Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2984/04.0TBCSC.L1.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: GARCIA CALEJO
Descritores: CONTRATO DE ARQUITECTURA
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
OBRIGAÇÕES DE MEIOS E DE RESULTADO
CONTRATO DE MANDATO
DEFEITOS
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
JUSTA CAUSA
PRAZO CERTO
MORA
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
PERDA DE INTERESSE
CUMPRIMENTO DEFEITUOSO
INTERPELAÇÃO ADMONITÓRIA
DIREITO À INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 06/26/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Área Temática: DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / NEGÓCIO JURÍDICO / PROVAS - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / CONTRATOS
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - INSTRUÇÃO DO PROCESSO
Doutrina: - Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11ª edição, pág. 1061.
- Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, 7ª edição, págs.128 e 129, 275.
- Galvão Telles, Direito das Obrigações, 7ª edição, pág. 337.
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 224.º, N.º1, 342.º, N.º1, 432.º, 436.º,798.º, 801.º, N.º 2, 802.º, N.º 1, 804º Nº 1, 808.º, N.º 1, 1154.º, 1156.º, 1170.º, N.º 1.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 516.º.
Sumário :

I - O contrato de prestação de serviços que, na definição legal (cf. art. 1154.º do CC), é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição, constitui uma obrigação de resultado.
II - O contrato celebrado entre a autora e os réus segundo o qual aquela se comprometeu a realizar diversos actos de arquitectura, com intuitos de urbanização e implantação de edifícios em terrenos pertencentes a estes, é um contrato de prestação de serviços: existe aqui como que uma garantia de que a acção será profícua no sentido de que o trabalho seja apropriado aos fins a que se destina, o que implicava, no caso, a execução dos projectos em conformidade com as regras legais aplicáveis e em condições de aprovação pela Câmara Municipal.
III - A resolução do contrato, por banda dos réus, extinguindo o vínculo contratual, inviabilizou o cumprimento do contrato de prestação de serviços por parte da autora. Tal declaração (receptícia) torna-se eficaz logo que chega ao conhecimento do destinatário ou é dele conhecia (art. 224.º, n.º 1, do CC).
IV - A resolução contratual, quando não convencionada pelas partes, depende da verificação de um fundamento legal (cf. art. 432.º, n.º 1, do CC), recaindo sobre a parte que resolve o contrato o ónus de alegar e provar o fundamento que justifica a destruição do vínculo contratual. O fundamento da resolução, como decorre dos arts. 801.º, n.º 2, e 802.º, n.º 1, do CC, é a impossibilidade de cumprimento da prestação determinativa do incumprimento definitivo.
V - O incumprimento do contrato pode verificar-se, designadamente, pelo comportamento do devedor que exprima, inequivocamente, a vontade de não querer cumprir o contrato, por não ter sido observado o termo das obrigações de prazo fixo absoluto, por, em caso de mora, o credor perder o interesse que tinha na prestação ou quando esta não for realizada no prazo que razoavelmente lhe for fixado pelo credor (cf. art. 808.º, n.º 1, do CC).
VI - No caso dos autos, o réu marido resolveu o contrato sem que qualquer daquelas hipóteses se tenha verificado por banda da outra parte, pelo que a resolução foi ilegal.
VII - O eventual cumprimento defeituoso da autora geraria somente a obrigação de correcção dos defeitos e já não o incumprimento definitivo da obrigação. No caso vertente, atenta a natureza dos vícios susceptíveis de correcção (as próprias partes acordaram na realização das alterações necessárias à aprovação camarária), os réus deveriam conceder, antes da resolução contratual, a possibilidade à autora de efectuar a prestação sem deficiências.
VIII - Ao contrato de prestação de serviços aplica-se, com as necessárias adaptações, as regras do mandato (cf. art. 1156.º do CC). Este contrato é livremente revogável por qualquer das partes (art. 1170.º, n.º 1, do CC), mas se tiver sido conferido também no interesse do mandatário (ou prestador de serviços), não pode ser revogado pelo mandante sem o acordo do outro interessado, salvo ocorrendo justa causa.
IX - No caso não se verifica qualquer justa causa que justifique a resolução do contrato operada pelo réu marido.
X - Tendo sido ilegal a resolução contratual efectuada pelo réu marido, devendo tal incumprimento ser-lhe imputável, deve indemnizar a autora pelo prejuízo que lhe causou (art. 798.º do CC), que coincide com o preço dos trabalhos de arquitectura realizados e não pagos.



Decisão Texto Integral:
 

           

                                               Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

                       

                       

                       

                        I- Relatório:

                        1-1- AA - Arquitectos Associados, Lda, propõe a presente acção com processo ordinário contra BB e mulher, CC, pedindo a condenação destes no pagamento da quantia de € 52.473,54 pelos serviços prestados que indica, acrescida de juros vencidos à taxa legal desde 19 de Abril de 2002, no montante de € 5.657,08 e de juros vincendos à taxa legal até integral pagamento.

                        Fundamente este pedido alegando que prestou serviços de arquitectura para o R., relativamente à construção de cerca de 60 moradias, mediante proposta de honorários que este aceitou, elaborada em função das possibilidades de construção que lhe foram comunicadas pelo mesmo R.. Posteriormente, veio a saber que o índice de construção admitido para o local era inferior àquele que o R. lhe havia indicado, apenas sendo possível construir cerca de 43 moradias, o que originou a alteração do projecto, aceite e acompanhado pelo R.. Mais tarde, a A. veio a obter na CMC (Câmara Municipal de Cascais) a indicação de uma nova área de construção o que obrigou a reformular o projecto, que deu entrada naquela autarquia no dia 6 de Abril de 2001, seguindo-se também uma alteração do acordo inicial sobre os honorários a pagar pelo R.. Em Novembro de 2001, a CMC comunicou a existência de diversas irregularidades do Projecto, o que é normal suceder, o que veio a dar lugar à sua correcção, acompanhada e aceite pelo R., com entrega do Projecto rectificado na CMC, no dia 19.04.2002. Entretanto, no dia 19 de Agosto de 2002, o R., sem conhecimento da A., entregou na CMC um requerimento onde afirma que depois de ter estudado o Projecto apresentado pela A. na CMC concluiu que o mesmo não dava satisfação à maioria das exigências colocadas pela autarquia, e que tinha sido amputado e alterado à sua revelia o projecto inicial, razões pelas quais solicitava a suspensão da análise do processo. No dia 7 de Outubro seguinte, o R. comunicou à A. que rescindia o contrato com justa causa, facto que, no dia 17 seguinte, comunicou à CMC, para que fosse cancelada a responsabilidade técnica da A. no respectivo processo, sem prejuízo de apresentar novo técnico. Em finais de 2002, a CMC indeferiu o processo, sem que os seus serviços tenham apreciado as correcções apresentadas pela A., e que a mesma considera estarem em condições de permitir a aprovação do Projecto. O terreno em causa nos autos é propriedade de ambos os RR., tendo ambos retirado proveito do projecto elaborado pela A. sendo, assim, ambos responsáveis pelo pagamento da dívida reclamada neste processo, no montante acima referido. Caso o Tribunal entenda que não é uso recorrer à Portaria de 7 de Fevereiro de 1972 para efectuar o cálculo de honorários de arquitectura, subsidiariamente, pede a condenação dos RR. no pagamento da quantia de € 111.484,15 acrescida de juros vencidos à taxa legal desde 19 de Abril de 2002, no montante de € 12.018,91 e dos juros vincendos à taxa legal; ou de € 40.084,15 acrescida de juros vencidos à taxa legal desde a citação; ou de € 52.924,15, acrescidas de juros vencidos à taxa legal desde a citação.

                        Os RR. contestaram alegando que a A. se inteirou das possibilidades de construção para o terreno em causa, antes de ter assegurado ao R. que era possível construir 60 moradias, sendo que o R. mais tarde não teve alternativa que não fosse aceitar um número inferior, em face da posição da CMC. A A. apresentou o projecto na CMC com grande atraso em relação ao previsto, sendo certo que o acordo de honorários tinha carácter provisório, dependendo da aprovação do projecto e sujeito a compensação pelos atrasos. Alegou ainda desconhecer se a A. efectuou as correcções exigidas pela CMC, até porque teve dificuldades em contactar com o seu gerente e responsável durante o período em que foram feitas essas correcções, e não lhe foi dado conhecimento do que foi apresentado na CMC. O R. pediu a suspensão do processo apenas para evitar o seu indeferimento imediato e dar tempo à A. para corrigir os erros do projecto.

                        Concluem sustentando que nada devem pagar à A.

                       

                        Antes de ser proferido despacho saneador, foi ordenada a apensação a estes autos, a acção que corria termos pelo mesmo Tribunal com o nº 7620/04, instaurada por BB e mulher, CC, contra AA - Arquitectos Associados, Lda e DD

                        Nesta acção, os AA. alegam que, em função dos factos já acima mencionados, sobre o modo deficiente como os RR. prestaram os serviços, sofreram diversos prejuízos, com os honorários pagos e taxa camarária, no total de € 36.314,68 (ou 7.280.440$00). Para além dessas despesas, foram entretanto aprovadas medidas mais restritivas da construção, segundo as quais apenas será possível construir 22 fogos, em lugar daqueles que se poderia ter construído se o projecto tivesse sido elaborado de forma correcta, de onde deriva um prejuízo não inferior a € 1.400.000,00. Existem ainda outros prejuízos pelo atraso na comercialização do empreendimento, danos de que não procederam à sua quantificação alegando que, naquele momento, ainda não dispunham de dados para o poderem fazer.

                        Defendem, assim, que a 1ª R., por incumprimento do contrato e o 2° R., por incumprimento das suas obrigações como técnico autor do projecto, são solidariamente responsáveis pelos danos causados.

                        Concluem pedindo a condenação solidária dos RR. no pagamento da indemnização de € 36.314,68 correspondente aos honorários que foram pagos a título de execução do projecto de arquitectura e à taxa paga na Câmara Municipal de Cascais para apreciação desse projecto, acrescida de juros á taxa legal a contar da citação e até integral pagamento, bem como a condenação dos mesmos RR. a pagar-lhes o montante dos danos patrimoniais derivados do atraso da entrega do projecto e da sua eficiente elaboração, danos esses a liquidar em execução de sentença.

                        Na contestação a esta acção os RR. defendem, em súmula, que foi cumprido o acordado, em relação ao qual o gerente da sociedade não foi parte, pelo que não são responsáveis por qualquer pagamento.

                        Procedeu-se à realização de audiência de discussão e julgamento tendo sido proferida sentença que julgou ambas as acções improcedentes, absolvendo os respectivos RR. dos pedidos formulados em cada uma delas.

                         

                        1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreram cada um dos AA. das acções declarativas respectivas, de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo-se aí, por acórdão de 17-1-2012, julgado improcedentes os recursos, confirmando-se a sentença recorrida.

                       

                        1-3- Irresignada com este acórdão, dele recorreu a A., AA, Arquitectos Associados Ldª, para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.

                       

                        A recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões:

                        1ª- A equidade é a justiça do caso concreto.

                        2ª- Os Tribunais apenas podem decidir por equidade nos casos estatuídos no art. 4º do CC.

                        3ª- Uma decisão segundo a qual não basta provar os pressupostos do direito para que este seja justo e que com esse fundamento declara o pedido improcedente, é uma decisão tomada por juízos de equidade.

                        4ª- A presente decisão viola o art. 4º do CC, que não permite a solução do presente caso por juízos de equidade.

                        5ª- Tendo o recorrido resolvido o contrato de prestação de serviços de arquitectura sem justa causa e tendo seguidamente tornado impossível a apreciação e subsequente aprovação do projecto pela Câmara Municipal (provocando ele próprio o indeferimento do projecto), deve ser condenado no pagamento dos honorários acordados para a integridade do serviço.

                        6ª- Deve, em consequência, ser revogado o douto acórdão ora em causa, sendo proferido douto acórdão que condene o recorrido como pedido.

                       

                         Os recorridos contra-alegaram, pronunciando-se pela confirmação do acórdão recorrido.

                       

                        Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:

                       

                        II- Fundamentação:

                        2-1- Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, deveremos apreciar apenas as questões que ali foram enunciadas (arts. 690º nº 1 e 684º nº 3 do C.P.Civil).

                        Nesta conformidade, será a seguinte a questão a apreciar e decidir:

                        - Se a Sociedade A., AA, Arquitectos Associados Ldª, cumpriu o acordo celebrado com os RR. e se, consequentemente, estes lhe devem pagar a totalidade do preço convencionado.

                       

                        2-2- Vem fixada das instâncias a seguinte matéria de facto:

                        1. (A) Os RR., BB e CC, são proprietários de um terreno com a área total de 42 299 m2, correspondente aos prédios rústicos inscritos na respectiva matriz da freguesia de Alcabideche, nos arts. 1807 e 1808 e descritos na 2ª Conservatória do Registo Predial de Cascais, nas fichas n.° 04296 e 0841.5.

                        2. (B) A A. é uma sociedade por quotas, tendo como objecto social prestação de serviços de arquitectura, planeamento paisagístico, topografia, instalações especiais, fiscalização de obra e gestão de projectos e dedica-se à prestação de serviços de arquitectura, exercendo efectivamente essa actividade profissionalmente, com um fim lucrativo.

                        3. (C) Os Réus são casados um com o outro desde 20/12/1999.

                        4. (D) O R. marido é engenheiro e dedica-se profissionalmente ao exercício de engenharia.

                        5. (E) A A. elaborou uma proposta de honorários e de condições da prestação de serviços de arquitectura.

                        6. (F) A A. enviou ao R. marido, que recebeu, uma carta com a proposta de condições e de honorários para a prestação dos serviços de arquitectura relativos ao projecto de um edifício com aproximadamente 60 moradias unifamiliares em banda, organizadas em condomínio.

                        7. (G) Segundo constava da proposta de honorários que o R. marido aceitou, os honorários seriam calculados do seguinte modo:

                        a. Por cada projecto tipo € 4.289,66 (860.000$00);.

                        b. Por cada repetição de projecto tipo € 299,28 (60.000$00);

                        c. Pela concepção geral do empreendimento, implantação, topografia, acessos, arruamentos e cave € 19.957,91 (4.000.000$00);

                        d. Por cada projecto de execução de projecto tipo € 2.244,59 (450.000$00);

                        e. Pelas medições e organização dos processos de concurso € 3.242,19 (650.000$00);

                        f. Pela assistência à obra € 498,80 (100.000$00) por mês, durante os meses considerados necessários.

                        8. (H) E seriam elaborados três projectos tipo e realizadas 57 repetições de projectos tipo, o que resultaria num total de sessenta fogos, através da combinação dos três projectos tipo de apartamento.

                        9. (I) Nos termos da proposta de honorários referida, os honorários seriam pagos de forma repartida, de acordo com a evolução do projecto, do seguinte modo:

                        g. Com a adjudicação pelo R. marido (que se previa ser em Novembro de 1999) a quantia de € 7.481,97 (1.500.000$00);

                        h. Com a aprovação do programa base pelo R. marido (que se previa ser em Dezembro de 1999) a quantia de € 7.481,97 (1.500.000$00);

                        i. Com a aprovação do estudo prévio pelo R. marido (que se previa ser em Janeiro de 2000) a quantia de € 12.469,95 (2.500.000$00);

                        j. Com a entrega do projecto base de licenciamento ao R. marido (que se previa ser em Fevereiro de 2000) a quantia de € 22.445,91 (4.500.000$00);

                        k. Com a entrega do projecto de execução de acabamentos na Câmara Municipal de Cascais (que se previa ser em Abril de 2000) a quantia de € 9.975,96 (2.000.000$00).

                        10. (J) O R. marido aceitou a proposta da Autora em 5 de Janeiro de 2000, tendo adjudicado a esta a elaboração do projecto.

                        11. (L) Nessa data (5 de Janeiro de 2000) o R. marido pagou, à A. a quantia de € 7.481,97 (1.500.000$00), conforme havia sido acordado.

                        12. (M) Após aceitação da proposta pelo R. marido, a A. iniciou a prestação dos serviços de arquitectura.

                        13. (N) Em 21 de Fevereiro de 2000, a Autora, através do seu sócio gerente Arq. DD, e o Réu marido reuniram-se no gabinete daquela.

                        14. (O) A A., através do seu sócio gerente Arq. DD, elaborou esquiços do projecto, que constituíam o programa base do projecto, tendo o R. aprovado o programa base do projecto em 13 de Março de 2000.

                        15. (P) Nessa data (13 de Março de 2000) o R. marido pagou à A. a quantia de € 7.481,97 (1.500.000$00), conforme havia sido acordado.

                        16. (Q) A A., através do seu sócio gerente Arq. DD, realizou então uma reunião com o Arq. EE, à data Director do Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Cascais.

                        17. (R) Em 6 de Abril de 2001, o projecto deu entrada na Câmara Municipal de Cascais, tendo-lhe sido atribuído o nº 05102/01.

                        18. (S) A A. informou o R. marido da entrada do projecto na Câmara Municipal de Cascais.

                        19. (T) Em Maio de 2001, em virtude da alteração do número de projectos tipo e de repetições, a A., através do seu sócio gerente Arq. DD, propôs ao R. marido uma alteração dos honorários devidos por cada repetição de projecto tipo para € 498,80 (100.000$00).

                        20. (U) A A., através do seu sócio gerente Arq. DD, e o R. marido acordaram então que os honorários (na parte afectada pela alteração do acordo ou pela alteração do projecto) passariam a ser os seguintes:

                        - Pela elaboração de cada projecto tipo € 4.289,66 (860.000$00), no total de € 51.475,94 (10.320.000$00) pelos 12 projectos tipo;

                        - Por cada repetição de projecto tipo € 498,00 (100.000$00), no total de € 15.962,00 (3.200.000$00) pelos 32 projectos tipo.

                        - Pela concepção geral do empreendimento, implantação, topografia, acessos, armamentos e cave € 19.951,91 (4.000.000$00);

                        - Por cada projecto de execução de projecto tipo € 2.244,59 (450.000$00), no total de € 26.935,00 (5.400.000$00) pelos 12 projectos de execução de projecto tipo.

                        - Pelas medições e organização dos processos de concurso € 3.242,19 (650.000$00).

                        - Pela assistência à obra € 498,80 (100.000$00) por mês, durante os meses considerados necessários.

                        21. (V) Em 9 de Novembro de 2001, a A. recebeu o parecer 31/10/01 da Câmara Municipal de Cascais, que apontava as seguintes irregularidades no projecto:

                        a) Excesso de área bruta de construção face aos 5661 m2 máximos admitidos (14153m2x0,40)

                        b) Excesso de fogos face às características morfológicas da zona e ao valor padrão de 25 fogos/ha que devem ser considerados como máximo para condomínios na zona.

                        c) Topologia da intervenção desajustada das características da zona, face à criação de bandas com frentes edificadas que atingem 60 m de comprimento, numa zona na qual as intervenções existentes de utilização habitacional se caracteriza por moradias isoladas ou germinadas.

                        d) Desrespeito pelos alinhamentos vários definidos para as zonas pelo G.S.I.G.

                        e) Existência de construção (pérgolas estacionamento) e vias implantadas em área de servidão não "edificandi" (35 m para cada lado do eixo da estrada, art. 5 do Dec-Lei 13/94 de 15 de Janeiro.

                        f) Desrespeito pelo afastamento mínimo, de 5 m a extremo do terreno do conjunto F.

                        g) Ausência de ante câmaras corta-fogo no acesso às caixas de escada dos pisos em cave, desrespeitando o expresso no nº 2 do art. 15 do Dec-Lei 66/95 de 8 de Abril.

                        h) Ausência de saídas de emergência para o exterior dos pisos em cave e respectiva indicação dos percursos pedonais (art. 12 e 13 do Dec-Lei 66/95 de 8 de Abril)

                        i) Existência de portas de acesso às caixas da escada que inviabilizam o lugar de estacionamento quando abertas não deixando os 2,50 m X 5,00 m livres (art. 86 do R.P.D.M.)

                        j) A saída automóvel no sentido Norte da cave do conjunto C/D/E é efectuada em contra-mão, não possuindo raio de curvatura suficiente para um correcto acesso à rotunda.

                        I) É desrespeitado o expresso no art. 70° do RGEU (largura mínima dos corredores/ nas moradias 37 e 38 do conjunto A e 33 do Conjunto B (acesso quarto "4").

                        m) É desrespeitado o expresso no art. 73 do RGEU (obstáculos à iluminação janelas compartimentos habitacionais.3) nas moradias 29, 30, 32, 33 do conjunto B; 18, 19, 21 a 27 do conjunto C, 10, 12,16 do conjunto D; e 1 a 9 do conjunto E.

                        n) É desrespeitada a altura máxima de fachada no conjunto A (máximo 7,5 m art. 25 RPDM)

                        o) Não é apresentada solução de parqueamento, nem planta de arranjos exteriores para o conjunto F.

                        p) O "local" do terreno onde o conjunto F se encontra implantado já se encontra fisicamente destacado do terreno principal pela existência de uma estrada pública, não podendo consequentemente ser considerado parte integrante do condomínio principal, uma vez que não possui qualquer tipo de ligação.

                        q) Não é feita nenhuma referência ao futuro da construção existente, não sendo claro se a proposta equaciona a sua manutenção ou demolição.

                        r) Não é apresentada nenhuma planta de implantação executada sobre levantamento topográfico com o afastamento das construções ás extremas do terreno e indicação dos arranjos exteriores com as respectivas cotas altimétricas propostas para as plataformas e níveis projectados, bem como cotas altimétricas propostas para os arruamentos.

                        s) Os cortes dos conjuntos B (corte B), C (corte CD), D (corte CD) e E (corte CD) não apresentam o perfil natural do terreno ou apresentam-no dissociado do apresentado no levantamento topográfico, não os referenciando aos eixos das vias adjacentes.

                        t) O alçado nascente do conjunto F apresenta muros divisórios do logradouro, contrariando o expresso na memória descritiva e o representado em plantas

                        u) A maioria dos alçados e cortes apresentados não possui nenhuma representação da via adjacente de acesso, existindo situações nas quais, partindo do pressuposto que as vias vão respeitar os perfis naturais do 1 terreno existem aterros e desaferres superiores a 4m (veja-se corte CD conjunto B) e cunhais das construções a 1.5m do limite, estando a via a uma cota 3.5m abaixo (veja-se casa 33 face via a sul).

                        v) Os desenhos da piscina A, não apresentam os perfis naturais do terreno, indicando urna cota altimétrica errada para a piscina das crianças e não relacionando o proposto em termos de arranjos exteriores com as cotas das construções mais próximas.

                        w) Os desenhos da piscina B, não apresentam os perfis naturais do terreno, nem relacionam a mesma com o limite do terreno e o eixo da via e respectiva cota altimétrica.

                        x) Não é feita nenhuma referência à localização e características das caixas do correio e dos compartimentos para o lixo."

                        22. (X) Por acordo entre A. e R. foi solicitada à Câmara Municipal de Cascais a prorrogação do prazo para rectificar o projecto, o que foi deferido, tendo o referido prazo sido prorrogado até 19/04/2002.

                        23. (Z) O R. solicitou à Câmara Municipal de Cascais novo pedido de prorrogação de prazo sem informar a A. do mesmo.

                        24. (AA) Em 19 de Abril de 2002 (Sexta-feira), a A. deu entrada ao projecto já rectificado.

                        25. (AB) A decisão de indeferimento recaiu sobre a primeira versão do projecto, sem as rectificações entradas na Câmara Municipal de Cascais em 19 de Abril de 2002.

                        26. (AC) Até à data o R. marido pagou as seguintes quantias:

                        a. Com a adjudicação pelo Réu marido, em 5 de Janeiro de 2000, a quantia de € 7,481,97 (1.500.000$00);

                        b. Com a aprovação do programa base pelo Réu marido, em 13 de Março de 2000, € 7.481,97 (1.500.000$00);

                        c. Com a aprovação do estudo prévio pelo Réu marido, € 6.234,97 (1.250.000$00) em 11 de Julho de 2000 e mais € 6.234,97 (1.250.000$00) em 7 de Agosto de 2000;

                        d. Em 5 de Dezembro de 2000, € 7.481,97 (1.500.000$00) por conta do pagamento a efectuar com a entrada do projecto base na Câmara Municipal de Cascais, tudo no total de € 34.915,85 (7.000.000$00).

                        27. (AD) O R. BB foi notificado pela Câmara Municipal de Cascais, através do oficio de 7.11.2001, para, nos termos dos arts. 100° e segts. do Código do Procedimento Administrativo e no prazo de 30 dias, se pronunciar sobre a proposta de indeferimento do pedido de aprovação do projecto de arquitectura e do respectivo licenciamento, com fundamento nas referidas deficiências do processo.

                        28. (AE) O R. BB requereu à Câmara Municipal a suspensão da apreciação do processo, o que fez por requerimento datado de 19.08.2002, tendo a Câmara Municipal dado resposta afirmativa ao pedido de suspensão,

                        29. (AF) O R. marido em 17 de Outubro de 2002 requereu à Câmara Municipal, o cancelamento da responsabilidade técnica do autor do projecto, ou seja, de DD.

                        30. (AG) O pedido de aprovação do projecto foi indeferido "com base nos fundamentos da Audiência Prévia" e por apresentar desconformidade com os instrumentos de planeamento territorial válido nos termos da lei e desrespeito por normas aplicáveis aos projectos.

                        31. (AH) O R. BB entregou a DD a quantia total de Esc. 7.000.000$00.

                        32. Pretendendo urbanizar o prédio referido na alínea A) (nº 1 dos factos Provados), BB contactou alguns arquitectos, com vista à elaboração do projecto de urbanização e dos projectos das construções a edificar (resposta ao art. 1.° da BI);

                        33. Entre esses arquitectos incluiu-se o arquitecto Nunes da Silva, o qual, através da autora, de que é sócio gerente, apresentou uma proposta para o efeito, em 25 de Outubro de 1999 (resposta ao art. 2.° da BI);

                        34. Na altura, o Eng.° BB entregou ao Arqt. Nunes da Silva, na qualidade de sócio-gerente da sociedade AA, Lda. (qualidade em que sempre teve intervenção nos factos a seguir referidos), alguns documentos referentes ao terreno, incluindo com áreas do mesmo (resposta ao art. 3.° da BI);

                        35. A proposta de honorários teve por base de cálculo a possibilidade de construir um condomínio com 60 moradias unifamiliares, em banda (resposta ao art. 4.° da BI);

                        36. O termo de responsabilidade do autor do projecto de arquitectura foi assinado em 05.04.2001 (resposta ao art. 9.° da BI);

                        37. O mesmo tendo acontecido com a memória descritiva do projecto de arquitectura (resposta ao art. 10.° da BI);

                        38. Nesse projecto apenas se previa a construção de 44 moradias, que o arquitecto DDentendeu então que não podia ser excedido, considerando, segundo dizia, os instrumentos urbanísticos em vigor (resposta ao art. 11.° da BI);

                        39. O Eng.° BB aceitou essa alteração (resposta ao art. 12.° da BI);

                        40. A sociedade autora, se tivesse actuado de forma mais atenta e cuidada na sua elaboração, teria evitado, pelo menos, muitas das deficiências apontadas pela CMC e referidas na alínea V) - (Ponto 21 dos Factos Provados) - (resposta ao art. 13.° da BI);

                        41. Foi solicitado a BB para comparecer no dia 17.04.2002 no atelier do arquitecto Nunes da Silva, com vista a assinar o requerimento de junção de documentos ao processo camarário (resposta ao art. 16.° da BI);

                        42. Conforme combinado, o réu compareceu no dia 17.04.2002 no atelier da sociedade, onde lhe foi mostrado, pelo menos na sua maior parte, o Projecto rectificado que ia dar entrada na CMC, com algumas explicações sobre o mesmo, tendo-lhe sido dito que ainda não estava disponível uma cópia para lhe ser entregue - (resposta ao art. 17.° da BI);

                        43. Só depois de entregues na CMC é que foram facultados a BB, em 22.04.2002, os respectivos elementos, que acompanharam o requerimento referido (resposta ao art. 19.° da BI);

                        44. No referido Projecto rectificado foram eliminadas as garagens na cave, o que diminui o valor de comercialização dos fogos (resposta ao art. 20.° da BI);

                        45. Antes da entrada desse Projecto na CMC, o Eng.° BB insistiu várias vezes junto do Arqt. Nunes da Silva, para que o mesmo desse andamento ao processo de correcção das deficiências antes apontadas pela CMC (referidas na alínea V)), não obtendo, por vezes, resposta pronta a essas solicitações (resposta ao art. 21.° da BI);

                        46. O Eng.° BB comunicou à sociedade AA a rescisão do contrato, através da carta junta como doc. nº 9, na acção 7620/04, com data de 07.10.2002, e onde, além do mais, refere o seguinte:

                        "Com suporte na vossa proposta de 25.10.1999, foi celebrado contrato de prestação de serviços, através do qual V. Exas. se obrigaram a elaborar os projectos de arquitectura para um condomínio de aproximadamente 60 moradias unifamiliares em banda. "Acontece que V Exas. ostensivamente não cumpriram as obrigações desse contrato. Com efeito e considerando que a adjudicação da prestação do serviço foi feita no início de Janeiro de 2000, a entrega do projecto base de licenciamento deveria ser efectuado em Março de 2000 e o próprio projecto de execução de acabamentos deveria ser entregue em Maio de 2000. "Esse projecto foi objecto de parecer dos Serviços Técnicos da Câmara Municipal, onde foram apontadas 23 deficiências na sua elaboração, o que conduziria ao indeferimento do pedido de licenciamento. "Em face desse parecer, foi o requerente notificado para se pronunciar no prazo de 30 dias úteis. "V. Exas. não conseguiram nesse prazo tomar posição em relação às referidas 23 deficiências, o que obrigou a pedir a prorrogação por mais 60 dias. E só em 19.04.2002 V. Exas. responderam ao parecer dos Serviços Técnicos da Câmara Municipal, resposta insuficiente e que levará necessariamente ao indeferimento do pedido. "V. Exas. têm perfeita consciência de que não só não cumpriram o contrato no que respeita a prazos, mas também e principalmente não cumpriram porque elaboraram o projecto de loteamento com violação clara das disposições do Plano Director Municipal, do Regulamento Geral das Edificações Urbanas e de outras disposições legais aplicáveis aos projectos em causa, além de reduzirem consideravelmente o número de moradias. "Por outro lado, fizeram alterações ao projecto inicialmente entregue sem o meu consentimento ou mesmo conhecimento. "Sob o ponto de vista contratual, a actuação de V. Exas. reveste-se de extrema gravidade, uma vez que da vossa conduta resultam elevados prejuízos. «Nestas condições, ocorre notória justa causa para ser rescindido de imediato o contrato de prestação de serviços. "Assim, venho formalmente notificar V. Exas, de que, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 1156° e 1170°, nº 2  in fine, do Código Civil, rescindo o contrato."- (resposta ao art. 22.° da BI);

                        47. O mesmo (Eng.° BB) pagou à CMC a taxa de Pte. 280.440$00 respeitante à apresentação do projecto (resposta ao art. 23.° da BI);

                        48. Em 2003 foram aprovadas Medidas Restritivas à construção para Cascais, temporárias, segundo as quais apenas seria possível construir 22 fogos nos terrenos em causa, o que não aconteceria se o projecto tivesse sido aprovado anteriormente (resposta ao art. 24.° da BI);

                        49. Considerando a sua localização e tendo em conta as características do empreendimento, o valor do terreno para cada moradia/fogo não será inferior a € 125.000,00 (resposta ao art. 25.° da BI);

                        50. Com a concretização do empreendimento e a venda das habitações, salvo situação imprevistas, o réu teria um lucro concretamente não apurado (resposta ao art. 26.° da BI);

                        51. O atraso na aprovação do Projecto também protela a data do início da comercialização das habitações a construir (resposta ao art. 27.° da BI);

                        52. A carta referida em F) (Ponto 6.° dos Factos Provados) foi enviada em 25.10.1999 (resposta ao art. 35.° da BI);

                        53. A disposição das moradias e número de fogos que constavam do Projecto referido na alínea R), tiveram a concordância do Eng.° BB (resposta ao arts. 36.° e 37.° da BI);

                        54. A orientação da CMC desde por volta dos anos de 1998/1999, transmitida nas consultas prévias que lhe eram feitas, era de não aprovar índices de construção superiores a 0,40, não obstante no PDM se referir um índice que podia chegar aos 0,50 (resposta ao art. 38.° da BI);

                        55. Em 22 de Maio de 2000, a autora solicitou uma planta do PDM de Cascais com a localização do prédio (resposta ao art. 39.° da BI);

                        56. De acordo com essa planta, apenas 14.303 m2 do terreno é que estavam classificados como área urbana de baixa densidade, contra os 16.044 m2 que constavam da planta junta a fls. 83, esclarecendo-se que as áreas que constam dessas plantas não resultam de qualquer medição camarária, antes, apenas dos elementos que constam do cadastro das propriedades por indicação dos donos (resposta ao art. 40.° da BI);

                        57. Na altura, foi acordado que seriam executados 12 projectos tipo que seriam depois usados no conjunto do empreendimento (resposta ao art. 42.° da BI);

                        58. Cada projecto tipo é um projecto autónomo e diferente (resposta ao art. 43.° da BI);

                        59. A sociedade autora procedeu então à elaboração do Projecto em conformidade com o acordado (resposta ao art. 44.° da BI);

                        60. As áreas indicadas pelos serviços da CMC para a área do terreno incluído em zona urbana de baixa densidade nem sempre eram coincidentes (resposta ao art. 45.° da BI);

                        61. Veio a concluir-se, em data concretamente não apurada, que essa área era de 14.153 m2 (resposta ao art. 46.° da BI);

                        62. No Projecto referido na alínea R), foi indicada uma área de construção da ordem dos 5.995 a 6.100 m2 (respostas aos arts. 46.° e 65.° da BI);

                        63. Na "Nota" que consta na parte final da Proposta de Honorários inicialmente acordada, constou que "os honorários foram calculados tendo como base o índice de 0,5, 8.000 m2 de construção acima do solo e projectos para aproximadamente 60 moradias. Se estas premissas forem, com o desenvolvimento do projecto e os contactos com as entidades competentes, alteradas, os honorários serão revistos para mais ou para menos, tendo como critério de cálculo o usado nesta proposta (resposta ao art. 50.° da BI);

                        64. Em 16 de Novembro de 2001, o réu enviou à autora o fax que constitui o doc. nº 36 junto a fls. 256 a 261, com comentários ao parecer da CMC supra referido e com algumas instruções sobre alterações ao projecto (resposta ao art. 51.° da BI);

                        65. E em 10 de Dezembro de 2001, enviou-lhe o fax que constitui o doc. n.° 12 junto a fls. 263-6, onde pedia que o projecto fosse elaborado com maior celeridade e em que dava algumas instruções e punha algumas questões relativas ao projecto (resposta ao art. 52.° da BI);

                        66. A autora procedeu às rectificações do projecto referidas no n.° 54° da base instrutória, a saber:

                        - alteração para 33 fogos, somando uma área total de construção de 4.605, 11 m2 (Alínea A);

                        - com a alteração para 33 fogos obteve-se um máximo de 8 fogos por hectare, se for considerada toda a área, ou de 23,4 fogos por hectare, se apenas for considerada a Zona Urbana de Baixa Densidade (Alínea B);

                        - com a anulação da banda B e da banda F garantem-se os afastamentos viários (Alínea D);

                        - as construções e as vias foram corrigidas de modo a respeitar a área non aedeficandi (Alínea E);

                        - foi anulada a banda F (Alínea F);

                        - na nova proposta não existe cave (Alínea G);

                        - na nova proposta não existe cave (Alínea H);

                        - na nova proposta não existe cave (Alínea I);

                        - na nova proposta não existe cave (Alínea J);

                        - as larguras dos corredores foram corrigidas para 1,1 metros (Alínea L);

                        - foram corrigidas todas as situações, garantindo um afastamento mínimo perpendicular ao plano da janela de 3 metros (Alínea M);

                        - na nova proposta foi eliminada a banda F) (Alínea O);

                        - na nova proposta foi eliminada a banda F) (Alínea P);

                        - corrigido na nova proposta de implantação (no desenho n.° 01a)(Alínea R);

                        - todos os cortes forma devidamente verificados e rectificados, tendo as bandas B e F sido anuladas (Alínea S);

                        - foi anulada a banda F (alínea T);

                        - os alçados e cortes foram todos verificados e corrigidos os necessários (Alínea U);

                        - os desenhos forma rectificados e corrigidos (desenho 36a) (Alínea V);

                        - foi corrigido o desenho da piscina B (Alínea W);

                        - as caixas de correio estão indicadas no desenho 39; a localização e quantidade de compartimentos de lixo estão indicadas no desenho nº 04a (Alínea X);

                        - excepto em relação à alínea n), o que poderá ter sido devido a erro do programa informático, com os esclarecimentos seguintes (resposta ao art. 54.° da BI);

                        67. Em relação aos aspectos destas alíneas c) e q):

                        - não sujeito a alterações mas antes a explicação em reunião (Alínea C);

                        - não foi feita qualquer alteração, pois tal apenas pode ser definido pelo Réu marido (Alínea Q);

                        - não se esclareceu se foram ou não corrigidos (resposta ao art. 54.° da BI);

                        68. Para além do acima referido sob o nº 13 [Ponto 44 dos Factos Provados], foi eliminado o conjunto habitacional "F" que constava do Projecto, do outro lado da via pública, e, da área de construção permitida, que era de 5.661 m2 (o que permitia 35 fogos) apenas foram aproveitados 4.605 m2 (33 fogos) (resposta ao art. 54.° da BI);

                        69. Tiveram lugar diversos contactos entre o Eng.° BB e o Arqt ° DD sobre as alterações a executar (resposta ao art. 55.° da BI);

                        70. No dia 17.04.2002, acima referido, não foi possível o réu ver as impressões finais do projecto uma vez que estavam a ser impressas e não estavam, ainda prontas (resposta ao art. 57.° da BI);

                        71. Até ao dia 07 de Outubro de 2002, a autora realizou o seguinte: a) elaborou 12 projectos tipo de apartamento; b) 32 repetições de projecto tipo de apartamento; c) concepção geral do empreendimento, implantação, topografia, acessos, arruamento e cave (resposta ao art. 60º da BI);

                        72. Para o cálculo dos honorários de arquitectos, é frequente o recurso à Portaria de 7 de Fevereiro de 1972, alterada por Portaria de 5 de Março de 1986, referente ao cálculo de honorários para projectos de obras públicas, que também é referida na parte final da proposta de Honorários inicialmente acordada (resposta ao art. 63.° da BI);

                        73. Bem como para esclarecer dúvidas sobre o cálculo de honorários (resposta ao art. 64.° da BI);

                        74. A área de construção considerada no projecto constante do Ponto 17 dos Factos Provados tem como valor do m2 para a construção do tipo da que foi projectada, para a zona de Cascais, e para a data do projecto, € 800,00 (resposta ao art. 65.° da BI);

                        75. Com a elaboração do Projecto dos autos, a autora teve despesas com pessoal, materiais e equipamento (resposta ao art. 67º da BI);

                        76. O réu era quem contactava com as entidades públicas e com terceiros sobre os assuntos relacionados com o empreendimento (resposta ao art. 71.° da BI); -------------------------

                       

                        2-3- Como se vê pelas circunstâncias acima relatadas, a A. pretende, com a presente acção, que os RR. lhe paguem os trabalhos de arquitectura que realizou, segundo contrato efectuado com estes, trabalhos que não lhe foram pagos na sua totalidade. Concretamente diz que realizou serviços no montante global de 87.389,00 €, tendo-lhe sido pago somente o valor de 34.915,85 €, faltando, assim solver 54.473,54 €. Daí o pedido que faz neste montante.

                        Na sentença de 1ª instância considerou-se que a acção deveria improceder visto que não se prova que as alterações efectuadas pela A. no projecto de construção em causa (por acordo das partes), fossem aceites pela Câmara Municipal e Cascais, pelo que se trata de factos que são pressuposto do direito invocado pela A., cabendo-lhe, por isso, o ónus da prova, havendo dúvidas sobre o tema, fica a sua posição prejudicada (arts. 342º nº 1 do C.Civil e 516º do C.P.Civil). Concluiu-se dizendo-se que a sociedade A. não logrou fazer a prova de que efectuou os serviços correspondentes aos honorários cujo pagamento pede na acção, pelo que considerou improcedente o pedido (principal) formulado.

                        Na Relação e no que toca à pretensão da A., AA - Arquitectos Associados, Lda referiu-se que esta entende ser-lhe devido o restante do preço contratualmente acordado mas o certo é que “o trabalho desenvolvido por esta sociedade foi realizado de forma pouco cuidada, conforme transparece do Parecer elaborado pela Câmara Municipal de Cascais e que determinou que os Peritos chamados a depor sobre esta matéria tivessem unanimemente concluído que se aquela sociedade de Arquitectura tivesse actuado de forma mais atenta e cuidada na sua elaboração, teria evitado, pelo menos, muitas das deficiências apontadas pela Câmara Municipal de Cascais”. Por outro lado, “do exame pericial realizado, não podemos afirmar, com o mínimo de segurança, que com as alterações realizadas ao projecto inicial neste segundo projecto viriam a ser objecto de provação por parte da Câmara Municipal, ónus de prova esse que impendia sobre a sociedade de Arquitectura e que poderia fundar o seu pedido de pagamento integral dos honorários contratuais acordados. Bem pelo contrário, o que resultou da perícia é que as alterações efectuadas padeciam de erros e que as rectificações efectuadas iriam limitar as possibilidades de rentabilização negocial pretendidas pelos donos da obra”. Por isso confirmando-se a decisão de 1ª instância, julgou-se improcedente a apelação.

                        Na presente revista, a recorrente, AA - Arquitectos Associados, Lda, em síntese, sustenta que os Tribunais apenas podem decidir por equidade nos casos estatuídos no art. 4º do C.Civil. Tendo o recorrido resolvido o contrato de prestação de serviços de arquitectura sem justa causa e tendo seguidamente tornado impossível a apreciação e subsequente aprovação do projecto pela Câmara Municipal (provocando ele próprio o indeferimento do projecto), deve ser condenado no pagamento dos honorários acordados para a integridade do serviço. Nesta conformidade, deve ser revogado o acórdão recorrido, decidindo-se a condenação dos RR. recorridos no pedido.

                       

                        Vejamos:

                        Como ponto prévio não poderemos deixar de sublinhar a dificuldade que sentimos na definição do direito (objecto da revista), dada a complexidade da matéria de facto dada como assente, nem sempre de modo ajustado e concordante, quiçá em razão de diversa factualidade alegada mas não provada.

                        Não poderemos deixar também de referir que só com base na factualidade provada é que poderemos aplicar definitivamente o regime jurídico adequado. Serve isto para dizer que não acompanharemos as considerações e deduções feitas no douto acórdão recorrido sobre o parecer elaborado pela Câmara Municipal de Cascais e o exame pericial realizado oportunamente, visto que eles, como se sabe, constituem meros elementos probatórios e, como tal, conducentes (somente) à demonstração da factualidade questionada.

                       

                        Somos em crer que, os factos provados, como as instâncias referiram, denunciam que as partes, mais particularmente a Sociedade A., AA, Arquitectos Associados Ldª, e os RR., BB e CC, celebraram um contrato de prestação de serviços, segundo o qual aquela se comprometeu a realizar diversos actos de arquitectura, com intuitos de urbanização e implantação de edifícios em terrenos pertencentes a estes.

                        Recapitulemos, a factualidade essencial dada como assente pelas instâncias:

                        A A. Sociedade enviou ao R. marido, que recebeu, uma carta com a proposta de condições e de honorários para a prestação dos ditos serviços de arquitectura relativos ao projecto de um edifício com aproximadamente 60 moradias unifamiliares em banda, organizadas em condomínio, sendo que o R. marido a aceitou em 5 de Janeiro de 2000, tendo adjudicado à Sociedade A. a elaboração do projecto, tendo esta iniciado a prestação dos serviços de arquitectura. Esta proposta de honorários teve por base de cálculo a possibilidade de construir um condomínio com 60 moradias unifamiliares, em banda.

                        Em 6 de Abril de 2001, o projecto deu entrada na Câmara Municipal de Cascais, sendo que a A. informou o R. marido deste facto.

                         Em Maio de 2001, em virtude da alteração do número de projectos tipo e de repetições, a A., através do seu sócio gerente Arq. DD, propôs ao R. marido uma alteração de honorários nos termos constantes nos nºs 19 e 20 acima referidos.

                        Em 9 de Novembro de 2001, a A. recebeu o parecer 31/10/01 da Câmara Municipal de Cascais, que apontava as (inúmeras) irregularidades no projecto referenciadas nas diversas alíneas do nº 21 dos factos assentes.

                        Então, por acordo entre A. e R., foi solicitada à Câmara Municipal de Cascais a prorrogação do prazo para rectificar o projecto, o que foi deferido, tendo o referido prazo sido prorrogado até 19/04/2002.

                        Sem que tivesse informado disso a A., o R. solicitou à Câmara Municipal de Cascais novo pedido de prorrogação de prazo.

                        Em 19 de Abril de 2002 (sexta-feira), a A. deu entrada ao projecto já rectificado.

                        Ocorreu uma decisão (camarária) de indeferimento que recaiu, porém, sobre a primeira versão do projecto, sem as rectificações entradas na Câmara Municipal de Cascais em 19 de Abril de 2002.

                        O R. BB foi notificado pela Câmara Municipal de Cascais, através do oficio de 7.11.2001, para, nos termos dos arts. 100° e segts. do Código do Procedimento Administrativo e no prazo de 30 dias, se pronunciar sobre a proposta de indeferimento do pedido de aprovação do projecto de arquitectura e do respectivo licenciamento, com fundamento nas referidas deficiências do processo.

                        Este R. BB requereu à Câmara Municipal a suspensão da apreciação do processo, o que fez por requerimento datado de 19.08.2002, tendo a Câmara Municipal dado resposta afirmativa ao pedido de suspensão.

                         O R. marido em 17 de Outubro de 2002 requereu à Câmara Municipal, o cancelamento da responsabilidade técnica do autor do projecto, ou seja, de DD.

                        O pedido de aprovação do projecto foi indeferido "com base nos fundamentos da Audiência Prévia" e por apresentar desconformidade com os instrumentos de planeamento territorial válido nos termos da lei e desrespeito por normas aplicáveis aos projectos.

                        A sociedade A., se tivesse actuado de forma mais atenta e cuidada na sua elaboração, teria evitado, pelo menos, muitas das deficiências apontadas pela CMC e acima referidas.

                        O termo de responsabilidade do autor do projecto de arquitectura foi assinado em 05.04.2001, o mesmo tendo acontecido com a memória descritiva do projecto de arquitectura. Nesse projecto apenas se previa a construção de 44 moradias, que o arquitecto DDentendeu então que não podia ser excedido, considerando, segundo dizia, os instrumentos urbanísticos em vigor, sendo que o Eng. BB aceitou essa alteração.

                        No projecto rectificado foram eliminadas as garagens na cave, o que diminui o valor de comercialização dos fogos, sendo que antes da entrada desse Projecto na CMC, o Engº BB insistiu várias vezes junto do Arqt. Nunes da Silva, para que o mesmo desse andamento ao processo de correcção das deficiências antes apontadas pela CMC (referidas na alínea V)), não obtendo, por vezes, resposta pronta a essas solicitações.

                         O Eng.° BB comunicou à sociedade AA a rescisão do contrato, através da carta junta como doc. nº 9, na acção 7620/04.

                        Em 2003 foram aprovadas medidas restritivas à construção para Cascais, temporárias, segundo as quais apenas seria possível construir 22 fogos nos terrenos em causa, o que não aconteceria se o projecto tivesse sido aprovado anteriormente.

                        O atraso na aprovação do Projecto também protela a data do início da comercialização das habitações a construir.

                        A A. procedeu às rectificações do projecto referidas no nº 66 dos factos assentes acima referidos.

                        Para além do acima referido, foi eliminado o conjunto habitacional "F" que constava do Projecto, do outro lado da via pública, e, da área de construção permitida, que era de 5.661 m2 (o que permitia 35 fogos) apenas foram aproveitados 4.605 m2 (33 fogos).

                        Até ao dia 07 de Outubro de 2002, a A. realizou os trabalhos referidos em 71 dos factos assentes, designadamente elaborou 12 projectos tipo de apartamento, 32 repetições de projecto tipo de apartamento, concepção geral do empreendimento, implantação, topografia, acessos, arruamento e cave.

                        Em relação aos serviços prestados, os RR. pagaram à A. a quantia de 34.915,85 € (7.000.000$00).

                       

                        Desta factualidade ressalta que, num primeiro momento, as partes estabeleceram os honorários da A. tendo em atenção a prestação de serviços relativos à construção e implantação no terreno de 60 moradias.

                        Posteriormente, de acordo com informações mais rigorosas sobre a área de construção permitida no terreno, a A. reformulou o projecto inicial, prevendo a instalação no terreno (apenas) de 44 moradias, dando o R. deu o seu acordo a esta reformulação, acordando, igualmente, a consequente alteração de honorários. O projecto sofreu ainda outras vicissitudes, como a eliminação das garagens na cave, o que diminui o valor de comercialização dos fogos. De sublinhar também que em 2003 foram aprovadas medidas restritivas à construção para Cascais, temporárias, segundo as quais apenas seria possível construir 22 fogos nos terrenos em causa, o que não aconteceria se o projecto tivesse sido aprovado anteriormente. Note-se também que a decisão camarária de indeferimento recaiu sobre a primeira versão do projecto, sem as rectificações entradas na Câmara Municipal de Cascais em 19 de Abril de 2002. Por fim, o R. Eng. BB requereu à Câmara Municipal a suspensão da apreciação do processo, o que fez por requerimento datado de 19.08.2002 e comunicou à sociedade A. a rescisão do contrato.

                        Quer dizer, sem que o projecto com a alterações realizadas tivesse sido aprovado pela Câmara Municipal da Cascais, o R. marido decidiu pedir a suspensão do processo junto do Município e resolver[1] o contrato que havia celebrado com a A..

                        Evidentemente que com a resolução do contrato, extinguiu-se o vínculo contratual e consequentemente inviabilizou-se o cumprimento do contrato de prestação de serviços por parte da A., ora recorrente. Com efeito, a declaração resolutiva pode fazer-se mediante declaração à outra parte, como resulta do art. 436º do C.Civil, diploma de que serão as disposições a referir sem menção de origem). Trata-se de declaração (receptícia) que se torna eficaz logo que chega ao destinatário, ou é dele conhecida (art. 224º nº1). Nesta conformidade, tal declaração, no caso vertente, tornou-se eficaz logo que a A. recebeu a tal declaração e se inteirou do respectivo conteúdo.

                        Assim, nessa altura deve reputar-se eficaz aquela declaração resolutiva.

                        Com esta declaração o R. marido destruiu ou extinguiu a relação contratual. É que, como refere o Prof. Antunes Varela[2] (Das Obrigações em Geral, 7ª edição, II Volume, pág. 275), “a resolução é a destruição da relação contratual, operada por um dos contraentes, com base num facto posterior à celebração do contrato”.

                        A resolução contratual, quando não convencionada pelas partes, depende da verificação de um fundamento legal, como decorre do disposto no art. 432º nº 1. Recai, assim, sobre a parte que resolve o contrato o ónus de alegar e provar o fundamento que justifica a destruição do vínculo contratual. A parte que, por circunstâncias não imputáveis ao outro contraente, não estiver em condições de restituir o que tiver recebido, não tem direito a resolver o contrato (nº 2 deste art. 432º).

                        O fundamento da resolução é, como decorre do art. 801º nº 2 e 802º nº 1, a impossibilidade de cumprimento da prestação, determinativa do incumprimento definitivo.

                        O incumprimento do contrato pode verificar-se, designadamente, pelo comportamento do devedor que exprima, inequivocamente, a vontade de não querer cumprir o contrato, por não ter sido observado o termo nas obrigações de prazo fixo absoluto, por, em caso de mora, o credor perder o interesse que tinha na prestação, ou quando esta não for realizada no prazo que razoavelmente lhe for fixado pelo credor (art. 808º nº 1).

                        Revertendo estes princípios para o caso dos autos, não poderemos deixar de concluir que o R. marido resolveu o contrato sem que qualquer destas hipóteses se tenha verificado por banda da outra parte. Com efeito, não existe qualquer declaração da outra parte no sentido de não querer cumprir o contrato, não se trata, obviamente, de uma obrigação de prazo fixo absoluto, não se enxerga que os RR. tenham perdido, em razão de uma eventual mora, o interesse no projecto e, por fim, não se vê que se tenha verificado a interpelação admonitória.

                        Por isso nos parece que o R. marido, não se demonstrando existir nos termos do negócio, causa da sua resolução convencional, não poderia, legalmente, resolver o contrato.

                       

                        Simultaneamente com a declaração resolutiva que proferiram os RR. constituíram-se na situação de não cumprir definitivamente o contrato ou seja, a declaração resolutiva feita pelo R. marido consubstancia uma manifestação clara da vontade de não cumprir integralmente o negócio.

                          Portanto, segundo cremos, o respectivo não cumprimento é-lhe imputável.

                        O pressuposto da resolução é, em regra, o incumprimento da obrigação principal, a realização do contrato conforme a inerente vinculação. A obrigação, porém, pese embora não seja cumprida, poderá ser executada de forma defeituosa.

                        Foi num eventual cumprimento defeituoso da obrigação (para além de outros fundamentos) que o R. marido justificou a resolução contratual.

                        Quanto à execução defeituosa da prestação, poder-se-á dizer que para aquele incumprimento dos RR., contribuiu a A. ao efectuar o projecto de implantação das moradias no terreno com deficiências. Terá existido, assim, no prisma do R. marido, um cumprimento defeituoso da obrigação.

                        Mas mesmo que assim fosse, um incumprimento defeituoso gera somente, segundo cremos, a obrigação de correcção dos defeitos e já não um incumprimento definitivo da obrigação. Como refere Galvão Telles[3]aquele que executa mal é obrigado, em princípio, a corrigir do defeito ou, se a correcção não se torna possível, a substituir a prestação imperfeita por outra perfeita”. Também Antunes Varela[4], excluindo os casos em que a irregularidade ou deficiência da prestação a afastam de tal forma da prestação exigível (em que o interesse do credor fica inteiramente por preencher) em que existirá uma situação de incumprimento ou mora, existirão casos “em que o credor, por analogia com o disposto no art. 808º nº 1, poderá exigir do devedor que corrija ou substitua a prestação defeituosa dentro do prazo razoável que para o efeito lhe fixar, sob pena de considerar a como definitivamente não cumprida”. Da mesma forma sustenta Almeida Costa[5]se o credor recusa a prestação defeituosa, passa-se também a um problema de incumprimento definitivo ou de mora (arts. 918º e 1032º)”.

                        No caso vertente e dado que notoriamente a natureza dos vícios eram susceptíveis de correcção (as próprias partes acordaram na realização da alterações necessárias à aprovação camarária), os RR. deveriam conceder, antes da resolução contratual, a possibilidade à A. de efectuar a prestação sem deficiências. Não poderiam, assim, com esse fundamento resolver o contrato.

                        De resto, na realidade (e contra o entendimento do R. marido expresso na declaração resolutiva), nem sequer está provado que, após as correcções realizadas pela A., as imperfeições do projecto subsistissem, pois demonstrou-se que a decisão camarária de indeferimento recaiu sobre a primeira versão do projecto sem apreciação, assim, das rectificações realizadas pela A. e entradas na Câmara Municipal de Cascais em 19 de Abril de 2002[6].

                        Em razão deste entendimento também não poderemos aceitar o que se refere no douto acórdão recorrido sobre o não se poder afirmar, com o mínimo de segurança, que com as alterações realizadas ao projecto inicial no segundo projecto, este viria a ser objecto de aprovação por parte da Câmara Municipal. Isto porque não tendo sido objecto de apreciação (em razão do pedido realizado pelo R. marido de suspensão da apreciação do projecto em 19-8-2002 – vide facto acima referido sob o nº 28 -), não se poderá com propriedade dizer que o projecto alterado não seria aprovado pela Câmara Municipal. A este propósito refere-se adequadamente na douta sentença de 1ª instância que “os réus alegam que a CMC não aceitou essas correcções, mas é manifesto que nessa parte não lhes assiste razão. Com efeito, uma vez que, entretanto o réu solicitou à CMC a suspensão do processo, essas correcções não chegaram a ser apreciadas pelos serviços técnicos daquela entidade, a qual, em face de tal pedido, acabaram por indeferir o projecto”.

                        Por outro lado, na carta de resolução o R. marido invoca também argumentos de ordem temporal justificativos da sua tomada de posição. Nestas circunstâncias, nos termos acima já referenciados, o que o R., como credor, poderia fazer, estando fora de causa a perda do seu interesse na realização do negócio, era transformar a mora em incumprimento definitivo, através da interpelação admonitória, fixando prazo razoável para o cumprimento da obrigação. Ou seja, o R. marido, entendendo ocorrer a mora, tinha ao seu alcance um dispositivo legal que lhe permitiria fazer cumprir o contrato ou então considerar este como não cumprido, retirando daí as correspondentes consequências. Isto sem prejuízo de poder exigir da devedora o ressarcimento dos prejuízos que a mora lhe poderia ter causado (art. 804º nº 1). Não poderia, todavia, com base na simples mora, proferir a declaração resolutiva do contrato.

                       

                        O contrato de prestação de serviços que, na definição da lei, é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição (art. 1154º), constitui uma obrigação de resultado. Ou seja, existe aqui como que uma garantia de que a acção será profícua no sentido de que o trabalho seja apropriado aos fins a que se destina, o que implicava, no caso, a execução dos projectos em conformidade com as regras legais aplicáveis e em condições de aprovação pela Câmara Municipal de Cascais.

                        Ao contrato de prestação de serviços aplica-se, com as necessárias adaptações, as regras do mandato (art. 1156º).

                        O mandato e concomitantemente o contrato de prestação de serviços é livremente revogado por qualquer das partes (art. 1170º nº1), mas se tiver sido conferido também no interesse do mandatário (ou prestador de serviços), o que é o caso dos autos[7], não pode ser revogado pelo mandante sem o acordo do outro interessado, salvo ocorrendo justa causa.

                        Para além do que já dissemos em relação à necessidade de o credor possibilitar à outra parte a correcção da prestação deficiente, acrescentaremos que a factualidade apurada não é de molde a concretizar uma situação de revogação do mandato por motivo de justa causa. É que, como se viu, não se demonstrou que a A. não pudesse suprir as eventuais deficiências que o projecto apresentava[8], sendo certo também que nem sequer ficou assente que no projecto rectificado subsistissem as imperfeições, dado que se demonstrou que a decisão camarária de indeferimento recaiu sobre a primeira versão do projecto sem as rectificações realizadas pela A.. Foi, aliás, o próprio R. marido que inviabilizou a avaliação do projecto alterado (e subsequente possível aprovação camarária), em razão do seu pedido de suspensão da apreciação do projecto.

                        Na carta de resolução enviada à A., para além do uso de argumentos de ordem temporal, alega o R. marido que a A. elaborou o projecto de loteamento com violação clara das disposições do Plano Director Municipal, do Regulamento Geral das Edificações Urbanas e de outras disposições legais aplicáveis aos projectos em causa, além de reduzirem consideravelmente o número de moradias.

                        Para além da generalidade da imputação e do que já referimos em relação ao cumprimento defeituoso da obrigação, diremos que os factos provados não indiciam essa asserção, pelo menos em relação ao projecto alterado, sendo que a redução do número de moradias foi acordada pelas partes.

                        É certo que se provou que a sociedade A., se tivesse actuado de forma mais atenta e cuidada na sua elaboração, teria evitado, pelo menos, muitas das deficiências apontadas pela CMC e referidas na alínea V), mas estas circunstâncias são irrelevantes para a consideração da justa causa de resolução. É que, por um lado, as deficiências em causa dizem respeito ao primitivo projecto e, pelo outro, essas imperfeições não foram relevantes para os RR. já que, depois disso, aceitaram que a A. realizasse as necessárias alterações ao projecto, mantendo, assim, o contrato.

                        É certo, igualmente, que como afirmam os recorridos nas suas doutas contra-alegações, a efectivação do direito da A. não se concretizava com a simples elaboração do projecto, mas implicava que tal realização fosse efectuada de forma adequada, em condições de o projecto ser aprovado. Por isso, como acima já dissemos, a obrigação do prestador de serviços é uma obrigação de resultado. Mas a controvérsia surgiu em razão do pedido inopinado de suspensão, junto da Câmara, da apreciação do projecto por banda do R. marido e da sequente resolução do contrato por este, acções que inviabilizaram o aperfeiçoamento do projecto de arquitectura, com vista à sua aprovação camarária.

                        Não se vê, deste modo, qualquer justa causa que justifique a resolução do contrato operada pelo R. marido[9].

                        Foi ilegal, por conseguinte, a resolução contratual efectuada pelo R. marido, devendo o incumprimento ser-lhe imputável. Por isso, deve indemnizar o credor pelo prejuízo que causa ao credor (art. 798º), sendo que a A. faz coincidir esse prejuízo com o preço dos trabalhos de arquitectura realizados e não pagos.

                        Vendo a questão sob o ponto de vista do contrato de prestação de serviços, então terão os RR. (igualmente) de pagar as tarefas efectuadas e não solvidas, de harmonia com o disposto nos arts. 1156º e 1167º al. b).

                       

                        Como se disse acima, a A. pede que os RR. lhe paguem os trabalhos de arquitectura que realizou e que não lhe foram pagos na sua totalidade. Efectuou serviços no montante global de 87.389,00 €, tendo-lhe sido pago somente o valor de 34.915,85 €, faltando, assim solver 52.473,54 €.

                        Compulsando a petição inicial verifica-se que os trabalhos que a A. diz ter efectuado foram referenciados no art. 115º. Designadamente afirma que realizou 12 projectos tipo de apartamento, 32 repetições de projecto tipo apartamento e procedeu à concepção geral do empreendimento, implantação, topografia, acessos, arruamento e cave, ascendendo os respectivos honorários a 87.389,00 €.

                        A A. logrou demonstrar que realizou todas estas acções (vide facto provado sob o nº 71- resposta ao art. 60º da BI -), tendo conseguido também provar o custo dessas realizações. Na verdade, evidenciou que ela, A., através do seu sócio gerente Arq. DD e o R. marido, acordaram que os honorários (na parte afectada pela alteração do acordo ou pela alteração do projecto) passariam a ser os seguintes: Pela elaboração de cada projecto tipo € 4.289,66 (860.000$00), no total de € 51.475,94 (10.320.000$00) pelos 12 projectos tipo, por cada repetição de projecto tipo € 498,00 (100.000$00) no total de € 15.962,00 (3.200.000$00) pelos 32 projectos tipo e pela concepção geral do empreendimento, implantação, topografia, acessos, armamentos e cave € 19.951,91 (4.000.000$00- factos referidos acima sob o nº 20), tudo no montante global de 87.389,85 €[10].

                        Demonstrou-se que os RR. pagaram à A. a quantia de 34.915,85 € (7.000.000$00), pelo que terão ainda a pagar o montante de 52.473,15 € (87.389,00 – 34.915,85).

                        Sobre esta quantia deverão incidir os juros moratórios legais a partir da citação (arts. 804º, 805º nº1).

                        Quer dizer que a acção será procedente, concedendo-se, assim, a revista.

                        III- Decisão:

                        Por tudo o exposto concede-se a revista, julgando-se a acção procedente, condenando-se os RR. a pagarem à A. a quantia de 52.473,15 € acrescida dos juros moratórios legais a computar a partir da data da citação.

                        Custas na acção e na revista pelos RR..

Garcia Calejo (Relator)
Helder Roque
Gregório Silva Jesus

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[1] A invocada rescisão é equivalente à resolução contratual.
[2] Das Obrigações em Geral, 7ª edição, II Volume, pág. 275)
[3] Direito das Obrigações, 7ª edição, pág. 337
[4] Das Obrigações em Geral, Vol. II, 7ª edição, págs.128 e 129.
[5] Direito das Obrigações, 11ª edição, pág. 1061
[6] Atendendo a esta circunstância, entendemos incorrecta a afirmação produzida na sentença de 1ª instância de que não será permitido concluir que a A. executou todas as correcções exigidas pela CMC. Evidentemente que tendo o indeferimento recaído sobre a primeira versão do projecto sem as rectificações realizadas pela A., desconhece-se o que sucederia se esse novo projecto fosse submetido à aprovação camarária, sendo que não está demonstrado que, caso este projecto fosse novamente indeferido, a A. não pudesse proceder no sentido de colmatar as eventuais deficiências.
[7] É um contrato celebrado também no interesse do prestador de serviços visto que o desenvolvimento do projecto de arquitectura implica o desempenho de uma actividade económica que se repercute directamente na esfera patrimonial da empresa.
[8] Circunstância a alegar e provar pelos RR. (art. 342º nº 2 do C.Civil).
[9] O próprio acórdão recorrido, conclui que não assistia justa causa ao R. marido para proceder à rescisão do contrato.
[10] Diga-se que em relação a este montante global o A. apenas pede 87.389,00, prescindindo, assim, dos remanescentes 0,85 €.