Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
10118/16.2T8VNG-A.P1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: ACÇÃO ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO DE DESPEDIMENTO
INTERVENÇÃO DE TERCEIROS
CONVOLAÇÃO PARA ACÇÃO COMUM
Data do Acordão: 09/26/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO EM GERAL / INCIDENTES NA INSTÂNCIA / INTERVENÇÃO DE TERCEIROS / INTERVENÇÃO PRINCIPAL / INTERVENÇÃO PROVOCADA / FORMAS DE PROCESSO.
DIREITO DO TRABALHO – DIREITO COLECTIVO / NEGOCIAÇÃO COLECTIVA / ARBITRAGEM / ARBITRAGEM NECESSÁRIA.
Doutrina:
- Madeira de Brito, O novo princípio da adequação formal, Aspectos do Novo Processo Civil, Lex, p. 36 e 67;
- Pereira Rodrigues, Noções Fundamentais de Processo Civil, Almedina, 2015, p. 358.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 316.º, N.ºS 2 E 3, ALÍNEA A) E 547.º.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGO 384.º, ALÍNEA D).
Sumário :

I - Formulando o trabalhador na contestação apresentada em acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento pedido reconvencional contra a empregadora que o proferiu, e contra uma outra empresa invocando uma situação de pluralidade de empregadores, e requerendo o chamamento desta última mediante o incidente de intervenção provocada, a tramitação da acção especial - baseada na simplificação processual e na celeridade - não comporta a dedução deste incidente.

II - Confrontado com este pedido pode o Juiz, ao abrigo do artigo 547° do CPC, convolar a acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento para acção com processo comum para assim permitir essa intervenção.

III – O princípio da adequação formal vem romper com o regime apertado do princípio da legalidade das formas processuais, visando-se através dele remover um obstáculo ao acesso à justiça em obediência à natureza instrumental da forma de processo.

IV- Assim, se a tramitação prevista na lei não se adequa ao fim do processo, justifica-se que se adapte a sequência processual às especificidades da causa com vista a obter uma solução global e justa do litígio.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1----

AA apresentou, em 16.12.2016, na Comarca do Porto, Vila Nova de Gaia - Juiz 1, o formulário a que aludem os artigos 98°-C e 98°-D do CPT, declarando opor-se ao despedimento promovido em 26.10.2016, pela sua empregadora

BB. CRL, pedindo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade do mesmo.

Como a audiência de partes não redundou na sua conciliação, veio a empregadora apresentar articulado a motivar o despedimento, alegando que a trabalhadora foi admitida ao serviço da CC(Norte) Lda., em 01.06.1999, mediante a celebração dum contrato de trabalho a termo certo de seis meses que se renovou. No entanto, em 01.11.2001, o contrato de trabalho foi cedido à empregadora que reconheceu a sua antiguidade desde 01.06.1999.

E quanto ao impugnado despedimento, sustenta a sua legalidade e licitude, opondo-se à reintegração da trabalhadora.

Esta veio apresentar articulado pedindo, em via reconvencional, a declaração da ilicitude do despedimento e a condenação da empregadora, solidariamente com a chamada CC de Avaliação Lda., a pagar-lhe as quantias resultantes dessa ilicitude e outras remunerações que peticionou.

E para sustentar o chamamento alega que ao longo dos anos trabalhou para várias entidades/empresas que fazem parte do grupo empresarial CC, tendo sido reconhecida como funcionária/técnica da CC, constituindo a Ré a alteração da sua denominação, ocorrida em Setembro de 2011.

A empregadora veio responder, invocando o erro na forma do processo e pedindo a absolvição da instância quanto aos factos relacionados com a chamada e peticionados nos artigos 45 a 55, 57 a 67, 128 a 136, e 237 a 241 da contestação.

Mais refere que nunca foi celebrado com a CC qualquer contrato de trabalho ou em regime de pluralidade de empregadores [artigos 318 a 436 da resposta].

A trabalhadora veio responder defendendo a inexistência do invocado erro na forma do processo.

Em 07.04.2017, proferiu o Senhor Juiz da 1ª instância o seguinte despacho:

(...) "Atentos estes princípios de celeridade e simplificação que informam a presente acção, afigura-se-nos que o que o legislador teve em vista foram, como únicas partes possíveis, de um lado o trabalhador despedido e, do outro, a entidade empregadora que tenha, por escrito, comunicado a decisão de despedimento.

No mesmo sentido aponta a circunstância de o único documento que a lei exigiu como pressuposto do recebimento do formulário inicial ser a «decisão de despedimento» - cf artigo 98º-E do CPT - em função da qual se pode desde logo apreciar a existência de uma decisão de despedimento escrita, quem foi despedido (trabalhador) e quem despediu (empregador) (...)

Assim e a nosso ver, não se mostra processualmente possível a dedução de pedidos, na acção especial de impugnação do despedimento, contra terceiros que não constem da decisão de despedimento invocada.

De todo o modo, não podemos olvidar que esta posição implica, para a responsabilização do terceiro visado, a instauração de uma nova acção, com uma duplicação de processos, de custos, de diligências e, sobretudo, de decisões que podem vir a ser tendencialmente contraditórias.

Por outro lado e como sucede no caso dos autos, os factos alegados para a demanda do terceiro, contendem, não só com a responsabilização dele para além da Ré inicialmente demandada, mas também com a definição da antiguidade do trabalhador, o seu passado laboral, as suas funções e retribuição efectiva (alegadamente paga por terceiros), tendo pois reflexos até no montante em que poderá vir a ser calculada uma indemnização pelo despedimento, caso este se venha a reputar ilícito (...)

Considerando estes aspectos e os princípios de adequação processual consagrados nos artigos 6º, n° l e 547° do CPC, os quais não deixam de ser extensivos ao processo laboral (cf. artigos 1º, n° 2, ali. a) e 49º, nº 2 do CPT), julgamos que a forma de compatibilizar a limitação processual, nesta matéria, da acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento com os interesses de economia processual, apreciação conjunta das pretensões e realização da justiça no caso concreto, é a seguinte:

adaptar o processado, desde a dedução da reconvenção e pedido de intervenção do terceiro, convolando-o para processo comum (ainda que sem prejuízo da ressalva a este contida no artigo 98°-M do CPT quanto à ordem de produção de prova, dadas as regras especiais do ónus da prova em matéria de despedimento).

É o que se decide, pelo que:

se determina que o processo passe doravante a seguir os termos do processo comum, devendo como tal ser autuado; se admite, ao abrigo do artigo 316°, n°s. 2 e 3, ali. a) do CPC, o chamamento da sociedade CC de Avaliação Lda., a qual deverá ser citada para, querendo, contestar no prazo de 10 dias e nos demais termos do artigo 319° do mesmo Código.

Face ao ora decidido, julga-se prejudicada a excepção de erro na forma de processo que a Ré Empregador suscitou no seu articulado de resposta (...)”.

Tendo a empregadora apelado deste despacho, veio o Tribunal da Relação do Porto proferir acórdão “em que se julga a apelação procedente, se revoga o despacho recorrido que determinou que o processo passasse a seguir os termos do processo comum e que admitiu o chamamento da sociedade CC e consequentemente se julga procedente a excepção do erro na forma do processo e se absolve a apelante e a chamada da instância.”

        

É agora a trabalhadora, que inconformada nos traz revista, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões:

1- A decisão proferida pela primeira instância, ao abrigo do princípio da adequação processual, deverá ser mantida, por consagrar solução jurídico-processual válida e adequada.

2- Tal adequação processual, convolando o processo para processo comum e admitindo o chamamento da sociedade terceira - e assim assegurando plenamente os interesses e o exercício dos direitos que a Recorrente pretende fazer valer na acção - não contendeu, nem feriu, os princípios da igualdade ou do contraditório e da aquisição processual de factos.

3- Nem diminuiu quaisquer garantias da Empregadora ou da Chamada.

4- Não se verifica, no caso, qualquer erro na forma do processo, nem existe fundamento para a decretada nulidade de todo o processado e para a consequente absolvição da instância quer da apelante, quer da chamada.

 5- A natureza especial da acção interposta não é incompatível com a existência de pluralidade de réus, designada e concretamente em face da invocada, pela Recorrente, situação de pluralidade de empregadores.

6- Isso mesmo resulta da correcta e adequada interpretação da norma do artigo 98º-L, n° 3 do CPT.

7- Solução diversa, como a que é preconizada pelo Acórdão recorrido, mostra-se indesejável e desproporcional para o trabalhador, suportando-se apenas na rigidez excessiva da tramitação da acção especial.

8- O Acórdão recorrido desconsidera a materialidade de que depende a tutela jurisdicional efectiva da posição e do interesse da Autora/Recorrente, adoptando uma perspectiva estritamente rígida e formal quanto ao âmbito e alcance possível da acção especial.

9- Nada impede que, mesmo na acção especial, o trabalhador possa demandar todos aqueles que considera seus empregadores.

10- Tal perspectiva tem hoje acolhimento tanto na doutrina, como na jurisprudência, nos termos referenciados nas presentes alegações.

11- No limite e sem prescindir, a acção sempre deveria prosseguir, como especial, contra a Apelante.

12- O Acórdão recorrido procedeu a uma incorrecta interpretação e aplicação das normas que correspondem aos artigos 4º, 413°, 193°, 552°, n,° 1, alínea d), 278°, n.° 1, alínea e), 577°, alínea b), 665°, n.° 2, e 193°, todos do CPC, e 98-L, n.° 3, do CPT, normas que assim se mostram violadas pelo Acórdão recorrido.

13- O presente recurso deve ser julgado procedente, revogando-se o Acórdão recorrido e determinando-se o normal prosseguimento dos presentes autos em função da decisão/despacho proferido em primeira instância em 7/4/2017.

        

A recorrida também alegou, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões:

1. Vem a Recorrente, através dos presentes autos, requerer a revogação do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, em 21 de Fevereiro de 2018, que "revogou o despacho (...) que determinou que o processo passasse a seguir os termos do processo comum e que admitiu o chamamento da sociedade CC", consequentemente julgando "procedente a excepção do erro na forma do processo'''' e absolvendo a apelante e a chamada da instância.

2. A decisão recorrida não merece censura, sendo, indubitavelmente, o desfecho mais justo e adequado às pretensões que a Recorrente veio a demonstrar ter nos presentes autos.

3. Em primeiro lugar, a Recorrente refere que o recurso interposto, pela Recorrida, do despacho ora revogado seria inadmissível "(...) em face da apresentação de todos os articulados, iniciais e subsequentes ao despacho do Mmo. Juiz da primeira instância, dos quais resulta, globalmente, o exercício das respectivas posições processuais por parte de todos os envolvidos (Autora, Ré, Chamada)" mostram-se "respeitados precisamente os princípios da igualdade, do contraditório e da aquisição processual de factos" (cfr. Págs. 4 e 5 das alegações da Recorrente).

4. Para além de a mesma não explicar concretamente em que medida parecem não existir concretas garantias que fiquem ou sejam postas em causa, não identifica a Recorrente, tão-pouco, como é que, na prática, poderia a Recorrida (e, bem assim, a Chamada) assegurar as eventuais garantias que hipoteticamente estivessem em causa, já no âmbito da acção com processo comum.

5. Este raciocínio entende-se, por advir de quem manifestamente o aproveita, mas não se aceita, porque é injusto e desequilibra a posição das partes, tanto no que diz respeito aos actos passados (por a Recorrida se ter visto limitada à natureza específica e as características particulares da acção especial), como também no que respeita ao futuro (já que a ordem de produção de prova, nos termos do despacho revogado, se manteria de acordo, precisamente, com as regras da acção especial).

6. O despacho em causa constitui uma decisão de simplificação ou de agilização processual e adequação formal, proferida nos termos previstos no n.° 1 do artigo 6.° e no artigo 547.° do CPC, de que cabe recurso nos termos do disposto no n.° 2, do artigo 630.°, do mesmo Código, sempre que contender com os princípios de igualdade ou do contraditório, com a aquisição processual ou com a admissibilidade de meios probatórios.

7. In casu e atento o exposto em 5., dúvidas não podem existir de que o despacho de adequação formal - a manter-se - determinaria a violação de facto dos referidos princípios, já que:

a)        Até essa convolação, a Recorrida se mostrou limitada à tramitação específica e urgente da acção especial e, bem assim, aos respectivos prazos de propositura e ónus de alegação;

b)        Encontrou-se, igualmente, impossibilitada de deduzir reconvenção, porquanto esta possibilidade apenas se encontra prevista para o processo comum, o que no presente e após oferecidos todos os articulados possíveis, se mostra intempestivo;

c)         E, agora, chegada à fase de discussão e julgamento, teria ainda de ser a primeira a produzir prova sobre os factos trazidos à colação pela Recorrente - que em nada se relacionam com o seu despedimento ou relação laboral -, o que não se mostra sequer conforme com o tipo de processo em que se convolaria a acção especial.

8. No seguimento de o que precede, é manifesto que a impugnação do despacho proferido com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil, não apenas porque a referida decisão incide directamente sobre questões que influem sobre a determinação da prova a fazer em audiência de discussão e julgamento - logo carecendo de ser prévia à mesma e cabendo, assim, no recurso de apelação previsto na alínea h) do n.° 2, do artigo 79.°-A, do CPT -, mas também porque a produção dessa prova, nos termos determinados pelo Ilustre Tribunal de 1ª instância e conforme já se disse, violaria as garantias de defesa e contraditório, pondo em causa a igualdade substancial entre partes nos presentes autos.

9. No que diz respeito ao objecto do Acórdão recorrido, dir-se-á que a acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento é um tipo específico de acção que visa o controlo jurisdicional da adequação do respectivo procedimento às previsões legalmente estabelecidas (artigos 98.°-B e seguintes, do CPT).

10. Sendo uma acção especial, não se compagina com a existência de uma relação laboral controvertida, a que acresce o facto de ser um processo urgente e que não se compadece com a demora na discussão deste tipo de questões, sujeitas ao termos do processo comum.

11. Apenas os pedidos formulados pela Recorrida, que tanjam directamente com o processo de despedimento por extinção do seu posto de trabalho, poderão ser apreciados pelo Ilustre Tribunal, o que, salvo melhor opinião, não se aplica ao reconhecimento de uma situação material de empregadores, com vista à responsabilização solidária de uma empresa que nunca teve a qualidade de entidade empregadora da Recorrente (CC de Avaliação, Lda.), nem com a mesma se encontra ou encontrou em relação de grupo ou partilhou estruturas organizativas comuns, nos termos e para os efeitos do n.° 1 do artigo 101.°, do Código do Trabalho.

12. Neste sentido, cfr. Acórdão proferido em 16.04.2015, pelo Tribunal da Relação de Évora; Acórdãos proferidos em 26.03.2014 e em 26.03.2015, pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

13. Com efeito, a Recorrida invocou a excepção de erro na forma de processo, cuja análise o Ilustre Tribunal de 1ª instância, no despacho revogado, entendeu encontrar-se prejudicada face à decisão de convolação da acção especial em processo comum.

14. Também no sentido da procedência da excepção invocada pela Recorrida vão, igualmente, os Acórdãos proferidos em 10.01.2011, 17.10.2011 e em 29.10.2012, pelo Tribunal da Relação do Porto e o Acórdão de 20.06.2013 do Tribunal da Relação de Évora.

15. No que diz respeito ao chamamento da sociedade CC Consultores de Avaliação, Lda., entende a Recorrida que já existe prova suficiente nos autos (quer oferecida pela Recorrida, como pela própria Recorrente) para que se pudesse afastar a fundamentação justificativa e aduzida pelo Ilustre Tribunal de 1ª instância.

16. Com efeito, com base no argumento de a Recorrida ter alegadamente prestado actividade "do ponto de vista material e substantivo, à empresa CC Consultores de Avaliação, Limitada, não obstante a sua vinculação formal à aqui Ré" (Cfr. Contestação apresentada pela Recorrente), vem a mesma peticionar a responsabilização solidária desta e da Recorrida, fazendo um suposto enquadramento de aspectos societários, que se encontra absolutamente incorrecta e que a Recorrida impugnou.

17. Sem prejuízo de o que supra se conclui relativamente à natureza especial deste tipo de acção e impossibilidade de existência de uma relação laboral controvertida para a respectiva aplicação, é de salientar que:

(i) Nunca foi celebrado qualquer contrato com ou em regime de pluralidade de empregadores entre a Recorrente e a Recorrida (ou entre a Recorrente e a sociedade CC Consultores de Avaliação, Lda.);

(ii) Nunca a Recorrente de forma directa prestou serviços à CC Consultores de Avaliação, Lda., de forma subordinada ou independente.

18. A Recorrida foi constituída em 18 de Outubro de 1983, sob a forma de cooperativa, com a natureza de utente de serviços (Cfr. Número Um do Artigo Um, do Pacto Social -Documento n.° 1, junto com a Resposta à Contestação e à Reconvenção), visando o fornecimento de serviços aos seus membros no âmbito do respectivo objecto principal, designadamente a prestação de serviços e consultoria no desenvolvimento e coordenação de projectos e formação profissional (Cfr. Artigo Quarto do Pacto Social - Documento n.° 1, junto com a Resposta à Contestação e à Reconvenção).

19. A lei permitia (e permite ainda a qualquer empresa com a natureza de Cooperativa), que a Recorrida e qualquer outro trabalhador da Cooperativa, por essa via, prestasse serviços a respeito das cooperadoras clientes da Recorrente, uma vez sendo esta última prestadora de serviços para as cooperadoras que fosse tendo em determinado momento; o que, efectivamente, sucedeu, sem que isso tenha consubstanciado uma relação de pluralidade de empregadores.

20. A Recorrida facturava às cooperadoras utentes/clientes dos seus serviços o produto do trabalho, designadamente, administrativo e financeiro, de avaliação imobiliária, de certificação energética, entre outros, prestado pelos trabalhadores da Recorrente, em sua representação, como o faz, a título de exemplo, uma empresa de contabilidade, de forma legal, sem que os seus trabalhadores passem a ter uma relação de pluralidade de emprego com as empresas para quem tratam da respectiva contabilidade! (Cfr. Documento n.° 2, junto com a Resposta).

21. A Recorrente realizou trabalhos de avaliação imobiliária para a cooperadora e, posteriormente, apenas cliente CC Consultores de Avaliação, Lda., sempre em representação da Cooperativa, aqui Recorrida, e no âmbito da relação laboral mantida com esta, como o fez, igualmente, para outras cooperadoras da Recorrente, sem agora vir invocar que mantinha uma relação de pluralidade de empregadores também com essas cooperadoras...

22. Acresce que, a contratação de um trabalhador por vários empregadores só é permitida quando estes sejam "sociedades de participações recíprocas, de domínio ou de grupo", isto é, sociedades coligadas, assim consideradas, nos termos do artigo 481.° e seguintes, do Código das Sociedades Comerciais, com excepção das sociedades em relação de simples participação.

23. Sucede, contudo, que o regime societário contido nos arts. 481º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais ("Título VI - Sociedades Coligadas") não é aplicável às cooperativas, que se encontram efectivamente fora do escopo das aludidas normas.

24. Neste sentido, não é possível à Recorrida, sendo uma Cooperativa, encontrar-se em qualquer tipo de relação de domínio ou de grupo com as cooperadoras que tenha, em determinado momento, não existindo qualquer relação societária directa ou indirecta entre a Recorrente e as mesmas, além de que:

(i) A Recorrida não tem, nem nunca teve qualquer domínio directo sobre a CC Consultores de Avaliação, Lda.;

(ii) A CC Consultores de Avaliação, Lda. não é nem nunca foi dependente da Recorrida;

(iii) A Recorrida não participa nem nunca participou no capital social da CC Consultores de Avaliação, Lda., não sendo nem nunca tendo sido sócia da mesma (Cfr. novamente Documentos n.° 8, 9, 10, 11 e 12, juntos pela Recorrente com a Contestação);

(iv) Nenhuma pessoa, por conta da Recorrida, detinha ou detém acções no capital social da CC Consultores de Avaliação, Lda. (Cfr. novamente Documentos n.° 8, 9, 10, 11 e 12, juntos pela Recorrente com a Contestação);

(v) As cooperadoras utentes de serviços da Recorrente não dominam a Cooperativa, nem poderiam, tendo em atenção até o princípio cooperativo de 1 voto, por cooperador, independentemente das respectivas participações no capital social da Cooperativa.

25. A Recorrente tão-pouco logrou fazer prova das alegadas relações societárias. Pelo contrário, da prova documental que junta apenas se conclui que inexistem tais ligações entre empresas (Cfr. Documentos n.° 8, 9, 10, 11 e 12, juntos pela Recorrente com a Contestação - Relatórios Empresariais da CC Consultores de Avaliação, Lda., com indicação da ligações empresariais maioritárias e minoritárias da referida empresa),

26. Por outro lado, e por via da inaplicabilidade do título VI do Código das Sociedades Comerciais às cooperativas, tão-pouco poderia ter aplicação, no caso sub judice, a responsabilidade solidária prevista no art. 334.°, do Código do Trabalho.

Este entendimento é acompanhado de perto pela doutrina (Cfr. ENGRACIA ANTUNES, José A., "Os Grupos de Sociedades - Estrutura e Organização Jurídica da Empresa Pluríssocietária, Almedina", pp. 222 e ss. e ALEGRE DONÂRIO, Arlindo, "Natureza dos Excedentes e Reservas nas Cooperativas: Seu Retorno e Distribuição", 2ª Edição aumentada e actualizada, 2013, Centro de Análise Económica de Regulação Social da Universidade Autónoma de Lisboa).

27. Assim, tendo em conta que a Recorrida, entidade empregadora da Recorrente é uma Cooperativa, inexistindo, por conseguinte, entre si e as suas cooperadoras, utentes de serviços ou não, bem como com a CC Consultores de Avaliação, Lda., qualquer relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, conclui-se que não se lhe pode ser aplicado o regime da responsabilidade solidária, a qualquer título.

28. Ao exposto supra, acrescem, ainda, os requisitos de carácter formal, previstos para a aplicabilidade do regime da pluralidade de empregadores, cuja observância cumulativa no respectivo contrato tem de ser obrigatoriamente respeitada e que, no presente caso, também não se encontram verificados. Com efeito:
(i) Dos contratos de trabalho juntos, não decorre nenhuma cláusula em que se tenha estabelecido ou querido estabelecer qualquer regime de pluralidade de empregadores.
(ii)  Nunca existiu qualquer contrato com ou em regime de pluralidade de empregadores (Cfr. Documentos n.° 1 e 2, juntos com a Motivação de Despedimento), designadamente da Cláusula 6% do contrato de trabalho celebrado entre a Recorrida e a Recorrente, em 1 de Fevereiro de 2003, onde são indicadas as cooperadoras que, à data, eram utentes dos serviços da Recorrida, enquanto Cooperativa, o que é bem diferente de se estabelecer ab initio uma relação de pluriemprego com qualquer uma das empresas aí referidas.

29. A Recorrente apenas foi trabalhadora da Recorrida e só prestou funções a favor desta empresa:
(i) Era a Recorrida quem pagava, e sempre pagou, a retribuição da Recorrente, conforme resulta dos recibos de vencimento juntos pela própria com a Contestação (Cfr. Documentos n.° 267, 268, 269, 273, 274, 275, 279, 280, 283, 284, 285, 286, 287, 288, 289, 290, 291, 292, para onde se remete, para todos os efeitos legais),
(ii) Era a Recorrida quem pagava as contribuições para a Segurança Social e procedia às retenções na fonte em sede de IRS (Cfr. Documentos n.° 3 e 4, juntos com a Resposta),
(iii) Era a Recorrida quem tinha o poder de direcção e autoridade sobre a Recorrente (Documentos n.° 32, 33,185 e 186, juntos com a Contestação da Recorrente),
(iv) Era a Recorrida quem exercia o poder disciplinar (Cfr. Documento n.° 5, junto com a Resposta e Documentos n,°s 185 e 186, juntos com a Contestação da Recorrente) e que exercia os demais poderes do empregador;
(v) Era à Recorrida a quem a Recorrente comunicava as suas faltas (Cfr. Documento n.° 159, da Contestação).
(vi) Era a Recorrida quem autorizava as férias da Recorrente, como é bom de ver pela documentação junta pela Recorrente com a Contestação - Documentos n.° 24, 102 a 109), que falam por si.
(vii) Todas as partes incluídas nos correios electrónicos, telefaxes, cartas, folhas de ponto e listas telefónicas juntas pela Recorrente aos autos pertenciam e sempre pertenceram ao quadro de pessoal da Recorrida, ao tempo relevante e que se discute, e não da CC Consultores de Avaliação, Lda. (Cfr. Documento n.° 6, junto com a Resposta). (viii) Era à Recorrida que a Recorrente enviava os registos do seu tempo de trabalho, bem como as suas folhas de ponto (Cfr. Documentos n.° 110 a 122, juntos com a Contestação).

30. Por último, para aplicação do regime da pluralidade de empregadores era, ainda, necessário que tivesse existido uma partilha dos meios (instalações, equipamentos, recursos humanos ou materiais) utilizados na prossecução da respectiva actividade, o que tão-pouco se verificou.

31. À luz de tudo o exposto, e salvo melhor opinião, entende a Recorrida que bem andou o Tribunal a quo quando revogou o despacho proferido pelo Tribunal de 1ª instância e, ao julgar procedente a excepção de erro na forma de processo, absolveu a Recorrida e a Chamada da instância.

32. E que, atentas as diferenças estruturais e substanciais entre as duas formas de processo, outra não poderia ser a conclusão que não a de que os actos anteriores não eram passíveis de aproveitamento no âmbito da convolação do processo, sem que, com isso, se violassem os princípios da igualdade e do contraditório, da aquisição processual de factos e, ainda, da estabilidade da instância, certeza e segurança jurídicas.

33. Mais se diga que a doutrina e extensa jurisprudência citadas pela Recorrida reforçam essa mesma interpretação seguida pelo Tribunal a quo, uma vez que são unânimes nesta orientação - Neste sentido, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 14.10.2014; Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Évora em 16.04.2015; Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 24.03.2011, em 29.01.2014, em 26.03.2014 e em 26.03.2015; Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação do Porto em 17.10.2011, em 29.10.2012, em 20.06.2013 e, mais recentemente em 21.02.2018.

34.       Entendimento contrário levaria a que se tivesse encontrado um mecanismo processual destinado a limitar a posição da Recorrida, condicionando-a na fase dos articulados a um processo que é rígido e específico (acção especial), mantendo-se essa limitação já na fase de discussão e julgamento, não obstante o mesmo já ter sido convolado em comum, ao sujeitá-la às regras do ónus da prova da forma do processo inicial.

35.       Aqui chegados, conclui-se que não merece censura o Acórdão do Ilustre Tribunal a quo ao decidir no sentido em que decidiu, devendo, por isso, o seu douto acórdão manter-se nos seus precisos termos, como é de elementar Justiça.

Pede assim a confirmação do julgado.

A Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer nos termos do artigo 87º, nº 3 do CPT no sentido da concessão da revista, argumentando basicamente que a convolação do processo para a forma comum não põe em causa os direitos processuais da empregadora.

A recorrida respondeu mantendo a posição sustentada na sua contra-‑alegação. 

        

Cumpre decidir.

2---

         Como se colhe do ponto anterior, e em resposta ao articulado motivador do despedimento apresentado pela empregadora, veio a trabalhadora pedir:

em via reconvencional, a declaração da ilicitude do despedimento;

e a consequente condenação da Ré, a pagar-lhe, solidariamente com a chamada  CC de Avaliação Lda., as quantias respeitantes à ilicitude do despedimento de que foi vítima, bem como as outras remunerações pedidas.  

Colocou-se assim ao tribunal recorrido a seguinte questão:

Admitirá a acção especial de impugnação de despedimento individual o incidente de intervenção de terceiros?

Efectivamente, e conforme impõe o artigo 387º, nº 1, do Código do Trabalho, na versão que lhe foi conferida pela Lei nº 9/2009 de 12/2, a questão da regularidade e licitude do despedimento só pode ser apreciada em tribunal.

Por outro lado, diz-nos o nº 2 que o trabalhador se pode opor ao despedimento mediante a apresentação dum mero formulário, a apresentar no prazo de 60 dias contados da sua comunicação ou da data da cessação do contrato se esta ocorrer posteriormente àquela comunicação.

Optou assim o legislador por introduzir um processo especial para o trabalhador impugnar o despedimento individual de que tenha sido vítima, que veio a ser regulado no Código de Processo do Trabalho na versão que lhe foi conferida pelo DL nº 295/2009 de 13/10, em vigor desde 1 de Janeiro de 2010.

No preâmbulo deste diploma, justifica-se desta forma a consagração deste processo especial:

“Para tornar exequíveis as modificações introduzidas nas relações laborais com o regime substantivo introduzido pelo CT, prosseguindo a reforma do direito laboral substantivo no sentido proposto pelo Livro Branco sobre as Relações Laborais e consubstanciado no acordo de concertação social entre o Governo e os parceiros sociais para a reforma das relações laborais, de 25 de Junho de 2008, cria-se agora no direito adjectivo uma acção declarativa de condenação com processo especial, de natureza urgente, que admite sempre recurso para a Relação, para impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, sempre que seja comunicada por escrito ao trabalhador a decisão de despedimento individual.”   

O seu formalismo e respectiva tramitação estão regulados nos artigos 98º-B e seguintes do CPT, estando profundamente marcados pelos valores da simplificação e da celeridade processual e que estão bem patentes na substituição da petição inicial por um simples formulário onde o trabalhador exprima a sua oposição ao despedimento, e na circunstância das partes apenas terem que constituir advogado quando tiverem que apresentar os respectivos articulados.

Foi nesta acção especial que o tribunal da 1ª instância se viu confrontado com o requerimento de intervenção duma entidade que não subscreveu a decisão de despedimento, invocando a trabalhadora que se está perante uma situação de pluralidade de empregadores, que determina a responsabilidade solidária de todos eles pelas consequências do despedimento e demais direitos reclamados. 

E tomando posição expressa sobre este ponto, concluiu que:

"Assim e a nosso ver, não se mostra processualmente possível a dedução de pedidos, na acção especial de impugnação do despedimento, contra terceiros que não constem da decisão de despedimento invocada”, argumentando para tanto que os princípios de celeridade e simplificação, que tão fortemente marcam esta acção, permitem deduzir que o legislador apenas teve em vista, como únicas partes possíveis, de um lado o trabalhador despedido e, do outro, a entidade empregadora que tenha, por escrito, comunicado a decisão de despedimento.

Importa assim apreciar se houve base legal para o acórdão recorrido revogar o despacho da primeira instância que havia determinado que o processo passasse a seguir os termos do processo comum, desde a dedução da reconvenção e do pedido de intervenção do terceiro, para deste modo admitir, ao abrigo do artigo 316°, n°s. 2 e 3, ali. a), do CPC, o chamamento da sociedade CC de Avaliação Lda, cuja repristinação é pretendida pela recorrente.

Para além desta questão, refere ainda a recorrente na sua conclusão 11ª que sempre a acção deverá prosseguir como especial, pois a Relação no seu dispositivo acabou por julgar procedente a excepção do erro na forma do processo absolvendo a apelante (ora recorrida) da instância.

Vejamos então se a recorrente tem razão.

2.1---

Conforme consagra o artigo 547º do CPC, é lícito ao juiz adoptar a tramitação processual adequada às especificidades da causa, e adaptar o conteúdo e a forma dos actos processais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo.

        

Este princípio da adequação formal consagrado no sobredito preceito corresponde ao que constava do artigo 265º-A da lei anterior, tendo sido introduzido pela reforma de 95/96, e sendo justificado deste modo no preâmbulo do DL nº 329-A/95 de 12 de Dezembro:        

        

“Procura-se por um lado obviar a que regras rígidas de natureza estritamente instrumental possam impedir a efectivação dos direitos em juízo e a plena discussão acerca da matéria relevante para propiciar a justa composição do litígio.

        Por isso, estabelece-se como princípio geral do processo o princípio da adequação, facultando-se ao juiz a possibilidade de adaptar o processado às especificidades da causa, sempre que a tramitação processual prevista na lei não se adeqúe perfeitamente às exigências da acção proposta.

        E como concretização desta ideia-chave do processo civil instituído na reforma de 95/96, prevê-se a possibilidade de cumulação de causas, mesmo que aos pedidos correspondam formas de processo diversas, quando a apreciação conjunta das pretensões se revele indispensável à justa composição do litígio.”

         Nesta linha, sustenta Pereira Rodrigues, “Noções Fundamentais de Processo Civil”, Almedina (2015), pgª 358, que de acordo com esta justificação tem de concluir-se que a filosofia que preside à introdução deste princípio processual é a de que o processo é um meio que deve ser o mais adequado possível para se obter uma justa composição do litígio.      

         E continuando a seguir o mesmo autor, o dever de adequação tem por fundamento a necessidade de adoptar a tramitação processual que melhor se ajusta à causa, com as especificidades que esta apresenta, visando garantir a efectividade das soluções legais que incentivam a economia processual e sobretudo a resolução global do litígio.

         Assim, o princípio da adequação formal integra um poder-dever do juiz a usar quando o modelo processual legal se mostre de todo inadequado à situação e por isso, colida com o objectivo de atingir um processo equitativo e que resolva definitivamente a situação.

Foi perante a impossibilidade do processo especial de impugnação judicial do despedimento da trabalhadora admitir a intervenção da chamada CC, que a 1ª instância convolou o processo para a forma comum escudando-se no princípio da adequação formal.

A apelante empregadora invocou perante a Relação a impossibilidade desta convolação, argumentando para tanto o erro na forma de processo, tese a que aderiu a decisão impugnada.

Não estamos porém, perante uma situação de erro na forma de processo, pois o processo seguiu desde o início a forma que o Código de Processo do Trabalho prevê para a impugnação da regularidade e licitude do despedimento da trabalhadora.

E só foi perante a impossibilidade legal desta acção especial admitir a intervenção dum terceiro que não consta da decisão de despedimento da trabalhadora que a 1ª instância convolou o processo para a forma comum, desde a dedução da reconvenção pela trabalhadora e do pedido de intervenção do terceiro, fazendo-o como forma de compatibilizar esta limitação processual com os interesses de economia processual, da necessidade duma apreciação conjunta das pretensões e da realização da justiça no caso concreto.

Por isso, e como já dito, a questão não é de erro na forma de processo, mas consiste em apreciar se foi legal esta convolação do processo especial para a forma comum, para assim ser possível admitir a intervenção da chamada CC de Avaliação Lda.

Ou seja, o que temos de apreciar é se ao operar esta convolação o Senhor juiz da 1ª instância cumpriu os pressupostos do artigo 547º do CPC, preceito em que se fundamentou o despacho que se pretende repristinar.

Conforme sustenta Madeira de Brito, “O novo princípio da adequação formal”, in “Aspectos do Novo Processo Civil”- Lex, pgª 67, nos casos a que corresponda uma forma de processo especial os poderes de adequação do juiz encontram-se naturalmente limitados, pois se o legislador, em atenção ao fim do processo, estabeleceu determinada regulamentação específica, não deve o juiz sobrepor-se à forma prevista na lei.

No entanto, continua o mesmo autor (pª 68), esta posição não deve ser entendida de modo radical, pois pode acontecer que exista a necessidade de adequar o processo especial quando se apure que, apesar de ser aplicável determinada forma de processo, ela não se ajusta à situação, estando-se perante uma lacuna que justifica a intervenção do juiz.

Ora, a trabalhadora invoca que o caso em apreço integra uma situação de pluralidade de empregadores, susceptível de gerar uma responsabilidade solidária da empregadora demandada e da chamada CC.

O despacho que se pretende repristinar não tomou posição sobre esta questão, pois limitou-se a convolar o processo e a admitir a sua intervenção.

Por isso, a questão da inexistência dos pressupostos duma relação de trabalho plural, e que a recorrida suscita na sua contra-alegação, não tem que ser agora apreciada, pois não foi objecto de pronúncia da decisão recorrida.

Posto isto, vejamos então se as razões constantes do despacho da 1ª instância procedem.

2.2----

Para tanto, este invocou as seguintes razões:

“De todo o modo, não podemos olvidar que esta posição implica, para a responsabilização do terceiro visado, a instauração de uma nova acção, com uma duplicação de processos, de custos, de diligências e, sobretudo, de decisões que podem vir a ser tendencialmente contraditórias.

Por outro lado e como sucede no caso dos autos, os factos alegados para a demanda do terceiro, contendem, não só com a responsabilização dele para além da Ré inicialmente demandada, mas também com a definição da antiguidade do trabalhador, o seu passado laboral, as suas funções e retribuição efectiva (alegadamente paga por terceiros), tendo pois reflexos até no montante em que poderá vir a ser calculada uma indemnização pelo despedimento, caso este se venha a reputar ilícito (...)“

Tendo sido estas razões que determinaram a convolação do processo especial para a forma comum, para que fosse possível desta forma admitir a intervenção da chamada, temos de concordar com esta posição e com a fundamentação adrede apresentada.

        

Na verdade, para além de poder estar em causa uma responsabilidade solidária de ambos os demandados (a empregadora inicial e a chamada), os factos invocados pela trabalhadora podem determinar uma antiguidade diferente da que foi considerada pela empregadora, podendo desta forma estar em causa o próprio montante da indemnização de antiguidade que foi colocada à disposição da trabalhadora, e por arrastamento, a própria regularidade do despedimento, conforme prevê a alínea d) do artigo 384º do Código do Trabalho.

Além disso, estando em causa um despedimento por extinção do posto de trabalho, a provar-se a tese da pluralidade de empregadores, os motivos invocados poderão ter que ser analisados tendo também em consideração a realidade das duas empresas, situação que só por si justifica plenamente a convolação efectuada, pois só desta forma se obterá uma justa apreciação e composição do litígio.

Devendo prevalecer esta apreciação global do diferendo existente entre as partes, justifica-se perfeitamente a decisão de adequação que foi operada pela 1ª instância, pois a necessidade de realização da justiça material enquanto missão do Estado, deve prevalecer sobre a garantia conferida às partes pela forma de processo, sendo esta meramente instrumental face ao fim que visa – a Justiça do caso concreto.

E continuando a seguir Madeira de Brito, obra citada, pª 36, “[O] novo princípio da adequação formal vem romper com este regime apertado do princípio da legalidade das formas processuais. Através dele, visa-se remover um obstáculo ao acesso à justiça em obediência à natureza instrumental da forma de processo: se a tramitação prevista na lei não se adequa ao fim do processo, então conferem-se os correspondentes poderes ao juiz para adaptar a sequência processual às especificidades da causa…”  

Sendo esta a situação presente, temos de considerar que bem andou o Senhor Juiz da 1ª instância ao convolar a acção especial de impugnação do despedimento da trabalhadora para o processo comum, pois só desta forma seria possível admitir a intervenção da chamada.

E só com a presença desta, e caso a tese da pluralidade de empregadores se venha a demonstrar, se poderá definir a antiguidade da trabalhadora, bem como o seu passado laboral, funções e retribuição efectiva (alegadamente paga por terceiros), questões de grande relevância para o cálculo do montante da indemnização de antiguidade, caso o despedimento se venha a considerar ilícito.

Por isso, e como o figurino legal da acção especial de impugnação do despedimento não admite a intervenção de terceiros que não tenham assinado a respectiva decisão, só convolando o processo e com a presença da chamada, como se fez, se pode obter uma apreciação global da causa e uma justa composição do litígio.

Por outro lado, mesmo tratando-se duma acção especial justificava-se a convolação, em virtude da mesma não se ajustar à situação.

Alega a recorrida que a convolação operada contende com os princípios de igualdade ou do contraditório, com a aquisição processual ou com a admissibilidade de meios probatórios.

Mas não tem razão, pois se na pendência da acção especial esta esteve limitada pela sua tramitação específica e urgente, bem como pelos respectivos prazos de propositura e ónus de alegação, da mesma forma a trabalhadora o esteve.

        

E quanto à invocada impossibilidade de reconvir, esta advém da especial configuração da acção especial e não da convolação operada.

        

Improcede assim esta argumentação da recorrida.

         E procedendo a primeira questão suscitada pela recorrente, temos de revogar o acórdão recorrido e repristinar a decisão da 1ª instância, ficando prejudicado o conhecimento da segunda questão por aquela suscitada.

3---

Termos em que se acorda nesta Secção Social em conceder a revista, repristinando-se o despacho da 1ª instância que determinou que o processo passasse a seguir os termos do processo comum e que admitiu o chamamento da sociedade CC de Avaliação Lda.

         Custas a cargo da recorrida.

         Lisboa, 26 de Setembro de 2018

     

Gonçalves Rocha (Relator)      

Leones Dantas

Júlio Vieira Gomes