reincidência, o grau de inserção na vida social, a prevenção especial e o tempo de residência em Portugal.

Como se considerou no acórdão de 21.10.2015 (Oliveira Mendes), Proc. 244/14.8GBPMS, em www.dgsi.pt, a pena acessória de expulsão, como qualquer outra pena acessória, constitui uma verdadeira pena; «conquanto seja uma pena dependente da aplicação da pena principal (como a própria denominação indica), não resulta direta e imediatamente da cominação desta, no sentido de que não é seu efeito automático, o que, aliás, constitui imposição constitucional, decorrente do n.º 4 do artigo 30.º da Constituição, que estabelece, tal qual o faz o n.º 1 do artigo 65.º do Código Penal, que nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos, constituindo uma sanção autónoma.» É assim que, como se salienta no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 239/09, «alguns dos princípios que presidem à aplicação das penas devem também estar presentes na aplicação daquelas medidas, nomeadamente os princípios da culpa, da necessidade e da proporcionalidade, pelo que é imprescindível a mediação de um juízo que avalie os factos praticados e pondere a adequação e a necessidade de sujeição do condenado a essas medidas, não podendo as mesmas resultarem ope legis da simples condenação penal».

24. A pena acessória de expulsão prevista no artigo 151.º, que sistematicamente se integra na respetiva Secção III («Expulsão judicial») do Capítulo VIII da Lei n.º 23/2007, constitui um dos motivos de «Afastamento do território nacional» (artigos 134.º e seguintes) regulado neste Capítulo.

Nos termos do n.º 1 do artigo 144.º («Prazo e âmbito territorial do dever de abandono e da interdição de entrada e de permanência») «Ao cidadão estrangeiro sujeito a decisão de afastamento é vedada a entrada em território nacional por período até cinco anos, podendo tal período ser superior quando se verifique existir ameaça grave para a ordem pública, a segurança pública ou a segurança nacional.»

Sendo a pena acessória uma verdadeira pena, a determinação da sua duração, em concreto, “por período até 5 anos” – que tem por consequência a recusa de entrada e de permanência em território nacional durante o período de tempo fixado na decisão de expulsão –, há de levar em conta, no caso de aplicação a estrangeiros residentes, os critérios a que se refere o n.º 2 do artigo 151.º. Nos termos do n.º 2 do artigo 33.º, o período de interdição de entrada e de permanência determinado na decisão de expulsão é contado a partir da data efetiva da execução do regresso, com a saída do visado.

Assim sendo, como defende o Senhor Procurador-Geral Adjunto em seu parecer, que merece inteira concordância, a decisão de expulsão não pode deixar de fixar a duração da interdição de entrada e de permanência em território nacional, que passa a constituir o período de tempo durante o qual pode ser recusada a entrada, a contar da data de saída do condenado.

25. Relembrando a decisão de expulsão do recorrente que «tem nacionalidade cabo-verdiana, país onde nasceu, encontrando-se em Portugal com autorização temporária de residência, para estudar», o tribunal a quo fundamenta-a, em termos sintéticos, na «gravidade dos factos imputados», na «sua fraca inserção social» e na «sua personalidade criminógena», concluindo, assim, que «deverá o mesmo ser expulso de Portugal».

Reconduz-se, assim, a afirmações conclusivas (que constam do ponto 31, da matéria de facto provada), consistentes na mera reprodução («gravidade dos factos») ou aditamento de mera adjetivação do texto legal («fraca inserção social», «personalidade criminógena»), não se mostrando explicitados os motivos de facto que conduziram a estas conclusões, de modo a permitir afirmar a completa e adequada aplicação dos critérios fixados no n.º 2 do artigo 151.º da Lei n.º 23/2007, que, como se viu, requer a devida ponderação, em juízo autónomo, das circunstâncias concretas relevantes para a avaliação da gravidade dos factos praticados pelo arguido, da sua personalidade, da eventual reincidência, do grau de inserção na vida social, da prevenção especial e do tempo de residência em Portugal.

Com esta finalidade importa, pois, apreender e considerar elementos da matéria de facto provada, resultantes, nomeadamente, do relatório social, em particular as indicações relativas ao trajeto de vida, ao comportamento anterior e posterior aos factos e às condições pessoais, socioeconómicas e familiares, que, não obstante a gravidade dos factos praticados, permitam contribuir positivamente no sentido do reforço da socialização, da prevenção da reincidência e do grau de inserção na vida social.

26. Como resulta do ponto 33 da matéria de facto provada, o arguido é «oriundo de uma família de condição socioeconómica humilde, fruto da relação de namoro de seus pais que durou cerca de 10 anos». O pai faleceu e o arguido «nunca conheceu a família paterna», que residia noutra ilha de .... Foi a mãe que «assumiu e liderou a prestação de cuidados e a educação do arguido», proporcionando-lhe «consultas de psicologia e fonoaudiologia», face a «dificuldades de aprendizagem», que levaram o arguido a beneficiar de «atendimento educativo especializado, no seu país de origem, onde concluiu o 6.º ano de escolaridade». Por «decisão da mãe», o arguido «veio sozinho para Portugal», em 2018, «para estudar», com 16 anos de idade (nasceu a 28.12.2001). Depois de ter vivido cerca de 2 anos com tios maternos, a mãe, face a problemas de relacionamento familiar, «optou por pagar um quarto ao filho» que «residiu sozinho durante algum tempo na zona de ...», após o que o tio «conseguiu que integrasse a residência de estudantes da Escola que frequentava». Frequentou uma escola secundária, mas, dadas as «dificuldades de aprendizagem», optou «pela via profissionalizante na Escola Profissional ... de ...». À data dos factos «morava há mais de um ano, numa residência para estudantes em Coimbra», «frequentava o curso de restaurante/bar, para obtenção do 12.º ano com dupla certificação (académica e profissional)» e «pontualmente em horário pós-escolar e nas férias escolares realizava com algumas atividades laborais remuneradas, nomeadamente lavagem de viaturas num rent-a-car» e «como ajudante de ... durante um curto período em ...», atividades que lhe permitiam «alguma autonomia económica relativamente à família», contando ainda com a ajuda da mãe que lhe «enviava algum valor monetário, mas pouco expressivo» (pontos 33.1 a 33.12).

Particularmente significativo é o que consta do ponto 33.13, onde se lê que, em 9 de setembro do «corrente ano» [2022], na pendência do processo, «JJ, mãe do arguido, deslocou-se para Portugal com a finalidade de fixar residência no país, para estar mais próximo e apoiar AA na situação, seu único filho. Verifica-se envolvimento afetivo da mãe e preocupação pelo bem-estar do arguido. A mãe vive maritalmente com KK, de nacionalidade portuguesa, de 51 anos, bate-chapas numa oficina de automóveis, em ..., estando em curso as diligências para o casamento. Residem em casa da mãe de KK, na Rua ... n.º 133- 1.º Esq- 2415-455 — ... — .... A situação económica é estável. A mãe refere contar com o apoio económico do companheiro e de outros familiares, nomeadamente um tio residente em ... e um irmão residente nos ....»

Acrescenta o relatório social que «As diversas fontes contactadas são unânimes em salientar o carácter influenciável do arguido. Esta característica pode estar associada a algumas dificuldades cognitivas, à imaturidade e à necessidade de pertença social» (ponto 33.15).

27. Torna-se, assim, evidente um percurso de vida do arguido, ainda muito jovem, oriundo de um meio carenciado, centrado na educação e formação, sempre com apoio material e afetivo da sua mãe – o único apoio ao longo da vida que vem noticiado –, a qual, com esse objetivo, lhe proporcionou cuidados para suprir problemas de saúde e dificuldades de aprendizagem e decidiu a sua vinda para Portugal, aos 16 anos, para estudar, e que, pouco tempo após a prática dos crimes por que o arguido veio a ser julgado e condenado, estando em prisão preventiva, fixou residência em Portugal em união de facto com um cidadão nacional, estabelecendo uma estrutura sociofamiliar com aparente organização e estabilidade para estar próxima e continuar a apoiar o arguido, seu único filho, circunstância que, no quadro conhecido, pode desempenhar um papel crucial na realização das finalidades de reinserção que no caso se fazem sentir.

Identifica-se nesta situação um conjunto de elementos com aptidão para, decididamente, contribuírem ativa e efetivamente para a necessária ressocialização do arguido, inscrita na realização da finalidade da pena (artigo 40.º do Código Penal), perante as muito elevadas necessidades de prevenção especial e desvaliosas qualidades de personalidade, ainda em estruturação, reveladas na prática do crime, que, num razoável juízo de prognose, não deverão neutralizar-se pela expulsão (temporária) para o país de origem, com o qual perdeu as ligações familiares, após a reclusão imposta pelo cumprimento da pena de prisão. Sendo certo que a permanência futura em território nacional sempre dependerá da verificação administrativa de condições legalmente exigidas que não cabe apreciar nesta sede processual.

28. Pelo exposto, ponderando conjuntamente os fatores de aplicação da pena de expulsão indicados no n.º 2 do artigo 151.º da Lei n.º 23/2007, em conjugação com o artigo 40.º do Código Penal, em respeito pelos critérios de necessidade, adequação e proporcionalidade, justifica-se que, tendo em devida conta o comportamento anterior aos crimes, as necessidades de prevenção especial e as condições de ressocialização em território nacional, que não ocorrem no país de origem, não deva ser aplicada a pena acessória de expulsão. Impondo-se, consequentemente, a revogação do decidido, nesta parte, no acórdão recorrido.

O que prejudica a apreciação da suscitada questão da nulidade parcial do acórdão recorrido por não fixação da duração da interdição de entrada em território nacional em virtude da aplicação da sanção acessória de expulsão.

É, pois, procedente o recurso nesta parte.

Quanto a custas

29. Nos termos do disposto no artigo 513.º do CPP (responsabilidade do arguido por custas), só há lugar ao pagamento da taxa de justiça quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso. O que não é o caso.

III. Decisão

30. Pelo exposto, acorda-se em conferência da secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça em:

a) Julgar improcedente o recurso quanto a todas as questões suscitadas relativamente à determinação das penas parcelares e da pena única, mantendo o decidido nesta parte;

b) Julgar procedente o recurso quanto à pena acessória de expulsão e, consequentemente, revogar a decisão de aplicação desta pena acessória.

Sem custas.

Supremo Tribunal de Justiça, 17 de janeiro de 2024.

José Luís Lopes da Mota (relator)

Teresa de Almeida

Ana Maria Barata de Brito