Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
53/14.4YFLSB
Nº Convencional: SECÇÃO DO CONTENCIOSO
Relator: GREGÓRIO SILVA JESUS
Descritores: RECURSO CONTENCIOSO
JUIZ
CONCURSO CURRICULAR
ACESSO AOS TRIBUNAIS DA RELAÇÃO
AVALIAÇÃO CURRICULAR
DELIBERAÇÃO DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
PLENÁRIO
PARECERES
JÚRI
CONTENCIOSO DE MERA ANULAÇÃO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
ALEGAÇÕES
OBJECTO DO RECURSO
Data do Acordão: 01/22/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO CONTENCIOSO
Decisão: IMPROCEDENTE
Área Temática:
DIREITO ADMINISTRATIVO - PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO - ACTO ADMINISTRATIVO / VALIDADE DO ACTO ADMINISTRATIVO - PROCESSO ADMINISTRATIVO / IMPUGNAÇÃO DE ACTOS ADMINISTRATIVOS.
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA - ESTATUTOS PROFISSIONAIS / MAGISTRADOS JUDICIAIS.
Doutrina:
- Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, vol. IV, 1988, pp. 203 e 207; em comentário ao art. 36.º, nº 1 da anterior Lei de Processo nos Tribunais Administrativos.
- Gomes Canotilho e Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa” Anotada, 3ª ed., pp. 126/128.
- Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, 10ª ed., Almedina, pp. 477, 478, último §.
- Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, Comentário ao “Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2ª ed., pp. 34, 290 (ponto 2), 556 a 558.
- Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco Amorim, no "Código do Procedimento Administrativo", Comentado, 2.ª ed., p. 792.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS (CPTA), APROVADO PELA LEI Nº 15/2002 DE 22/02: - ARTIGOS 3.º, N.º1, 50.º, N.º1, 78.º, N.º4, 91.º, N.º6, 191.º, 192.º.
CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO (CPA): - ARTIGOS 124.º, N.º1, AL. A), 125.º, N.º1, 135.º.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 13.º.
ESTATUTO DOS MAGISTRADOS JUDICIAIS (EMJ): - 168.º, N.º1, 172.º, N.º1, 173.º, N.º2, 174.º, N.º1, 175.º, N.º1, 176.º, 178.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:

-DE 29/03/79, PROC. Nº 011830, 12/05/87, PROC. Nº 021941, 12/05/92, PROC. Nº 027969, 7/10/93, PROC. Nº 026625, 9/05/95, PROC. Nº 019146, 21/12/95, PROC. Nº 031968, E DE 3/03/00, PROC. Nº 044537, DE 27/05/09, PROC. Nº 0308/08, TODOS EM WWW.DGSI.PT .

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ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 19/03/02, PROC. Nº 01B2977, 26/10/07, PROC. Nº 07B184, 7/12/07, PROC. Nº 07B1522, 21/04/10, PROC. Nº 638/09.0YFLSB, 27/05/10, PROC. Nº 08B0453, 5/06/12, PROC. Nº 118/11.4YFLSB, 18/10/12, PROC. Nº 58/12.0YFLSB, 18/10/12, PROC. Nº 125/11.7YFLSB, 21/11/12, PROC. Nº 66/12.0YFLSB, 26/06/13, PROC. Nº 132/12.2YFLSB, E DE 21/03/13, PROC. Nº 136/12.5YFLSB, TODOS DISPONÍVEIS EM WWW.DGSI.PT , DE 27/10/09, PROC. Nº 2472/08 E DE 5/07/12, PROC. Nº 141/11.9YFLSB NOS SUMÁRIOS DO STJ, EM WWW.STJ.PT , BEM COMO OS DEMAIS NELES CITADOS;
-DE 29/11/05, PROC. N.º 1907/04 E N.º 2050/14.0YFLSB;
-DE 5/07/12, PROC. N.º 137/11.0YFLSB;
-DE 5/07/12, PROC. Nº 128/11.1YFLSB, 19/09/12, PROC. Nº 10/12.5YFLSB, EM WWW.DGSI.PT ;
-DE 5/07/12, PROC. N.º 147/11.8YFLSB, 19/09/12, PROC. N.º 23/12.7YFLSB, 18/10/12, PROC. N.º 140/11.0YFLSB, 21/03/13, PROC. N.º 93/12.8YFLSB, E DE 26/06/13, PROC. N.º 114/12.4YFLSB, EM WWW.DGSI.PT .
-DE 21/03/13, NO PROC. Nº 93/12.8YFLSB, EM WWW.DGSI.PT .
-DE 26/06/13, PROC. Nº 101/12.8YFLSB.
Sumário :

I - O CSM goza nas matérias de graduação e classificação da chamada discricionariedade técnica, insindicável, caracterizada por um poder que, embora vinculado aos preceitos legais, lhe deixa margem de liberdade de apreciação dos elementos fácticos;
II - A valoração que o CSM haja efectuado dos elementos do currículo de um concorrente é, em princípio, insusceptível de censura por este Supremo Tribunal, que somente poderá intervir quando se afigure que ocorreu um evidente erro manifesto, crasso ou grosseiro, ou a violação de qualquer regra que enforme aquela actividade, como seja a adopção de critérios ostensivamente desajustados ou violadores dos princípios da justiça, da imparcialidade, da igualdade, da proporcionalidade, da prossecução de interesse público, ou do dever de fundamentação;
III - Fora destes casos, o STJ não pode substituir-se à entidade recorrida, alterando para melhor a pontuação atribuída em alguns dos itens da avaliação curricular, por não estar no âmbito do contencioso de plena jurisdição;
IV - Não basta que a recorrente aluda a uma troca de impressões com colegas, como suporte da sua convicção de “que a prova de defesa curricular terá ocorrido sensivelmente nos mesmos moldes entre todos”, para que se possa ter por assegurada a necessária concretização e consistência da invocação de violação do princípio da igualdade;
V - Neste ponto, a alegação da recorrente não demonstra que em idênticas circunstâncias, com desempenhos funcionais equiparáveis, outros concorrentes tenham obtido tratamento substancialmente diverso, e melhor, daquele que ela teve. Só assim se poderia encarar a hipótese de uma identidade objectiva de situações a impor o mesmo critério de classificação, sendo inquestionável que cabe ao recorrente que imputa à deliberação o vício de violação do princípio da igualdade a prova dos respectivos pressupostos;
VI - É o requerimento inicial do recurso que delimita o seu âmbito, depois dele não podem ser arguidos novos vícios, ressalvados os casos de impossibilidade de arguição a não ser que só então tenham vindo ao conhecimento do recorrente, não sendo, como tal, lícito alargá-lo nas alegações apresentadas no âmbito do art. 176.º do EMJ;
VII – As alegações apresentadas no âmbito do art. 176.º do EMJ como facultativas que são, a falta da sua apresentação por parte do recorrente não impede que se conheça do recurso, não só não constituem o espaço e o momento próprios da delimitação do âmbito do recurso, como, coerentemente, e com excepção da ressalva estabelecida no art. 91.° n° 6 do CPTA, nelas não pode o recorrente proceder à ampliação do pedido;
VIII - A fundamentação do acto administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas o ponto de vista relevante para avaliar se o conteúdo da fundamentação é adequado ao imperativo da fundamentação obrigatória é o da compreensibilidade por parte do destinatário normal, colocado na situação concreta, de modo que deve dar-se por cumprido tal dever se a motivação contextualmente expressa lhe permitir perceber quais as razões de facto e de direito que determinaram o autor do acto a agir ou a escolher a medida adoptada;
X – A terminologia previamente estabelecida, através da qual o júri dá a conhecer de que modo se moveu dentro das molduras e instrumentos de análise classificativa que utilizou, em conjugação com a asserção de que a recorrente prestou provas públicas “defendendo bem o seu currículo” traduz indiscutível fundamentação, simples e sintética, mas objectiva e clara, reveladora de qual foi o iter lógico, qual o caminho seguido para a pontuação atribuída, para, perante a situação concreta do procedimento, se haver tomado aquela decisão;
XI - A jurisprudência deste Supremo Tribunal tem entendido, relativamente a deliberações do CSM para graduação de concorrentes ao STJ, ser suficiente uma fundamentação genérica, que enuncie os critérios da lei e particularize, de forma clara e congruente, a avaliação de cada um dos candidatos, sem que se imponha uma descrição exaustiva do processo cognitivo e valorativo que determinou o sentido de voto de cada um dos membros do Conselho, podendo também consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto.


Decisão Texto Integral:



        Acordam na Secção de Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça



        I - RELATÓRIO

AA, Juíza ..., a exercer funções como Juíza ... no Tribunal ..., veio nos termos do disposto nos arts. 164.º nº 1 e 168.º nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), interpor recurso contencioso da deliberação de 08/07/14 do Plenário do Conselho Superior da Magistratura (CSM), que aprovou a graduação final dos concorrentes ao 3.° Concurso Curricular de Acesso aos Tribunais da Relação, por discordância da pontuação que lhe foi atribuída nessa graduação.

Para tanto alegou, em síntese, o seguinte:

- Foi publicado, em 27 de Novembro de 2013, no DR, 2ª série, n° 230, o Aviso n° 14602/2013, de 20/11/2013, pelo qual se tornou pública a deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura que declarou aberto o 3.° concurso curricular de Acesso aos Tribunais da Relação nos termos do art. 46.° n° 2 do EMJ;

- Consta do Aviso n.° 14602/2013, no ponto 13, al. e), como critério de avaliação, o parâmetro “Prova pública de defesa do currículo, com ponderação entre 0 e 5 pontos”;

- Foi atribuída à recorrente, neste item, a classificação de 3 pontos, com a seguinte justificação: “A Exma Concorrente prestou provas públicas de defesa do currículo, no dia 21 de Maio de 2014, defendendo bem o seu currículo”;

- Considera que lhe deveria ter sido atribuída, pelo menos, a classificação de 4 pontos, uma vez que defendeu o seu currículo com compostura, correcção, urbanidade e simpatia, respondendo a todas as questões que lhe foram colocadas com prontidão e sinceridade;

- Por outro lado, apela ao princípio da igualdade entre os candidatos, nomeadamente à classificação que foi atribuída a outros colegas e amigos (de 4 pontos), no mesmo dia da prova da recorrente, uma vez que da troca de impressões com esses colegas concluiu que a prova de defesa curricular terá ocorrido sensivelmente nos mesmos moldes entre todos;

- Pelo que, não vê a recorrente motivo para ser diminuída nesse item em relação a esses colegas, solicitando, assim, que lhe seja atribuída a classificação de, pelo menos, 4 pontos neste item;

- Consta também do mesmo Aviso, como critério de avaliação, no ponto 13, o seguinte parâmetro:

f. - Outros factores que abonam a idoneidade da concorrente para o cargo a prover, com ponderação entre 0 e 5 pontos, designadamente: ii - Prestígio profissional e pessoal, tendo em conta, designadamente, a contribuição para a melhoria do sistema, para a formação nos tribunais de novos magistrados, bem como a dinâmica revelada nos lugares em que exerceu as funções (0 a 5 pontos);

- Indicou a recorrente, para a valorização do item em análise, que contribuiu, enquanto magistrada no tribunal de Trabalho de ..., para a formação de novos magistrados, tendo dado formação a juízes na fase do estágio de 1996 a 1999, sempre com muita competência, empenho e elevado sentido pedagógico (conforme documento comprovativo elaborado pelo CEJ que juntou);

- Quanto à contribuição para a melhoria do sistema, destacou o facto de ter auxiliado, sempre que foi solicitada pelo CSM, outros colegas em dificuldade, nomeadamente:

- no ano de 1999, enquanto juíza do Tribunal de ... prestou colaboração na comarca de ..., integrando semanalmente, às 2ªs feiras, os colectivos de juízes nos julgamentos dos processos de natureza criminal, serviço que prestou em regime de colaboração com os colegas da comarca, a pedido verbal do Sr. Inspector Judicial, Exmo Conselheiro ..., sem qualquer remuneração pela "acumulação";

- enquanto juíza do Círculo Judicial de ..., exerceu funções em regime de acumulação, em regime de permanência, no tribunal da comarca de ... (6 meses), no tribunal de Trabalho de ... (8 meses), e no tribunal da comarca de ... (2 meses);

- Foi-lhe atribuída a classificação de 4 pontos nesse item, sem se levar em consideração o trabalho desempenhado em regime de acumulação noutros tribunais;

- Considera que lhe deveria ter sido atribuída a pontuação máxima (de 5 pontos) uma vez que se disponibilizou sempre que foi solicitada, revelando sempre uma dinâmica, por todos reconhecida, nos tribunais em que exerceu funções;

- Isto no entendimento da recorrente de que o trabalho desempenhado nas comarcas onde exerceu tais funções não pode ser diminuído em relação ao trabalho desempenhado no âmbito forense nem no âmbito do ensino jurídico (tão valorizado em relação a alguns colegas), sob pena de se desvirtuar a verdadeira função judicial e o trabalho - extra – desempenhado;

- Consta ainda do mesmo Aviso, como critério de avaliação, o seguinte parâmetro: iii - Capacidade de trabalho. Neste item valoriza-se a quantidade e a qualidade do serviço, designadamente, a existência de serviço já prestado como auxiliar na Relação (0 a 12 pontos);

- Indicou a recorrente, quanto ao trabalho desempenhado:

- nos tribunais da 1ª instância onde exerceu funções, que sempre manteve rigorosamente em ordem o serviço, como resulta dos vários relatórios das inspecções a que foi submetida (sobretudo os dois últimos, nos quais lhe foi atribuída a classificação de "Muito Bom");

- no tribunal da Relação do ..., de Setembro de 2010 a 3/12/2013, relatou 301 acórdãos (à data da apresentação da nota curricular), muitos deles publicados no ITIJ, na Colectânea de Jurisprudência e no Boletim interno do tribunal da Relação ..., e analisou, enquanto adjunta, outros tantos acórdãos dos Exmos Colegas, com quem tem trabalhado, sempre de forma leal e correcta;

- a sua pendência, tendo em conta a estatística do mês de Novembro de 2013, é de 16 processos pendentes, ou seja, tem também a recorrente o serviço no Tribunal da Relação rigorosamente em dia, tendo relatado todos os acórdãos que lhe foram distribuídos, no prazo legal de 30 dias ou menos (sem excepção);

- Foi-lhe atribuído neste parâmetro, apenas a classificação de 10 pontos, quando deveria ser avaliada neste parâmetro com a pontuação máxima de 12 pontos (ou, pelo menos de 11)..

Conclui o seu requerimento peticionando, para além da citação dos interessados que podem vir a ser afectados pela decisão do STJ, “ A alteração da pontuação que foi atribuída à requerente nos seguintes itens:

- e) - 4 pontos, em vez dos 3 pontos que lhe foram atribuídos;

- f) - ii) - 5 pontos, em vez dos 4 pontos que lhe foram atribuídos;

- f) - iii) - 12 pontos (ou, pelo menos 11) em vez dos 10 pontos que lhe foram atribuídos, com a consequente graduação no lugar que lhe competir. “.

Juntou vários documentos.



Admitido o recurso, o CSM respondeu rejeitando tais argumentos e defendendo a improcedência do recurso, nesse propósito invocando, em síntese, que:

- em primeiro lugar, porque o recurso é de mera legalidade, e não de plena jurisdição; o pedido terá sempre de ser ou a anulação ou a declaração de nulidade ou de inexistência do acto recorrido, não a reapreciação dos critérios adoptados pelo órgão recorrido, nem o saber se estão bem ou mal determinados, como vem decidindo uniformemente a jurisprudência do Supremo Tribunal;

- em segundo lugar, porque apenas é pedida a reapreciação dos critérios adoptados e não é invocada a violação de qualquer regra que enforme a actividade de avaliação e graduação dos candidatos como sejam os princípios constitucionais da igualdade, da proporcionalidade, ou do dever de fundamentação;

- a recorrente apenas aflora a existência de uma violação do princípio da igualdade (n° 8 do seu petitório) a propósito da classificação atribuída à sua prova pública de defesa do currículo, porém, os argumentos que aduz são inaceitáveis, pretende trocar a avaliação isenta efectuada pelo júri pelas impressões trocadas entre alguns dos colegas interessados na graduação, e nem sequer demonstra a existência de tratamento desigual em situações idênticas;

- em terceiro lugar, importa ter em consideração que ao apreciar o mérito relativo dos candidatos ao provimento de vagas, o CSM age num espaço de valoração de matéria de facto, gozando, em ampla medida, e muito particularmente no que respeita ao factor da al. f), da chamada "discricionariedade técnica", pelo que a sindicabilidade contenciosa é fortemente restringida.;

- a recorrente limita-se a questionar os critérios seguidos, sem atender a que foram seguidos com imparcialidade em relação a todos os candidatos e que, uma sobrevalorização dos pontos que lhe são atribuídos corresponderia a uma manifesta injustiça em relação aos demais candidatos que foram classificados de acordo com os mesmos critérios;

- relativamente ao ponto f) - ii) "Prestígio profissional e pessoal, tendo em conta, designadamente, a contribuição para a melhoria do sistema, para a formação nos tribunais de novos magistrados, bem como a dinâmica revelada nos lugares em que exerceu as funções” valorável com 0 a 5 pontos, o júri atribuiu-lhe a pontuação de 4 pontos que correspondeu a pontuação máxima que atribuiu aos candidatos que foram graduados neste III CCATR, tendo em atenção que a recorrente foi considerada "uma magistrada com elevado prestigio profissional e pessoal a que as funções exercidas na formação de novos magistrados conferiram maior distinção";

- da análise do parecer do júri resulta que a recorrente teve tratamento igual a todos os outros candidatos a quem foi reconhecido elevado prestígio profissional e pessoal e o exercício de funções que conferiram maior distinção a esse prestígio, porem sem a excepcionalidade que poderia impor a pontuação máxima;

- o mesmo se passa com o ponto f) - iii) quanto à capacidade de trabalho: da análise do parecer do júri, acolhido pela deliberação recorrida, resulta que a recorrente teve a mesma pontuação que todos os demais candidatos a quem foi reconhecido o cumprimento pontual e sem atrasos do serviço a seu cargo, nos últimos anos, sendo distinguida com pontuação superior à daqueles que tiveram ou têm atrasos registados e não existindo nenhum candidato (incluindo a recorrente) que, face ao volume e complexidade do serviço, justificasse pontuação superior.



Citados os interessados susceptíveis de virem a ser directamente prejudicados pela procedência do recurso para responderem, nenhum exerceu esse direito.

Notificados que foram nos termos do art. 176.º do EMJ, recorrente e recorrido ofereceram alegações.

Nelas a recorrente reafirmou o que anteriormente havia alegado, introduzindo, todavia, a seguinte inovação na argumentação e pedido deduzidos:

- a decisão proferida não se encontra devidamente fundamentada quanto à classificação atribuída aos itens da “prova pública de defesa do currículo” e “prestígio profissional e pessoal”, não tendo sido neste tido em consideração o trabalho que desempenhou em regime de acumulação noutros tribunais.

- concluiu reiterando que deve ser alterada a pontuação que lhe foi atribuída nos mencionados itens, na medida que anteriormente indicou, e que “se assim se não entender, sempre seria de considerar a falta de fundamentação da deliberação quanto aos itens e) e f) ii) nestes aspectos, geradora da anulabilidade dessa parte da deliberação, nos termos do art. 135.° do CPA”.

Por sua vez, o recorrido concluiu as suas alegações nos seguintes termos:

“1) A Recorrente limita-se a discordar da pontuação que lhe foi atribuída e a formular o pedido de alteração da pontuação que lhe foi atribuída pelo que o recurso não pode merecer provimento porquanto é de mera legalidade, e não de plena jurisdição e o pedido terá de ser ou a anulação ou a declaração de nulidade ou de inexistência do acto recorrido e não a reapreciação dos critérios adoptados pelo órgão recorrido e porque não é invocada a violação de qualquer regra que enforme a actividade de avaliação e graduação dos candidatos;

2) Para existir violação do princípio da igualdade não basta trocar a avaliação isenta efectuada pelo júri após análise de todas as provas, pelas impressões subjectivas trocadas entre alguns dos colegas interessados na graduação, numa argumentação que não demonstra nem sequer procura demonstrar a existência de comportamentos discriminatórios ou de tratamento desigual em situações idênticas como decorre da natureza do princípio da igualdade;

3) Estão perfeitamente definidos os critérios de apreciação da defesa do currículo (3 pontos aos concorrentes que "defenderam bem o seu currículo" e 4 pontos aos concorrentes que "defenderam com distinção o seu currículo"), no âmbito da "discricionariedade técnica" do Conselho Superior da Magistratura na apreciação do mérito relativo que restringe fortemente a sindicabilidade contenciosa;     

4) O Conselho Superior da Magistratura actuou com imparcialidade em relação a todos os candidatos e, por isso, uma sobrevalorização dos pontos que são atribuídos à Recorrente corresponderia a uma manifesta injustiça em relação aos demais candidatos que foram classificados de acordo com os mesmos critérios e a uma frontal violação do princípio da igualdade;

5) A atribuição da pontuação de 4 pontos ao ponto f) - ii) "Prestígio profissional e pessoal " correspondeu à pontuação máxima atribuída aos candidatos que foram graduados neste III CCATR mas a distinção que lhe foi e é reconhecida - e o parecer do júri dá conta das razões dessa distinção - sem que se justifique contudo, o reconhecimento de que tem um prestígio profissional e pessoal excepcional e manifestamente superior ao de todos os outros candidatos, determinante de uma melhor classificação;

6) O mesmo se passa com o ponto f) - iii) quanto à capacidade de trabalho: da análise do parecer do júri, acolhido pela deliberação recorrida, resulta que a Recorrente teve a mesma pontuação que todos os demais candidatos a quem foi reconhecido o cumprimento pontual e sem atrasos do serviço a seu cargo, nos últimos anos, sendo distinguida com pontuação superior à daqueles que tiveram ou têm atrasos registados e não existindo nenhum candidato (incluindo a Recorrente) que, face ao volume e complexidade do serviço, justificasse pontuação superior;

7) A argumentação ou fundamentação nova em que a Recorrente discute a desvaloração atribuída do trabalho nas comarcas comparativamente com a valoração do trabalho no âmbito forense e do ensino jurídico não pode ser considerada como fundamento novo do pedido nos termos do art. 91° n° 5 do CPTA;

8) A distinta valoração dada às actividades no âmbito forense ou no ensino jurídico decorre do Aviso n° 14602/2013, de abertura do 3.º Concurso Curricular de Acesso aos Tribunais da Relação cujas normas não foram postas atempadamente em causa pela Recorrente e este, limitou-se a concretizar a imposição do n° 7 do art. 47° do Estatuto dos Magistrados Judiciais de, na graduação final, tomar em consideração em 40%, a avaliação curricular e adoptando os factores de ponderação previstos no n° 1 do art. 52° do Estatuto dos Magistrados Judiciais para o concurso para o Supremo Tribunal de Justiça (al. e): actividade desenvolvida no âmbito forense ou no ensino científico);

9) Ainda assim, o peso do trabalho judicial plasmado em vários itens é muito superior aos 10 pontos máximos da cotação da actividade desenvolvida no âmbito forense ou no ensino científico;

10) No caso concreto, apenas quatro dos 15 concorrentes graduados obtiveram pontos por causa do exercício dessas actividades, num máximo de 3 pontos, o que reduz ainda mais a relevância concreta desse item e mesmo descontando os pontos obtidos por aqueles quatro candidatos por causa  da actividade desenvolvida no âmbito forense ou no ensino científico, ainda assim, a graduação da Recorrente não seria alterada;

11) Não ocorre falta de fundamentação da deliberação quanto aos itens e) e f) ii) nem pode anular-se essa parte da deliberação porquanto também é extemporânea a invocação da anulabilidade por falta de fundamentação e essa ampliação ou substituição (total) do pedido, em momento processual em que essa modificação da instância já não era admissível, nos termos do art. 91° n° 6 do CPTA, por referência aos arts. 45° e 63° do mesmo diploma;

12) A invocação de falta de fundamentação não se encontra estribada em nenhuma factualidade nem se encontra qualquer fundamento de facto que permita sustentar a invocada insuficiência/falta de fundamentação;

13) Os itens em causa estão fundamentados em termos claros e precisos de forma a que o destinatário compreenda o sentido do acto e os seus motivos, habilitando-o a querendo, impugná-lo;

14) Mais não seria necessário face às especificidades da prova de defesa do currículo e face aos termos da fundamentação quanto ao prestígio profissional e pessoal com recurso anunciado à análise dos relatórios de inspecção onde constam todos os elementos pertinentes que a Recorrente pretende ver valorados e que afinal já foram devidamente apreciados, incluindo "o trabalho desenvolvido em regime de acumulação noutros tribunais" porquanto a pontuação atribuída teve em atenção a análise do que consta dos relatórios de inspecção”.



Foi, então, momento para a Exma Procuradora-Geral Adjunta neste STJ emitir o seu douto Parecer, constante de fls. 197/200, no qual formulou juízo de concordância com o recorrido, consentâneo com a improcedência do recurso, que rematou nos seguintes termos:

 “Pelo que vai dito, entendemos que o recurso deve ser rejeitado por manifesta improcedência ou, se houver que ser conhecido, deve ser julgado improcedente. “.

Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, colhidos que foram os vistos legais, cumpre decidir.

           

     II-FUNDAMENTAÇÃO

DE FACTO

Os factos dados por apurados na deliberação recorrida que aqui importam são os seguintes:

A) Na Sessão Plenária Ordinária do CSM, realizada em 8/07/14, foi tomada a seguinte deliberação:

 “aprovar por unanimidade o parecer do júri, que aqui se dá por integralmente reproduzido, ficando em anexo a esta acta, com as alterações supra referidas. -

1) ...

2) ...

3) ...

4) ...

5) ...

6) ...

7) ...

8) ...

9) ...

10) ...

11) ...

12) ...

13) ...

14) ...

15) ...”.

B) Por seu turno, o Parecer emitido pelo Júri no que directamente diz respeito à recorrente é do seguinte teor:

1. A Exm.ª  Concorrente foi admitida à frequência do VI Curso Normal de Formação na Magistratura Judicial, tendo obtido, em 12 de Julho de 1989, a classificação de Suficiente no respectivo concurso, tendo ficado graduada em 35.º lugar, entre 39 candidatos aprovados.

1.1. Obteve ao longo da sua carreira na judicatura, as seguintes classificações de serviço

– Bom, em 9 de Fevereiro de 1993, como juiz de direito do Tribunal Judicial da comarca de ...; 

– Bom, em 30 de Novembro de 1993, como juiz de direito na comarca de ...;

– Bom, em 10 de Fevereiro de 1998, como juiz de direito do Tribunal Judicial da comarca de ... – ... juízo;

– Bom, em 15 de Junho de 2000, como juiz de direito no Tribunal do Trabalho de ...;

– Bom com distinção, em 1 de Outubro de 2002, como juiz de direito no ... Juízo do Tribunal do Trabalho de ...;

– Muito Bom, em 20 de Junho de 2006, como juiz de direito no Circulo Judicial de ... e no ... Juízo do Tribunal do Trabalho de ....

– Muito Bom, em 27 de Novembro de 2012, como juiz de direito no Circulo Judicial de ... (entre 16.4.2006 e 31.8.2010) e como auxiliar no Tribunal da Relação do ... (entre 1.9.2010 e 31.12.2011).

Por deliberação do Plenário do CSM de 13 de Julho de 2010, foi destacada como Juiz de Direito Auxiliar do Tribunal da Relação do ..., tendo o destacamento sido renovado em 12 de Julho de 2011, 10 de Julho de 2012 e 9 de Julho de 2013.

1.2. Obteve as seguintes graduações em cursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais [ponto 13.a) do Aviso]:

• Centro de Estudos Judiciários: Suficiente

1.3. Licenciou-se em Direito, pela Faculdade de Direito da Universidade de ... em 19 de Julho de 1986, com a classificação de ... valores.

1.4. Não apresentou trabalhos científicos. 

1.5. A Exma. Senhora Juiz exerceu as funções de formadora dos Sr.s Auditores de Justiça, na área laboral, nos anos de 1996 a 1999.

1.6. No âmbito da al. f), do ponto 13, do Aviso de abertura de concurso, importa considerar que:

1.6.1. A Exma. Concorrente granjeou ao longo da carreira, como decorre dos relatórios de inspecção que lhe respeitam, grande prestígio, pelo modo como foi desempenhando as suas funções, atestando-se nesses relatórios as suas altas qualidades pessoais e profissionais, acentuando-se a sua elevada categoria intelectual e excelente cultura jurídica aliadas a uma postura de rigor e notável método profissional, dignificando a justiça.

Também no Tribunal da Relação do ... goza de prestígio e consideração junto dos seus pares, dando plena conta dos processos que lhe são distribuídos quer do ponto de vista técnico, quer quantitativamente.

1.6.2. A Exma. Senhora Juiz apresentou sete trabalhos forenses, acórdãos proferidos na secção cível do Tribunal da Relação do ..., a saber:

i) Acórdão proferido na Apelação n.º 4944/12.9TBSTS-A.P1, datado de 28.6.2013 (publicado no ITIJ) sobre Plano de Revitalização CIRE – Créditos do Estado, em que sustenta, após decidir a questão prévia da admissibilidade do recurso por considerar cumprido o ónus de formular conclusões, que deixou de ser legalmente possível homologar um plano de revitalização que contemple redução, extinção ou moratória de créditos fiscais sem que o Estado o tenha votado favoravelmente após a alteração introduzida pela Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, ao art.º 30.º da LGT. Trata-se de decisão que alinha de forma clara todos os argumentos a favor da tese que perfilha, com suporte na interpretação dos vários diplomas aplicáveis e com recurso a jurisprudência e doutrina pertinentemente citadas.

ii) Acórdão proferido na Apelação n.º 6914/10.2TBMTS.P1, datado de 11.4.2013 (publicado no ITIJ), que versa sobre a caducidade da denúncia dos defeitos da obra, em que sustenta que “deve ser equiparado ao construtor do imóvel o promotor da sua construção, ainda que por intermédio de empreiteiro, sendo aplicáveis os prazos de caducidade do art.º 1225.º e não do art.º 917.º, ambos do Código Civil; compete ao comprador provar que efectuou a denúncia dos defeitos da coisa comprada nos termos do art.º 342.º, n.º1, do Código Civil, sendo do vendedor o ónus da prova do decurso do prazo da denúncia (art.º 343.º, n.º 2, do mesmo Código)”, procedendo a uma análise clara da situação e dos seus contornos jurídicos com apoio de jurisprudência e doutrina pertinente.

iii) Acórdão proferido no Proc. n.º 3544/09.5TBVCD.P1, datado de 12.9.2013, em que previamente decide a inadmissibilidade do recurso da matéria de facto se o recorrente não indicar os concretos meios probatórios em que baseia a sua discordância  e que aborda, como tema central,  as cláusulas contratuais gerais e a cláusula penal, sustentando ser dos RR. o ónus da prova da nulidade de cláusulas inseridas em contratos que alegam ser de adesão ou sujeitos ao regime do D.L. nº 446/85, de 25 de Outubro, competindo-lhes também alegar e provar a manifesta excessividade de uma cláusula penal do contrato; aborda a questão dos limites da responsabilidade os sócios de uma sociedade extinta pelas dívidas e defende que ocorrendo a extinção de uma sociedade na pendência de acção contra ela movida, deverá a A. alegar e provar, para que o sócio seja condenado em substituição da sociedade extinta, em articulado superveniente, e logo que seja conhecida a extinção, que o sócio recebeu em partilha bens da sociedade”. Discorre de forma clara sobre as várias vertentes dos contornos jurídicos da situação, com apoio de jurisprudência e doutrina pertinente e aplica-os ao caso concreto.

iv) Acórdão proferido no Proc. n.º 707/09.7TBPVZ.P1, datado de 14.3.2013 (publicado no ITIJ), em que aborda a relevância negativa da causa virtual defendendo que o não pagamento indevido, pelo banco, do montante dos cheques apresentados a pagamento pelo portador do mesmo, é a causa real, efectiva, do dano sofrido, sendo a falta de aprovisionamento da conta do sacador, a causa virtual desse mesmo dano – isto é, constitui um facto que teria produzido aquele mesmo dano, se não operasse a causa real, levando à exoneração da responsabilidade indemnizatória do banco sacado (autor da causa real), decidindo fundamentadamente de forma clara e sintética como se impunha, sempre com apoio de jurisprudência e doutrina pertinente aplicadas ao caso concreto.

v) Acórdão proferido no Proc. n.º 17103/12.1YIPRT.P1 datado de 16.5.2013 em que sustenta  a responsabilidade do ACE e das restantes agrupadas pelo incumprimento de contrato de fornecimento por uma das agrupadas antes da constituição formal e registo da ACE, com fundamentação clara e apoiada na jurisprudência e na doutrina.

vi) Acórdão proferido no Proc. n.º 2936/10.1TBPRD.P1, datado de 12.11.2013, aborda a questão do dano biológico em acidente de viação, considerando-o como “dano patrimonial futuro desde que ele tenha repercussão na actividade profissional do A., considerada nessa repercussão (negativa) o maior esforço que ele tenha de fazer para desempenhar as tarefas que vinha desempenhando, devendo ser compensado por esse esforço suplementar” fundamentando com clareza e equilíbrio a posição assumida, com apelo a jurisprudência e doutrina pertinente.

vii) Acórdão proferido no Proc. n.º 11187/05.6TBMTS.P1, datado de 26.11.2013 (publicado no ITIJ), em que numa expropriação, a propósito do justo valor indemnizatório, decide que “a avaliação dos solos nos termos previstos no artº 26º nº 12 do CE é feita em função do valor médio das construções existentes ou que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela expropriada; essa avaliação não impede o recurso pelos peritos aos critérios referenciais previstos nos artºs 28º e 26º do CE (caso haja ou não construções a avaliar, respectivamente)”, analisando de forma clara a dimensão constitucional e legal da questão.

Apreciação global:

Os acórdãos em referência revelam profundos conhecimentos jurídicos, com grande domínio dos atinentes conceitos jurídicos do Direito substantivo (também na sua dimensão constitucional no trabalho vii) e processual, com uma argumentação e uma linguagem muito clara e de fácil compreensão adequada à realidade dos casos concretos, abordando, com segurança e desenvoltura os assuntos tratados, com recurso a doutrina e jurisprudências com interesse para cada caso.

São, em suma, trabalhos de muito boa qualidade.

1.6.3. A Exma. Senhora Juiz revela um adequado empenho na sua formação contínua, designadamente tendo frequentado várias acções de formação no âmbito do Centro de Estudos Judiciários:

- A nova legislação do trabalho Porto, 4 e 5 de Fevereiro de 2000;

- O novo regime jurídico da acção executiva - Porto, 26 de Setembro de 2003;

 - Abusos sexuais sobre crianças e jovens - Porto, 28 de Janeiro e 18 de Março de 2005;

- A Nova Lei de Arbitragem Voluntária, Porto, 23 de Fevereiro de 2012;

- A impugnação da matéria de facto, por vídeo-conferência no Porto, em 30 de Outubro de 2012;

Cursos organizados pela Universidade Católica do Porto:

- A insolvência de pessoas singulares, em 11 de Junho de 2012;

-Justiça Constitucional, em 14 de Junho de 2012;

- Mobbing e outros riscos psicossociais no trabalho, em 19 de Junho de 2012.

Colóquio organizado pelo Instituto de Direito Judiciário:

- A reforma do Código de Processo Civil, Porto, em 8 e 9 de Março de 2013.

Cursos Formação Técnica:

Participou em vários cursos de informática (das várias versões do sistema Word) sempre que foi necessário, para acompanhar os meios técnicos disponibilizados pelo tribunal.

No ano de 2008 participou ainda do curso de formação do programa "citius", sistema onde passou a trabalhar desde o início da sua implantação no Tribunal de Matosinhos

Domina as novas tecnologias de informação.

1.6.4. À Exma. Concorrente não foi aplicada qualquer pena disciplinar sujeita a registo.

1.6.5. Dos elementos estatísticos resulta que na 1ª instância manteve o serviço em dia, sem atrasos, com boa produtividade e bons prazos de resposta (designadamente, no que respeita ao serviço analisado na última inspecção).

No Tribunal da Relação do ... relatou 301 acórdãos até 3.12.2013 (45 publicados no ITIJ) e tinha 16 processos pendentes em 30 de Novembro de 2013 (transitados 39 de 2010, em 2011 foram distribuídos 98, findos 63 e transitaram 18; em 2012, foram distribuídos 90, findos 94 e transitaram 14; em 2013 foram distribuídos 85 e findos 62).

1.6.6. Goza de elevado prestígio pessoal e profissional como se evidencia dos relatórios de inspecção. Revela uma conduta exemplar, método, capacidade de trabalho e preocupação em realizar a uma justiça rápida e eficaz. É dotado de uma excepcional capacidade de trabalho e igualmente elevada qualidade de serviço, designadamente no já prestado na Relação.

É uma magistrada com elevado prestígio profissional e pessoal a que as funções exercidas na formação de novos magistrados conferiram maior distinção.

2. A Exma. Concorrente prestou provas públicas de defesa do currículo, no dia 21 de Maio de 2014, defendendo bem o seu currículo.

3. Considerando todos os elementos supra enunciados, propõe-se como pontuação para os factores ínsitos nos n.ºs 13 e 14 do Aviso de abertura do 3.º concurso curricular de acesso aos Tribunais da Relação, aberto pelo aviso de abertura n.º 14602/2013, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 230, de 27 de Novembro de 2013 e constantes do disposto no artigo 47.º, do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a seguinte:

Ponto n.º 13 do Aviso

– alínea a):     1 ponto;

– alínea b): 2 pontos;

– alínea c): 0 pontos;

– alínea d): 0 pontos;

– alínea e): 3 pontos;

– alínea f):

f) i): 26 pontos;

f) ii): 4 pontos;

f) iii): 10 pontos;

f) iv): 0 pontos;

f) v): 2 pontos;

Ponto n.º 14 do Aviso: 120 pontos.

— Perfazendo o total de 168 pontos.”.

DE DIREITO

No conjunto da sua intervenção, requerimento de interposição de recurso e alegações, a recorrente suscita três questões: a alteração da pontuação que lhe foi atribuída em alguns dos itens da avaliação curricular, a violação do princípio da igualdade, e a falta de fundamentação da deliberação quanto a alguns dos itens.

Ponderemos cada uma delas.

A) Alteração da pontuação atribuída em alguns dos itens da avaliação curricular

Pretende a Dra AA que este Supremo Tribunal altere a pontuação que lhe foi atribuída nos itens acima mencionados, no decurso da graduação ao 3.° Concurso Curricular de Acesso aos Tribunais da Relação.

Concretamente, reclama que lhe sejam conferidos 4 pontos em vez dos 3 atribuídos no factor da “prova pública de defesa do currículo”, 5 pontos em vez dos 4 pontos atribuídos quanto ao seu "Prestígio profissional e pessoal”, e 12 pontos, ou pelo menos 11, em vez dos 10 pontos que lhe foram atribuídos quanto ao item “capacidade de trabalho”, com o consequente reflexo da sua graduação no lugar que lhe competir.

Vejamos.

De acordo com o nº 1 do art. 168.º do EMJ, “das deliberações do Conselho Superior da Magistratura recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça”, constituindo fundamentos de recurso “os previstos na lei para os recursos a interpor dos actos do Governo”, consoante nº 5 do mesmo artigo.

São subsidiariamente aplicáveis as normas que regem os trâmites processuais dos recursos de contencioso administrativo interpostos para o Supremo Tribunal Administrativo” (art. 178.º do referido diploma).

Por sua vez, o art. 3.º, nº 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aprovado pela Lei nº 15/2002 de 22/02, restringe a actuação dos tribunais administrativos à apreciação do cumprimento das normas e princípios jurídicos que vinculam a administração, e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação. Preserva dos poderes de condenação dos tribunais administrativos os “espaços de valoração próprios do exercício da função administrativa”[1]. Acresce que de acordo com o nº 1 do art. 50.º do mesmo Código, “a impugnação de um acto administrativo tem por objecto a anulação ou a declaração de nulidade ou inexistência desse acto”.

Resulta da conjugação destes normativos, estarmos ante um recurso contencioso de mera anulação, regulamentado nos arts. 168.º e segs. do EMJ, e art. 192.º do CPTA, que não de mérito. Recurso esse em que, como, sem divergência e de forma reiterada, vem sendo afirmado na doutrina e na jurisprudência deste Supremo Tribunal, a que aderimos, terá sempre o pedido de ser a anulação, ou a declaração de nulidade, ou de inexistência do acto recorrido (cf., neste sentido, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco Amorim, no Código do Procedimento Administrativo, Comentado, 2.ª ed., pág. 792, Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, na obra citada, pág. 290 (ponto 2), e na jurisprudência deste Tribunal, entre muito outros, os Acs. de 19/03/02, Proc. nº 01B2977, 26/10/07, Proc. nº 07B184, 7/12/07, Proc. nº 07B1522, 21/04/10, Proc. nº 638/09.0YFLSB, 27/05/10, Proc. nº 08B0453, 5/06/12, Proc. nº 118/11.4YFLSB, 18/10/12, Proc. nº 58/12.0YFLSB, 18/10/12, Proc. nº 125/11.7YFLSB, 21/11/12, Proc. nº 66/12.0YFLSB, 26/06/13, Proc. nº 132/12.2YFLSB, e de 21/03/13, Proc. nº 136/12.5YFLSB, todos disponíveis na base de dados do IGFEJ, de 27/10/09, Proc. nº 2472/08 e de 5/07/12, Proc. nº 141/11.9YFLSB nos Sumários, bem como os demais neles citados).

Isto é, emana dos mencionados normativos do CPTA estarmos perante um recurso de legalidade e não de mérito, afastando-se, assim, a possibilidade de se apreciar o conteúdo da decisão recorrida fazendo sobre ela juízos valorativos. O mesmo é dizer que, não pode este Tribunal intrometer-se no conteúdo da decisão recorrida, apenas lhe cabendo pronunciar-se sobre a sua legalidade.

Por se revelar perfeitamente ajustado ao caso, transcrevemos o que judiciosamente a este título se decidiu no Acórdão deste Supremo Tribunal de 5/07/12, já citado: “ O CSM goza, nas matérias de graduação e classificação, da chamada discricionariedade técnica, insindicável, caracterizada por um poder que, embora vinculado aos preceitos legais, lhe deixa margem de liberdade de apreciação dos elementos fácticos. Os actos praticados no exercício de um poder discricionário só são contenciosamente sindicáveis nos seus aspectos vinculados – a competência, a forma, as formalidades de procedimento, o dever de fundamentação, o fim do acto, a exactidão dos pressupostos de facto, a utilização de critério racional e razoável e os princípios constitucionais da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade[2].

Nesta conformidade, a valoração que o CSM haja efectuado dos elementos do currículo da recorrente é, em princípio, insusceptível de censura por este Supremo Tribunal, que somente poderá intervir quando se afigure que ocorreu um evidente erro manifesto, crasso ou grosseiro, ou a violação de qualquer regra que enforme aquela actividade, como seja a adopção de critérios ostensivamente desajustados ou violadores dos princípios da justiça, da imparcialidade, da igualdade, da proporcionalidade, da prossecução de interesse público, ou do dever de fundamentação.

Fora destes casos, deve entender-se que o juízo emitido pelo CSM se insere na ampla margem de liberdade de apreciação e avaliação de que, como órgão administrativo, goza, sendo, por isso, os respectivos elementos incontroláveis pelos órgãos jurisdicionais[3].

Destarte, avaliado o recurso na sua essência, como manifestação de desacordo com a pontuação que o CSM lhe atribuiu aos aludidos parâmetros, e numa abordagem imediata, ter-se-ia de rejeitar o mesmo, por a referida valoração ser insusceptível de sindicar por este STJ, como acima já expusemos. Sem dúvida que o STJ não pode substituir-se à entidade recorrida, alterando para melhor a pontuação, por não estar no âmbito do contencioso de plena jurisdição.

Acontece que a recorrente, no n° 8 do seu petitório, aborda a existência de uma violação do princípio da igualdade a propósito da pontuação atribuída à sua “prova pública de defesa do currículo”, razão da admissibilidade do recurso e do conhecimento que se segue.

B) Violação do princípio da igualdade

. No quadro desta invocação argumenta a recorrente que “apela... ao princípio da igualdade entre os candidatos, nomeadamente à classificação que foi atribuída a outros colegas e amigos (de 4 pontos), no mesmo dia da prova da recorrente, uma vez que da troca de impressões com esses colegas concluiu a requerente que a prova de defesa curricular terá ocorrido sensivelmente nos mesmos moldes entre todos.

Pelo que, não vê a recorrente motivo para ser diminuída nesse item em relação a esses colegas.

Solicita assim a recorrente que lhe seja atribuída a classificação de, pelo menos, 4 pontos neste item“.

Apreciando.

O artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa[4] consagra o princípio da igualdade entre todos os cidadãos. Princípio estruturante do Estado de direito democrático e social, tem por base constitucional a “igual dignidade social” de todos os cidadãos, traduzindo-se na regra da generalidade na atribuição de direitos e na imposição de deveres.

O seu âmbito de protecção abrange a proibição do arbítrio, servindo o princípio da igualdade como “princípio negativo de controlo”, nesta perspectiva exigindo positivamente um tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de facto diferentes, a proibição de discriminação, que não significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciações de tratamento, apenas não sendo legítimas quaisquer diferenciações de tratamento entre cidadãos fundamentadas em qualquer dos motivos indicados no nº 2 do art. 13.º, e a obrigação de diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, o que significa que o princípio da igualdade tem uma “função social”, e pressupõe o dever de eliminação ou atenuação, pelos poderes públicos, de desigualdades de natureza social, económica e cultural [5].

Fundamenta a recorrente a violação deste principio unicamente no facto de ter concluído, pela troca de impressões que teve com colegas que prestaram prova no mesmo dia que a sua, “que a prova de defesa curricular terá ocorrido sensivelmente nos mesmos moldes entre todos”, pelo que não vê motivo para ser diminuída nesse item em relação a esses colegas.

Isto é, pretende que este Tribunal troque a avaliação isenta, idónea, e qualificada efectuada pelo júri após análise de todas as provas, por impressões subjectivas, indemonstradas, trocadas entre colegas, indeterminados, interessados na graduação, o que só por si é inaceitável, como ainda extravasa o poder de censura deste Tribunal, por estar a apreciação feita quanto a este factor, e a correspondente pontuação atribuída sem erro manifesto ou crasso que não vem alegado ou concretizado, dentro do grau de discricionariedade na apreciação do mérito dos candidatos.

Como o recorrido bem refere, “a argumentação da Recorrente não demonstra nem sequer procura demonstrar a existência de comportamentos discriminatórios nem de tratamento desigual em situações idênticas”. De facto, não basta que a recorrente aluda a uma troca de impressões com colegas, como suporte de uma convicção, de “que a prova de defesa curricular terá ocorrido sensivelmente nos mesmos moldes entre todos”, para que se possa ter por assegurada a necessária concretização e consistência da invocação de violação do princípio da igualdade.

Neste ponto, a alegação da recorrente não demonstra que em idênticas circunstâncias, com desempenhos funcionais equiparáveis, outros concorrentes tenham obtido tratamento substancialmente diverso, e melhor, daquele que ela teve. Só assim se poderia encarar a hipótese de uma identidade objectiva de situações a impor o mesmo critério de classificação, sendo inquestionável que cabe ao recorrente que imputa à deliberação o vício de violação do princípio da igualdade a prova dos respectivos pressupostos.

Em suma, não se demonstra, não se concretiza, que, em idênticas circunstâncias, com desempenhos equiparáveis, outros juízes graduados tenham obtido tratamento substancialmente diverso daquele que teve a recorrente.

Daqui resulta por indemonstrada a violação do princípio constitucional de igualdade, pois a deliberação não tratou de forma diferente situações iguais.

C) Falta de Fundamentação

Subsidiariamente ao seu pedido inicial, mas em sede das alegações que ofereceu na permissão do art. 176.º do EMJ, a recorrente aduziu um outro. Aditou que sempre será de considerar a falta de fundamentação da deliberação quanto à classificação atribuída aos itens e) e f) ii), geradora da anulabilidade dessa parte da deliberação, nos termos do art. 135.° do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

Ora, esta invocação da anulabilidade por falta de fundamentação é tardia e não pode ser considerada no presente recurso. A ampliação do pedido ocorre extemporaneamente, em momento processual em que a modificação da instância já não é admissível, a não ser na previsão estabelecida no art. 91.° n° 6 do CPTA, por referência aos arts. 45.°, 63.° e 70.º do mesmo diploma, que não é o caso[6].

Acresce que mandando o art. 178.º do EMJ aplicar subsidiariamente as normas que regem os trâmites processuais dos recursos de contencioso administrativo interpostos para o Supremo Tribunal Administrativo, há que atentar ao que dispõe o art. 191.º do CPTA, nos termos do qual as remissões que em lei especial sejam feitas para o regime do recurso de contencioso de anulação de actos administrativos consideram-se feitas para o regime da acção administrativa especial.

Deste regime, definido nos arts 78.º e segs., emana a dispensabilidade das alegações, o seu carácter facultativo (cfr. nº 4 do art. 78.º e a epígrafe do art. 91.º). Neste sentido se pronunciou já o Acórdão desta Secção de Contencioso, de 29/11/05, Proc. n° 1907/04, (Rel. Cons. Fernandes Cadilha) assim sumariado, na parte pertinente:

V – O art. 178° do EMJ manda aplicar subsidiariamente as normas que regem os trâmites processuais dos recursos de contencioso administrativo interposto para o STA; não contendo o art. 176° do mesmo Estatuto um regime específico quanto á sanção processual a aplicar por falta de alegações, haverá que entrar em linha de conta com o que dispõe o novo CPTA, que se aplica aos processos instaurados a partir de 01-01-2004.

VI - O art. 78° ss. deste Código não só admite a possibilidade de ser requerida a dispensa de alegações (n° 4 do art. 78°) como prevê que as alegações, quando deva ocorrer essa fase processual, são meramente facultativas.

VII - Assim, a falta de apresentação de alegações por parte do recorrente não impede que se conheça do recurso.”.

Deste modo, como facultativas que são, estas alegações não só não constituem o espaço e o momento próprios da delimitação do âmbito do recurso, como, coerentemente e com excepção da ressalva estabelecida naquele art. 91.° n° 6, nelas não pode o recorrente proceder à ampliação do pedido.

É o requerimento inicial do recurso que delimita o seu âmbito, depois dele não podem ser arguidos novos vícios, ressalvados os casos de impossibilidade de arguição a não ser que só então tenham vindo ao conhecimento do recorrente, não sendo, como tal, lícito alargá-lo nas alegações[7].

Nessa consonância se compreende a imposição feita no nº 1 do art. 172.º do EMJ de que o requerimento de interposição do recurso deve conter “os fundamentos de facto ou de direito… e a formulação clara e precisa do pedido“, a possibilidade conferida no nº 2 do art. 173.º do convite ao recorrente para corrigir as deficiências do mesmo, bem como a utilidade e eficácia das respostas do recorrido e dos interessados que possam ser directamente prejudicados pela procedência do recurso[8], previstas nos nºs 1 dos arts. 174.º e 175.º do mesmo EMJ.

Como refere Diogo Freitas do Amaral, em comentário ao art. 36.º, nº 1 da anterior Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, mas que mantém perfeita actualidade face à similitude dos regimes, o vício ou os vícios de que enferma o acto recorrido devem ser especificados na fundamentação do recurso que deve integrar a petição inicial, sendo a fase das alegações a fase em que os sujeitos processuais, uma vez delimitadas as posições da Administração e dos particulares, desenvolvem as razões de facto e de direito que julgam assistir-lhes[9].

Nesta linha de entendimento se posiciona também o Acórdão desta Secção de Contencioso de 26/06/13, Proc. nº 101/12.8YFLSB, assim sumariado no site do Supremo:

XV - As alegações determinadas no âmbito do artigo 176.° do EMJ não servem para introduzir no recurso novos fundamentos, eventualmente suprindo falhas das iniciais alegações que moldaram o âmbito do recurso. Daqui decorre que a impugnante apenas pode desenvolver linhas argumentativas já explanadas e não enxertar novas razões de divergência com o decidido, o que conduz à não apreciação de questões novas.”.

Por fim, como adverte a Exma Procuradora - Geral Adjunta no seu douto Parecer, “o que a recorrente veio acrescentar na alegação não serve para reconfigurar o pedido que apresentou com a petição do recurso pois só o pedido aí formulado pode "formatar" o recurso e balizar o alcance e âmbito da decisão que sobre o mesmo se pode tomar, não sendo, como não é e bem refere o recorrido, um caso de modificação objetiva da instância a fazer intervir o disposto no art° 91°, n° 6 do CPTA. “.

Em suma, a Dra. AA não suscitou no requerimento de interposição do recurso a falta de fundamentação da deliberação no que respeita à pontuação aplicada aos itens e) e f) ii), nem peticionou a anulabilidade da deliberação. Daí que não seja admissível conhecer desse vício e pedido só arguidos nas conclusões das alegações finais apresentadas no âmbito do art. 176.° do EMJ, por extemporaneidade de tal arguição, e por corresponder a vício que, a mostrar-se objectivado, já estava consumado e era conhecido à data da apresentação do requerimento de interposição do recurso, nada tendo de posterior, de superveniente. Aliás, diga-se, que neste último sentido nem sequer algo foi invocado, sendo certo que se o fosse a superveniência se mostraria contrária à própria natureza do vício em causa.



 Sempre se dirá, porém, o seguinte:

Sem dúvida, estamos perante um acto que obrigatoriamente deve ser fundamentado (al. a) do nº 1 do art. 124.º do CPA), e o ponto da fundamentação a que a recorrente primeiramente se reporta diz respeito à decisão que lhe atribuiu 3 pontos na “prova pública de defesa do currículo”, a que se refere a al. e) do nº 13 do citado aviso nº 14.602/2013, de 20/11/13, que declarou aberto o concurso curricular de acesso aos Tribunais da Relação.

Entende a recorrente que lhe deveriam ser atribuídos, pelo menos, 4 pontos. Como no início se vincou, não se pode discutir neste recurso a valia ou o nível da respectiva defesa do currículo perante o júri, questão cuja apreciação por este Tribunal está excluída por se situar no âmbito da discricionariedade técnica da Administração. Apenas se questiona a fundamentação da decisão da aludida pontuação, materializada na expressão de que a recorrente prestou provas públicas “defendendo bem o seu currículo”.

No caso concreto, a deliberação impugnada incorporou o parecer do júri do concurso, e desse modo incluiu a explicitação e concretização dos critérios legais de pontuação assim como a justificação da sua aplicação a cada candidato (cfr. em especial o ponto 4. da introdução do parecer do júri).

No que respeita à recorrente, essa justificação específica consta do ponto 2 da avaliação que directamente lhe diz respeito (fls. 76 vº dos autos), e inclui a expressão “defendendo bem o seu currículo”. É nesta expressão que a recorrente suporta o vício de falta de fundamentação, e a consequente anulabilidade da deliberação. Fá-lo, porém, sem que alegue qualquer fundamento de facto que permita sustentar essa imputação. Densifica-a tão somente citando um acórdão desta Secção de Contencioso de 21/03/13, no Proc. nº 93/12.8YFLSB, de cujo sumário transcreve um extracto, e aduzindo que aquela expressão é mencionada “(sem se especificar, no entanto, em concreto, quais os critérios que serviram para avaliar essa defesa)”.

Ora, “a fundamentação consiste em deduzir expressamente a resolução tomada das premissas em que assenta, ou em exprimir os motivos por que se resolve de certa maneira, e não de outra”[10]. Contrariamente ao que entende a recorrente, a deliberação fundamentou de forma legalmente suficiente a sua pontuação, e a consequente graduação[11], por incorporação do parecer elaborado pelo júri do concurso, fazendo sua a respectiva fundamentação[12], que dela passou a fazer “parte integrante”, nos termos do nº 1 do art. 125.º do CPA, segundo o qual “ A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto”.

Assim, no parecer do júri acolhido pela deliberação recorrida, diz-se, a propósito da valoração da entrevista que:

Tiveram lugar as provas públicas de defesa dos curricula, deliberando-se, no que se refere à avaliação de tais provas e considerando a moldura de 0 a 5 pontos, prevista na al. e) do n°13 do Aviso, fazer uso, de acordo com o modo como cada candidato conseguiu defender o respectivo currículo, da seguinte terminologia:

0 pontos - Defendeu o seu currículo de forma insatisfatória;

1 ponto - Defendeu o seu currículo de forma pouco satisfatória;

2 pontos - Defendeu o seu currículo de forma satisfatória;

3 pontos - Defendeu bem o seu currículo;

4 pontos - Defendeu com distinção o seu currículo;

5 pontos - Defendeu muito bem o seu currículo”.

Através desta terminologia previamente estabelecida, em nome da transparência dá-se a conhecer de que modo o júri se moveu dentro dessas molduras, que instrumentos de análise classificativa utilizou.

Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27/05/09, Proc. nº 0308/08, no IGFEJ, “Sobre a questão do cumprimento do imperativo da fundamentação obrigatória (como é imposto pelo artº 268º, nº 3, da CRP e artºs 124º e 125º do CPA), este Supremo Tribunal desde há muito entende que, tendo em vista que a fundamentação do acto administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, e como é assinalado em abundante jurisprudência deste STA - Citam-se por mais recentes os seguintes acórdãos do Pleno da Secção: de 25-01-2005 (Rec. 01423/02), de 13-10-2004 (Rec. 047836), de 17-06-2004 (Rec. 0706/02), e de 06-05-2004 (Rec. 047790), de 03-11-2004 (Rec. nº 0561/04), de 11-01-2005 (Rec. nº 0605/04), de 26-04-2005 (Rec. nº 01198/04, de 20-01-2005 (Rec. nº 0857/04), de 20-11-2002 (Rec. nº 01178/02), de 05-12-2002 (Rec. nº 01130/02) e de 12-07-2005 (Rec. 512/05) -, o ponto de vista relevante para avaliar se o conteúdo da fundamentação é adequado àquele imperativo, é o da compreensibilidade por parte do destinatário normal, colocado na situação concreta, de modo que deve dar-se por cumprido tal dever se a motivação contextualmente externada lhe permitir perceber quais as razões de facto e de direito que determinaram o autor do acto a agir ou a escolher a medida adoptada.

O mesmo é dizer, como se afirma no acórdão de 25-01-2005, (Rec. 01423/02) “primeiro, que o dever de fundamentação se cumpre sempre que o discurso justificativo da decisão administrativa seja apto a realizar aquele esclarecimento e, segundo, que a fundamentação tem uma dimensão formal autónoma que se satisfaz com tal objectivo, ainda que, porventura, as razões aduzidas não sejam exactas, indiscutíveis ou convincentes. Esta é outra vertente, que tem já a ver com a legitimidade material do acto administrativo (vide, neste sentido, Vieira de Andrade, “O Dever de Fundamentação Expressa de Actos Administrativos”, pp. 11 e 236 e acórdão STA de 2002.07.04 – recº nº 616/02)”. “.

Assim sendo, a terminologia estabelecida em conjugação com aquela asserção de que a recorrente prestou provas públicas “defendendo bem o seu currículo” traduz indiscutível fundamentação, simples e sintética, mas objectiva e clara, reveladora de qual foi o iter lógico, qual o caminho seguido para a pontuação atribuída, para, perante a situação concreta do procedimento, se haver tomado aquela decisão.

A afirmação de que a recorrente prestou provas públicas “defendendo bem o seu currículo” exprime a avaliação do júri quanto a esse específico acto do procedimento concursal com alcance que é objectiva e facilmente apreensível.

Sabe-se que a avaliação, mesmo com utilização de critérios tanto quanto possível precisos, não é uma actividade que possa ser integralmente objectivada, tendo sempre uma forte componente subjectiva. Mas o que é necessário é que a fundamentação dessa utilização seja compreensível e suficiente, como no caso é, e a recorrente tenha compreendido o iter cognoscitivo que conduziu à sua notação.

Pode a recorrente discordar da pontuação atribuída, discordar da forma de concretização daqueles critérios que o júri utilizou, mas não pode afirmar que ela não seja uma concretização desses mesmos critérios previamente estabelecidos, constituindo eles próprios instrumento de fundamentação.

Destarte, tem de concluir-se que a deliberação impugnada explicitou de forma clara e suficiente os motivos de facto da pontuação atribuída à recorrente e, consequentemente, da respectiva graduação, assim preenchendo os objectivos da imposição da obrigação de fundamentar. 

Nesta consonância, igualmente é conhecida a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, de que se transcrevem, como exemplos, os seguintes extractos dos seus sumários:

- Acórdão de 21/03/13, Proc. nº 99/12.7YFLSB, “V -A existência de critérios, tanto quanto possível precisos, visa assegurar uma avaliação curricular equitativa, constituindo eles próprios instrumento de fundamentação da própria graduação; se tais critérios não existissem, a graduação perderia clareza e poderia passar a incorrer no vício de falta de fundamentação por obscuridade ou insuficiência (art. 125.º, n.º 2, do CPA). “, disponível na base de dados do IGFEJ;

- Acórdão de 29/11/05, Proc. n.º 2050/14.0YFLSB, “A jurisprudência deste Supremo Tribunal tem entendido, relativamente a deliberações do CSM para graduação de concorrentes ao STJ, ser suficiente uma fundamentação genérica, que enuncie os critérios da lei e particularize, de forma clara e congruente, a avaliação de cada um dos candidatos, sem que se imponha uma descrição exaustiva do processo cognitivo e valorativo que determinou o sentido de voto de cada um dos membros do Conselho”;

- Acórdão de 5/07/12, Proc. n.º 137/11.0YFLSB, “ IX - O dever de fundamentação exigível ao recorrido, nos termos do art. 125.º do CPA, alcança-se através de uma «sucinta exposição de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto», mostrando-se cumprido no caso em apreço “, estes dois no site deste Tribunal[13].



Invoca ainda a recorrente o mesmo vício de forma quanto ao “prestígio profissional e pessoal”, a que se refere a al. f), ii) do nº 13 do mesmo aviso nº 14.602/2013, pelo qual lhe foram atribuídos 4 pontos. Reclama a pontuação máxima de 5 pontos, argumentando que não foi tido em consideração, “o trabalho desempenhado em regime de acumulação noutros tribunais (...), o que se traduz, mais uma vez, salvo o devido respeito, em falta de fundamentação da decisão proferida “.

Com todo o respeito que nos merece, não podemos concordar com a Dra. AA. Também aqui, e de forma mais exuberante, se mostra clara e precisa a fundamentação da deliberação impugnada, com recurso à anunciada análise dos relatórios de inspecção onde constam todos os elementos pertinentes que a recorrente pretende ver valorados e que afinal já foram devidamente apreciados.

Nela se afirma, recordamos que por incorporação do parecer elaborado pelo júri, o seguinte:

A Exma. Concorrente granjeou ao longo da carreira, como decorre dos relatórios de inspecção que lhe respeitam, grande prestígio, pelo modo como foi desempenhando as suas funções, atestando-se nesses relatórios as suas altas qualidades pessoais e profissionais, acentuando-se a sua elevada categoria intelectual e excelente cultura jurídica aliadas a uma postura de rigor e notável método profissional, dignificando a justiça.

Também no Tribunal da Relação do Porto goza de prestígio e consideração junto dos seus pares, dando plena conta dos processos que lhe são distribuídos quer do ponto de vista técnico, quer quantitativamente.”.

E adiante:

Goza de elevado prestígio pessoal e profissional como se evidencia dos relatórios de inspecção. Revela uma conduta exemplar, método, capacidade de trabalho e preocupação em realizar a uma justiça rápida e eficaz. É dotado de uma excepcional capacidade de trabalho e igualmente elevada qualidade de serviço, designadamente no já prestado na Relação.

É uma magistrada com elevado prestígio profissional e pessoal a que as funções exercidas na formação de novos magistrados conferiram maior distinção”.

Se a recorrente entende que devia ter merecido maior relevo o trabalho desempenhado em regime de acumulação noutros tribunais é matéria que extravasa os poderes censórios deste STJ, integrando-se no âmbito dos poderes discricionários do CSM. Mas esta decisão parcelar mostra-se fundamentada com particular detalhe, pelo que é desajustado o imputado vício formal.

Conclui-se que a decisão impugnada não padece do alegado vício de falta de fundamentação. A pretensão da recorrente tem de improceder.

  III – DECISÃO

Nos termos expostos, acorda-se em julgar improcedente o recurso contencioso interposto pela Exma Juíza de Direito Dra. AA.

Custas a cargo da recorrente, conforme art. 527.º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil, com taxa de justiça que se fixa em 6 Ucs, nos termos do disposto na Tabela I-B, anexa ao Regulamento das Custas Judiciais, e art. 7.º, nº 1 deste mesmo diploma, sendo o valor da presente acção de 30.000,01€, atento o disposto no art. 34.º, nº 2 do CPTA.

 Lisboa, 22/01/15

Gregório Silva Jesus (Relator)

Fernando Bento

Ana Paula Boularot

Melo Lima

Santos Cabral

Souto de Moura

Távora Victor

Sebastião Póvoas (Presidente da Secção do Contencioso)

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[1] Cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2ª ed., pág. 34.
[2] Cfr. no mesmo sentido o Ac. de 5/07/12, Proc. nº 133/11.8YFLSB no IGFEJ.
[3] Cfr. Acs. do STJ de 5/07/12, Proc. nº 128/11.1YFLSB, 19/09/12, Proc. nº 10/12.5YFLSB, e 18/10/12, Proc. nº 58/12.0YFLSB, já citado, no IGFEJ.
[4] Nele se dispõe que: “1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. 2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual “.
[5] Cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., págs. 126/128.
[6] Cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, na obra citada, págs. 556 a 558.
[7] Neste sentido se vem pronunciando, de forma unânime e reiterada, o Supremo Tribunal Administrativo (cfr., entre outros, por exemplo, os Acs. de 29/03/79, Proc. nº 011830, 12/05/87, Proc. nº 021941, 12/05/92, Proc. nº 027969, 7/10/93, Proc. nº 026625, 9/05/95, Proc. nº 019146, 21/12/95, Proc. nº 031968, e de 3/03/00, Proc. nº 044537, todos no IGFEJ).
[8] Interessados que nem têm outro momento para se pronunciarem sobre o âmbito do recurso.
[9] In Direito Administrativo, vol. IV, 1988, págs 203 e 207.
[10] Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, 10ª ed., Almedina, pág. 477.
[11] Com efeito, da consideração conjunta dos pontos 1 e 2 do parecer, acima descritos na al. B) da matéria de facto a relevar, resulta a descrição pormenorizada do currículo académico e profissional da Dra. ..., a indicação e apreciação dos trabalhos apresentados, o seu empenho na formação contínua e as acções de formação que frequentou, a sua boa produtividade e elevado prestígio pessoal e profissional de que goza, em termos que não são contestados, e a pontuação atribuída aos diversos factores.
[12] Cfr. neste sentido, Marcello Caetano, ob. cit., pág. 478, último §.
[13] Cfr. ainda no mesmo sentido os Acs. desta Secção de 5/07/12, Proc. n.º 147/11.8YFLSB, 19/09/12, Proc. n.º 23/12.7YFLSB, 18/10/12, Proc. n.º 140/11.0YFLSB, 21/03/13, Proc. n.º 93/12.8YFLSB, e de 26/06/13, Proc. n.º 114/12.4YFLSB, no site do Supremo.