Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4077/05.4TBVCT.G1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: TAVARES DE PAIVA
Descritores: SERVIDÃO DE PASSAGEM
MUDANÇA
EXTINÇÃO
FACTO CONSTITUTIVO
OPONIBILIDADE
TERCEIRO
Data do Acordão: 02/21/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - DIREITOS REAIS / SERVIDÕES PREDIAIS.
DIREITO DOS REGISTOS E NOTARIADO - REGISTO PREDIAL - ACTOS NOTARIAIS (ESCRITURA PÚBLICA).
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 1543.º.
CÓDIGO DO NOTARIADO (C.NOT.): - ARTIGO 80.º, N.º1.
CÓDIGO DO REGISTO PREDIAL (CRGP): - ARTIGO 7.º.
DL N.º 448/91, DE 29/11: - ARTIGO 29.º
Sumário :

I - A servidão exprime uma limitação ao direito de propriedade do prédio que com ela é onerado (prédio serviente) em favor do prédio que dela beneficie (prédio dominante).

II - A servidão que onera um prédio que é, posteriormente, objecto de loteamento, passando a onerar uma parcela desse terreno, que agora constitui um lote, e por conseguinte, um prédio diferente, constitui, nesse circunstancialismo, uma nova servidão, e não uma mudança da existente.

III - Para ser oponível a terceiros (designadamente os adquirentes dos respectivos lotes), a nova servidão deveria ser objecto de escritura pública e registo na Conservatória de Registo Predial respectiva (art. 7.º do CRgP).
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I-Relatório

AA e mulher BB intentaram no Tribunal Judicial da comarca de Viana do Castelo acção com processo ordinário contra, CCe marido DD, EE Ldª, FF e mulher GG pedindo  que: 

a) – se declare  que o prédio rústico composto de campo de lavradio, situado no lugar de ....... freguesia de Vila Franca, desta comarca, a confrontar do norte com HH, do sul com II, do nascente com herdeiros do Dr. JJ e do poente com KK inscrito na matriz predial rústica sob o art. 1757.º e descrito na Conservatória de Registo Predial de Viana do Castelo sob o n.º 0000000, com a área de 4170 m2, se encontra dividido, por usucapião, em duas parcelas de terreno e que corresponde a dois novos prédios autónomos e distintos;

b) – se declare que a Parcela A, composta por prédio rústico, de terreno de lavradio, com a área de 2539 m2, sito em ....... freguesia de Vila Franca, a confrontar do norte com CC do sul com II, do nascente com JJ e do poente com KK pertence aos Autores por a terem adquirido por usucapião;

c) –  se condene os primeiros Réus a reconhecerem a divisão e a aquisição supra referidas, por usucapião, sobre cada uma das parcelas resultantes dessa divisão a favor dos seus proprietários;

d) – se declare  que os Autores têm direito de passagem, a pé e com veículos automóveis, tractores e carro de bois que permita o acesso àquela parcela A através do prédio dos terceiros Réus (prédio urbano situado em ....... Pereiro, Vila Franca, que constitui o lote n.º 22, inscrito na matriz sob o art. 814.º e descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º 0000000000), pela forma e configuração descrita nos artigos 23º a 27º da petição inicial;

e) -  Os segundos e terceiros Réus sejam  condenados a verem reconhecidos os direitos de passagem dos Autores sobre a parcela de terreno descrita no artº 23º a 27º da p.i. e, condenar-se os RR., a título de sanção pecuniária compulsória, na quantia de € 5,00 dia enquanto não procederem à efectivação da referida servidão de passagem;

f) -  os segundos e terceiros Réus sejam  condenados a pagar aos Autores os prejuízos causados, a liquidar em execução de sentença.

Sem prescindir e para a hipótese do pedido formulado na al. d) e e) improceder:

g)  Os primeiros e terceiros Réus sejam condenados a consentir na expropriação, de modo a que seja constituída servidão de passagem a pé e em veículos automóveis do caminho municipal a nascente para o prédio dos Autores, ou do caminho existente a norte, através do prédio dos Réus, pela forma indicada na petição inicial ou por qualquer outra que venha a revelar-se mais conveniente, sempre mediante a indemnização que venha a ser fixada;

h) –  Os segundos RR condenados a pagar aos Autores os prejuízos causados, a liquidar em execução de sentença, correspondente à indemnização que vier a ser fixada relativa à expropriação referida na al. g).

Após a citação:

-A ré, CC, contestou nos termos que constam a fls. 71 e ss., impugnando parcialmente os factos alegados pelos AA..

Concluindo que, devem, no mínimo, ser julgados procedentes os pedidos formulados em a), b), c) e g) da petição inicial.

-Os réus, FFe mulher e “EE, Ldª”, contestaram nos termos que constam a fls. 88 e ss., por excepção e impugnação.

Concluem que deve:

a) ser julgada procedente a excepção de caso julgado, deduzida pelos RR. FFe mulher e estes serem absolvidos dos pedidos.

b) ser julgada procedente a excepção de ilegitimidade da Ré “EE Ldª” e, consequentemente, esta ser absolvida da instância;

c) se tal não for decidido, deve a acção ser julgada não provada e improcedente relativamente aos mesmos RR., e à Ré “EE Ldaª” e, consequentemente, estes serem absolvidos dos pedidos formulados pelos AA..

Falecido o Réu DD na pendência da acção, foram habilitados, para prosseguir os termos da causa como Réus, a sua viúva, a 1.ª Ré, e os filhos do casal, LL, MM,NN, OO, PP, QQ e RR.

Os AA. a fls. 203 e ss., vieram apresentar réplica às contestações apresentadas e terminam que devem as invocadas excepções improceder, no mais concluindo como na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador onde se julgou procedente a excepção da ilegitimidade da Ré “Predial” para o pedido principal e improcedente a excepção, quanto ao pedido subsidiário, considerando-a parte legítima. Julgou-se improcedente a excepção de caso julgado deduzida pelos Réus.

Fixaram-se os factos assentes e a base instrutória, sem reclamação.

A fls. 237 os AA interpuseram recurso do despacho saneador, que foi admitido a fls. 251, como agravo, com subida imediata em separado e, que foi provido pelo Tribunal da Relação, considerando a Ré “Predial” parte legítima para o pedido principal.

Instruído o processo, seguiram os autos para julgamento, tendo a matéria de facto constante da base instrutória sido decidida, nos termos que constam a fls. 333 a 336, sem reclamações.

Por fim, foi proferida sentença com a seguinte decisão:

“Pelo exposto, julga-se a presente acção parcialmente procedente por provada e, em consequência:

- declara-se que o prédio rústico composto de campo de lavradio, situado no lugar de ....... freguesia de Vila Franca, Viana do Castelo, a confrontar do norte com HH, do sul com II, do nascente com herdeiros do Dr. JJ e do poente com KK inscrito na matriz predial rústica sob o art. 1757.º e descrito na Conservatória de Registo Predial de Viana do Castelo sob o n.º 0000000, se encontra dividido em duas parcelas de terreno, correspondendo a dois prédios autónomos;
- declara-se que os Autores AA e mulher BB são proprietários, por usucapião, da parcela do mesmo prédio composta de terreno de lavradio com 2383 m2, sito em ....... freguesia de Vila Franca, a confrontar do norte com CC, do sul comII, do nascente com JJ e do poente com KK;

- condenam-se os Réus CC, LL, MM,NN, OO, PP, QQ e RR a reconhecer a divisão e aquisição supra referidas;

- condenam-se os Réus FF e mulher GG a pagar aos Autores AA e mulher BB uma indemnização, a liquidar em execução de sentença, resultante de os Autores não terem cultivado a sua parcela supra descrita, nem dela ter recolhido proventos, desde Abril de 2003 até ao presente;

- condenam-se os Réus CC, LL, MM,NN, OO, PP, QQ e RR, na qualidade de proprietários da outra parcela do prédio referido em A), composta de terreno de lavradio com 1765 m2, sito em ....... freguesia de Vila Franca, a confrontar do norte com loteamento, do sul com AA, do nascente com JJ e do poente com KK, a suportar a constituição, sobre este prédio e favor do supra descrito dos Autores, de um direito de servidão de passagem, de e para o arruamento existente a norte, através de um caminho com cerca de 2,5 m de largura, destinado ao trânsito a pé e com veículos agrícolas (de animais ou motorizados), mediante o pagamento, pelos Autores, da indemnização correspondente ao prejuízo sofrido, a liquidar em execução de sentença;


- absolve-se a Ré “EE, LDA.” dos pedidos contra ela formulados pelos Autores;

- absolvem-se os Réus FF e mulher GG dos demais pedidos contra eles formulados pelos Autores.

Custas a cargo dos terceiros Réus e dos Autores, na proporção de 4/5 e 2/6, respectivamente (os primeiros Réus defenderam, na contestação, a procedência dos pedidos que assim foram julgados, pelo que não há sucumbência da sua parte).”.

Inconformados com o decidido, recorreram os autores e os réus, FF e mulher GG para esta Relação, os quais foram admitidos como apelação e efeito devolutivo.

 O Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães julgou improcedente a apelação dos autores e totalmente procedente a apelação dos terceiros Réus e revogou parcialmente a sentença recorrida na parte relativa em que procedeu à sua condenação, absolvendo-os quanto a todos os pedidos contra eles formulados.

Os AA não se conformaram com esta decisão e interpuseram recurso de revista para este Supremo Tribunal.

 Nas suas alegações de recurso formulam as seguintes conclusões:

1ª  - Os AA. sempre detiveram sobre o prédio dos segundos e terceiros RR.. o direito de servidão de passagem e devem os segundos e terceiros réus ser condenados a ver reconhecidos tal direito dos AA. e como tal condenados, tal como resulta da matéria dada como provada nos pontos 9º, 10º e 11. 2ª. - a considerar-se nula a mudança de servidão não poderá considerar-se, pelas mesmas razões de facto e de direito, a extinção da anterior servidão pelo que os 2º e 3º RR. deveriam ser condenados a restabelecer a referida servidão.

3ª. - Não tendo sido alegada qualquer impossibilidade de restabelecimento da servidão em causa, deveriam os RR. ser condenados no restabelecimento da servidão seja na parte em que os RR. FF e mulher detêm o lote ou seja na parte em que a Ré "EE, L.da" passou a ocupar com o loteamento que levou a efeito.

4ª. - e, desse modo, deveriam ser julgados procedentes os pedidos supra mencionados na al. d) e e).

5ª. - Igualmente deveria ser julgado procedente o pedido constante da al. f) contra a Ré "EE, L.da" porque a sua conduta também impediu, como impede, o exercício do direito de servidão por parte dos AA.

6ª. - Em todo o caso, ambos os RR. FF e mulher e "EE, L.da" deveriam ser condenados no pedido da al. f) pois é a sua conduta que impede o exercício do direito de servidão por parte dos AA.;

7ª. - Deveria ainda o tribunal julgar procedente o pedido formulado na al. h) contra ambos os RR. FF e mulher e "EE., L.da",   caso   se   venha   a   entender   que   existe   impossibilidade   de restabelecimento de nova servidão, com a constituição da nova servidão causa prejuízos aos AA. que terão de suportar os custos das obras necessárias e pagar indemnização pelo expropriação sendo aqueles RR. que obtêm benefício por os seus prédios deixarem de estar onerados com tal servidão.

7ª. - O acórdão recorrido viola, entre outras, as disposições dos artigos 220º e 1571º do C.C.

 Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se o acórdão recorrido e proferindo-se douto acórdão em conformidade com as alegações supra-formuladas.

Com o que se fará

JUSTIÇA!

Os terceiros RR FF e GG apresentaram contra- alegações concluindo que de acordo com  factualidade provada o Tribunal  a quo não poderia ter julgado procedentes os pedidos formulados nas als. d) e) e f) da pi, pugnando pela confirmação do Acórdão recorrido.

 Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II - FUNDAMENTAÇÃO

A) - OS FACTOS

Na 1ª instância consideraram-se provados os seguintes factos:

A) - Os Autores são donos e legítimos possuidores, em comum com os Réus CCe marido DD, na proporção de 2/5 para estes e de 3/5 indivisos para os Autores, de um campo de lavradio, situado no lugar de ....... freguesia de Vila Franca, desta comarca, a confrontar do norte com HH, do sul com II, do nascente com herdeiros do Dr. JJ e do poente com KK inscrito na matriz predial rústica sob o art. 1757.º e descrito na Conservatória de Registo Predial de Viana do Castelo sob o n.º 0000000.

B) - O acesso, a partir da via pública, à parcela de terreno identificada sob a letra “A” na planta junta a fls. 36 era feito, até 1992, através de um caminho de traçado oblíquo, orientado a nascente, pelo meio de terrenos de cultivo localizados entre aquela e a via pública, correspondente ao que está assinalado a cor amarela na mesma planta.

C) - Em Abril de 2003, os Réus FF e mulher GG colocaram um amontoado de pedras e areias na entrada do caminho que dá acesso ao prédio dos Autores.

D) - Nos dias imediatos, os Réus FF e mulher fecharam o portão de acesso à propriedade dos Autores com uma chave da qual estes não têm cópia.

E) - Anteriormente a Abril de 2003, os Autores produziam milho, batata e vinho, tudo para consumo próprio.

F) - A parcela identificada sob a letra “A” na planta junta a fls. 36 confina a nascente com o lote dos terceiros Réus e a norte com a parcela identificada sob a letra “B” da mesma planta.

1.º2.º,3.º - Há mais de 25 anos, os Autores e a Ré CC e seu marido  colocaram no prédio referido em A) marcos a delimitar duas parcelas de terreno, passando, a partir de então, os Autores a tratar como sua uma das referidas parcelas e os Réus CC e marido a tratar como sua a outra, e cada uma das referidas parcelas de terreno a ser usada como unidade independente e com autonomia física da outra.

4.º - A parcela que os Autores passaram a tratar como sua é constituída por um terreno de lavradio com 2383 m2, sito em ....... freguesia de Vila Franca, a confrontar do norte com CC, do sul com II, do nascente com JJ e do poente com KK.

5.º - A parcela que a Ré CC e marido passaram a tratar como sua é constituída por um terreno de lavradio com 1765 m2, sito em ....... freguesia de Vila Franca, a confrontar do norte com loteamento, do sul com AA, do nascente com JJ e do poente com KK.

6.º - As parcelas descritas nas respostas aos quesitos 4.º e 5.º têm a localização e a configuração que constam da planta de fls. 293, aí identificadas, respectivamente, como “B” e “A”.

7.º,8.º - Os Autores e a Ré CC e marido vêm explorando, respectivamente, as parcelas descritas nas respostas aos quesitos 4.º e 5.º, com respeito pelos limites por eles definidos, cultivando-as, limpando-as, retirando delas e fazendo suas todas as utilidades que são susceptíveis de produzir, há mais de 25 anos, à vista de toda a gente, sem interrupção temporal, sem oposição de ninguém, sem violência e na convicção de que exercem um direito correspondente ao direito de propriedade sobre a respectiva parcela e de que não ofendem o direito de outrem.

9.º - O acesso referido em B) tinha um trilho visível e calcado com uma largura de cerca de 2,5 m.

10.º - O caminho referido em B) foi usado, desde há mais de 30 anos contados até 1992, para aceder da via pública à parcela dos Autores e vice-versa, de forma ininterrupta, pacífica, à vista, com conhecimento e aceitação de toda a gente, sem oposição de ninguém, no convencimento de quem exercia um direito próprio e não prejudicava ninguém.

11.º - No ano de 1992, parte dos prédios pelos quais se fazia o trajecto do caminho referido em B) foram objecto de uma operação de loteamento para construção urbana levado a cabo pela Ré “EE, Lda.”.

12.º - Por acordo entre a Ré “Predial”, os Autores e os primeiros Réus, na altura da operação de loteamento, procedeu-se à mudança do acesso referido em B) para a estrema sul desse loteamento.

14.º - O acesso descrito na resposta ao quesito 12.º passou a fazer-se pelo prédio que actualmente constitui o lote pertença dos Réus FF e mulher GG.

15.º - Além desse acesso, a parcela descrita na resposta ao quesito 4.º não tinha outra comunicação com a via pública.

16.º,17.º - O referido em C) e D) impede o acesso dos Autores à parcela de terreno descrita na resposta ao quesito 4.º, não permitindo que os Autores a cultivem.

18.º - Pelo acesso aludido nas respostas aos quesitos 12.º e 14.º, os Autores chegavam à sua parcela a pé e com veículos agrícolas, de animais ou motorizados.

19.º - Actualmente, o único acesso fisicamente viável da via pública para a parcela dos Autores é através de parte do terreno referido na resposta ao quesito 5.º.

30.º - Para se fazer um acesso da parcela referida na resposta ao quesito 4.º ao arruamento que fica a norte da parcela aludida na resposta ao quesito 5.º, e além de atravessar esta última, tem de ser derrubado parte de um muro de pedra de xisto, com cerca de 2 m de altura.

Apreciando:

Conforme decorre das precedentes conclusões de recurso que, como se sabe, delimitam o objecto de recurso, salvo as questões de conhecimento oficioso, a questão fulcral que vem submetida á apreciação e tendo também em conta os termos em que a  Relação  a situou, consiste no essencial saber se, no caso em apreço, houve  uma mudança de servidão ou, se antes estamos perante uma nova servidão e se esta mudança ou nova servidão pode ser oposta aos terceiros RR .

 Na presente revista  importa sublinhar está  fundamentalmente em causa o direito de passagem dos AA para a sua parcela , através do prédio dos 3ºs RR, sendo que os pedidos relacionados com a sanção pecuniária compulsória e com prejuízos  estão naturalmente  dependentes da sorte daquele pedido  relativo ao  direito de passagem.

         Em primeiro lugar a resolução desta questão não pode ser resolvida  sem ter em conta a matéria de  facto que vem provada, que destacamos:

Os AA são donos e legítimos possuidores em comum com os RR CC e marido DD, na proporção de 2/5 para estes e de 3/5 indivisos para os Autores , de um campo de lavradio, situado no lugar de Igreja , freguesia de Vila Franca, desta comarca, a confrontar do norte com  HH, do sul com António II, do nascente com herdeiros do Dr. JJ e do poente com KK, inscrito na matriz predial rústica sob o art. 1757 e descrito na Conservatória do registo Predial de Viana do  Castelo sob o nº 0000000-A)

O acesso, a partir da via pública , á parcela de terreno identificada sob a letra “ A” na planta junta a fls. 36 era feito, até 1992 , através de um caminho de traçado oblíquo , orientado a nascente pelo meio de terrenos de cultivo localizados entre aquela  e a via pública , correspondendo ao que está assinalado a cor amarela na mesma planta – B)

A parcela identificada sob a letra “A” na planta junta a fls.36 confina a nascente com o lote dos terceiros RR e a norte com a parcela identificada soba letra “B” da mesma planta –F)

O caminho referido em B) foi usado , desde há mais de 30 anos contados até 1992 para aceder à via pública à parcela dos AA e vice-versa, de forma ininterrupta, pacífica, à vista com conhecimento e aceitação de toda a gente, sem oposição de ninguém, no convencimento de quem exercia um direito próprio e não prejudicava ninguém.10º;

No ano de 1992 parte dos prédios pelos quais se fazia o trajecto do caminho referido em B)foram objecto de uma operação de loteamento para construção levada a cabo pela Ré EE Ldª-11º;

Por acordo entre a Ré Predial , os Autores e os primeiros RR na altura da operação de loteamento , procedeu –se à mudança do acesso referido em B)para a estrema sul deste loteamento- 12º

O acesso referido na resposta ao quesito 12º passou a fazer-se pelo prédio que actualmente constitui o lote pertença dos RR FF e mulher GG. 14º;

Pelo acesso aludido nas respostas aos quesitos 12º e 14º os Autores chegavam á sua parcela a pe e com veículos agrícolas, de animais ou motorizados . 18º;

Actualmente o único acesso fisicamente viável da via pública para a parcela dos Autores é através de parte do terreno referido na resposta ao quesito 5º( A parcela que a Ré CC e marido passaram a tratar como sua é constituída por um terreno de lavradio com 1765 m2 , sito em Igreja freguesia de Vila franca a confrontar do norte com loteamento, do sul com AA , do nascente com JJe do poente comKK )-19º

Para se fazer  um acesso da parecela referida na resposta ao quesito 4º( parcela que os Autores passaram a  tratar como sua é constituída por um terreno de lavradio com2383 m2, sito em Igreja freguesia de Vila Franca) ao arruamento que fica a norte da parcela aludida na resposta  ao quesito 5º e além de atravessar esta última tem de ser derrubado um muro de pedra de xisto , com cerca de 2m de altura.30º.

 A questão que, aqui, se coloca, como bem observa o Acórdão recorrido, é a de saber se, com a mudança do sítio da servidão operada aquando da operação de loteamento  configura   a constituição de uma nova servidão, como defendem os terceiros RR, ou se o direito de servidão de que gozava o prédio dos autores até 1992 se manteve com as mesmas características, embora exercido de forma diferente , por outo trajecto.

         O Acórdão sobre a matéria adiantou que a mudança da servidão que ocorreu em 1992 , aquando da operação de loteamento implicou a extinção da servidão originária e o nascimento de nova servidão , porque no dizer do Acórdão “ não ocorreu apenas a mudança do sítio da servidão , como essa mudança se operou para um prédio diferente , o que configura não uma modificação objectiva da servidão existente até 1992, mas a sua extinção” , conclusão que sustentou  recorrendo a Mário Tavarela  Lobo in “ Mudança e Alteração de Servidão, 1984 pag. 19 2 segs”.

 E assim parece ser, pois, a  operação de loteamento implica não uma mudança da primitiva servidão, mas uma nova servidão , tanto mais que a existir servidão   esta tinha necessariamente de constar do alvará do loteamento ou pelo menos devia constar do registo, para ser oponível a terceiros , os futuros adquirentes dos respectivos  lotes.

 Efectivamente, com a operação de loteamento a simples mudança de uma servidão primitiva e anterior que incidia sobre um terreno que foi objecto de loteamento,    para uma parcela desse terreno  que passou a ser um lote e, por conseguinte, prédio urbano diferente, constitui neste circunstancialismo uma nova servidão e, como tal, além de ter de constar das especificações do alvará do respectivo loteamento (cfr. art. 29 do DL nº 448/91 de 29/11) devia, pelo menos, ter sido objecto de  escritura pública, conforme refere o Acórdão recorrido  e de registo na Conservatória do Registo Predial respectiva, para ser oponível a terceiros, adquirentes dos respectivos lotes, procedimentos que, aqui, conforme o que vem provado, não tiveram lugar. ( cfr. art. 7º do C.Reg. Predial).

“ Servidão predial é o encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio pertencente a dono diferente ; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão e dominante o que dela beneficia”- art. 1543º do C. Civil.

“ podem ser objecto da servidão quaisquer utilidades, ainda que futuras ou eventuais, susceptíveis  de ser gozadas por intermédio do prédio dominante , mesmo que não aumente o seu valor “. Art. 1544 do CC.

 A servidão exprime uma limitação ao direito de propriedade do prédio que com ela é onerado ( prédio serviente) em  favor do prédio que dela beneficie ( prédio dominante)..

 “ Condition sine qua non “ para se poder falar na existência de uma servidão é que os prédios servientes e dominante pertençam a todos diferentes , uma vez que é antijurídico que relativamente à mesma coisa coexistam o direito de propriedade – que em princípio é absoluto- e um direito que o restringe como é a servidão- “ nemini res sua servit”.

No caso em apreço, como já se referiu, não houve aqui uma mudança de servidão, não obstante ter havido uma mudança  de trajecto  para sítio do primitivamente assinalado e, isto porque como se disse,  com a operação de loteamento a mudança para um terreno que agora constitui um lote ( prédio urbano diferente) altera de forma  substantiva  o objecto jurídico da  servidão,  desde logo, porque  o prédio serviente , por força do referido loteamento urbano passa a ser necessariamente diferente.

 Nesta perspectiva e de acordo com o provado não houve uma  mudança de servidão nos termos definidos no art. 1568 do C Civil, mas sim numa nova servidão que as partes interessadas seguramente  na altura quiserem constituir, face ao novo quadro jurídico que um loteamento urbano na altura certamente lhes  colocava.

 Aconteceu é que as partes não traduziram documental e oficialmente esses propósitos, nomeadamente através da respectiva escritura pública  (cfr. art. 80 nº1 do C Notariado) conforme refere o Acórdão  recorrido e, daí que a nova servidão  não possa vigorar por não ter sido validamente constituída e, por via disso, também não possa ser oposta a terceiros.

 E não havendo mudança de servidão os AA não podem aproveitar os actos de posse que exerceram sobre a primitiva servidão até 1992.

Também não há lugar á reposição da primitiva servidão, por impossibilidade de exercício que, agora ocorre, por força do loteamento  realizado no terreno .

 Importa, neste domínio, no entanto sublinhar, que o prédio dos AA com a impossibilidade de constituir servidão sobre o prédio dos RR nos termos descritos, não fica definitivamente encravado, valendo, aqui,  a servidão já reconhecida e a constituir nos termos descritos na decisão da 1ª instância  , através de parte do terreno referido na resposta ao quesito 5º( A parcela que a Ré CC e marido passaram a tratar como sua é constituída por um terreno de lavradio com 1765 m2 , sito em Igreja freguesia de Vila franca a confrontar do norte com loteamento, do sul com AA , do nascente com JJ e do poente com KK ) actualmente o único acesso fisicamente viável para a parcela dos Autores -19º,

Para se fazer um acesso da parcela referida na resposta ao quesito 4º (parcela que os Autores passaram a  tratar como sua é constituída por um terreno de lavradio com2383 m2, sito em Igreja freguesia de Vila Franca) ao arruamento que fica a norte da parcela aludida na resposta  ao quesito 5º e além de atravessar esta última tem de ser derrubado um muro de pedra de xisto , com cerca de 2m de altura-30º.

 Significa que em função desta factualidade que vem provada também carece de fundamento o pedido que os AA fazem de forma subsidiária contra os RR sob a alínea g). 

Improcedem as conclusões dos recorrentes.

 III Decisão:

 Nestes termos e considerando o exposto, acordam os Juízes deste Supremo em negar a revista, confirmando o Acórdão recorrido.

 Custas pelos recorrentes.

Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça, 21 de Fevereiro de 2013

 
Tavares de Paiva (Relator)
Abrantes Geraldes
Bettencourt de Faria