Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1004/23.0YRLSB-A.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: JÚLIO GOMES
Descritores: IRRECORRIBILIDADE
TRIBUNAL ARBITRAL
SERVIÇOS MÍNIMOS
RECURSO DE REVISTA
Data do Acordão: 02/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECLAMAÇÃO - ARTº 643 CPC
Decisão: INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO.
Sumário :

O artigo 22.º, n.º 1, do DL 259/2009 deve ser interpretado no sentido de que da decisão do tribunal arbitral que fixa serviços mínimos, no âmbito de uma greve, só cabe o recurso para o Tribunal da Relação, que decide definitivamente, não sendo admissível recurso de revista, salvo se for invocada alguma das situações contempladas no artigo 629.º, n.º 2, do CPC.

Decisão Texto Integral:

Processo n.º 1004/23.0YRLSB-A.S1


Acordam em Conferência na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,


O Ministério da Educação, Recorrente no presente recurso em que é Recorrido o Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (S.T.O.P), notificado do despacho que não admitiu o recurso de revista veio reclamar para a Conferência, pedindo que sobre a matéria do despacho recaia um Acórdão, ao abrigo do disposto no artigo 643.º e no artigo 652., n.º 3 do Código do Processo Civil (CPC)


A reclamação do Recorrente apresenta as seguintes Conclusões:


A. A referência à recorribilidade da decisão arbitral para o Tribunal da Relação, constante do n.º 1 do artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 259/2009, de 25 de setembro, aplicável por força da norma remissiva do artigo 405.º da LTFP, não pode entender-se como excludente dos recursos para o Supremo Tribunal de Justiça, por tal entendimento não ter correspondência no seu texto legal e a finalidade da norma não o consentir.


B. Nas situações em que o legislador quis vedar o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões do Tribunal da Relação, disse-o: v.g. artigos 370.º, nº. 2, 662.º, nº. 4, 854º e 998.º, nº. 2 do C.P.C., nº. 3 do artigo 46º do Código da Propriedade Industrial.


C. Ademais, no que respeita à arbitragem dos serviços mínimos, é também subsidiariamente aplicável a arbitragem necessária, que remete para o regime da arbitragem voluntária, por via do disposto no artigo 405.º conjugado com o artigo 382.º, todos da LTFP, pelo que sempre seria aplicável o disposto no artigo 59.º, n.º 8 da Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro, que aprovou a Lei da Arbitragem Voluntária (LAV), que dispõe que “Salvo quando na presente lei se preceitue que a decisão do tribunal estadual competente é insusceptível de recurso, das decisões proferidas pelos tribunais referidos nos números anteriores deste artigo, de acordo com o que neles se dispõe, cabe recurso para o tribunal ou tribunais hierarquicamente superiores, sempre que tal recurso seja admissível segundo as normas aplicáveis à recorribilidade das decisões em causa”.


D. Pelo que não se podem excluir as possibilidades recursórias previstas na lei de processo, nomeadamente o n.º 1 do artigo 671.º do C.P.C., aplicável ao caso sub judice, conforme o tem entendido a jurisprudência do STJ (vide, a título exemplificativo, o Ac. do STJ, de 23/06/2016, no Proc. 1248/14.6YRLSB.S1).


E. Não se ignora a jurisprudência do STJ, que nega o conhecimento dos recursos para si interpostos em litígios, também sujeitos a arbitragem obrigatória, emergentes de direitos de propriedade industrial, em que estão em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos, disciplinados pela Lei 62/11 de 12 de Dezembro.


F. No entanto, nesta jurisprudência, a inadmissibilidade de recurso para o STJ encontra fundamento nas exigências de decisão célere do processo (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-09-2019, OLIVEIRA ABREU, Processo: 222/18.8YRLSB.S1), exigências por natureza ausentes na arbitragem de serviços mínimos a prestar durante a greve.


A questão não é nova e foi já reiteradamente decidida por este Supremo Tribunal de Justiça, justificando-se, assim, ao abrigo do artigo 663.º n.º 5 do CPC, aplicável ao recurso de revista ex vi artigo 679.º do CPC, a remissão para o que já foi decidido no Acórdão proferido no processo 1006/23.7YRLSB-A.S1, onde se pode ler designadamente que:


“(…) deve dizer-se que longe de ser uma violação do artigo 9.º do Código Civil a decisão objeto da presente Reclamação assenta na interpretação mais próxima da letra da lei, à luz da presunção de que o intérprete deve partir de um legislador razoável e que se sabe exprimir. Com efeito, se tudo o que a norma legal visasse fosse permitir o recurso para os tribunais judiciais, o legislador teria empregado outra redação, como, por exemplo, afirmado que a decisão arbitral era suscetível de recurso para os tribunais judiciais. A fórmula legal empregue sugere, ao invés, que houve o escopo de apenas permitir o recurso para o Tribunal da Relação e já não o recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça.


E ao contrário do que pretende o Reclamante há um interesse na celeridade da definição definitiva dos serviços mínimos. No nosso sistema legal a greve pode ser decretada por um período determinado, mais ou menos longo, mas também por período indeterminado. É certo que tradicionalmente a greve era decretada por alguns poucos dias, de tal modo que sendo os serviços mínimos definidos pelo tribunal arbitral, o Tribunal da Relação normalmente já se pronunciará após a greve ter cessado. No entanto, não só nada impede que a greve, como se referiu, seja decretada por um período substancialmente mais longo, fenómeno hoje mais comum, mormente pela difusão dos designados “fundos de resistência”, como a celeridade prende-se com a importância em definir rapidamente se deverão existir, e em caso afirmativo quais serão, os serviços mínimos a assegurar pelos grevistas. Com efeito, não só o incumprimento dos serviços mínimos pode acarretar consequências para a licitude da própria greve, como os trabalhadores grevistas que não cumpram os serviços mínimos expõem-se a responsabilidade, designadamente disciplinar. E, como já se disse, a própria lei é manifestamente sensível a esta exigência de celeridade, tanto mais que fixa para o próprio recurso de apelação um prazo mais curto que o normal”.


Face ao exposto, há que indeferir a presente reclamação.


Decisão: Indefere-se a reclamação. Junte-se cópia do Acórdão proferido no processo n.º 1006/23.7YRLSB-A.S1


Custas: Estando o Estado isento da taxa de justiça, condena-se o Reclamante nas custas de parte.


Lisboa, 8 de fevereiro de 2024


Júlio Gomes (Relator)


Ramalho Pinto


José Eduardo Sapateiro