Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
02S345
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: EMÉRICO SOARES
Descritores: JUNÇÃO DE DOCUMENTO
TRANSPORTE INTERNACIONAL DE MERCADORIAS POR ESTRADA - TIR
CRÉDITO ILÍQUIDO
Nº do Documento: SJ200206050003454
Data do Acordão: 06/05/2002
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL PORTO
Processo no Tribunal Recurso: 1499/00
Data: 06/18/2001
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Área Temática: DIR TRAB - CONTRAT INDIV TRAB.
DIR PROC CIV - RECURSOS.
Legislação Nacional: CPC95 ARTIGO 706 N2 ARTIGO 722 N2 ARTIGO 721 ARTIGO 729 N2.
CCIV66 ARTIGO 342 N2 ARTIGO 400 N2 ARTIGO 473 N1.
CCTV IN BTE N9 DE 1980/03/08.
CCTV IN BTE N16 DE 1982/04/29.
CCTV IN BTE N18 DE 1991/05/15 CLAUS20 CLAUS41 CLAUS46 CLAUS47 - A CLAUS74 N7.
Sumário : I - A admissibilidade de junção de documentos com as alegações está legalmente condicionada à natureza superveniente dos mesmos documentos.
II - No caso de recurso para a Relação, os documentos supervenientes só podem ser juntos às alegações até se iniciarem os vistos aos juízes, é apodíctico que , no recurso para o Supremo, o documento só poderá considerar-se superveniente se a sua obtenção for posterior àquele momento em que se iniciaram os vistos aos juízes da Relação.
III - É facto notório que, por isso, não precisa de ser alegado nem provado, que o autor, enquanto esteve deslocado no estrangeiro, se alimentou, para o que, necessariamente fez, despesas, uma vez que o contrário não está provado. A circunstância de não ter produzido as facturas relativas a essas despesas não dispensa o empregador de delas o reembolsar, sendo, neste caso de se fixar o montante a liquidar em execução de sentença.
IV - Sendo o crédito do trabalhador ilíquido, tem a consequência de, nos termos do nº3 do artº 805 do CC, não poder a mora no reembolso ser imputada à entidade patronal enquanto o crédito não se tornar líquido.
V - Sendo o autor motorista de transportes internacionais, só excepcionalmente prestando serviços de âmbito nacional, tem direito à remuneração prevista no n. 7 da cláusula 74 do CCT aplicável (BTE, 1ª Série, nº16, de 19/04/82), uma vez que a ré não cumpriu o ónus que a ela cabia de alegar e provar quais os dias em que o autor não esteve deslocado no estrangeiro, facto este que emerge como extintivo do direito do autor.
VI - Devendo o dia de descanso semanal coincidir, sempre que possível, com o domingo, e o dia de descanso semanal complementar ser fixado imediatamente antes ou a seguir ao dia de descanso semanal, tem o autor também direito ao pagamento da remuneração de 53 dias de descanso semanal, complementar ou feriado passados no estrangeiro, os quais, de acordo com a matéria de facto provada, não lhe foram dados a gozar, não tendo a ré também aqui cumprido o ónus de provar, como alegou, que aquele gozou os seus dias de descanso fora dos sábados e domingos .
VII - O autor tem ainda direito a exigir o reembolso de despesas que fez com portagens e em resultado de avarias na viatura, não se provando que as primeiras houvessem sido em auto-estradas nas quais estava proibido pela empregadora de circular, e, em todo o caso, sempre tendo redundado em proveito da empregadora tais despesas.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

No Tribunal do Trabalho de Santo Tirso, A, residente na Rua ....., Santo Tirso, propôs acção declarativa de condenação com processo ordinário contra:

1º - B - Empresa de Transportes Rodoviários, Ldª. e

2º - Transportes C, Ldª., ambas com instalações e escritórios na Várzea do Monte, em Santo Tirso, pedindo a condenação das Rés a pagar ao Autor a quantia de 3754626 escudos, "acrescida dos juros a contar de .... até integral pagamento".

Para tanto alega: As duas Rés são firmas familiares, que se dedicam aos transportes rodoviários internacionais, tendo instalações comuns, sendo os sócios da primeira Ré, também sócios da segunda, acrescendo-lhes, nesta última, apenas o pai e sogro daqueles, tendo as duas Rés o mesmo chefe de tráfego e pertencendo, nas duas, a gerência ao Engenheiro D. O A. sempre trabalhou com o camião QP, registado como propriedade da 1ª Ré. As folhas de viagem foram sempre preenchidas pelo Autor em papel da 1ª Ré e os documentos que lhe entregavam atestavam que o A. era trabalhador da 1ª Ré, mas os recibos dos salários eram passados em nome da 2ª Ré, convencendo-se o Autor que a 1ª Ré era sua entidade patronal. Em 19.02.99 o Autor endereçou à 1ª Ré a carta de despedimento rescindindo, com alegação de justa causa, o contrato com efeitos a partir de 22 desse mês, com fundamento em falta de pagamento de trabalho em dias de descanso semanal e de remunerações, na não concessão de período de férias e não pagamento do respectivo subsídio e no não reembolso de várias quantias pagas pelo A. ao serviço da firma, no montante global do pedido formulado. O A. iniciou o seu trabalho em 23.02.98, com a categoria profissional de motorista dos transportes internacionais rodoviários de mercadorias aplicando-se à relação laboral o CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU, publicado no BTE n.º 9, de 8/03/80, n.º 16 de 29/04/82 e n.º 18 de 15/05/91, com PEs publicadas nos BTE n.º 30/80 e 33/82 de 08/9 e com a última alteração salarial publicada no BTE n.º 30/97 de 15/08.

Contestaram as Rés:

A "B - Empresa de Transportes Rodoviários, Ldª.", começando por arguir a sua ilegitimidade passiva, alegando não haver entre ela e o Autor qualquer relação fundada em contrato de trabalho. E, impugnando, depois, todos os factos, por desconhecimento os factos não pessoais e por negação os pessoais, conclui pela improcedência da acção e pela condenação do Autor como litigante de má fé, em multa e indemnização a favor da Ré.

A Transportes C, Ldª, aceitando alguns factos alegados na petição e impugnando, por inverídicos, os demais, alegando que o A. foi admitido ao serviço da Contestante, como motorista, exercendo as suas funções sob as ordens e direcção desta; que o A. litiga de má fé ao afirmar ignorar estes factos, pois até apresentou contestação no processo disciplinar que a Contestante lhe instaurou, precedentemente à instauração desta acção, onde o A. nunca pôs em causa a identidade da sua entidade patronal. O A. a partir de 22.02.99 não mais compareceu ao trabalho nem justificou a sua ausência. A Contestante pagou ao Autor tudo o que lhe era devido, nada mais tendo este a reclamar daquela. E deduzindo reconvenção, pede a condenação do Autor no pagamento da quantia de 431851 escudos com o fundamento de o mesmo ter abandonado o trabalho sem pré-aviso e nos prejuízos que à Reconvinte emergiram do facto de o Reconvindo, desobedecendo às ordens daquela, não ter efectuado um transporte de carga para Colónia. E pede ainda a condenação do Autor como litigante de má fé em multa e indemnização a favor da Contestante / Reconvinte.

Respondeu o A. à excepção de ilegitimidade arguida pela Ré B, Lda. (fls. 177 e verso) e contestou a reconvenção deduzida pela Ré Transportes C, Lda. (fls. 175 e verso) pugnando pela improcedência de ambas e requerendo, pelo seu turno, a condenação das Rés em multa e indemnização a favor do Autor.

Pelo despacho de fls. 18/190, foi o Autor, que requerera a concessão do benefício de apoio judiciário total, apenas dispensado do pagamento correspondente a 50% da taxa de justiça e das custas.

No despacho saneador (fls. 192 e verso) relegou-se para a decisão final o conhecimento da excepção de ilegitimidade invocada pela Ré, "B, Lda.", julgando-se verificados os demais pressupostos da validade e da regularidade da instância.

Elaboraram-se, de seguida, a especificação e o questionário, sem reclamação das partes.

Realizado o julgamento, o questionário mereceu as respostas constantes do despacho de fls. 220 a 223, que também não sofreram qualquer reclamação, seguindo-se-lhe a prolação da sentença que decidiu:

"A) Julgar improcedente a acção relativamente à ré B - Empresa de Transportes Rodoviários, Lda, por ilegitimidade da mesma, indo absolvida da instância;
B) Julgar parcialmente procedente, por parcialmente provada, a acção no que tange à ré Transportes C, Lda, que vai condenada a pagar ao autor a quantia de 3287783 escudos (três milhões. duzentos e oitenta e sete mil, setecentos e oitenta e três escudos) deduzida do montante global que a ré pagou ao autor correspondente aos 10$00 (dez escudos) por quilómetro percorrido por este, depois de deduzido este montante global do montante global correspondente ao valor das refeições - pequeno-almoço, almoço e jantar - que o autor poderia tomar no estrangeiro nos dias em que (efectivamente) ali estava deslocado, à razão de 340$00 por pequeno-almoço e 1330$00 por almoço ou jantar, acrescidos estes valores (das refeições) de 50% um e outro montante global a liquidar em execução de sentença, e sendo que ao montante final apurado acrescerão juros de mora, à taxa legal, desde a efectiva liquidação e até efectivo e integral pagamento;
C) Condenar o autor, na procedência do pedido reconvencional, a pagar à ré (Transportes C, Lda) a quantia de 431851 escudos (quatrocentos e trinta e um mil, oitocentos e cinquenta e um escudos) acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até efectivo e integral pagamento;
D) Não condenar qualquer das partes como litigante de má - fé. pois que não se verificam, salvo melhor entendimento, os respectivos requisitos (designadamente pela dificuldade, e afastada que está a actuação dolosa, de reputar de "gravemente" negligente o comportamento tanto do autor como das rés) - cfr. art.º 496º, n.º 2, do C.P.C."

Indeferida uma aclaração pedida pela Ré, Transportes C, Ldª., veio esta recorrer da sentença, também o fazendo o Autor, mas limitando o seu recurso à questão da ilegitimidade da R. B, Ldª., ao âmbito da retribuição e à não condenação na indemnização pela rescisão do contrato com justa causa e condenação do A. no pedido reconvencional.

Pelo acórdão de fls. 281 a 288, o Tribunal da Relação do Porto, na improcedência da apelação do Autor e na procedência parcial do recurso da ré, Transportes C, Lda. decidiu confirmar a sentença recorrida, "incluindo, porém, a verba de 518971 escudos das als. A)A) dos recibos de fls. 164, 165, e 166, no montante global que a R. pagou ao A., correspondente aos 10$00 por Km percorrido, montante global esse a liquidar em execução de sentença, e que deverá ser deduzido à quantia de 3287783 escudos em que a 2ª co-R. foi condenada".

Novamente inconformada, traz a Ré, Transporte C, Lda. recurso de revista para este Supremo Tribunal, finalizando a sua alegação com as seguintes conclusões:

1 - Os documentos ora juntos pela Recorrente, assinados pelo recorrido e não impugnados, fazem prova plena quanto às declarações aí inseridas, como já decidiu o Douto Acórdão recorrido.
2 - Constando neles que as verbas foram pagas mediante acordo com a recorrente e em substituição das verbas constantes das cláusulas 41, 46, 47, 47-A e 74 do CCT, tal acordo não poderá deixar de se considerar assente.
3 - De todo o modo, não tendo o recorrido exibido quaisquer facturas comprovativas das refeições tomadas, não pode, agora, exigir o seu pagamento.
4 - Aliás, o recorrido não logrou sequer provar ter consumido qualquer refeição no estrangeiro.
5 - O cálculo do preço das refeições, da forma como foi efectuado na Douta Sentença recorrida e confirmado no Douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação não tem qualquer sustentação e traduz-se em remuneração acrescida e não em qualquer compensação de despesas efectuadas, como estipula a cláusula 47-A do CCT.
6 - Apesar do acordo de remuneração, o recorrido, embora excepcionalmente, efectuou serviço de transporte de âmbito nacional, sendo certo que, nessas circunstâncias, não tem direito a auferir o correspondente a duas horas de trabalho extraordinário por dia.
7 - A recorrente foi condenada no pagamento da retribuição acrescida de 200% e por todos os Sábados e Domingos que o recorrido provou ter passado no estrangeiro.
8 - Sucede que, nos termos da cláusula 20ª do CCT, o dia de descanso semanal não tem necessariamente que coincidir com o Domingo, nem o complementar com o Sábado.
9 - O dia de descanso semanal e o complementar foram gozados pelo recorrido antes e depois de cada viagem, como resulta dos discos e diários de viagem juntos aos autos.
10 - As despesas em que a recorrente foi condenada foram efectuadas pelo motorista sem autorização da entidade patronal.
11 - Quando possuía cartão de crédito destinado às portagens e ao abastecimento de combustível.
12 - A falta de autorização impedia o recorrido de efectuar tais despesas e, consequentemente, de exigir o seu reembolso da recorrente.
13 - A despesa decorrente da deslocação de táxi é uma extravagância do recorrido, pela qual a recorrente não é responsável.
14 - O Douto Acórdão recorrido violou as disposições das cláusulas 20ª; 41ª; 47ª; 47ª-A e 74ª do CCT aplicável pelo que deve ser, nesta parte, revogado o Douto Acórdão recorrido e substituindo-o por outro que absolva a recorrente das quantias referidas e em que foi condenada.

Não houve contra-alegação e a Dg.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu o douto parecer que se acha a fls. 311 a 315, no qual manifestou o seu entendimento de que não é admissível a junção, nesta fase, dos documentos apresentados pela Recorrente e de que a revista deve ser negada.

As partes, notificadas desse parecer, nada disseram.

Colhidos que se mostram os legais vistos, cumpre apreciar e decidir.

Como é sabido, por resultar do disposto nos art.s 684º, n.º 3 e 690º n.º 1, do Cód. Proc. Civ., conforme jurisprudência pacífica dos nossos tribunais superiores, são as conclusões da alegação do recorrente que, em princípio e ressalvadas as questões de que o tribunal deva oficiosamente conhecer, delimitam objectiva e subjectivamente qualquer recurso, cumprindo ao Tribunal ad quem conhecer, tão somente, as questões que nessas conclusões o recorrente suscita e não pronunciar-se, sobre as razões ou argumentos que o mesmo expende em defesa dos seus pontos de vista - Arts. 660º, n.º 2, 713º, n.º 2 e 726º do Cód. Proc. Civ.

Ora, apreciando as conclusões do aqui recorrente, constata-se serem as seguintes as questões que o mesmo submete ao julgamento deste Tribunal de Revista.

1ª - Com base nos documentos ora juntos pela Recorrente, que gozam de força probatória pela, não podia deixar de se considerar como assente o acordo mediante o qual foram pagas as verbas neles constantes em substituição das verbas das cláusulas 41, 46, 47, 47-A e 74 do CCT aplicável ?

2ª - Não tendo o Recorrido exibido quaisquer facturas comprovativas das refeições tomadas, nem tendo logrado provar ter consumido qualquer refeição no estrangeiro, não pode agora exigir o seu pagamento ?

3ª - Não tem o recorrido o direito a auferir o correspondente a duas horas de trabalho extraordinário por dia ?

4ª - Não tendo o dia de descanso semanal, nos termos da cláusula 20ª do CCT, que coincidir com o Domingo, nem o complementar com o Sábado, não havia lugar à condenação no pagamento da retribuição acrescida de 200%, por todos os Sábados e Domingos que o Recorrido provou ter passado no estrangeiro?

5ª - Não tem o Recorrido direito a exigir o reembolso das despesas que fez, por as ter feito sem autorização da Recorrente e quando possuía cartão de crédito destinado às portagens e ao abastecimento de combustível ?

Sendo, pois, estas as questões a resolver, alinhemos a materialidade factícia dada como apurada pelo Tribunal Recorrido, aceitando a que havia sido fixada na 1ª instância:

Proveniente da especificação:

1. As rés, B - Empresa de Transportes Rodoviários, Lda e Transportes C, Lda, são duas firmas familiares - al. A).
2. O camião de matrícula QT encontra-se pintado com a cor própria da 1ª ré, B - al. B);
3. O autor, em 19.02.99, enviou à ré B a carta cuja fotocópia consta de fls. 43 (doc. n.º 34 junto com a p.i.), que foi por esta recebida, e dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu conteúdo, nomeadamente na parte em que consta "(...) venho pela presente comunicar a V. Exs que pretendo rescindir o aludido contrato que me liga a essa firma, com efeitos a partir do dia 22 do corrente mês, e com justa causa (...)" - al. C);
4. A segunda ré enviou ao autor, que a recebeu, a carta de fls. 46 (doc. n.º 37 junto com a p.i.) cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido - al. D);
5. O autor é sócio do Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários - Al. E).

Provenientes das respostas ao Questionário:

6 . Ambas as rés se dedicam, pelo menos, aos transportes rodoviários internacionais - Q. 1º:
7 . Ambas têm instalações em Várzea do Monte - Q 2º;
8. Onde aparcam as viaturas - Q. 3º;
9. O chefe de tráfego é o mesmo nas duas empresas - Q. 6º;
10. O Eng.º D aparece nas instalações da B e da ré Transportes C como verdadeiro patrão - Q.7º;
11. As folhas de viagem foram sempre preenchidas pelo autor em papel com o timbre da B, que lhe era entregue nos escritórios - Q. 9º;
12. Alguns dos documentos que eram entregues ao autor quando das viagens eram respeitantes à B - Q.10º;
13. Os recibos de salários eram passados em nome da segunda ré (Transportes C, Lda) - Q.11º;
14. O autor iniciou o trabalho em 23.02.98, como motorista - Qs.17º e 18º;
15. O autor prestava o seu serviço como motorista em transportes internacionais rodoviários de mercadorias, só excepcionalmente prestando serviço em transportes de âmbito nacional - Q.19º;
16. O autor recebia ordens, directivas e era fiscalizado também pelo Eng. D - Q. 20º;
17. A ré não pagava ao autor as refeições à factura - Q. 21º;
18. Os 10 escudos por quilómetro que a ré pagava ao autor destinavam-se a substituir o pagamento de, pelo menos, as refeições à factura - Q. 22º;
19. O autor encontrou este sistema remuneratório na firma quando começou nela a trabalhar - Q. 23º;
20. Pelo menos, o autor não recebia o prémio TIR nem o respeitante à cláusula 74 n.º 7 do CCTV nos termos neste previstos - Q. 28º;
21. Nunca gozou férias - Q. 29º;
22. Nem recebeu qualquer subsídio de férias e de Natal -
Q. 30º;
23. O autor não recebeu os Sábados, Domingos e Feriados com o acréscimo de 200% - Q. 31;
24. Desses dias, pelo menos 53 (cinquenta e três) não lhe foram dados a gozar - Q. 32º;
25. O autor, nas viagens, passou no estrangeiro os seguintes Sábados, Domingos e Feriados: em 1998, dias 7, 8, 28 e 29 de Março, 10, 11, 19, 25 e 26 de Abril, 1, 2, 3, 9, 16, 17, 24, 30 e 31 de Maio, 6, 10, 11, 13, 14,27 e 28 de Junho, 4, 5, 11, 12.,18, 19 e 25 de Julho, 1, 2, 29 e 30 de Agosto, 12, 13, 19, 20 e 27 de Setembro, 4, 10, 11, 24, 25 e 31 de Outubro, 1, 7, 8, 14, 15, 21, 22, 28 e 29 de Novembro e 1, 5, 6, 8, 13, 19 e 20 de Dezembro - Q. 33º;
26. E os dias 3, 9 e 10 de Janeiro de 1999 - Q. 34º;
27. Na 2ª viagem o autor despendeu em portagens 720$00, mais 430$00, mais 9,8 DM e mais 23,06 DM - Q.36º;
28. Na terceira viagem o autor despendeu 1140$00 em portagens - Q. 37º;
29. Na 4ª viagem o autor despendeu 11,53 DM em portagens mais 795 pesetas numa cinta para a carga - Q. 38º;
30. Na 5ª viagem o autor despendeu 10668 mais 11967 pesetas em gasóleo e 1140$00, mais 1140$00, mais 460$00 em portagens - Q. 39º;
31. Na 6ª viagem o autor despendeu, de portagens 1140$00, mais 1.140$ 00, mais 320$00, mais 320$00, mais 1130 pesetas, duma avaria no IP5 telefone 640$00 mais, mecânico, 8190$00 - Q. 40º;
32. Na 7ª viagem, de portagens 1140$00, mais 1140$00, mais 1340$00 mais 320$00, mais 320$00, mais 320$00 - Q. 41º;
33. Na 8ª viagem, de portagens 1.130 pesetas, mais 1.140$00, mais 1140$ 00, mais 320$00, mais 550$00, mais 550$00, mais 460$00, mais 320$ 00, mais 11,53 DM, de gasóleo 755,20 F.F. - Q. 42º;
34. Na 9ª viagem, de portagens 1140$00, mais 1140$00, mais 320$00, mais 320$00 - Q. 43º;
35. Na 10ª viagem, de gasóleo 32944 escudos, de portagens 2620$00, mais 320$00, mais 1710$00, mais 11,53DM - Q. 44º;
36. Na 11ª viagem o autor despendeu 1.140$00, mais 1.220$00 e mais 740$ 00 em portagens - Q. 45º;
37. Na 12ª viagem, de portagens 1140$00, mais 320$00, mais 18 F.F., mais 1130 pesetas - Q. 46º;
38. Na 13ª viagem o autor despendeu 1.300 pesetas em portagens e 22000$00 em táxi, por o camião ter sofrido uma avaria no IPS - Q. 47º;
39. Na 14ª viagem, de portagem, despendeu 320$00 - Q. 48º;
40. Na 15ª viagem, de portagens, 730$00, mais 730$00 - Q. 49º;
41. Despesas de que o autor não foi ainda reembolsado - Q. 51º;
42. O autor a partir de 22.02.99 não mais compareceu ao trabalho - Q.52º;
43. O autor era possuidor de cartão de crédito destinado ao pagamento das portagens e do combustível, sendo que essa forma de pagamento apenas era aceite em determinadas portagens e em certos postos de abastecimento de combustível - Q. 57º;
44. À excepção de alguns troços de auto-estrada, em que o autor estava autorizado pela ré a circular, o autor recebeu ordens expressas da gerência da ré no sentido de não circular nas auto-estradas em Portugal - Q. 58º.
45. A ré Transportes C, através da sua gerência, deu ordens ao autor para que, no dia 03.07.98, efectuasse uma carga em Colónia, na Alemanha - Q. 59º;
46. Por sua iniciativa, o autor decidiu não se deslocar ao local da carga e iniciar a viagem de regresso a Portugal.- Q. 60º;
47. Essa atitude do autor implicou que o cliente alemão suportasse um prejuízo de 2300 D.M. (253451$00), contratando com outro transportador - Q. 61º;
48. Tal quantia foi debitada à segunda ré, que a suportou - Q 62º.

Nos termos do art, 85º, n.º 1 do Cód. Proc. Trabalho (de 1981, por ser o aplicável em atenção à data da proposição da acção), o Supremo Tribunal de Justiça, quando funcione como Tribunal de revista conhece apenas da matéria de direito. Correspondentemente, o n.º 1 do art.o 729º do Cód. Proc. Civ. dispõe que aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o Supremo aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado, preceituando o n.º 2 do mesmo artigo que a decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo caso excepcional previsto no n.º 2 do art.o 722º, ou seja, quando haja ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova. Fora este caso excepcional, e no que à matéria de facto respeita, só reconhece a lei (n.º 3 do art.o 729º) ao Supremo Tribunal o poder de devolver o processo ao tribunal recorrido quando entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou que ocorrem contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito.

Assentes estes critérios legais quanto à possibilidade de intervenção do Supremo na fixação da matéria de facto, entremos no conhecimento das questões que o Recorrente suscita:

1ª questão: Com base nos documentos juntos pela Recorrente com a alegação, deve considerar-se como assente o acordo mediante o qual foram pagas as verbas que desses documentos constam, em substituição das verbas das cláusulas 41ª, 46ª, 47ª, 47ª-A e 74ª do CCT aplicável ?

Para justificar a junção desses documentos nesta fase do processo afirma a Recorrente que ela decorre do estipulado no art. 706 do C.P.C e resulta do julgamento da causa na 1ª instância.

A douta Magistrada do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal manifesta o seu entendimento no sentido de não ser admissível essa junção.

E tem, a nosso ver, inteira razão.

Dispõe o art. 727 do Cód. Proc. Civ. que com as alegações podem juntar-se documentos supervenientes, sem prejuízo do disposto no n. 2 do artigo 722 e no n. 2 do art.o 729.

Donde logo resulta que a admissibilidade de junção de documentos com as alegações está legalmente condicionada à natureza superveniente dos mesmos documentos. Se, nos termos do art.o 706º, n.º 2 do Cód. Proc. Civ., no caso de recurso para a Relação, os documentos supervenientes só podem ser juntos às alegações até se iniciarem os vistos aos juízes, parece-nos apodíctico que, no recurso para o Supremo, o documento só poderá considerar-se superveniente se a sua obtenção for posterior àquele momento em que se iniciaram os vistos aos juízes da Relação.

Os documentos juntos pelo ora Recorrente à sua alegação de revista, pretendem ser os originais do "recibo de remunerações" referentes aos meses de Junho e Dezembro de 1998, cujas fotocópias já as juntara a Recorrente aos autos, a fls. 162 e 163. Logo, logicamente, se a Recorrente juntou aos autos, ainda na 1ª instância, fotocópias dos originais que pretende agora juntar, não pode, de modo algum, conferir-se a estes natureza superveniente.

Mas, argumenta a Recorrente que a junção desses documentos "resulta do julgamento da causa na 1ª Instância".

O argumento não colhe. Por um lado, se a necessidade da sua junção se tornou necessária devido ao julgamento da causa na 1ª Instância, então os mesmos deviam ter sido apresentados com a alegação da Apelação até ao momento previsto no n. 2 do art.o 706 do Cód. Proc. Civ. Por outro lado, como se lê no Manual de Processo Civil, de A. Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora (pág. 533 e verso), com referência à ultima parte do n. 1 do referido art.o 706, "é evidente que, na sua última parte, a lei não abrange a hipótese de a parte se afirmar surpreendida com o desfecho da acção (ter perdido quando esperava obter ganho da causa) e pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter sido apresentado em 1ª instância".

É, assim, manifestamente extemporânea e, por isso, ilícita a junção dos documentos que acompanham a alegação da Recorrente os quais por isso não podem ser tidos em consideração, pelo que, nos termos do art.o 543, n. 1 do Cód. Proc. Civ., se ordena o seu desentranhamento e restituição à Apresentante que vai condenada nas custas com a taxa de justiça que se fixa no mínimo.

Com a junção desses documentos pretendia a Recorrente que se tivesse como assente o alegado acordo substitutivo do pagamento das verbas das cláusulas 41ª, 46ª, 47ª, 47ª-A e 74ª do CCTV aplicável.

O douto acórdão recorrido admitiu a existência desse acordo, "pelo menos em relação aos docs. n.ºs 4, 5, e 6 juntos com a contestação, assinados pelo Réu e não impugnados, uma vez que os mesmos fazem prova plena (art. 376º do C.P.C) que houve acordo entre A. e R. quanto ao pagamento das verbas neles constantes (nos meses de Setembro, Outubro e Novembro de 1998, em substituição das verbas constantes nas Cls. 41ª, 46ª, 47ª, 47ª-A e 74ª do CCTV aplicável". E, em face disso, acrescentou ao quadro factício fixado na 1ª instância mais um facto com essa matéria.

Portanto, o acórdão recorrido considerou assente a existência desse acordo, embora com um âmbito mais reduzido do que o pretendido pela ora Recorrente, pois, considerou que, "dos docs. 2 e 3 juntos com a contestação da 2ª R. nada resulta, pela simples razão de que neles nada consta (pelo menos não se consegue ler) quanto a um eventual acordo de pagamento de verbas em substituição de outras".

Impondo-se a este Supremo Tribunal acatar a matéria de facto fixada pelas instâncias, uma vez que não se vê que ocorram as circunstâncias em que lhe é, nos termos dos art.os 729 n. 2 e 3 do Cód. Proc. Civ., permitido alterá-la ou determinar a sua ampliação, é com a amplitude admitida pelo acórdão recorrido que tem de ser aqui aceite o alegado acordo entre o A. e a R., substitutivo do pagamentos das verbas constantes das referidas cláusulas do CCTV aplicável.

Só com esse âmbito procedem, assim, as conclusões 1ª e 2ª.

2ª questão: Não tendo o recorrido exibido quaisquer facturas comprovativas das refeições tomadas, nem tendo logrado provar ter consumido qualquer refeição no estrangeiro, não pode agora exigir o seu pagamento?

A cláusula 47ª-A do CCTV aplicável, confere, na sua alínea a) aos trabalhadores deslocados no estrangeiro o "direito ao pagamento das despesas efectuadas com as refeições (pequeno-almoço, almoço e jantar) mediante factura".

O aqui A. provou que esteve deslocado no estrangeiro mas não juntou aos autos quaisquer facturas relativas às despesas com as suas refeições.

Será esse facto impeditivo de o mesmo ser pago pela entidade patronal dessas despesas?

A resposta não pode senão ser negativa.

É facto notório que, por isso não precisa de ser alegado nem provado - art. 514º, n.º 1 do Cód. Proc. Civ. - que o Autor, enquanto esteve deslocado no estrangeiro, se alimentou, para o que, necessariamente, fez despesas, uma vez que o contrário não está provado. A circunstância de não ter produzido as facturas relativas a essas despesas não dispensa o Empregador de delas o reembolsar. A exigência da factura apenas releva para o efeito da determinação do montante do reembolso, não prevendo a transcrita cláusula do CCT que a ausência delas importe a liberação da Empregadora da obrigação de reembolsar o trabalhador. Só que, não sendo produzidas as facturas, a fixação do montante a reembolsar terá de ser feita pelo recurso a critérios de equidade. O que quer dizer que, face a ausência de facturas o crédito do trabalhador se manterá ilíquido enquanto não for liquidado, com a consequência de, nos termos do n. 3 do art. 805 do Cód. Civil, não poder a mora nesse reembolso ser imputada à entidade patronal enquanto o crédito não se tornar líquido.

Uma Interpretação da referida cláusula 47ª-A do CCTV no sentido pretendido pela Recorrente, não pode ter sido querida pelos contraentes, até porque traduziria dar guarida a uma manifesta situação de inadmissível locupletamento da empregadora à custa do trabalhador, com o correspondente enriquecimento daquela, sem causa. E, se, contra esse entendimento, aceitássemos que da falada cláusula resulta um direito da empregadora de não reembolsar, definitivamente, o trabalhador das despesas de alimentação que comprovou ter feito enquanto deslocado no estrangeiro, por o mesmo não apresentar as respectivas facturas, então teríamos de considerar ilegítimo, por abusivo, o seu exercício, uma vez que excederia manifestamente os limites impostos pela boa fé e pelo próprio fim social e económico desse direito - art. 334º do Cód. Civ..

Bem andou assim o Tribunal a quo em considerar que a não apresentação das facturas não libertava a Recorrente da obrigação de pagar as despesas que o Recorrido, como motorista, fez enquanto deslocado no estrangeiro.

Mas, sustenta a Recorrente que "o cálculo do preço das refeições, da forma como foi efectuado na Douta Sentença recorrida e confirmado no Douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação não tem qualquer sustentação e traduz-se em remuneração acrescida e não em qualquer compensação de despesas efectuadas, como estipula a cláusula 47-A do CCT.

Vejamos:

Importa antes de mais, precisar que o que está aqui em recurso não é a sentença da 1ª instância mas o acórdão da Relação do Porto que decidiu os recursos interpostos daquela sentença, pelo que só pela via indirecta é que se pode dizer, como o faz a Recorrente, que é aqui recorrida a "Douta Sentença" .

No respeitante ao cálculo do preço das refeições escreveu-se na sentença da 1ª Instância: "Sucede, no entanto, que o autor não provou que as refeições no estrangeiro têm o custo que alegou, sendo certo que, de resto em consonância com a sua posição quanto ao acordo (substituição do pagamento à factura pelo pagamento de 10$00 por quilómetro) que invocou na inicial, também nem sequer alegou que tenha tomado refeições em estabelecimento hoteleiro, que tenha suportado os respectivos custos, enfim, que existam facturas com a proveniência em causa.

Mas também nesta sede podemos recorrer à equidade - cfr. art.º 400º n.º 2 do C.C.

Assim, haverá que considerar as refeições que o autor poderia (se quisesse) tomar no estrangeiro - pequeno-almoço, almoço e jantar - , durante os períodos que aí esteve deslocado ao serviço da ré, tomando como custo de referência os valores constantes da cláusula 47 do CCT, alteração publicada no BTE 30/97 (pequeno almoço 340$00, almoço ou jantar 1330$00) acrescidos de 50%, pois que é facto notório que o custo de vida na generalidade dos países europeus é superior ao verificado no nosso país, e a relegar para a execução da sentença - Cfr. artºs 514º, n.º 1 e 661º, n.º 2 do C.P.C."

A Relação do Porto aceitou essa argumentação, excluindo porém a obrigação dos pagamentos relativos aos meses de Setembro, Outubro e Novembro de 1998, com o fundamento de que nesses meses vigorou o acordo segundo o qual ao Autor seria paga uma retribuição mensal - 10$00 ao Km - substitutiva dos pagamentos previstos nas Clªs 41ª, 46ª, 47ª, 47ª-A e 74 do CCTV para o sector e que o Autor aceitou, referindo, quanto aos outros meses, "que a R. não provou por docs. ou testemunhas, que aquando da admissão do A. tivesse sido celebrado um acordo para vigorar durante toda a relação laboral, nos termos constantes do alegado no art.o 28º da contestação, sendo certo que o ónus da prova de tal facto lhe cabia, como facto impeditivo ou extintivo do direito do A."

Não vemos que a posição do Tribunal Recorrido possa ser passível de censura. À ora Recorrente cabia compensar o Recorrido das despesas deste com a sua alimentação no estrangeiro. Não se conhecendo o montante exacto dessas despesas, havia que se remeter a sua fixação para a execução de sentença, nos termos do art.o 661º n.º 2 do Cód. Proc. Civ. Foi o que fizeram as Instâncias fixando desde logo os critérios para a determinação dessa compensação, tendo por base os valores constantes da Clª 47ª do CTT (BTE n.º 30/1997), e fazendo-lhes acrescer, por razões de equidade, o percentual de 50%, em atenção ao notoriamente maior custo de vida no estrangeiro.

Improcedem assim as conclusões 3ª, 4ª e 5ª.

3ª questão: Não tem o recorrido direito a auferir o correspondente a duas horas de trabalho extraordinário por dia?

Assenta a Recorrente a defesa duma resposta afirmativa a esta questão em dois argumentos:

1º - Os documentos juntos com a alegação impõem que se dê como provado o acordo, aceite pelo Autor, de substituição do pagamento das verbas aludidas nas atrás citadas cláusulas do CCTV pelo pagamento de 10$00 por quilómetro.

2º - Ficou provado que o Recorrido, embora excepcionalmente, efectuou serviço em transportes de âmbito nacional, sendo que, nos dias em que tal acontecer, nunca teria direito à retribuição especial prevista no n.º 7 da Cláusula 74ª do CCT que se aplica apenas aos trabalhadores deslocados no estrangeiro, resultando alias claramente dos diários de viagem e discos) que o motorista não se encontrou deslocado em muitos dias que alega.

Quanto ao primeiro argumento, o mesmo manifestamente improcede, uma vez que os documentos juntos pela Recorrente com a sua alegação tiveram de ser desconsiderados por junção extemporânea.

No que respeita ao segundo argumento, provou-se, efectivamente (ponto 15º da matéria de facto), que "o autor prestava o seu serviço como motorista de transportes internacionais rodoviários de mercadorias, só excepcionalmente prestando serviço em transportes de âmbito nacional".

Na Clª 74ª do CCTV (Cfr. BTE 1ª Série n.º 16, de 29.4/1982) relativamente ao regime de trabalho para os trabalhadores deslocados no estrangeiro, estipula-se no seu n.º 7, que "os trabalhadores têm direito a uma retribuição mensal, que não será inferior à remuneração correspondente a duas horas de trabalho extraordinário por dia".

É evidente que, nos termos desta estipulação, os trabalhadores só têm direito à remuneração ali referida quando deslocados no estrangeiro.

Acontece que o aqui Autor era motorista de transportes internacionais, só excepcionalmente prestando serviços de âmbito nacional.

Parece pretender a Recorrente que o Autor não tem o direito de auferir essa remuneração do n.º 7 da Clª 74ª em virtude de, excepcionalmente, também prestar serviços de âmbito nacional. Quando muito, teria razão relativamente aos dias em que o A. prestou esse serviço no interior do pais, mas cumpria à Recorrente alegar e provar quais os dias em que o Autor não esteve deslocado no estrangeiro, uma vez que tal facto emerge como extintivo do direito do Autor - art. 342º, n.º 2 do Cód. Civ..

Sem essa prova, terá que se concluir que o Autor, como motorista de transportes internacionais de mercadoria, tem o direito de auferir a remuneração prevista no citado n.º 7 da Cláusula 74ª do CCT

Improcede a conclusão 6ª.

4ª questão: Não tendo o dia de descanso semanal, nos termos da Clª 20ª do CCT que coincidir com o domingo, nem o complementar com sábado, não havia lugar à condenação no pagamento da retribuição acrescida de 200%, por todos os sábados e domingos que o Recorrido provou ter passado no estrangeiro ?

Efectivamente, nos termos da Clª 20ª do referido CCT o dia de descanso semanal deve coincidir, sempre que possível, com o domingo, e o dia de descanso complementar tem de ser fixado imediatamente antes ou a seguir ao dia de descanso semanal. Donde a necessária conclusão de que, em harmonia com essa cláusula, o imperioso é que o trabalhador tenha dois dias de descanso seguidos, podendo ou não ser um deles - sê-lo-á sempre que possível - o domingo.

Todavia, uma vez mais nos encontramos aqui confrontados com a ausência de prova de que, como a Recorrente alega, o Autor gozou os seus dias de descanso fora dos sábados e domingos. O que, pelo contrário, se provou é que "o autor não recebeu os Sábados, Domingos e Feriados com o acréscimo de 200%" e que "desses dias, pelo menos 53 (cinquenta e três) não lhe foram dados gozar" (pontos 23 e 24 da matéria de facto). O que resulta ou não dos "discos e diários de viagem" que se encontram nos autos, não pode ser aqui considerado por serem esses "discos e diários de viagem" meros instrumentos de prova de factos, que não cabe a este Supremo Tribunal apreciar, por ser sua vocação apenas aplicar o direito aos factos apurados pelas Instâncias.

Foi por isso a Recorrente, e bem, em nosso entender, condenada "no pagamento da remuneração desses 53 dias de descanso semanal, complementar ou feriados passados no estrangeiro", e com o acréscimo de 200% previstos na clª. 41ª n.º 1 do referido CCT.

Improcedem as conclusões 7ª a 9ª.

5ª questão: Não tem o recorrido direito a exigir o reembolso das despesas que fez por as ter feito sem autorização da Recorrente e quando possuía cartão de crédito destinado às portagens e ao abastecimento do combustível?

Atentando no quadro factício apurado, constata-se (cfr. pontos 26 a 41) que, nas quinze viagens que fez, o A, fez as despesas ali referidas, a quase totalidade delas com portagens e pelo menos duas em resultado de avarias, despesas essas de que o autor ainda não foi reembolsado.

Mais está assente que o autor era possuidor de cartão de crédito destinado ao pagamento das portagens e do combustível, sendo que essa forma de pagamento apenas era aceite em determinadas portagens e em certos pontos de abastecimento de combustível (ponto 43). À excepção de alguns troços de auto-estrada, em que o autor estava autorizado pela Ré a circular, o autor recebeu ordens expressas da gerência da ré no sentido de não circular nas auto estradas de Portugal (ponto 44).

A Recorrente não esclareceu, como devia ter feito, em que troços de auto- estradas estava o autor autorizado a circular, não se provando, assim, que as despesas com as portagens por si efectuadas denunciem a circulação pelo mesmo em auto-estradas nas quais estava proibido de circular. Mas mesmo que provado tivesse ficado que o autor circulara em desobediência àquelas ordens expressas da gerência da ora Recorrente, nem por isso estaria esta desvinculada de reembolsar o autor das despesas feita embora naquela desobediência pudesse, eventualmente, encontrar matéria para proceder disciplinarmente contra o autor. É que essas despesas que o A. fez redundaram também em proveito da Ré, na medida em que é facto, do conhecimento da generalidade das pessoas e, por isso, facto notório, que a circulação em auto estradas além de poupar tempo, importa enormes ganhos em termos de menor desgaste do material.

Daí que, mesmo que tivesse provado que a circulação do Autor em auto-estradas se fizera contra aquelas ordens expressas da Ré, assistiria àquele o direito de ser reembolsado das despesas por ele feitas e que não se provaram terem tido como finalidade mera comodidade do Autor.

Solução diferente levaria, uma vez mais, a um injustificado locupletamento da ora Recorrente à custa do Autor, constituindo aquela na obrigação de reembolsar este, com o fundamento no disposto no art.o 473º, n.º 1 do Cód. Civ.

Repare-se, aliás, que, como muito bem observa a Dg.ma Procuradora-Geral Adjunta, a R., contestando as despesas indicadas pelo Autor no item 62º da petição inicial, começa por afirmar (cf. item 69º da sua contestação) que "todas as despesas referidas em 62 são inventadas pelo A., sendo certo que a R. sempre suportou todos os encargos, nomeadamente, portagens e gasóleo"

Do que parece poder concluir-se, que, não obstante aquelas ordens expressas da gerência da Ré, no sentido de os seus motoristas circularem em apenas alguns troços de auto-estradas, a própria Ré não as levava a sério, pagando sempre as portagens das auto estradas que os seus motoristas utilizavam.

Não se vê motivo para, no caso em apreço, a mesma proceder diversamente.

Discorda a Recorrente que seja condenada a pagar a quantia de 22.000$00 "na sequência de uma viagem de táxi não autorizada". E questiona: "Será que o trabalhador poderá optar pela forma como se faz transportar, e, após, isso, exigir o pagamento à sua entidade patronal ?

Apurou-se que na sua 13ª viagem o Autor despendeu 22.000$00 em táxi, por o camião ter sofrido uma avaria (ponto 38 do quadro factício).

Essa 13ª viagem está documentada no diário de viagem que se acha a fls. 22 onde, em nota, se escreve "devido ao compromisso que tinha para o dia 20.09.98 e que a empresa tinha conhecimento não tive outra alternativa senão viajar para casa de táxi no qual paguei 22000 escudos".

A ora Recorrente limitou-se a dizer que todas as despesas referidas pelo A. no item 62º da petição inicial, foram por ele inventadas. Porém as instâncias deram as mesmas como provadas.

A ser verdade o que consta da transcrita nota do diário de viagem, teríamos que concluir que a utilização do táxi para regressar a casa teve por causa, não um capricho do Autor mas uma situação de necessidade.

De qualquer forma, não diz a Recorrente que outro meio, mais económico, tinha o Autor disponível para, face à avaria sofrida pelo camião, se fazer transportar para a casa..

Também improcedem, portanto, as conclusões 10ª a 13ª.

Por tudo quanto fica exposto, nega-se a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 5 de Junho de 2002.

Emérico Soares,

Manuel Pereira,

Azambuja Fonseca.