Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
09P0484
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: RAUL BORGES
Descritores: TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
DUPLA CONFORME
ADMISSÃO DO RECURSO
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
FACTOS GENÉRICOS
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
REGIME CONCRETAMENTE MAIS FAVORÁVEL
REABERTURA DA AUDIÊNCIA
IN DUBIO PRO REO
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
TRÁFICO DE MENOR GRAVIDADE
ILICITUDE CONSIDERAVELMENTE DIMINUÍDA
COMPARTICIPAÇÃO
CUMPLICIDADE
Nº do Documento: SJ200905270004843
Data do Acordão: 05/27/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário :

I - Numa situação em que:
- o primitivo acórdão da 1.ª instância, de 09-07-2007, foi declarado nulo por omissão de exame crítico da prova e substituído por outro, proferido em 13-05-2008, que, tal como o anterior, condenou as arguidas VR e MA, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º do DL 15/93, de 22-01, nas penas de 7 anos e de 7 anos e 6 meses de prisão, respectivamente;
- na sequência de novo recurso, foram aquelas penas reduzidas, por acórdão da Relação de 05-11-2008, para 5 anos e 5 meses e 5 anos e 4 meses, respectivamente;
é de aferir o direito ao recurso das arguidas em função do regime vigente ao tempo daquela primeira decisão da 1.ª instância.
II - Com efeito, de acordo com o art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP na redacção dada pela Lei 48/2007, de 29-08, em vigor desde 15-09-2007, só é possível o recurso de decisão confirmatória no caso de a pena aplicada ser superior a 8 anos de prisão. Ora, tendo as arguidas sido condenadas em penas de 5 anos e 5 meses e de 5 anos e 4 meses de prisão, é indubitável que não seriam admissíveis os recursos face à actual versão.
III - Todavia, face à redacção do mesmo preceito anterior à entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29-08, em que se referia pena aplicável e não pena aplicada, por no caso se estar perante crime punível com pena de prisão superior a 8 anos – em causa está a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, a que cabe a moldura penal abstracta de 4 a 12 anos de prisão – era admissível recurso do acórdão da Relação para o STJ.
IV - Aliás, este Supremo Tribunal, através do acórdão de uniformização n.º 4/2009, de 18-02 (Proc. n.º 1957/08 - 3.ª, DR I Série, n.º 55, de 19-03-2009), fixou jurisprudência no sentido de que «Nos termos dos artigos 432.º, n.º 1, alínea b), e 400.º, n.º 1, alínea f) do CPP, na redacção anterior à entrada em vigor da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, é recorrível o acórdão condenatório proferido, em recurso, pela relação, após a entrada em vigor da referida lei, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão superior a oito anos, que confirme decisão de 1.ª instância anterior àquela data».
V - Como vem sendo afirmado pela jurisprudência dominante do STJ, as imputações genéricas, designadamente no domínio do tráfico de estupefacientes, sem qualquer especificação das condutas em que se concretizou o aludido comércio e do tempo e lugar em que tal aconteceu, por não serem passíveis de um efectivo contraditório e, portanto, do direito de defesa constitucionalmente consagrado, não podem servir de suporte à qualificação da conduta do agente.
VI - Com a nova versão do art. 50.º do CP, introduzida pela Lei 59/2007, de 04-09, passou a ser possível a suspensão da execução da pena, reunidos os demais pressupostos, em casos em que tenha sido aplicada pena de prisão até 5 anos. Confrontado com este tipo de situação, nomeadamente em casos de sucessão de leis aplicáveis e face ao disposto no art. 371.º-A do CPP, tem sido entendido por alguma jurisprudência deste Supremo Tribunal dever conhecer-se logo da possibilidade da concessão ou de negação da pena de substituição, havendo uma outra linha de orientação, que se acolhe, que defende que, na falta de elementos seguros e actualizados, não se deverá tomar posição sobre a questão ou que, face a tal carência de dados, se deverá remeter a decisão para o tribunal de 1.ª instância.
VII - Em concreto, colocando-se neste Supremo Tribunal pela primeira vez a questão da suspensão da execução da pena – na sequência da redução para 4 anos e 6 meses de prisão da pena aplicada à arguida VR –, deve ser adoptada a solução de ordenar a reabertura da audiência na 1.ª instância, a fim de ser ponderada a concessão, ou não, da pena de substituição, com elaboração de relatório social actualizado, através do qual se possa ter uma noção mais precisa e abrangente da personalidade da arguida, bem como da sua inserção familiar, e recolha de demais elementos que se mostrem necessários a essa ponderação.
VIII - A abordagem de eventual violação do princípio in dubio pro reo está balizada pelos parâmetros de cognoscibilidade presentes numa indagação dos vícios decisórios, com o consequente alargamento da possibilidade de incursão de exame no domínio fáctico, mas simultaneamente, como ali ocorre, operando de forma mitigada, restrita, que se cinge ao texto da decisão recorrida, por si só considerado ou em conjugação com as regras da experiência comum.
IX - Tal significa que, à semelhança do que ocorre na análise e exame de verificação dos vícios previstos no n.º 2 do art. 410.º do CPP, quando se perspectiva indagação de eventual violação do princípio in dubio pro reo há que não esquecer que se está sempre perante um poder de sindicância de matéria fáctica, que é limitado, restrito, parcial, mitigado, exercido de forma indirecta, dentro do condicionalismo estabelecido pelo referido preceito, em suma, que o horizonte cognitivo do STJ se circunscreve ao texto e aos vícios da decisão, não incidindo sobre o julgamento, isto é, que o objecto da apreciação será sempre a decisão e não o julgamento.
X - Inexistindo dúvida razoável na formulação do juízo factual que conduziu à condenação da arguida, fica afastado o princípio do in dubio pro reo e o da presunção de inocência, sendo de ter por definitivamente assente a matéria de facto apurada.
XI - O art. 25.º do DL 15/93, de 22-01, tem como pressuposto específico a existência de uma considerável diminuição do ilícito; depende de um juízo positivo sobre a ilicitude do facto que constate uma substancial diminuição desta, um menor desvalor da acção, uma atenuação do conteúdo de injusto, uma menor dimensão e expressão do ilícito.
XII - Os pressupostos da disposição respeitam, todos eles, ao juízo sobre a ilicitude do facto no sentido positivo. Com efeito, a aplicação do art. 25.º do DL 15/93, de 22-01, depende da constatação, face à específica forma e grau de realização do facto, de que o caso se situa forçosamente aquém da necessidade de pena expressa pelo limite mínimo do tipo base, reclamando uma substancial diminuição desta.
XIII - Os índices, exemplos padrão, ou Regelbeispiel, enumerados no preceito, a par de outros, são atinentes, uns, à própria acção típica (meios utilizados, modalidade, circunstâncias da acção), outros, ao objecto da acção típica (qualidade ou quantidade do estupefaciente), ou seja, pertinem todos estes factores ao desvalor da conduta, à execução do facto, fazendo parte do tipo de ilícito, não entrando em acção qualquer consideração relativa ao desvalor da atitude interna do agente, à personalidade deste, ao juízo sobre a culpa.
XIV - Para avaliar da verificação, ou não, do tipo privilegiado do art. 25.º do DL 15/93, de 22-01, haverá que proceder à valorização global do episódio, não se mostrando suficiente que um dos factores interdependentes indicados na lei seja idóneo em abstracto para qualificar o facto como menos grave ou leve, devendo valorar-se complexivamente todas as circunstâncias.
XV - O critério a seguir será a avaliação do conjunto da acção tendo em conta o grau de lesividade ou de perigo de lesão (o crime de tráfico é um crime de perigo abstracto) do bem jurídico protegido (saúde pública). Valerá o tipo privilegiado ou atenuado para os casos menos graves, sendo de assinalar a similitude e paralelismo com os pressupostos gerais da atenuação especial da pena, mas quedando-se aqui a “atenuação” em função do juízo de ilicitude, sem intervenção da culpa do agente e da necessidade de pena, presentes no art. 72.º do CP, pois o princípio regulativo da aplicação do regime da atenuação especial é o da diminuição acentuada não apenas da ilicitude do facto ou da culpa do agente mas também da necessidade da pena e, portanto, das exigências da prevenção.
XVI - O art. 25.º do DL 15/93, de 22-01, possibilita a aplicação de uma pena cujo limite máximo fica aquém da aplicação à moldura penal do tráfico base das regras da atenuação modificativa da pena do art. 73.º do CP.
XVII - Na comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria são essenciais dois requisitos: urna decisão conjunta, tendo em vista a obtenção de um determinado resultado, e uma execução igualmente conjunta.
XVIII - O co-autor executa o facto, toma parte directa na sua realização, por acordo ou juntamente com outro ou outros, ou determina outrem à prática do mesmo. A co-autoria é a execução colectiva do facto, comunitária, em que cada comparticipante quer causar o resultado como próprio, mas com base numa decisão conjunta e com recurso a forças conjugadas.
XIX - A comparticipação criminosa exige um elemento subjectivo e um outro objectivo. O primeiro reclama uma decisão conjunta – que pode consistir num acordo, expresso ou tácito, ou, pelo menos, numa consciência de colaboração com carácter bilateral – e uma participação na execução do facto criminoso, conjuntamente com outro ou outros, num exercício conjunto do domínio do facto, ou numa contribuição objectiva para a consumação do tipo legal visado, isto é, não é indispensável nem necessário que cada um dos agentes cometa integralmente o facto punível, que execute todos os factos correspondentes ao preceito incriminador, que intervenha em todos os actos a praticar para obtenção do resultado pretendido, bastando que a actuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo e indispensável à produção do resultado.
XX - A componente subjectiva «basta-se com o simples acordo tácito, com a simples consciência bilateral, reputado ao facto global, com o conhecimento pelos agentes da recíproca cooperação», não se exigindo que os co-autores se conheçam entre si, na medida em que cada um esteja consciente de que junto a ele vai estar outro (ou outros) e estes se achem imbuídos da mesma ideia – cf. Ac. do STJ de 11-03-1998, Proc. n.º 1133/97 - 3.ª, CJSTJ 1998, tomo 1, pág. 220.
XXI - A cumplicidade é a cooperação dolosa com outro na realização de um seu (dele) facto antijurídico dolosamente cometido. O cúmplice limita-se a favorecer um facto alheio, não toma parte no domínio do facto; o autor não necessita sequer de conhecer a cooperação que lhe presta (a chamada cumplicidade oculta) – cf. Hans-Heinrich Jescheck, Tratado de Derecho Penal, Parte General, tradução de S. Mir Puig e F. Muñoz Conde, ed. Bosch 1981, vol. II, pág. 962.
XXII - Na comparticipação criminosa, de que a cumplicidade é um dos modos, «cada comparticipante responde pelo mesmo facto típico, porque todos os comparticipantes concorrem para a prática do mesmo facto. O modo de cooperação é que é diverso; o objecto a que se dirige a cooperação de todos é o mesmo: o facto, o crime». A cumplicidade é uma forma de participação secundária na comparticipação criminosa, e num duplo sentido: de dependência da execução do crime ou começo de execução e de menor gravidade objectiva, na medida em que não é determinante da prática do crime, que seria sempre realizado, embora eventualmente de modo e em tempo, lugar ou circunstâncias diversos. Traduz-se «num mero auxílio, não sendo determinante da vontade dos autores nem participa da execução do crime, mas é sempre auxílio à prática do crime e nessa medida contribui para a prática do crime, é uma concausa do crime» – cf. Germano Marques da Silva, in Direito Penal Português, Verbo, 1998, vol. II, págs. 280, e 291-292.
XXIII - A cumplicidade experimenta uma subalternização relativamente à autoria, estando-se face a actividade que se fica pelo auxílio, perante uma causalidade não essencial. A infracção sempre seria praticada, só que o seria em outro tempo, lugar ou circunstância – cf. Faria Costa, Formas do Crime, in Jornadas de Direito Criminal, Fase I, CEJ, 1983, pág. 174.

Decisão Texto Integral:

No âmbito do processo comum com intervenção de tribunal colectivo n.º 216/03.8GAMCD, do Tribunal Judicial da Comarca de Macedo de Cavaleiros, integrante do Círculo Judicial de Bragança, foram submetidos a julgamento os arguidos:
1 - AA;
2 - BB, solteira, feirante, nascida em 28-09-1976, natural de S. Salvador, Ílhavo, residente no ........., n.º .., em Moncorvo;
3 - CC, solteiro, feirante, nascido em 24-06-1976, natural de S. João Batista, Entroncamento, residente em........., Moncorvo, preso preventivamente à ordem destes autos;
4 - DD;
5 - EE;
6 - FF;
7 - GG;
8 - HH;
9 - II;
10 - JJ, casado, empregado de restaurante e café, nascido em 31-05-1973, natural de Amendoeira, Macedo de Cavaleiros, residente em Macedo de Cavaleiros, preso preventivamente à ordem destes autos;
11 - KK, casada, empregada de café restaurante, nascida em 19-01-1980, natural de Macedo de Cavaleiros, residente em Macedo de Cavaleiros, na mesma morada do anterior;
12 - LL;
13 - MM;
14 - NN;
Sendo-lhes imputada, relativamente aos primeiros doze arguidos a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01, sendo em relação aos arguidos indicados sob os números 1, 3, 7 e 10, como reincidentes, e aos dois últimos, a autoria material de um crime de tráfico de menor gravidade, p. p. pelo artigo 25º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01.
Por acórdão do Colectivo de Macedo de Cavaleiros, de 9 de Julho de 2007, constante de fls. 5349 a 5428 do 21º volume, foi deliberado condenar os arguidos nas penas, respectivamente, de nove anos, sete anos e seis meses, dez anos, quatro anos e seis meses, oito anos, seis anos e seis meses, dez anos, oito anos e seis meses, cinco anos, dez anos e seis meses, sete anos, três anos, um ano e seis meses e três anos de prisão, sendo suspensa a execução das penas aplicadas aos arguidos LL e MM, pelo período de cinco e quatro anos, respectivamente.
Interposto recurso para o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de fls. 6667 a 6728 do 26º volume, datado de 30 de Janeiro de 2008, foi deliberado declarar “nulo o acórdão proferido que deve ser substituído por outro que faça o pertinente exame crítico da prova, em conformidade com o disposto no art. 374º, n.º 2 do CPP”.

Na sequência da anulação decretada foi proferido pelo Colectivo de Macedo de Cavaleiros novo acórdão, em 13 de Maio de 2008, constante de fls. 6956 a 7043, sendo deliberado condenar os arguidos, pela seguinte forma:

a) - o arguido AA, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artº 21º, nº 1, do DL 15/93 de 22-01, e artigos 75º e 76º do Código Penal, como reincidente, na pena de nove anos de prisão;
b) - a arguida BB, como autora de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01, na pena de sete anos e seis meses de prisão;
c)- o arguido CC, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01, e artigos 75º e 76º CP, como reincidente, na pena de dez anos de prisão;
d)- o arguido DD, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artº 21º 1, do DL 15/93 de 22-01, na pena de quatro anos e seis meses de prisão;
e)- o arguido EE, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artº 21º 1, do DL 15/93 de 22-01, na pena de oito anos de prisão;
f)- a arguida FF, como autora de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artº 21º 1, do DL 15/93 de 22-01, na pena de seis anos e seis meses de prisão;
g) o arguido GG, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artº 21º 1, do DL 15/93, de 22-01, e artigos 75º e 76º CP, como reincidente, na pena de dez anos de prisão;
h)- a arguida HH, como autora de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artº 21º 1, do DL 15/93, de 22-01, na pena de oito anos e seis meses de prisão;
i)- o arguido II, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artº 21º 1, do DL 15/93, de 22-01, na pena de cinco anos de prisão;
j)- o arguido JJ, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01, e artigos 75º e 76º Código Penal, como reincidente, na pena de dez anos e seis meses de prisão;
l)- a arguida KK, como autora de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01, na pena de sete anos de prisão;
m) - o arguido LL, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. p., pelo artigo 25º, alínea a), do DL 15/93, de 22-01, na pena de três anos de prisão;
n)- o arguido MM, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. p., pelo artigo 25º, alínea a), do DL 15/93 de 22-01, na pena de um ano e seis meses de prisão;
o) o arguido NN, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. p. pelo artigo 25º, alínea a), do DL 15/93, de 22-01, na pena de três anos de prisão;
Atendendo ao disposto no artigo 50º Código Penal, na redacção da Lei n.º 59/07, porque mais favorável, o Tribunal Colectivo:
- suspendeu a execução da pena de prisão aplicada a cada um dos arguidos LL e MM, pelo período de três anos e de um ano e seis meses, respectivamente;
- suspendeu a execução da pena de prisão aplicada aos arguidos II e DD, pelo período de cinco anos e quatro anos e seis meses, respectivamente, sujeita a regime de prova.

Inconformados, interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do Porto os arguidos
1 - AA,
2 - BB,
3 - CC,
5 - EE,
6 - FF,
7 - GG,
8 - HH,
10 - JJ,
11 - KK.
A maioria deles - com excepção dos arguidos CC e GG, que arguiram apenas os vícios previstos no artigo 410º, n.º 2, do CPP - invocando erro de julgamento quanto à respectiva matéria de facto, que impugnam, nos termos do artigo 412º, n.ºs 3 e 4, do CPP, para além de igualmente suscitarem aqueles vícios.

Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto (processo n.º 4979/08-1ª), constante de fls. 7917 a 8038, do 30.º volume, datado de 5 de Novembro de 2008, foi deliberado:
A) Modificar a decisão proferida sobre a matéria de facto;
B) Alterar o acórdão sob recurso, e consequentemente, condenar:
1- o arguido AA, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, na pena de 7 (sete) anos de prisão;
2- a arguida BB, como autora de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, na pena de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de prisão;
3- o arguido CC, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, com a agravante da reincidência, p. e p. nos artigos 75º e 76º do Código Penal, na pena de 8 (oito) anos e 3 (três) meses de prisão;
4- o arguido EE, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, na pena de 6 (seis) anos e 4 (quatro) meses de prisão;
5- a arguida FF, como autora de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22-01, tendo em vista o disposto nos artigos 2º, nº 4, 50º e 53º, nº 3, do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 4 (quatro) meses de prisão, cuja execução se suspende por igual período de tempo, sujeito a regime de prova;
6- o arguido GG, (corrigido para Silva a fls. 8156) como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, na pena de 7 (sete) anos e 3 (três) meses de prisão;
7- a arguida HH, como autora de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22-01, na pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão;
8 - o arguido JJ, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22-01, na pena de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão;
9 - a arguida KK, como autora de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, na pena de 5 (cinco) anos e 5 (cinco) meses de prisão;
C) - Revogar parcialmente o acórdão sob recurso quanto:
- à decisão de condenação dos arguidos CC, GG e HH a pagar ao Estado as quantias respectivamente de 5.000 euros e de 4.000 euros em substituição da perda dos veículos de matrículas ..-..-.. e ..-..-..;
- à decisão de condenação proferida ao abrigo dos artigos 1º, nº 1, a), 7º e 12º da Lei nº 5/2002, de 11-01, relativamente a todos os arguidos por ela abrangidos por força do disposto no artigo 403º, nº 3, do CPP;
- quanto à declaração de perdimento a favor do Estado das contas bancárias abertas em nome dos respectivos recorrentes, melhor dizendo dos respectivos saldos nelas existentes;
(…)

Os arguidos AA e HH, em 03-12-2008, a fls. 8096, informaram não pretender interpor recurso, conformando-se com o acórdão condenatório, vindo o arguido EE, a fls. 8173, declarar conformar-se com a decisão, dela não interpondo recurso.
Inconformados, recorreram os arguidos:
- JJ e KK,
- CC
- BB

Os arguidos JJ e KK, requerendo a realização de audiência, nos termos do artigo 435º do CPP, apresentaram a motivação de fls. 8063 a 8089, em original de fls. 8099 a 8125, que rematam com as seguintes conclusões (em transcrição):
1 - A) Questão prévia. Admissibilidade do recurso em relação à arguida KK.
Em 9/7/07, depois de realizado o respectivo julgamento, foi proferido Acórdão em 1.° instância, que condenou os arguidos JJ e KK nas penas de prisão de 10 anos e 6 meses e 7 anos respectivamente.
Os arguidos JJ e KK vinham acusados em co-autoria material, sendo o primeiro em reincidência, de um crime de tráfico de estupefacientes p.p. pelo art.° 21, n.° 1 do DL 15/93 de 22/1, sendo-lhe aplicável a este crime uma moldura penal de 4 a 12 anos de prisão.
Interposto recurso para o Tribunal da Relação do Porto, por Acórdão de 30/1/08, proferido em conferência pela 2.° secção Criminal, foi decidido declarar “nulo o Acórdão proferido que deve ser substituído por outro que faça o pertinente exame crítico da prova, em conformidade com o disposto no art.° 374.°, n.° 2 do CPP”.
Em 13/5/08, foi entretanto proferido novo Acórdão pelo Colectivo, que manteve a pena aplicada aos arguidos JJ e KK, de 10 anos e 6 meses de prisão e 7 anos de prisão respectivamente.
Desse Acórdão foi interposto novo recurso para a Relação do Porto, que através do Acórdão proferido a 5.11.2008, reduziu as penas de prisão ao arguido JJ para 8 anos e 6 meses e à arguida KK para 5 anos e 5 meses.
2 - A uma só voz os senhores Juízes Conselheiros têm entendido, que, no tratamento das questões de aplicação da lei no tempo das alterações introduzidas pela Lei n.° 48/2007, de 29 de Agosto no CPP, na matéria de recorribilidade das decisões, sobre a data relevante para a aplicação na nova redacção dessas disposições é, a da data da prolação da primeira decisão de fundo proferida no processo. (1)

3 - Para o efeito do disposto no art.° 5.°, n.° 2, al. a), do CPP, os direitos de defesa, para além dos que têm eficácia em todo o decurso do processo (art.º 61.º, n.º 1), são apenas os que se encontram consignados para a fase processual em curso no momento da mudança da lei.
A prolação da decisão final na 1ª instância encerra a fase processual do julgamento (Livro VII) e inicia, consoante o caso, a dos recursos (Livro IX) ou a das execuções (Livro X).
Ao se iniciar a fase dos recursos, o arguido inscreve nas suas prerrogativas de defesa o direito a todos os graus de recurso que a lei processual lhe faculta nesse momento.
A lei processual posterior que retirar o direito a um desses graus de recurso constitui um agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente uma limitação do seu direito de defesa.
4 - É recorrível para o STJ a decisão proferida pela Relação já depois da entrada em vigor da nova lei de processo que não reconheça esse grau de recurso, se a lei que vigorava ao tempo da decisão da 1ª instância o mandasse admitir.
A lei que regula a recorribilidade de uma decisão, ainda que esta tenha sido proferida em recurso pela Relação, é a que se encontrava em vigor no momento em que a 1ª instância decidiu, salvo se lei posterior for mais favorável para o arguido.
Ora, estando em causa um recurso interposto de Acórdão da Relação, que incidiu sobre o Acórdão final de tribunal colectivo proferido antes da entrada em vigor das alterações ao CPP, e que a 2.° instância confirmou, a decisão é recorrível, atendendo à data, não da decisão recorrida, mas da decisão da 1.ª instância por a solução corresponder a tratamento mais favorável, nos termos do art.° 5.°, n.° 2, al a) do CPP, já que face à nova redacção do art.° 400.°, n.° 1, al f), do CPP, conferida pela Lei 48/2007, de 29. 8, não seria admissível o recurso.
5 - Pode-se colocar seguinte questão: o primeiro Acórdão proferido pelo colectivo foi julgado nulo. O segundo Acórdão foi proferido em 13.5.08, ou seja já em plena vigência das alterações ao CPP (15.9.2007).
Entendemos neste caso, que continua a ter plena existência o Acórdão proferido em primeiro lugar, pelo colectivo. O Supremo Tribunal de Justiça tem-se pronunciado nos últimos anos, constante e uniformemente, nos casos de anulação da sentença da 1ª instância, no sentido de que na nulidade o acto existe, apenas não produz ou pode não produzir os efeitos para que foi criado, ante uma falta ou irregularidade no tocante aos seus elementos internos e, consequentemente, o prazo a considerar para efeito por exemplo de duração da prisão preventiva é, não o previsto na alínea c) do n.° 1, do artigo 215°, do Código de Processo Penal, antes, o da alínea d), do mesmo dispositivo legal, uma vez que, mal ou bem, houve condenação em primeira instância, embora não tivesse, ainda, sido objecto de trânsito em julgado.
Lê-se, por exemplo, no Ac. do STJ de 7/12/2006, proc. 4583/06-5, o seguinte:
«[...] como é dos princípios, acto processual nulo não se confunde com acto puramente inexistente.Com efeito, enquanto a inexistência corresponde àqueles casos mais graves «em que verdadeiramente se pode dizer que para o direito não há nada» na nulidade o acto existe. Apenas não produz ou pode não produzir os efeitos para que foi criado, ante uma falta ou irregularidade no tocante aos seus elementos internos. (2)

Tanto assim que os casos de inexistência da sentença se resumem a estas três hipóteses: a) não provir a sentença de pessoa investida do poder jurisdicional; b) ser o acto emitido a favor de ou contra pessoas fictícias ou imaginárias; c) não conter a sentença uma verdadeira decisão ou conter uma decisão incapaz de produzir qualquer efeito jurídico.
(...)
Se assim é, nunca o julgamento acontecido na 1ª instância se poderia ter como apagado do processo uma vez que mal ou bem, houve condenação em primeira instância, embora não tivesse, ainda, sido objecto de trânsito em julgado.» No mesmo sentido também se podem ler, entre outros, os Acs. do STJ de 20/11/2003, 25/01/2006 e de 17/01/2007, processos 4029/03-5, 281/06-3, 176/07-3.
Por tudo isto, consideramos que o recurso atinente á arguida KK terá de ser admitido.
6 - Os recorrentes (a arguida KK e o arguido JJ) põe em causa a medida das penas impostas, achando exageradas.
7 - O recurso vem da Relação para o STJ, funcionando este com a sua vocação essencial de tribunal de revista, pois a revisão da pena aplicada traduz-se na aplicação de matéria de direito.
Os poderes cognitivos do STJ, como se sabe, abrangem no tocante a esta matéria, entre outras, a avaliação dos factores que devam considerar-se relevantes para a determinação da pena: a questão do limite ou de moldura da culpa, a actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, e também o quantum da pena, ao menos quando se encontrarem violadas regras de experiência ou quando a quantificação operada se revelar de todo desproporcionada (cf. Figueiredo Dias - Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, p. 197).
8 - A censura que o tribunal de recurso pode opinar sobre a decisão respeitante à determinação da sanção, incide sobre todos os elementos fornecidos pelo tribunal que, não tendo sido considerados para a questão da culpabilidade, são relevantes para a determinação da sanção, bem como sobre todos os elementos que considerou “adquiridos” (e porque considerou adquiridos uns e outros não) e ainda sobre a forma, fundamentada, porque valorou esses factores na decisão final.
9 - É função do recurso - nos casos, o de Revista -, antes de tudo, analisar criticamente, os “parâmetros” da determinação de sanções.
10 - Se quisermos apresentar os fundamentos do recurso da Revista em matéria de determinação da sanção, poderíamos socorrer-nos do Direito austríaco e dizer que o tribunal de recurso, no exercício dos seus poderes de cognição, pode censurar a decisão sobre a medida da pena quando, por forma manifesta, este errou na valoração de factos de relevância “decisiva” para a determinação da sanção, ou violou, por forma indefensável, preceitos legais atinentes à determinação da sanção ou, então, não esgotou o seu “ Ermessensspierlraum” - o seu espaço de liberdade, aliás formulação que, no essencial, se assemelha àquela que é defendida por Figueiredo Dias, consequências jurídicas §§ 255.
Mas, como é evidente, a transposição para o nosso modelo de estrutura acusatória, tem que implicar que o tribunal, quando fundamenta a decisão sobre a determinação da sanção, tenha de atender a todos os factores relevantes para tal determinação, e, em consequência disso, demonstrar a validade do método por que procedeu a determinação da sanção.
Para censurar a decisão sobre esta questão, deve o tribunal de recurso conhecer de tudo quanto seja legitimamente permitido para averiguar da correcção dessa decisão.
Há, todavia, um outro “erro” punível por, mais que um erro de “inadequação” da determinação da sanção, traduz a “inaceitabilidade” de “toda” a determinação da sanção - p. ex., quando o tribunal de recurso entende a condenação como excessiva.
Ora, como é evidente, o recurso de Revista alargado impõe o dever de o tribunal conhecer de todas as questões que lhe permitam censurar a validade da decisão tomada, pelo que, sendo estas questões relevantes, delas deve conhecer.
11- Ora, posto isto, os factores a que a lei mandar atender para a determinação concreta da pena são os que vêm indicados no referido n.° 2 do art°. 71°., do CP. (visto que tal enumeração não é exaustiva) como se disse em supra, bem assim outras que sejam relevantes do ponto de vista da prevenção e da culpa, mas que não focam parte do tipo legal de crime, sob pena, de infracção do princípio da proibição da dupla valoração.
12 - Assim, ao elemento prevenção no sentido de prevenção geral positiva ou de integração, vai buscar-se o objectivo de tutela dos bens jurídicos, erigido como finalidade primeira da aplicação, de qualquer pena, na esteira de opções hoje prevalecentes a nível de política criminal e plasmadas na lei, mas sem esquecer a vertente de prevenção especial ou de socialização ou, segundo os termos legais, a integração do agente na sociedade - art°. 40°., n.°1 do CP..
13 - Ao elemento culpa, enquanto traduzindo a vertente pessoal do crime, a marca, documentada nos factos, da singular personalidade do agente (com a sua autonomia volitiva e a sua radical liberdade de fazer opções e de escolher determinados caminhos), pede-se que imponha um limite às exigências, porventura expansivas em demasia, de prevenção geral, sob pena do condenado servir de instrumento a tais exigências.
14 - Neste sentido é que se diz que a medida da tutela dos bens jurídicos, como finalidade primeira da aplicação da pena, é referenciada por um ponto óptimo, consentido pela culpa, e por um ponto mínimo que ainda seja suportável pela necessidade comunitária de afirmar a validade da norma ou a valência dos bens jurídicos violados com a prática do crime.
Entre esses limites devem satisfazer-se, quanto possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização (Figueiredo Dias ob. cit.)
O que quer isto dizer?
Quer dizer que as exigências de prevenção traçam, entre aqueles limites óptimo e mínimo, na submoldura que se inscreve na moldura abstracta correspondente ao tipo legal de crime e que é definido a partir das circunstâncias relevantes para tal efeito e encontrado na culpa uma função limitadora do máximo da pena.
Entre tais limites é que vão actuar justamente, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização, cabendo a esta determinar em último termo a medida da pena, evitando, em toda a extensão possível, a quebra da inserção social do agente e dando azo à sua reintegração na sociedade (Figueiredo Dias ob. cit. p. 231).
15 - No caso sub júdice, há que começar por ver a moldura penal abstracta aplicável, - 4 anos a 12 anos de prisão (art°. 21°., n.°1 do DL 15/93)
O comportamento de ambos os arguidos e a sua participação no crime, não é igual, há uma grande diferença na responsabilidade de cada um no ilícito em questão.
Ora, em relação à arguida KK, tendo em vista as considerações acabadas de tecer e ainda a sua primariedade, aqui a integrar em todo o contexto referido no Acórdão da Relação do Porto (agora objecto de Recurso) é bem diferente daquele em que se inscreve a actuação do arguido JJ.
A arguida KK, à data dos factos, com 26 anos e actualmente com 28 anos, é uma jovem, sem antecedentes criminais.
A sua actuação no ilícito, quase que foi “impelida” pelo marido para o acompanhar em algumas entregas de “droga”.
O douto acórdão recorrido, não teve - no ponto da sua elaboração - essa atenuação em relação a determinados factos nomeadamente:
- a) encontra-se actualmente a trabalhar num restaurante situado no Centro de Macedo de Cavaleiros;
- é com este rendimento que se sustenta a si e aos seus dois filhos menores que com ela vivem;
- o seu marido o aqui arguido JJ encontra-se preso preventivamente à ordem destes autos;
- encontra-se bem inserida no meio social onde vive;.
- tem bom comportamento anterior e posterior aos factos;
- já decorreram quase três anos desde a prática dos factos;
- esteve presa - prisão domiciliária - 11 meses, até ser colocada em liberdade pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto;
- Nessa situação - enquanto perdurou a prisão domiciliária - nunca desrespeitou os deveres inerentes a tal estatuto;
- colaborou de uma forma voluntária com as autoridades policiais na busca à sua residência, indicou o local onde se encontrava escondida a restante droga apreendida;
- a arguida à data dos factos vivia dos rendimentos de trabalho;
- tem uma boa imagem na comunidade onde pertence e de uma boa mãe,
- actuou muitas das "vezes" sobre a influência e ameaça do seu cônjuge, a pessoa de quem dependia de uma forma bastante emocional;
- não há nenhuma razão séria, para duvidar da capacidade da arguida se afastar do crime e não repetir a prática de crimes e essencialmente desta natureza.
16- Perante este condicionalismo global, as necessidades de prevenção acabam por ficar bastante diluídas.
No caso (em que a moldura abstracta do crime de tráfico comum de drogas ilícitas - art°. 21°., do DL 15/93, - é de 4 a 12 anos de prisão); o ponto óptimo no entender da recorrente KK, de realização das necessidades preventivas da comunidade - ou seja, a medida da pena que a comunidade entenderia necessária à tutela das suas expectativas na validade e no reforço da norma jurídica afectada pela conduta da arguida situar-se-ia na fronteira dos 4 anos e 6 meses de prisão, ou seja entre a pena abstracta correspondente ao “tráfico comum” (4 a 12) e a correspondente ao tráfico menor (1 a 5).
Todavia, abaixo dessa medida (óptimo) da pena de prevenção, outras haKK (entre 3 anos e os 4 anos) que a comunidade ainda entendesse, suficientes para proteger as suas expectativas na validade da norma".
No entanto, à ponderação das circunstâncias atrás descritas (sobretudo ter actuado sob a influência do seu conjugue de quem dependia ou a quem devia obediência; ter a arguida bom comportamento quer anterior, quer posterior aos factos, estar bem inserida socialmente, ter uma família estruturada; ter a seu cargo dois filhos menores dos quais é o seu único sustento económico, ter na sociedade/comunidade onde vive boa imagem e de mãe afectuosa; ter estado presa (em prisão domiciliária - cerca de 11 meses), já ter decorrido quase três anos sobre a prática dos factos, ser jovem, não ter antecedentes criminais, circunstâncias fortemente mitigadora da culpa e que decididamente tem a ver com a necessidade da pena, justifica-se agora uma pena de prisão entre os 3 e 4 anos e 6 meses, sendo e que é de aceitar o juízo de prognose favorável à suspensão da execução da pena por igual período acompanhada, naturalmente, de regime de prova, nos termos dos 53°, e 54°, do C P (devendo a 1ª instância diligenciar para obter o plano de readaptação social adequado ao caso).
17 - Em relação à pena de prisão aplicada ao arguido JJ.
Consideramos também exagerada a pena de 8 anos e seis meses.
O Acórdão agora objecto de recurso não teve em alteração que quanto a ele, dado que não foi considerado reincidente, teria o tribunal recorrido, de partir de uma outra moldura para aplicar a pena em concreto.
18 - Como já foi salientado, o STJ foi concebido como “regulador e uniformizador da jurisprudência nacional”, aliás como refere Antunes Varela, J. Miguel Beleza e Sampaio e Nora.
Pelo facto de estar colocado no mais alto grau da hierarquia judicial, de ser tribunal único, e de ser presumível que a jurisprudência estabelecida pelos seus acórdãos venha a ser adoptada, de futuro, em casos semelhantes, é natural que os tribunais de 1ª., e 2ª. instância se inspirem na interpretação e aplicação que o Supremo for dando aos textos legais.
Ora, o que dá aos Acórdãos do Supremo um prestígio e valor especial é a circunstância de emanarem do mais alto tribunal e de dever supor-se que o Supremo manterá, de futuro, a sua jurisprudência, em casos semelhantes.
Por outro lado, a determinação da pena, dentro dos limites da moldura penal é um acto de discricionariedade judicial, mas não uma discricionariedade livre.
O exercício dessa discricionariedade pelo juiz na individualização da pena depende de princípios individualizadores em parte não escritas, que se inferem dos fins das penas em relação com os dados da individualização (3) "
.
Deve, no entanto, notar-se que neste domínio o juiz tem de a traduzir, numa certa quantidade (exacta) da pena, os critérios jurídicos de determinação, circunstância específica no domínio da aplicação do direito (4).
.
Na individualização da pena o juiz deve procurar não infringir o princípio constitucional da igualdade, o qual exige que na individualização da pena não se façam distinções arbitrárias.
Ora, têm sido notadas distonias significativas nesta matéria, nos tribunais recorridos, quer em condições diferentes, quer em idênticas condições de tempo e de lugar.
19 - Como nos diz o Conselheiro do STJ Manuel Simas Santos, in Medida Concreta da Pena. Disparidades, a pág. 36 “por disparidades injustificadas” entendeu-se as diferenças na aplicação das penas que resultem de concepções variáveis.
Para além da obrigação dos tribunais, motivar concretamente as suas decisões, devem ainda indicar nomeadamente os motivos específicos quando aplicam uma pena de prisão efectiva.
Quando existem orientações ou pontos de partida, é recomendado que os tribunais motivem as suas decisões quando se afastam da grelha de penas indicadas, (neste sentido, o Conselheiro Simas Santos, ob. cit, p.74).
Há, no entanto, um limite geral que é necessário respeitar quaisquer que possa(m) ser(o)s outro(s) princípio(s) base declarando(s) da aplicação das penas.
Trata-se do limite imposto pelo princípio de proporcionalidade entre a gravidade da infracção em apreço e a severidade da pena infligida.
Segundo um princípio ditado pela justiça, ninguém deve ser condenado a uma pena cuja severidade exceda o limite de proporcionalidade prevista para os factos constitutivos da infracção ou das infracções de que foi reconhecido culpado. Umas injustiças tem repercussões mais graves quando estão em jogo penas de prisão.
Ora, disparidade significa diferença ou desigualdade (não desejada).
A disparidade na aplicação das penas constitui uma falta de justiça formal. Casos análogos não são tratados da mesma forma (ou) casos diferentes não são tratados diferentemente (5).
20 - Atendendo por um lado, que o arguido não foi considerado reincidente, teria em 1º lugar, o tribunal recorrido, de partir de uma outra moldura para aplicar a pena em concreto (4-12 anos).
21 - Em segundo lugar, o tribunal recorrido não teve em conta a qualidade da “droga” traficada, haxixe, muito diferente de outras drogas, chamadas “duras” cocaína e heroína.
Não teve o tribunal recorrido em consideração da inexistência de uma estrutura organizativa, mas apenas um simples “negócio de rua”, sem recurso a qualquer técnica ou meio especial, o que lhe dá uma natureza de simplicidade.
Não teve o tribunal recorrido em conta as circunstâncias provadas em julgamento, nomeadamente de ter mulher (a aqui arguida KK) e dois filhos menores; está socialmente inserido; tem uma família estrutura; ter exercido à data dos factos uma actividade profissional; tem bom comportamento posterior aos factos (é faxina no E.P); ter já cumprido cerca de 2 anos e sete meses de prisão;
22 - Na revista de Ciência Criminal ano 14 (2004), pág. 492 e ss., um estudo sobre a medida concreta da pena, no STJ, no tráfico de estupefacientes, relativamente ao gráfico referido na figura I - distribuição das penas e valores acumulados (4 a 12 STJ) e na figura II – distribuição dos anos de pena (4 a 12 STJ), verifica-se que em 70% dos casos a pena é inferior a 6 anos, não se registando qualquer pena superior a 9 anos, embora a moldura vá até aos 12 anos.
23 - A título de exemplo:
- decisão de 20.10.2004, processo n.° 1884/04. 3a. Secção um transporte (correio) de cerca de 33 Kg., de cannabis de Angola para Portugal, descem a pena de 7 anos e seis meses de prisão para 5 anos e 6 meses;
- decisão de 15.01.04, processo n.° 3766/03 da 5a: Secção, um transporte de cannabis de Espanha para Portugal de cerca de 191,402 Kg., fixou a pena em seis anos e seis meses de prisão;
- Acórdão de 20.03.07 acedido em www.dgsi.pt STJ aplicou uma pena de 5 anos ao traficante de 5Kg., de haxixe.
-Acórdão de 10.10.04, acedido em www.dgsi.pt. STJ aplicou uma pena de 8 anos ao tráfico de 270 Kg., de haxixe.
-Acórdão do STJ de 17.10.05, acedido em www.dgsi.pt. a pena de 5 anos e 9 meses de prisão ao tráfico de 20 Kg. de haxixe.
- Acórdão do STJ de 11.05.06, acedido em www.dgsi.pt STJ tráfico de 59 Kg., de haxixe aplicada uma pena de prisão de 5 anos.
- Acórdão do STJ de 28.06.06, acedido em www.dqsi.pt STJ, com o n.° convencional STJ 000, sendo relator o Exm°. Conselheiro Carmona da Mota, para um traficante de droga "haxixe" que durante 29 semanas por que se prolongou a sua actividade, transaccionou, à média de 1 Kg., por semana, quase 30 Kg., de haxixe, a pena aplicada foi de 6 anos de prisão
24 - Também aqui - pela prática do STJ., se vê que a pena aplicada ao arguido JJ foi exagerada.
Temos, assim, face ao que se disse em supra, como adequada uma pena de prisão que. se situa entre os 5 e os 6 anos.
Foram violados os artigos 40.°, n.º 1 e 71.°, n.º 2 do Código Penal.

O arguido CC apresentou a motivação de fls. 8090 a 8095, e em original 8157 a 8162, que remata com as seguintes conclusões:
1. O arguido foi condenado por factos ocorridos em 2005 na pena única de oito anos e três meses.
2. Desde aí que mantém uma postura correcta e consentânea para com as regras em sociedade.
3. É pai de crianças de tenra idade.
4. É feirante de profissão.
5. Interiorizou o erro da sua conduta e perspectiva uma rápida ressocialização.
6. O alarme social causado pela sua conduta há muito que se esgotou.
7. A pedagogia da sentença pelos erros cometidos foi interiorizada e evidencia-se desde aí pela ausência de ilícitos criminais.
8. Se o efeito pedagógico da pena já foi alcançado, não devemos impor uma pena tão longa para que se evidenciem esses mesmos efeitos que já se lograram alcançar.
9. Progredi-los no tempo é regredir nos efeitos pretendidos.
10. O excesso de justiça por vezes degenera em injustiça.
11. Por tudo isto a defesa entende que a medida da pena pode e deve ser ajustada no seu quantum por melhor se adequar em face das actuais necessidades de prevenção.
12. A dosimetria penal excede pois a culpa do arguido pelo que foram violados os artigos 40 n.º 2, 70 e 71 do CP, devendo a pena ser ajustada numa redução tendo em conta estes factores.

A arguida BB apresentou a motivação de fls. 8128 a 8149 (volume 30º), requerendo a realização de audiência de julgamento e concluindo deste modo:
I - Por douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, foi a arguida, BB, condenada pela prática em co-autoria material de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21° do DL 15/93, na pena de 5 anos e 4 meses de prisão.
II - Salvo o devido respeito, dada a modalidade da acção, o comportamento da arguida: uma única chamada telefónica em 08.01.06, a verter: “...a arguida deu ao L.... um bocadinho de droga..." (fls. 40, parag. 1, do douto Ac), insere-se no artigo 25° n° 1 do citado diploma legal - tráfico de menor gravidade, como supra se justifica, tendo assim sido violado o citado normativo legal.
III - A recorrente, BB terá prestado algum auxílio material ao companheiro AA, mas nunca deteve o domínio do facto e por isso deverá ser mera auxiliar.
A aqui recorrente, nunca agiu com dolo directo, e o seu comportamento enquadra-se na figura jurídica de cúmplice e não de autora, nos termos do art.27° do CP., destarte, sido violado os artigos 26° e 27° do CP.
IV - O facto de os julgadores, não acreditarem nas versões sustentadas em Julgamento pelas testemunhas, conferindo, só crédito a conversações telefónicas transcritas, em linguagem inteligível e quiçá, meros actos de intenção, foi caso, de violação de lei, nomeadamente do disposto no art. 127° do CPC.
Mais é de salientar, quando em Julgamento não tem qualquer apoio.
Entrou-se numa apreciação arbitrária, discricionária e caprichosa da prova.
V - Foi violado o principio in dúbio pro reo, por não se dar, como não provado que, um mero propósito ou intenção (descrito numa escuta telefónica), pode não ser ter concretizado.
Nada há na prova, sustentada em julgamento que leve à conclusão que a BB, agiu de comum acordo e em conjugação de esforços com o seu companheiro.
VI - Como cúmplice a pena a aplicar concretamente à BB, não deverá ser superior a dois anos de prisão, nos termos do art. 25° do DL 15/93, 22/01. Sem prescindir, somos de parecer que a pena a aplicar à arguida não deverá ultrapassar os 4 anos de prisão, suspensa na sua execução, por igual período de tempo, com sujeição a regime de prova, com acompanhamento pelo IRS, de acordo com o art. 53°, n°3 do CP., como melhor forma de garantir a ressocialização da recorrente, dado a personalidade, as condições de vida e a sua conduta anterior e posterior ao crime da recorrente e as circunstâncias deste (art.50°, n°1 do CP), se se entender que a conduta da recorrente se insere no art° 21° do citado diploma legal, olhando à imagem global dos factos apurados e tendo presente, o limite máximo, consentido pelo grau de culpa da recorrente, bem como os princípios político-criminais da necessidade e da proporcionalidade:
- A recorrente nunca frequentou a escola, não sabendo ler nem escrever;
- Tem 3 filhos de tenra idade a seu cargo;
- Exerce a actividade de feirante, nas localidades da área da sua residência;
- De bom comportamento, quer anterior quer posterior aos factos.
Nestes termos e em nossa humilde opinião, o Tribunal a quo fez errada indagação, interpretação e aplicação da lei, pelo que deverá o douto Acórdão recorrido ser alterado.
VII - Colendos Conselheiros, a suspensão da execução da pena não colide de forma alguma, com o conteúdo mínimo da tutela dos bens jurídicos, uma vez que a ameaça de prisão que recai sobre a arguida é suficiente para acautelar as expectativas da comunidade no sistema jurídico penal vigente.
VIII - Salvo o devido respeito, deveriam ter decidido declarar nulo o Acórdão proferido, mandando substituir por outro, que fizesse o pertinente exame critico da prova, em conformidade com o disposto no art.374º, n° 2 do CPP, mas recaíram no mesmo vício, devendo este ser declarado, igualmente, nulo.
IX - Na fundamentação, é agora obrigatória, a indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal e do exame crítico destas, de forma tão exigente quanto a que vigora no processo civil. Será já de salientar que, o Tribunal Superior da Relação está obrigado aos mesmos princípios legais.
X - O Douto Acórdão continua a violar materialmente a rácio do art. 202°, n°2 da CRP, porque neste douto acórdão, continua a haver uma genérica remissão para os diversos meios de prova, fundamentadores da convicção do Tribunal, sem fundamentar, indicar, nem fazer o exame critico das provas, que serviram para formar a convicção do Tribunal.
XI - A fundamentação deve ser tal, que permita intraprocessualmente aos sujeitos processuais e ao Tribunal Superior, o exame do processo lógico ou racional que lhe subjaz pela via do recurso, conforme impõe o art.210, n°2 da CRP.
XII - E extraprocessualmente a fundamentação, deve assegurar pelo conteúdo um respeito efectivo pelo Principio da Legalidade no Acórdão e a própria imparcialidade e independência dos Juízes, in casu, do Tribunal a quo de 1ª e 2ª Instância, dado que os destinatários da decisão não são apenas os sujeitos processuais mas a própria sociedade. Conforme o estatuído no artigo 205°, n°1 da CRP, tendo assim, sido violada esta norma constitucional.
XIII - Não se nos afigura, salvo melhor opinião, sensato, integrar a arguida, BB, no meio prisional, meio esse por muitos caracterizado como uma escola do crime, e por este não se revelar necessário nem conveniente à sua ressocialização.
No provimento do recurso pede a substituição do acórdão da Relação, com alteração da pena imposta à arguida ou que esta seja suspensa na sua execução.

O Ministério Público junto do Tribunal da Relação do Porto, a fls. 8200/4, apresentou resposta aos recursos acabados de referir, defendendo a admissibilidade dos recursos quanto às arguidas KK e BB, e no mais, concluindo (em transcrição):
1. Mostra-se correcta a subsunção jurídica do art. 21° da Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro em relação às recorrentes KK e BB;
3. (SIC) As penas concretas encontradas estão adequadamente doseadas e são justas em relação a todos os recorrentes;
4. O seu “quantum” não permite, legalmente (art. 50°, n° 1, do CP), a suspensão da execução da pena.
Nestes termos, deverão improceder os recursos, mantendo-se o acórdão recorrido.

Por despacho de 21-01-2009, de fls. 8205, 30º volume, foram admitidos os recursos, com o esclarecimento de que quanto aos interpostos pelas arguidas entendia-se ser aplicável o regime processual anterior à entrada em vigor da lei n.º 48/2007, tendo em vista o disposto no artigo 5º, n.º 2, alínea a), do CPP

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer de fls. 8215 a defendendo que deve ser com referência ao primeiro acórdão que deverá atender-se para definir a admissibilidade, ou não do recurso para o STJ, promoveu a notificação dos recorrentes JJ e KK para em 10 dias especificarem os pontos da motivação do seu recurso que pretendem ver debatidos em audiência, artigo 411º, n.º 5, do CPP, sob pena de o mesmo ser julgado em conferência, pronunciando-se quanto ao mérito apenas relativamente ao recurso do arguido CC, o único que não requereu audiência, tendo em conta a reincidência, que o seu profundo envolvimento no tráfico de drogas mostram que é um traficante que se situa num escalão acima da média, considera que a a pena aplicada não se mostra desproporcionada ou violadora das regras da experiência, não se justificando qualquer intervenção correctiva do STJ, devendo ser negado provimento ao recurso.

Por despacho de fls. 8224 foi ordenada a notificação dos arguidos JJ e KK, nos termos promovidos, bem como o cumprimento do disposto no artigo 417º, n.º 2, do CPP.

Os arguidos JJ e KK responderam a fls. 8231, dizendo que pretendem ambos ver debatidos em audiência a medida de pena a ser-lhes aplicada, as necessidades de prevenção geral e especial, moldura penal, tudo conforme pontos n.ºs 6 a 15 das conclusões de recurso, em relação à arguida e pontos n.ºs 17 a 24 das conclusões de recurso, em relação ao arguido.

Notificado nos termos do artigo 417º, n.º 2, do CPP, o recorrente CC silenciou.

Colhidos os vistos, foi realizada, a requerimento dos arguidos JJ, KK e BB, audiência de julgamento, nos termos do artigo 435º do CPP.

Como é jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – vícios decisórios e nulidades referidos no artigo 410.º, n.ºs 2 e 3, do CPP – é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.
Questões a resolver

Para além da questão prévia da admissibilidade dos recursos, suscitada pelas arguidas BB e KK, são as seguintes as matérias a abordar:

I – Recurso dos arguidos JJ e KK
Medida da pena – Redução? - Conclusões 6ª a 16ª, quanto à arguida e 17ª a 24ª, no que toca ao arguido
II – Recurso do arguido CC
Medida da pena
III – Recurso da arguida BB
Tendo-se em conta a ordem da sua apresentação nas conclusões, são as seguintes as questões a apreciar e decidir:
1 – Alteração de qualificação jurídica – Convolação para crime de tráfico de menor gravidade? – conclusão II
2 – Cumplicidade – conclusão III
3 - Violação do princípio de livre apreciação da prova – conclusão IV
4 - Violação do princípio in dubio pro reo – conclusão V
5 – Medida da pena – conclusão VI
6 – Suspensão da execução da pena – conclusão VII
7 – Nulidade do acórdão recorrido por falta de exame crítico da prova e violação de disposições constitucionais – conclusões VIII a XII

Apreciando.

Questão Prévia

Admissibilidade dos recursos interpostos pelas arguidas KK e BB

A arguida KK nas conclusões 1ª a 5ª suscita a questão prévia da admissibilidade do recurso por si interposto.
A mesma questão é colocada pela arguida BB logo no início da motivação apresentada, embora depois não leve a questão às conclusões, o que não constitui impedimento de cognição até porque a questão é de conhecimento oficioso.
As arguidas KK e BB foram condenadas por acórdão do Colectivo de Macedo de Cavaleiros, de 9 de Julho de 2007, pela autoria de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º do DL 15/93, respectivamente, nas penas de 7 anos e de 7 anos e 6 meses de prisão, o qual veio a ser anulado por acórdão da Relação do Porto de 30-01-2008.
Em cumprimento do ordenado veio a ser elaborado novo acórdão pelo Colectivo de Macedo de Cavaleiros, datado de 13 de Maio de 2008, que repetiu aquelas penas, as quais na sequência de novo recurso vieram a ser reduzidas pelo acórdão da Relação do Porto, de 05-11-2008, para, respectivamente, 5 anos e 5 meses de prisão e 5 anos e 4 meses de prisão.
Face às medidas das penas aplicadas e à dupla condenatória conforme in mellius, poderia colocar-se a questão de saber se era admissível o recurso de uma e outra arguida, à face da nova lei.
A alteração legislativa de 2007 tem um sentido restritivo, circunscrevendo a admissibilidade de recurso das decisões confirmativas de condenações proferidas na 1ª instância às que apliquem pena de prisão superior a oito anos.
Com efeito, à luz do artigo 400º, n.º 1, alínea f), do CPP, na redacção dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, em vigor desde 15-09-2007, só é possível o recurso de decisão confirmatória no caso de a pena aplicada ser superior a 8 anos de prisão.
Sendo as penas aplicadas às arguidas de 5 anos e 5 meses e de 5 anos e 4 meses de prisão, é indubitável que não seriam admissíveis os recursos face à nova versão.
Todavia, a situação era diferente face à redacção anterior, em que se referia pena aplicável e não pena aplicada, por no caso se estar perante crime punível com pena de prisão superior a 8 anos, estando em causa um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01, a que cabe a moldura penal abstracta de 4 a 12 anos de prisão.
Estando-se perante situação de direito intertemporal, há que eleger o regime mais favorável ao arguido, uma vez que estamos face a exercício do direito ao recurso, no âmbito das garantias de defesa do arguido.
Estabelece o artigo 5.º do CPP, sob a epígrafe “Aplicação da lei processual no tempo”:
“1. A lei processual penal é de aplicação imediata, sem prejuízo da validade dos actos realizados na vigência da lei anterior.
2. A lei processual penal não se aplica aos processos iniciados anteriormente à sua vigência quando da sua aplicabilidade imediata possa resultar:
a) Agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente uma limitação do seu direito de defesa; ou
b) Quebra da harmonia e unidade dos vários actos do processo”.

Este preceito estabelece a regra tempus regit actum: a lei processual penal é aplicada a todos os actos processuais praticados a partir da sua entrada em vigor, salvaguardando-se os actos até então realizados, os quais mantêm plena validade (só assim não acontecendo em relação às normas processuais penais de natureza substantiva).
A prolação do acórdão ora recorrido, como aliás a daquele sobre que versou, teve lugar no âmbito da nova lei processual penal e esta é, em regra, de aplicação imediata, nos termos do mencionado artigo 5.º, n.º 1, sendo certo que “a lei processual penal não se aplica aos processos iniciados anteriormente à sua vigência quando da sua aplicabilidade possa resultar (…) uma limitação do seu direito de defesa”.
A propósito da questão da aplicação do direito intertemporal, no que respeita à lei processual aplicável no que tange a recorribilidade, nesta 3.ª secção entendia-se que seria de aplicar o anterior regime sempre que a decisão recorrida proferida na primeira instância o tivesse sido em data anterior a 15 de Setembro de 2007, por assim se mostrarem acautelados os direitos do arguido; de contrário, ficaria limitado o direito de defesa do arguido, por privado do direito ao recurso, que detinha à luz da antiga lei.
Neste sentido, enumeram-se, a título exemplificativo, os acórdãos desta secção de 22-11-2007, processo n.º 3876/07; de 19-12-2007, processo n.º 3857/07; de 23-01-2008, processo n.º 4641/07; de 06-02-2008, processos n.ºs 4633/07, 111/08 e n.º 117/08; de 20-02-2008, processos n.ºs 116/08, 4456/07, 4832/07 e 300/08; de 27-02-2008, processo n.º 3309/07; de 05-03-2008, processo n.º 100/08; de 12-03-2008, processo n.º 112/08; de 26-03-2008, processos n.ºs 105/08 e 444/08; de 02-04-2008, processo n.º 817/08-3ª; de 09-04-2008, processos n.ºs 113/08, 307/08 e 698/08; de 07-05-2008, processo n.º 294/08; de 28-05-2008, processo n.º 1147/08.
As secções criminais deste Supremo Tribunal convergiram para uma solução de compromisso, expressa no acórdão de 29-05-2008, processo n.º 1313/08-5ª, que no fulcro se reconduz à afirmação de que «é aplicável a nova lei processual à recorribilidade de decisão que na 1ª instância já tenha sido proferida depois da entrada em vigor dessa lei, independentemente do momento em que se iniciou o respectivo processo; a lei que regula a recorribilidade de uma decisão, ainda que esta tenha sido proferida em recurso pela Relação, é a que se encontrava em vigor no momento em que a 1ª instância decidiu, salvo se lei posterior for mais favorável para o arguido»; em sentido idêntico, podem ver-se, inter altera, os acórdãos de 05-06-2008, processo n.º 1151/08 - 5ª, com o mesmo relator do acórdão de 29-05-08, in CJSTJ 2008, tomo 2, pág. 251; de 05-06-2008, processo n.º 1226/08-5ª; de 12-06-2008, processo n.º 1660/08; de 18-06-2008, processos n.ºs 1624/08 e 1971/08-3ª; de 25-06-2008, nos processos n.ºs 449/08-3ª, 1312/08-5ª e 1779/08-5ª; de 10-07-2008, processos n.ºs 2146/08 e 2193/08-3ª; de 03-09-2008, processo n.º 2192/08 - 3ª ; de 10-09-2008, processo n.º 2506/08-3ª; de 22-10-2008, processo n.º 215/08-3ª; de 29-10-2008, processo n.º 2827/08-3ª; de 08-01-2009, processo n.º 2041/08-5ª; de 21-01-2009, processo n.º 2387/08-3ª; de 27-01-2009, processo n.º 4031/08-3ª e processo n.º 3854/08-5ª; de 04-02-2009, processo n.º 4134/08-3ª; de 11-02-2009, processo n.º 113/09-3ª; de 12-03-2009, processo n.º 3781/08-3ª; de 25-03-2009, processo n.º 610/09-5ª; de 29-04-2009, processo n.º 391/09-3ª.
O critério de atender à data da decisão da 1 ª instância foi adoptado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2009, de 18 de Fevereiro de 2009, processo n.º 1957/08-3ª, publicado no Diário da República, 1ª Série, n.º 55, de 19-03-2009, que uniformizou jurisprudência em caso de dupla conforme, em situação em que a decisão da 1ª instância foi proferida antes de 15 de Setembro de 2007, nos termos seguintes: «Nos termos dos artigos 432º, n.º 1, alínea b), e 400º, n.º 1, alínea f) do CPP, na redacção anterior à entrada em vigor da Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, é recorrível o acórdão condenatório proferido, em recurso, pela relação, após a entrada em vigor da referida lei, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão superior a oito anos, que confirme decisão de 1ª instância anterior àquela data».
No sentido de ser aplicável a lei processual vigente aquando do início do processo, pronunciaram-se os acórdãos de 20-02-2008, processo n.º 4838/07, de 12-06-2008, processo n.º 1524/08 e de 10-09-2008, processo n.º 1959/08, todos da 3ª secção - vejam-se nesse sentido os votos de vencido no citado Acórdão n.º 4/2009.
Para Germano Marques da Silva (Curso de Processo Penal, Verbo, 1996, I, pág. 96, nota 1), só se impõe a excepção do n.º 2, alínea a), do artigo 5.º do CPP “quando da aplicação imediata da nova lei resultar, no caso concreto, diminuição do direito de defesa do arguido, frustrando as expectativas da defesa relativamente à admissibilidade de certos actos de defesa que ficariam prejudicados pela aplicação imediata da nova lei”.
De acordo com tal posição é de ter em consideração no presente caso o regime processual em vigor à data da prolação da decisão na 1ª instância.
No caso presente, com contornos especiais, ponto é saber, face à existência de duas decisões de 1ª instância, se deverá atender-se à data da subsequente decisão válida, de 13 de Maio de 2008, ou antes à da primitiva decisão, de 9 de Julho de 2007, que foi anulada, sendo aplicável naquele caso a nova versão do artigo 400º, n.º 1, alínea f), do CPP, olhando-se às penas aplicadas, e neste o regime processual anterior, tendo em consideração a pena aplicável.
Por ter sido entendido pelo Tribunal da Relação do Porto que o primeiro acórdão padecia de vício, sendo nulo, por omissão de exame crítico da prova, foi determinada a repetição, em ordem a ser suprida a lacuna.
O suprimento veio a verificar-se já no domínio da nova versão do artigo 400º, do CPP, em 13-05-2008, o que não impede a aplicação da antiga versão de tal preceito.
Como se escreveu no acórdão de 12-03-2008, processo n.º 112/08, com o mesmo relator, em caso com alguma semelhança com o presente, havendo duas decisões de 1ª instância, entendeu-se que “o suprimento da detectada omissão de pronúncia pela Relação teve lugar já após aquela data (15-09-2007), sendo a omissão suprida já na vigência da nova lei, e exactamente porque o foi - porque disso houve necessidade - a aplicar-se a nova lei, ficaria coarctado o direito de o recorrente ver reapreciada a decisão condenatória nos termos propostos no recurso e que só o não foi então, porque uma questão de natureza adjectiva, não imputável ao recorrente, impediu, naturalmente, que o STJ se debruçasse sobre a sua pretensão recursória em toda a sua extensão e amplitude”.
Retomado o mesmo argumento no acórdão de 22-10-2008, no processo n.º 215/2008, onde se escreveu:
«Deslocando estas considerações para o presente caso, dir-se-á que apenas por força de ocorrência de um vício decisório no acórdão de 2005 detectado pela Relação no seu acórdão de 2006, que determinou o reenvio, prejudicando o conhecimento das demais questões postas pelo recorrente, é que estas não foram então analisadas.
Dito de outra forma, não tivesse ocorrido o referido vício de insuficiência e o acórdão da Relação teria cumprido a vinculação temática proposta no recurso, o que é dizer, teria o arguido visto o seu recurso plenamente apreciado pela Relação desde logo, podendo de seguida recorrer para o STJ.
Ora, se o arguido em nada contribuiu para a situação de não conhecimento global atempado, imediato, do seu recurso, mal seria que se visse expropriado do seu direito a uma apreciação pelo tribunal superior da sua discordância em relação ao decidido na primeira instância.
De qualquer modo, não obstante as divergências existentes sobre este ponto, desenha-se uma tendência que colhe consenso no sentido de aceitar que “a lei que regula a recorribilidade de uma decisão, ainda que esta tenha sido proferida em recurso pela Relação, é a que se encontra em vigor no momento em que a 1.ª instância decidiu, salvo se lei posterior for mais favorável para o arguido”, como se pode ler no acórdão de 29-05-2008, no processo n.º 1313/08, da 5.ª secção, ibidem»
No caso presente, o facto de ter havido a necessidade de reformular o acórdão de Macedo de Cavaleiros, de 9 de Julho de 2007, sendo que para a situação não contribuíram as arguidas, não poderá prejudicá-las, aferindo-se o seu direito ao recurso em função daquela primeira decisão e estando então em vigor o antigo regime processual, será de aplicar mesmo, o que conduz à afirmação de recorribilidade.
Pelo exposto, continuando a seguir-se esta orientação, declara-se a recorribilidade do acórdão recorrido, à luz do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, na versão anterior, conhecendo-se, assim, dos recursos das arguidas.

Da matéria de facto provada

Na enunciação da matéria de facto provada confrontámo-nos com alguma dificuldade decorrente de ter havido impugnação de matéria de facto, tendo ocorrido algumas modificações, optando o acórdão recorrido por inserir na íntegra os pontos de facto que foram alterados, mas não fazendo uma reprodução integral de toda a matéria de facto, na sua globalidade, de modo que temos a matéria de facto apurada “repartida” pelas duas decisões, oferecendo uma leitura sincopada, descontínua.
Daí que tenhamos ordenado a matéria de facto no seu contexto global, operando a conjunção dos dois textos, naquilo que tinham de definitivo, assinalando no texto final as modificações efectuadas pela Relação, procurando-se em nota prévia dar o enquadramento das alterações realizadas.
O acórdão da Relação do Porto procedeu à modificação da decisão sobre a matéria de facto, ao abrigo do disposto no artigo 431º do CPP, na sequência de impugnação, por parte da maioria dos recorrentes, da matéria de facto, nos termos do artigo 412º, n.º 3 e n.º 4, do CPP, o que fez de fls. 103 a 189, a que correspondem fls. 7967 a 8010 do processo.
Como, porém, o Tribunal da Relação optou por ir inserindo ao longo da decisão as modificações que ia decretando, sem fornecer uma imagem global final do que efectivamente ficou provado e não provado, sem dar o texto final, de modo a dar a possibilidade de uma leitura sequencial, optamos por ordenar a matéria de facto no seu contexto global, operando a conjunção dos dois textos, naquilo que tinham de definitivo, de modo a apresentar a matéria de facto tal como resultou do reexame feito pela Relação, assinalando no texto final as modificações efectuadas pela Relação, procurando-se em breve nota prévia dar conta das alterações feitas e seu enquadramento.

Nota I - Vejamos as alterações efectuadas pela Relação em sede de matéria de facto.
Recursos dos arguidos AA e BB
Estes recursos foram tratados de fls. 7970 a 7979, em resultado do que foi modificada, nos termos do artigo 431º do CPP, a decisão proferida sobre a matéria de facto quanto ao ponto I dos factos dados como provados e com o sequente aditamento aos factos que foram dados como não provados relativamente aos que foram afastados.

Recursos dos arguidos CC e GG.
Como se referiu acima, neste caso os recursos cingiram-se à análise da verificação dos vícios previstos no artigo 410º, n.º 2, do CPP e à invocação da violação dos princípios in dubio pro reo e da igualdade.
Os recursos foram analisados de fls. 7979 a 7982, sendo apenas determinada a eliminação, por se estar perante matéria conclusiva e irrelevante para a decisão da causa, do seguinte parágrafo constante dos factos provados: “Os arguidos de etnia cigana estão ligados entre si por estreitos laços familiares e no meio onde vivem são conotados com a prática de actos ilícitos”.

Recursos dos arguidos EE e FF
Estes recursos foram ponderados de fls. 7982 a 7995, sendo alterada, com base no artigo 431º do CPP, a redacção dos pontos II - a) e IV dos factos dados como provados, aditando-se aos factos não provados e para aqui transferindo o que foi na reapreciação dado por não provado.

Recurso da arguida HH.
Este recurso foi abordado de fls. 7995 a 8002 e nos termos do artigo 431º do CPP, foi modificada a decisão proferida sobre a matéria de facto, não só quanto a esta arguida como ao arguido GG, do que resultou a alteração do ponto V dos factos dados como provados, transferindo para o lote dos factos não provados o que assim foi considerado e expurgado do texto inicial.

Recursos dos arguidos JJ e KK.
Estes recursos foram apreciados de fls. 8002, in fine, a 8009 verso, e nos termos do artigo 431º do CPP, foi alterada a decisão proferida sobre a matéria de facto, modificando a redacção do ponto VII dos factos dados como provados, aditando aos factos não provados o que como tal foi considerado.

A fls. 8010 o acórdão da Relação do Porto elimina da matéria de facto dada como provada, para além da referência a etnia cigana já referida, o seguinte:
- Segundo parágrafo do ponto II dos factos dados como provados, a respeito do arguido CC “F....”, com o seguinte teor: «Pena que não lhe serviu de suficiente advertência para o afastar de voltar a enveredar pelo mesmo tipo de crime no tempo de até 5 anos após o cumprimento da condenação».
E ainda os dois seguintes parágrafos constantes do ponto XI dos factos dados como provados do acórdão de 1ª instância do seguinte teor:
«Os arguidos AA, CC “F....”, e GG, revelaram com a sua insistência e persistência no cometimento de factos idênticos e do mesmo tipo de crime, insensibilidade pela anterior condenação e pela pena de prisão que lhes foi aplicada e que efectivamente cumpriram, que não foi suficiente para os afastar da prática de novos crimes;
O arguido JJ com a sua conduta revelou de igual modo insensibilidade à condenação e em especial à pena efectiva de prisão que sofreu, e a mesma não foi suficiente para o afastar da prática de novos crimes como os ora em apreço, de diferente natureza mas ainda mais gravemente punidos e socialmente censurados».
Com a eliminação destes três parágrafos pretendeu o acórdão da Relação a exclusão da referência à conclusão de que as condenações anteriores sofridas respectivamente pelos arguidos AA, CC e JJ não foram suficientes para os afastar da prática de novos crimes.

Nota II - Na enunciação sequencial de factos dados como provados de I a XI, falta o X, saltando do IX para o XI, constituindo falha de origem, do acórdão da primeira instância, como se mostra de fls. 40 e 41 do mesmo (fls. 6995 e 6996 dos autos - volume 27º).

Nota III - Na enumeração dos factos assentes têm-se em consideração os textos modificados pelo acórdão ora recorrido, por força do artigo 431º do CPP, bem como se suprimiram os textos eliminados, apenas se deixando no local próprio essa indicação.
Como se anota ao fim de cada um dos pontos modificados, a matéria de facto que foi alterada e reformulada pela Relação é a que consta dos pontos de facto dados como provados sob os pontos I, II - a), IV, V e VII.
A eliminação pela Relação de trechos da matéria de facto dada como provada pela 1ª instância verificou-se em quatro parágrafos, a saber:
- segundo parágrafo no ponto II dos factos dados como provados; e
- os três parágrafos, que a finalizar o ponto XI dos factos dados como provados, antecediam o segmento final “Mais se provou”, conforme constavam de fls. 44 do acórdão do Colectivo de Macedo de Cavaleiros (fls. 6999 dos autos - volume 27º) e de fls. 64 na transcrição feita no acórdão ora recorrido (fls. 7947 verso dos autos).
Segue-se a enumeração dos factos provados na “versão final”, emergente das modificações levadas a cabo pela Relação do Porto.

FACTOS PROVADOS

“I- O arguido AA, também conhecido por “B....”, foi julgado no processo comum colectivo com o n.º 39/98 (actual nº 94/99.0TBTMC) do Tribunal de Circulo de Mirandela e condenado, por decisão transitada em julgado, na pena de 4 anos e 3 meses de prisão, por ter cometido até 15/05/1997 um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art.º 21º n.º 1 do DL 15/93 de 22/1, pena que expiou em 15/08/2001, data a partir da qual produziu efeitos a liberdade definitiva concedida pelo TEP.
Esteve preso em cumprimento dessa pena desde 15/05/1997 até 12/5/2000, data esta em que lhe foi concedida a liberdade condicional.
Não obstante essa condenação e prisão que cumpriu, pelo menos a partir de Outubro de 2005 e até à data da sua detenção (em 24/1/2006) e subsequente prisão preventiva à ordem destes autos, voltou a enveredar pela mesma actividade, comprando estupefacientes em quantidades que permitiam satisfazer as vendas a que procediam, chegando a atingir numa das vezes um valor da ordem dos 4.000 contos (ou seja, vinte mil euros), comprando principalmente a heroína a preço não superior a 30,00 € o grama e a cocaína a preço não superior a €40 o grama.
Entre outros fornecedores que não foi possível identificar, comprou heroína e cocaína a um tal OO que usava o telemóvel nº 0000000000 e chegou a comprar, em conjunto com outros indivíduos, como sucedeu com um que se identificava como “P.....”, que usava o telefone nº 0000000000.
Actividade que o arguido AA executava directamente por si e de comum acordo e em conjugação de esforços com a sua companheira, a arguida BB, consoante o que estivesse disponível (embora o arguido AA tivesse maior disponibilidade e assumisse a liderança desse negócio), vendendo a maior parte da droga a outros indivíduos, sabendo que estes a iriam voltar a vender por conta própria, mas também a vendendo directamente a consumidores.
E assim, entre outros que não foi possível identificar, forneceram os arguidos AA e BB estupefacientes, vendendo-lhes o grama de heroína a cerca de 40,00€ e o de cocaína a 60,00€, cientes de que estes iam revender, por conta própria, tais drogas aos consumidores que diariamente os procuravam para lhes comprar:
a)- ao co-arguido EE (conhecido por “M.......”), heroína e cocaína, e entre as outras vezes em que ocorreu contacto pessoal directo entre ambos (arguidos AA e EE), designadamente nas proximidades de Valverde ou mesmo nas imediações das casas do EE ou do AA, ou contactaram para fixar o ponto de encontro para entrega das drogas e recebimento do preço correspondente ou para dar instruções para ocultar os estupefacientes fornecidos, o que sucedeu na sequência de telefonemas que efectuarem para esse efeito em 16/10/2005; em 22/10/2005; em 30/10/2005; em 30/11/2005 e em 10/12/2005;
b)- ao co-arguido II, heroína para revenda por conta própria e uma pequena parte para ele mesmo consumir, o que aconteceu em 18/11/05, após prévio contacto telefónico com o arguido AA.
Quando vendiam, qualquer um dos dois arguidos (AA e BB) o fazia - consoante o que estivesse disponível (tendo o arguido AA maior disponibilidade e assumindo a liderança desse negócio) - directamente aos consumidores que para o efeito os contactavam, fosse pessoalmente na rua, em Moncorvo, na sua casa, nas feiras da região, fosse mediante prévio contacto telefónico para fazer a encomenda e marcar o encontro para a transacção, e por regra, faziam-no sempre em quantidades de gramas e nunca menos de meios gramas, que vendiam ao preço de €20 e de €30 respectivamente a heroína e a cocaína, e esporadicamente vendiam pacotes de €10 e €20 a clientes já conhecidos, se estes assim demandavam, e entre outros que não foi possível identificar, venderam também aos seguintes consumidores:
- PP em Outubro de 2005 pelo menos dois meios gramas de heroína;
- a QQ, que com um amigo, com quem foi comprar heroína, tendo dado 10,00 € pela sua parte;
- RR (também conhecido por “C........”), aos fins-de-semana desde uma dose de 10,00 € até 0,5 gramas de 20,00 €, desde Outubro de 2005, designadamente, em 28/11/2005, em 8/01/2006, em 15/01/2006, em 16/01/2006 e em 19/1/2006;
- SS (também conhecido por “ P.... do C....”), pelo menos dois meses antes da detenção dos arguidos, uma embalagem de 0,5 gr de heroína por 20,00€ que foi fornecida pelo arguido AA;
- TT, durante dois meses em 2005, que através do “T....” que usava o seu telemóvel para contactar o arguido AA e lhe ia comprar um ou dois pacotes de 10,00 € de heroína;
- UU (também conhecido por “N...”) que usou os telefones 000000000 e 000 000 000 pelo menos 0,5 gr de heroína em 10/12/05 e em 7/12/2005, falando previamente com o arguido AA para esse efeito;
- Em 8/1/06 a arguida BB deu a um L.... um bocadinho de droga, e o VV, pelo menos em Janeiro de 2006 encomendou cocaína ao AA.

Pelas 11,30 horas de 24/01/2006 foi o arguido AA detido, tendo-lhe sido encontrados e apreendidos: o telemóvel preto da marca Samsung modelo SGH com o IMEI 0000000000000, que também usava para estabelecer os contactos para comprar e vender os estupefacientes; o veículo ligeiro de mercadorias da marca Ford, modelo Transit, azulado, com a matrícula ..-..-.. no valor de 3000,00€ sua pertença, examinado, avaliado e fotografado a fls. 1793/1794, no qual se deslocava para comprar e para vender e no qual transportava as drogas; a navalha com cabo de madeira de 8,3cm de lamina, usada para cortar e misturar os estupefacientes; e a quantia total de € 4.505 (quatro mil quinhentos e cinco euros), (sendo 73 notas de €5, 117 notas de €10, 101 notas de €20, 15 notas de €50 e 2 notas de €100), que estava escondida no tablier do veículo, que provinha da venda dos estupefacientes.
Foi também apreendida mercadoria (destinada à venda nas feiras), que se encontrava no interior daquele veículo, a qual posteriormente foi entregue aos arguidos.
Também foi apreendido o saldo, no valor de € 0,82, existente em conta bancária aberta na CGD.
Para além da actividade descrita, os arguidos agindo de comum acordo e em conjugação de esforços, deslocavam-se, por vezes em conjunto, para fazer as entregas de estupefacientes, fazer as compras, verificar a qualidade, transportar e guardar as drogas e a ajustar e receber os preços, como sucedeu, pelo menos em 13/01/2006 e em 22/01/2006.

O arguido AA frequentou o 5º ano de escolaridade, e fez transplante renal há 13 anos;
O arguido e a arguida BB “casaram” segundo a lei da etnia cigana e têm três filhos menores, viviam em casa própria, fazendo as feiras da região;
Viviam sem dificuldades económicas, essencialmente com os lucros provenientes da compra e venda de estupefacientes, embora também usufruíssem dos rendimentos da actividade de feirantes que também desenvolviam, contando ainda com apoio dos familiares;
Um filho frequenta a escola e outro o infantário, e a mais nova está com a arguida;
O arguido tem mantido no EP comportamento normativo e tem os antecedentes criminais que constam do seu CRC junto aos autos;
A arguida não frequentou a escola;
A arguida não tem antecedentes criminais. (Texto modificado pela Relação).

II - O arguido CC “F....” foi julgado no proc. comum colectivo com o n.º 13/98 do TJ de Trancoso tendo sido condenado por acórdão de 5/5/1998 na pena de 7 anos de prisão por ter cometido até 4/4/1997 um crime de tráfico de estupefacientes, pena de prisão que expiou em 6/4/2004, data em que o TEP lhe concedeu a liberdade definitiva.(seguia-se parágrafo eliminado pelo acórdão da Relação).
Não obstante essa condenação e a execução da prisão, voltou o arguido “F....”, ainda em 2004 e até que foi detido e preso preventivamente à ordem destes autos (em 24/01/2006), a enveredar pela compra e venda de estupefacientes, em especial de heroína e de cocaína que adquiria, pelo menos na ordem de 500 gramas, a preços que rondavam os 30,00€ a grama de heroína e de 40,00 a grama de cocaína a indivíduos que não foi possível identificar e que, de seguida, misturava com outros produtos para lhes aumentar o peso e o volume para assim potenciar os lucros visados e que logo depois vendia a alguns revendedores para que estes vendessem aos consumidores desta região ou que por aqui passam temporariamente, e entre outros que não foi possível identificar, vendeu e forneceu, sempre em quantidades entre meio a vários gramas, principalmente heroína mas também cocaína ainda que em quantidades menores, sendo a primeira ao preço de €40 e a segunda a €60 a grama, pelo menos a:
a)- ao co-arguido EE, também conhecido por “M.......”, desde pelo menos Agosto de 2005 e até que este foi detido, em 24/01/2006, heroína e cocaína, chegando a atingir pelo menos as 150 doses de cada vez e, entre outras entregas, ocorridas através de contacto pessoal directo, designadamente nas imediações da casa do arguido EE e nas imediações de Valverde, onde o arguido CC se deslocava propositadamente para lhe entregar os estupefacientes e dele (arguido EE) receber o preço ajustado, o que ocorreu na sequência de contactos que efectuaram para esse efeito em 12/08/2005; em 13/08/2005; em 15/08/2005; em 17/08/2005, em 17/08/2005; em 20/08/2005; em 21/08/2005; em 22/08/2005; em 23/08/2005; em 26/08/2005; em 31/08/2005; em 2/09/2005; em 13/09/2005; em 18/09/2005; em 26/09/2005; em 24/09/2005; em 26/09/2005; em 29/09/2005; em 30/09/2005; em 5/10/2005; em 6/10/2005; em 11/10/2005; em 17/10/2005; em 18/10/2005; em 23/10/2005; em 12/12/2005; em 13/12/2005; em 23/12/2005; em 24/12/2005; em 3/01/2006 e em 19/01/2006 (texto da alínea a) modificado pela Relação);
b)- ao co-arguido DD, pelo menos desde Setembro de 2005 até que este foi detido em 25/01/2006, uma ou duas vezes por semana entre 3 a 10 gramas de heroína e entre outras vezes na sequencia de contacto pessoal directo tal sucedeu também 30/09/2005; em 8/10/2005; em 18/10/2005; em 27/10/2005; em 7/11/2005; em 15/11/2005; em 17/11/2005; outra vez em 17/11/2005; em 22/11/2005; em 24/11/2005; em 30/11/2005; em 5/12/2005; em 27/12/2005 e em 9/01/2006, e com vista a que vendesse droga por sua conta, o que aconteceu desde 15/11/05;
c)- ao co-arguido II, vendeu heroína em 26/11/05 que o contactou para o efeito;
d)- ao seu irmão ...., algumas vezes heroína normalmente assim sucedia para cobrir as faltas deste, por regra através de contacto pessoal directo o que aconteceu pelo menos em 8/10/2005, 5 gramas de heroína, num dos dias antecedentes a 17/10/2005 e também em 7/11/2005 que lha foi buscar;
e)- ao XX e, “o carteiro” de Foz Côa, algumas vezes, desde pelo menos 22/11/05 entre 3 e 10 gramas de heroína de cada vez, o que aconteceu em 22/11/2005 e em 23/11/2005 heroína e cocaína e em 29/11/2005, vendendo por conta daquele;
d)- ao ZZ, desde pelo menos Dezembro de 2005 várias vezes por mês entre 5 a 10 gramas de heroína e entre 2 a 5 gramas de cocaína, o que aconteceu também em 3/12/2005; em 4/12/2005; em 7/12/2005; e também para seu consumo;
e)- ao AAA “T...” de Moncorvo que para os contactos usou o telm. 00000000000, até dez gramas de heroína de cada vez e pelo menos em 28/09/2005; em 29/09/2005; e em 6/10/2005, vendendo por conta daquele e de quem recebia prendas;
O arguido foi contactado por um individuo cujo nome não foi possível determinar mas que utilizando o telemóvel com o n.º 0000000000 em 29/12/2005, propôs-se adquirir-lhe para revenda e de uma só vez, 500 gramas de heroína;

O arguido CC “F....” também vendia directa, diária e intensamente aos consumidores que para o efeito o procuravam fosse em Foz Côa, fosse em Moncorvo ou fosse em qualquer dos outros concelhos da região sul deste distrito.
Vendia-lhes quase sempre porções de meios gramas e de gramas sendo o meio grama de heroína ao preço de €20 e a de cocaína ao preço de €30 e a grama a €40 e €60, respectivamente.
Entre muitos outros que não foi possível identificar vendeu, até à data da sua detenção em 24/1/2006, também aos seguintes consumidores:
- PP, pelo menos duas vezes em Setembro/Outubro de 2005, meios gramas de heroína nos dias 26/09/2005 e 22/10/2005;
- UU, “N...”, “o agente de seguros”, pelo menos em 25/9/05, dois meios gramas de heroína para ele e para a M...a;
- VV, pelo menos três meios gramas de heroína em 21/01/2006;
- QQ, de Janeiro a Dezembro de 2005, de dois em dois dias em regra 0,5 gramas de 20,00 € mas até 2 meios gramas de cada vez, e tal aconteceu também em 26/9/2005; em 14/11/2005 e em 8/12/2005;
- BBB de Junho a Outubro de 2005 de vez em quando 0,5 gramas de heroína, incluindo 25/10/05;
- CCC, de 15 em 15 dias um pacote de heroína de 20,00 € e também em 26/09/2005; em 22/01/2006;
- DDD, desde Setembro de 2005, heroína até às duas gramas e designadamente em 25/09/2005; em 22/10/2005; em 15/11/2005; em 16/11/2005 e em 26/12/2005;
- EEE, meio grama de heroína em 24/09/2005, em 18/10/2005 e em 19/01/2006;
- FFF, durante seis meses antes de serem presos pelo menos uma vez por semana meio grama de heroína de cada vez, incluindo em 4/11/2005;
-GGG, durante três meses antes de presos cerca de duas vezes por semana, heroína entre 10 e 20,00 € e por vezes cocaína incluindo em 5/12/2005 e em 8/12/2005
- HHH pelo menos uma grama de heroína e 1 grama de cocaína em 30/11/2005;
- III, em 2004 durante cerca de 3 meses meio grama de heroína (20,00 €) e cocaína incluindo em 15/11/2005 e em 4/12/2005 com um colega 0,5 grama de cada;
- JJJ, desde Setembro de 2005, 50,00 € de heroína 2 a 3 vezes por semana que ia comprar com o ZZ, e em 27/12/05 três gramas de cocaína e 0,5 gr de heroína;
- KKK, pelo menos em 31/10/05 três meios gramas de heroína e contactou-o para o mesmo efeito em 27/12/05;
- LLL, “ P..... do C.......” pelo menos 0,5 gramas de heroína em 27/09/2005 e em 28/09/2005;
- XX, “o carteiro”, e para além das situações de revenda já referidas, ainda lhe vendeu em 25/09/2005 quatro meias gramas de heroína; em 4/10/2005 três meias gramas de heroína; em 9/10/2005 duas meias gramas de heroína; em 10/10/05 duas meias gramas de heroína; em 12/10/2005 uma grama de heroína; em 13/10/2005 duas meias gramas de heroína; em 19/10/2005 duas gramas de heroína; em 4/11/2005 uma grama e meia de heroína; em 11/11/2005 duas gramas de heroína; em 13/11/2005 duas gramas de heroína; em 14/11/2005 uma grama de heroína; em 17/11/2005 uma grama de heroína;
- MMM, que lhe comprou 0,5 grama de heroína de cada vez após contacto telefónico, enviando ao encontro um amigo, pelo menos durante quatro meses em 2005;
- QQQ, desde, pelo menos Outubro de 2005, desde 1 grama até 2,5 gramas de heroína designadamente em 4/10/2005; em 12/10/2005; em 19/10/2005; em 29/10/2005; em 7/11/2005; em 12/11/2005 e em 22/11/2005 ;
- NNN, desde Setembro de 2005 heroína e designadamente em 26/09/2005 quatro meias gramas de heroína; em 10/10/2005 duas gramas e meia de heroína e também em 27/10/2005;
- TT, pelo menos em Novembro de 2005 heroína e designadamente em 7/11/2005 duas gramas e em 22/11/2005;
- OOO, “l...a”, em 2005 durante um mês e meio heroína entre 10,00 a 20,00 € deslocando-se ao IP2;
- PPP, desde Setembro de 2005 de meia grama até 5 gramas de heroína e designadamente em 25/09/2005; em 1/10/2005; em 4/10/2005; em 10/10/2005; em 21/10/2005; em 16/11/2005; em 5/12/2005; em 7/12/2005;
- RRR, “C....”, meia grama de heroína em 24/09/2005;
- a um individuo que se identificou por Russo e que para contactar o arguido usou o telem. 00000000, e lhe comprou em 23/09/2005, 3 meias gramas de heroína; em 4/10/2005, outras tês meias gramas; em 5/10/2005, cinco meias gramas; em 12/10/2005, uma grama; em 20/10/2005, três gramas; em 20/11/2005, mais três gramas; em 27/12/2005
- a um individuo que se identificou por Bragança e que para contactar o arguido usou o telef. 0000000 e o telem. 00000000, que lhe comprou em 23/09/2005, uma grama de heroína e outra de cocaína; em 1/10/2005, uma grama de heroína; em 4/01/2006, duas gramas de heroína e duas gramas de cocaína;
- a um individuo que se identificou por “o de La.....”, aldeia de Freixo de Espada-à-Cinta, que tem um Audi A4 e que para contactar o arguido usou os telemóveis 00000000, 0000000, 00000000 e 00000000, que lhe comprou em 25/09/2005, três meias gramas de heroína ; em 28/9/2005, meia grama de heroína; em 18/10/2005, meia grama de heroína; em 17/12/2005; em 4/1/2006, três gramas de cocaína e duas meias gramas de heroína;
- a um individuo que se identificou por “cunhado do C....” e que para contactar o arguido usou o telem. 00000000, que lhe comprou em 25/09/2005 heroína;
- SSS “o b....”, em 25/09/2005, uma grama de heroína;
- a um individuo que se identificou por “E.....” e que para contactar o arguido usou o telem. 000000000, em 26/09/2005, duas meias gramas de heroína;
- a um individuo que se não identificou mas que para contactar o arguido usou o telem. 0000000 em 1/10/2005 duas gramas de heroína;
- a um individuo que se identificou por “P...o” e que para contactar o arguido usou os telef. 0000000000 (cabine pública em Foz Côa) e o telm. 00000000, em 7/10/2005, duas meias gramas de heroína; em 0000000000, seis meias gramas de heroína
- a um individuo que se identificou por L... e que para contactar o arguido usou o telem. 0000000000 e o telef. 000000000, em 26/09/2005 heroína; em 4/10/2005 heroína;
- a um individuo que se identificou por “Zé” e que para contactar o arguido usou o telef. 000000000 (cabine pública de Foz Côa), em 1/11/2005, duas gramas de heroína;
- a um individuo que se identificou como sendo “o do 307” e que para contactar o arguido usou o telef. 0000000 e o telem. 000000000, em 4/10/2005, meia grama de heroína; em 11/11/2005, duas gramas de heroína;
- a um individuo que se identificou por “S........” e que para contactar o arguido usou o telem. 000000000 em 12/10/2005, quatro meias gramas de heroína
- a um individuo que se identificou por J..... e que para contactar o arguido usou o telem. 00000000, em 20/11/2005, uma grama e meia de heroína;
- a um individuo que se identificou como sendo “o de M........” e que para contactar o arguido usou o telem. 000000 e o telef. 0000000000, em 3/12/2005. uma grama de cocaína por 60,00 € e em 7/12/2005, cinco meias gramas de cocaína e duas meias gramas de heroína;
- a um individuo que se identificou como sendo “primo do P...... da M...” e que para contactar o arguido usou o telem. 00000000, em 4/12/2005, meia grama de heroína;
- a um individuo que se identificou como sendo “o do Mitsubishi” e que para contactar o arguido usou o telef. 0000000 em 6/12/2005 heroína e cocaína;
- a um individuo que se identificou como sendo o “engenheiro de F.......” e que para contactar o arguido usou o telem. 00000000000 e o telef. 0000000000 em 13/12/2005 heroína e em 20/12/2005 cocaína;
- a um individuo que se não identificou mas que para contactar o arguido usou o telem. 000000000, em 27/12/2005 heroína
- a um individuo que se identificou por “o francês” e que para contactar o arguido usou o telef. 0000000000, em 29/12/2005, grama e meia de heroína;
- a um indivíduo que se identificou com sendo “o rapazito do A4” e que para contactar o arguido usou o telem. 00000000, em 18/10/2005, meia grama de heroína;
- Paulo, filho do sr. A........, que para contactar o arguido usou o telem. 00000000, em 27/12/2005 heroína;
- a um indivíduo que se identificou por M.....l, que para contactar o arguido utilizou o telef. 0000000000, em 15/11/2005 heroína
O arguido deslocava-se nos seus veículos abaixo identificados incluindo o Opel Vivaro, para fazer as entregas de droga, heroína e cocaína, após prévio contacto com os consumidores que o aguardavam no local combinado normalmente com os seus veículos, como aconteceu entre as 19,10 h e as 24 horas do dia 6/1/06, com os veículos Peugeot 306 com a matrícula ..-..-..; outro com a matrícula ..-..-..; outro com a matrícula ..-...---; e os veículos com as matriculas ........, ..-..-.. e ..-..-..;
Pelas 17,40 horas de 24/01/2006 foi o arguido CC “F....” detido tendo-lhe sido encontrados na mão esquerda cinco pacotes de heroína embrulhados em plástico, com o peso liquido de 4,600 gramas e tinha ainda consigo €104 (sendo 2 notas de €10, 4 notas de €20 e 4 moedas de €1) e um fio em ouro com crucifixo, heroína, numerário e fio estes provenientes da venda de drogas, que se apreenderam;
Para ir comprar, para transportar e para ir entregar os estupefacientes que traficava deslocava-se o CC “F....”, de Foz Côa, onde residia, aos locais previamente acordados para as transacções, fazendo uso dos seus veículos: ligeiro de passageiros da marca Volvo, modelo 480ES, preto, com a matrícula ..-..-.., examinado e fotografado a fls. 1791/1792 e sem valor comercial, e de mercadorias da marca Opel, modelo Vivaro, branco, com a matrícula ..-..-.. examinado e fotografado a fls. 1789/1790 no valor de 5000,00 €, e para contactar e ser contactado por vendedores, revendedores e compradores e acertar os pontos do encontro e até as transacções, servia-se do telemóvel da marca Alcatel, dos dois Panasonic e do Siemens, nos quais usava o cartão com o n.º 0000000.
No compartimento da porta do condutor do Opel ..-..-.., foram encontrados e apreendidos em 14/6/06, dois panfletos de heroína com o peso liquido de 0,781 gramas, ali deixados pelo arguido;
Veículos e telemóveis que, por isso, foram apreendidos, tendo o Opel Vivaro sido posteriormente entregue á Finicrédito;
Na busca domiciliária judicialmente autorizada à residência do arguido “F....” e da sua companheira F............, em Foz Côa foi encontrado e apreendido: na sala, em cima da mesa, um saco plástico de hipermercado com vários recortes de forma circular destinados a embrulhar as drogas, uma faca de cozinha e um telemóvel da marca Siemens; na cozinha, a balança de precisão da marca Ufesa com resíduos de heroína e de cocaína, objectos que se apreenderam por terem sido usados para acondicionar, pesar, misturar e partir os estupefacientes e o telemóvel para estabelecer contactos para as transacções.
Foi apreendida a pistola da marca W...... de calibre 6,35mm carregada com 6 munições do mesmo calibre e outras 9 munições de igual calibre propriedade de TTT;

O arguido completou o 4º ano de escolaridade no EP, até á idade de 18/19 anos em que casou segundo as regras da etnia cigana deslocava-se com os pais pelas diversas localidades do país fazendo feiras;
Goza de situação económica desafogada proveniente da actividade de compra e venda de estupefacientes;
Casou com UUU, entretanto falecida, tendo 3 filhos menores a cargo dos avós maternos e conta com o apoio familiar;
Tem os antecedentes criminais que constam do seu CRC junto aos autos;

III - O arguido DD era consumidor viciado de heroína e veio a aperceber-se que havia muita procura de drogas e que era fácil vender e ganhar dinheiro.
Com o desígnio de sustentar o seu próprio vício e de conseguir lucros fáceis para os gastos pessoais e viver sem ter emprego remunerado certo, pelo menos a partir de Setembro de 2005 e até que foi detido em 24/01/2006, passou a adquirir regularmente, uma ou duas vezes por semana entre três a dez gramas de heroína ao “ F....” para vender, dividindo por norma cada grama em, pelo menos, 9 pacotes, que acondicionada em doses individuais, pacotes, que vendia a €10 cada aos vários consumidores que para o efeito o procuravam directa e pessoalmente em Moncorvo ou através de prévio contacto telefónico.
Entre outros que não foi possível identificar vendeu pacotes de heroína aos seguintes consumidores:
- TT várias vezes, pelo menos, durante um mês, um ou dois pacotes de heroína de cada vez, a 10,00 € cada
- VVV pelo menos no final de 2005 um pacote de heroína;
- J...., heroína pelo menos uma vez em 17/11/05
RRR, “ canudo” heroína uma ou duas vezes em Dezembro de 2005;
Pelas 12,30 horas de 25/01/2006 foi o arguido detido e na busca domiciliária judicialmente autorizada feita ao seu quarto, na casa de seus pais, em Moncorvo, foi encontrado e apreendido o telemóvel da marca Nokia modelo 5110, que utilizava para estabelecer os contactos com o fornecedor (o “F....”) e com os compradores dos estupefacientes que vendia.
O arguido é toxicodependente anda em tratamentos desde 1999, tendo feito diversas desintoxicações e programas de recuperação e nenhuma delas surtiu efeito;
Não se encontra a fazer qualquer tratamento á toxicodependência;
Nunca manteve uma ocupação laboral de modo regular, e frequentou o 11º ano de escolaridade;
Vivia com os pais, gozando da situação económica desafogada destes, que lhe prestam o apoio de que carece e mantém um comportamento adequado na prisão;
É dotado de uma personalidade próxima da delinquência, pouca responsabilidade, auto-desculpabilização, com comportamento instável e imaturo e com acentuada conduta manipuladora
Pretende continuar a estudar;
Não tem antecedentes criminais.

IV - O arguido EE, também conhecido por “M.......”, foi julgado, entre outros processos, no NUIPC 221/03.4GBTMC – comum colectivo - do Tribunal Judicial de Alfandega da Fé, tendo sido condenado por acórdão datado de 25/5/2004, transitado em julgado, na pena de 10 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, por ter cometido em 22/9/2003 um crime de detenção ilegal de arma de fogo. EE Luciano foi absolvido do crime de tráfico que lhe era imputado.
Desde pelo menos Agosto de 2005 e até que foi detido, em 24/01/2006, que o arguido EE vinha comprando heroína e cocaína ao arguido CC (também conhecido por “F....”) e ao arguido AA (também conhecido por “B....”), este desde pelo menos Outubro de 2005, que transportava, guardava, acondicionava e dividia, regra geral em “pacotes” mas que também em maiores quantidades desde meio grama, um grama ou até mais, sempre que para essas quantidades tinha demanda, e que vendia diariamente aos consumidores que para o efeito o procuravam em Valverde, Alfandega da Fé, ao preço de €10 ou de €20 cada pacote, respectivamente de heroína e de cocaína;
Entre outros que não foi possível identificar e que o contactaram pessoalmente ou por telefone para os seus telemóveis com os nºs 000000000 e 00000000 vendeu heroína e cocaína aos seguintes compradores e consumidores:
- ZZZ, desde Agosto de 2005, pelo menos um pacote de heroína de 10,00 € designadamente em 12/8/2005; em 13/08/2005; em 14/08/2005; em 21/8/2005; em 26/08/2005; em 31/08/2005; em 14/09/2005; em 17/09/2005; em 24/09/2005; em 29/09/2005; em 30/09/2005; em 15/10/2005; em 20/10/2005; em 26/10/2005; em 6/11/2005; e em 2/12/2005;
- RR (conhecido por “C..............”), pelo menos uma dose de heroína de 10,00 € de cada vez, designadamente em 26/09/2005; em 29/09/2005; em 1/10/2005; em 6/10/2005; em 30/11/2005;
- AAAA (conhecido por “P.....”) cerca de três vezes uma ou duas doses de heroína, nomeadamente em 18/09/2005 e em 4/12/2005;
- BBBB (também conhecida por “R.....”), desde o verão de 2005, várias vezes heroína uma ou duas doses de 10,00 € de cada vez, designadamente em 7/09/2005; em 15/09/2005; em 25/09/2005; em 29/09/2005; em 10/10/2005; em 11/10/2005; em 13/10/2005 e em 21/10/2005;
- CCCC (também conhecido por “B......), desde o verão de 2005 heroína, desde uma dose até 0,5 grama, designadamente em 13/08/2005; em 23/08/2005; em 16/11/2005; em 3/12/2005 e em 10/12/2005;
- DDDD (também conhecido por “Z.......”), uma dose de 10,00 € heroína, uma vez em 2005, em casa dele;
- EEEE (também conhecido por “B......”), durante cerca de seis meses antes de preso, três a quatro vezes por semana, heroína, uma ou duas doses de 10,00 € cada, designadamente em 13/08/2005; em 14/08/2005; em 26/08/2005; em 5/09/2005; em 5/10/2005; em 2/12/2005;
- FFFF (também conhecido por “Q....”), pelo menos três doses de heroína de cada vez, designadamente em 25/08/2005; em 15/09/2005; em 11/10/2005; em 14/10/2005; em 17/10/2005; em 18/10/2005; em 19/10/2005; em 20/10/2005; em 12/11/2005;
- GGGG, pelo menos heroína em 18/10/2005;
- HHHH (também conhecido pelo “o do N.......) heroína em 19/08/2005 e em 25/08/2006;
- IIII (também conhecido por “S......”), desde Dezembro de 2005, durante cerca de um mês quase diariamente 20,00 € de heroína, designadamente em 16/12/2005; em 5/1/2006 e em 8/01/2006;
- JJJJ (conhecido por “P....”), heroína, pelo menos em 25/08/2005; em 1/9/2005; em 15/11/2005 e em 8/12/2005;
- a um indivíduo que se identificou por J...., e que para contactar o arguido utilizou o telemóvel 00000000, heroína em 12/8/05;
- a um indivíduo que se identificou por “o 37”, e que para contactar o arguido utilizou o telemóvel 0000000 e os telefones nºs 00000000, 0000000, heroína pelo menos em 13/08/2005; em 15/08/2005; em 19/08/2005 e em 21/08/2005;
- a um indivíduo que se identificou por “C...........”, e que para contactar o arguido usou telemóvel com os nºs 0000000, 00000000 e os telefones nºs 0000000 e 00000000, pelo menos uma e três doses de heroína, designadamente em 14/09/2005; em 18/09/2005; em 18/09/2005; em 3/10/2005; em 5/10/2005; em 10/10/2005; em 11/10/2005; em 18/10/2005; em 22/10/2005;
- KKKK (também conhecido por “Lisboa”), pelo menos até duas doses de heroína e cocaína, designadamente em 5/09/2005; em 17/09/2005; em 19/01/2006; em 24/09/2005; em 27/09/2005; em 9/10/2006; em 4/12/2005; em 10/01/2006 e em 19/01/2006;
- LLLL, heroína pelo menos em 19/08/2005; em 14/09/2005 e em 26/09/2005;
- a um indivíduo que se identificou como “C......., o do ......, de M.....”, e que para contactar o arguido usou o telefone nº 0000000, heroína pelo menos em 16/11/2005, em 30/09/2005 e em 3/10/2005;
- indivíduo que se identificou como sendo “o rapaz da carrinha cinzenta”, e que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 000000000, heroína pelo menos em 21/08/2005 e em 24/08/2005;
- um indivíduo que se identificou como sendo “o xavalo da carrinha branca”, e que para contactar o arguido usou o telefone nº 00000000, heroína em 19/08/2005;
- a um indivíduo que se identificou por F............r, e que para contactar o arguido usou o telefone nº 00000000, heroína em 20/08/2005;
- a um indivíduo que se não identificou, mas que para contactar o arguido usou o telemóvel 0000000, heroína em 20/08/2005;
- a um indivíduo que se identificou como sendo “o rapaz do Audi A3, o C.....”, e que para contactar o arguido usou o telefone 000000000 e o telemóvel 0000000, heroína em 14/09/2005; em 26/9/2005; em 4/10/2005 e em 12/10/2005;
- a um indivíduo que se identificou como sendo “o do B … o do carro preto”, e que para contactar o arguido usou o telefone 00000000, heroína em 15/9/05;
- ao enfermeiro amigo do ZZZ, heroína em 21/8/05;
-MMMM, que para contactar o arguido usou o telemóvel 000000, heroína em 21/01/2006;
- a um indivíduo que se identificou por “B........”, e que para contactar o arguido utilizou telemóvel 00000000 e o telefone 00000000, heroína em 12/10/2005; em 17/10/2005 e em 11/11/2005;
- indivíduo que se identificou por B......, que trabalha no hospital, reside na B....... em Macedo de Cavaleiros, e que para contactar o arguido usou o telefone 000000000, heroína em 7/10/2005;
- indivíduo que se identificou por “B...”, e que para contactar o arguido usou os telemóveis 000000000, 000000000 e 00000000, heroína em 8/10/2005; em 9/10/2005 e em 15/10/2005;
- ao arguido NN, conhecido por “o E.........”, pelo menos desde o Verão de 2005 vendeu-lhe para revenda por conta própria e para o próprio consumo heroína e cocaína, designadamente em 11/07/2005; em 8/07/2005, em 28/07/2005, em 31/7/2005; em 7/08/2005; em 16/08/2005; em 17/08/2005; em 20/08/2005; em 25/08/2005; em 14/10/2005; em 4/12/2005; em 6/12/2005; em 22/12/2005; em 3/01/2006 e em 20/01/2006;
Agindo de comum acordo e em conjugação de esforços com o seu companheiro EE (que era quem desenvolvia a actividade de compra e venda de estupefacientes nos moldes acima descritos), em execução dessa mesma decisão, por ele então não estar disponível, a arguida FF atendeu os seguintes consumidores:
- BBBB a (conhecida por “R.....x”), a quem entregou uma dose de heroína em 5/10/05;
- ZZZ, a quem pelo menos em 10/12/2005 proporcionou, com a ajuda da filha e de um tal Z....(cujos demais elementos de identificação se desconhecem), uma dose de heroína pelo preço de 10,00€;
- EEEE “B....o”, a quem em dia não concretamente apurado mas situado entre Agosto de 2005 e 24/1/2006, mandou ir buscar heroína a determinado local que lhe indicou, o que aquele fez deixando nesse local o preço correspondente, ou seja, 10,00€.
Pelas 17,30 horas de 24/01/2006 foram os dois arguidos detidos e revistados tendo sido encontrado em poder do arguido EE um telemóvel da marca Siemens, azul, que usava para estabelecer contactos com fornecedores e consumidores de droga e a quantia de €85,00, proveniente da venda de estupefacientes.
Na busca judicialmente autorizada à respectiva residência acima referida, foram encontrados e apreendidos: na cozinha € 350,00; no quarto do casal dois telemóveis da marca Nokia - um esverdeado e o outro preto e azul -, um cartão TMN, a quantia de € 20,50 em moedas e um papel com várias contas.
Esses telemóveis e cartão foram apreendidos por serem usados pelo arguido EE para estabelecer os acima mencionados contactos; igualmente o numerário foi apreendido por ser proveniente da venda de estupefacientes.
Foi apreendido o saldo de €490,86 existente à data na conta 0000000000, aberta em nome da arguida FF, na agência de Alfandega da Fé da CGD.
O arguido EE, tem a 4ª classe da instrução primária, vive com a arguida FF em união de facto, em casa da família, e têm dois filhos menores de 14 e 9 anos, ora entregues aos cuidados da avó materna e uma tia paterna.
O arguido trabalhava esporadicamente na limpeza da floresta, é de humilde condição social e educado.
Tem mantido comportamento normativo na prisão onde frequenta um curso de canalização.
A arguida FF é de humilde condição social e dedicava-se às lides domésticas e a tratar dos filhos.
Encontrava-se laboralmente inactiva.
A mãe da arguida é portuguesa e foi com ela que a arguida sempre viveu e lidou desde que nasceu até passar a viver com o arguido EE
Aquando da sua detenção, a arguida FF tinha-se zangado com o companheiro - por este na altura andar a ingerir bebidas alcoólicas em excesso - e encontrava-se, juntamente com os filhos, temporariamente em casa da mãe.
No EP a arguida FF concluiu o 1º ciclo do ensino básico e frequenta um curso de jardinagem.
A arguida FF não tem antecedentes criminais.
Desde Agosto de 2005 até à data da sua detenção, o arguido EE sustentava o respectivo agregado familiar (composto pela mulher e pelos dois filhos menores) essencialmente com os lucros provenientes da actividade de compra e venda de estupefacientes que desenvolvia nos moldes acima indicados, embora também usufruísse de rendimento proveniente de trabalho esporádico que fazia na limpeza da floresta.
O arguido tem os antecedentes criminais que constam do seu CRC junto aos autos. (texto modificado pela Relação).

V- No proc. comum colectivo n.º 39/98 (actual nº 94/99.0TBTMC) do Tribunal de Círculo de Mirandela, por acórdão do STJ de 10/3/1999, transitado em julgado, foi o arguido GG(também conhecido por “C.....” ou “C......”) condenado na pena de 2 anos de prisão por ter cometido em 28/3/1996 um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade.
Essa pena foi cumulada com a de 3 meses de presídio militar que lhe foi aplicada no proc. nº 26/99 do Tribunal Militar Territorial de Coimbra por ter cometido em 29/11/1998 um crime de deserção, sendo então condenado, por decisão de 6/4/2000, transitada em julgado, na pena única de 2 anos e 1 mês de prisão.
Naquele processo nº 39/98 esteve preso desde 30/7/1999 até 13/7/2001, data esta em que foram passados mandados de desligamento para o processo nº 26/99.
Entretanto, naquele processo nº 26/99 foi-lhe concedida a liberdade definitiva em 30/08/2001.
Desde pelo menos o Verão de 2005 e até que foi feita a busca na sua residência, em Alfandega - em 25/01/2006 - o arguido GG e a sua companheira a arguida B...., por vezes tratada por “D....”, passaram de comum acordo e em conjugação de esforços e de intentos, a comprar, por acordo prévio e concertadamente, estupefacientes em quantidade pelo menos não inferior a cem gramas de heroína e cocaína de cada vez, drogas que misturavam com outros produtos para lhes aumentar o peso e o volume a fim de potenciar os lucros visados e que de, seguida, também conjugadamente, consoante o que estivesse disponível (embora o arguido GG tivesse maior disponibilidade e assumisse a liderança desse negócio, mesmo assim contava com uma participação mais activa da sua companheira nessa mesma actividade), vendiam em quantidades de várias gramas ao preço de € 40,00 a € 50,00 a heroína e € 60,00 a cocaína, aos diversos indivíduos que contactavam, angariavam ou que os procuravam.
De entre os indivíduos a quem vendiam e forneciam periodicamente e, nalguns casos regularmente, droga, foi possível identificar:
- o AAA (também conhecido por “T....” de Moncorvo), desde Outubro de 2005, várias vezes cerca de 5 gramas de heroína, designadamente em 4/10/2005; em 6/10/2005, em 13/10/2005; em 16/10/2005; em 17/10/2005; em 24/10/2005, que a comprava também em parte para seu consumo;
- o ZZ, da Meda, desde Dezembro de 2005, entre 1 a 5 gramas de heroína e também pelo menos até um grama de cocaína, designadamente em 15/12/2005 e em 22/01/2006, que a comprava também em parte para seu consumo;
- o co-arguido II, desde pelo menos Outubro de 2005 heroína e cocaína até 2 gramas, designadamente em 21/10/2005; em 24/10/2005; em 28/10/2005; em 29/10/2005; em 31/10/2005; que a comprava também em parte para seu consumo;
- o NNNN (“companheiro da G....), a quem, pelo menos, mandaram em 25/1/06, retirar de casa e levar para ele cerca de 40 gramas de heroína e tirar de casa a balança com que pesavam a droga, droga e balança que vieram a ser apreendidas
E vendiam estes arguidos - GG e HH- indiscriminadamente consoante o que estivesse disponível (embora o arguido GG tivesse maior disponibilidade e assumisse a liderança desse negócio, mesmo assim contava com uma participação mais activa da sua companheira nessa mesma actividade), concertando-se entre si para atender os compradores, fazer as entregas e receber o preço correspondente aos estupefacientes - heroína e cocaína – que vendiam directamente aos consumidores que os procuravam pessoalmente na sua residência em Alfandega ou que os contactavam noutros locais desta região ou pelo telefone para marcar encontro, vendendo-lhes pacotes, meios gramas e gramas de heroína ao preço de respectivamente €10, €20 e €40 mas também de cocaína ao preço de €20, €30 e €60.
Entre outros que se não identificaram venderam estes arguidos - ambos concertados e conjugadamente nos moldes acima indicados - directamente aos seguintes consumidores:
- UU(também conhecido por “N...”, “o agente de seguros”), pelo menos 0,5 gramas de heroína em 20/12/2005;
-. AAAA (também conhecido por “P...”) pelo menos uma ou duas vezes, doses de 10,00 € de heroína e cocaína, nomeadamente em 14/10/2005; 30/10/2005; em 22/10/2005;
- BBBB (também conhecida por “R....”) desde Outubro de 2005 e desde 0,5 grama a 2 gramas de cocaína e até 2 gramas de heroína de cada vez, designadamente em 7/10/2005; em 14/10/2005, em 1/11/2005; e em 18/01/2006;
- CCCC (também conhecido por “B.....”), desde Outubro de 2005, pelo menos três vezes chegando a comprar até 1 grama de heroína e cocaína em 10/10/2005, em 16/10/2005 e em 18/10/2005;
-DDDD (também conhecido por “Z. P..”), em 2005 várias vezes por semana pacotes de heroína e de vez em quando um ou dois de cocaína;
- EEEE (também conhecido por “B...”) durante cerca de seis meses antes de serem presos, 0,5 gramas de heroína de cada vez, uma das quais em 14/10/2005;
- OOOO (também conhecido por “s....”), heroína, em doses de 10 a 20,00 € com o “Lisboa”, que usava o seu telemóvel, em 18/12/2005;
- PPPP desde uma dose a 0,5 gramas de cocaína em 30/10/2005; em 8/11/2005 e em 10/11/2005;
- XX (também conhecido por “c......”), desde pelo menos Outubro de 2005, uma vez ou outra heroína;
-. IIII (também conhecido por “S...”), desde Dezembro de 2005, durante cerca de um mês 0,5 gramas de heroína quase diariamente;
- JJJJ (conhecido por “P....”), em 2005, consumiu heroína fornecida pelo arguido GG;
- a um indivíduo que se identificou por Jorge e que para contactar o arguido utilizou o telefone nº 000000, em 9/11/2005 grama e meio de heroína;
- a um indivíduo que se identificou por “C.... de M......o” e que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 000000000, 0,5 grama de cocaína em 28/10/2005 e em 18/12/2005;
- KKKK (também conhecido por “L.....”), desde 0,5 grama a uma grama de heroína e uma grama de cocaína em pelo menos em 7/11/2005; em 16/11/2005; em 17/11/2005; em 15/12/2005; em 18/12/2005; em 8/01/2006;
- LLLL, 0,5 grama de heroína até um grama e meio de cocaína, designadamente em 23/09/2005, em 28/09/2005; em 22/10/2005; em 28/10/2005; em 14/11/2005; em 19/11/2005; em 26/11/2005; em 29/11/2005; em 15/12/2005;
- CCC, heroína em 16/10/05;
- EEE, um grama de heroína e um grama de cocaína, pelo menos em 23/10/2005; em 27/10/2005 e em 7/01/2006; e em 25/1/06 pede-lhe para ir buscar a droga que tem em casa;
- Nuno, da carrinha branca, que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 000000000, uma dose de cocaína em 4/1/06;
- indivíduo que se identificou como sendo “o xavalo de Alfandega”, que para contactar os arguidos usou o telefone nº 000000000, 0,5 grama de heroína de 20,00 € em 20/11/2005;
- QQQQ de Vila Flor e que para contactar os arguidos usou os telemóveis nº 00000000 e 000000 e o telefone nº 00000000, meio grama de heroína e meio grama de cocaína em 24/09/2005 duas vezes; em 6/10/2005 e em 25/01/2006 ocorreram contactos para tirar a droga de casa;
- a um indivíduo que se identificou como “o C....” e que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 0000000 e o telemóvel nº 0000000, heroína até um grama em 7/10/2005; em 16/10/2005 e em 29/10/2005;
- indivíduo que se identificou como sendo “o dos .......” e que para contactar os arguidos usou o telefone nº 0000000, uma dose pelo menos de cocaína em 22/10/2005;
- a um indivíduo que se deslocava num Toyota Corola vermelho e que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 0000000, um grama e meio de heroína e meio grama de cocaína em 17/10/2005;
- uns indivíduos que se identificaram por B... que utilizou o telefone nº 000000000 e T.. que usou o telemóvel nº 00000000, heroína em 1/12/05 e heroína e cocaína em 7/1/06 respectivamente;
- o “M....” de 0,5 gramas a um grama de heroína em 4/10/05 e em 8/10/05;
- a um individuo que se identificou por “B........” e que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 00000000, heroína em 8/1/06;
- RRRR pelo menos duas vezes directamente, 0,5 grama de cocaína de cada vez a 30,00 € cada;
- SSSS (conhecido por “o professor”), que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 000000000, heroína em 4/1/06;
- a um indivíduo que se identificou por “S....” e que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 0000000, em 8/10/2005 três meias de heroína e meio grama de cocaína;
- a um indivíduo que se identificou por “rapaz do Seat vermelho, de L......” e que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 000000, heroína em 19/10/2005;
- ao arguido NN, conhecido por “o espanhol” pelo menos desde o Verão de 2005, que os contactava várias vezes, e nalguns períodos mais que uma vez por semana, com vista à compra de heroína para revender por conta própria e também cocaína para o seu consumo pessoal, nomeadamente em 8/07/2005; em 10/07/2005; em 23/07/2005; em 6/08/2005; em 9/08/2005; em 12/08/2005; em 17/08/2005; em 20/08/2005; em 21/08/2005; em 24/08/2005; em 10/09/2005; em 17/09/2005; em 2/12/2005; e em 25/07/2005, tendo o seu próprio veículo avariado, pediu-lhe o arguido GG que o levasse de Alfandega a Moncorvo e o trouxesse de volta, o que o arguido NN fez, tendo-o aquele compensado não só com a gasolina necessária como ainda lhe pagou o frete com meio grama de cocaína;
- Sá que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº0000000, cocaína em 6/10/2005;
- indivíduo que se não identificou (referiu apenas ser “o rapaz de à bocado”), que para contactar os arguidos usou o telefone nº 0000000, heroína em 16/10/2005;
- TTTT, cocaína em 18/10/05, em 22/10/05 e em 15/12/05;
- a indivíduo que se identificou como sendo “o do Citroen Saxo”, que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 0000000, cocaína, em 23/10/05 dois meios gramas e em 9/11/05 três meios gramas;
-a indivíduo que se identificou como sendo “o amigo do P......”, que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 0000000, 000000 e o telefone nº 000000, meio grama de cocaína em 26/11/05 e 1 grama de cocaína em 18/1/06;
-a indivíduo que se identificou como sendo “o do Toyota Celica mas estou numa Mitsubishi”, que para contactar os arguidos usou o telefone nº 0000000, um grama e meio de cocaína e um grama e meio de heroína em 1/11/2005;
-a indivíduo que se não identificou mas que para contactar os arguidos usou o telefone nº 0000000, três meios grama de heroína em 20/12/05;
-a indivíduo que se identificou por “o Mogadouro” que para contactar os arguidos usou o telemóvel nº 0000000, heroína e cocaína em 7/1/06;
- a indivíduo que se identificou por “o do casaco vermelho” que para contactar os arguidos usou o telefone nº 000000000, e o telemóvel nº 00000000000, droga em 20/10/05 e em 22/10/05;
- TT, pelo menos duas vezes um ou dois pacotes de heroína de 10,00 €;
- ao arguido MM heroína em 17/1/06 com “o L.....” e em 18/1/06;

Em 25/01/2006, na sequência de busca judicialmente autorizada feita na residência dos arguidos GG e HH, num quarto do 1ª andar, foi encontrada a balança electrónica de precisão da marca Tanita, modelo 1479V de cor preta com resíduos de heroína e cocaína; 40 comprimidos da marca Nostam; na arrecadação do 1º piso foi encontrado um plástico com o peso líquido de 30,010 gramas de heroína (em pó acastanhado), outro plástico com o peso líquido de 1,830 gramas de cocaína (em pedra branca); o telemóvel da marca Alcatel de cor prateada examinado a fls. 1316.
Balança que os arguidos utilizavam para pesar os estupefacientes, medicamento que destinavam a misturar com as drogas e telemóveis que usavam nos contactos que mantinham na actividade de compra e venda de estupefacientes e que, por isso, tal como a heroína e a cocaína, foram apreendidos.
Foram-lhes, também, nessa ocasião apreendidos os veículos: ligeiro de passageiros da marca Renault, modelo 19, cinzento, com a matrícula ..-..-.. examinado e fotografado a fls. 1787/1788 sem valor comercial e ligeiro de mercadorias da marca Iveco, modelo 29LIIV, branco, com a matrícula ..-..-.. examinado e fotografado a fls. 1785/1786 no valor de 4.000,00 € em nome da arguida, por serem usados pelo referido casal para ir comprar, para transportar e para ir entregar os estupefacientes.
Foi entregue à Finicrédito o veículo ..-..-...
Pelas 14,35 horas de 6/07/2006 foram estes arguidos detidos tendo-lhe sido encontrados o telemóvel da marca Sendo, uma carteira com recortes de papel com n.º de telefone e o veículo ligeiro de mercadorias da marca Hyundai, modelo H1, branco, com a matrícula ..-..-.., examinado e fotografado a fls. 1952/1953, no valor de 3000,00 €, que foram apreendidos por terem servido para a prática da actividade que desenvolviam de compra e venda de estupefacientes.
Os arguidos GG e HH, estão “casados” segundo a lei cigana, viviam com 4 filhos menores de 11, 7, 4 e 3 anos, em casa arrendada em Alfandega da Fé desde há dois anos, tendo antes residido em Moncorvo.
Desde o Verão de 2005 que viviam sem dificuldades económicas, essencialmente com os lucros provenientes da compra e venda de estupefacientes, embora também usufruíssem de rendimentos da actividade de feirantes que igualmente iam desenvolvendo;
Andavam pelas feiras da região;
A filha mais nova está com a mãe no EP e os demais com familiares em Rio Tinto e Moncorvo, que os apoiam;
O arguido GG não sabe ler nem escrever mas assina o seu nome;
A arguida HH não sabe ler nem escrever;
Era-lhes pago RSI desde 1999 de 643,61 €, e abono de família de 120,00€;
A arguida pagava 300,00€ mensais da prestação da carrinha Iveco;
A arguida no EP frequenta o 1º Ciclo do ensino básico e mantém actividade laboral;
A arguida HH não tem antecedentes criminais;
O arguido GG tem os antecedentes criminais que constam do seu CRC junto aos autos. (texto modificado pela Relação).

VI – O arguido II era consumidor de estupefacientes e conhecendo bem o meio da toxicodependência apercebeu-se que era fácil vender por haver procura e que da compra e venda podia tirar proventos para prover ao seu consumo e ainda para se sustentar sem ter de trabalhar de forma regular e constante e ainda para obter algum lucro, e desde, pelo menos Outubro de 2005 e até que foi preso em 25/01/2006 passou a comprar para vender principalmente heroína e, também em menor quantidade cocaína, que vendia sobretudo no concelho de Moncorvo, na Lousa e em localidades próximas.
Assim em períodos sucessivos e alternados e algumas vezes ao mesmo tempo, adquiria as drogas aos arguidos AA “B....”, J..... “F....”, GG, B......., e a outros vendedores, tendo para o efeito contactado o C......... ( telef. 00000000) para lhe comprar 2 gramas de heroína, e depois de as dividir e acondicionar, vendia-as, a maior parte das vezes em pacotes ou doses individuais, ao preço de €10 a heroína e de €20 a cocaína, mas também vendia meias gramas ao preços de €20 e €40 respectivamente e esporadicamente vendia gramas aos preços de €50 e €60, aos vários consumidores que o abordavam pessoalmente ou que o contactavam telefonicamente para esse efeito.
Entre muitos outros que não foi possível identificar, vendeu o arguido II estupefacientes aos seguintes consumidores:
- UUUU, “ A......” heroína em 21/11/05;
- VVVV, cocaína em 25/11/05;
- XXXX, quatro gramas de heroína em 10/12/2005;
- a individuo que se identificou por “moço de Seixo de Manhoses”, que para contactar o arguido usou o telm. 0000000, heroína um pacote de 20,00 € em 28/12/05;
Pelas 12,45 horas de 25/01/2005 foi detido e revistado tendo-lhe sido encontrado o telemóvel da marca Nokia, modelo 2220, cinzento que foi apreendido por ser utilizado pelo arguido para estabelecer os contactos com os fornecedores e com os consumidores dos estupefacientes que comprava e que vendia.
Também lhe foi encontrado o veículo ligeiro de passageiros da marca Volkswagen, modelo Golf, vermelho, com a matrícula ..-..-.. examinado e fotografado, sem valor comercial, que foi apreendido por o usar nas deslocações para efectuar as compras e para fazer as vendas de droga.
O arguido tem o 6º ano de escolaridade mas foi-lhe atribuída a equivalência ao 9º ano de escolaridade;
Trabalhou de 1/3/05 a 31/8/05 na Impordavid, em Aveiro e tem um percurso laboral instável, por causa da droga, tendo trabalhado em França e na Suiça;
Á data dos factos estava desempregado, vivia com os pais e consumia droga;
Goza do apoio da irmã com vista ao seu tratamento em França
É de humilde condição social;
Era consumidor de droga;
Tem os antecedentes criminais que constam do seu CRC.

VII - O arguido JJ, também conhecido por “R........., foi condenado várias vezes em pena de prisão por ter cometido crimes de furto qualificado e furtos simples, sendo que a última condenação foi proferida em 24/5/1994, transitada em julgado, no proc. comum colectivo nº 53/93 do Tribunal de Circulo de Mirandela, tendo-lhe sido aplicada, em cúmulo jurídico (das penas ali aplicadas, por crimes de furto simples e de furto qualificado - cometidos na noite de 25 para 26/9/1991, na noite de 8 para 9/10/1991 e na noite de 14 para 15/10/1991- com as impostas nos processos nºs 54/91, nº 8/92 e nº 26/92, ali melhor identificadas), a pena única de 9 anos de prisão a que logo foram perdoados 2 anos 6 meses e 15 dias, tendo expiado essa condenação, com a concessão da liberdade definitiva pelo TEP, em 3/5/1998 (sendo certo que cumpriu a pena única residual de prisão desde 22/11/1991 até 13/7/1996, data esta em que lhe foi concedida a liberdade condicional).
Pelo menos desde data não concretamente apurada do ano de 2001 e até à data da sua detenção à ordem destes autos, em 13/05/2006, que se vinha dedicando, cada vez com mais intensidade e em maiores quantidades, à compra e venda de estupefacientes, principalmente haxixe e liamba, mas também, em quantidades menores, heroína.
Comprava o haxixe aos quilogramas, ao preço de cerca de novecentos euros o quilo, tendo pelo menos chegado a comprar quatro quilos numa das vezes, que depois repartia em porções mais pequenas e variáveis, desde sabões ou sabonetes até patelas, barras e laminas que vendia a diversos indivíduos - sabendo que alguns deles, que eram da zona, iriam depois vender directamente e por conta própria aos respectivos clientes consumidores - e directamente aos consumidores que o procuravam.
Entre muitos outros que não foi possível identificar vendeu haxixe a:
- arguido LL pelo menos desde Setembro de 2005 a Fevereiro de 2006 que, para além de lhe guardar os estupefacientes, também lhe preparava o haxixe e o entregava aos consumidores que o procuravam directamente ou que lhe vinham encaminhados pelo arguido JJ, como aconteceu em 5/01/2006, em 22/01/2006; em 24/01/2006; em 7/02/2006 e em 8/02/2006; o qual lhe comprava haxixe para seu consumo desde meados de 2004, e entregando-lhe o arguido JJ haxixe como paga daqueles serviços;
- arguido ZZZZ, conhecido por “espanhol”, várias vezes haxixe em quantidades variáveis desde um sabonete de 50,00 € a patelas de 20,00 €, assim sucedendo em 28/11/2003; em 1/09/2005 (50,00 €); em 13/09/2005 (50,00€ para outra pessoa mas retirando uma parte para ele); em 22/09/2005 (20,00€); em 10/10/2005 (50,00 €); em 27/10/2005 (40.00€); e em 8/2/06, para vender e para seu consumo;
- arguido AAAAA, desde data não concretamente apurada do ano de 2001,várias vezes haxixe em quantidade variáveis de uma vez por semana uma patela de 20,00€ (10 gramas), designadamente em 26/09/2005; em 27/09/2005, em15/11/2005; em 16/12/2005; em 30/12/2005, em 30/01/2006 e em 7/02/2006 para seu consumo e também para vender e ceder a amigos;
- BBBBB, também conhecido por “T..”, desde pelo menos Outubro de 2005 haxixe desde uma lamina até 100 g, designadamente em 3/10/2005; em 10/10/2005; em 13/10/2005; em 21/10/2005; em 16/11/2005; em 16/12/2005; em 26/12/2005; em 31/12/2005 e em 25/03/2006;
- ao EE, 50,00 € de haxixe em 28/03/2006 ;
- ao P..... do B......, pelo menos desde Outubro de 2005, haxixe até 100 g de cada vez, nomeadamente em 17/10/05; em 11/11/2005; em 12/12/2005; em 8/12/2005 e em 12/5/06.
Também vendeu directamente aos consumidores que pessoalmente o procuravam ou que o contactavam telefonicamente, vendendo-lhes quantidades em “laminas”, “patelas”, “charros” ou outras porções de haxixe em função da demanda e do numerário dos compradores, e às vezes quantidades por preços superiores de até €200 ou mais euros e, esporádica e raramente, vendia-lhes alguns pacotes de heroína, na ordem de €10 cada.
Entre outros que não foi possível identificar vendeu directamente a:
- RRRR pelo menos em 2004 haxixe, de que era consumidor, 10,00 € de cada vez;
- CCCCC, durante dois ou três meses de 2005, incluindo 25/9/05, haxixe em regra uma vez por semana, em quantidade de 10,00€ até aos 50,00 €;
- OOOO, também conhecido por “s........”, durante dois anos, incluindo em 15/11/05, haxixe em quantidades de 5.00€, 10,00 € e 15,00€;
- DDDDD, também conhecido por “T.......”, pelo menos em fins de 2005 e princípios de 2006, haxixe em quantidades de 10,00 a 50,00 € várias vezes, designadamente em 24/10/2005, em 31/10/2005, em 16/11/2005, e em 29/12/2005;
- EEEEE, também conhecido por “C.....”, em 2005 várias vezes haxixe em quantidades desde 10,00 até 20,00 €, designadamente em 25/09/2005; em 3/10/2005; em 20/10/2005; em 31/10/2005; em 11/11/2005, e em 10/05/2006 chegando a ter haxixe do arguido para vender e consumindo com ele;
- FFFFF, também conhecido por “N...”, desde data não concretamente apurada do ano de 2001 até ser preso, uma patela de 20,00 € de 15 em 15 dias, incluindo em 11/05/2006;
- GGGGG, também conhecido por “r.....”, durante seis meses antes de preso, habitualmente haxixe e em regra 20,00 € de cada vez, designadamente em 6/10/2005; em 29/10/2005; em 7/11/2005; em 16/11/2005, e em 25/11/2005;
-HHHHH, também conhecido por “C....”, durante um ano antes de ser preso, haxixe desde 300,00 € (quando pedia “metade de um rádio”) a 550,00 € (quando pedia “um rádio completo”), designadamente em 1/10/2005; em 30/10/2005, em 1/11/2005; em 7/11/2005; em 20/11/2005, em 12/12/2005; em 30/01/2006; em 12/02/2006; em 1/05/2006;
- IIIII, também conhecido por “M...”, uns meses antes de ser preso pelo menos três vezes haxixe entre 10,00 a 20,00 €;
-a indivíduo que se identificou como sendo “o de I.....”, haxixe em 24/09/2005;
- V.... que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 0000000, haxixe em 27/09/2005 e em 1/11/2005;
- R.... de pronúncia brasileira que para contactar o arguido usou os telemóveis nº 0000000, 00000000 e o telefone nº 00000000, haxixe em 4/10/2005; em 11/10/2005; em 19/10/2005 e em 29/11/2005;
- JJJJJ que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 0000000, haxixe em 8/10/2005;
- David que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 00000000, haxixe em 13/10/2005;
- Nina que para contactar o arguido usou os telemóveis nºs 0000000, 00000000, haxixe em 22/10/2005; em 3/11/2005; em 6/11/2005; em 8/11/2005; e em 10/02/2006;
-a indivíduo que se identificou como “o de Amarante” que para contactar o arguido usou os telemóveis nºs 000000 e 000000, pelo menos haxixe na quantidade de 50,00 € em 3/11/2005 e em 27/11/2005;
- A... de Podence que para contactar o arguido usou o telefone nº 000000000, pelo menos uma patela de haxixe em 17/11/2005;
- L..... que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 00000000, haxixe em 19/11/2005;
- indivíduo que se identificou por “o chavalo de Alfandega” que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 0000000, haxixe até à quantidade de pelo menos 300,00 € em 25/11/2005 e em 5/01/2006 ;
- M..... de A... que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 0000000, desde 2004, haxixe em 30/11/2005;
- a indivíduo que se identificou por Bragança, que para contactar o arguido usou os telemóveis nºs 0000000 e 00000000, haxixe pelo menos em 15/12/2005; em 4/01/2006 e em 20/01/2006;
-a indivíduo que se identificou como “o colega do Z... e do M.....do F...” que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 000000000, pelo menos 50,00 € de haxixe em 5/01/2006;
- indivíduo que se identificou como “P.....” que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 000000000 20,00 € de haxixe em 25/01/2006;
- Beto que para contactar o arguido usou o telefone nº 00000000, 50,00 € de haxixe em 25/01/2006;
- indivíduo que se não identificou mas que para contactar o arguido usou o telefone nº 000000000, haxixe em 5/10/2005;
- indivíduo que se não identificou mas que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 000000, haxixe em 30/11/2005 e em 4/01/2006;
- C... que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 000000, desde finais de 2005, um sabão de haxixe em 6/01/2006;
- B..... que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 000000, heroína em 25/03/2006;
- KKKKK que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 000000, heroína em 26/03/2006;
- X....que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 000000, haxixe em 29/03/2006;

Actividade que o arguido JJ desenvolvia, contando com a participação da mulher, a arguida KK, sendo certo que de comum acordo e em conjugação de esforços e vontades, consoante o que estivesse disponível (embora o arguido JJ tivesse maior disponibilidade e assumisse a liderança desse negócio), procediam à guarda, arranjavam esconderijo, transportavam os estupefacientes, e procediam à sua divisão.
Por vezes a arguida KK acompanhava o marido nas entregas/vendas de produtos estupefacientes, agindo com perfeito conhecimento e inteirada dos factos que praticava.
A arguida KK também procedeu a entregas de estupefacientes acompanhada do marido - como sucedeu com o MM, com o CCCCC e com o FFFFF - o que fez a pedido expresso do marido ou conforme as instruções que ele lhe transmitia ,tendo recebido o preço correspondente dos compradores.
Pelas 10.00 e 10,30 horas de 13/05/2006 foram os arguidos KK e JJ detidos e efectuada busca judicialmente autorizada na respectiva residência, sendo aí encontrado: na cozinha dois telemóveis da marca Nokia cinzentos, um Motorola preto, dois cartões Vodafone, um envelope desta operadora móbil com resíduos de canabis, uma caderneta referente a conta da CGD titulada pela KK, uma caixa metálica com o peso liquido de 7,970 de haxixe (canabis) em pedaços e um embrulho plástico com 1,230 gramas de peso líquido de liamba (canabis); no quarto do casal €400 – quatrocentos euros, (sendo 4 notas de €50 e 10 de €20), mais €2.500 – dois mil e quinhentos euros (sendo 3 notas de €500, 1 de €200 e 3 de €100) e um telemóvel Nokia azulado.
Depois de detido, o arguido JJ, voluntariamente e por sua iniciativa, indicou onde estava escondido um pedaço de haxixe (canabis) em forma de sabonete com o peso de 246,085 gramas, o qual foi apreendido.
Apreenderam-se os estupefacientes, o numerário por ter resultado da venda de drogas, os telemóveis e cartões que eram usados pelos arguidos para estabelecer contactos com os fornecedores, os guardadores e os compradores dos estupefacientes e ainda os veículos: ligeiro de passageiros da marca Volkswagen, modelo Golf, cinzento, com a matrícula ..-..-.. (examinado e fotografado a fls. 1795/1796) e ligeiro de passageiros da marca Volkswagen, modelo Golf, preto, com a matrícula ..-..-.., por serem usados pelos arguidos como seus donos e ser neles que o arguido JJ ia fazer as compras das drogas, as transportava e ia fazer a distribuição e entrega dos estupefacientes, por vezes (nas situações acima apontadas) juntamente com a mulher;
Também foi apreendida a conta bancária aberta em nome da arguida KK na CGD, com o saldo de €28,51, assim como a do arguido JJ aberta no Montepio com o saldo de €91.29.
O arguido JJ e a mulher a arguida KK, viviam com dois filhos menores de 7 anos e 15 meses de idade, em casa própria;
Trabalhavam no restaurante dos pais e sogros auferindo ele cerca de 500,00 € mensais e ela 250,00 €.
Gozavam de situação económica desafogada proveniente da compra e venda de droga, e em 1/10/05 já o arguido JJ pensava em ”investir num negócio” para “ branquear o meu dinheiro “;
Ele tem a 4ª classe da instrução primária e ela o 6º ano de escolaridade;
São de humilde condição social;
Gozam do apoio familiar, e ele trabalha no EP como faxina na cozinha;
O arguido JJ consumia esporadicamente haxixe, parte das vezes para provar a qualidade do que comprava, considerando “que não fazia mal em vender o haxixe porque eram os consumidores que o procuravam”.
Tem os antecedentes criminais que constam do seu CRC junto aos autos;
A arguida não tem antecedentes criminais. (texto modificado pela Relação).

VIII - Porque a actividade que o JJ“do mercado” desenvolvia com a droga já estava referenciado pelas autoridades, cautelosamente, para não ser surpreendido com grandes quantidade de haxixe, escondia-a ou confiava-a à guarda de outros indivíduos que não estavam então conotados com o tráfico de estupefacientes, e assim sucedeu, com o co-arguido LL a quem, pelo menos, desde Setembro de 2005 o arguido JJ confiava parte do haxixe que adquiria para que este lho guardasse e lho fosse devolvendo, incluindo fazendo o seu transporte, conforme a necessidade ou a previsibilidade que tinha da demanda e assim sucedeu, entre outras vezes, em 26/9/2005; em 28/9/2005; em 16/10/2005 e em 18/10/2006, e que, para além disso o dividia e fazia entregas mediante a indicação deste, se necessário;
O arguido é de humilde condição social, tem o 9º ano de escolaridade;
É trabalhador, com trato social correcto, responsável, considerado pessoa respeitada e respeitadora;
Começou a trabalhar aos 17 anos e nos últimos anos angariava o seu sustento e o da mãe que dele dependia, devido á doença que a atingiu, ficando entrevada, e abandonados pelo pai e marido, e após a morte da mãe foi trabalhar para o estrangeiro;
Vivia em união de facto e trabalhava como carpinteiro e depois de ter trabalhado em França desde 12/4/06 encontra-se a trabalhar em Espanha, onde aufere 1.000,00 € por mês;
Não tem antecedentes criminais;

IX – O arguido MM, comprou heroína e cocaína até 2003, para seu consumo e comprou até ser preso haxixe desde 2001 ao arguido KK.
Pelas 14,45 horas de 13/05/2006 foi o arguido detido e revistado, sendo-lhe encontrado no bolso das calças um pedaço de haxixe (canabis) com o peso líquido de 0,713 gramas, que fazia parte de uma patela de 10,00 € que havia comprado ao arguido JJ “do Mercado” que destinava ao seu consumo
Na busca domiciliária judicialmente autorizada que se lhe seguiu foi encontrado no seu quarto, o telemóvel da marca Samsung, um cartão da Optimus e 3 cartões da Vodafone, que se apreenderam por ser equipamento de telecomunicações usados pelo arguido para estabelecer os contactos com os fornecedores
Arguido que pelas 15,30 horas de 28/11/2003 no café “M.... da F....”, nesta cidade, tinha sido detido ao mesmo tempo que o arguido J... “espanhol” quando ambos estavam na posse de 60,776 gramas (peso liquido) de haxixe (canabis) que tinham adquirido conjuntamente e “ a meias” ao arguido JJ, tendo-lhe então sido encontrado e que lhe foi apreendido e, foi-lhe também apreendido um telemóvel e €290 (sendo 13 notas de €20, uma de €10 e 4 de €5) e destinado a servir para a compra estupefacientes.
O arguido por diversas vezes cedeu haxixe a amigos, como ao FFFFF e aos amigos franceses no KK, e também vendeu e com aqueles foi comprar haxixe para todos consumirem, e levou e entregou ao arguido C..... um “ charro” em 18/1/06 ao ir comprar-lhe heroína;
O arguido vive com a mãe que aufere a reforma de sobrevivência do pai já falecido, e um irmão, é de humilde condição social, frequenta um curso de formação profissional auferindo 227,00€ mensais, e á data dos factos estava desempregado auferindo 400,00 de subsidio, depois de ter trabalhado para a Câmara Municipal de Macedo de Cavaleiros durante 2 anos e 9 meses na jardinagem;
É toxicodependente e anda em tratamento no CAT com metadona desde 2003 e tem o apoio dos familiares;
Tem a 4ª classe da instrução primária
Não tem antecedentes criminais;

XI- o arguido ZZZZ “espanhol” pelo menos desde 2003 que vinha comprando e vendendo estupefacientes em quantidade conforme as suas disponibilidades monetárias, mas principalmente de acordo com as demandas que lhe surgiam e que aproveitava para satisfazer, com o objectivo não só de poder ganhar para satisfazer o seu consumo pessoal como ainda de aproveitar alguns ganhos monetários.
Cerca das 17,30 horas de 2/08/2003, na EM de Castelões onde – ao ir ou ao regressar de fazer entregas - tinha sinistrado o seu automóvel com a matrícula ..-..-.., foi revistado, assim como o veículo, tendo-lhe sido encontradas 3,586 gramas, peso liquido, de bicarbonato de sódio que destinava a adicionar a cocaína e uma colher de chá com resíduos de cocaína, e em 28/11/2003, no café “M.....da F....AAAAA”, nesta cidade, quando estava na companhia do arguido AAAAA, foi detido e revistado, tendo-lhe sido encontrado um pedaço de haxixe (canabis) com o peso de 60,78 gramas que estava a dividir fazendo uso de um canivete e de que ia entregar parte ao JJ;
Estupefaciente, canivete e o telemóvel da marca Nokia modelo 3510 que tinha consigo que foram apreendidos, por serem usados no contacto com os vendedores e compradores e na divisão da droga;
Desde pelo menos o verão de 2005 até que foi detido pelo última vez à ordem destes autos, em 13/05/2006, comprava, para revenda heroína aos arguidos GG, B...... e C..... “M.......” estupefacientes que, por vezes, misturava com outros produtos para lhes aumentar o volume, e também desde pelo menos 2003 comprava canabis (haxixe e liamba) ao JJ “do mercado” em sabonetes ou em porções menores, estupefacientes que de seguida dividia em doses ou pedaços mais pequenos consoante as demandas que tinha vendendo-os aos vários consumidores que para o efeito o procuravam, e também comprava cocaína para seu consumo.
Por vezes angariava os compradores e contactava os vendedores, servindo de intermediário na compra e venda entre uns e outros, cobrando com isso uma porção para o seu consumo. Pelo menos num caso fez um frete ao C.... que o compensou com meia grama de cocaína que o ora arguido consumiu com outro;
Entre outros que não foi possível identificar, a quem vendeu nesse espaço de tempo, por contacto pessoal directo, também vendeu estupefacientes após ou na sequência de contacto telefónico:
- T.... que para contactar o arguido usou o telm. 00000000, haxixe em 25/07/2005;
-LLLLL e que para contactar o arguido usou o telm. 0000000, haxixe em 9/08/2005; em 16/08/2005 e em 19/08/2005, desde uma pedrita a 50,00 €;
- Pedro da Saldonha que para contactar o arguido usou o telm. 000000, haxixe em 10/10/2005, no valor de 50,00 €;
-indivíduo não identificado, de Ge...... que para contactar o arguido usou o telm. 000000000 haxixe 6/09/2005;
- a indivíduo que não foi possível identificar mas que para contactar o arguido usou o telm. 0000000, haxixe em 12/10/2005, uma pedra de 30,00 €;
-individuo que não foi possível identificar mas que para contactar o arguido usou o telm. 000000, haxixe em 24/12/2005 no valor de 20,00 €;
- MMMMM que para contactar o arguido usou o telef. 000000 e o telm. 000000 heroína em13/09/2005; e haxixe em 29/09/2005 e em 1/1/06, 20,00€ de cada vez
- indivíduo que se identificou por G... que para contactar o arguido usou o telm.0000000 haxixe 24/02/2006 no valor de 50,00 €;
- a uns “xavalos” €50 de haxixe em 13/09/2006, ficando com uma sena para si; - a um “puto”, €50 de haxixe em 13/09/2005;
O arguido tem o 6º ano de escolaridade, trabalha de modo esporádico como carpinteiro, é toxicodependente, fez diversos tratamentos sem sucesso e está em tratamento desde 21/7/98 no CAT com metadona, e é portador do HIV, e apesar da ajuda dos familiares, não manifesta vontade de mudar de vida e continua a consumir estupefacientes;
Vive com os pais, ele reformado e ela doméstica, que já estão saturados do modo de vida do filho, vivendo os irmãos em Espanha;
É de humilde condição social;
Tem antecedentes criminais em Espanha, e os antecedentes criminais que constam do seu CRC em Portugal;

Todos os arguidos conheciam muito bem a natureza e características das substâncias estupefacientes acima enumeradas, que cada um deles individual ou alguns conjuntamente e em conjugação de esforços e vontades, nos termos supra descritos adquiriram, transportaram, guardaram, dividiram, pesaram e prepararam em doses individuais, puseram à venda, venderam, ofereceram e colocaram a disposição dos compradores, introduzindo-as no mercado do consumo, em alguns casos, nos termos descritos, para revenda, e todos eles por venda e nalguns casos por cedência.
Todos os arguidos sabia muito bem que esses seus actos ou actividade relativamente a tais produtos estupefacientes, porque não autorizada, é expressamente proibida e punida por lei, e que tais substâncias estupefacientes constam das tabelas I-A, I-B e I-C anexas ao DL 15/93 de 22/1.
Todos os arguidos agiam na prática de tais actos e actividade com vontade livre e consciente, sabendo bem que incorriam em responsabilidade criminal.
(…) Parágrafo eliminado
(…) Parágrafo eliminado
(…) Parágrafo eliminado

Mais se provou:
Por acórdão de 13/2/08 proferido pelo Tribunal Colectivo neste processo foi decidido “ suspender a execução da pena aos arguidos II e DD, pelo período de cinco anos a contar do trânsito em julgado da decisão e sujeita ao seguinte regime de prova, relativamente ao qual deram o seu consentimento e com as seguintes condições:
a - Não frequentarem os sítios conhecidos como de tráfico;
b - Não acompanhar com traficantes ou consumidores;
c - Se submeterem a tratamento de desintoxicação;
d - Apresentarem no tribunal análises clínicas de 3 em 3 meses e no prazo de um ano e meio comprovativas do seu estado de toxicidade;
e - Apresentarem prova da frequência de consultas psicológicas de acompanhamento com o fim de desintoxicação de três em três meses durante ano e meio”.

Apreciando os recursos.

I – Recurso dos arguidos JJ e KK

Como se viu, em ambos os recursos está em causa tão só a medida da pena aplicada, considerada exagerada, pretendendo os recorrentes a sua redução, o que explicitam nas conclusões 6ª a 16ª, quanto à arguida e 17ª a 24ª, no que toca ao arguido.
Começar-se-á por assinalar que o acórdão recorrido, em relação a todos e cada um dos arguidos recorrentes, procedeu a uma redução das penas aplicadas, por considerar que as penas aplicadas pela 1ª instância a cada um dos arguidos, na perspectiva do direito penal preventivo, para além de ser claramente excessiva (traduzindo uma retribuição da culpa não consentida), era, também, manifestamente desproporcionada (tendo presente que a pena há-de encontrar suporte nos próprios factos dados como provados) em relação à gravidade dos factos concretos cometidos, defendendo ainda que pena superior à que fixava então a cada um dos recorrentes, atenta a jurisprudência mais recente do STJ sobre a matéria, violava o princípio da proibição do excesso.
Os arguidos foram condenados por crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º, do Decreto-Lei n.º 15/93, a que corresponde a moldura penal abstracta de 4 a 12 anos de prisão.

A terceira alteração ao Código Penal operada pelo Decreto-Lei nº 48/95, de 15 de Março, entrado em vigor em 1 de Outubro seguinte, proclamou a necessidade, proporcionalidade e adequação como princípios orientadores que devem presidir à determinação da pena aplicável à violação de um bem jurídico fundamental, introduzindo a inovação, com feição pragmática e utilitária, constante do artigo 40º, ao consagrar que a finalidade a prosseguir com as penas e medidas de segurança é «a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade», ou seja, a reinserção social do agente do crime, o seu retorno ao tecido social lesado.
Com esta reformulação do Código Penal, como se explica no preâmbulo do diploma, não prescindiu o legislador de oferecer aos tribunais critérios seguros e objectivos de individualização da pena, quer na escolha, quer na dosimetria, sempre no pressuposto irrenunciável, de matriz constitucional, de que em caso algum a pena pode ultrapassar a culpa, dispondo o nº 2 que «Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa».
Em consonância com estes princípios, dispõe o artigo 71º, n.º 1, do Código Penal, que “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”; o n.º 2 elenca, a título exemplificativo, algumas das circunstâncias, agravantes e atenuantes, a atender na determinação concreta da pena, dispondo o n.º 3, que na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena, injunção com concretização adjectiva no artigo 375º, nº 1, do CPP, ao prescrever que a sentença condenatória especifica os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada. (Em sede de processo decisório, a regulamentação respeitante à determinação da pena tem tratamento autónomo relativamente à questão da determinação da culpabilidade, sendo esta tratada no artigo 368º, e aquela prevista no artigo 369º, com eventual apelo aos artigos 370º e 371º do CPP).
Para o efeito de determinação da medida concreta ou fixação do quantum da pena que vai constar da decisão o juiz serve-se do critério global contido no referido artigo 71º do Código Penal (preceito que a alteração introduzida pela Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro, deixou intocado, como de resto aconteceu com o citado artigo 40º), estando vinculado aos módulos - critérios de escolha da pena constantes do preceito.
Como se refere no acórdão de 28-09-2005, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 173, na dimensão das finalidades da punição e da determinação em concreto da pena, as circunstâncias e os critérios do artigo 71º do Código Penal têm a função de fornecer ao juiz módulos de vinculação na escolha da medida da pena; tais elementos e critérios devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (circunstâncias pessoais do agente; a idade, a confissão; o arrependimento) ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.

Observados estes critérios de dosimetria concreta da pena, há uma margem de actuação do julgador dificilmente sindicável, se não mesmo impossível de sindicar.
O referido dever jurídico-substantivo e processual de fundamentação visa justamente tornar possível o controlo - total no caso dos tribunais de relação, limitado às «questões de direito» no caso do STJ, ou mesmo das relações quando se tenha renunciado ao recurso em matéria de facto – da decisão sobre a determinação da pena.
Estando a cognoscibilidade em recurso de revista limitada a matéria de direito, coloca-se a questão da controlabilidade da determinação da pena nesta sede.
Paulo Pinto de Albuquerque, no Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, págs. 217/8, defende que a questão da determinação da espécie e da medida da sanção criminal redunda numa verdadeira questão de direito.
Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, págs. 196/7, § 255, após dar conta de que se revela uma tendência para alargar os limites em que a questão da determinação da pena é susceptível de revista, afirma estarem todos de acordo em que é susceptível de revista a correcção do procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela, ou, pelo contrário, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis. Defende ainda estar plenamente sujeita a revista a questão do limite ou da moldura da culpa, assim como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, e relativamente à determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, esta será controlável no caso de violação das regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada.
Ainda de acordo com o mesmo Professor, nas Lições ao 5º ano da Faculdade de Direito de Coimbra, 1998, págs. 279 e seguintes: «Culpa e prevenção são os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo de medida (sentido estrito ou de «determinação concreta») da pena.
As finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela de bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade. A pena, por outro lado, não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
Assim, pois, primordial e essencialmente, a medida da pena há-de ser dada pela medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto e referida ao momento da sua aplicação, protecção que assume um significado prospectivo que se traduz na tutela das expectativas da comunidade na manutenção (ou mesmo no reforço) da validade da norma infringida. Um significado, deste modo, que por inteiro se cobre com a ideia da prevenção geral positiva ou de integração que vimos decorrer precipuamente do princípio político-criminal básico da necessidade da pena».
Uma síntese destas posições sobre os fins das penas foi feita no acórdão do STJ de 20-05-1998, CJSTJ 1998, tomo 2, pág. 205 e BMJ 477, 124 nos seguintes termos: “A defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração), é a finalidade primeira, que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo que a culpa do agente consente; entre esses limites, satisfazem-se, quanto possível, as necessidades da prevenção especial positiva ou de socialização.
Ou seja, devendo ter um sentido eminentemente pedagógico e ressocializador, as penas são aplicadas com a finalidade primordial de restabelecer a confiança colectiva na validade da norma violada, abalada pela prática do crime, e, em última análise, na eficácia do próprio sistema jurídico-penal”.
Anabela Miranda Rodrigues, O Modelo de Prevenção na Determinação da Medida Concreta da Pena, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, nº 2, Abril/Junho de 2002, págs. 147 e ss., como proposta de solução defende que a medida da pena há-de ser encontrada dentro de uma moldura de prevenção geral positiva e que será definida e concretamente estabelecida em função de exigências de prevenção especial, nomeadamente de prevenção especial positiva ou de socialização; a pena, por outro lado, não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
Adianta que “é o próprio conceito de prevenção geral de que se parte - protecção de bens jurídicos alcançada mediante a tutela das expectativas comunitárias na manutenção (e no reforço) da validade da norma jurídica violada - que justifica que se fale de uma moldura de prevenção. Proporcional à gravidade do facto ilícito, a prevenção não pode ser alcançada numa medida exacta, uma vez que a gravidade do facto ilícito é aferida em função do abalo daquelas expectativas sentido pela comunidade. A satisfação das exigências de prevenção terá certamente um limite definido pela medida da pena que a comunidade entende necessária à tutela das suas expectativas na validade das normas jurídicas: o limite máximo da pena. Que constituirá, do mesmo passo, o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade, que não pode ser excedido em nome de considerações de qualquer tipo, ainda quando se situe abaixo do limite máximo consentido pela culpa. Mas, abaixo daquela medida (óptima) de pena (da prevenção), outras haverá que a comunidade entende que são ainda suficientes para proteger as suas expectativas na validade das normas - até ao que considere que é o limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas. Aqui residirá o limite mínimo da pena que visa assegurar a finalidade de prevenção geral”.
Apresenta três proposições em jeito de conclusões e da seguinte forma sintética:
“Em primeiro lugar, a medida da pena é fornecida pela medida de necessidade de tutela de bens jurídicos, isto é, pelas exigências de prevenção geral positiva (moldura de prevenção). Depois, no âmbito desta moldura, a medida concreta da pena é encontrada em função das necessidades de prevenção especial de socialização do agente ou, sendo estas inexistentes, das necessidades de intimidação e de segurança individuais. Finalmente, a culpa não fornece a medida da pena, mas indica o limite máximo da pena que em caso algum pode ser ultrapassado em nome de exigências preventivas”.
E finaliza, afirmando: “É este o único entendimento consentâneo com as finalidades da aplicação da pena: tutela de bens jurídicos e, na medida do possível, a reinserção do agente na comunidade, e não compensar ou retribuir a culpa. Esta é, todavia, pressuposto e limite daquela aplicação, directamente imposta pelo respeito devido à eminente dignidade da pessoa do delinquente”.

A intervenção do Supremo Tribunal de Justiça em sede de concretização da medida da pena, ou melhor, do controle da proporcionalidade no respeitante à fixação concreta da pena, tem de ser necessariamente parcimoniosa, porque não ilimitada, sendo entendido de forma uniforme e reiterada que “no recurso de revista pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada”- cfr. acórdãos de 09-11-2000, processo nº 2693/00-5ª; de 23-11-2000, processo nº 2766/00 - 5ª; de 30-11-2000, processo nº 2808/00 - 5ª; de 28-06-2001, processos nºs 1674/01-5ª, 1169/01-5ª e 1552/01-5ª; de 30-08-2001, processo nº 2806/01 - 5ª; de 15-11-2001, processo nº 2622/01 - 5ª; de 06-12-2001, processo nº 3340/01 - 5ª; de 17-01-2002, processo 2132/01-5ª; de 09-05-2002, processo nº 628/02-5ª, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 193; de 16-05-2002, processo nº 585/02 - 5ª; de 23-05-2002, processo nº 1205/02 - 5ª; de 26-09-2002, processo nº 2360/02 - 5ª; de 14-11-2002, processo nº 3316/02 - 5ª; de 30-10-2003, CJSTJ 2003, tomo 3, pág. 208; de 11-12-2003, processo nº 3399/03 - 5ª; de 04-03-2004, processo nº 456/04 - 5ª, in CJSTJ 2004, tomo1, pág. 220; de 11-11-2004, processo nº 3182/04 - 5ª; de 23-06-2005, processo nº 2047/05 -5ª; de 12-07-2005, processo nº 2521/05 - 5ª; de 03-11-2005, processo nº 2993/05 - 5ª; de 07-12-2005 e de 15-12-2005, CJSTJ 2005, tomo 3, págs. 229 e 235; de 29-03-2006, CJSTJ 2006, tomo 1, pág. 225; de 15-11-2006, processo n.º 2555/06 - 3ª; de 14-02-2007, processo n.º 249/07 - 3ª; de 08-03-2007, processo n.º 4590/06 - 5ª; de 12-04-2007, processo n.º 1228/07 - 5ª; de 19-04-2007, processo n.º 445/07 - 5ª; de 10-05-2007, processo n.º 1500/07 - 5ª; de 04-07-2007, processo n.º 1775/07 - 3ª; de 17-10-2007, processo n.º 3321/07 - 3ª; de 10-01-2008, processo n.º 907/07 - 5ª; de 16-01-2008, processo n.º 4571/07 - 3ª; de 20-02-2008, processos n.ºs 4639/07 - 3ª e 4832/07-3ª; de 05-03-2008, processo n.º 437/08 - 3ª; de 02-04-2008, processo n.º 4730/07 - 3ª; de 03-04-2008, processo n.º 3228/07 - 5ª; de 09-04-2008, processo n.º 1491/07 - 5ª e processo n.º 999/08-3ª; de 17-04-2008, processos n.ºs 677/08 e 1013/08, ambos desta secção; de 30-04-2008, processo n.º 4723/07 - 3ª; de 21-05-2008, processos n.ºs 414/08 e 1224/08, da 5ª secção; de 29-05-2008, processo n.º 1001/08 - 5ª; de 15-07-2008, processo n.º 818/08 - 5.ª; de 03-09-2008 no processo n.º 3982/07-3ª; de 10-09-2008, processo n.º 2506/08 - 3ª; de 08-10-2008, nos processos n.ºs 2878/08, 3068/08 e 3174/08, todos da 3ª secção; de 15-10-2008, processo n.º 1964/08 - 3ª; de 22-10-2008, processo n.º 215/08-3ª.
De acordo com o disposto nos artigos 71.º, n.º 1, e 40.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Código Penal, na graduação da sanção deve olhar-se para as funções de prevenção geral e especial das penas, mas sem se perder de vista a culpa do agente, ou, dito de outra forma, «a pena, no mínimo, deve corresponder às exigências e necessidades de prevenção geral, de modo a que a sociedade continue a acreditar na validade da norma punitiva; no máximo, não deve exceder a medida da culpa, sob pena de degradar a condição e dignidade humana do agente; e, em concreto, situando-se entre aquele mínimo e este máximo, deve ser individualizada no quantum necessário e suficiente para assegurar a reintegração do agente na sociedade, com respeito pelo mínimo ético a todos exigível» – cfr. acórdão do STJ de 22-09-04, processo n.º 1636/04 - 3.ª.
Na determinação da medida concreta da pena deve o Tribunal, em conformidade com o disposto no artigo 71.º, nº 2, do Código Penal, atender a todas as circunstâncias que deponham a favor ou contra o agente, abstendo-se no entanto de considerar aquelas que já fazem parte do tipo de crime cometido.
O limite mínimo da pena a aplicar é assim determinado pelas razões de prevenção geral que no caso se façam sentir; o limite máximo pela culpa do agente revelada no facto; e servindo as razões de prevenção especial para encontrar, dentro daqueles limites, o quantum de pena a aplicar – cfr. Jorge de Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Editorial Notícias, págs. 227 e ss.
Ou, como expressivamente se diz no acórdão deste STJ de 16-01-2008, processo n.º 4565/07-3.ª: «A norma do art. 40.º do CP condensa em três proposições fundamentais o programa político-criminal sobre a função e os fins das penas: a) protecção de bens jurídicos; b) a socialização do agente do crime; c) constituir a culpa o limite da pena mas não o seu fundamento.
O modelo do C P é de prevenção: a pena é determinada pela necessidade de protecção de bens jurídicos e não de retribuição da culpa e do facto. A fórmula impositiva do art. 40.º determina, por isso, que os critérios do art. 71.º e os diversos elementos de construção da medida da pena que prevê sejam interpretados e aplicados em correspondência com o programa assumido na disposição sobre as finalidades da punição.
O modelo de prevenção acolhido – porque de protecção de bens jurídicos – estabelece que a pena deve ser encontrada numa moldura de prevenção geral positiva, e concretamente estabelecida também em função das exigências de prevenção especial ou de socialização, não podendo, porém, na feição utilitarista preventiva, ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
Dentro desta medida de prevenção (protecção óptima e protecção mínima – limite superior e limite inferior da moldura penal), o juiz, face à ponderação do caso concreto e em função das necessidades que se lhe apresentem, fixará o quantum concretamente adequado de protecção, conjugando-o a partir daí com as exigências de prevenção especial em relação ao agente (prevenção da reincidência), sem poder ultrapassar a medida da culpa.
Nesta dimensão das finalidades da punição e da determinação em concreto da pena, as circunstâncias e critérios do art. 71.º do CP devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.»

Comecemos pela análise da situação do arguido, a qual servirá em boa medida para avaliar igualmente a da arguida.
O recorrente entende como adequada uma pena que se situe entre os 5 e os 6 anos de prisão.
O acórdão recorrido considerou, e bem, não se verificarem os pressupostos da reincidência que era imputada ao arguido na decisão de Macedo de Cavaleiros.
Na análise da situação do arguido, com naturais reflexos na apreciação da situação da arguida KK, existem dois aspectos que merecem mais atenção, face ao que é concretizado na matéria de facto dada por provada.
Referimo-nos ao período de tempo por que se protraiu a actividade de ambos os arguidos e à qualidade dos produtos traficados.
O acórdão recorrido, ao ponderar sobre a dosimetria da pena, a fls. 8029 v.º e 8030, considerou elevada a ilicitude dos factos apurados, olhando à quantidade e diferente qualidade (principalmente haxixe e uma ou outra vez heroína) de estupefacientes que o arguido JJ comprava e vendia no circunstancialismo e período de tempo dado como provado.
Prossegue: “O seu (do arguido JJ) profundo envolvimento no tráfico de drogas (até considerando o período de tempo em que o cometeu), mostra que é um traficante que se situa num escalão acima da média”.
Considera de seguida que importa atender ao período de tempo (a partir de data indeterminada de 2001até 13/5/2006, ou seja, durante cerca de 4 anos e 5 meses) em que cometeram o crime em questão.
Ao referir-se o acórdão às consequências graves da conduta (dos arguidos JJ e KK), a fls. 8030, refere a necessidade de se ter em atenção “as quantidades de haxixe -sendo que de heroína apenas se apurou a venda nos casos concretos indicados nos factos apurados mas desconhece-se o quantitativo o que também os não pode desfavorecer”.

Começando pelo período temporal de actividade desenvolvida pelos arguidos.
A actividade do arguido era a de retalhista, comprando o produto que depois vendia a clientes, que depois o revenderiam a terceiros consumidores, mas também fazendo vendas directas a consumidores.
Vem dado por provado no segundo parágrafo do ponto VII dos factos provados, onde se explicita a actividade dos dois arguidos, que “Pelo menos desde data não concretamente apurada do ano de 2001 e até à data da sua detenção em 13/05/2006, que (o arguido JJ, também conhecido por “JJ”) se vinha dedicando, cada vez com mais intensidade e em maiores quantidades, à compra e venda de estupefacientes, principalmente haxixe e liamba, mas também, em quantidades menores, heroína”. (sublinhado nosso).
O reporte ao início da actividade de tráfico em data não concretamente apurada de 2001 redunda numa imputação genérica, não confirmada pelos factos que se descrevem a seguir a tal proclamação.
A esmagadora referência a datas de vendas reporta-se ao período pós Setembro de 2005 e até 13 Maio de 2006, altura em que os arguidos foram detidos.
Relativamente ao ano de 2001 na matéria de facto dada por provada há apenas duas referências.
Refere o § 6 do ponto VII dos factos provados, data não concretamente apurada de 2001, quanto a vendas ao arguido Rui T. Braga, mas concretizando datas apenas a partir de 26-09-2005.
Reafirmando-se a realização de vendas em 2001, no segmento dos factos dados por provados respeitantes ao arguido MM – ponto IX – deu-se por provado que “… e comprou até ser preso haxixe desde 2001 ao arguido JJ”.
E no segmento das vendas directas, as vendas a FFFFF, dando-se por provado que o arguido JJ vendeu “desde data não concretamente apurada do ano de 2001 até ser preso, uma patela de 20.00 € de 15 em 15 dias, incluindo em 11-05-2006”.
O ano de 2002 não mereceu qualquer reporte concretizador de vendas por parte do arguido.
No que tange ao ano de 2003, por uma única vez, surge uma referência, concretizando-se transacção por uma única vez em 28-11-2003.
Foi dado por provado que o arguido vendeu ao “arguido ZZZZ, conhecido por “espanhol”, várias vezes haxixe em quantidades variáveis desde um sabonete de 50,00 € a patelas de 20,00 €, assim sucedendo em 28/11/2003; em 1/09/2005 (50,00 €); em 13/09/2005 (50,00€ para outra pessoa mas retirando uma parte para ele); em 22/09/2005 (20,00€); em 10/10/2005 (50,00 €); em 27/10/2005 (40.00€); e em 8/2/06, para vender e para seu consumo” (sublinhado nosso).
Este facto provado de venda tem de ser conjugado com o que ficou provado no que respeita aos compradores indicados.
A referência a 28-11-2003 é repetida no ponto IX dos factos provados respeitantes ao co-arguido MM, precisando-se que tal arguido foi detido nesse dia pelas 15,30 horas, no café “M... da F....”, ao mesmo tempo que o arguido J.... “espanhol” quando ambos estavam na posse de 60,776 gramas (peso líquido) de haxixe (canabis) que tinham adquirido conjuntamente e “ a meias” ao arguidoJJ.
No que toca aos factos provados relativos ao co-arguido ZZZZ “espanhol” ali referido e descritos no ponto XI, refere-se que naquele dia no dito café estando acompanhado do co-arguido AAAAA, foi detido e revistado, tendo-lhe sido encontrado um pedaço de haxixe (canabis) com o peso de 60,78 gramas que estava a dividir fazendo uso de um canivete e de que ia dar parte ao AAAAA, mas sem ser referida a aquisição dessa droga em concreto ao arguido JJ, apenas mais abaixo se dando por provado que para além de compras de heroína desde o Verão de 2005 a outros arguidos, o ZZZZ “desde pelo menos 2003 comprava canabis (haxixe e liamba) ao JJ “do mercado” em sabonetes ou em porções menores”.
O ano de 2004 é referenciado por três vezes.
Foram dadas por provadas compras de haxixe por parte do arguido LL e após se referir que o arguido JJ lhe vendia desde Setembro de 2005 a Fevereiro de 2006, deu-se por provado que “o qual lhe comprava para seu consumo desde meados de 2004” o que não tem correspondência no segmento específico relativo ao arguido LL constante do ponto VIII, e por outro lado, no segmento das vendas directas, foi dado por provado (primeiro caso) que “vendeu directamente a RRRR, pelo menos em 2004 haxixe, de que era consumidor, 10,00 € de cada vez” (sic) e (caso n.º 20) a “M..... de ... que para contactar o arguido usou o telemóvel n.º 00000000, desde 2004, haxixe em 30/11/2005” (sic).
Como vem sendo afirmado pela jurisprudência dominante do STJ, as imputações genéricas, designadamente no domínio do tráfico de estupefacientes, sem qualquer especificação das condutas em que se concretizou o aludido comércio e do tempo e lugar em que tal aconteceu, por não serem passíveis de um efectivo contraditório e, portanto, do direito de defesa constitucionalmente consagrado, não podem servir de suporte à qualificação da conduta do agente - neste sentido podem ver-se os acórdãos de 06-05-2004, processo n.º 908/04-5ª; de 04-05-2005, processo n.º 889/05; de 07-12-2005, processo n.º 2945/05; de 06-07-2006, processo n.º 1924/06-5ª; de 14-09-2006, processo n.º 2421/06 - 5.ª; de 17-01-2007, processo n.º 3644/06-3ª; de 24-01-2007, processo n.º 3647/06-3ª; de 21-02-2007, processos n.ºs 4341/06 e 3932/06, ambos da 3ª secção; de 02-05-2007, processo n.º 1238/07-3ª; de 16-05-2007, processo n.º 1239/07-3ª; de 04-07-2007, processo n.º 2303/07-3ª, CJSTJ 2007, tomo 2, pág. 234; de 15-11-2007, processo n.º 3236/07-5ª; de 02-04-2008, processo n.º 4197/07-3ª e n.º 578/08-3ª (neste afirmando-se que a dúvida sobre a quantidade de droga vendida a vários consumidores, e apresentada de forma indeterminada e em jeito de imputação genérica, tem de ser equacionada de acordo com o princípio in dubio pro reo); de 02-07-2008, processo n.º 3861/07-3ª.
Sem a individualização concreta e clara dos actos integrantes da actividade do arguido, a referência vaga e indeterminada não relevará para efeitos de enquadramento de tráfico com a amplitude temporal certificada nas instâncias, ou seja, durante cerca de 4 anos e 5 meses.
Não pode ser conferida toda essa amplitude, a extensão da conduta, pois não se concretiza o modo de execução, os locais onde tiveram lugar as vendas, a periodicidade da sua realização, se os compradores eram revendedores ou meros consumidores, e quanto a qualidade, o que foi efectivamente vendido, se haxixe, ou heroína.
Tal imprecisão da matéria de facto provada impede que se considere respeitado o princípio do contraditório, dado que o arguido não poderá validamente nestes casos pronunciar-se sobre a afirmação genérica em causa, uma vez que não concretizada ou individualizada noutros pontos da matéria de facto, no que respeita a alguns períodos.
Nesta conformidade, cumpre concluir que a imprecisão inviabiliza a sua aceitação para efeitos penais - exceptuados os casos concretizados, com realce, nos períodos pouco esclarecidos, para os casos singulares de 2001, a venda de 28-11-2003, os casos restritos de 2004 - designadamente, para efeitos de consideração da indicada delimitação temporal da prática do crime, dado que tal constituiria uma violação do direito de defesa do arguido constitucionalmente consagrado.

No que respeita à qualidade do produto, nos seis casos especificados em que o arguido JJ actuava como fornecedor/retalhista (sendo que um deles apenas se reporta a venda “ao C.....”, de € 50 de haxixe em 28/3/2006), apenas são referidas transacções de haxixe.
E no que respeita às concretizações dos 30 (trinta) casos em que o arguido vendeu directamente aos consumidores, em 28 situações é referido apenas o tráfico de haxixe e apenas em duas a venda de heroína, ambas em Março de 2006, como se vê dos factos provados:
“- B.... que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 0000000, heroína em 25/03/2006;
- KKKKK que para contactar o arguido usou o telemóvel nº 00000000, heroína em 26/03/2006”.
No que toca aos factos provados respeitantes ao arguido MM – Ponto IX – deu-se por provado no primeiro parágrafo que “…comprou heroína e cocaína até 2003, para seu consumo e comprou até ser preso haxixe desde 2001 ao arguido JJ”.
Nos dois casos de Março de 2006 desconhece-se que quantidade de heroína foi vendida e por que preço (como se diz no acórdão recorrido, o desconhecimento do quantitativo não os pode desfavorecer), e no caso de AAAAA, a referência é extremamente vaga, desconhecendo-se desde quando e que quantidades foram adquiridas, a periodicidade de compra de heroína, surgindo referência a cocaína pela primeira vez, sendo que tal compra ao JJ não tem o correspondente sinalagma em sede de atribuição de vendas concretas feitas a este arguido, pois que na sede própria, como se viu, apenas se refere venda de haxixe, podendo numa outra, legítima, leitura entender-se que a primeira parte do excerto se referirá a outros fornecedores co-arguidos e só na parte final quanto ao haxixe se referirá ao arguido JJ, o que liga com o antecedente quanto às vendas.
A única referência a liamba reporta-se ao produto que foi apreendido em casa do casal em 13 de Maio: 7, 970 de haxixe (canabis) sic em pedaços e um embrulho plástico com 1, 230 gramas de peso líquido de liamba.
Em suma, no que concerne à natureza e qualidade do produto estupefaciente em causa, releva sobremaneira a compra e venda de haxixe, face às descrições das várias vendas, ao produto apreendido na residência e o que foi apreendido em resultado da colaboração do arguido, encontrando-se tal substância prevista na Tabela I-C, droga considerada como de menor potencialidade de dano, com menor grau de lesividade dos bens jurídicos protegidos.
Com efeito, se é certo que o Decreto-Lei n.º 15/93 não adere totalmente à distinção entre drogas leves e drogas duras, não deixa de afirmar no preâmbulo que “a gradação das penas aplicáveis ao tráfico, tendo em conta a real perigosidade das respectivas drogas afigura-se ser a posição mais compatível com a ideia de proporcionalidade”, havendo que atender à inserção de cada droga nas tabelas anexas, o que constitui indicativo da respectiva gradação, pois a organização e colocação nas Tabelas segue, como princípio, o critério da sua periculosidade intrínseca e social.
O produto destinou-se a considerável número de consumidores, quer por via directa, quer através das revendas, sendo grande o risco de disseminação do mesmo.
Relativamente à duração da actividade de tráfico, a delimitação temporal é de considerar como incidindo mais a partir de Setembro de 2005, ou seja, desenvolvendo-se ao longo de um período temporal mais apertado, ou numa outra perspectiva, com menos intensidade (as referências a 2001, 28-11-2003 e 2004 são episódicas e circunstanciais).
Na base do negócio estava uma estrutura organizativa quase rudimentar, apenas dispondo o arguido e sua mulher de outros locais de guarda e transporte do produto, a cargo do co-arguido LL, como resulta dos pontos de factos provados VII e VIII.
O valor monetário apreendido foi de 2.900 euros.
De relevo a atitude do arguido, que depois de detido, por sua iniciativa, indicou o local onde estava escondido um pedaço de haxixe, com o peso de 246, 085 gramas.
O arguido trabalhava no restaurante dos pais, auferindo cerca de 500,00 €, sendo pai de dois menores, com 7 anos e 15 meses de idade.
O arguido tem a 4ª classe, sendo de humilde condição social, gozando do apoio familiar, trabalhando no Estabelecimento Prisional como faxina.
As necessidades de prevenção geral são elevadas como assinalou o acórdão recorrido.
O arguido, não sendo reincidente, como decidiu o acórdão, e bem, tem antecedentes criminais com algum relevo.
O ponto VII dos factos provados começa por referir a condenação do arguido por “várias vezes” em pena de prisão, sendo certo que o arguido sofreu quatro condenações nos processos n.ºs 54/91, 8/92, 26/92 e 53/93, tendo respondido por factos situados em 1991, quando tinha 18 anos de idade, sendo condenado no último processo, por acórdão de 24-05-1994, em cúmulo jurídico das penas aplicadas anteriormente, na pena única de 9 anos de prisão, tendo beneficiado dos perdões das Leis n.º 23/91, de 04-07 e n.º 15/94, de 11-05, no total de 2 anos, 6 meses e 15 dias, tendo cumprido a pena residual de 4 anos, 7 meses e 21 dias, entre 22-11-1991 e 13-07-1996, data em que foi concedida a liberdade condicional, com a definitiva a ser concedida em 03-05-1998.
Os antecedentes criminais referem-se a ilícitos de diferente natureza (furtos simples e qualificados), revelando uma maior desatenção por parte do arguido à advertência de conformação ao direito, funcionando os mesmos como agravante geral.
Sendo de ter presente a pessoalidade das penas e sabendo-se que cada caso é um caso, não se pode deixar de surpreender alguma diferenciação de tratamento, que não parece de sustentar, e sobretudo, ora de manter, ao cotejarmos as penas atribuídas aos arguidos AA, GG e JJ, sendo este o arguido com pena aplicada mais elevada.
Estando em causa um caso de tráfico regional, com limites geográficos definidos, do texto dos acórdãos não se surpreende qualquer ligação entre os três mencionados arguidos, afora o facto de terem alguns clientes comuns, sendo que o arguido AA traficou em heroína e cocaína durante cerca de 4 meses e o arguido GG, durante mais de um ano, igualmente traficou em heroína e cocaína, tendo ficado provado quanto a este, que efectuava misturas dos estupefacientes com outros produtos, sendo ainda o único arguido considerado reincidente.
A ter em conta a necessidade de prevenção especial, pois que as condenações anteriores não demoveram eficaz e definitivamente o arguido da prática de ilícitos, embora de outra natureza.
Por outro lado, há a considerar o facto de os arguidos recorrentes (todos) não terem prestado declarações em julgamento, exercendo o seu direito ao silêncio, tendo o ora recorrente, no entanto, prestado declarações, quanto às suas condições pessoais.
Sopesados todos estes elementos, considerando que o tráfico desenvolvido pelo arguido JJ teve uma amplitude temporal mais restrita do que a entendida pelas instâncias, que o “negócio” se restringiu, comprovadamente, praticamente apenas a compra e venda de haxixe, atento o que supra se disse quanto aos “casos” de venda de heroína, e atendendo a que foi o único arguido que contribuiu de alguma forma para a descoberta da verdade, com a indicação que conduziu à apreensão do haxixe referido, entende-se ser adequada uma redução na pena, fixando-a, por adequada, equilibrada, necessária e não excessiva, em sete anos de prisão.

Vejamos agora a situação quanto à recorrente KK.
Pretende a recorrente a aplicação de uma pena que se situe entre os 3 e os 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa na execução e sujeita a regime de prova – conclusão 16ª.
Casada com o co-arguido JJ, esta recorrente participou na actividade por ele desenvolvida, embora ele tivesse maior disponibilidade e assumisse a liderança do negócio, por vezes acompanhando o marido e procedendo a entregas.
Como assinalou o acórdão recorrido “importa distinguir a contribuição de cada membro do casal, tendo presente que a conduta do JJ foi mais intensa em relação à da sua mulher, na medida em que era ele que assumia a liderança do negócio e que para o mesmo tinha maior disponibilidade”.
Há que atender ao facto de ser pessoa jovem, tendo 26 anos aquando da detenção, pois nasceu em 19-01-80, que trabalhava no restaurante dos sogros, auferindo 250,00 €, tendo o 6 º ano de escolaridade, sendo humilde a condição social.
Não ficou provado que, como alega na conclusão 15ª, tivesse actuado “muitas das vezes sobre a influência e ameaça do seu cônjuge, a pessoa de quem dependia de uma forma bastante emocional”.
Releva a primariedade da recorrente.
Como decorre do artigo 29º do Código Penal, cada comparticipante deve ser punido segundo a sua culpa, independentemente da punição ou do grau de culpa dos outros comparticipantes.
Sendo características da culpa a sua pessoalidade e intransmissibilidade, a culpas diferentes corresponderão penas diferentes, atento o princípio da igualdade – artigo 13º da CRP – o qual tanto é respeitado tratando por igual situações iguais como tratando diferentemente situações diferentes.
Pelas mesmas razões por que se reduziu a pena aplicada ao arguido marido, exceptuada a iniciativa própria referida, ou seja, tendo em conta as apontadas restrições quanto ao período temporal da actividade e no que concerne à natureza e qualidade do estupefaciente traficado, mas tendo em conta os sinais distintivos em relação à actividade do marido, como o é por um lado, a reconhecida menor intensidade de actividade da recorrente, e por outro, a ausência de antecedentes criminais, entende-se ser de reduzir a pena aplicada à arguida, considerando-se como ajustada a pena de quatro anos e seis meses de prisão.
Esta nova pena suscita uma questão, que tem a ver face a essa nova dimensão, com a possibilidade de suspensão da execução, que constitui um poder dever vinculado, a exigir uma específica fundamentação, quer no sentido da concessão quer da denegação (artigos 50º, n.º 4, do Código Penal e 375º, n.º 1, do CPP).
Com a nova versão do artigo 50º do Código Penal, introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 04-09, passou a ser possível aquela suspensão, reunidos os demais pressupostos, em casos em que tenha sido aplicada pena de prisão até 5 anos.
Confrontado com este tipo de situação, nomeadamente, em casos de sucessão de leis aplicáveis e face ao disposto no artigo 371º- A do CPP, tem sido entendido neste Supremo Tribunal dever conhecer-se logo da possibilidade da concessão ou denegação da pena de substituição, o que é sustentado em vários arestos, havendo outra linha que defende que na falta de elementos seguros e actualizados não se deverá tomar posição na questão, ou ainda face a tal carência de dados remeter a decisão para o tribunal de 1ª instância.
Situando-se na segunda posição, passamos a citar o que consta no acórdão de 30-04-2008, no processo n.º 4723/07, de que fomos relator:
“Colocando-se aqui e agora, pela primeira vez, tal questão, afigura-se-nos que não se deverá avançar no sentido de equacionar uma tal possibilidade, uma vez que o recorrente no âmbito do processo, sempre poderá, se assim o entender, requerer a reabertura da audiência para que lhe seja aplicado o novo regime mais favorável, de acordo com o artigo 371º - A do CPP, na redacção dada pela Lei nº 48/07, de 29 de Agosto, em que será avaliada essa possibilidade numa audiência convocada especificamente para tal efeito, pois de contrário, decidindo-se desde já, estar-se ia a impedir um grau de recurso, o que contrairia o direito de recurso reconhecido em sede constitucional desde a Lei Constitucional nº 1/1997, de 20-09, com a inclusão da parte final “incluindo o recurso” no nº 1 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa – neste sentido, acórdãos de 13-12-2007 e de 19-12-2007, nos processos nº 3210/07 e 4275/07, ambos relatados pelo presente relator.
Há que considerar o facto de que aquando da decisão ora recorrida não se colocava a hipótese da possibilidade de suspensão no caso concreto e daí não se terem recolhido elementos factuais que na vigência de outro regime legal, mais benévolo, deveriam ser carreados para o processo, sob pena de se incorrer no vício de insuficiência para a decisão de matéria de facto provada, que neste quadro concreto obviamente não se verifica, porque não existia uma tal solução de direito – a insuficiência só é detectável face à nova lei.
Por outras palavras, à época não se colocava a necessidade de angariação de factos que suportassem a formulação ou não de um juízo de prognose favorável – facto novo.
A nova solução legal surge posteriormente, podendo naturalmente falecerem dados importantes para a análise conscienciosa que se impõe, até porque supõe a abordagem de questão com outros parâmetros e um maior grau de exigência de fundamentação.
Configurando-se a suspensão como um poder dever, um poder vinculado do julgador, tendo o tribunal sempre de fundamentar especificamente, quer a concessão, quer a denegação da suspensão, a fundamentação da posição assumida pressupõe uma boa e mais ampla fundamentação de facto, que pode não ocorrer, exactamente porque não equacionada, porque não previsível ao tempo da decisão.
Sendo assim, não se conhecerá de tal questão”.
A mesma argumentação foi utilizada nos acórdãos de 22-10-2008, no processo n.º 215/08 e de 14-01-2009, no processo n.º 2494/08, com o mesmo relator.
No acórdão de 24-01-2008, processo n.º 4574/07-5ª, em situação em que o tribunal recorrido não colocara a hipótese da suspensão da pena, pois ao tempo da decisão tal não era legalmente possível para as penas de prisão superiores a 3 anos, considera-se que: “Assim, como se está perante questão nova que resultou da mudança da lei penal no tempo, de cuja apreciação pode resultar para o recorrente uma decisão mais favorável, há que aplicar mutatis mutandis o disposto nos arts. 369.º a 371.º - A do CPP.
Em consequência, depois de se confirmar a pena aplicada na 1.ª instância, há que reenviar o processo para o tribunal recorrido, para que aí, após se mandar efectuar relatório social actualizado e perícia sobre a personalidade do arguido, se reabra a audiência, onde, entre outras diligências consideradas úteis, se podem ouvir o perito criminológico, o técnico de reinserção social e, quiçá, a mãe da vítima, tendo por única finalidade decidir se deve ou não ser aplicada pena de substituição”.
No acórdão de 31-01-2008, processo n.º 2798/07-5ª, em situação em que se procedeu a atenuação especial e se fixou a pena única em 2 anos e 6 meses de prisão, na ponderação de aplicação da pena de substituição, refere-se: “No caso, este Tribunal não dispõe de elementos suficientes e actualizados, em ordem a fazer um juízo de prognose fundamentado, tal como exigido por lei, e sobretudo para adequar a medida à sua situação, sendo certo que o recorrente tem estado em liberdade. Impõe-se, por isso, apurar os elementos necessários, na 1.ª instância, nomeadamente recorrendo à elaboração de relatório social, com vista ao objectivo de se aplicar ou não a referida pena de substituição, subordinada ou não a deveres e regras de conduta ou ao regime de prova”.
No acórdão da mesma data e do mesmo relator, no processo n.º 3272/07, considera-se que estando os crimes cometidos pelo arguido em relação de concurso, a suspensão da pena aplicada só deve ser ponderada depois de efectuado pelo tribunal competente o cúmulo jurídico de todas as penas, caso a pena única se situe dentro do limite de 5 anos, ponderação essa que deve ser precedida de relatório social actualizado.
No acórdão de 25-06-2008, processo nº 2046/07-3ª, em que o arguido é condenado pela autoria de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º do DL n.º 15/93, é seguida esta posição, ordenando-se a remessa dos autos à primeira instância para reabertura de audiência, nos termos do artigo 371º-A, do CPP.
Em tal acórdão pode ler-se: “Tendo o arguido sido condenado, pela prática do referido ilícito criminal, numa pena de 5 anos de prisão, não passível de qualquer intervenção correctiva por parte deste STJ, coloca-se a questão da suspensão da respectiva execução, ao abrigo da nova redacção do art. 50.º, n.º 1, do CP, claramente mais favorável ao arguido (art. 2.º, n.º 4, do mesmo diploma legal). Porém, sendo este Supremo Tribunal confrontado com esta questão nova, resultante da modificação da lei penal, uma vez que nem a 1.ª instância nem a Relação equacionaram essa hipótese, porque à data não era legalmente possível a suspensão da execução de uma pena de 5 anos de prisão, e porque, apesar do consignado na matéria de facto, os elementos ali constantes já remontam há alguns anos, sendo necessário que o tribunal disponha de dados actualizados, nomeadamente relatório social, que sirvam de ponderação da aplicabilidade da pena de substituição, devem os autos ser remetidos à 1.ª instância para que proceda à reabertura da audiência – arts. 370.º a 371.º-A, do CPP –, aí se procedendo às diligências reputadas úteis, com o fim de se decidir se deve, ou não, ser aplicada a pena de substituição de suspensão da execução da pena de prisão.
Do mesmo modo no acórdão de 03-07-2008, processo n.º 1623/08-5ª, em que se considerou tornar-se necessário realizar relatório social a dar conta dos aspectos ressocializantes do recorrente, cabendo então ao tribunal da condenação tomar posição actualizante quanto à medida de suspensão de execução da pena de prisão, no âmbito e para os efeito do artigo 371º- A, do CPP.
No acórdão de 10-07-2008, processo n.º 3054/06-3ª, em situação em que tendo o arguido sido condenado numa pena de 4 anos e 4 meses de prisão e colocando-se a questão da suspensão da respectiva execução, ao abrigo da nova redacção do art. 50.º, n.º 1, do CP, claramente mais favorável ao arguido (art. 2.º, n.º 4, do mesmo diploma legal), considera-se quesendo este Supremo Tribunal confrontado com esta questão nova, resultante da modificação da lei penal, uma vez que nem a 1.ª instância nem a Relação equacionaram essa hipótese, porque à data não era legalmente possível a suspensão da execução de uma pena superior a 3 anos de prisão, não dispondo, sequer, de relatório social actualizado que sirva de ponderação da aplicabilidade da pena de substituição, devem os autos ser remetidos à 1.ª instância para que proceda à reabertura da audiência para que tenham lugar as diligências reputadas úteis, com o único propósito de se decidir se deve, ou não, ser aplicada a pena de substituição de suspensão da execução da pena de prisão”.
No acórdão de 04-02-2009, processo n.º 4135/08, relatado pelo ora relator, foi adoptada a solução de ordenar a reabertura da audiência, a fim de ser apreciada a nova questão, com elaboração de relatório social actualizado.
Na situação presente adoptar-se-á a mesma solução, devendo ser reaberta a audiência na 1ª instância, a fim de ser ponderada a concessão ou não da pena de substituição, que no caso sempre será acompanhada de regime de prova, com elaboração de relatório social actualizado, através do qual se possa ter uma noção mais precisa e abrangente da personalidade da arguida, bem como da sua inserção familiar e social, tendo-se em particular atenção o que foi alegado na conclusão 15ª da motivação da recorrente, mais concretamente os pontos 1, 2, 4, 5 e 11, bem como a recolha dos demais elementos que se mostrem necessários a essa ponderação.



Recurso do arguido CC

Neste recurso em causa está apenas a medida da pena aplicada, defendendo o recorrente que a mesma deve ser “ajustada numa redução”, tendo em conta os factores que enuncia, mas sem concretizar a medida pretendida.
Atenta a qualificativa da reincidência, a moldura penal abstracta é de prisão de 5 anos e 4 meses a 12 anos.
Sobre esta matéria, para além do mais, a decisão recorrida, a fls. 220, pronunciou-se assim: “…importa atender ao seu modo de actuação, período de tempo (desde data não apurada do ano de 2004 até 24/1/2006, ou seja, durante cerca de pelo menos um ano e quatro meses, na interpretação mais favorável ao arguido na ausência de outros elementos concretos nessa matéria) em que cometeu o crime em questão, motivos que o determinaram (obtenção de lucro fácil), lucros que obteve (atentos os preços de compra e os preços de venda que praticou naquele período de tempo e quantidades de estupefacientes que transaccionou) e consequências graves da sua conduta (até tendo em atenção as quantidades de heroína e cocaína que vendia não só a consumidores como também a indivíduos que sabia que os iriam “revender”, isto é, voltar a vender) que se prolongaram no tempo. A sua conduta diversificada mostra bem que são elevadas as razões de prevenção geral positiva que se fazem sentir neste tipo de crime”.

O dolo foi directo e intenso.
A ilicitude dos factos provados é elevada, atenta a quantidade e diferente qualidade dos estupefacientes que comprava, chegando a atingir os 500 gramas, e que vendia.
O arguido comprava e vendia heroína e em menor quantidade cocaína, do que deriva elevado grau de danosidade social, com o risco criado com a disseminação dos produtos em causa, adicionados dos componentes introduzidos antes da colocação no mercado.
A ter em atenção as quantidades traficadas, mostrando-se concretizadas sete referências a revendedores e quarenta e cinco a consumidores a quem vendia directamente, para além da heroína apreendida aquando da detenção (cinco pacotes com o peso líquido de 4,600 gramas) e já posteriormente 0, 781 gramas deixados no carro pelo arguido.
No que concerne ao modo de actuação, concretizando, o recorrente comprava o grama de haxixe a 30 € e o de cocaína a 40 €, que de seguida misturava com outros produtos para lhes aumentar peso e volume para assim potenciar os lucros.
Vendia a revendedores (v. g., co-arguidos EE, chegando a atingir as 150 doses de cada vez – ponto II, alínea a); cfr. em conexão ponto IV -DD uma ou duas vezes por semana entre 3 e 10 gramas de heroína – ponto II, alínea b), em conexão com ponto III, § 2º- e II– ponto II, alínea c), em conexão com ponto VI) e vendia directamente, sendo o haxixe ao preço de 40 € por grama e a cocaína a 60 €, ou seja, com um lucro, não contando com os acréscimos das adições, de 10 € na heroína e 20 € na cocaína, vendendo igualmente meios gramas, de heroína, a 20 € e de cocaína, a 30 €.
Para comprar, transportar e entregar os produtos deslocava-se, fazendo uso de veículos seus, desenvolvendo a actividade nos concelhos de Foz Côa, Moncorvo e limítrofes da região sul do distrito de Bragança.
As razões e necessidades de prevenção geral positiva ou de integração - que satisfaz a necessidade comunitária de afirmação ou mesmo reforço da norma jurídica violada, dando corpo à vertente da protecção de bens jurídicos, finalidade primeira da punição - são muito elevadas, fazendo-se especialmente sentir neste tipo de infracção, tendo em conta o bem jurídico violado no crime em questão – a saúde pública - e impostas pela frequência do fenómeno e do conhecido alarme social e insegurança que estes crimes em geral causam e das conhecidas consequências para a comunidade a nível de saúde pública e efeitos colaterais, justificando resposta punitiva firme, o que de resto foi bem assinalado nas instâncias.
Na verdade, há que ter em atenção as grandes necessidades de prevenção geral numa sociedade assolada pelo fenómeno do tráfico de droga, que a juzante gera outro tipo de criminalidade, mas inteiramente relacionada com esta, senão mesmo por ela determinada, pois é das leis do mercado que os bens têm um preço de aquisição e quando escasseia o meio para sua obtenção muitas poderão ser as formas de alcançar o necessário e imprescindível poder aquisitivo, em vista da satisfação das necessidades geradas pela toxicodependência e como é sabido uma dessas formas mais comum é a prática de roubos, havendo que dar satisfação ao sentimento de justiça da comunidade.
No que concerne a antecedentes criminais o arguido foi condenado por crime de tráfico de estupefacientes, por factos cometidos até 04-04-1997, no processo 135/97.5TBTCS, da Comarca de Trancoso (antigo PCC n.º 13/98), por acórdão de 05-05-1998, confirmado por acórdão do STJ de 28-10-1998, na pena de 7 anos de prisão, tendo estado preso de 04-04-1997 até 6-02-2003, altura em que foi libertado na sequência de concessão de liberdade condicional, sendo a pena sido julgada extinta em 06-04-2004, por concedida liberdade definitiva, conforme certidão de fls. 2020 a 2084 (8º volume).
O arguido completou o 4º ano de escolaridade no Estabelecimento Prisional, sendo viúvo e pai de três filhos menores, que no recurso (conclusão 3ª) vêm indicados como sendo crianças de tenra idade, sem se concretizar as respectivas idades, os quais se encontram a cargo dos avós maternos.
As necessidades de prevenção especial avaliam-se em função do facto de o arguido ter estado preso, em cumprimento de pena, durante 5 anos, 10 meses e 2 dias, o que não foi suficiente para o afastar do mesmo tipo de ilícito.
Face a todos estes factores, considerando que a aplicação de penas tem como primordial finalidade a de restabelecer a confiança colectiva na validade da norma violada, abalada pela prática do crime e em última análise, na eficácia do próprio sistema jurídico penal, não devendo ultrapassar o grau de culpa, entende-se ser de manter a pena aplicada, por não se justificar intervenção correctiva deste Tribunal.


Recurso da arguida BB

A recorrente suscita várias questões, começando pela qualificação jurídica e medida da pena aplicada, mas impõe-se o conhecimento prioritário da arguida nulidade, até porque a vingar a arguição, precludidas ficariam as restantes questões, que naturalmente pressupõem uma decisão válida.
Assim, começar-se-á por apreciar a questão da nulidade invocada nas conclusões VIII a XII.

Nulidade do acórdão recorrido por falta de exame crítico das provas

A arguida no anterior recurso, tal como os co-arguidos AA, FF, JJ e KK, havia suscitado a nulidade prevista no artigo 379º, n.º 1, alínea a), do CPP, com referência ao artigo 374º, n.º 2, do mesmo Código, por na sua perspectiva a motivação de facto da decisão do Colectivo padecer de falta de fundamentação, não tendo efectuado o exame crítico das provas que serviram para fundamentar a convicção do tribunal.
A recorrente renova a arguição nas conclusões VIII a XII, defendendo que a Relação deveria ter anulado o acórdão do Colectivo de Macedo de Cavaleiros, padecendo o acórdão ora recorrido de idêntico vício.

No caso concreto, estamos face a acórdão da Relação proferido em recurso, que, como vimos supra, reapreciou a matéria de facto fixada na 1ª instância, nos termos e com a amplitude consentida pelo artigo 412º, n.ºs 3 e 4, do CPP, o que está longe de constituir um segundo julgamento, já que esse reexame é feito com base na avaliação das transcrições dos depoimentos produzidos e na análise dos demais elementos constantes dos autos, maxime documentais, sem a proximidade conferida pela imediação e oralidade.
Se é certo que por força do nº 4 do artigo 425º do CPP é correspondentemente aplicável o disposto no artigo 379º, ou seja, a arguição ou o conhecimento oficioso de nulidade, não menos verdade será que tal aplicabilidade terá os limites decorrentes da própria natureza da intervenção recursória a nível da fundamentação de facto e mais especificamente da motivação e do exame crítico das provas, que têm lugar na 1ª instância, esta sim com amplas possibilidades de cognição e investigação, actuando em imediação.
Como se pode ler no acórdão de 13-11-2002, SASTJ, nº 65, pág. 60, aplicada aos tribunais de recurso, a norma do artigo 374º, nº 2, do CPP, não tem aplicação em toda a sua extensão, nomeadamente, não faz sentido a aplicação da parte final de tal preceito “exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”, quando referida a acórdão confirmatório proferido pelo Tribunal da Relação, ou quando referida a acórdão do STJ funcionando como tribunal de revista. Se a Relação, reexaminando a matéria de facto, mantém a decisão da primeira instância, é suficiente que do respectivo acórdão passe a constar esse reexame e a conclusão de que, analisada a prova respectiva, não se descortinaram razões para exercer censura sobre o decidido.
No mesmo sentido, cfr. os acórdãos de 13-02-2008, processo n.º 4729/07-3ª; de 07-05-2008, processos n.ºs 294/08-3ª e 1132/08-3ª; de 25-06-2008, processo 2046/07-3ª, onde se aduz: “a fundamentação decisória da Relação é exercida sobre uma outra decisão que, por seu turno, já motivou a convicção; nesse sentido, não é uma fundamentação originária, mas uma fundamentação derivada, sendo-lhe lícito recorrer à fundamentação da decisão recorrida para justificar as suas próprias soluções”; de 10-09-2008, processo n.º 2506/08-3ª e de 08-10-2008, processo n.º 3068/08-3ª; de 22-10-2008, processo n.º 215/08-3ª.
O acórdão recorrido debruçou-se sobre a questão ora em causa, o que fez de fls. 189 a 194 (fls. 8010 a 8012 v.º dos autos), concluindo pela não existência da nulidade, tendo sido feita a análise conjugada e crítica de todos os elementos probatórios carreados para o processo.
Ademais, o próprio acórdão recorrido ao conhecer do invocado erro de julgamento quanto à matéria de facto impugnada - o que fez, conquanto não fosse modelar a impugnação em sede de cumprimento dos ónus impostos nos n.º 3 e 4 do artigo 412º do CPP, deficiência presente, aliás, em todos os recursos com esta matriz, incluído o da ora recorrente - procedeu a uma criteriosa, detalhada, aprofundada e fundamentada análise das provas produzidas.
Com efeito, o acórdão recorrido apreciou conjuntamente os recursos da ora recorrente e do companheiro co-arguido AA, por se relacionarem com matéria relativa à actuação dos dois arguidos, o que fez de fls. 109, in fine, a 127 do acórdão (e fls. 7970 a 7979 dos autos).
A decisão recorrida analisou o teor de conversas telefónicas, através das respectivas transcrições, citando as folhas onde se encontravam as referências feitas nos apensos das escutas, com concretizações só possíveis baseando-se em real e efectiva leitura e análise dos dados disponíveis, com indicação de dia e hora em que tiveram lugar, dando o significado de palavras usadas como código, como “camisolas” e “prenon”, referenciando inclusive análise de auto de pesquisa de telemóvel, de agenda telefónica de telemóvel, corrigindo lapso existente na matéria de facto apurada, eliminando referência a número de telemóvel por lapso indicado de forma errada, referenciando depoimentos, valorando-os de per si e em confronto com os demais e relacionando-os com buscas e autos de apreensão, chegando-se a corrigir o lapso de escrita quanto ao último nome de um dos militares da GNR ouvido como testemunha.
Procedeu o acórdão recorrido a rectificações e a alterações, como por exemplo, considerar não haver prova de que, como constava da matéria de facto provada, que os arguidos AA e BB misturassem os estupefacientes que adquiriam com outros produtos para lhes aumentar o peso e volume e assim potenciar os lucros, explicando as razões por que concluía nesse sentido, terminando por, ao abrigo do artigo 431º do CPP, proceder a modificação da matéria de facto, reformulando o ponto I dos factos provados respeitante a estes arguidos, do que se deu nota supra, antes de se elencar os “factos provados” e aditando ao segmento respectivo os factos não considerados provados na sequência das aludidas alterações.
E no que em concreto respeita à convicção formulada acerca da actividade da recorrente BB dada por provada, passa-se a citar o seguinte trecho do acórdão recorrido, onde se explica a razão por que se considera provada a sua comparticipação no tráfico:
«O envolvimento da arguida BB, concretamente quanto à sua participação em conjunto com o seu companheiro o arguido AA (independentemente do papel mais activo e de liderança que este tinha na execução daquela resolução prévia que ambos tomaram de em conjunto se dedicarem à compra e venda de estupefacientes), na actividade que desenvolviam de compra e venda de estupefacientes, resulta desde logo não só da conversa telefónica acima referida (fls. 35 a 38 do apenso IX das escutas, relativa a chamada feita em 22/1/2006, às 16:31:16, onde o P......conversa com a arguida BB sobre a compra de estupefacientes que pretendiam fazer, estando ela perfeitamente ciente e à vontade na preparação da concretização do negócio de que estavam a falar), como também, por exemplo, do teor das conversas telefónicas que o arguido AA manteve com ela (chamada feita em 8/01/2006, às 14:09:19, transcrita a fls. 21 e 22 do apenso IX das escutas, na altura em que falaram sobre a deslocação do “L..... L......” e chamada feita em 23/11/2005 onde tiveram a conversação transcrita a fls. 5 do apenso IX das escutas, por no dia seguinte o arguido AA ir para a feira) e, ainda, do teor das conversas telefónicas mantidas entre o “C.....” (6) (que como se verá adiante é a testemunha RR, também conhecido por “C.......”, como o próprio admitiu, reconhecendo que o seu telemóvel tinha o nº0000000) e a própria arguida BB (chamadas feitas em 8/1/2006 às 14:55:03 e às 16:20:24, transcritas a fls. 23 a 24 do apenso IX das escutas), v.g. quando combinaram em 8/1/2006 o encontro em casa desta última, tendo ela lhe dito “vê lá que, que ninguém te veja, sabes.”
Esse “C......”, aliás, voltou a ir lá a casa dos arguidos AA e BB em 15/1/2006 (como decorre das duas conversas telefónicas transcritas a fls. 29 e 30 do mesmo apenso IX, chamadas feitas nesse dia às 16:59:02 e depois às 17:44:49, tendo pelo menos nesta última falado com a arguida BB) e também em 16/1/2006 (como se verifica da chamada de fls. 33 do mesmo apenso IX) e em 19/1/2006 (fls. 34 e 35 do mesmo apenso IX).
A forma e à vontade como a arguida BB falou e negociou com o P...... (um dos referidos “parceiros” quando pretendiam comprar maiores quantidades de estupefacientes - como aquela que ascendeu a 20.000 € - que lhes permitisse satisfazer as encomendas e vendas que posteriormente faziam) em 22/1/2006, como falava das transacções de estupefacientes (cf. também transcrição de conversação ocorrida em 13/1/2006, que consta de fls. 27 e 28 do apenso IX das escutas), como conversava com o arguido AA sobre esse negócio (v.g. quando em 8/1/2006 falaram sobre a deslocação do “L...... L......” e, quando falaram em 23/11/2005, onde se identifica como sendo a “T....”), como participava na combinação de encontros quando acompanhava o arguido AA em compras e entregas que faziam de estupefacientes (cf. transcrição de conversação ocorrida em 30/10/2005, que consta de fls. 89 e 90 do apenso III das escutas, onde a arguida BB, que acompanhava o arguido AA, também fala com o arguido EE, sendo certo que na altura os três combinaram o encontro próximo das “bombas”, onde costumavam ir antigamente; e conferir transcrição de conversas ocorridas em 13/1/2006 e em 22/1/2006, constantes de fls. 27, 28, 38 a 40 do apenso IX das escutas) e como lidava com as pessoas que também atendia no telemóvel nº 914072624 (usado pelo casal, embora mais pelo arguido AA), que pretendiam adquirir estupefacientes (v.g. como quando conversou e atendeu o referido “C....”, dizendo-lhe “vê lá que ninguém te veja”), mostram bem que a mesma desenvolvia em conjunto com o arguido AA a actividade de compra e venda de estupefacientes, não obstante ele assumir um papel preponderante e mais activo nesse negócio.
Aliás, decorre da transcrição das conversas telefónicas de fls. 22, 23 e 24, 29, 30 do apenso IX das escutas que a arguida BB atendeu pessoas que a sua casa se deslocaram para comprar estupefacientes (e isso não obstante as respectivas testemunhas negarem terem sido “servidos” pela arguida BB, o que não invalida a valoração – no sentido de não merecerem crédito – feita pelo Colectivo quanto a essa parte dos referidos depoimentos).
No entanto, como se verá adiante, impõe-se a modificação da matéria de facto nos termos que irão ser indicados a final, para melhor distinguir a actividade de um e outro dos arguidos (uma vez que resulta claro de toda a prova analisada pelo tribunal que o arguido AA tinha um papel mais activo e preponderante do que a arguida BB naquela actividade de tráfico de estupefacientes que ambos desenvolviam em conjunto)».

No caso presente é patente que na fundamentação da matéria de facto constante do acórdão recorrido, que acolheu na sua maior parte a proveniente da decisão da 1.ª instância, foram indicadas as provas produzidas e “reavaliadas” da forma possível (na ausência de oralidade, imediação e concentração) e descrito o seu exame crítico, por forma a explicar o porquê de serem ou não atendidas, permitindo compreender o percurso lógico-racional seguido pelo tribunal, «de modo a poder afirmar-se que a condenação procede de uma apreciação correcta das provas, apresentando-se como uma peça coerente, fundada, convincente e à margem do arbítrio, não enfermando de contradições ou lacunas de pensamento, não violadora das regras da experiência e do bom senso, capaz de se impor quer aos sujeitos processuais quer à comunidade mais vasta dos cidadãos, seus destinatários.» – cfr. o acórdão do STJ de 28-02-2007, processo n.º 3646/06 - 3.ª.
Na verdade, de todo o exposto resulta poder concluir-se que o Tribunal da Relação teve uma intervenção activa, analisando com a profundidade possível, todos os elementos disponíveis, discutindo-os, sopesando-os, explicando porque dava prevalência a um sentido de interpretação e não a outro, procurando sustentar as opções feitas na análise conjugada dos vários dados, assinalando-se que os arguidos não prestaram declarações, o que torna mais ampla a exigência de fundamentação e de demonstração do bem fundado da opção assumida, com vista a um mais largo convencimento dos destinatários imediatos e mediatos, e para além da apreciação da impugnação da matéria de facto, concluiu ainda pela não existência dos vícios decisórios previstos no artigo 410º, n.º 2, do CPP, também imputados ao acórdão.
Face à referida ausência de declarações dos arguidos em julgamento, onde se inclui a ora recorrente, não deixou de expressar que tal facto não impedia o Tribunal Colectivo de apreciar a demais prova produzida em julgamento, nomeadamente, de avaliar o teor das conversas telefónicas transcritas, constantes dos respectivos apensos, uma vez que todas elas foram obtidas através de escutas telefónicas autorizadas judicialmente e que foram executadas de acordo com o formalismo legal.
Neste contexto, mal se compreende a invocação feita pela recorrente, reveladora, salvo o devido respeito, de alguma afoiteza, pois face a todo o trabalho desenvolvido pelo tribunal recorrido, não conseguimos descortinar razão que sustente a afirmação de que houve apenas uma “genérica remissão para os diversos meios de prova, fundamentadores da convicção do Tribunal, sem fundamentar, indicar, nem fazer o exame crítico das provas, que serviram para formar a convicção do Tribunal”, como refere na conclusão X.
Mais do que enunciá-los, o acórdão apreciou-os de forma aprofundada, não ocorrendo qualquer omissão, tendo sido debatidos os pontos em questão, realçando-se o extremo cuidado e empenho colocados, a análise meticulosa, pormenorizada, atributos, aliás, não exclusivos no tratamento do recurso desta arguida, mas de todos e de cada um dos restantes recorrentes, estando sempre presente o mesmo tipo de tratamento rigoroso do tema, procurando convencer e demonstrar a justeza da opção tomada.
No fundo, certo é que, mais uma vez, o que verdadeiramente se pretende, é pôr em causa a forma como o tribunal apreciou e valorou a prova.
Por outro lado, mostrando-se cumpridos os ditames impostos quanto à concretização do dever de fundamentação e não se vendo postergados quaisquer direitos de defesa, que a recorrente exerce de resto com o presente recurso, não há violação de preceitos constitucionais, nomeadamente, dos artigos 202º, n.º 2, 210º, n.º 2 e 205º, nº 1, da Constituição da República, como vem defendido nas conclusões X, XI e XII.
Assim, mostrando-se cumprida, de forma completa e compreensível, a injunção legal de fundamentação preconizada no n.º 2 do artigo 374.º do CPP, nos termos em que é possível fazer este tipo de exigência nos casos em que a Relação reaprecia matéria de facto e analisa prova já produzida, e não renovada, com as condicionantes e restrições próprias desta forma de cognição, não ocorre a invocada nulidade da decisão nos termos do artigo 379.º, n.º 1, alínea a), do CPP.

Violação do princípio de livre apreciação da prova

Na conclusão IV a recorrente critica a valoração das provas por não terem (os julgadores do Colectivo) acreditado nas versões dos depoimentos feitos em julgamento, conferindo crédito apenas a conversações telefónicas, com violação do disposto no artigo 127º do CPP.
A questão foi já abordada pela Relação, dizendo a propósito, a fls. 121 a 123:
«Convém, ainda, lembrar que é ao tribunal, e não aos sujeitos processuais, que incumbe avaliar a prova, não se vislumbrado que, pelo facto de os julgadores não terem acreditado em parte das versões sustentadas em julgamento por algumas testemunhas, conferindo em contraponto maior crédito a conversações telefónicas transcritas, tivessem violado qualquer norma legal, nomeadamente o disposto no art. 127 do CPP.
Aliás, o tribunal não está impedido de conferir crédito apenas a uma parte (e não a todo) do depoimento de qualquer testemunha e, sobretudo, não está impedido de raciocinar, v.g. quando tinha outras provas (as referidas conversações telefónicas transcritas, obtidas legalmente) ao seu dispor, o que lhe permitia retirar as devidas ilações quando articulava de forma conjugada toda essa prova que por si foi avaliada.
Não é pelo facto de esta ou aquela testemunha apresentar determinada versão, que esta passa a impor-se ao Tribunal.
A análise da prova produzida em julgamento supõe uma apreciação crítica, não sendo o tribunal um mero receptor de declarações ou depoimentos produzidos em julgamento.
Os julgadores têm de raciocinar quando analisam a prova produzida em julgamento, o que devem fazer com recurso às regras da lógica, da ciência, da experiência comum, consoante os casos, cabendo-lhes determinar se esta ou aquela prova merece ou não crédito.
Nessa avaliação da prova o tribunal não está impedido de conferir crédito apenas a parte de um depoimento ou declaração.
O importante é que o tribunal se convença da veracidade daquela prova e que esse convencimento se imponha de forma objectiva e racional.
Salvo quanto a aspectos pontuais já acima indicados, que justificam a modificação da matéria de facto, as provas supra descritas - nos aspectos em que foram valoradas - apreciadas em conjunto, permitiam ao Colectivo, segundo as normais regras da experiência comum, formar a sua convicção no sentido dos factos que deu como provados.
Não é através dos pequenos extractos de depoimentos (escolhidos de forma interessada, segmentando-os e desarticulando-os do restante depoimento e da demais prova produzida em julgamento, v.g. das respectivas conversações telefónicas transcritas, que os recorrentes esquecem por não interessarem à defesa da sua visão parcial e subjectiva das provas produzidas em julgamento), citados pelos recorrentes, que se abala a valoração e apreciação que o tribunal faz de toda a prova produzida em julgamento.
As divergências dos recorrentes, quando apresentam a sua própria análise da prova produzida em julgamento, é irrelevante porque é ao tribunal que incumbe valorar toda a prova produzida em julgamento, sendo certo que não se pode confundir essas divergências com impugnação da matéria de facto.(…)
Do que acima se expôs resulta que, salvo as pontuais alterações a introduzir à decisão sobre a matéria de facto, foi produzida prova bastante que sustenta e fundamenta, de forma objectiva e criteriosa, essa decisão.
E, não se diga que estamos perante uma “apreciação arbitrária, discricionária ou caprichosa da prova” ou perante uma apreciação subjectiva do Colectivo, incontrolável ou imotivável ou, sequer desconforme com as regras da experiência.
Como resulta da fundamentação de facto da decisão sob recurso, não se verifica qualquer violação do disposto no art. 127 do CPP.
Esqueceram os recorrentes que o que é relevante é a convicção que o tribunal forme perante as provas produzidas em audiência, e não a sua (dos recorrentes) convicção pessoal.
O que sucede, portanto, é que os recorrentes querem substituir-se ao tribunal, quando pretendem impor a sua própria apreciação (subjectiva e parcial) de parte da prova produzida em julgamento.
Assim, salvo as apontadas alterações a introduzir à decisão sobre a matéria de facto, os demais argumentos dos recorrentes revelam-se inconsequentes».

A recorrente no anterior recurso impugnara a matéria de facto e invocara a violação deste princípio, reeditando agora de novo esta arguição, olvidando que a sua pretensão se situa no plano da matéria de facto, que se não contém nos poderes de cognição deste Supremo Tribunal.
Neste aspecto da valoração das provas, dir-se-á que na análise a efectuar há que ter em conta que a fixação da matéria de facto teve na sua base uma apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador, nos termos do artigo 127º do CPP, o que é insindicável no presente recurso.
O que na realidade a recorrente faz é manifestar a sua discordância com o decidido ao nível do assentamento da facticidade dada como apurada, pretendendo impugnar a convicção adquirida pelos julgadores sobre os factos pertinentes à configuração do crime por que foi condenada, olvidando por completo a regra da livre apreciação da prova ínsita no aludido preceito do CPP.
Como esclareceu o acórdão de 21-05-1992, BMJ 417, 404, “O STJ, como tribunal de revista, não dispõe de poderes de crítica ou censura sobre o concreto desempenho do princípio da livre apreciação da prova exercitada pelo tribunal a quo” e o acórdão de 25-03-1998, BMJ 475, 502, esclareceu que “O STJ não pode sindicar a valorização das provas feita pelo Colectivo em termos de o criticar por não ter sido dada prevalência a uma em detrimento de outra” - cfr. acórdão de 11-02-1998, BMJ 474, 309, e mais recentemente, o acórdão de 08-02-2006, processo 98/06-3ª, no sentido de que “a deficiente apreciação da prova produzida é matéria que escapa aos poderes do STJ”.
A impossibilidade deste Tribunal sindicar a prova produzida conduz a que seja manifesta a improcedência do recurso neste segmento, que assim, digamos, tem um objecto impossível, devendo ser rejeitado, nos termos do artigo 420º, nº 1, alínea a), do CPP, preceito que nesta perspectiva não padece de inconstitucionalidade - cfr. acórdãos do Tribunal Constitucional nº 352/98, de 12-05-1998, in BMJ 477, 18 e nº 165/99, de 10-03-1999, in DR-II Série, de 28-02-2000 e BMJ 485, 93.
Como se referia no acórdão do STJ de 30-03-1995, BMJ 445, 355, é de rejeitar o recurso por manifesta improcedência quando o recorrente se limita a discutir matéria de facto e a livre apreciação do tribunal.
De igual sorte o acórdão de 21-06-1995, BMJ, 448, 278: “Apresenta-se como manifestamente improcedente, e, portanto, deve ser rejeitado, o recurso cuja fundamentação se circunscreve à interpretação da prova que se diz ter sido produzida em audiência, indicando-se os factos que deveriam ter sido considerados provados, em vez dos que foram dados por provados”.
Em suma, estamos perante recurso manifestamente improcedente.
A manifesta improcedência constitui um fundamento de rejeição do recurso de natureza substancial, visando os casos em que os termos do recurso não permitem a cognição do tribunal ad quem, ou quando, versando sobre questão de direito, a pretensão não estiver minimamente fundamentada ou for claro, simples, evidente e de primeira aparência que não pode obter provimento. Será o caso típico de invocação contra a matéria de facto directamente provada, de discussão processualmente inadmissível sobre a decisão em matéria de facto, ou de o recurso respeitar à qualificação e à medida da pena e não ser referida nem existir fundamentação válida para alterar a qualificação acolhida ou a pena que foi fixada pela decisão recorrida – acórdão do STJ, de 22-11-2006, processo 4084/06 - 3ª .
Ou, quando, através de uma avaliação sumária dos fundamentos do recurso, se puder concluir, sem margem para dúvidas, que o mesmo será claramente votado ao insucesso, que os seus fundamentos são inatendíveis – acórdãos de 17-10-1996, processo 633/96, de 06-05-1998, processo 113/98, de 05-04-2000, processo 47/00. Pelo exposto, neste segmento, é de rejeitar o recurso por manifestamente improcedente.

Violação do princípio in dubio pro reo

Na conclusão V invoca a recorrente a violação do princípio in dubio pro reo, reeditando igualmente arguição feita no recurso anterior, defendendo que nada há na prova sustentada em julgamento que leve à conclusão que a recorrente agiu de comum acordo e em conjugação de esforços com o companheiro.
O acórdão recorrido, a propósito da questão, enunciou assim a sua posição: «Tendo em atenção a alteração que iremos introduzir na decisão sobre a matéria de facto, podemos afirmar que, no mais, não foi violado o princípio in dubio pro reo (princípio este que se destina «a dar solução a um problema muito preciso – o da falta de convicção suficiente do julgador relativamente à matéria de facto, objecto da prova»), visto que o tribunal a quo conseguiu obter a certeza dos demais factos apurados, como se verifica do texto da respectiva fundamentação da decisão recorrida».

O princípio in dubio pro reo funda-se constitucionalmente no princípio da presunção da inocência até ao trânsito em julgado da sentença condenatória – artigo 32º, nº 2, da CRP - , impondo este que qualquer non liquet na questão da prova seja valorado a favor do arguido, apresentando-se aquele, na fase de decisão, como corolário daquela presunção – acórdão do Tribunal Constitucional nº 533/98, DR, II Série, de 25-02-1999.
O princípio in dubio pro reo - fórmula condensada por Stubel - que estabelece que, na decisão de factos incertos a dúvida favorece o arguido, é um princípio de prova que vigora em geral, isto é, quando a lei, através de uma presunção, não estabelece o contrário.
A violação do princípio in dubio pro reo tem sido entendida sob diversas perspectivas, como a de respeitar a matéria de prova e, pois, tratar-se de matéria de facto e como tal insindicável pelo STJ (por todos, acórdão de 18-12-1997, processo n.º 930/97, BMJ 472, 185), ou enquanto princípio estruturante do processo penal, podendo ser suscitada perante o Tribunal de revista, mas o Supremo vem afirmando que isso só é possível se a violação resultar do próprio texto da decisão recorrida, designadamente da fundamentação da decisão de facto – acórdão de 29-11-2006, processo n.º 2796/06-3ª, in CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 235 (239).
Contrariamente à posição de Figueiredo Dias, expressa in Direito Processual Penal, volume I, pág. 217, que defende que o princípio se assume como um princípio geral de processo penal, não forçosamente circunscrito a facetas factuais, podendo a sua violação conformar também uma autêntica questão de direito plenamente cabível dentro dos poderes de cognição do STJ, a jurisprudência maioritária tem repudiado a invocação do princípio em sede de interpretação ou de subsunção de um facto à lei, não valendo para dúvidas nessas matérias.
Para o acórdão de 06-04-1994, processo n.º 46092, BMJ 436, 248, o princípio não tem aplicação apenas quanto à matéria de facto, começando, logo, por poder ser aplicado na própria interpretação da matéria de direito, esclarecendo que “nada impede que, em via de recurso penal interposto para este Supremo Tribunal, os julgadores se socorram do princípio in dubio pro reo, quando, esgotados todos os meios de interpretação dos factos ou das disposições legais, surgirem dúvidas justificadas quanto ao sentido dos factos ou relativamente à norma aplicável”.
E de acordo com o acórdão de 11-02-1999, CJSTJ 1999, tomo 1, pág. 210, o princípio in dubio pro reo é multifacetado e a sua força omnímoda e dinamismo podem e devem aplicar-se mesmo dentro dos processos lógicos que interessam à interpretação e integração da lei.
Este acórdão foi objecto de comentário na RPCC, 2003, ano 13, n.º 3, págs. 433 e ss., onde se diz que o STJ adoptou uma tese errónea em relação à aplicabilidade do princípio, defendendo-se que o alcance do in dubio pro reo restringe-se a dúvidas sobre a prova da matéria de facto e não tem aplicação na resolução de dúvidas quanto à interpretação de normas penais, cuja única solução correcta reside em escolher, não o entendimento mais favorável ao arguido, mas sim aquele que se revele juridicamente mais exacto.
Em sentido oposto pronunciaram-se, i. a., os acórdãos de 06-12-2006, processo n.º 3520/06-3ª; de 20-12-2006, processo n.º 3105/06-3ª; de 23-04-2008, processo n.º 899/08, supra citado, onde se refere que «O princípio vale apenas em relação à prova da questão de facto e já não a qualquer dúvida suscitada dentro da questão de direito; aqui, a única solução correcta residirá em escolher não o entendimento mais favorável ao arguido, mas sim aquele que juridicamente se reputar mais exacto» e no acórdão de 30-04-2008, processo n.º 3331/07-3ª, diz-se que «O princípio in dubio pro reo não tem quaisquer reflexos ao nível da interpretação das normas penais. Em caso de dúvida sobre o conteúdo e o alcance destas, o problema deve ser solucionado com recurso às regras de interpretação, entre as quais o princípio do in dubio pro reo não se inclui, uma vez que este tem implicações exclusivamente quanto à apreciação da matéria de facto – sejam os pressupostos do preenchimento do tipo de crime, sejam os factos demonstrativos da existência de uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpa».

A eventual violação do princípio in dubio pro reo só pode ser aferida pelo STJ quando da decisão impugnada resulta, de forma evidente, que tribunal recorrido ficou na dúvida em relação a qualquer facto, que tenha chegado a um estado de dúvida “patentemente insuperável” e que, nesse estado de dúvida, decidiu contra o arguido, optando por um entendimento decisório desfavorável ao arguido, posto que saber se o tribunal recorrido deveria ter ficado em estado de dúvida, é uma questão de facto que exorbita os poderes de cognição do STJ enquanto tribunal de revista.
Não se verificando esta hipótese, resta a aplicação do mesmo princípio enquanto regra de apreciação da prova no âmbito do dispositivo do artigo 127º do CPP, que escapa ao poder de censura do STJ enquanto tribunal de revista – neste sentido acórdãos de 20-06-1990, BMJ 398, 431; de 04-07-1991, BMJ 409, 522; de 14-04-1994, processo n.º 46318, CJSTJ 1994, tomo 1, pág. 265; de 12-01-1995, CJSTJ 1995, tomo 1, pág. 181; de 06-03-1996, CJSTJ 1996, tomo 2 (sic), pág. 165;de 02-05-1996, CJSTJ 1996, tomo 2, pág. 177; de 25-02-1999, BMJ 484, 288; de 15-06-2000, processo n.º 92/00-3ª, CJSTJ 2000, tomo 2, pág. 226 e BMJ 498, 148; de 02-05-2002, processo n.º 599/02-5ª; de 23-01-2003, processo n.º 4627/02-5ª; de 15-10-2003, processo n.º 1882/03-3ª; de 27-05-2004, processo n.º 766/04-5ª, CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 209 (a alegada violação do princípio só poderá ser sindicada se ela resultar claramente dos textos das decisões recorridas); de 21-10-2004, processo n.º 3247/04-5ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 198 (com recensão de jurisprudência sobre o tema e em concreto sobre a temática das conclusões que as instâncias retiram da matéria de facto e o recurso às presunções naturais); de 12-07-2005, processo n.º 2315/05-5ª; de 07-12-2005, processo n.º 2963/05-3ª; de16-05-2007, CJSTJ 2007, tomo 2, pág. 182; de 20-02-2008, processo n.º 4553/07-3ª; de 05-03-2008, processo n.º 210/08-3ª, CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 243; de 09-04-2008 processo n.º 429/08-3ª; de 23-04-2008, processo n.º 899/08-3ª; de 15-07-2008, processo n.º 1787/08-5ª.
Noutra perspectiva, o STJ poderá sindicar a aplicação do princípio, quando a dúvida resultar evidente do texto da decisão recorrida em termos análogos aos dos vícios do artigo 410º, n.º 2, do CPP, ou seja, quando seguindo o processo decisório evidenciado através da motivação da convicção se chegar à conclusão de que o tribunal tendo ficado em estado de dúvida, decidiu contra o arguido – cfr. acórdãos de 30-10-2001, processo n.º 2630/01-3ª; de 06-12-2002, processo n.º 2707/02-5ª; de 08-07-2004, processo n.º 1121/04-5ª, SASTJ, n.º 83; de 24-11-2005, processo n.º 2831/05-5ª; de 07-12-2006, processo n.º 3137/06-5ª; de 18-01-2007, processo n.º 4465/06-5ª; de 21-06-2007, processo n.º 1581707-5ª; de 13-02-2008, processo n.º 4200/07-5ª; de 17-04-2008, processo n.º 823/08-3ª; de 07-05-2008, processo n.º 294/08-3ª; de 28-05-2008, processo n.º 1218/08-3ª; de 29-05-2008, processo n.º 827/08-5ª; de 15-10-2008, processo n.º 2864/08-3ª; de 16-10-2008, processo n.º 4725/07-5ª; de 22-10-2008, processo n.º 215/08-3ª;de 04-12-2008, processo n.º 2486/08-5ª; de 05-02-2009, processo n.º 2381/08-5ª (A apreciação pelo Supremo da eventual violação do princípio in dubio pro reo encontra-se dependente de critério idêntico ao que se aplica ao conhecimento dos vícios da matéria de facto: há-de ser pela mera análise da decisão que se deve concluir pela violação deste princípio).
Na perspectiva, mais concreta - e que data de finais da década de 90 do século passado - de análise do princípio in dubio pro reo, como figura próxima do vício decisório - erro notório na apreciação da prova, previsto no artigo 410º, n.º 2, alínea c), do CPP - , e, pois, da sua sindicabilidade pelo Supremo Tribunal, podem ver-se os acórdãos de 15-04-1998, processo n.º 285/98-3ª, in BMJ 476, 82; de 22-04-1998, processo n.º 120/98-3ª, BMJ 476, 272; de 04-11-1998, processo n.º 1415/97-3ª, in CJSTJ 1998, tomo 3, pág. 201 e BMJ 481, 265, com extensa informação acerca do princípio em causa e da livre apreciação da prova; de 27-01-1999, no processo nº 1369/98-3ª, in BMJ 483º, 140; de 24-03-1999, processo n.º 176/99-3ª, in CJSTJ 1999, tomo 1, pág. 247, todos do mesmo relator, Exmo. Conselheiro Leonardo Dias, em que a tónica do entendimento sufragado nos citados arestos é o seguinte: “o erro na apreciação da prova só existe quando, do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum, resulta por demais evidente a conclusão contrária àquela a que chegou o tribunal. Nesta perspectiva, a violação do princípio in dubio pro reo pode e deve ser tratada como erro notório na apreciação da prova, o que significa que a sua existência também só pode ser afirmada quando, do texto da decisão recorrida, se extrair, por forma mais do que evidente, que o colectivo, na dúvida, optou por decidir contra o arguido”; e ainda os acórdãos de 20-10-1999, processo n.º 1475/98 -3ª, in BMJ 490º, 64 (em que aquele relator intervém como adjunto); de 04-10-2006, processo n.º 812/2006-3ª; de 11-04-2007, processo n.º 3193/06-3ª.
Como referimos no acórdão de 05-12-2007, processo n.º 3406/07, parece-nos que esta possibilidade de abordagem de eventual violação do princípio será balizada pelos parâmetros de cognoscibilidade presentes numa indagação dos vícios decisórios, por um lado, com o consequente alargamento de possibilidade de incursão de exame no domínio fáctico, mas simultaneamente, como ali ocorre, operando de uma forma mitigada, restrita, que se cinge ao texto da decisão recorrida, por si só considerado ou em conjugação com as regras da experiência comum.
O que significa que, tal como ocorre na análise e exame de verificação dos vícios, quando se perspectiva indagação de eventual violação do princípio in dubio pro reo (em ambos os casos diversamente do que ocorre com a avaliação de nulidades da sentença), há que não esquecer que se está sempre perante um poder de sindicância de matéria fáctica, que é limitado, restrito, parcial, mitigado, exercido de forma indirecta, dentro do condicionalismo estabelecido pelo artigo 410º do CPP, em suma, que o horizonte cognitivo do STJ se circunscreve ao texto e aos vícios da decisão, não incidindo sobre o julgamento, isto é, que o objecto da apreciação será sempre a decisão e não o julgamento.

Da análise dos textos dos acórdãos impugnados não se retira que os Colectivos tenham dado como provados os factos que como tal especificaram, tendo dúvidas sobre a verificação de algum ou alguns deles, nomeadamente, a comparticipação activa da recorrente no tráfico desenvolvido por ela e companheiro, e, por outro lado, dos mesmos textos, conjugados com as regras da experiência comum, não ressalta, de modo algum, que outra, como a defendida pela recorrente, devia ter sido a decisão sobre a matéria de facto, maxime, por se dever considerar irrazoável, temerária, inverosímil ou arbitrária a proferida pelo Colectivo de Macedo de Cavaleiros, bem como a efectuada em reexame pela Relação; não resulta que perante uma dúvida sobre a prova, tenham optado por uma solução desfavorável à arguida, decorrendo antes que as instâncias não ficaram na dúvida em relação a qualquer facto.
Esta invocação, de resto, não tem autonomia relativamente à discordância manifestada pela arguida em relação à matéria de facto, situando-se na mesma linha da invocação de violação do artigo 127º do CPP.
Na verdade, a pretensa violação do princípio in dubio pro reo não constitui mais do que uma diversa perspectiva de colocar exactamente a mesma questão relativamente ao julgamento da matéria de facto, procurando a recorrente contrariar a convicção das instâncias no sentido de que comparticipou de forma activa, embora menos intensa, na actividade do seu companheiro AA.
Inexistindo dúvida razoável na formulação do juízo factual que conduziu à condenação da arguida, fica afastado o princípio do in dubio pro reo e o da presunção da inocência, sendo de ter por assente definitivamente a matéria de facto apurada.
O acórdão recorrido não denota dúvida irredutível, da sua leitura se vendo não persistir qualquer dúvida razoável sobre os factos, por isso não tendo fundamento fazer apelo ao princípio, que supõe a existência de uma dúvida. Pelo contrário, decorre da sua leitura uma tomada de posição firme e estribada nas provas produzidas e não indicando ter-se decidido contra a recorrente.
Improcede, pois, esta arguição, aqui também se mostrando manifestamente infundada a impugnação nesta parte, sendo de rejeitar o recurso nesta parte - artigo 420º, n.º 1, alínea a), do CPP.

Alteração de qualificação jurídica – Convolação para crime de tráfico de menor gravidade

Analisado o anterior recurso, ressalta à evidência que a recorrente não colocou então esta questão, sendo que a nível de subsunção da sua conduta apenas defendera dever ser vista como mera cúmplice, o que significa que ao avançar com este novo argumento a recorrente está verdadeiramente a colocar uma questão nova, não submetida à consideração do Tribunal da Relação.
A nova pretensão vem expressa na conclusão II - «Salvo o devido respeito, dada a modalidade da acção, o comportamento da arguida: uma única chamada telefónica em 08.01.06, a verter: “...a arguida deu ao L.... um bocadinho de droga..." (fls. 40, parag. 1, do douto Ac), insere-se no artigo 25° n° 1 do citado diploma legal - tráfico de menor gravidade, como supra se justifica, tendo assim sido violado o citado normativo legal».
No anterior recurso a questão da qualificação jurídico-criminal dos factos dados como provados foi colocada pelos recorrentes BB, EE, FF, HH e KK, mas de forma diversa.
Assim, a subsunção no tipo de crime do artigo 25º, alínea a), do DL 15/93, apenas foi abordada pelos arguidos EE e FF Ferreira, sendo que as restantes recorrentes – ora recorrente incluída - defenderam que, a não serem absolvidas, só podiam ser condenadas como cúmplices de um crime de tráfico, p. p. pelo artigo 21º do citado DL.
O acórdão recorrido abordou a questão, de fls. 195, in fine, a 199 (fazendo fls. 8013 a 8015 dos autos), julgando improcedente a argumentação dos recorrentes EE e FF.
Suscitando a recorrente pela primeira vez, aqui e agora, a possibilidade de subsunção da sua conduta a tráfico de menor gravidade, sem dúvida estamos face a uma questão nova, que corresponde à colocação de um problema novo, em primeira mão, que não expôs no primeiro recurso, que não propôs à consideração do Tribunal da Relação.
Os recursos ordinários visam o reexame da decisão proferida dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento em que a proferiu.
Sendo os recursos meios de impugnação e de correcção de decisões judiciais e não meio de obter decisões novas, não pode o tribunal de recurso ser chamado a pronunciar-se sobre questões não suscitadas ao tribunal recorrido.
Constitui jurisprudência uniforme a de que os recursos se destinam a reexaminar decisões proferidas por jurisdição inferior, visando apenas apurar a adequação e legalidade das decisões sob recurso, e não a obter decisões sobre questões novas, não colocadas perante aquelas jurisdições.
O Tribunal Superior, visando apenas a reapreciação de questões colocadas anteriormente e não a apreciação de outras novas, não pode conhecer de argumentos ou fundamentos que não foram presentes ao tribunal de que se recorre – neste sentido, vejam-se os acórdãos do STJ de 27-07-1965, BMJ 149, 297; de 26-03-1985, BMJ 345, 362; de 02-12-1998, BMJ 482, 150; de 12-07-1989, BMJ 389, 510; de 09-03-1994, processo n.º 43402; de 01-03-2000, processo n.º 43/00, SASTJ, nº 39, pág. 55; de 05-04-2000, processo n.º 160/00; de 06-06-2001, processo n.º1874/02-5ª (não pode o STJ conhecer em recurso trazido da Relação de questões não colocadas perante este Tribunal Superior, mesmo que resolvidas na decisão da 1ª instância); de 28-06-2001, processo n.º 1293/01-5ª; de 26-09-2001, processo n.º 1287/01-3ª; de 16-01-2002, processo n.º 3649/01-3ª; de 22-10-2003, processo n.º 2446/03-3ª, SASTJ, nº 74, pág. 147; de 30-10-2003, processo n.º 3281/03-5ª (os recursos, como remédios jurídicos que são, não se destinam a obter decisões ex novo sobre questões não colocadas ao tribunal a quo, mas sim a obter o reexame das decisões tomadas sobre pontos questionados, procurando obter o cumprimento da lei); de 27-05-2004, CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 209; de 20-07-2006, processo n.º 2316/06-3ª; de 02-05-2007, processo n.º 1238/07-3ª; de 10-10-2007, processo n.º 3634/07-3ª; de 17-10-2007, processo n.º 3878/07-3ª; de 30-04-2008, processo n.º 4723/07-3ª; de 12-06-2008, processo n.º 4375/08-3ª; de 11-02-2009, processo n.º 4132/08-3ª; de 07-05-2009, processo n.º 352/02.8TAETR.
Todavia, no caso concreto, não há impedimento a que se indague da eventual subsunção no tipo reclamado.
Nada impede este Supremo Tribunal de indagar, por iniciativa própria, da correcção da subsunção jurídica feita no acórdão recorrido, como tem sido entendido, nomeadamente, no Acórdão nº 4/95, de 07-06-1995, in DR, I Série, de 06-07-1995 e BMJ, 448, 107 e acórdãos de 02-05-1996, CJSTJ 1996, tomo 2, pág. 179; de 04-12-1997, CJSTJ 1997, tomo 3, pág. 246; de 19-10-2000, processo n.º 2803/00-5ª; de 17-01-2002, CJSTJ 2002, tomo 1, pág. 183; de 20-03-2003, processo n.º 504/03-5ª; de 05-02-2004, CJSTJ 2004, tomo 1, pág. 195; de 04-12-2004, processo n.º 3293/03-5ª; de 12-07-2006, CJSTJ 2006, tomo 2, pág. 239; de 24-01-2007, processo n.º 3647/06-3ª; de 02-04-2008, processo n.º 4197/07-3ª; de 22-10-2008, processo n.º 215/08-3ª.

Vejamos se colhe esta pretensão da recorrente.
(Seguir-se-á a linha de exposição que adoptámos nos acórdãos de 30-04-2008, de 28-05-2008 e de 22-10-2008, nos processos n.ºs 4723/07, 1147/07 e 215/08).

Dispõe o artigo 21.° do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01:
«Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40°, plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos».
Estabelece o artigo 25.º, alínea a):
Se, nos casos dos artigos 21.º e 22.º, a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de prisão de um a cinco anos, se se tratar de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III, V e VI.

O crime de tráfico de menor gravidade contempla, como a própria denominação indica, situações em que o tráfico de estupefacientes, tal como se encontra definido no tipo base, se processa de forma a ter-se por consideravelmente diminuída a ilicitude, ou seja, em que se mostra diminuída a quantidade do ilícito.
A título exemplificativo, indicam-se no preceito como índices, critérios, exemplos padrão, ou factores relevantes, de graduação da ilicitude, circunstâncias específicas, mas objectivas e factuais, verificadas na acção concreta, nomeadamente, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações objecto do tráfico, os quais devem ser analisados numa relação de interdependência, já que há que ter uma visão ou perspectiva global, uma mais ampla e correcta percepção das acções desenvolvidas (actividade disseminadora de produtos estupefacientes) pelo agente, de modo a concluir-se se a conduta provada fica ou não aquém da gravidade do ilícito justificativa da integração no tipo essencial, na descrição fundamental, do artigo 21.º, n.º 1.
O Decreto-Lei n.º 15/93 abriu o leque sancionatório relativamente ao antecessor Decreto-Lei n.º 430/83, de 13-12, adicionando ao elenco dos tipos já previstos um novo específico tipo legal de crime, o denominado tráfico de menor gravidade.
Na anterior lei, o artigo 23.º – “antecessor” do actual artigo 21.º – abrangia as grandes, médias e pequenas quantidades de substâncias estupefacientes.
De fora, ficavam apenas as quantidades diminutas, situação prevista no artigo 24.º, definidas no n.º 3 do preceito como as que não excediam o necessário para consumo individual durante 1 dia, estabelecendo-se então para as substâncias ou preparados compreendidos nas tabelas I a III, a pena compósita de prisão de 1 a 4 anos e multa de 20.000$ a 1.500.000$.
O novo artigo 25.º veio colmatar uma lacuna existente no sistema e prevenir os casos de diminuição considerável da ilicitude baseada, entre outros critérios, na qualidade ou quantidade de plantas, substâncias ou preparações.
Não estando em causa no novo crime apenas um critério quantitativo relativo ao produto estupefaciente, até porque considerado isoladamente de pouco valerá, é óbvio que nunca o artigo 25.º poderia ser encarado como um “sucessor directo” do artigo 24.º do DL n.º 430/83, cuja marca distintiva era apenas a quantidade – a diminuta quantidade de estupefaciente – independentemente da sua conjugação com outros factores de avaliação, e mesmo no plano da mera dosimetria, do que isso pudesse exactamente significar, ou do modo como pudesse ser computada, sendo que nessa altura – dificuldade acrescida – não havia lugar sequer a reporte a diploma legal, como veio a acontecer já no âmbito da nova lei, com a Portaria n.º 94/96, de 26-03, norma complementar, que veio dar expressão, por força do critério do valor probatório da remissão nela contida, à norma sancionatória (em branco) – norma incompleta – do artigo 71.º, n.º 1, al. c), do DL n.º 15/93, que veio definir os limites quantitativos máximos admitidos nas doses individuais de estupefacientes (em função dos quais se aplicam tipos de ilícitos comuns ou privilegiados) e de entender como norma de natureza meramente técnica, devendo ser interpretada como um critério de prova pericial, permitindo, pois, impugnação dos dados apresentados, nos termos do artigo 163.º do CPP – neste sentido, cfr. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 534/98, de 7 de Agosto, comentado in Revista do Ministério Público, n.º 75, págs. 173-180; ver ainda, a propósito, O Regime Legal do Erro e as Normas Penais em Branco, de Teresa Pizarro Beleza e Frederico de Lacerda da Costa Pinto, Almedina, 2001, págs. 37/38.
Segundo H. H. Jescheck, Tratado de Derecho Penal, Parte General, Edição Bosch, tradução de S. Mir Puig e F. Muñoz Conde, pág. 363, a modificação dos tipos tem lugar através de «variantes dependentes do tipo básico completamente reguladas, que constituem por sua vez tipos qualificados ou privilegiados», ou pelo recurso a «causas inominadas de agravação ou de atenuação da pena», que a lei designa como «casos especialmente graves» ou «casos menos graves».
Com o argumento da moldura da pena, tomou a pena aplicável como círculo dentro do qual se estabelecem as variações próprias dos casos especialmente graves e dos casos menos graves, com formação de grupos valorativos especiais que correspondem a diversos graus de gravidade.
O artigo 25.º encerra um específico tipo legal de crime, o que pressupõe a sua caracterização como uma variante dependente privilegiada do tipo de crime do artigo 21.º – cfr. Jescheck, Tratado citado, pág. 363.
A sua aplicação tem como pressuposto específico a existência de uma considerável diminuição do ilícito; pressupõe um juízo positivo sobre a ilicitude do facto, que constate uma substancial diminuição desta, um menor desvalor da acção, uma atenuação do conteúdo de injusto, uma menor dimensão e expressão do ilícito.
Os pressupostos da disposição respeitam, todos eles, ao juízo sobre a ilicitude do facto no sentido positivo, constatando, face à específica forma e grau de realização do facto, que o caso se situará forçosamente aquém da necessidade de pena expressa pelo limite mínimo do tipo base, uma substancial diminuição desta.
Os índices, exemplos padrão, ou Regelbeispiel, enumerados no preceito, a par de outros, são atinentes uns, à própria acção típica (meios utilizados, modalidade, circunstâncias da acção), outros ao objecto da acção típica (qualidade ou quantidade do estupefaciente), ou seja, pertinem todos estes factores ao desvalor da conduta, à execução do facto, fazendo parte do tipo de ilícito, não entrando em acção qualquer consideração relativa ao desvalor da atitude interna do agente, à personalidade deste, a juízo sobre a culpa.
Haverá que proceder à valorização global do episódio, não se mostrando suficiente que um dos factores interdependentes indicados na lei seja idóneo em abstracto para qualificar o facto como menos grave ou leve, devendo valorar-se complexivamente todas as circunstâncias.
O critério a seguir será a avaliação do conjunto da acção tendo em conta o grau de lesividade ou de perigo de lesão (o crime de tráfico é um crime de perigo abstracto) do bem jurídico protegido (saúde pública).
Valerá o tipo privilegiado ou atenuado para os casos menos graves e equivale aos casos de pouca importância do facto da lei italiana, sendo de assinalar a similitude e paralelismo com os pressupostos gerais da atenuação especial da pena, mas quedando-se aqui a “atenuação” em função do juízo de ilicitude, sem intervenção da culpa do agente e da necessidade de pena, presentes no artigo 72.º do C. Penal, pois o princípio regulativo da aplicação do regime da atenuação especial é a diminuição acentuada não apenas da ilicitude do facto ou da culpa do agente, mas também da necessidade da pena e, portanto, das exigências da prevenção.
Qualquer que seja a posição adoptada sobre o posicionamento dogmático do novo crime, a verdade é que entre o citado artigo 25.º e o artigo 72.º do Código Penal, ressalta uma evidente conexão.
Aquele dispositivo comina uma redução substancial da pena de prisão, relativamente ao tipo matricial (mínimo de 1 ano de prisão, em vez de 4 anos estabelecido para o tipo base, e máximo de 5 anos de prisão, em vez de 12 anos, encurtando-se de forma sensível, considerável, os limites da moldura abstracta cabível ao tipo fundamental) para os casos de tráfico em que a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, estabelecendo, inclusive, uma mais benévola moldura penal – 1 a 5 anos de prisão – do que a que resultaria de atenuação especial do crime base, pois, por força do artigo 73.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código Penal, a moldura penal seria então de 9 meses e 18 dias a 8 anos de prisão!
Por outras palavras, o artigo 25.º possibilita a aplicação de uma pena cujo limite máximo fica aquém da aplicação à moldura penal do tráfico base das regras de atenuação modificativa da pena do artigo 73.º do Código Penal.
A moldura atenuada emergente (prevista) deste tipo não é, pois, coincidente com a que resulta do Código Penal para a atenuação em geral e nessa medida será, incontornavelmente, uma regra de determinação de pena, de medida judicial da pena (consagra uma pena mais leve) a que se refere Jescheck, in loc. cit..
Trata-se de uma especial forma de atenuação para a qual aqui só se tem em consideração o plano da ilicitude, quando nos termos gerais é necessário estar-se perante diminuição acentuada, não só da ilicitude do facto, mas também da culpa do agente ou da necessidade da pena.
Como se expressou o acórdão do STJ, de 23-02-2000, processo n.º 1200/99 - 3.ª, in SASTJ, n.º 38, pág. 75 «É na acentuada diminuição da ilicitude e/ou da culpa e/ou das exigências da prevenção que radica a autêntica ratio da atenuação especial da pena».
Algo semelhante se passa com o crime de homicídio privilegiado, p. e p. pelo artigo 133.º do Código Penal, punível com idêntica penalidade, mas em que o privilegiamento assenta num especial tipo de culpa.
Aliás, o novo crime veio colmatar uma lacuna existente no anterior regime, face ao fosso existente entre a previsão das quantidades diminutas e o tipo fundamental, de tal modo que o equilíbrio do sistema se procurava então entre o uso abusivo do artigo 24.º e o recurso, mais frequente, à atenuação especial da pena do artigo 23.º, para as situações de pequenas quantidades que se não devessem subsumir no artigo 24.º do DL nº 480/83.
Maria João Antunes (in Decisões de Tribunais de 1.ª instância, Comentários, 1993, pág. 296) expendia que o artigo 25.º «exige do intérprete, fundamentalmente, que equacione se a imagem global do facto se enquadra ou não dentro dos limites das molduras fixadas nos artigos 21º e 22º, sob pena de a reacção criminal ser, à partida, desproporcionada».
Adiantava que o legislador «consagrou para o efeito o critério da diminuição considerável da ilicitude do facto, adoptando a denominada técnica dos exemplos padrão, uma vez que só exemplificativamente fornece o substrato a partir do qual se poderá concluir por aquela diminuição».
E finalizava, dizendo que significava isto duas coisas fundamentais: “Por um lado, «os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações» são meramente indiciadoras da consideravelmente diminuída ilicitude do facto; por outro, não sendo a enumeração esgotante, mas só exemplificativa, o tribunal pode concluir que a ilicitude do facto se mostra consideravelmente diminuída, apesar do substrato que funda esta conclusão ser alheio à enumeração prevista no artigo 25º”.
Como se extrai do acórdão do STJ de 08-10-1998, CJSTJ, 1998, tomo 3, pág. 188, o artigo 25.º, a), do DL n.º 15/93, de 22-01, constitui uma “válvula de segurança do sistema”, destinado a evitar que se parifiquem os casos de tráfico menor aos de tráfico importante e significativo, evitando-se que situações de menor gravidade sejam tratadas com penas desproporcionadas ou que se utilize indevidamente uma atenuação especial.
Para o acórdão do STJ, de 24-11-1999, BMJ 491, 88, o crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art. 25.º do DL n.º 15/93, é um tipo de crime privilegiado que se fundamenta na diminuição considerável da ilicitude do facto, revelada pela valoração conjunta de diversos factores, alguns deles exemplificativamente indicados na norma: meios utilizados, modalidade e circunstâncias da acção, qualidade ou quantidade das substâncias.
Como se diz no acórdão do STJ, de 12-07-2000, BMJ 499, 117, no artigo 25.º prevê-se uma ilicitude do facto consideravelmente diminuída, por referência à ilicitude pressuposta no artigo 21.º, exemplificando aquela norma circunstâncias factuais com susceptibilidade de influírem no preenchimento valorativo da cláusula geral aí formulada. Esse artigo 25.º tem na sua base o reconhecimento de que a intensidade das circunstâncias pertinentes à ilicitude do facto não encontra na moldura penal do artigo 21.º, pela sua gravidade diminuta, acolhimento justo, equitativo, proporcional.
Segundo os acórdãos de 17-01-2001 e de 01-03-2001, in CJSTJ, 2001, tomo 1, págs. 216 e 234; de 22-03-2007, processo n.º4808/06-5ª, CJSTJ 2007, tomo 1, pág. 226; de 12-07-2007, processo nº 2084/07-5ª; de 16-01-2008, processo n.º 4638/07-3ª, CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 198, i. a., a contemplação de uma hipótese atenuada de tráfico implica uma valorização global do facto, isto é, as circunstâncias relevantes do ponto de vista da ilicitude têm de ser complexivamente analisadas, delas tendo de sobressair uma imagem global do facto acentuadamente diminuída, de forma a poder dizer-se que punir o agente pelo artigo 21º seria desproporcionado, já que a ilicitude que lhe corresponde se não enquadra no padrão de ilicitude que constitui o pressuposto da punição prevista no tipo-base de tráfico.
Como se extrai dos acórdãos do STJ de 26-11-2003, CJSTJ, tomo 3, pág. 245, de 13-04-2005, CJSTJ, 2005, tomo 2, pág. 174, e de 22-03-2006, CJSTJ, 2006, tomo 1, pág. 216, todos do mesmo relator, «A essência da distinção entre os tipos fundamental e privilegiado reverte, assim, ao nível exclusivo da ilicitude do facto (consideravelmente diminuída), mediada por um conjunto de circunstâncias objectivas que se revelem em concreto, e que devam ser conjuntamente valoradas por referência à matriz subjacente à enumeração exemplificativa contida na lei, e significativas para a conclusão (rectius, para a revelação externa) quanto à existência da considerável diminuição da ilicitude pressuposta no tipo fundamental, cuja gravidade bem evidente está traduzida na moldura das penas que lhe corresponde. Os critérios de proporcionalidade que devem estar pressupostos na definição das penas constituem, também, um padrão de referência na densificação da noção, com alargados espaços de indeterminação, de “considerável diminuição de ilicitude”.
A diversificação dos tipos apenas conforme o grau de ilicitude, com imediato e necessário reflexo na moldura penal, não traduz, afinal, senão a resposta a realidades diferenciadas que supõem respostas também diferenciadas: o grande tráfico e o pequeno e médio tráfico».
A este propósito, veja-se o acórdão de 13-02-2003, CJSTJ, 2003, tomo 1, pág. 191, onde se procede a um “corrido respigo da jurisprudência mais recente do STJ”, dando-se nota da jurisprudência que então começava a contrariar uma interpretação mais restritiva até então dominante e que quase esvaziara de conteúdo útil os artigos 25.º e 26.º do DL n.º 15/93, remetendo para o artigo 21.º a generalidade das situações (cfr. acórdão de 28-06-2006, CJSTJ, 2006, tomo 2, pág. 227).
De acordo com o acórdão do STJ, de 23-03-2006, CJSTJ, 2006, tomo 1, pág. 219, a qualidade e quantidade do estupefaciente traficado, embora sejam elementos relevantes para aferição da imagem global do facto, não são decisivos.

Versando o caso concreto.

Olhando a conduta provada da recorrente, há que ter em conta a dimensão e intensidade da actividade desenvolvida, em conjunção com o companheiro, o período que durou o desempenho, a modalidade de execução, com vendas a revendedores e consumidores directos, os diferenciais entre valor de aquisição e de venda, a produzirem lucros, a natureza e qualidade dos produtos adquiridos e vendidos, as quantidades transaccionadas, e a consequente dimensão do risco criado para a saúde pública, atento o número de consumidores atingidos, tudo factores a conferir uma imagem global do facto, que de todo se não compadece com a conclusão de estarmos face a caso de considerável diminuição de ilicitude, que se esteja face a uma situação privilegiada de menor gravidade, resultante de menor quantidade de ilícito; de resto a conduta da recorrente não se cingiu a um mero episódio, como pretende fazer crer face ao que verteu na conclusão II, referindo uma única chamada telefónica em 08-01-2006 e que a arguida deu ao Lopes um bocadinho de droga, segmento constante do 1º § de fls. 40 do acórdão recorrido, havendo que atender a toda a matéria de facto provada e não apenas àquele trecho.
O que privilegia o crime é a diminuição sensível, ponderosa, da ilicitude, o que se não mostra no caso; a avaliação global da conduta olhada no contexto em que a recorrente operou, não revela uma projecção menor de ilicitude, tendo por referência os pressupostos que enquadram o tipo base, demonstrando antes a conduta apurada um elevado grau de ilicitude.
Não é possível fazer uso da previsão atenuada quando a conduta do agente não surge como de pouco relevo à luz de um dos critérios mencionados na norma, como aqui ocorre, não só face à quantidade e qualidade das drogas, como à colaboração com a actividade do companheiro, à potenciação de perigo para a saúde pública.
Em suma, improcede a pretensão de integração da conduta da recorrente no tipo privilegiado do artigo 25º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01.

Co-autoria ou Cumplicidade?

A questão da qualificação jurídica da participação da arguida foi abordada no acórdão recorrido em conjunto com outras recorrentes, pois as arguidas BB, EE, HH e KK haviam defendido que as respectivas formas de comparticipação com os respectivos companheiros/marido se quedavam por mero auxílio, integrante de cumplicidade - fls. 199 a 202 do acórdão recorrido e fls. 8015 a 8016vº dos autos.
A recorrente na conclusão III suscita de novo a questão, defendendo que o seu comportamento se enquadra na figura jurídica de cúmplice e não de autora.
Estabelece o artigo 26º do Código Penal: «É punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução».
Dispõe o artigo 27º, n.º 1, do mesmo Código: É punível como cúmplice quem, dolosamente e por qualquer forma, prestar auxílio material ou moral à prática por outrem de um facto doloso.
Os casos de comparticipação só são configuráveis mediante acordo prévio dos comparticipantes, que traçando um plano criminoso, visam pô-lo em prática.
O co-autor executa o facto, toma parte directa na sua realização, por acordo ou juntamente com outro ou outros, ou determina outrem à prática do mesmo.
A co-autoria é a execução colectiva do facto, comunitária, em que cada comparticipante quer causar o resultado como próprio, mas com base numa decisão conjunta e com forças conjugadas
Na comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria são essenciais dois requisitos: uma decisão conjunta, tendo em vista a obtenção de um determinado resultado, e uma execução igualmente conjunta.
Exige-se, assim, um elemento subjectivo e um outro objectivo.
O primeiro exige uma decisão conjunta, podendo consistir num acordo, expresso ou tácito, ou, pelo menos, uma consciência de colaboração com carácter bilateral.
O elemento objectivo consiste na participação na execução do facto criminoso, conjuntamente com outro ou outros, num exercício conjunto do domínio do facto, ou numa contribuição objectiva para a consumação do tipo legal visado.
Decidiu o acórdão do STJ de 11-03-1998, processo n.º 1133/97-3ª, CJSTJ 1998, tomo 1, pág. 220, versando caso de tráfico de estupefacientes, que “a componente subjectiva basta-se com o simples acordo tácito, com a simples consciência bilateral, reputado ao facto global, com o conhecimento pelos agentes da recíproca cooperação”, não se exigindo que os co-autores se conheçam entre si, na medida em que cada um esteja consciente de que junto a ele vai estar outro (ou outros) e estes se achem imbuídos da mesma ideia.
No que respeita à execução propriamente dita, não é indispensável nem necessário que cada um dos agentes cometa integralmente o facto punível, que execute todos os factos correspondentes ao preceito incriminador, que intervenha em todos os actos a praticar para obtenção do resultado pretendido, bastando que a actuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo e indispensável à produção do resultado – acórdãos do STJ, de 18-07-1984, processo n.º 37420, BMJ, 339, 276; de 14-11-1984, BMJ 341, 202; de 23-04-1987, Tribuna da Justiça, nº 29, pág. 29; de 15-02-1995, processo n.º 44846, CJSTJ 1995, tomo 1, pág. 205 (212); de 22-02-1995, processo n.º 47103, CJSTJ 1995, tomo 1, pág. 221 (versando caso de crime autónomo –sequestro – cometido durante a execução do plano - de roubo); de 14-06-1995, CJSTJ 1995, tomo 2, pág. 130; de 27-09-1995, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 197; de 12-07-2000, processo n.º 274/00-3ª, CJSTJ 2000, tomo 2, pág. 239; de 11-04-2002, processo n.º 485/02-5ª; de 24-10-2002, processo n.º 3211/02-5ª; de 6-10-2004 processo n.º 1875/04-3ª (há que distinguir acordo e execução conjunta; enquanto o acordo conjunto representa o elemento subjectivo da co-autoria, a execução conjunta representa o seu elemento objectivo); de 12-07-2005, processo n.º 2315/05-5ª; de 03-11-2005, processo n.º 2938/05-5ª, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 193 (a contribuição objectiva exigida consiste na prática de actos de execução do crime, na sua realização típica); de 7-12-2005, processo n.º 2945/05-3ª CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 224 (o co-autor age com e através do outro; são de imputar a cada co-autor, como próprios, os contributos do outro para o facto, como se ele próprio os tivesse prestado); de 14-02-2007, processo n.º 4339/06-5ª, CJSTJ 2007, tomo 1, pág. 191 (o agente do crime - tráfico - responde pela co-autoria dos factos por si executados ou juntamente com outro, pelos factos que executou por intermédio deste e ainda pelos que este levou a cabo, por ele determinado, na execução de um acordo e objectivo comuns); de 02-05-2007, CJSTJ 2007, tomo 2, pág. 174 (haverá co-autoria sempre que haja uma decisão conjunta e uma execução igualmente conjunta, ainda que cada um dos agentes desempenhe tarefas distintas); de 03-10-2007, processo n.º 2576/07-3ª, CJSTJ 2007, tomo 3, pág. 198; de 10-01-2008, processo n.º 4277/07-5ª, in CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 183 (verifica-se a co-autoria quando cada comparticipante quer o resultado como próprio com base numa decisão conjunta e com forças conjugadas, bastando um acordo tácito assente na existência da consciência e vontade de colaboração, aferidas aquelas à luz das regras de experiência comum); de 18-06-2008, processo n.º 1971/08-3ª (essencial à co-autoria é um acordo respeitante à execução do plano, que tanto pode ser de extrema simplicidade, como altamente complexo, abrangendo sempre uma divisão de trabalho, uma repartição de tarefas entre co-autores, que se atribuem e aceitam prestar, destinadas ao plano comum).
Para Hans - Heinrich Jesheck, Tratado de Derecho Penal, Parte General, tradução de S. Mir Puig e F. Muñoz Conde, edição Bosch 1981, volume II, pág. 962, a cumplicidade é a cooperação dolosa com outro na realização de um seu (dele) facto antijurídico dolosamente cometido. O cúmplice limita-se a favorecer um facto alheio, não toma parte no domínio do facto; o autor não necessita sequer conhecer a cooperação que lhe presta (a chamada cumplicidade oculta).
Neste ponto se distingue a cumplicidade da co-autoria, posto que esta requer o domínio funcional do facto sobre a base de um acordo comum.
A cumplicidade requer uma vinculação entre o facto principal e a acção do cúmplice.
Germano Marques da Silva, in Direito Penal Português, Verbo, 1998, volume II, pág. 279, explicita “A linha divisória entre autores e cúmplices está em que a lei considera como autores os que realizam a acção típica, directa ou indirectamente, isto é, pessoalmente ou através de terceiros (dão-lhe causa) e com o cúmplices aqueles que não realizando a acção típica nem lhe dando causa ajudam os autores a praticá-la”.
E a fls. 280, refere que na comparticipação criminosa, de que a cumplicidade é um dos modos, “cada comparticipante responde pelo mesmo facto típico, porque todos os comparticipantes concorrem para a prática do mesmo facto. O modo de cooperação é que é diverso; o objecto a que se dirige a cooperação de todos é o mesmo: o facto, o crime”.
A fls. 291/2 afirma que a cumplicidade é uma forma de participação secundária na comparticipação criminosa, secundária num duplo sentido: de dependência da execução do crime ou começo de execução e de menor gravidade objectiva, na medida em que não é determinante da prática do crime que seria sempre realizado, embora eventualmente em modo, tempo, lugar ou circunstâncias diversas.
Traduz-se “num mero auxílio, não sendo determinante da vontade dos autores nem participa da execução do crime, mas é sempre auxílio à prática do crime e nessa medida contribui para a prática do crime, é uma concausa do crime”.
Cavaleiro Ferreira, Lições de Direito Penal, Verbo, 1987, Volume I, pág. 335, distingue entre uma participação mais grave, a participação principal (autoria) e uma participação secundária que o Código Penal designa por cumplicidade.
E a fls. 352, expende: A gravidade das formas de participação não assenta exclusivamente em elementos subjectivos baseados na intenção dos participantes (animus auctoris e animus socii), porque a distinção entre autoria e cumplicidade deriva fundamentalmente da gravidade do facto cometido por cada comparticipante no contexto da comparticipação. E é essa diferente gravidade que origina a diferenciação entre participes que são autores (participação principal) e participantes que são cúmplices (participação secundária).
Esclarece que denomina-se a cumplicidade participação secundária para acentuar a sua menor gravidade objectiva.
Faria Costa, em Formas do Crime, Jornadas de Direito Criminal, Fase I, CEJ 1983, pág 174, salienta que a primeira ideia que ressalta do preceito (artigo 27º do C. Penal) é a de que a cumplicidade experimenta uma subalternização relativamente à autoria, estando-se face a actividade que se fica pelo auxílio, perante uma causalidade não essencial. A infracção sempre seria praticada, só que o seria em outro tempo, lugar ou circunstância.
Como se pode ler no acórdão do STJ de 10-12-1997, processo n.º 916/97, BMJ 472, 116, “A definição da cumplicidade do artigo 27º do Código Penal contém a cláusula geral «por qualquer forma», que permite que o seu conteúdo seja o mais compreensível possível. Como acontece em outras legislações europeias, o legislador renunciou aqui a descrever em pormenor as diversas formas possíveis da cumplicidade, limitando-se a uma definição geral – o cúmplice presta assistência, mas pouco importa como esta é fornecida. E desta forma são as circunstâncias de cada caso concreto que constituem o critério decisivo da configuração da figura. Deste modo deixou-se ao julgador um largo poder de apreciação, no sentido de lhe permitir, em cada caso, um juízo conforme a realidade das coisas”.
A jurisprudência tem procurado estabelecer as diferenças entre co-autoria e cumplicidade, como se vê dos seguintes acórdãos:
- de 22-03-2001, processo n.º 473/01-5ª, CJSTJ 2001, tomo 1, pág. 260, tanto co-autor como cúmplice são auxiliatores; cada um a seu jeito, ajuda ou concorre para a produção do feito. Mas enquanto o primeiro assume um papel de primeiro plano, dominando a acção (já que esta é concebida e executada com o seu acordo – inicial ou subsequente, expresso ou tácito – e contribuição efectiva), o segundo é um interveniente secundário ou acidental: só intervém se o crime for executado ou tiver início de execução e, além disso, mesmo que não interviesse, aquele sempre teria lugar, porventura em circunstâncias algo distintas. A sua intervenção sendo, embora, concausa do concreto crime levado a cabo, não é causal da existência da acção, no sentido de que, sem ela, apesar de tudo, o facto sempre teria lugar, porventura em circunstâncias algo diversas. É neste sentido, um auxiliator simplex ou causam non dans; de tal modo que pode conceber-se autoria sem cumplicidade, mas não, esta sem aquela, o que mostra o carácter acessório da figura;
- de 31-03-2004, processo n.º 136/04-3ª CJSTJ 2004, tomo 1, pág. 239: A cumplicidade pressupõe um apoio doloso a outra pessoa no facto anti jurídico doloso cometido por esta, não há na cumplicidade domínio material do facto, pois o cúmplice limita-se a favorecer a prática do facto;
- de 21-10-2004, processo n.º 3205/04-5ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 202 «É co-autor e não simples cúmplice de um crime de tráfico de estupefacientes o co-arguido que, no exterior (fora da cadeia), recebeu, guardou e posteriormente transportou num percurso de mais de 100 Km, cerca de meio quilo de heroína, em conjugação de esforços com outro co-arguido que, a partir do estabelecimento prisional onde se encontrava detido, monta uma operação de tráfico de estupefacientes, na qual contou com a colaboração de outras pessoas».
Podem ver-se ainda, i. a., os acórdãos de 18-07-1984, processo n.º 37469, BMJ 339, 297 (a essencialidade (causam dans), na determinação do agir, afasta irremediavelmente a cumplicidade); de 01-02-1989, BMJ 384, 371; de 09-02-1994, processo n.º 45166, CJSTJ 1994, tomo 1, pág. 223 (versando caso de tráfico de estupefacientes); de 11-04-1996, CJSTJ 1996, tomo 1, pág. 240 (versando caso de tráfico de estupefacientes e citando os acórdãos de 15-07-1992, processo n.º 42889 e de 23-02-1994, processo n.º 45710); de 09-05-2001, processo n.º 772/01-3ª, CJSTJ 2001, tomo 2, pág. 187; de 06-12-2001, processo n.º 3160/01-5ª, CJSTJ 2001, tomo 3, pág. 227 (em caso de roubo com homicídio, fazendo recensão de posições doutrinárias sobre a distinção das figuras); de 22-11-2006, processo n.º 3182/06-3ª, CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 230; de 22-03-2007, processo n.º 4808/06-5ª, CJSTJ 2007, tomo 1, pág. 226 (maxime, 231); de 10-10-2007, processo n.º 2684/07-3ª.

Revertendo ao caso concreto.

O acórdão recorrido sobre o tema versou, de fls. 199 a 202, nos termos seguintes:
«Porém, no caso dos autos, não há dúvidas que cada uma das referidas recorrentes, além do simples auxílio, tanto mais que tomaram uma decisão conjunta com os respectivos comparticipantes (companheiros/marido), actuou com pleno domínio do facto.
O modo como foi executado o dito crime de tráfico de estupefacientes em relação a cada um dos quatro casais (a saber: arguidos AA e BB; arguidos GG e HH; arguidos EE e FF; e arguidos JJ e KK) mostra que cada uma das arguidas BB, FF, HH e KK (mesmo considerando a particular actuação de cada uma delas, inferior - em termos de execução da resolução do crime que decidiram cometer - à dos respectivos companheiros e marido que assumiram a liderança do dito negócio de compra e venda de estupefacientes, no qual tiveram maior participação em função também da sua maior disponibilidade) praticou actos necessários de execução do crime de tráfico de estupefacientes, colaborando com os respectivos companheiros/marido naquela decisão criminosa, tornando-se co-autores do facto (isto é, daquele concreto crime de tráfico de estupefacientes), ainda que não tivessem participado em todos os actos ao longo do tempo em que o crime foi cometido.
É que também não se pode esquecer que, para a existência da co-autoria “não é indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos ou tarefas tendentes a atingir o resultado final.”(7),
Ao contrário do que referem as recorrentes BB, FF, HH e KK a sua actuação não se limitou a um mero auxílio à prática por outrem de um crime doloso.
O que sucedeu foi que cada uma das recorrentes participou directamente na execução do facto criminoso, no circunstancialismo apurado, praticando (umas mais, outras menos) actos necessários de execução do “plano criminoso”, que encontra suporte na decisão conjunta que tomaram nas respectivas circunstâncias dadas como provadas (tendo cada uma das recorrentes BB, FF, HH e KK agido em comunhão de esforços, vontades e de acordo com o respectivo co-arguido, seu companheiro/marido).
A actuação de cada uma das recorrentes BB, FF, HH e KK (ainda que a sua contribuição esteja circunscrita a uma parte da respectiva acção conjunta) não se traduziu no “simples encobrimento”, nem tão pouco os seus actos podem ser interpretados como “simples favorecimento”.
A comparticipação das referidas recorrentes é manifesta na medida em que “tomaram parte directa na execução do ilícito típico” (8) e, sempre que actuaram, agiram em colaboração com os respectivos companheiros/marido na execução do crime em questão, no circunstancialismo dado como provado.
Assim, pese embora cada uma das recorrentes BB, FF, HH e KK não tivesse intervenção em todos os actos que integraram o crime de tráfico de estupefacientes pelo qual foram condenadas, na medida em que participaram como co-autoras no dito crime de tráfico de estupefacientes, respondem pela totalidade do evento na parte em que lhes pode ser imputado (consoante a actuação de cada uma delas).
Por isso, integrando a conduta de cada uma das recorrentes BB, FF, HH e KK, a prática em co-autoria de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. no art. 21 nº 1 do cit. DL nº 15/93 e, sendo a co-autoria uma forma de autoria, atento o conceito amplo definido no art. 26 do CP, não merece censura a qualificação jurídico-penal efectuado no acórdão sob recurso.
O mesmo sucedia, tendo plena aplicação as considerações acima feitas, ainda que a decisão sobre a matéria de facto não tivesse sido modificada por esta Relação.
A tese das recorrentes BB, FF, HH e KK (quanto à sua participação no dito crime de tráfico de estupefacientes, apenas enquanto cúmplices), não encontra suporte na prova produzida em audiência de julgamento, como acima se explicou e olvida a diferença que existe entre as figuras da autoria (co-autoria) e da cumplicidade.
Ora, uma vez que a tese das recorrentes BB, FF, HH e KK (quanto à sua participação enquanto cúmplices) não procede, é manifesto que não podem beneficiar da atenuação especial prevista no art. 27 nº 2 do C P.
Em face do exposto, improcede a argumentação das recorrentes BB, FF, HH e KK, quer quando pretendem integrar a respectiva conduta na figura da cumplicidade, quer quando pretendem beneficiar da atenuação especial prevista no art. 27 nº 2 do CP».

Perante o acerto desta análise pouco mais se poderá dizer.
É certo que não nos podemos ficar pela afirmação da existência de um plano prévio comum, concertado, que é apenas a expressão de uma mera intenção, necessário se impondo a individualização concreta de cada co-autor de modo a poder concluir-se se a recorrente tinha ou não o domínio funcional do facto, para utilizar a terminologia de Jesheck.
Por outro lado, dado o carácter pessoal da responsabilidade, necessário é que o facto seja atribuível a cada comparticipante como seu.
Ora, no caso em apreciação, estamos perante um exercício conjunto no domínio do facto, uma contribuição objectiva para a realização do facto; a recorrente aderiu ao projecto global do seu casal e dele comparticipou através de contributo essencial à sua concretização, não se estando perante intervenção ou mero favorecimento em facto alheio.
Os factos provados no ponto I não deixam margens para dúvidas de que ficou assente o que configura inequivocamente a comparticipação directa da arguida na execução do crime de tráfico de estupefacientes, sob a forma de co-autoria, e não de cumplicidade, pois não se limitou a facilitar a execução do facto, ou a uma prestação de ajuda ou de assistência à sua concretização, não sendo a actuação episódica, acessória, incidental, havendo antes a resolução comum de realizar o facto e uma participação directa na sua execução.
A actividade da recorrente não se limitou a uma “caminhada a latere” do comum acordo constitutivo da co-autoria, tendo antes participado neste na sua génese a nível de formulação de intenção e a sua actividade foi mais além do que uma mera cooperação psicológica que fortalecesse o autor, seu companheiro, antes executando, dando forma e substância ao projecto e desígnio comum, em ordem a concretizar os objectivos traçados, e retirando, a juzante, os proveitos comuns dessa actividade comungada e querida por ambos.

Improcede, pois, esta pretensão, sendo de manter a qualificação da participação da recorrente como co-autora.

Medida da pena

Na conclusão VI expressa a recorrente a pretensão de ver reduzida a pena aplicada, numa primeira linha como cúmplice, não devendo ser superior a 2 anos de prisão, e subsidiariamente, não devendo ultrapassar os 4 anos, suspensa na sua execução com sujeição a regime de prova.
No acórdão recorrido esta questão foi tratada relativamente aos arguidos AA e ora recorrente, a par, pronunciando-se nestes termos:
«Obviamente que importa distinguir a contribuição de cada membro do casal constituído pelos arguidos AA e BB, tendo presente que a conduta do AA foi mais intensa em relação à da sua companheira, na medida em que era ele que assumia a liderança daquele “negócio” e que para o mesmo tinha maior disponibilidade».
O envolvimento do arguido AA no tráfico de drogas, mostra que é um traficante que se situa num escalão acima da média (embora não tão alto como o do arguido CC ou sequer como o do arguido JJ, mas já próximo do arguido GG, como se verá adiante).
A ilicitude dos factos apurados é elevada, se olharmos à quantidade e diferente qualidade (heroína e cocaína) de estupefacientes que compraram (chegando numa das vezes o arguido AA a comprar juntamente com o “P......” estupefacientes no valor de 20.000 euros) e venderam no circunstancialismo dado como provado.
Por outro lado, importa atender ao seu modo de actuação (mais grave o do arguido AA porque mais activo e variado – v.g. sendo ele que contactava fornecedores e comprava os estupefacientes - do que o da arguida BB), período de tempo (a partir de Outubro de 2005 até 24/1/2006, ou seja, cerca de 4 meses) em que cometeram o crime em questão, motivos que os determinaram (obtenção de lucros fáceis), lucros que obtiveram (atentos os preços de compra e os preços de venda que praticaram naquele período de tempo e quantidade de estupefacientes que transaccionaram) e consequências graves da sua conduta (até tendo em atenção as quantidades de heroína e cocaína que vendiam não só a consumidores como também a indivíduos que sabiam que os iriam revender) que se prolongaram no tempo.
A conduta de cada um dos arguidos mostra bem que são elevadas as razões de prevenção geral positiva que se fazem sentir neste tipo de crime.
As elevadas razões de prevenção geral (necessidade de restabelecer a confiança na validade da norma violada) são por todos conhecidas (e foram também ponderadas pelo tribunal a quo), designadamente, tendo em atenção o bem jurídico primordial violado no crime em questão (genericamente a saúde pública), o qual deve ser combatido com maior severidade, embora de forma proporcional à danosidade que causa e tendo em atenção as particulares circunstâncias de cada caso.
Importa ainda ter em atenção, embora tendo como limite a medida da culpa de cada um deles, a necessidade de prevenir a prática de futuros crimes, sendo certo que o arguido AA (…), enquanto a arguida BB não tem antecedentes criminais.
E, não obstante serem mais elevadas e “prementes” as razões de prevenção geral (“reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida”), neste caso concreto as razões de prevenção especial (carência de socialização) e a necessidade de ressocialização de cada um dos arguidos, também são elevadas (uma vez que apesar de terem família constituída – inclusive filhos menores - trabalharem como feirantes, vivendo em casa própria, contando com o apoio de familiares, ainda assim não foram capazes de levar uma vida conforme ao direito).
Importa também ter em atenção a situação pessoal, social e económica de cada um dos arguidos que, apesar de tudo, revela (por outro lado) alguma sensibilidade positiva à pena a aplicar, com reflexo favorável no juízo de prognose sobre a necessidade e a probabilidade da sua reinserção social.
Igualmente se deverá atender (como diz o Colectivo) às respectivas idades (o arguido AA nasceu em 9/1/1973 e a arguida BB nasceu em 28/9/76, consoante resulta da sua identificação constante do relatório do acórdão sob recurso) - quer à data do cometimento do crime (então ele com 33 anos e ela com 29 anos de idade), quer actualmente (ele com 35 anos e ela com 32 anos de idade) - e ao efeito previsível da pena sobre o seu comportamento futuro.
Tudo ponderado, olhando à imagem global dos factos concretos apurados e tendo presente o limite máximo consentido pelo grau de culpa de cada um dos arguidos, bem como os princípios político-criminais da necessidade e da proporcionalidade, julga-se adequada e ajustada a pena de 7 anos de prisão para o arguido AA (…) e a pena de 5 anos e 4 meses de prisão para a arguida BB».

Face a estes elementos pouco mais haverá a dizer.
Será de atender ao elevado grau de ilicitude, ao período da actividade, às quantidades que foram transaccionadas, as qualidades dos produtos, haxixe e cocaína, com maior grau de danosidade social, a disseminação dos estupefacientes por grande número de consumidores, atendendo a que vendiam, não só directamente a consumidores mas também a revendedores que os iam vender e as condições pessoais, tendo três filhos menores, um a frequentar a escola, outro o infantário estando a mais nova com a arguida.
A arguida que não frequentou a escola, não tem antecedentes criminais.
Sopesando todos estes elementos afigura-se-nos ser de efectuar um ajustamento na pena aplicada, reduzindo-a para os 5 anos de prisão.

Suspensão da execução da pena

Quanto a esta pretensão expressa na conclusão VII, a mesma colocar-se-á em função da pena ora aplicada.
Na falta de elementos actualizados que permitam aqui e agora fundamentar uma opção no sentido da concessão ou denegação da pena de substituição, remetendo para tudo o que foi dito a propósito do tema no recurso da recorrente KK, considera-se ser de ordenar a reabertura de audiência para os assinalados fins com prévia requisição de relatório social actualizado.

Pelo exposto, acordam neste Supremo Tribunal de Justiça em julgar os recursos pela forma que segue:
1 - Recurso do arguido JJ
1. 1 - Julgar o recurso parcialmente procedente, reduzindo a pena que se fixa em sete anos de prisão.
2 - Recurso da arguida KK
2. 1 - Julgar procedente o recurso, reduzindo a pena aplicada e fixando-a em quatro anos e seis meses de prisão;
2. 2 - Determinar a reabertura de audiência, nos termos expostos, com vista a ser ponderada a possibilidade de aplicação de pena de substituição;
3 – Recurso do arguido CC
3. 1 – Julgar o recurso improcedente, mantendo a pena aplicada;
4 - Recurso da arguida BB
4. 1- Rejeitar o recurso no que respeita à invocação de violação dos princípios de livre apreciação da prova e in dubio pro reo;
4. 2 - Julgar improcedente o recurso, no que toca à pretensão de requalificação para crime de tráfico de menor gravidade, confirmando a condenação como co-autora de crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º, do DL 15/93;
4. 3 - Julgar improcedente o recurso no que toca à pretensão de qualificação da participação como cumplicidade;
4. 4 – Julgar parcialmente procedente o recurso, no que respeita à medida da pena, que se fixa em cinco anos de prisão;
4. 5 - Determinar a reabertura de audiência, nos termos expostos, com vista a ser ponderada a possibilidade de aplicação de pena de substituição.

Custas pelos recorrentes JJ, CC e BB, nos termos dos artigos 513º, n.ºs 1, 2 e 3 e 514º, n.º 1, do CPP (na redacção anterior à que lhes foi dada pela Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro – Regulamento das Custas Processuais - com as alterações introduzidas pelo artigo 156º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro) e artigos 74º, 87º, nº 1, alínea a) e 89º do Código de Custas Judiciais, aplicando-se este diploma, uma vez que de acordo com o artigo 27º daquela Lei, o novo regime de custas processuais só é de aplicar aos processos iniciados a partir de 20 de Abril de 2009, fixando-se a taxa de justiça em 5 unidades de conta para os primeiro e segundo recorrentes e em 7 UC para a recorrente BB.
Sem custas quanto à recorrente KK.
A recorrente BB vai condenada na importância de 5 unidades de conta, nos termos do artigo 420º, nº 3, do CPP.
Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94º, n.º 2, do CPP.

Lisboa, 27 de Maio de 2009


Raul Borges (Relator)
Fernando Fróis
Pereira Madeira

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(1) Esse consenso visou responder aos problemas de entendimento e decisão que se vinham desenhando no seio do Supremo Tribunal de Justiça, face à inexistência de qualquer disposição transitória visando antecipar a resolução antecipada dos problemas de aplicação da lei no tempo que se viessem a colocar, designadamente na fase de recurso e funda-se nos seguintes argumentos.
(2) - Cfr., por todos, o Ac. STJ, de 6/3/79, BMJ285.° 286.
(3) Escreve Engisch, in Introdução ao Pensamento Jurídico, Lisboa, Gulbenkian, p. 205 e 206 que "também aqui não obstante todos os esforços da teoria e da prática para trazer justiça à graduação da pena, - por um lado, desempenha um papel importante a ideia de utilidade ou conveniência prática e, por outro lado, subsiste um resíduo de apreciação pessoal que não pode ser reduzido pela análise da razão e que é, portanto, uma componente individual. Lembrando que "os fins" das penas não são unívocos, acrescenta Engisch; " se tanto a valoração axiologicamente estruturada da ordem da conveniência prática são factores inseguros da graduação das penas, a custo o produto desses factores poderá ser alguma vez unívoco "
(4) Cfr. Karl Lorenz, sobre a irredutível margem de livre apreciação por parte do juiz na Metodologia da Ciência do Direito, 2ª. ed., Gulbenkian, p. 353.
(5) Manuel Simas Santos Marcelo xxxx Ribeiro, in Medida Concreta da Pena. Disparidades 1998, p. 111.
(6) O nº de telefone desse “C.....” (0000000) também aparece na agenda telefónica do telemóvel apreendido ao arguido A.........., como decorre de fls. 1312.
(7) Neste sentido, entre outros, Ac. do TRP de 13/4/2005, proferido no processo nº 037896, relatado por Agostinho Freitas, consultado no mesmo site do ITIJ. Acompanhando o Ac. do STJ de 18/10/89, in BMJ nº 390/142, argumenta-se: “a essência da co-autoria consiste em que cada comparticipante quer causar o resultado como próprio, mas com base numa decisão conjunta e com forças conjugadas. É assim co-autor de um crime quem, embora o não pratique directamente, o combinou por palavras e gestos com outrem, e se encontra presente quando ele é cometido, para poder intervir se for necessário. E a circunstância de um agente ter ficado de vigia enquanto o outro entrou na moradia para furtar, de acordo com o plano estabelecido, não significa que aquele não tenha cometido o crime de introdução em casa alheia, toda a vez que, como se viu, no que respeita à execução propriamente dita não se torna indispensável que cada um dos arguidos intervenha em todos os actos a praticar para a consecução do resultado final, bastando que a actuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo.” A este propósito, citam ainda Faria Costa quando escreve: «para definir uma decisão conjunta parece bastar a existência da consciência e vontade de colaboração de várias pessoas na realização de um tipo legal de crime juntamente com outro ou outros. É evidente que na sua forma mais nítida tem de existir um verdadeiro acordo prévio - podendo mesmo ser tácito - que tem igualmente que se traduzir numa contribuição objectiva conjunta para a realização típica. Do mesmo modo que, em princípio, cada co-autor é responsável como se fosse autor singular da respectiva realização típica...».
(8) Assim, João Varela, “Tráfico ilícito de drogas: questões de autoria e participação à luz do respectivo tipo legal de crime”, anotação ao Ac. do STJ de 15/2/2007, in RPCC ano 17, nº 3 (Julho-Setembro de 2007), p.
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