Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
07S4107
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: BRAVO SERRA
Descritores: PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
MATÉRIA DE FACTO
RESOLUÇÃO PELO TRABALHADOR
JUSTA CAUSA
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
Nº do Documento: SJ200803050041074
Data do Acordão: 03/05/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : I - Não é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o resultado da decisão tomada pela Relação quanto à matéria de facto que foi objecto de impugnação, se os recorrentes não aduzem que o Tribunal de 2.ª instância não cumpriu ou errou na interpretação e aplicação dos normativos ínsitos no artigo 712º do Código de Processo Civil.
II - O princípio de que na dúvida sobre a realidade dum facto e sobre a repartição do ónus da prova se resolve contra a parte a quem o facto aproveita (artigo 516º do Código de Processo Civil) pressupõe que não tenha havido uma concludência probatória quanto à factualidade aduzida pela parte a quem o facto aproveita.
III - Configura justa causa de resolução do contrato de trabalho, efectuada pelo trabalhador em 29 de Abril de 2004, a falta de pagamento das remunerações correspondentes ao mês de Fevereiro e 29 dias de Março de 2004 e ainda o facto de o empregador, desde Abril de 2002 até Abril de 2004, e em relação ao mesmo trabalhador, efectuar descontos para a Segurança Social incidindo apenas sobre a quantia de € 468,50 mensais, quando aquele auferia a remuneração de € 840,00 líquidos mensais.
IV - A litigância de má fé é uma questão de natureza processual, pelo que a espécie de recurso que visa impugnar a decisão sobre tal matéria é o agravo.
V - Porém, sempre que o recurso de revista seja o próprio, a lei admite que o recorrente invoque, além da violação de lei substantiva, a violação de lei do processo, quando perante esta for admissível o recurso, nos termos do n.º 2, do art. 754.º, do CPC, de modo a interpor do mesmo acórdão um único recurso.
VI - Não estando em causa a situação prevista nos n.ºs 2 e 3 do artigo 754º do Código de Processo Civil e tendo havido pronúncia da Relação sobre o segmento decisório da sentença da 1.ª instância que condenou os recorrentes como litigantes de má fé, não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I


1. Pelo Tribunal do Trabalho de Barcelos instaurou AA contra BB e mulher, CC acção de processo comum, solicitando a condenação dos réus a pagaram-lhe € 18.900, a título de indemnização por antiguidade, € 2.492, a título de salários referentes aos meses de Fevereiro, Março e 29 dias de Abril de 2004, € 833, a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, correspondentes a 119 dias de trabalho prestados no ano de 2004, e € 1.680, a título de férias e respectivo subsídio, vencidos em 1 de Janeiro de 2004.

Em síntese, alegou: –
– que ele, autor, por carta registada de 28 de Abril de 2004, resolveu o contrato de trabalho que, desde o início de Julho de 1989, mantinha com os réus, invocando justa causa;
– que tal invocação, por um lado, se baseou na circunstância de, processando os réus descontos para a Segurança Social em montantes bastantes inferiores aos efectivamente pagos, e porque o autor a isso não acedeu, viu-se compelido a receber apenas € 840 líquidos mensais, para assim fazer face à diferença na subida dos descontos;
– que, por outro lado, o autor foi obrigado a trabalhar todos os Sábados durante cerca de dezasseis anos, sem que alguma vez lhe tenha sido pago trabalho suplementar.

Contestaram os réus, os quais, em súmula, impugnaram o aduzido na petição e invocaram a excepção de compensação parcial de créditos, já que, inexistindo motivos para justa causa de resolução do contrato por parte do autor, a cessação do contrato de trabalho se haveria de ter como uma rescisão sem aviso prévio, pelo qual eles, réus, tinham direito a ser indemnizados pela quantia de € 937, quantia esta que deveria ser considerada como “contracrédito parcialmente extintivo do pedido” do autor.

O autor veio a ampliar o pedido por forma a serem ao réus condenados a pagarem-lhe € 1.889,43 referentes a pagamento de dias de descanso compensatório, que não gozou.

Por sentença proferida em 16 de Dezembro de 2005, foi a acção julgada parcialmente procedente, declarando-se “lícita e com justa causa a rescisão do contrato operada pelo autor”, condenando-se os réus a pagarem àquele € 17.592,23, acrescidos de juros, além de serem os mesmos réus condenados, como litigantes de má fé, na multa de dez unidades de conta e em € 1.000 de indemnização ao autor.

Do assim decidido apelaram os réus para o Tribunal da Relação do Porto, impugnando no recurso a matéria de facto.

Aquele Tribunal de 2ª instância, por acórdão de 9 de Maio de 2007, julgou improcedente a apelação e, no tocante à impugnação da matéria de facto, discreteou assim o mencionado aresto: –
“(…)
Sustentam os recorrentes a este propósito que a matéria de facto constante da alínea D) dos factos provados (‘o autor auferia ultimamente o salário de € 840 líquidos mensais’) não foi corroborada por nenhum dos depoimentos das testemunhas ouvidas na audiência de julgamento, pelo que tal matéria deve ser considerada não provada e eliminada da matéria de facto assente.
Vejamos.
Tendo ocorrido a gravação dos depoimentos prestados e verificando-se os demais requisitos formais exigidos pelos arts 690º-A e 522º-C do CPC para a respectiva apreciação, vejamos se a pretensão dos recorrentes é de sufragar no plano substancial.
Impõe-se realçar a este respeito – mais uma vez – que a reapreciação da decisão da matéria de facto em sede de 2ª instância não permite postergar o princípio fundamental da livre apreciação de provas por parte do tribunal da 1ª instância (cf. art. 655º/1 do CPC), salvo se este tribunal tiver cometido erros clamorosos na apreciação do valor probatório dos concretos meios de prova.
De tal sorte que a alteração da matéria de facto pela Relação deve ser feita com todo o cuidado e ponderação e somente em casos excepcionais e pontuais.
Efectivamente, existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas são percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores.
Por isso, com respeito e prevalência dos princípios da imediação, oralidade e contraditório, se vem uniformemente entendendo que a alteração da matéria de facto por este Tribunal só ocorrerá se, dos meios de prova indicados pelo recorrente – quando inseridos e valorizados no amplexo global da prova produzida – se verificar que tais elementos probatórios, em concreto, se revelam inequívocos no sentido pretendido. Ora, no caso em apreço pretendem os recorrentes a eliminação do vertido na alínea D) dos factos provados, quanto ao salário que o A. ultimamente auferia, alegando que o depoimento da testemunha DD, em que o Mº Juiz a quo firmou a sua convicção, para além de contraditório e incoerente é destituído de credibilidade por se tratar da mulher do autor e assim ter interesse na causa; por outro lado, no tocante aos documentos relativos a depósitos bancários também não se provou que os mesmos fossem referentes ao salário mensal do A.
Só que da apreciação simultânea, mas conjunta, do conteúdo dos depoimentos adrede prestados e ora invocados após a respectiva audição, em cotejo com o teor dos documentos relativos aos depósitos bancários de fls 14 a 30 –, concluímos que as considerações exaradas na respectiva motivação estão sustentadas numa análise que se nos afigura criteriosa e ponderada das provas e da especificação dos fundamentos decisivos para a convicção do julgador.
Destarte, em função da relevância do princípio da imediação e oralidade e não vislumbrando erro clamoroso susceptível de postergar a convicção firmada em sede de 1[ª] instância, convergimos com a fundamentação exarada sobre a matéria de facto controvertida, de que a testemunha DD, pela qualidade invocada – e não obstante ela – demonstrou ter conhecimento do último vencimento auferido pelo A., seu marido, em conformidade com o teor dos documentos de fls 14 a 30, de tal depoimento adjuvante.
Aliás, apesar da presença aos pertinentes actos processuais do ilustre mandatário da ré, nem aquela matéria de facto assim seleccionada e provada, nem a leitura do despacho que a decidiu foram objecto de qualquer reclamação ou censura.
E sendo assim, comungamos da opinião que a pretensão dos recorrentes tem, neste enfoque, de improceder.
Todavia, porque se verificam os respectivos pressupostos, uma vez que do processo constam todos os elementos de prova pertinentes – de harmonia com o disposto no art. 712º/1-a) do CPCivil, é mister dar como provado mais o seguinte facto:
Desde Abril.2002 até Abril 2004, em relação ao A., os descontos efectuados pela R. para a Segurança Social incidiam sobre a quantia de € 468.50
(…)”

2. Do falado acórdão pediram os réus revista, rematando a alegação adrede produzida com as seguintes «conclusões»: –

1. Vem o presente recurso interposto do acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto que julgou improcedente a apelação dos RR-Recorrentes, confirmando a sentença recorrida, proferida em 1ª Instância, na medida em que não efectua uma correcta interpretação e aplicação dos preceitos legais.
2. Entende-se no acórdão recorrido que, pese embora tenha havido gravação dos depoimentos prestados em sede de julgamento em 1ª Instância, tal não permite postergar o princípio fundamental da livre apreciação da prova por parte daquele tribunal previsto no art.º 655º/1, do CPC, porque existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados e valorados por quem os presencia, não ficando ‘gravados ou registados’ para aproveitamento de outro tribunal.
3. Este princípio não poderá justificar o desrespeito pela Lei substantiva.
4. É estabelecida legalmente, como condição de reapreciação da matéria de facto, a gravação da prova, sendo que os tribunais apenas dispõem de sistemas de gravação áudio.
5. Com base na doutrina estabelecida no acórdão recorrido, fica na prática vedada aos recorrentes qualquer possibilidade de ver reapreciados os depoimentos em que assentou a decisão de facto da 1ª Instância, sendo afinal o registo da prova absolutamente desnecessário e o recurso em matéria de facto simplesmente inócuo, assim se violando o direito do RR-Recorrentes de ver reapreciada a matéria de facto assente e, consequentemente, a decisão proferida em 1ª Instância.
6. No caso dos autos o ónus da prova recai sobre o trabalhador, na medida em que está em apreciação a sua rescisão do contrato de trabalho com justa causa, com base em alegados comportamentos ilícitos do seu empregador (art.º 342º/1 do Código Civil).
7. Essa prova tem de se alicerçar em factos e nunca em ‘conjecturas’ que não se podem provar.
8. Não existe suporte fáctico para a versão trazida aos autos pelo A-Recorrido.
9. Na fundamentação da matéria de facto dada como provada em 1ª Instância, o Meritíssimo Juiz refere que ‘quanto às razões que efectivamente levaram o autor a rescindir o contrato de trabalho (entre as quais se contam a diminuição de salário), as versões são nebulosas de ambas as partes, pelo que a convicção que formei baseia-se simplesmente em conjecturas insusceptíveis de serem dadas como provadas, por ausência de suporte fáctico’ (sublinhado nosso).
10. As razões alegadas pelo A-Recorrido para rescindir o contrato foram a falta de pagamento pontual da retribuição, por diminuição do salário devido, a efectivação de descontos para a Segurança Social por valor abaixo do valor real do salário e alegado trabalho suplementar prestado sem ser pago e sem ser dado descanso compensatório.
11. Se estas razões estão alicerçadas numa versão ‘nebulosa’, em meras ‘conjecturas insusceptíveis de serem dadas como provadas’, não é possível julgar-se procedente a acção intentada pelo A-Recorrido.
12. Dispõe ainda o art.º 516º do CPC que ‘a dúvida sobre a realidade de um/acto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o/acto aproveita.’.
13. Não havendo suporte fáctico para as versões apresentadas pelas partes e atentas as regras supra descritas de repartição do ónus da prova, outra alternativa não existe senão decidir contra a parte a quem os factos aproveitavam, nos termos da Lei, ou seja, contra o A-Recorrido.
14. A violação das normas vindas de referir faz com que, consequentemente, e ao contrário do vertido no acórdão recorrido, estejam a ser violados também os art.º 441º, 442º e 443º do Código do Trabalho e art.º 308º da Lei n.º 35/2004.
15. O A-Recorrido não provou a sua tese, deixando por isso de ser lícita a sua rescisão, por caírem completamente as razões por si invocadas.
16. Improcede a alegada diminuição de salário, passando a disponibilização de salários efectuada pelos RR-Recorrentes e comunicada ao A-Recorrido a ter a virtualidade de fazer cessar a mora daqueles.
17. Improcede a alegação de que os descontos para a Segurança Social eram feitos por valor inferior ao salário real, ao contrário do defendido também no acórdão recorrido, que ampliou a matéria de facto provada.
18. E já havia improcedido a alegada prestação de trabalho suplementar.
19. A rescisão do contrato efectuada pelo A-Recorrido é manifestamente ilícita, o que implicará a total absolvição dos RR-Recorrentes, ficando antes o A-Recorrido obrigado a indemnizá-los nos termos da rescisão de contrato sem aviso prévio, conforme peticionado nos autos.
20. O cálculo dos direitos que o trabalhador ainda terá de receber, relativos a remunerações que se recusou a receber, férias e subsídio de férias (vencidas e proporcionais) e subsídio de Natal, tenha de ser feito pelo valor real e não pelos 840 € dados como ‘provados’.
21. Sustenta o acórdão recorrido que bem andou também o Meritíssimo Juiz de 1ª Instância ao condenar os RR-Recorrentes como litigantes de má fé, absolvendo o A-Recorrido dessa mesma condenação.
22. Alegadamente, não se provaram factos que permitam concluir que o A-Recorrido tenha litigado com má fé, sendo certo que tal condenação tem de alicerçar-se em factos dados como provados, não podendo resultar de suspeita ou comportamentos não inequívocos para o accionamento de tal condenação.
23. Esta decisão, nos termos em que foi proferida, para além de violar o disposto nos art.º 456º e 457º do CPC, viola manifestamente o princípio da igualdade das partes previsto no art.º 3º-A do CPC.
24. Em virtude do que resulta ‘provado’ na alínea D) dos factos provados fixados pelo Meritíssimo Juiz de 1ª Instância (bem como em virtude de ter sido dado ainda como provado no acórdão recorrido o valor dos descontos processados para a Segurança Social), entendeu aquele, bem como os Meritíssimos Desembargadores, condenar os RR-­Recorrentes como litigantes de má fé.
25. Mas, tendo sido também fixado na matéria de facto provada, alínea G), que o A-­Recorrido assinou a declaração de folhas 73, com o conteúdo ali inserto, então este deveria ter sido condenado como litigante de má fé, pois ostensivamente mentiu e tentou induzir em erro o tribunal quando invocou a existência de um crédito de trabalho suplementar que bem sabia, já antes de intentar a acção, não lhe ser devido.
26. Essa condenação, ao contrário do vertido no acórdão recorrido, não seria fundamentada em ‘suspeita’ ou ‘comportamentos não inequívocos’, mas sim em matéria de facto dada como provada e assente (ao contrário da condenação dos RR-Recorrentes que, essa sim, continua até hoje a assentar em ‘versões nebulosas’ ... ).
27. O acórdão recorrido, ao decidir como decidiu, violou o disposto nos art.º 342º/1 do Código Civil, art.º 441º, 442º e 443º do Código do Trabalho, art.º 308º da Lei n.º 35/2004 e art.º 456º, 457º e 516º do Código do Processo Civil.

Respondeu o autor à alegação dos réus propugnando pela improcedência do recurso.

A Ex.ma Representante do Ministério Público neste Supremo Tribunal exarou douto «parecer» no qual propugnou pela negação da revista.

Notificado tal «parecer» às partes, sobre ele não vieram elas efectuar qualquer pronúncia.

Cumpre decidir.
II

1. Vem dada, pelo acórdão impugnado, como assente a seguinte matéria fáctica: –

– a) o réu marido é um empresário em nome individual que se dedica ao acabamento e comercialização de móveis, explorando um estabelecimento comercial que gira sob o nome de ..., sito na Avenida D. Nuno Álvares Pereira, nº ..., ...., em Barcelos;
b) no exercício dessa actividade, o réu marido admitiu o autor ao seu serviço, por contrato de trabalho verbal, há cerca de 15 anos, para [este último], sob as suas ordens, direcção e fiscalização, prestar actividade consistente no acabamento de móveis e de motorista;
– c) o ré transferiu o seu estabelecimento para o Lugar de Esparrinha, Barcelos;
– d) o autor auferia, ultimamente, o salário de € 840 líquidos mensais;
– e) no dia 29 de Abril de 2004, o autor resolveu unilateralmente o seu contrato de trabalho, com invocação de justa causa, [tendo,] por carta, enviada em 28 de Abril de 2004 e recebida em 29 de Abril de 2004, comunicando ao réu a resolução do seu contrato de trabalho, com base nos seguintes comportamentos deste e invocando os seguintes fundamentos: –

– “falta de pagamento pontual da retribuição referente ao trabalho prestado nos meses de Fevereiro e Março de 2004, sendo tal falta de pagamento culposa, já que se não pagou foi porque não quis”;
– “Violação das garantias legais ou convencionais do autor, consubstanciando-se tal violação na pretensão de redução do seu salário líquido de € 840 mensais que vinha pagando desde o mês de Março de 2002 para € 416,96 líquidos no final do mês de Fevereiro e novamente no final do mês de Março de 2004, conforme decorre da carta que lhe enviou, datada de 5 de Abril de 2004 e ainda no processamento continuado dos descontos para a Segurança Social por valor muito abaixo do efectivamente pago”;
No facto de o obrigar a trabalhar todos os sábados ao longo dos cerca de dezasseis anos de ligação contratual, sem que alguma vez lhe tenha sido pago qualquer trabalho suplementar”;

– f) o autor não recebeu as remunerações correspondentes aos meses de Fevereiro, Março e 29 dias de Abril de 2004, nem os proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal relativos ao ano da cessação do contrato, nem as férias e subsídio de férias vencidos em 1 de Janeiro de 2004;
– g) o autor assinou o documento junto a fls. 73 com o conteúdo ali inserto;
– h) o réu marido utiliza os rendimentos provenientes da actividade referida em a) para fazer face às despesas do seu agregado familiar, integrando-os no pecúlio comum do casal;
– i) desde Abril de 2002 até Abril de 2004, em relação ao autor, os descontos efectuados pel[o] réu para a Segurança Social incidiam sobre a quantia de € 468,50.

2. Como resulta das transcritas «conclusões» formuladas no recurso de revista, os ora impugnantes censuram o aresto prolatado pelo Tribunal da Relação do Porto com base, na visão dos mesmos impugnantes, em ter o mencionado acórdão efectuado uma (i) incorrecta decisão sobre a matéria de facto, (ii) violação do ónus da prova e (iii) decidido incorrectamente ao manter a condenação dos recorrentes como litigantes de má fé e não ter condenado o autor também como litigante de má fé.

Poderá, ainda, em face das aludidas «conclusões», sustentar-se que igualmente os recorrentes põem em causa a licitude da rescisão do contrato por banda do recorrido (cfr. «conclusão» 19). Porém, como se extrai, quer do corpo da alegação, quer do contexto em que se insere a globalidade das «conclusões» apresentadas, a perspectiva de que foi ilícita a rescisão unilateral do contrato pelo autor baseia-se, afinal, num inconformismo perante a matéria de facto que foi alcançada, sendo que, nesse ponto de vista, se outro fosse o quadro fáctico tido por assente, então haveria que concluir-se pela ilicitude da rescisão.

De todo o modo, tratadas que sejam as duas primeiras questões acima elencadas, não se deixará de fazer referência à licitude, ou não licitude, da rescisão operada pelo autor.

No tocante à primeira das equacionadas questões, é de todo evidente que se não insere nos poderes cognitivos deste Supremo aquilatar de um pretenso erro de julgamento que teria, na perspectiva dos réus, sido levado a efeito pelo acórdão em crise.

Sublinhe-se, neste particular, que, conforme deflui da alegação produzida na revista, os mesmos não esgrimem com qualquer argumento segundo o qual, na apreciação do recurso incidente sobre a matéria de facto, a Relação postergou qualquer disposição expressa de lei impositora de certa prova para a existência de determinado ou determinados factos, ou que fixe a força de certo meio de prova, sendo que somente em tais situações seria cometido a este Supremo Tribunal pronunciar-se sobre o erro na apreciação das provas e dos factos materiais da causa (cfr. nº 2 do artº 722º do Código de Processo Civil).

De outra banda, também não vem invocado na dita alegação que o Tribunal de 2ª instância, ao decidir no ponto em causa, se recusou a efectivar a apreciação da matéria de facto que tinha sido dada por apurada pela 1ª instância.

Efectivamente, o que naquela alegação vem sustentado é que, ao referir o aresto recorrido que, muito embora tivesse havido gravação da prova produzida em audiência, isso não significava, só por si, a postergação do princípio da livre apreciação da prova consagrado no artº 655º, nº 1, do diploma adjectivo civil, já que existiam comportamentos e reacções dos depoentes que apenas poderiam ser percepcionados e valorados por quem os presenciou, isso significava que, com base em tal consideração, ficaria vedado aos recorrentes qualquer possibilidade de almejarem uma reapreciação da matéria de facto alcançada na 1ª instância.

Ora, como resulta da transcrição acima levada a efeito, o acórdão recorrido, ao apreciar a questão referente à impugnação da matéria fáctica, conquanto, ao jeito introdutório de considerações gerais, tivesse realçado aquela referência, não deixou de proceder à «apreciação simultânea, mas conjunta, do conteúdo dos depoimentos adrede prestados» e invocados pelos recorrentes no recurso de apelação, na parte respeitante à impugnação de tal matéria, cotejando-os com os documentos existentes nos autos e que, naquele recurso, também eram invocados pelos réus para tentar demonstrar o erro de julgamento fáctico que teria ocorrido na 1ª instância.

E, após aquelas apreciação e cotejo, concluiu não vislumbrar qualquer erro «susceptível de postergar a convicção firmada em sede de 1ª instância», vindo, ainda, com esteio na alínea a) do artº 712º do Código de Processo Civil, a aditar mais um facto (justamente o que consta do item i) de II 1. do vertente acórdão.

Vale isto por dizer que o acórdão recorrido veio, na verdade, a proceder a uma reapreciação dos pontos de facto questionados na revista.

Ora, nos termos do que se prescreve no nº 6 do citado artº 712º, o resultado da decisão tomada pela Relação quanto à matéria de facto que foi objecto de impugnação não é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, vincando-se, uma vez mais, que os recorrentes não aduzem que o Tribunal de 2ª instância não cumpriu ou errou na interpretação e aplicação dos normativos ínsitos naquele artigo.

Improcede, assim, o recurso nesta parte.

3. Ancoram-se os impugnantes na circunstância de que teria ocorrido, por banda do acórdão em sindicância, violação das regras sobre o ónus de prova, já que, sustentam, seria sobre o autor que impenderia demonstrar o quantum da sua remuneração, que houve falta de pagamento pontual da retribuição, que houve diminuição do seu salário, que foram feitos descontos para a Segurança Social abaixo do valor real do salário e que foi desempenhado trabalho suplementar sem ser pago e sem ser dado descanso compensatório.

Porém, a invocação deste fundamento, tal como se encontra precipitada na alegação por eles formulada no particular em análise, redunda, ao fim e ao resto, em que, se as razões aduzidas pelo autor para rescindir o contrato foram dadas como provadas, alicerçadas em «versões nebulosas» ou em «meras conjecturas insusceptíveis de serem dadas como provadas», então, à míngua de uma demonstração concreta dos factos consubstanciadores dessas razões ou, mais concretamente, em face das dúvidas sobre a existência desses factos, deveria soçobrar a pretensão do autor, atendendo ao que se consagra no artº 516º do Código de Processo Civil.

O mesmo é dizer que aquilo que os recorrentes vêm sustentar é que, perante a, do seu ponto de vista, não concludência das provas, haveriam as instâncias de lançar mão daquele preceito, porquanto, atenta a circunstância de as regras substantivas de repartição do prova fazerem impender sobre o autor a demonstração dos factos que conduziriam à licitude da rescisão do contrato, a dúvida sobre essa demonstração haveria de reverter contra o mesmo autor, em face daquela disposição legal.

Mas, sendo assim, como é, então torna-se evidente que, ao assim esgrimirem, os impugnantes partem de um postulado que é, justamente, o de não ter havido uma concludência probatória quanto à factualidade aduzida pelo autor para basear a sua pretensão.

Ora, não se lobriga no acórdão recorrido qualquer asserção de onde, directa ou indirectamente, explícita ou implicitamente, resulte que a matéria de facto tida por assente assentou em dados probatórios que fossem «nebulosos» ou que eles somente apontariam «em conjecturas indemonstráveis» e que, de todo o modo, não obstante essas características, haveriam de conduzir a que se dessem por provadas as razões fundantes da pretensão do autor.

Como se disse já, a argumentação dos recorrentes no que concerne à por eles invocada violação do ónus da prova, parte, verdadeiramente, de uma premissa sobre um erro de julgamento sobre a matéria de facto em que teria incorrido o aresto em causa.

Viu-se também que, no que diz respeito a esse alegado «vício», não cabe este Supremo curar, pois que não só se não postam situações inseríveis no nº 2 do artº 722º do Código de Processo Civil, como também, acrescenta-se agora, se não divisa o que quer que seja que impusesse o uso do estabelecido no nº 3 do artº 729º do mesmo corpo normativo.

Neste contexto, torna-se improcedente o recurso na parte em que vem aduzida a violação do mencionado artº 516º.

Sublinhe-se, de todo o modo, que, como faz notar a Ex.ma Magistrada do Ministério Público no «parecer» de que acima se deu notícia, quando o Juiz da 1ª instância, ao fundamentar a decisão de facto, se referiu em que a convicção que formou se baseou “simplesmente em conjecturas insusceptíveis de serem dadas como provadas, por ausência de suporte fáctico”, reportava-se às razões que, efectivamente, “levaram o Autor a rescindir o contrato de trabalho” (ou seja, se foram tão-somente os fundamentos invocados na acção para a rescisão – não pagamento de descontos para a Segurança Social, que ocasionou, após ter sido chamada a atenção dos recorrentes, a diminuição dos seus salários, e o não pagamento do trabalho suplementar – ou se, para além dessas, porventura outras estariam subjacentes ao desiderato de rescisão) e não ao que mais veio a ser dado como provado.

4. Já se expôs acima que, quando os impugnantes brandem com a circunstância de a rescisão do contrato efectuada pelo autor ser «manifestamente ilícita», fazem-no, não com base em que, perante a factualidade tida por assente pelo acórdão recorrido, não se deveria concluir, em face da lei, que a rescisão era permitida, mas sim com fundamento em que a essa mesma factualidade se não apurou.

Mas, seja como seja, e na esteira das considerações que, então, se fizeram, sempre se aditará que, como deflui da matéria de facto que este Supremo tem de acatar, são de aceitar os fundamentos que conduziram o acórdão recorrido a concluir pela licitude da resolução do contrato de trabalho pelo autor.

Nesse aresto foi escrito, em dados passos: –

“(…)
2. Da (i)licitude da Resolução do Contrato de Trabalho
Em causa está, neste particular, a licitude/ilicitude da resolução do contrato de trabalho com invocação de justa causa pelo trabalhador.
Estabelece a propósito o art. 441º/1 do Código do Trabalho (diploma a que pertencerão os demais preceitos indicados sem menção de origem) que ocorrendo justa causa, pode o trabalhador fazer cessar imediatamente o contrato, sendo certo que a declaração de resolução deve ser feita por escrito com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento desses factos (art.442º/1), únicos atendíveis (art. 444º/3)
Trata-se pois de um acto jurídico unilateral formal e receptício fazendo cessar o contrato de trabalho aquando da sua recepção(1) ( art.224º do CC).
Ora, nos termos do art. 441º/2, constituem justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador, entre outros, o seguinte comportamento do empregador: a) falta culposa do pagamento pontual da retribuição.
Por outro lado, como determina o art. 441º/4, a justa causa é apreciada, com as necessárias adaptações, nos moldes previstos para o despedimento individual, no art. 396º, ao considerar como constituindo justa causa ‘o comportamento culposo do empregador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho’ (1); e que ‘para a apreciação da justa causa deve atender-se ao quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses ao empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros de trabalho e demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes’.
Ou seja, também aqui o conceito de justa causa assenta na ideia de inexigibilidade, de tal sorte que a violação culposa dos direitos do trabalhador ou qualquer outro comportamento do empregador descrito no art. 441º/2 apenas constituirá justa causa subjectiva de resolução quando esse comportamento gere uma situação de imediata impossibilidade de subsistência da relação laboral, tornando inexigível, em concreto, que o trabalhador mantenha o vínculo com o empregador por mais tempo.(2)

Verificados os requisitos formalmente exigidos, vejamos agora se a factualidade provada consubstancia a invocada justa causa de resolução, num ónus probatório que incumbe ao trabalhador (art. 342º/1 CC).
Ora, dos factos invocados pelo A. para a resolução do respectivo contrato de trabalho, provou-se a propósito que:
- O A. auferia ultimamente o salário de € 840 líquidos mensais;
- O A. não recebeu as remunerações correspondentes aos meses de Fevereiro, Março e 29 dias de Abril de 2004; e ainda que,
Desde Abril.2002 até Abril 2004, em relação ao A., os descontos efectuados pelo R. para a Segurança Social incidiam sobre a quantia de € 468.50
In casu, porém, a falta de pagamento pontual da retribuição na forma devida considera-se culposa, dado que a ré não ilidiu a presunção estabelecida no art. 799º/1 do CC.
Mas será que o comportamento do empregador acima reflectido é grave em si e nas suas consequências? Pensamos que sim.
Na verdade, a retribuição enquanto contrapartida do trabalho fornecido pelo trabalhador, tem uma função alimentar e representa, muitas vezes, o principal, ou mesmo exclusivo rendimento do trabalhador, pelo que se não confunde com o direito à vida traduz-se numa das suas mais significativas exigências, podendo dizer-se que constituí uma necessidade vital do trabalhador e respectiva família. Por isso, afigura-se-nos incontroverso que a mora ou incumprimento dessa obrigação retributiva do empregador assumem particular relevância e gravidade na vida do trabalhador.(3)

Logo, tendo o trabalhador cumprido a sua obrigação, a falta de pagamento da retribuição no âmbito deste contrato bilateral e sinalagmático traduz, em princípio, um incumprimento essencial do contrato a justificar a sua ruptura imediata, existindo portanto causa para a cessação imediata do contrato de trabalho.
Aliás, no ensinamento do Prof. Júlio Gomes(4) quando a lei se reporta ao não pagamento pontual da retribuição não faz referência à seriedade dos interesses em jogo, como faz, por exemplo, na ‘lesão culposa de interesses patrimoniais sérios do trabalhador’; é que qualquer incumprimento da retribuição se tem, em princípio, por sério, na economia do contrato.
Por outro lado, para além de a ré não ter provado factualidade que em sua tese pudesse relevar na aferição da (não) existência de justa causa, também não se pode olvidar o facto de a Ré ter vindo a efectuar até Abril.2004, em relação ao A., descontos para a Segurança Social apenas sobre o montante de € 468,50, quantia inferior portanto ao vencimento por aquele auferido de € 840,00 líquidos mensais.
E como este incumprimento defeituoso pela R. dos deveres sociais quanto ao A. pode ter reflexos na subsistência futura deste seu trabalhador, já que como decidiu o acórdão da Relação de Lisboa de 15-12-1999(5) , «o trabalho não se destina apenas a angariar meios de subsistência no presente, mas também a prevenir a subsistência futura, sendo a previdência social o instrumento fundamental desta protecção nas condições de vida da generalidade dos trabalhadores dependentes» –, afiguram-se-nos preenchidos os pressupostos para a resolução do contrato de trabalho pelo autor e como tal há que considerá-la lícita por existência de justa causa.
(…)”

Entende este Supremo que é de acompanhar toda esta corte de considerações, pelo que, em consequência, se haverá de concluir pela licitude da resolução do contrato de trabalho levada a efeito pelo autor.

Por outro lado, aditar-se-á também que, conquanto se anua a que, na espécie de acção em causa, seria sobre o autor que impendia o ónus da prova dos factos que o levaram à resolução do contrato de trabalho, tendo em conta que, com base nela, veio peticionar a condenação dos recorrentes nos termos em que o fez (cfr. artº 342º, nº 1, do Código Civil), o que é certo é que o mencionado autor, se bem que não lograsse demonstrar a totalidade dos factos que constituíam a causa de pedir, almejou, porém, provar factualidade bastante para se concluir, como se concluiu, pela licitude da resolução e que essas invocações constavam da carta que enviou aos autores.

5. Resta a apreciação da condenação por litigância de má fé.

Os ora recorrentes foram objecto de condenação, como litigantes de má fé, pela sentença proferida na 1ª instância.

Na apelação incidente sobre essa peça processual, puseram igualmente em causa o decidido quanto a essa condenação, defendendo ainda que quem deveria sofrê-la era o autor (cfr. «conclusões» 23 a 27 da alegação da apelação).

O acórdão em apreço, a este respeito, negou o pretendido pelos impugnantes, dizendo: –
“(…)
4. Da Litigância de Má Fé
Defendem ainda os recorrentes que na procedência do respectivo recurso em sede de matéria de facto se impõe a sua absolvição da condenação como litigantes de má fé, na medida em que a mesma se baseia unicamente no facto de alegadamente terem afirmado dolosamente que o A/recorrido auferia um salário inferior ao efectivamente recebido; e reclamam, por outro lado, a condenação a tal título do A. porque peticionou o pagamento de trabalho suplementar e descanso compensatório não gozado, bem sabendo não lhe serem devidos.
Vejamos se lhes assiste razão.
Tendo litigado de má fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir. É o que dispõe o art.456.º, n.º 1 do CPCivil.
Por outro lado, nos termos do n.º 2 do mesmo normativo diz-se litigante de má fé não só quem com dolo, mas também com negligência grave:
‘- a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não podia ignorar
- b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
- c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
- d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
É sabido que as partes estão ligadas por um direito e um dever recíprocos de verdade e honestidade, devendo agir de boa fé e cooperar para a justa composição do litígio, com brevidade e eficácia – arts 266-A e 266º/1 do CPC.
Ora, como se refere na sentença recorrida, os réus alegaram que o A. auferia um salário inferior ao por aquele efectivamente recebido, nos termos em que se veio a sedimentar na alínea D) dos factos provados, ou seja, deduziram assim oposição cuja falta de fundamento não podiam ignorar, até por se tratar de facto pessoal.
E tratando-se, como vimos, da negação de facto pessoal que veio a provar-se(6)–, impõe-se a subsunção de tal conduta aos ditames do transcrito normativo, tal como decidiu o Mº Juiz a quo. (7)
Já no que se refere à conduta do A. entendemos outrossim que não se provaram factos que permitam concluir que este demandante tenha litigado com má fé, sendo certo que a condenação em má fé tem de alicerçar-se em factos dados como provados, não podendo resultar de suspeita ou comportamentos não inequívocos para o accionamento de tal condenação.
Pensamos assim que bem se decidiu na 1ª instância não só ao sancionar – como sancionou – como litigantes de má fé os réus; como também ao não vislumbrar censura no comportamento processual do autor.
E sendo assim também, neste particular, se nos afigura não ser de alterar a decisão impugnada.
(…)”

Isto significa que, quanto ao problema em apreço, houve a reapreciação, pelo Tribunal Superior, do problema atinente à litigância de má fé.

Porque este problema, claramente, traduz uma questão de natureza processual, torna-se óbvio que a impugnação a realizar sobre ela há-de tomar a forma de agravo, e isto independentemente da espécie com que ela veio a ser admitida.

De acordo com o que se dispõe no nº 1 do artº 722º do Código de Processo Civil, sendo o recurso de revista o próprio, pode o recorrente alegar, além da violação de lei substantiva, a violação de lei de processo, quando desta for admissível o recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 754.º, de modo a interpor do mesmo acórdão um único recurso.

Contudo, comanda o aquele nº 2 do artº 754º que não é admitido recurso do acórdão da Relação sobre decisão da 1.ª instância, salvo se estiver em oposição com outro, proferido no domínio da mesma legislação pelo Supremo Tribunal de Justiça ou por qualquer Relação, e não houver sido fixada pelo Supremo, nos termos dos artigos 732.º-A e 732.º-B, jurisprudência com ela conforme.

Não estando aqui em causa esta última situação e, bem assim, aquela a que se reporta o nº 3 do indicado artº 754º, tendo havido pronúncia da Relação sobre o segmento decisório da sentença da 1ª instância que condenou os recorrentes como litigantes de má fé, é evidente que do acórdão lavrado em 5 de Maio de 2007 se não pode recorrer para este Supremo.
III
Termos em que: –

a) Se não toma conhecimento do objecto do recurso na parte atinente à condenação dos impugnantes como litigantes de má fé;

b) Se nega a revista;

c) Se condenam os recorrentes nas custas.

Lisboa, 5 de Março de 2008

Bravo Serra (Relator)
Sousa Peixoto
Mário Pereira
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(1) - Cfr. Jorge Leite, Dto do Trabalho, II Vol., Serviço de Textos da UC, 2004, p. 278 e Romano Martinez, Dto do Trabalho, 2ª edição, p 986.
(2) - Cfr. Monteiro Fernandes, Dto do Trabalho, 13ª edição, p. 619 e Acórdão da Relação do Porto,de 23-04-2007,, Proc 334/2007-1 , em que interviemos como adjunto, inédito ao que supomos.
(3) - Vd Jorge Leite, apud ob citada, pag. 108 e também o aresto desta Relação de 23-04-2007, supra citado.
(4) - In obra citada, p. 1048.
(5) - Proferido no procº nº 4949, in Grande Enciclopédia de Jurisprudência, citado por Júlio Gomes apud obra citada, p. 1052.
(6) - Aliás, é entendimento jurisprudencial desde há muito uniforme que não pode eximir-se à condenação como litigante de má fé a parte que nega factos pessoais que vêm a ser dados como provados. Vid[e], por todos, o ac. STJ: 18.12.2003, proc. 03B294/itij/net.
(7) - No âmbito do entendimento perfilhado se insere também Albino Mendes Baptista, Código do Processo do Trabalho anotado, Quid iuris ano 2000, p 68 ao consignar ‘… que os tribunais prestariam um bom serviço à justiça se fizessem um maior uso da condenação por litigância de má fé, não adoptando uma postura permissiva e desculpabilizante, e particularmente, se promovessem o seu accionamento oficioso.’