Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
07S2096
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: BRAVO SERRA
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO
CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
MOTIVAÇÃO
CONTRATO DE UTILIZAÇÃO
CTT
CASO JULGADO
Nº do Documento: SJ200710170020964
Data do Acordão: 10/17/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.
Sumário : I - A falta de indicação dos motivos que justificam a celebração do contrato de trabalho temporário, com menção concreta dos factos e circunstâncias que integram esses motivos, acarreta que o contrato passe a considerar-se sem termo (art. 19.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17-10 e art. 42.º, n.º 3, da LCCT).
II - Não contêm menção concreta dos factos e circunstâncias que justificam a celebração dos contratos de trabalho temporário aqueles em que apenas se faz alusão a «acréscimo temporário ou imprevisto de actividade», «acréscimo temporário de tráfego» ou «acréscimo temporário de tráfego (pagamento de vales)».
III - Porém, a falta de motivação da contratação que determina que o contrato de trabalho temporário se considere por tempo indeterminado não se repercute directamente na relação jurídica titulada pelos contratos de utilização de trabalho temporário celebrados entre a empresa de trabalho temporário e a empresa utilizadora do trabalho, se esses contratos de utilização não se encontram documentados nos autos, nem da matéria de facto dada como assente se pode extrair que os mesmos (contratos de utilização) estavam, também eles, feridos de invalidade por falta de motivação.
IV - Tendo a 1.ª instância condenado a empresa de trabalho temporário a reconhecer que a autora era sua trabalhadora permanente, em virtude da invalidade dos contratos de trabalho firmados com esta, decisão que foi revogada pelo Tribunal da Relação, que condenou, naqueles termos, a empresa utilizadora do trabalho, interposto recurso de revista apenas por esta, a sua procedência não determina a subsistência daquela decisão da 1.ª instância (de condenação da empresa de trabalho temporário).
V - A norma do n.º 1, do art. 41.º-A da LCCT, aditada pela Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, só se aplica às relações jurídicas constituídas após a sua entrada em vigor.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I

1. Pelo Tribunal do Trabalho do Funchal intentou AA contra Empresa-A, S.A., e Empresa-B, S.A., acção com processo comum, solicitando a condenação da ré Empresa-A a reintegrar a autora como Técnica Postal e de Gestão, com efeitos desde 17 de Maio de 1999, e a pagar-lhe as retribuições vencidas, no montante de € 780,40, e vincendas até ao trânsito em julgado da decisão ou, assim não se entendendo, a condenação da ré Empresa-B a reintegrar a autora com efeitos desde 15 de Novembro de 2001 e a pagar-lhe as retribuições vencidas, no referido montante, e as vincendas até ao dito trânsito.

Em súmula, para estear a sua pretensão, a autora invocou que: –
– em 17 de Maio de 1999 foi admitida para trabalhar, pelo prazo de cento e sessenta e cinco dias, sob a autoridade e direcção da ré (Empresa-A), com vista ao desempenho de determinadas funções, que indicou, invocando-se nesse contrato que a contratação intentava suprir necessidades transitórias de serviço por motivo de substituição de férias de certos técnicos postais e de gestão, vindo, em 29 de Outubro desse ano, a assinar com a mesma ré um contrato de trabalho a termo incerto, para o mencionado desempenho, na Estação dos Correios Calouste Gulbenkian, no Funchal, com a justificação, aposta no contrato, de substituir determinada técnica postal e de gestão, e, em 3 de Maio de 2000, a assinar outro, desta feita a termo certo, pelo período de cento e oitenta a nove dias, para exercer idênticas funções no Centro de Agrupamento de Reserva Contínua Zarco, na mesma cidade, com invocação similar à constante do contrato de 17 de Maio de 1999;
– ela, autora, celebrou com a empresa Empresa-C, S.A., dezoito contratos de trabalho temporário, sempre visando o desempenho das referidas funções nas Estações de Correio da ré Empresa-A sitas na Madeira, e com invocações de necessidade de substituição de trabalhadores ausentes por doença ou para prestarem assistência a familiares ou por acréscimo temporário e imprevisto de actividade;
– a autora celebrou com a ré Empresa-B, em 29 de Março de 2001, 30 de Março de 2001 e 2 de Abril de 2001, três contratos de trabalho temporário por, respectivamente, um dia, um dia e oito dias, para desempenho das aludidas funções na já mencionada Estação de Correios Calouste Gulbenkian;
– em 2 de Maio de 2001 a autora celebrou um contrato a termo certo com a ré (Empresa-A), pelo período de cento e noventa e dois dias, ainda visando o exercício de semelhantes funções na Estação dos Correios Zarco, invocando-se em todos esses contratos o suprimento de necessidades transitórias de serviço e de substituição de técnicos postais e de gestão;
– a autora celebrou com a ré Empresa-B setenta e dois contratos de trabalho temporário, também para o desempenho daquelas funções, em Estações dos Correios da Madeira, invocando-se um acréscimo temporário do tráfego;
– em 3 de Maio de 2004, a autora celebrou com a ré Empresa-A um contrato de trabalho a termo certo, por cento e oitenta dias, para exercer as referenciadas funções no indicado Centro de Agrupamento de Reserva Contínua, nele se apondo que se visavam suprir necessidades transitórias de serviço por motivos de substituição de técnicos postais e de gestão em gozo de férias;
– por carta datada de 12 de Outubro de 2004, a ré (Empresa-A) comunicou à autora a não renovação do contrato, com efeitos a partir de 29 de Outubro desse ano, vindo, porém, em 3 de Janeiro e 3 de Fevereiro de 2005, a celebrar com a ré Empresa-B dois contratos de trabalho temporário para o desempenho de tais funções, neles se invocando, uma vez mais, o acréscimo temporário de tráfego;
– assim, a autora prestou serviço à ré (Empresa-A) de 17 de Maio de 1999 até 7 de Fevereiro de 2005, sendo certo que, não obstante as invocações ínsitas nos contratos, a contratação da autora visou assegurar necessidades normais e permanentes da mesma ré.

Prosseguindo os autos seus termos, veio, em 21 de Dezembro de 2005, a ser proferida sentença que absolveu a ré Empresa-A dos pedidos e declarou a autora como trabalhadora permanente da ré Empresa-B desde 3 de Janeiro de 2005, consequentemente declarando ilícito o despedimento daquela, por não ter sido precedido de processo disciplinar, e condenando esta última ré a pagar à autora as retribuições vencidas até à decisão final e as vincendas até à efectiva reintegração.

Inconformadas, apelaram a autora e a ré Empresa-B, vindo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 31 de Janeiro de 2004, a absolver dos pedidos a ré apelante e, no provimento parcial da apelação da autora, a declarar que ela era trabalhadora por tempo indeterminado da ré Empresa-A desde 3 de Janeiro de 2005, sendo ilícito, por não ter sido precedido de processo disciplinar, o seu despedimento, tendo, na decorrência dessa declaração, condenado a ré Empresa-A a reintegrar a autora no seu posto de trabalho com as funções e antiguidade que deteria se não tivesse ocorrido o despedimento e a condená-la a pagar as retribuições vencidas até à decisão final e as vincendas até à efectiva reintegração.

2. É daquele aresto que a ré Empresa-A vem agora pedir revista, rematando a alegação adrede produzida com o seguinte quadro conclusivo: –

A – Não deve o entendimento preconizado pelo acórdão da douta Relação de Lisboa proceder porquanto tem por base, apenas, dois contratos de trabalho temporário assinados com a R. Empresa-B, SA, em virtude dos quais a A. prestou funções como Técnica Postal e de Gestão, ambos juntos aos autos como DOC 100 e 101 da p.i., no âmbito dos quais a ora Recorrente não teve qualquer tipo de oportunidade de intervenção ou supervisão;
B – Tais contratos de trabalho foram fundamentados num ‘acréscimo temporário de tráfego’, acréscimos esses, saliente-se, que foram dados por assentes.
C – O motivo justificativo mencionado nos contratos de trabalho temporário traduzem exactamente os factos que justificaram a necessidade de contratação. Tanto assim é que, salvo melhor opinião, para um qualquer colega da Recorrida, nas mesmas funções, a menção ao aumento do ‘tráfego’ tem uma e só uma interpretação possível: o aumento do fluxo de correspondência. A apreciação realizada pelo Tribunal parece-nos distante na medida em que desconsidera a utilização por parte da Recorrente, no seu dia-a-dia e por parte da Empresa-B SA, nos respectivos contratos, de termos que são total e integralmente apreensíveis pela Recorrida e que são já parte da prática desta actividade. Nenhum Técnico Postal e de Gestão terá qualquer dúvida sobre que factos se encontram subsumidos ao conceito de ‘tráfego’ e ao seu respectivo aumento.
D – Ao admitir da Recorrida este tipo de argumentação, é, sem sombra de dúvidas, um grave desvio aos princípios da justiça e da boa-fé. Fará sentido admitir que nunca a Recorrida tenha posto em causa a validade deste vínculo junto da R. Empresa-B SA, sua efectiva entidade patronal? Fará sentido impor à ora Recorrente uma condenação assente sobre argumentos no sentido de que a trabalhadora Recorrida desconhece a razão de ser para a celebração dos contratos de trabalho temporário celebrados com a R. Empresa-B SA? Fará sentido admitir, na mesma medida, de um Técnico Postal e de Gestão que hoje venha reclamar do Tribunal que este se digne consagrar a reintegração na Recorrente, tendo em conta que, naquela data, desconhecia o que significava um aumento de tráfego? É que, assumindo tais funções, a necessidade da sua prestação de trabalho por motivo de aumento de tráfego não poderia ter outra interpretação que não fosse o aumento do fluxo de correspondência postal a que esta teria de dar resposta nos períodos ao abrigo dos quais foram celebrados os contratos de trabalho temporário.
E – Ao consagrar tudo isto, andou, salvo o devido respeito, mal o Tribunal da Relação de Lisboa ao consagrar aquilo que de outra forma não poderá ser classificado como uma clara e manifesta tentativa por parte da Recorrida de se fazer valer, abusivamente, de um direito.
F – Ignorando total e completamente que a principal prejudicada de tal juízo é precisamente a única parte que não teve qualquer intervenção na elaboração dos contratos de trabalho temporário com base nos quais se sustenta a presente decisão validar com tão superior chancela o entendimento preconizado pela Recorrida nos autos em referência, representa assim para a Recorrente uma incomportável consequência com a qual não pode, nunca, contentar-se.
G – Do ponto de vista material, colocando-se o Julgador na posição da trabalhadora ora Recorrida, não se pode sequer conceber como poderia est[a] deixar de reconhecer o substrato material e factual que nos contratos de trabalho temporário surgia evidenciado. Para alguém cuja função será o manuseamento e a gestão de correspondência, mais a mais no caso dos presentes autos, que dúvidas se poderão admitir ao nível da natureza do ‘tráfego’ em causa ..?
H – Salvo o devido respeito, não nos parece correcta a configuração oferecida pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa ao considerar ‘(...) a omissão dos motivos que justificam a celebração do contrato de trabalho temporário (...) ‘. Salvo melhor opinião, para um homem médio, receptor da proposta negocial constante dos documentos acima identificados e juntos aos autos como DOC 100 101, a verdade é que não restariam quaisquer dúvidas sobre os fundamentos da sua contratação.
I – Ainda que assim não fosse, o que por mera hipótese cumpre agora admitir, o certo é que ainda assim se discorda, salvo o devido respeito, das conclusões a que chegou o Douto acórdão da Relação de Lisboa, na medida em que de forma incompreensível estabeleceu com a ora Recorrente, o nexo contratual legalmente imposto em consequência de uma invalidade formal ao nível de um contrato no qual não teve qualquer intervenção, nem sequer esta lhe era por qualquer forma exigível, ainda que através de um procedimento de mera fiscalização.
J – A consequência que em virtude do acórdão ora Recorrido se imputou à Recorrente fixa-se muito para além de quaisquer limites admissíveis à luz dos mais elementares princípios de direito. Visou-se e conseguiu-se efectivamente imputar de forma inadmissível à ora Recorrente as vicissitudes de um contrato que, intencional ou negligentemente, foram sem sombra de dúvidas provocadas por um comportamento da R. Empresa-B SA que, a configurar-se como ilícito, não pode senão responsabilizar ela própria. Desconhecem-se quaisquer razões de justiça que desta forma injustificada permitam, conscientemente, punir uma entidade, uma empresa, pelo comportamento ilícito intencional ou negligentemente assumido por outra, mais a mais, quando a principal prejudicada nem sequer responsabilidade fiscalizadora tinha, teve ou tem para neste domínio. Nas palavras do ilustre Professor Dr. Pedro Romano Martinez se encontre melhor razão, quando refere, ‘Não sendo observada a forma escrita ou faltando a indicação do motivo que justifica a celebração do contrato, remete-se para a conversão em contrato sem termo (...) não se esclarecendo contudo quem fica vinculado por este negócio jurídico.’ mais adiantando que, ‘Diferentemente do disposto nos arts. 11.º, n.º 4, e 16º, n.º 3, da LTT, onde se comina que o contrato sem termo se considera celebrado entre o trabalhador e o utilizador, no art. 19º, n.º 2, da LTT fica em aberto o sentido da estatuição legal, devendo entender-se que o vínculo se consolida entre a ETT e o trabalhador, pois não seria curial responsabilizar o utilizador por factos de que não é imputável.
L – Não só pouco curial seria, como, segundo pensamos, se poderia até situar para além dos limites da própria legalidade porquanto, não existindo expressão legal claramente fixada nesse sentido, seria no mínimo controverso forçar uma parte a ‘aderir’ à manifestação de uma vontade contratual que não foi por si emitida, recepcionada e até, por vezes, conhecida. Conforme refere o ilustre Professor Dr. Monteiro Fernandes,
A sanção mais significativa para a inobservância de tais condições é a que corresponde à «atipiciade» do trabalho temporário, como esquema contratual de utilização da força de trabalho, no quadro das valorações que continuam a prevalecer no nosso ordenamento laboral. Essa sanção consiste na consideração legal da existência de contrato de trabalho de duração indeterminada.
Na maioria das situações, esse contrato ligará o trabalhador à entidade utilizadora: são os casos do prosseguimento do trabalho ao serviço desta, por mais de dez dias além da cessação do contrato de utilização (art.10º), da falta de contrato de utilização escrito ou da omissão dos motivos da sua celebração (art.11º), da celebração de contrato de utilização com empresa de trabalho temporário não autorizada (...)
O contrato sem termo considera-se existente entre o trabalhador e a empresa de trabalho temporário quando a cedência é feita sem contrato de trabalho temporário (art.º 17), ou quando este é celebrado sem indicação do motivo justificativo (art.19º)
M – Não pode a Recorrente, neste domínio e considerado que seja tudo o que infra se expôs, deixar de afirmar que a conversão do contrato de trabalho temporário, porque de uma conversão se trata efectivamente, não pode deixar de se estabelecer entre a empresa de trabalho temporário, aqui a R. Empresa-B, SA e a trabalhadora Recorrida[,] conforme suporta jurisprudência recente do próprio Tribunal da Relação de Lisboa, acima claramente evidenciada,
Nestes termos e dado o exposto, deve, sempre com o douto suprimento de V. Excelências, ser o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa revogado, absolvendo-se em consequência a Recorrente da prática dos factos em que vem condenada, dando-se assim total e integral provimento á presente revista, com as devidas consequências legais,

Por seu turno, a recorrida autora respondeu à alegação da ré Empresa-A propugnando pela improcedência da revista, formulando, a final, as seguintes «conclusões»: –

1. Os motivos justificativos dos contratos de trabalho temporário celebrados entre a recorrida e a Empresa-B são insuficientes, vagos e falsos.
2. A motivação apresentada, além de falsa, omite os factos e circunstâncias concretas que justificam o recurso à contratação excepcional de trabalhadores.
3. O contrato de trabalho temporário, datado de 3/01/2005, não respeitou os formalismos exigidos pelo Decreto-Lei n.º 358/89, razão por que deve ser considerado um contrato de trabalho por tempo indeterminado que vincula a recorrida à recorrente.
4. A recorrente foi a responsável pela indicação dos motivos presentes naquele clausulado, tentando iludir as disposições legais que regulam a contratação a termo.
5. Só a recorrente tem meios, estrutura organizativa e funções compatíveis com a categoria e natureza da actividade desempenhada pela recorrida que permite a real efectivação do seu direito à reintegração.
6. A cessação do contrato sub judice configura um despedimento ilícito, porque não foi precedido do necessário processo disciplinar.
7. A celebração abusiva de 101 contratos de trabalho a termo e temporário, no período compreendido entre 17 de Maio de 1999 e 7 de Fevereiro de 2005 atenta, gravemente, contra a dignidade da pessoa humana que é a trave mestra da ‘Constituição do Trabalho’ e do Estado de Direito Democrático (arts. 1.º e 2.º da CRP).

Igualmente a ré Empresa-B respondeu à alegação da recorrente Empresa-A, também sustentando a improcedência da revista, e redigindo assim as suas «conclusões»: –

1 – Dos 93 contratos de trabalho temporário que a recorrida trabalhadora celebrou, 37 tinham como fundamento justificativo ‘Acréscimo (ou aumento) temporário de tráfego’.
2 – A recorrida trabalhadora, pela relação intensa e directa mantida com os Empresa-A ao longo de 4 anos e 7 meses, era uma trabalhadora com profundo conhecimento da actividade desta empresa, bem sabendo que esta estava sujeita a acréscimos temporários e a picos de fluxo coincidentes, nomeadamente com o princípio de cada mês.
3 – A terminologia usada nos Empresa-A para designar o fluxo da correspondência e do volume do atendimento – tráfego – era, por isso mesmo, muito bem conhecida da recorrida trabalhadora.
5 – Por esse motivo, é evidente que quando celebrou e assinou os contratos de trabalho temporário com a recorrida Empresa-B, em 02/01/05 e 02/02/05, cada um pelo prazo de 5 dias (!), a recorrida trabalhadora sabia, pela sua profunda experiência anterior, que o fundamento ali invocado pela recorrida Empresa-B – ‘acréscimo temporário de tráfego’ dizia directamente respeito aos picos de aumento da actividade dos serviços nos Empresa-A, que sempre se verificava nos primeiros dias de cada mês.
6 – Tendo ficado provado que, quer durante a execução dos contratos de trabalho temporário, quer após o termo dos mesmos, nunca a recorrida trabalhadora apresentou à recorrida Empresa-B qualquer reclamação sobre o teor e fundamentação dos contratos de trabalho temporário.
7 – A recorrida Empresa-B confiou nos fundamentos para a contratação que lhe foram transmitidos pelos Empresa-A – ‘Acréscimo temporário de tráfego’ – e confiou ainda na boa fé e honestidade da recorrida trabalhadora, que por 37 vezes em situações anteriores celebrara consigo idênticos contratos de trabalho temporários, sem nunca ter apresentado qualquer reclamação.
8 – A haver insuficiência da fundamentação indicada pela recorrida Empresa-B, não lhe poderá ser assacada qualquer responsabilidade, seja a título de negligência, seja a título de dolo, já que a fundamentação que fez inserir nos 2 contratos de trabalho temporário corresponde exactamente àquela que lhe foi indicada pela recorrente Empresa-A.
9 – Assim, se porventura viesse a provar-se a inexistência ou insuficiência das motivações que os CIT deram a conhecer à Empresa-B para justificar o recurso ao trabalho temporário, seria sempre aquele (Empresa-A) o único responsável – ex vi do que se dispõe no nº 6 do art. 11º do Decreto-Lei nº 358/89.
10 – Termos em que deverá ser julgada improcedente o recurso interposto pela recorrente CIT, mantendo-se o douto acórdão recorrido.

O Ex.mo Representante do Ministério Público junto deste Tribunal exarou douto «parecer» (que, notificado às partes, sobre ele se não pronunciaram) no qual defendeu não dever ser concedida a revista.

Corridos os «vistos», cumpre decidir.
II
1. Por aqui se não colocarem quaisquer das situações mencionadas no nº 2 do artº 722º do Código de Processo Civil, há que acatar a seguinte matéria fáctica assente pelo acórdão impugnado: –

– a) com data de 17 de Maio de 1999 a autora celebrou com a ré Empresa-A, S. A., um contrato intitulado de “Contrato de Trabalho a Termo Certo”, pelo qual a primeira se comprometia a prestar à segunda a sua actividade profissional, “desempenhando as funções de: atendimento, promoção, venda e assistência pós-venda e tratamento, manual ou mecanizado, das correspondências”, efectuar “balanços, auditorias, estudos de redimensionamento de giros, controlo e guarda de valores, bem como todo o tipo de tarefas de natureza técnico-administrativa inerentes às actividades comerciais, operacionais, de apoio e controlo de qualidade”, desempenhar “tarefas de apoio à organização, racionalização e implantação das redes comercial, distribuição, tratamento e transporte” e poder “assumir a responsabilidade de coordenação de equipas de trabalho e participar em acções de formação nas Estações de Correio: Mercado à Rua do Arcipreste n.º ... – 9050 Funchal e Calouste Gulbenkian à Av. C. Gulbenkian, n.º ... Funchal, pelo período de 165 dias, com início em 17.05.1999”;
– b) com data de 29 de Outubro de 1999 entre a autora e a ré Empresa-A foi celebrado um contrato intitulado “Contrato de Trabalho a Termo Incerto”, em que aquela se comprometia a prestar a esta a sua actividade profissional, com as funções referidas em a) supra, na Calouste Gulbenkian à Av. Calouste Gulbenkian, n.º .., no Funchal, pelo tempo necessário à substituição da TPG BB, que se encontrava na situação de doença;
– c) no dia 3 de Maio de 2000 a autora celebrou, novamente com a ré Empresa-A, um “Contrato de Trabalho a Termo Certo”, para desempenhar as mesmas funções no CARC da Zarco, à Avenida Zarco, ..., no Funchal;
– d) a autora celebrou com a Empresa-C, S.A., dezoito contratos denominados “Contrato de Trabalho Temporário”, para exercer as funções de Técnica Postal e de Gestão (TPG) em Estações de Correios da ré Empresa-A, na Madeira (Câmara de Lobos, Penteada/Calouste Gulbenkian, Zarco – Funchal, Machico, Nazaré e Mercado – Funchal), relativos aos seguintes períodos:
1º – de 8 de Novembro de 2000 a 9 de Novembro de 2000;
2º – de 23 de Novembro de 2000 a 23 de Novembro de 2000;
3º – de 24 de Novembro de 2000 a 27 de Novembro de 2000;
4º – de 27 de Novembro de 2000 a 27 de Novembro de 2000;
5º – de 30 de Novembro de 2000 a 30 de Novembro de 2000;
6º – de 4 de Dezembro de 2000 a 13 de Dezembro de 2000;
7º – de 19 de Dezembro de 2000 a 21 de Dezembro de 2000;
8º – de 27 de Dezembro de 2000 a 28 de Dezembro de 2000;
9º – de 2 de Janeiro de 2001 a 8 de Janeiro de 2001;
10º – de 10 de Janeiro de 2001 a 10 de Janeiro de 2001;
11º – de 11 de Janeiro de 2001 a 18 de Janeiro de 2001;
12º – de 23 de Janeiro de 2001 a 24 de Janeiro de 2001;
13º – de 25 de Janeiro de 20021 a 31 de Janeiro de 2001;
14º – de 1 de Fevereiro de 2001 a 9 de Fevereiro de 2001;
15º – de 12 de Fevereiro de 2001 a 12 de Fevereiro de 2001;
16º – de 21 de Fevereiro de 2001 a 25 de Fevereiro de 2001;
17º – de 19 de Fevereiro de 2001 a 20 de Fevereiro de 2001;
18º – de 1 de Março de 2001 a 9 de Março de 2001;
– e) a autora celebrou com a Empresa-B, S.A., três contratos denominados “Contrato de Trabalho Temporário”, para exercer as funções de Técnica Postal e de Gestão (TPG) na Estação de Correios Calouste Gulbenkian da ré Empresa-A, sita na Avenida Calouste Gulbenkian, n.º ..., Funchal, relativos aos seguintes períodos:
1º – de 29 de Março de 2001 a 29 de Março de 2001;
2º – de 30 de Março de 2001 a 30 de Março de 2001;
3º – de 2 de Abril de 2001 a 10 de Abril de 2001;
– f) com data de 2 de Maio de 2001, a autora assinou um documento intitulado “Contrato de Trabalho a Termo Certo” com a ré Empresa-A, pelo período de 192 dias, com início em 2 de Maio de 2001, para desempenhar as funções de: atendimento, promoção, venda e assistência pós-venda e tratamento, manual ou mecanizado, das correspondências, efectuar balanços, auditorias, estudos de redimensionamento de giros, controlo e guarda de valores, bem como todo o tipo de tarefas de natureza técnico-administrativa inerentes às actividades comerciais, operacionais, de apoio e controlo de qualidade, desempenhar tarefas de apoio à organização, racionalização e implantação das redes comercial, distribuição, tratamento e transporte, poder assumir a responsabilidade de coordenação de equipas de trabalho e participar em acções de formação na Estação de Correio de Zarco;
– g) a autora celebrou com a Empresa-B, S.A., setenta e dois contratos, denominados “Contrato de Trabalho Temporário”, para exercer as funções de Técnica Postal e de Gestão (TPG) em Estações de Correios da ré Empresa-A na Madeira (Calouste Gulbenkian – Funchal, DCM, Zarco Funchal, Monumental, Livramento, Estreito Câmara de Lobos, Ribeira Brava, São Gonçalo – Funchal, Nazaré, Penteada – Nazaré, Mercado, Camacha, Livramento/S. Gonçalo/Caniço), relativos aos seguintes períodos:
1º – de 15 de Janeiro de 2001 a 15 de Janeiro de 2001;
2º – de 16 de Janeiro de 2001 a 16 de Janeiro de 2001;
3º – de 21 de Janeiro de 2001 a 22 de Janeiro de 2001;
4º – de 23 de Janeiro de 2001 a 23 de Janeiro de 2001;
5º – de 26 de Janeiro de 2001 a 29 de Janeiro de 2001;
6º – de 30 de Janeiro de 2001 a 30 de Janeiro de 2001;
7º – de 3 de Dezembro de 2001 a 7 de Dezembro de 2001;
8º – de 11 de Dezembro de 2001 a 15 de Dezembro de 2001;
9º – de 3 de Janeiro de 2002 a 11 de Janeiro de 2002;
10º – de 14 de Janeiro de 2002 a 24 de Janeiro de 2002;
11º – de 25 de Janeiro de 2002 a 25 de Janeiro de 2002;
12º – de 28 de Janeiro de 2002 a 1 de Fevereiro de 2002;
13º – de 4 de Fevereiro de 2002 a 8 de Fevereiro de 2002;
14º – de 4 de Março de 2003 a 5 de Março de 2002;
15º – de 1 de Abril de 2002 a 5 de Abril de 2002;
16º – de 8 de Abril de 2002 a 12 de Abril de 2002;
17º – de 15 de Abril de 2002 a 19 de Abril de 2002;
18º – de 22 de Abril de 2002 a 23 de Abril de 2002;
19º – de 24 de Abril de 2002 a 24 de Abril de 2002;
20º – de 29 de Abril de 2002 a 7 de Abril de 2002;
21º – de 8 de Maio de 2002 a 10 de Maio de 2002;
22º – de 21 de Maio de 2002 a 21 de Maio de 2002;
23º – de 3 de Junho de 2002 a 11 de Junho de 2002;
24º – de 2 de Julho de 2002 a 8 de Julho de 2002;
25º – de 9 de Julho de 2002 a 10 de Julho de 2002;
26º – de 5 de Agosto de 2002 a 12 de Agosto de 2002;
27º – de 2 de Setembro de 2002 a 6 de Setembro de 2002;
28º – de 9 de Setembro de 2002 a 13 de Setembro de 2002;
29º – de 24 de Setembro de 2002 a 30 de Setembro de 2002;
30º – de 1 de Outubro de 2002 a 7 de Outubro de 2002;
31º – de 16 de Outubro de 2002 a 25 de Outubro de 2002;
33º – de 30 de Outubro de 2002 a 31 de Outubro de 2002;
34º – de 4 de Novembro de 2002 a 8 de Novembro de 2002;
35º – de 11 de Novembro de 2002 a 14 de Novembro de 2002;
36º – de 2 de Dezembro de 2002 a 12 de Dezembro de 2002;
37º – de 13 de Dezembro de 2002 a 20 de Dezembro de 2002;
38º – de 23 de Dezembro de 2002 a 23 de Dezembro de 2002;
39º – de 27 de Dezembro de 2002 a 2 de Janeiro de 2003;
40º – de 3 de Janeiro de 2003 a 10 de Janeiro de 2003;
41º – de 13 de Janeiro de 2003 a 17 de Janeiro de 2003;
42º – de 4 de Fevereiro de 2003 a 10 de Fevereiro de 2003;
43º – de 5 de Março de 2003 a 12 de Março de 2003;
44º – de 2 de Abril de 2003 a 8 de Abril de 2003;
45º – de 9 de Abril de 2003 a 11 de Abril de 2003;
46º – de 14 de Abril de 2003 a 16 de Abril de 2003;
47º – de 21 de Abril de 2003 a 24 de Abril de 2003;
48º – de 5 de Maio de 2003 a 9 de Maio de 2003;
49º – de 12 de Maio de 2003 a 16 de Maio de 2003;
50º – de 19 de Maio de 2003 a 23 de Maio de 2003;
51º – de 18 de Junho de 2003 a 20 de Junho de 2003;
52º – de 2 de Julho de 2003 a 2 de Julho de 2003;
53º – de 3 de Julho de 2003 a 8 de Julho de 2003;
54º – de 9 de Julho de 2003 a 18 de Julho de 2003;
55º – de 21 de Julho de 2003 a 23 de Julho de 2003;
56º – de 30 de Julho de 2003 a 13 de Agosto de 2003;
57º – de 14 de Agosto de 2003 a 14 de Agosto de 2003;
58º – de 20 de Agosto de 2003 a 20 de Agosto de 2003;
59º – de 22 de Agosto de 2003 a 22 de Agosto de 2003;
60º – de 1 de Setembro de 2003 a 5 de Setembro de 2003;
61º – de 15 de Setembro de 2003 a 19 de Setembro de 2003;
62º – de 29 de Setembro de 2003 a 30 de Setembro de 2003;
63º – de 1 de Outubro de 2003 a 3 de Outubro de 2003;
64º – de 6 de Outubro de 2003 a 7 de Outubro de 2003;
65º – de 9 de Outubro de 2003 a 10 de Outubro de 2003;
66º – de 13 de Outubro de 2003 a 17 de Outubro de 2003;
67º – de 22 de Outubro de 2003 a 24 de Outubro de 2003;
68º – de 30 de Outubro de 2003 a 7 de Novembro de 2003;
69º – de 31 de Março de 2004 a 31 de Março de 2004;
70º – de 2 de Abril de 2004 a 7 de Abril de 2004;
71º – de 16 de Abril de 2004 a 16 de Abril de 2004;
72º – de 26 de Abril de 2004 a 30 de Abril de 2004;
– h) com data de 3 de Maio de 2004, a autora subscreveu um documento intitulado “Contrato de Trabalho a Termo Certo” com a ré Empresa-A, pelo período de 180 dias, com início em 3 de Maio de 2004 e termo em 29 de Outubro de 2004, para exercer as mesmas funções de TPG no Centro de Agrupamento de Reserva Contínua (CARC) sediado na Estação de Correios Zarco, sita na Avenida Zarco, n.º ..., Funchal;
– i) por carta com data de 12 de Outubro de 2004, a ré Empresa-A comunicou à autora a não renovação do seu contrato, que terminava em 29 de Outubro de 2004;
– j) a autora celebrou com a Empresa-B, S. A., dois outros contratos, denominados “Contrato de Trabalho Temporário”, para exercer as funções de Técnica Postal e de Gestão (TPG) em Estações de Correios da ré Empresa-A na Madeira (Câmara de Lobos e Penteada – Funchal), relativos aos seguintes períodos:
1º – de 3 de Janeiro de 2005 a 7 de Janeiro de 2005;
2º – de 3 de Fevereiro de 2005 a 7 de Fevereiro de 2005;
– k) do documento referido em a) consta, na cláusula 4ª, que o contrato era celebrado pelo prazo de 165 dias “a fim de suprir necessidades transitórias de serviço, por motivo de férias dos seguintes TPG`s: CC de 17.05.99 a 1.06.99, DD de 2.06.99 a 2.07.99, EE de 5.07.99 a 3.08.99, FF de 4.08.99 a 2.09.99, GG de 3.09.99 a 27.09.99, HH de 28.09.99 a 28.10.99”;
– l) do documento referido em c) consta, na cláusula 4ª, que o contrato era celebrado pelo prazo de 189 dias “a fim de suprir necessidades transitórias de serviço, por motivo de substituição de férias dos seguintes TPG´s: EC Calouste Gulbenkian, FF de 3.05. a 22.05.2000, CC de 23.05. a 29.05.2002 e de 1.08. a 25.08.2000; II de 30.05 a 1.06.2000, DD de 2.06 a 29.06.2000, JJ de 30.06 a 31.07.2000, KK de 28.08. a 26.09.2000, LL de 27.09 a 26.10.2000 e CARC, MM de 27.10 a 7.11.2000”;
– m) do documento referido em d), 1º, consta, na alínea 6), como justificação do contrato temporário, a substituição de trabalhador(a), ausente por motivo de doença, NN;
– n) do documento referido em d), 2º, consta, na alínea 6), como justificação do contrato temporário, a substituição de trabalhador(a), ausente por motivo de doença, OO;
– o) dos documentos referidos em d), 3º a 6º, 8º, 9º, 13º, 14º e 16º a 18º, consta, na alínea 6), como justificação do(s) contrato(s) temporário(s), o acréscimo temporário ou imprevisto de actividade (motivado por aumento de tráfego);
– p) dos documentos referidos em d), 7º, 10º a 12º e 15º consta(m), na alínea 6), como justificaç(ões) do(s) contrato(s) temporário(s), respectivamente, a substituição de trabalhador(a), ausente por motivo de assistência familiar, a TPG PP, a substituição de trabalhador ausente por motivos de TPG´s efectivos, a substituição de trabalhador ausente por motivo de formação, a substituição de trabalhador(a), ausente por motivo de doença de um familiar, a TPG PP;
– q) do documento referido em f) consta, na cláusula 4ª, que o contrato era celebrado pelo prazo de 192 dias, (...) “a fim de suprir necessidades transitórias de serviço, substituir férias das TPG´s: QQ de 2.05 a 24.05; RR de 25.05 a 31.05 e de 17.07 a 1.08; SS de 1.06 a 13.06; TT de 15.06 a 16.07; UU de 2.08 a 4.09; VV de 5.09 a 4.10; XX de 8.10 a 31.10; ZZ (Assl) de 2.11 a 9.11”;
– r) dos documentos referidos em e), 1º e 3º, consta, na cláusula n.º 1, que “O recurso é fundamentado, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do art. 9º da Lei n.º 146/99, de 1.09, que se justifica por: acréscimo temporário de tráfego”;
– s) do documento referido em e), 2º, consta, na cláusula n.º 1, que “O recurso é fundamentado, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do art. 9º da Lei n.º 146/99, de 1.09, que se justifica por: baixa médica da Sra. D. HH”;
– t) dos documentos referidos em g), 1º a 4º, 5º, 6º, 8º, 10º a 12º, 14º, 16º a 20º, 22º, 23º, 28º, 29º, 32º, 33º, 38º, 39º, 45º a 51º, 54º a 63º, 65º a 69º e 72º, consta, nas respectivas cláusulas n.º 1, que “O recurso é fundamentado, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do art. 9º da Lei n.º 146/99, de 01/09, que se justifica por: substituição (...) da TPG (...)”, referindo-se o nome dos trabalhadores substituídos, ausentes em razão de formação euro, doença, exames médicos, férias, etc.;
– u) dos documentos referidos em g), 7º, 9º, 13º, 15º, 21º, 24º a 27º, 30º, 31º, 34º a 37º, 40º a 44º, 52º, 53º, 64º, 70º e 71º, consta, nas respectivas cláusulas n.º 1, que “O recurso é fundamentado, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do art. 9º da Lei n.º 146/99, de 01/09, que se justifica por: acréscimo temporário de tráfego (pagamento de vales);
– v) do documento referido em h) consta, na cláusula 4ª, que o contrato era celebrado pelo prazo de 180 dias, “a fim de suprir necessidades transitórias de serviço, por motivo de substituição dos seguintes trabalhadores TPG´s, na situação de férias: AA', de 3.05.2004 a 31.05.2004, BB', de 1.06.2004 a 30.06.2004, PP de 1.07.2004 a 30.07.2004, CC' de 2.08.2004 a 31.08.2004, DD', de 1.09.2004 a 30.09.2004 e OO de 1.10.2004 a 29.10.2004”;
– w) dos documentos referidos em j), 1º e 2º, consta, na cláusula 1, que o “O recurso é fundamentado, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do art. 9º da Lei n.º 146/99 de 1.09, que se justifica por: acréscimo temporário de tráfego”;
– x) a autora prestou serviço de TPG à ré Empresa-A, S.A., desde 17 de Maio de 1999 a 7 de Fevereiro de 2005, nos períodos mencionados nos contratos referidos em a) a h) e j);
– y) durante o tempo em que vigoraram os contratos referidos em a) a h) e j), a autora trabalhou nas instalações da ré Empresa-A neles mencionadas, utilizando material e utensílios de trabalho a esta última pertencentes;
– z) o trabalho da autora foi sempre dirigido e fiscalizado pela ré Empresa-A;
– aa) ultimamente, a autora auferia a remuneração de base mensal de € 601,10, acrescida de subsídio de refeição por cada dia útil de trabalho prestado no montante de € 8,15;
– bb) a autora é sócia do SNTCT – Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações;
– cc) antes da cessação do contrato da autora, em 7 de Fevereiro de 2005, não teve lugar qualquer processo disciplinar;
– dd) a ré Empresa-B é uma empresa de trabalho temporário, devidamente autorizada a exercer a actividade de trabalho temporário, conforme alvará n.º 1 emitido pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional com data de 27.07.1990;
– ee) a ré Empresa-B aceitou celebrar os contratos de trabalho temporário referidos em e), g) e j) convencida de que os fundamentos para a contratação que lhe foram comunicados pela ré Empresa-A eram verdadeiros e correspondiam a uma necessidade temporária e transitória dos serviços destes;
– ff) quer durante a execução dos contratos de trabalho temporário, quer após o termo dos mesmos, nunca a autora apresentou à ré Empresa-B qualquer reclamação sobre o teor dos mesmos;
– gg) na sequência da celebração dos contratos de trabalho referidos em a) a c), f) e h) a autora foi desempenhar as referidas funções com vista a, efectivamente, substituir os trabalhadores em férias conforme aí referido;
– hh) o período preferencial para gozo de férias dos trabalhadores da ré Empresa-A decorre entre Maio e Novembro de cada ano;
– ii) para além das situações referidas em gg) supra, a autora foi contratada para desempenhar as funções de Técnica Postal e de Gestão, em situações de substituição de trabalhadores ausentes e de acréscimo de serviço, sucedendo que ao longo dos períodos relativos aos diversos contratos celebrados o acréscimo de serviço verificava-se de modo repetitivo em todos os inícios de mês do ano;
– jj) a ré Empresa-A é uma empresa de comunicações com o objecto social de distribuição de correspondência, sujeita às oscilações da procura e acréscimo de tráfego, nomeadamente em determinadas épocas do ano, como a época natalícia, estando a sua actividade sujeita a acréscimos temporários e picos de fluxo coincidentes com determinadas alturas do mês (pagamento de pensões, pagamento de impostos, rendimento mínimo, etc.);
– kk) no dia 7de Fevereiro de 2005 a autora deixou de prestar serviço para a ré (Empresa-A) até Maio de 2005.


2. A decisão impugnada fundou o respectivo juízo com as seguintes considerações: –

“(…)
Cumpre apreciar em primeiro lugar o recurso interposto pela Autora (vide art 710º do CPC).
Segundo a apelante foi sujeita a um único contrato de trabalho com início em 17 de Maio de 1999 e termo em 7 de Fevereiro de 2005, não sendo razoável qualificar como contratos individuais os descritos na matéria de facto, sendo certo que sempre exerceu as mesmas funções sob as ordens e instruções dos Empresa-A.
Daí que – tendo em conta o disposto no art 41º-A do DL nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro (na redacção introduzida pelo DL nº 18/2001, de 3 de Julho), e art 132º do CT – sustente a existência de um único contrato.
Assim, entende que improcede a excepção de prescrição.
Segundo o art. 41º-A do DL nº 64-A/89,de 27 de Fevereiro (na redacção introduzida pelo DL nº 18/2001, de 3 de Julho):
‘1 – A celebração sucessiva e ou intervalada de contratos a termo entre as mesmas partes, para o exercício das mesmas funções ou para satisfação das mesmas necessidades do empregador determina a conversão automática da relação jurídica em contrato sem termo.
2 – Exceptua-se do número anterior a contratação a termo com fundamento nas alíneas c) e d) do nº 1º do artigo 41º.
3 – Sem prejuízo do disposto no artigo 5º, é nulo e de nenhum efeito o contrato de trabalho a termo que seja celebrado posteriormente à aquisição pelo trabalhador da qualidade de trabalhador permanente’.
O art 132º do CT (que entrou em vigor em 1 de Dezembro de 2003 – vide nº 1º do art 3º da Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto) regula:
‘1 – A cessação, por motivo não imputável ao trabalhador, de contrato de trabalho a termo impede a nova admissão a termo e para o mesmo posto de trabalho, antes de decorrido um período de tempo equivalente a um terço da duração do contrato, incluindo as suas renovações.
2 – O disposto no número anterior não é aplicável nos seguintes casos:
a) Nova ausência do trabalhador substituído, quando o contrato de trabalho a termo tenha sido celebrado para a sua substituição;
b) Acréscimos excepcionais da actividade da empresa, após a cessação do contrato;
c) Actividades sazonais;
d) Trabalhador anteriormente contratado ao abrigo do regime aplicável à contratação de trabalhadores à procura de primeiro emprego, sem prejuízo do disposto nos nºs 1º e 2º do art 139º.
3 – Considera-se sem termo o contrato celebrado entre as mesmas partes em violação do disposto no nº 1º, contando para a antiguidade do trabalhador todo o tempo de trabalho prestado para o empregador em cumprimentos dos sucessivos contratos’.
In casu, analisada a matéria provada constata-se que:
– em 17 de Maio de 1999, 29 de Outubro de 1999 e 3 de Maio de 2000 (vide fls 13 a 15), a Autora e os Empresa-A celebraram três contratos de trabalho a termo, sendo certo que o último cessou em 7 de Novembro de 2000 (vide 1 a 3 e 12 da matéria de facto).
Mais se constata que a Autora e a Empresa-C e a Empresa-B – ambas empresas de trabalho temporário – celebraram ‘contratos de trabalho temporário’ a partir de 8 de Novembro de 2000 até 10 de Abril de 2001.
Em 2 de Maio 2001, a Autora celebrou com os Empresa-A outro contrato de trabalho a termo que cessou em 10 de Novembro de 2001 (ponto 6).
Após esta data a Autora celebrou contratos de trabalho temporário com empresa de trabalho temporário, sendo que em 3 de Maio de 2004 celebra novo contrato de trabalho a termo com os Empresa-A por um período de 180 dias que terminou em 29 de Outubro de 2004 (ponto 8).
Em 3 de Janeiro e 3 de Fevereiro de 2005, voltaram a ser celebrados contratos de trabalho temporário com a Empresa-B empresa de trabalho temporário (10).
**
É evidente que os contratos celebrados entre a Autora e os Empresa-A configuram contratos de trabalho a termo.
Coisa distinta são os contratos outorgados entre a trabalhadora e as empresas de trabalho temporário.
Os contratos celebrados entre a Autora e a Empresa-C (Portugal) – Trabalho Temporário, S. A, bem como entre a primeira e a Empresa-B, S. A (que são as empresas de trabalho temporário) – são contratos para a prestação de trabalho temporário – sendo que a Ré Empresa-A era a respectiva utilizadora.
Cumpre a tal título salientar que ‘entre nós, o trabalho temporário foi admitido e regulado em 1989, pelo DL nº 358/89, de 17 de Outubro (LTT). Este diploma, que foi posteriormente alterado pela Lei nº 39/96, de 31 de Agosto (art 1º), e pela Lei nº 146/99, de 1 de Setembro, está ainda em vigor pelo que se impõe a sua conjugação com o Código do Trabalho, entretanto aprovado’ – Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, Almedina, pág 264.
A prestação de trabalho temporário ‘decorre da natureza especifica do trabalho temporário que pressupõe um vínculo jurídico tripartido.
Este vínculo é instituído por dois contratos distintos, que a lei regula separadamente, mas cuja relação de interdependência permite qualificar como uma situação de união funcional de contratos:
i) O contrato de utilização de trabalho temporário: é o acordo celebrado entre a empresa de trabalho temporário e a empresa utilizadora, com vista ao fornecimento de trabalhadores temporários pela primeira à segunda (art 2º e art s 9º ss da LTT); trata-se de um contrato de prestação de serviço;
ii) O contrato para a prestação de trabalho temporário: é o contrato de trabalho celebrado entre a empresa de trabalho temporário e o trabalhador temporário com vista à prestação de trabalho temporário pelo primeiro para uma ou mais empresas utilizadoras (art 2º d) da LTT); pode ser celebrado por tempo indeterminado ou a título temporário (art 17º nº 1 da LTT)’ – Maria Rosário Ramalho, ob cit, pág 271.
Tal como refere Pedro Romano Martinez ‘no trabalho temporário a relação laboral estabelece-se entre a ETT e o trabalhador, mas o poder de direcção é, por delegação, atribu[í]do ao utilizador (art 20º nº 1º LTTT), cabendo o poder disciplinar à ETT (art 20º nº 6º LTTT); a ETT é, assim, o empregador formal, sendo o utilizador o empregador real’ – Direito do Trabalho, IDT, pág 638.
Constata-se, assim, que no nosso ordenamento jurídico, tal como sucede no do país vizinho, não existe contrato de trabalho entre a empresa utilizadora e o trabalhador cedido, embora isso não seja impeditivo que entre ambos existam certos direitos e deveres derivados da relação mútua criada por força da lei (vide Alfredo Montoya Melgar, Derecho del trabajo, 27ª edição, pág 409).
Temos, pois, que não se pode considerar, sem mais, para efeitos de aplicação quer do disposto no art 41º-A do RJCCT quer do art 132º do CT que desde 17 de Maio de 1999 até 7 de Fevereiro de 2005 estamos perante contratos celebrados sucessiva ou intervaladamente entre as mesmas partes, nomeadamente entre a Autora e os Empresa-A como a primeira sustenta.
E nem se argumente com o disposto no nº 9[ ] do art 20º do DL nº 358/89, de 17 de Outubro, visto que mesmo dando de barato a aplicabilidade do disposto no art 41º-A do RJCCT ao trabalho temporário ainda assim entre 17 de Maio de 1999 até 7 de Fevereiro de 2005 não estamos perante contratos celebrados sucessiva ou intervaladamente entre as mesmas partes.
Argumentar-se-á que o empregador real sempre foi os Empresa-A.
Porém, o art 41º-A do RJCCT respeita ao outorgante de contrato escrito e não ao destinatário final do trabalho.
Não se afigura, pois, que, ao abrigo da supra citada norma, se deva considerar que a Autora é trabalhadora dos Empresa-A desde 17 de Maio de 1999.
E o mesmo dirá em relação à Empresa-B desde 29 de Março de 2001.

Mas será que se deve considerar que a não aplicação do regime decorrente da celebração sucessiva ou intervalada às situações de contratos de trabalho temporário viola os princípios da segurança no emprego e da igualdade consagrados nos artigos 53º e 13º da CRP?
Ou ainda que a celebração abusiva de cento e um contratos de trabalho no período em causa atenta gravemente contra a dignidade humana trave mestra da ‘Constituição do Trabalho’ e do Estado de Direito Democrático (artigos 1º e 2º da CRP)?
No tocante à violação do princípio da igualdade não se vislumbra que tenha sido arguida qualquer outra situação concreta que permita considerar violado tal princípio.
Segundo José João Abrantes o direito fundamental dos trabalhadores à segurança do emprego, consagrado no art 53º da Constituição, não se esgota na proibição dos despedimentos sem justa causa, antes impregna todo o regime do contrato de trabalho, designadamente o da sua cessação.
Um seu corolário é o princípio da indeterminação da duração do contrato de trabalho: a aposição de termo resolutivo ao contrato de trabalho, precisamente porque conflitua com aquela garantia constitucional só será, em princípio, admissível em situações excepcionais, em que a capacidade ou a necessidade de manter o posto de trabalho surge como provisória ou incerta e em que, por essa razão, não seria justo que se impusesse ao empregador uma vinculação de carácter permanente’ – Contrato de trabalho a termo, Estudos do IDT, Volume III, pág 158/159.
A questão atinente à violação do princípio da segurança do emprego suscitada pela recorrente mostra-se relacionada com a questão da inconstitucionalidade material do trabalho temporário.
Para Maria Regina Gomes Redinha ‘sendo a transitoriedade e a intermitência caracteres dominantes da relação de trabalho temporário, que o regime jurídico configura como espécie de contrato a termo, a situação jurídico laboral do trabalhador traduz-se, irremediavelmente, na negação da segurança e da estabilidade no emprego’.
Daí que sustente ‘que o acolhimento do trabalho temporário não é passível de ser entendido de forma incondicional e sem causa proporcionalmente justificativa, isto é, só se haverá tolerado dentro dos limites em que a excepcionalidade e a objectividade das necessidades económicas que preenche não subvertam os fundamentos da ordem constitucional nem deneguem ao trabalhador o reconhecimento da sua qualidade de sujeito dos direitos, liberdades e garantias consagrados no capítulo III, do título II da Lei Fundamental’ – A Relação Laboral Fragmentada, BFC, pág 209.
Ora será que se possuem elementos no sentido da verificação dessa subversão no caso concreto?
Analisada a globalidade dos contratos celebrados pela Autora com as Rés e ainda com a Empresa-C constata-se que estamos perante um período temporal de mais de cinco anos, sendo certo que nalguns meses o trabalho foi prestado apenas nalguns dias (vg: de 1.3.01 a 9.3.2001, de 4.2.02 a 8.2.02, de 4.3.02 a 5.3.02, de 8.5.02 a 10.5.02 e em 21.5.02, em 3.6.02, em 2 e 7 de Julho de 2002, de 5.8.02 a 12.8.02, de 4.2.03 a 10.2.03, de 5.3.03 a 12.3.03 e de 18.6.03 a 20.6.03).
Por outro lado, no aludido lapso temporal chegou a haver um interregno de quase cinco meses (de 8 de Novembro de 2003 a 31 de Março de 2004) e um outro de cerca de dois (de 29 de Outubro de 2004 a 3 de Janeiro de 2005) na prestação de trabalho, sendo certo que sempre incumbia à Autora o ónus da prova de prestação de trabalho contínuo durante o mesmo, o que não logrou fazer.
Assim, afigura-se não ser sustentável que a interpretação feita da norma em apreço seja violadora dos supra citados princípios.
Cabe agora referir que ainda que se admitisse que por aplicação do disposto no art 41º-A do RJCCT entre 17 de Maio de 1999 e 7 de Novembro de 2003 existiu um único contrato de trabalho entre os Empresa-A e a Autora os eventuais direitos resultantes do mesmo sempre tinham que se considerar prescritos, visto que não resulta da matéria assente que se verifique a situação contemplada na norma (a qual refere celebração ‘intervalada de contratos a termo entre as mesmas partes, para o exercício das mesmas funções ou para satisfação das mesmas necessidades do empregador’).
Embora a norma não concretize intervalos temporais mínimos nem máximos, afigura-se que períodos de cinco e dois meses excedem a respectiva previsão, sob pena de se admitir que os intervalos possam ser de anos…
Ora é evidente que não foram essas situações que o legislador quis contemplar, mas antes aquelas em que o intervalo temporal (necessariamente mais curto) é utilizado como uma forma de iludir a lei, ocultando situações de continuidade.
Estas não se compadecem com intervalos de meses.
Por outro lado, a norma em questão não obstaculiza nem permite contornar a aplicação do disposto no art 381º do CT.
Improcedem, pois, as 8ª e 9ª conclusões do recurso.

Igualmente se afigura que nada há a imputar à decisão recorrida no tocante à prescrição.
Tal como se refere na decisão recorrida ‘entre 17.05.1999 e 3.05.2000 foram celebrados três contratos de trabalho a termo sendo que o último cessou em 7.11.2000 (pontos 1 a 3 e 12 da matéria de facto).
Após isso a A. celebrou diversos contratos de trabalho temporário com empresas de trabalho temporário a partir de 8.11.2000 até 10.04.2001.
Posteriormente, em 2.05.2001, volta a celebrar com a ré um novo contrato de trabalho a termo, o qual cessou em 10.11.2001 (ponto 6).
Após esta data celebra novamente diversos contratos de trabalho temporário com empresa de trabalho temporário.
Em 3.05.2004 celebra novo contrato de trabalho a termo com a ré Empresa-A pelo período de 180 dias que cessa em 29.10.2004 (ponto 8)’.
Em 3 de Janeiro de 2005 e 3 de Fevereiro do mesmo ano, a Autora e a Empresa-B celebraram dois contratos de trabalho temporário (10 e fls 115 e 116 dos autos).
O art. 381º do CT preceitua que:
‘1 – Todos os créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação pertencentes ao empregador ou ao trabalhador, extinguem-se por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
2 – Os créditos resultantes da indemnização por falta do gozo de férias, pela aplicação de sanções abusivas ou pela realização de trabalho suplementar, vencidos há mais de cinco anos, só podem, todavia, ser provados por documento idóneo’.
Este preceito corresponde ao anterior art 38º da LCT.
A norma em apreço estabelece um prazo especial para a prescrição dos créditos resultantes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, sendo certo que a prescrição não corre enquanto vigorar a relação laboral.
O regime em apreço funda-se na subordinação jurídica do trabalhador em relação à entidade empregadora, resultante do própria natureza do contrato de trabalho, a qual no decurso do mesmo é susceptível de o inibir de fazer valer os seus direitos.
‘Assim, o que importa (para o início da contagem) é o momento da ruptura da relação de dependência, não o momento da cessação efectiva do vínculo jurídico, a qual, em virtude de decisão judicial que (por exemplo) declare ilícito o despedimento, pode até ser juridicamente neutralizada.
O momento decisivo é, por conseguinte, aquele em que a relação factual de trabalho cessa, ainda que posteriormente, o acto que lhe tenha posto termo venha a ser invalidado’ – Monteiro Fernandes Direito do Trabalho, 12ª edição, pág 481.
Assim, tal como referia Pedro Romano Martinez (Direito do Trabalho, IDT, Almedina, pág 557), embora referindo-se ao anterior art 38º da LCT, o prazo de um ano para a prescrição dos créditos laborais tem início no dia seguinte ao da cessação factual da relação laboral ‘independentemente da causa do acto que lhe deu causa (caducidade, revogação, despedimento ou rescisão)’.
Por outro lado, esse início é independente de ‘o acto jurídico que lhe deu causa ser lícito ou ilícito’ – vide Mário Pinto, Furtado Martins e Nunes Carvalho, Comentário às Leis de Trabalho, 11ª edição, pág 187.
Cumpre ainda referir que ‘o conceito de créditos laborais constantes desta norma é um conceito amplo, uma vez que se incluem aqui não apenas os créditos remuneratórios em sentido estrito, mas todos os créditos que resultem da celebração e da execução do contrato de trabalho, e ainda os decorrentes da violação do contrato e da sua cessação’ – Maria do Rosário Palma Ramalho, obra citada, pág 581.

O art. 323º do Código Civil regula:
‘1 – A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
2 – Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
3 – A anulação da citação ou notificação não impede o efeito interruptivo previsto nos anteriores.
4 – É equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do acto àquele contra quem o direito puder ser exercido’.
In casu, a presente acção deu entrada na secretaria judicial do Tribunal do Trabalho do Funchal em 12 de Setembro de 2005.
Assim, o prazo prescricional interrompeu-se em 17 de Setembro de 2005 nos termos do preceituado no nº 2º do artigo 323º do C. Civil.
Ora não se tendo por assente, como pretendia a recorrente, que entre 17 de Maio de 1999 e 7 de Fevereiro de 2005 existiu um único contrato de trabalho entre a Autora e qualquer um dos Réus, sendo certo que a interrupção do decurso do prazo prescricional ocorreu em 17.09.2005 cumpre concluir que os créditos emergentes dos contratos de trabalho referidos nos nºs 1 a 3 e 6 da matéria de facto se mostram prescritos.
No tocante aos contratos celebrados com a Ré Empresa-B, S. A, constata-se que:
– entre 29.03.2001 e 2.04.2001 foram celebrados três;
– entre 15.11.2001 e 26.04.2004 outorgaram setenta e dois contratos de trabalho temporário.
– em 3.01.2005 e 3.02.2005 celebraram mais dois contratos de trabalho temporário.
Assim, há que concluir que também os créditos emergentes dos contratos de trabalho temporários referidos em 5 e 7 estão prescritos.
Basta recordar que se provou que:
– em 30 de Outubro de 2003, a Autora celebrou com a Empresa-B um contrato de trabalho temporário com a duração de 9 dias com início nessa data e termo em 7 de Novembro de 2003 (vide fls 108);
– em 31 de Março de 2004, a Autora celebrou com a Empresa-B um contrato de trabalho temporário com a duração de 1 dia (vide fls 109);
– em 2 de Abril de 2004, a Autora celebrou com a Empresa-B um contrato de trabalho temporário com a duração de 6 dias (vide fls 110) que se manteve até ao dia 7 desse mês;
– em 16 de Abril de 2004, a Autora celebrou com a Empresa-B um contrato de trabalho temporário com a duração de 1 dia (vide fls 111);
– em 26 de Abril de 2004, a Autora celebrou com a Empresa-B um contrato de trabalho temporário com a duração de 5 dias (vide fls 112) que se manteve até ao dia 30 desse mês.
Em 3 de Maio de 2004, a Autora celebrou com s Empresa-A um contrato a termo pelo prazo de 180 dias que cessou em 29 de Outubro de 2004 (vide fls 113/114).
Mais se provou que em 3 de Janeiro de 2005, a Autora celebrou com a Empresa-B um contrato de trabalho temporário com a duração de 5 dias (vide fls 115) que se manteve até ao dia 7 desse mês.
Em 3 de Fevereiro de 2005, a Autora celebrou com a Empresa-B um contrato de trabalho temporário com a duração de 5 dias (vide fls 116) que se manteve até ao dia 7 desse mês.
Constata-se, assim, que não se provou que entre 8 de Novembro de 3003 e 30 de Março de 2004 – ou seja durante aproximadamente 5 meses – a Autora não manteve relacionamento laboral com qualquer das Rés.
E o mesmo se dirá nos períodos decorridos de 8/4/04 a 15/4/2004, de 17/4/04 a 25/4/04 e em 1 e 2 de Maio de 2004.
Assim, os únicos contratos em relação aos quais não se detecta que em 17 de Setembro de 2005 a prescrição tivesse operado são os referidos em 8 e 10.
É que com data de 3 de Maio de 2004, a A. subscreveu um documento intitulado ‘Contrato de Trabalho a Termo Certo’ com a Ré Empresa-A, pelo período de 180 dias, com início em 3.05.2004 e termo em 29.10.2004, para exercer as mesmas funções de TPG no Centro de Agrupamento de Reserva Contínua (CARC) sediado na Estação de Correios Zarco, sita na Avenida Zarco, n.º 9, Funchal, sendo que por carta com data de 12 de Outubro de 2004 a ré Empresa-A comunicou à A. a não renovação do seu contrato que termina em 29 de Outubro de 2004 (9).
Por outro lado, a A. celebrou com a ‘Empresa-B – Serviços de Recursos Humanos (E.T.T.), S. A.’ dois outros contratos denominados ‘Contrato de Trabalho Temporário’, para exercer as funções de Técnica Postal e de Gestão (TPG) em Estações de Correios da ré Empresa-A na Madeira (Câmara de Lobos e Penteada – Funchal), relativos aos seguintes períodos:
1º – de 3 de Janeiro de 2005 a 7 de Janeiro de 2005;
2º – de 3 de Fevereiro de 2005 a 7 de Fevereiro de 2005(10).
É evidente que os eventuais créditos relativos a qualquer destes contratos não se mostram prescritos.
Improcede, pois, sob tal perspectiva o recurso interposto pela Autora, sendo, por outro lado, evidente que operada tal prescrição se mostra prejudicada, por inútil, a apreciação de questões suscitadas que não respeitem aos contratos mencionados em 8 e 10.

A Autora no seu recurso questiona de forma implícita a validade do termo aposto no contrato de trabalho a termo que celebrou em 3 de Maio de 2004 com os Empresa-A, sendo que a tal título a decisão recorrida decidiu ‘que o motivo invocado integra-se no âmbito da alínea a) do n.º 2 do art. 129º do Código do Trabalho e está em consonância com a realidade verificada e comprovada em audiência’.
Todavia resulta da clª 4ª do acordo em apreço que foi celebrado, atento o disposto no nº 1º e nº 2 al a) do art 129º do CT, pelo prazo de 180 dias por se prever o mesmo como necessário a satisfazer as necessidades atinentes à substituição dos seguintes trabalhadores TPG´s na situação de férias:
‘AA' de 3.5.2004 a 31.5.2004;
BB' de 1.6.2004 a 30.6.2004;
PP de 1.7.04 a 30.07.2004;
CC' de 2.8.2004 a 31.8.2004;
DD' de 1.9.2004 a 30.9.2004;
e OO de 1.10.2004 até 29.10.2004.
Não se vislumbra, pois, motivo para questionar a validade da estipulação desse termo, sendo certo que ficou provado que na sequência da celebração desse contrato de trabalho a termo a Autora desempenhou as suas funções substituindo, efectivamente, os trabalhadores em férias (vide 33).
Mostra-se, pois, preenchida a situação prevista no art. 129º, n.º 2, a) do Código do Trabalho.

A Autora também invoca que os motivos justificativos dos contratos de trabalho temporário celebrados com a Empresa-B são insuficientes, vagos e falsos e que a sua cedência aos Empresa-A não respeitou os formalismos exigidos pelo DL nº 358/89, de 17 de Outubro, razão pela qual deve ser considerada vinculada à empresa utilizadora.
Invoca ainda que os Empresa-A foram os responsáveis pela indicação dos motivos e que a mesma tentou iludir as disposições legais que regulam os contratos sem termo, sendo certo que apenas essa empresa tem meios e estrutura organizativa para proceder à sua reintegração (vide conclusões nºs 3 a 7).
Em face do supra exposto na apreciação a efectuar apenas se terão em conta os acordos referidos em 10.
É evidente que a Autora celebrou com a ‘Empresa-B – Serviços de Recursos Humanos (E.T.T.), S. A’, dois contratos denominados ‘Contrato de Trabalho Temporário’, para exercer as funções de Técnica Postal e de Gestão (TPG) em Estações de Correios da ré Empresa-A na Madeira (Câmara de Lobos e Penteada – Funchal), relativos aos seguintes períodos:
1º – de 3 de Janeiro de 2005 a 7 de Janeiro de 2005;
2º – de 3 de Fevereiro de 2005 a 7 de Fevereiro de 2005 ( vide 10).
Nos termos do art 18º do DL nº 358/89, de 17 de Outubro (contrato de trabalho temporário) a celebração de contrato de trabalho temporário só é permitida nas situações previstas para celebração de contrato de utilização, sendo certo que estas se mostram estipuladas no art 9º do mesmo diploma encontrando-se entre elas o acréscimo temporário ou excepcional de actividade (al c) do nº 1º do art 9º).
O nº 5º do art 18º do DL nº 358/89, de 17 de Outubro, estabelece que ‘o trabalhador que seja cedido a um utilizador sem estar vinculado à empresa de trabalho temporário por contrato celebrado nos termos do nº 2º do art 17º ou por contrato de trabalho temporário considera-se vinculado àquela empresa mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado’.
Segundo o art 19º do DL nº 358/89, de 17 de Outubro:
‘1 – O contrato de trabalho deve conter as seguintes menções:
a)…
b) Indicação dos motivos que justificam a celebração do contrato, com menção concreta dos factos e circunstâncias que integram esses motivos;
h)…
2 – A falta da menção exigida na alínea b) do número anterior ou a inobservância de forma escrita têm a consequência prevista no nº 3º do art 42º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo DL nº 64-A/89, 27 de Fevereiro.
3 – …”.
Nos termos do nº 3º do art 42º do DL nº 64-A/87, de 27 de Fevereiro, considera-se sem termo aquele em que falte a redução a escrito, a assinatura das partes, o nome ou denominação, bem como as referências exigidas na alínea e) do nº 1º ou, simultaneamente, nas alíneas d) e f) do mesmo número’.
Analisados os autos constata-se que nos termos do ponto nº 1º de cada um dos contratos o recurso à respectiva celebração foi ‘fundamentado, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do art. 9º da Lei n.º 146/99 de 1.09, que se justifica por: acréscimo temporário de tráfego’ (vide 23 e fls 115/116).
Foi, pois, esse o motivo aposto nos contratos reduzidos a escrito para o recurso ao trabalho temporário.
A supra citada expressão afigura-se manifestamente insuficiente em face da exigência da lei, visto que não permite concretizar minimamente as circunstâncias específicas que justificaram o recurso àquele tipo de trabalho.
Acréscimo temporário de tráfego configura um conceito vago e indeterminado que impede o intérprete de determinar a realidade e de poder avaliar a realidade empírica que se mostra subjacente à contratação frustrando os objectivos que o legislador pretendeu atingir com o regime jurídico em causa.
Tal como sucede com as situações de indicação da razão justificativa do termo também neste caso a obrigatoriedade de indicação da razão justificativa da celebração do contrato de trabalho temporário visa prevenir eventuais divergências entre as partes, permitir o exercício da actividade fiscalizadora por parte das entidades responsáveis na área e permitir que ao trabalhador o devido esclarecimento sobre as razões que determinam a verificação daquele tipo de vínculo dando-lhe hipótese de aferir da sua veracidade e validade e de as discutir em juízo se for caso disso.
Daí que no documento escrito que titula o contrato de trabalho temporário devam ficar consignadas as razões justificativas da respectiva celebração, com menção concreta dos factos e circunstâncias que integram esses motivos.
Concorda-se, pois, com a decisão recorrida quando refere que ‘a aposição do fundamento do recurso ao trabalho temporário não se basta com uma justificação genérica carecendo, também aqui, de concretização de quais as razões que determinaram a contratação daquele trabalhador como trabalhador temporário.
A mera referência a ‘acréscimo temporário de tráfego’, sem qualquer outra especificação e sem que se possa complementá-la com o eventual recurso ao teor do contrato de utilização de trabalho temporário (que nem sequer se mostra junto aos autos), tem claramente uma natureza vaga e genérica que não permite descortinar qual o acréscimo, sua natureza, tempo de duração, etc, que justificou a contratação da A. nos períodos em causa.
Cabe, assim, concluir que a expressão acréscimo temporário de tráfego utilizada nos contratos (que equivale a uma quase integral reprodução da fórmula utilizada no artigo 9º do DL nº 358/89, de 17/10, ou seja ‘acréscimo temporário de actividade’) não satisfaz a exigência legal, desde logo, porque não permite efectuar o controlo dos motivos que justificam o recurso ao trabalho temporário.
A que acréscimo temporário se pretenderam as partes referir?
E qual o tráfego em causa?
A expressão utilizada não o permite saber, pelo que também não se pode nem deve agora proceder a tal concretização.
E nem se argumente com os trinta e sete contratos celebrados anteriormente com fundamento idêntico, visto que os mesmos padeciam de vício idêntico ao que é apontado aos agora em questão, sendo certo que não cabe no âmbito do presente recurso qualquer apreciação atinente aos mesmos os quais, pelos motivos anteriormente explanados, sempre se mostram abrangidos pela supra enunciada prescrição.
E não se esgrima com a profunda experiência anterior da Autora no tocante à verificação de picos de aumento de actividade nos serviços dos Empresa-A que sempre se verificava no início de cada mês.
A norma em questão refere a indicação no contrato dos motivos que justificam a celebração do contrato, com menção concreta dos factos e circunstâncias que os integram, e não conhecimento dos motivos por parte do outorgante trabalhador.
Entendimento diverso equivaleria a deixar entrar pela janela aquilo que o legislador pretendeu evitar que entrasse pela porta.
Ora tal como refere acórdão da Relação do Porto de 18 de Setembro de 2006 ‘nas hipóteses patológicas de falta de redução a escrito do contrato de utilização de trabalho temporário ou do contrato de trabalho temporário ou de falta de indicação do motivo do recurso a tal tipo de contratação, a consequência é sempre a mesma – contrato de trabalho sem termo – apenas faltando saber se o trabalhador vai ter como entidade empregadora, a ETT ou a EU. [Cfr. Maria Regina Gomes Redinha, in Empresas de trabalho temporário, Revista de Direito e Economia, Anos X/XI, 1984/1985, págs. 137 a 171, in A RELAÇÃO LABORAL FRAGMENTADA, ESTUDO SOBRE O TRABALHO TEMPORÁRIO, 1995 e in TRABALHO TEMPORÁRIO: APONTAMENTO SOBRE A REFORMA DO SEU REGIME JURÍDICO, ESTUDOS DO INSTITUTO DO DIREITO DO TRABALHO, VOLUME I, 2001, págs. 443 a 470, Paula Camanho, Miguel Cunha, Sofia Pais e Paulo Vilarinho, in Trabalho temporário, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, Ano XXXIV (VII da 2.ª Série), Janeiro-Setembro – 1992, N.ºs 1-2-3, págs. 171 a 257, António Monteiro Fernandes, in DIREITO DO TRABALHO, 12.ª EDIÇÃO, págs. 160 a 168, Pedro Romano Martinez, in DIREITO DO TRABALHO, 2.ª EDIÇÃO, págs. 653 a 661 e Guilherme Machado Dray, TRABALHO TEMPORÁRIO e Célia Afonso Reis, NOTAS SOBRE O TRABALHO TEMPORÁRIO, in ESTUDOS DO INSTITUTO DO DIREITO DO TRABALHO, V “ VOLUME IV, 2003, págs., respectivamente, 101 a 143 e 145 a 182]’ – doc: RP200609180612883 in www.dgsi.pt.
Ora no tocante à questão de saber se a entidade empregadora deve ser a ETT ou a EU perfilha-se a orientação propugnada por Maria Regina Gomes Redinha segundo a qual a: ‘omissão dos motivos que justificam a celebração do contrato de trabalho temporário que não possa ser suprida pela correspondente menção do contrato de utilização importa, igualmente, a conversão do contrato de trabalho num contrato sem termo, mas desde que o trabalhador preste efectivamente a s[u]a[ ] actividade à empresa utilizadora presumir-se-á a existência de um contrato de trabalho de duração indeterminada com o utilizador, como resulta, algo contraditoriamente, da conjunção do nº 2º do art 11º com o art 19º nº 2º.
Na realidade, a articulação das sanções para a omissão dos motivos legitimadores do recurso ao trabalho temporário nos contratos de utilização e de trabalho traduz-se num direito de opção do trabalhador entre a integração na ETT ou na empresa utilizadora’ – A Relação Laboral Fragmentada, pág 253.
Na situação em exame considera-se que foram omitidos os motivos que justificaram a celebração dos contratos de trabalho temporário, não se vislumbrando que tal omissão possa ser suprida através do recurso dos contratos de utilização.
Por outro lado, é manifesto que a Autora prestava a sua actividade à empresa utilizadora, sendo evidente em face do pedido formulado na acção que a mesma optou ab initio pela reintegração na empresa utilizadora (ou seja a Ré Empresa-A).
Procede, pois, embora de forma parcial, o recurso interposto pela Autora pelo que cumpre absolver a Ré Empresa-B, S. A., dos pedidos contra si deduzidos devendo em consequência declarar-se que a A. é trabalhadora por tempo indeterminado da Ré Empresa-A, S. A, desde 3 de Janeiro de 2005, bem como ilícito o despedimento da mesma por não ter sido precedido de processo disciplinar.
Há, assim, que condenar a Ré Empresa-A, S. A, a reintegrar a A. no seu posto de trabalho com as funções e antiguidade que teria se não tivesse ocorrido o despedimento.
(…)”


3. Numa situação detendo contornos semelhantes aos da ora em apreciação, teve já este Supremo Tribunal ocasião de se pronunciar.

Fê-lo por intermédio do Acórdão tirado em 6 de Dezembro de 2006 na Revista nº 2067/2006.

Em face de tal similitude de contornos, justifica-se que aqui se proceda a mui ampla transcrição do aludido aresto, a fim de, desta sorte, se permitir a exposição das razões jurídicas que conduziram à decisão nele tomada, bem como a envolvência fáctica do caso então analisado e que ditou o então decidido.

Escreveu-se nesse Acórdão de 6 de Dezembro de 2006: –

“(…)
4. Fundamentação de direito.
A questão a decidir é a de saber se o termo aposto no último contrato celebrado com a autora se pode considerar como inválido, e, independentemente da resposta a essa questão, quais as consequências que podem decorrer para a situação funcional da autora dos contratos a termo e contratos de trabalho temporário com cedência de utilização à ré que foram sendo sucessivamente celebrados com a autora no período que mediou entre 25 de Junho de 1997 e 2 de Janeiro de 2003.
Nos termos do artigo 41º da LCCT, na sua redacção originária, o contrato a termo só era admitido nos casos especificamente previstos nas diversas alíneas do seu n.º 1, e, designadamente, para substituição temporária de trabalhador que, por qualquer razão, se encontre impedido de prestar serviço ou em relação ao qual esteja pendente em juízo acção de apreciação da licitude do despedimento (alínea a), acréscimo temporário e excepcional de serviço (alínea b)) e contratação de trabalhadores à procura de primeiro emprego (alínea h)), estipulando o n.º 2 desse artigo que a celebração de contratos a termo fora desse condicionalismo importava a nulidade de estipulação do termo.
A Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, alterou a redacção do n.º 2 desse artigo e aditou os n.ºs 3 e 4, tendo vindo esclarecer, no que mais interessa considerar, que ‘a celebração de contratos a termo fora dos casos previstos no número anterior importa a nulidade da estipulação do termo, adquirindo o trabalhador o direito à qualidade de trabalhador permanente da empresa’.
Entretanto, a mesma Lei também aditou um artigo 41º-A, passando a consignar que ‘a celebração sucessiva e ou intervalada de contratos de trabalho a termo, entre as mesmas partes, para o exercício das mesmas funções ou para satisfação das mesmas necessidades do empregador determina a conversão automática da relação jurídica em contrato sem termo, exceptuando-se apenas as situações de contratação a termo com fundamento nas alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 41º, isto é, os casos em que a contratação sucessiva seja feita para a execução de actividades sazonais ou de uma tarefa ocasional ou de um serviço determinado precisamente definido e não duradouro.
Resulta ainda do artigo 42º da LCCT que o contrato de trabalho a termo deve ser reduzido a escrito e conter, entre o mais, a estipulação do prazo com indicação do motivo justificativo, o qual, por sua vez, como se depreende do artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto, só será atendível se forem devidamente concretizados os factos e as circunstâncias que o integram (artigo 42º, n.º 1, alínea e)). Como explicita ainda o n.º 3 desse artigo 42º, considera-se sem termo o contrato a que falte a redução a escrito, a assinatura das partes, o nome ou denominação, bem como as referências exigidas na alínea e) do n.º 1 desse artigo, isto é, a indicação do motivo justificativo da contratação.
No que respeita ao contrato de trabalho temporário, a sua celebração só é permitida nas situações previstas para a celebração do contrato de utilização (artigo 18º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro), e, por conseguinte, apenas nos casos enunciados no artigo 9º, n.º 1, desse diploma, e, designadamente, nos casos de acréscimo temporário ou excepcional de actividade.
Por outro lado, o contrato de trabalho temporário deve também conter, entre outras referências, a ‘indicação dos motivos que justificam a celebração do contrato, com menção concreta dos factos e circunstâncias que integram esses motivos’ (artigo 19º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro), sendo que a falta da menção exigida nesse dispositivo tem a consequência prevista no nº 3 do artigo 42º da LCCT, a que há pouco se fez referência (artigo 19º, n.º 2).
Temos, por conseguinte, que a falta de indicação dos motivos que justificam a celebração do contrato de trabalho temporário, com menção concreta dos factos e circunstâncias que integram esses motivos, acarreta que o contrato passe a considerar-se como sem termo, como preconiza o citado artigo 42º, n.º 3, da LCCT para a situação similar dos contratos celebrados a termo, ainda que relativamente aos contratos celebrados anteriormente à entrada em vigor das alterações introduzidas pela Lei n.º 149/99, de 1 de Setembro, essa insuficiência pudesse considerar-se suprida pela menção constante do contrato de utilização (cfr. redacção originária do artigo 19º, n.º 2).
No caso vertente, a situação factual é esquematicamente a seguinte.
A autora celebrou com a ré três contratos de trabalho a termo certo com início, respectivamente, em 25 de Junho de 1997, 26 de Setembro de 1997 e 3 de Novembro de 1997, e, posteriormente, outorgou treze sucessivos contratos de trabalho temporário com a ADECCO, no período que medeia entre 1 de Outubro de 1998 e 10 de Maio de 1999, para exercer funções a favor da ré. Mais tarde trabalhou para ré, mas, de novo, com contratos a termo certo, outorgados em 2 de Novembro de 1999 e 2 de Maio de 2000, a que se seguiram seis contratos de trabalho temporário em que figurava como empresa de trabalho temporário a Empresa-C (Portugal) – Trabalho Temporário, S. A. (6 de Novembro de 2000 a 1 de Março de 2001). Houve ainda dois contratos de trabalho temporário, desta feita outorgados com a Empresa-B – Serviços de Recursos Humanos (ETT), S. A., com datas de 29 de Março de 2001 e 4 de Abril de 2001, a que se seguiu um novo contrato a termo certo celebrado directamente com a ré (23 de Abril de 2001). A autora celebrou ainda com a Empresa-B quarenta sucessivos contratos de trabalho temporário para prestar temporariamente a sua actividade à ré, preenchendo o período de 31 de Outubro de 2001 a 27 de Dezembro de 2002, e só posteriormente ao termo do último contrato desta série é que outorgou um novo contrato a termo com a ré com início em 2 de Janeiro de 2003, pelo prazo de seis meses, findo o qual cessou a ligação laboral.
Compulsando a matéria de facto, verifica-se ainda que os contratos a termo celebrados em 25 de Junho de 1997, 26 de Setembro de 1997, 3 de Novembro de 1997, 2 de Maio de 2000 e 23 de Abril de 2001, se enquadram na previsão da alínea a) do n.º 1 do artigo 41º da LCCT e encontram-se plenamente justificados, porque indicam a situação concreta que motivou esse tipo de contratação, referenciando-se que se trata da substituição temporária de um determinado trabalhador, que é aí identificado, por virtude de uma circunstância que é também especificada no documento contratual – substituição de trabalhador por motivo de férias (n.ºs 14, 15, 16, 21 e 25). Por sua vez, em dois casos, o motivo indicado relaciona-se com a contratação de trabalhador à procura do primeiro emprego – contratos de 2 de Novembro de 1999 e de 2 de Janeiro de 2003 (n.ºs 20 e 29).
Por seu lado, em relação aos contratos de trabalho temporário, muitos deles encontram-se devidamente justificados, por referência a situações de necessidade de substituição de trabalhadores claramente identificadas (n.ºs 19, 23 e 27), mas diversos outros contêm uma motivação vaga que não pode considerar-se como suficiente para preencher o requisito a que se reporta o artigo 19º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro.
Na verdade, em muitos casos, os contratos contêm apenas a menção ‘acréscimo de tráfego’ ou ‘aumento de tráfego’, acrescido, por vezes, da referência à alínea c) do n.º 1 do artigo 9º Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro, pretendendo-se dessa forma justificar a necessidade do recurso ao contrato de trabalho temporário por acréscimo temporário ou excepcional de actividade (n.ºs 18, 22, 24 e 26). Nos contratos a que se refere o n.º 28 da matéria de facto apenas se menciona como motivo justificativo ‘acréscimo temporário de tráfego (pagamento de vales).
O ‘acréscimo temporário ou excepcional da actividade’ é justamente uma das condições indicadas na lei em que se admite a celebração do contrato de trabalho temporário (por efeito da remissão que o artigo 18º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 358/89 efectua para o regime do artigo 9º, n.º1, do mesmo diploma). No entanto, a empresa de trabalho temporário, em todas as situações agora descritas limita-se a utilizar a fórmula legal, sem concretizar minimamente os factos e circunstâncias que justificam o ‘acréscimo temporário ou excepcional da actividade’, sendo que a obrigatoriedade dessa especificação resulta directamente, como se observou, do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 19º daquele diploma.
A falta do motivo justificativo da contratação determina que o contrato de trabalho temporário se considere por tempo indeterminado, por força do que estabelece o artigo 19º, n.º 2, do citado Decreto-Lei n.º 358/89, que, como vimos, remete para no nº 3 do artigo 42º da LCCT (salvo no que concerne aos contratos a que se refere o n.º 18 da matéria de facto, anteriores à entrada em vigor da Lei n.º 149/99, e caso estes se encontrassem justificados através das menções constantes dos respectivos contratos de utilização).
No entanto, contrariamente ao que propugna a recorrente, essa consequência não se repercute directamente na relação jurídica titulada pelos contratos de utilização de trabalho temporário celebrados entre a empresa de trabalho temporário e a ré. É que, ao invés do que sucede na situação analisada no acórdão de 13 de Julho de 2005 (Processo 1173/05), que se encontra junto aos autos, os contratos de utilização de trabalho temporário não se encontram documentados nos autos nem são referenciados na matéria de facto dada como assente. E, por outro lado, ao Supremo Tribunal de Justiça, face aos limitados poderes de cognição de que dispõe, enquanto tribunal de revista, não compete extrair a presunção de que esses contratos, a terem sido efectivamente celebrados, foram justificados pela mesma forma vaga e genérica com que o tinham sido os contratos de trabalho temporário.
Não pode, portanto, concluir-se, dada a factualidade existente, que os contratos de utilização de trabalho temporário estão eles também feridos de invalidade, por falta de motivação, em termos de se considerar que se operou a conversão desses contratos em contratos sem termo.
4. Uma outra questão que tem de colocar-se é a de saber que consequência acarreta a celebração de contratos de trabalho temporário não justificados em relação aos ulteriores contratos a termo outorgados entre a autora e a ré, com fundamento na contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego.
O Supremo já decidiu que a nulidade da estipulação do termo, por falta de concretização do motivo justificativo de contratos de trabalho a termo, pode ser considerada para invalidar o ulterior contrato de trabalho a termo celebrado com fundamento na contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego. Isso porque o trabalhador anteriormente contratado a termo, por virtude da nulidade da estipulação do termo, adquiriu a qualidade de trabalhador permanente, tal como preconiza o artigo 42º, n.º 3, da LCCT, pelo que, não preenche já o requisito de trabalhador à procura de primeiro emprego quando, posteriormente, vem a ser contratado pelo mesmo empregador (acórdão de 12 de Janeiro de 2006, Processo n.º 3138/05).
No entanto, a situação não é equivalente quando os anteriores contratos a termo ou contratos de trabalho temporário, que possam ter sido convertidos em contratos por tempo indeterminado por virtude da nulidade da estipulação do termo, tenham sido celebrados, não pelo mesmo empregador que posteriormente contratou a mesma pessoa como trabalhador à procura de primeiro emprego, mas por uma terceira entidade.
Na verdade, reportando-nos ao caso concreto, a ré não poderia ter ignorado as condições em que celebrou com o mesmo trabalhador diversos contratos a termo, e não poderia eximir-se à responsabilidade que resulta da nulidade da estipulação do termo por eventualmente não ter indicado convenientemente os motivos da contratação. Mas essa responsabilidade já não lhe pode ser assacada quando se trate de contratos de trabalho temporário que, estando sujeitos ao mesmo regime de fundamentação, foram, todavia, celebrados entre o trabalhador e uma empresa de trabalho temporário.
De facto, pode suceder que tenham subsistido razões que justifiquem em concreto a utilização temporária, pela ré, de trabalhadores vinculados por contrato de trabalho temporário e que a empresa de trabalho temporário se tenha abstido de mencionar os factos e circunstâncias que integram os motivos para celebrar o contrato de trabalho temporário, optando por uma fórmula genérica que acarreta que esse contrato passe a ser tido como contrato por tempo indeterminado.
A ré é, todavia, alheia às vicissitudes do contrato de trabalho temporário, em que não interveio, pelo que a verificação dos requisitos do trabalhador à procura do primeiro emprego, no último contrato a termo que celebrou, terá de ser aferida em função dos elementos que a entidade empregadora dispunha no momento em que celebra o contrato.
(…)
5. A autora sustenta ainda que os contratos de trabalho a termo se converteram em contratos sem termo por terem sido celebrados sucessivamente para satisfação das mesmas necessidades da recorrida, fazendo apelo ao que se dispõe, quanto a esta matéria, no artigo 41º-A da LCCT.
Com efeito, este dispositivo, aditado pela Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, sob a epígrafe ‘Contratos sucessivos’, estabelece que ‘a celebração sucessiva e ou intervalada de contratos de trabalho a termo, entre as mesmas partes, para o exercício das mesmas funções ou para a satisfação das mesmas necessidades do empregador determina a conversão automática da relação jurídica em contrato sem termo’ (n.º 1), exceptuando apenas a contratação a termo com fundamento nas alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 41.º (n.º 2). Ainda nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, ‘é nulo e de nenhum efeito o contrato de trabalho a termo que seja celebrado posteriormente à aquisição pelo trabalhador da qualidade de trabalhador permanente’.
A primeira questão que se coloca, quando se pretenda determinar os efeitos jurídicos desta disposição relativamente à situação factual em presença é a da eficácia temporal desse novo preceito, o que nos reconduz a um problema de aplicação das leis no tempo.
Acresce que este Supremo teve já oportunidade de se pronunciar sobre esta temática, através dos acórdãos de 2 de Fevereiro e 18 de Outubro de 2006, em termos que mantêm plena validade e são de acolher.
Conforme se ponderou nesses arestos, a Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, que aditou o citado artigo 41.º-A da LCCT, não contém normas transitórias que delimitem a sua vigência quanto às relações jurídicas subsistentes à data da respectiva entrada em vigor, pelo que, para fixar a eficácia temporal desse diploma, há que recorrer aos critérios sobre aplicação da lei no tempo, enunciados no artigo 12.º do Código Civil. E de acordo com esses critérios, haverá de considerar-se que a lei só dispõe para o futuro, não tendo eficácia retroactiva, salvo se o legislador lhe atribuir essa eficácia. Por outro lado, por força do que dispõe a primeira parte do n.º 2 desse artigo, quando a lei nova regula os efeitos de certos factos, como expressão duma valoração dos factos que lhes deram origem, deve entender-se que só se aplica aos factos novos.
O n.º 1 do artigo 41.º-A da LCCT regula os efeitos da «celebração sucessiva e ou intervalada de contratos de trabalho a termo, entre as mesmas partes, para o exercício das mesmas funções ou para a satisfação das mesmas necessidades do empregador», determinando a conversão automática da relação jurídica assim configurada em contrato sem termo, o que traduz uma valoração dos factos que lhes deram origem, e, por conseguinte, só se aplica aos factos novos, isto é, às relações jurídicas constituídas após o início da sua vigência.
Ora, no caso vertente, as partes celebraram sete contratos de trabalho a termo, respectivamente, em 25 de Junho de 1997, 26 de Setembro de 1997, 3 de Novembro de 1997, 2 de Novembro de 1999, 2 de Maio de 2000, 23 de Abril de 2001 e 2 de Janeiro de 2003, pelo que só este último contrato é que foi celebrado após a entrada em vigor do n.º 1 do artigo 41.º-A da LCCT, que ocorreu em 2 de Agosto de 2001.
Não se verifica, por isso, uma celebração sucessiva e ou intervalada de contratos de trabalho a termo susceptível de integrar a previsão daquela norma e determinar a conversão automática da relação jurídica assim configurada em contrato sem termo.
6. A recorrente alega, todavia, que a contratação sucessiva através de contratos de trabalho a termo certo e contratos de trabalho temporário, durante um longo período de tempo, viola o princípio da segurança no emprego consignado no artigo 53º da CRP e atenta contra a dignidade da pessoa humana, segundo o princípio ínsito nos artigos 1º e 2º da CRP.
O direito à segurança no emprego, consagrado constitucionalmente como o primeiro dos direitos fundamentais dos trabalhadores (artigo 53º da CRP), constitui já uma expressão directa do direito ao trabalho, entendido como o direito de obter emprego ou exercer uma actividade profissional (artigo 58º da CRP), e, nesse sentido, é já, no âmbito da Constituição do Trabalho, uma manifestação do direito à vida e à dignidade da pessoa humana (GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista, Coimbra, pág. 287).
Por outro lado, o direito à segurança no emprego abrange, não apenas o direito a não ser despedido sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos, mas também todas as situações que se traduzam em precariedade da relação de trabalho. O empregador não poderá limitar-se a constituir relações de trabalho com prazos curtos, por forma a efectuar livremente despedimentos por via da não renovação dos contratos. Por isso o trabalho a termo, sendo por natureza precário, só é admissível quando ocorram razões que o justifiquem (Idem, pág. 289).
Por identidade de razão, pode entender-se que o direito à segurança no emprego obsta a que a entidade patronal possa manter indefinidamente o trabalhador numa situação de precariedade, mediante o recurso sucessivo a contratos a termo para o exercício das mesmas funções ou para a satisfação das mesmas necessidades de serviço. O legislador ordinário parece, aliás, ter sido sensível a este argumento ao efectuar através da Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, o aditamento do já referido artigo 41º-A à LCCT, pelo qual impôs a conversão automática da relação jurídica em contrato sem termo quando se verifique a celebração sucessiva ou intervalada de contratos a termo para o desempenho da mesma actividade.
No caso vertente, importa reter que, embora a autora se tenha encontrado ligada funcionalmente à ré desde 1997 e até 1 de Julho de 2003, data em que cessou o último contrato a termo celebrado entre as partes, apenas formalizou sete contratos a termo, sendo que todo o restante período de tempo, com pequenos lapsos temporais, se encontra coberto por contratos de trabalho temporário celebrados com empresas de trabalho temporário para cedência à ré na condição da entidade utilizadora.
Já se observou que vários dos contratos de trabalho temporário não se encontram suficientemente justificados, o que teria determinado que a autora tivesse adquirido a qualidade de trabalhador permanente da empresa de trabalho temporário, nos termos do citado artigo 19º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 358/89. No entanto, o reconhecimento jurisdicional desse direito apenas pode operar no âmbito da acção judicial que venha a ser interposta pela autora contra a empresa de trabalho temporário (que não é sequer parte no presente processo), sendo que a invalidade cometida na outorga daqueles contratos (e que eventualmente também resulte da celebração de contratos sucessivos) não se reflecte directamente na relação jurídica estabelecida entre a autora e a ré através dos correspondentes contratos de utilização de trabalho temporário.
A eventual violação do direito constitucional à segurança no trabalho terá, portanto, de ser aferida em função das normas que regulam a contratação a termo e por referência ao período relativamente ao qual a autora se manteve, por via desse tipo de contratação, numa situação de precariedade de emprego.
Neste momento, cabe recordar que alguns dos indicados contratos a termo foram celebrados para suprir necessidades transitórias do serviço, a que se reporta a alínea c) do n.º 1 do artigo 41º da LCCT (contratos de 25 de Junho de 1997, 26 de Setembro de 1997, 3 de Novembro de 1997, 2 de Maio de 2000 e 23 de Abril de 2001), enquanto que outros tiveram como fundamento a contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego, mencionado na alínea h) do mesmo preceito (2 de Novembro de 1999 e 2 de Janeiro de 2003).
A possibilidade de se recorrer a trabalho precário para fazer face a necessidades temporárias de trabalho ou aumentos anormais do volume de serviço da empresa parece não suscitar grandes dúvidas, do ponto de vista da sua conformação constitucional, já que se trata da situação típica em que se mostra relevantemente justificada a excepção ao princípio de que a relação de trabalho, em ordem ao direito à segurança no trabalho, deverá ser temporalmente indeterminada. A questão poderá ser mais controversa no que se refere à invocação de um motivo que tem a ver, não com dificuldades meramente conjunturais da empresa, mas com considerações de política de emprego, tal como sucede quando a contratação a termo é justificada ao abrigo da citada alínea h) do n.º 1 do artigo 41º da LCCT. E é justamente neste âmbito que se tem movido a jurisprudência do Tribunal Constitucional.
O acórdão n.º 581/95 do Tribunal Constitucional (publicado no Diário da República, n.º 18, I Série-A, de 22 de Janeiro de 1996), intervindo em sede de fiscalização abstracta, concluiu pela não inconstitucionalidade da norma do artigo 41.º, n.º 1, alínea h), da LCCT, partindo da ideia de que a excepcionalidade da contratação a termo, que o legislador quis salvaguardar como desiderato da garantia constitucional da segurança no emprego, se encontra concretizada, no plano legislativo, por duas ordens de considerações.
Por um lado, a lei faz depender a contratação a termo de um elenco taxativo de situações em que se considera justificável o recurso ao trabalho precário, sem pôr por isso em causa que a relação de trabalho temporalmente indeterminada é a regra.
Por outro lado, o legislador fez rodear a celebração de contratos a termo de um sistema de normas teleologicamente orientado que se destina a limitar o recurso a esse regime contratual: o contrato a termo é escrito (artigo 42.º, n.º 1) e deve indicar o seu ‘motivo justificativo’ ou, sendo celebrado a termo incerto, indicar “a actividade, tarefa ou obra cuja execução justifique a respectiva celebração (...)” (artigo 42.º, n.º 1, alínea e)); se o contrato a termo certo é sujeito a renovação, ‘então não poderá efectuar-se para além de duas vezes e a sua duração terá por limite três anos consecutivos’ (artigo 44.º, n.º 2); ‘até ao termo do contrato (a termo certo como a termo incerto), o trabalhador tem, em igualdade de condições, preferência na passagem ao quadro permanente, sempre que a entidade empregadora proceda a recrutamento externo para o exercício, com carácter permanente, de funções idênticas àquelas para que foi contratado’ (artigo 54.º, n.º 1).
Subsistem depois – acrescenta-se no acórdão – outros momentos normativos que concorrem para demover a entidade empregadora do recurso sistemático ao contrato a termo e que funcionam como garantias ad posteriori ou periféricas a favor da estabilidade no emprego. São elas: a atribuição ao trabalhador a uma compensação por caducidade do contrato a termo certo (artigo 46.º, n.º 3) e a termo incerto (artigo 50.º, n.º 4), e a proibição de contratar a termo, para o mesmo posto de trabalho, um novo trabalhador, nos três meses que decorrem sobre a cessação do trabalho a termo com outro trabalhador, quando a cessação a este não é imputável (artigo 46.º, n.º 4), e, finalmente, a atribuição de benefícios financeiros e contributivos às empresas em situações de contrato sem termo ou de conversão dos contratos a termo em contratos por tempo indeterminado (artigos 8.º e 9º do Decreto-Lei n.º 64-C/89, de 27 de Fevereiro).
O Tribunal Constitucional concluiu, à luz de todas as precedentes considerações, que às normas do artigo 41.º não pode reconhecer-se um ‘défice de constitucionalidade’ que porventura lhe adviesse de uma falta de apoio no sistema.
Reportando-se, por seu turno, à situação específica da contratação a termo com base no disposto na alínea h) do n.º 1 do artigo 41º da LCCT – aqui particularmente em foco –, acórdão n.º 581/95 sublinha que essa disposição tem uma lógica própria, no sentido de que ela radica numa ratio que tem em conta a qualidade dos trabalhadores-destinatários, e não propriamente a natureza do trabalho a prestar, com o que se terá pretendido estimular a celebração de contratos de trabalho pela convicção de inexistência de riscos para a entidade empregadora. Ou seja, no caso da norma do artigo 41.º, n.º 1, alínea h), o legislador optou por modelar o contrato de trabalho sobre uma ponderação em que se sopesa o inconveniente de limitar a relação laboral no tempo com a oportunidade que é dada a trabalhadores no desemprego de entrarem, ainda que em termos precários, no mercado do trabalho.
O acórdão conclui que aquela ponderação não é ilegítima se tivermos em conta que a garantia de segurança no emprego está em relação com a efectividade do direito ao trabalho (artigo 58.º da C.R.P.) e que é a própria Lei Fundamental que comete ao Estado a incumbência de realização de políticas de pleno emprego, em nome também da efectividade desse direito (artigo 58.º, n.º 3, alínea a), da C.R.P.), e, sobretudo, se se considerar, por referência à norma em análise, que a opção de alargamento dos casos de contratação a termo tem pressuposta uma ‘menos-valia’ da experiência profissional daqueles candidatos ao emprego.
Esta orientação foi, entretanto, sufragada pelos acórdãos n.ºs 207/2004, 210/2004, 267/2004 e 516/2004 (todos disponíveis em www.tribunalconstitucional. pt) e não há motivo para não ser adoptada, no presente caso, quando se verifica que a contratação a termo, por parte da ré, se manteve dentro dos limites consentidos pelo disposto no artigo 41º, n.º 1, da LCCT.
Deste modo, não é possível reconhecer, com fundamento em inconstitucionalidade, a nulidade da estipulação do termo em relação ao último contrato celebrado entre as partes em 2 de Janeiro de 2003, pelo que a ré não estava impedida de fazer cessar a relação laboral para o termo do respectivo prazo.
(…)”


4. No caso sub specie, os diversos contratos a termo celebrados entre a recorrida autora e a recorrente Empresa-A e, bem assim, os contratos de trabalho temporário celebrados entre a primeira e as empresas de trabalho temporário Empresa-C, S.A., e Empresa-B, S.A., encontram-se documentados nos autos, constando da matéria de facto assente as cláusulas apostas nos primeiros, que intentavam justificar os motivos da contratação a termo, e as menções exaradas nos segundos, também apostas ao jeito de justificação dos motivos da respectiva celebração.

O que, talqualmente sucedia na situação apreciada pelo Acórdão de 6 de Dezembro de 2006, não se encontra documentado são os contratos de utilização de trabalho temporário celebrados entre as empresas de trabalho temporário e a ré.

Como deflui da transcrição supra efectuada, naquele citado acórdão, este Supremo Tribunal concluiu, a dado passo, que, embora a falta do motivo da contratação determinasse que o contrato de trabalho temporário se considerasse por tempo indeterminado, por força do nº 2 do artº 19º do Decreto-Lei nº 358/89, de 17 de Outubro, que remetia para o nº 3 do artº 42º do Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual do Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de Trabalho a Termo aprovado pelo Decreto-Lei nº 64-A789, de 27 de Fevereiro, essa consequência não se repercutia directamente na relação jurídica titulada pelos contratos de utilização de trabalho temporário celebrados entre a empresa de trabalho temporário e a empresa utilizadora do trabalho; e isso porque, não se encontrando esses contratos documentados nos autos nem sendo eles referenciados na matéria de facto dada como assente, não se podia extrair, em face da factualidade então assente, que os contratos de utilização de trabalho temporário estavam, também eles, feridos de invalidade por falta de motivação.

E isso, realçou-se no mesmo acórdão, conduzia a uma decisão diversa da tomada no Acórdão de 13 de Julho de 2005, proferido na Revista nº 1173/2005 (o qual se encontra disponível em www.dsgi.pt sob o nº de documento SJ200507130011734), pois que, nos autos em que foi prolatada tal decisão, estavam documentados os contratos de utilização de trabalho temporário, pelo que, acrescenta-se agora, era possibilitada a aferição dos motivos que levaram especificamente ao negócio jurídico celebrado entre duas das partes da «relação tripartida» do trabalho temporário, justamente a empresa de trabalho temporário e o utilizador desse trabalho.

Ora, também aqui nos postamos em idêntica situação. E, não se lobrigando motivos para dissentir do decidido nesse particular no Acórdão de 6 de Dezembro de 2006, se concluirá de idêntico jeito, obviamente com referência aos contratos de trabalho temporário invocados pela autora e enunciados na matéria fáctica tida por demonstrada em que apenas se faz mera alusão a «acréscimo temporário ou imprevisto de actividade», «acréscimo temporário de tráfego» ou «acréscimo temporário de tráfego (pagamento de vales)», já que essas alusões são manifestamente insuficientes para uma densificação ou menção concreta dos factos e circunstâncias elencados no nº 1 do artº 41º da LCCT, e que, por via da Lei nº 38/96, de 31 de Agosto, se veio a interpretar autenticamente por sorte a que as indicações dos motivos justificativos da celebração do contrato (a termo) só serem atendíveis se se mencionassem concretamente os factos e circunstâncias integradores desses motivos.

5. O acórdão da Relação de Lisboa agora impugnado, entendeu, porém – após aferir da validade dos contratos de trabalho temporário celebrados entre a autora e as empresas de trabalho temporário, e concluindo pela não ocorrência dessa validade em relação a muitos deles (precisamente com base na falta de indicação concreta dos factos e circunstâncias integradores dos motivos da contratação da autora, já que, ao fim e aos resto, se limitaram praticamente a fazer uma mera menção da expressões utilizadas na lei) –, que a invalidade se havia de repercutir, não nas empresas de trabalho temporário (mais concretamente na Empresa-B, aliás como foi decidido na 1ª instância, em face de um dos pedidos formulados pela autora na petição inicial) – repercussão essa em termos de vir a ser entendido haver um contrato sem termo –, mas sim na ora recorrente Empresa-A.

Para tanto, o aresto recorrido, inter alia, socorreu-se do referido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 18 de Setembro de 2006 (disponível em www.dgsi.pt sob o nº de documento RP2006091806612883), no qual se citaram, por entre outros, os ensinamentos de Maria Regina Gomes Redinha em A Relação Laboral Fragmentada, Estudo sobre o Trabalho Temporário, e Trabalho Temporário: Apontamento sobre a Reforma do seu Regime Jurídico, in Volume I dos Estudos do Instituto do Direito do Trabalho, 2001.

É a essa postura que, na esteira do acórdão de que grande parte se encontra extractada, se não anui, e isso, como deflui do acima exposto, porque não disponibilizam os autos ou a matéria fáctica a eles trazida quaisquer elementos de onde se possa extrair o que foi mencionado nos contratos de utilização do trabalho temporário celebrados entre a Empresa-B e os Empresa-A.

Anote-se aqui, todavia, que a autora citada no acórdão do Tribunal da Relação do Porto, por seu turno citado pelo acórdão recorrido, refere que a “omissão dos motivos que justificam a celebração do contrato de trabalho temporário que não possa ser suprida pela correspondente menção do contrato de utilização, importa, igualmente, a conversão do contrato de trabalho num contrato sem termo, mas, desde que o trabalhador preste efectivamente a sua actividade à empresa utilizadora, presumir-se-á a existência de um contrato de trabalho de duração indeterminada com o utilizador, como resulta, algo contraditoriamente, da conjugação do n.º 2 do art. 11.º com o art.º 19.º, n.º 2” (negrito aposto agora).

E é justamente a falta de dados de facto tocantes aos contratos de utilização do trabalho temporário que levam ao juízo agora efectuado, no seguimento do que veio a suceder no Acórdão de 6 de Dezembro de 2006.

6. Por outro lado, no vertente recurso de revista – aliás tão só interposto pelos Empresa-A – não foi colocada a questão de dever ser operada a revogação do acórdão recorrido em termos de vir a subsistir a decisão tomada na 1ª instância.

Vem isto a propósito das considerações, ínsitas no Acórdão de 6 de Dezembro de 2006, no ponto em que nele é vincado que, tendo sido observado que vários dos contratos de trabalho temporários não se encontravam suficientemente justificados, o que teria determinado que a ali autora tivesse adquirido a qualidade de trabalhadora permanente da empresa de trabalho temporário, nos termos do artº 19º, nº 2, do Decreto-Lei n.º 358/89, o que era facto era que o reconhecimento jurisdicional desse direito apenas podia operar no âmbito da acção judicial que viesse a ser intentada pela autora contra a empresa de trabalho temporário que, então, nem sequer era parte no processo, sendo que a invalidade cometida na outorga daqueles contratos (e que eventualmente também resultasse da celebração de contratos sucessivos) não se reflectia directamente na relação jurídica estabelecida entre a autora e a ré através dos correspondentes contratos de utilização de trabalho temporário.

Ora, no processo de onde emergiu o presente recurso, a empresa de trabalho temporário Empresa-B foi também demandada, vindo até, como se viu, a ser condenada na 1ª instância a reconhecer que a autora era sua trabalhadora permanente, em virtude da invalidade dos contratos de trabalho firmados com esta.

Simplesmente, em face da apelação interposta da sentença tomada pela 1ª instância, essa decisão foi revogada pelo acórdão agora em crítica, não vindo, como se disse, impostada na revista a subsistência da decisão daquela primeira instância, sendo certo que, nesse ponto, poderia ter havido recurso subordinado por banda da autora.

7. Dar-se-á, também, nota do seguinte: –

Da matéria de facto tida por assente resulta que, após a entrada em vigor da Lei nº 18/2001, de 3 de Julho, ocorrida 30 dias após a sua publicação (cfr. seu artº 4º), celebrou a ré Empresa-A, em 3 de Maio de 2004 e com a autora, o contrato a termo certo, por cento e oitenta dias, sendo que os demais, a termo certo ou incerto, outorgados entre ambas são datados antes da ocorrência da vigência daquele diploma (reportamo-nos aos contratos de 19 de Maio de 1999, 29 de Outubro de 1999, 3 de Maio de 2000 e 2 de Maio de 2001).

Ora, de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, de que dá nota o Acórdão de 6 de Dezembro de 2006, não contendo aquela Lei nº 18/2001 normativos transitórios que delimitem a sua vigência quanto aos efeitos da nova regulação às relações jurídicas que subsistiam aquando da sua entrada em vigor, haverá, para se saber desses efeitos, que recorrer aos critérios de aplicação da lei no tempo constantes do artº 12º do Código Civil; e, assim, à míngua de normação consagradora de eficácia retroactiva, deverá entender-se que os efeitos da regulação daquela Lei só se poderão aplicar para o futuro.

Daí que o desencadeamento de efeitos do artº 41º-A (e, no que ora releva, do seu nº 1) introduzido na LCCT pela dita Lei, só possa ser aplicado às relações jurídicas constituídas após a entrada em vigor da Lei nº 18/2001.

Não tendo, pois, os contratos de 19 de Maio de 1999, 29 de Outubro de 1999, 3 de Maio de 2000 e 2 de Maio de 2001, sido celebrados no domínio da Lei nº 18/2001, não poderá cobrar âmbito de aplicação o citado artº 41º-A, já que, em tal domínio, apenas foi outorgado o contrato datado de 3 de Maio de 2004, não dando os autos qualquer notícia de outros contratos celebrados entre as mesmas partes – autora e ré Empresa-A – após a vigência de tal Lei.
III
Em face do que se deixa dito, concede-se a revista, em consequência absolvendo a recorrente Empresa-A, S.A., dos pedidos contra si formulados.

Custas pelas recorridas.

Lisboa, 17 de Outubro de 2007

Bravo Serra (Relator)
Mário Pereira
Sousa Peixoto