Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
12927/94.2TVLSB.L1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: RICARDO COSTA
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
OPERAÇÃO DE BOLSA
MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
ILICITUDE
NEXO DE CAUSALIDADE
TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
PRESSUPOSTOS
Data do Acordão: 10/17/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: REVISTA IMPROCEDENTE E DA LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ.
Sumário :
I- A responsabilidade fundada no art. 463º (em especial n.os 1 a 3) do CVM de 1991, sem prejuízo da relação de intermediação financeira geradora da celebração de operações sobre valores mobiliários por conta e no interesse de outrem, deve ser qualificada como extra-negocial e, sendo regulada pela exigência dos pressupostos constitutivos do art. 483º, 1, do CCiv., não pode ser decretada se, em especial, não se identificam as normas legais específicas de protecção de interesses alheios em benefício da tutela do lesado alegadamente violadas pela actuação de solicitação de operações em mercado de bolsa e não se demonstra provado o nexo de causalidade imputacional exigido pelo critério do art. 563º do CCiv.
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 12927/94.2TVLSB.L1.S1


Revista – Tribunal recorrido: Relação de Lisboa, ... Secção


Acordam na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça


I) RELATÓRIO


1. «Sofin – Sociedade Financeira Internacional de Corretagem (Dealers), S.A.», depois sob a firma «Caixa Valores – Sociedade Financeira de Corretagem, S.A.», tendo na sua posição sido habilitada a «Caixa – Banco de Investimento, S.A.», instaurou acção declarativa sob forma de processo ordinário contra «BSN Dealer – Sociedade Financeira de Corretagem, S.A.», objecto de fusão e depois passando a integrar a «Banco Santander Totta, S.A» (1.ª), AA (2.º), BB (3.º), CC (4.ª), DD (5.º), entretanto falecido e representado pelos seus herdeiros habilitados, CC, EE, FF e GG, e EE (6.ª), pedindo, na procedência da acção, a condenação solidária dos Réus a pagar à Autora a quantia de 1.203.509.628$00 de capital, acrescida de juros à taxa legal de 15% desde 30/6/1993, vencidos até à data da propositura da acção no montante calculado de 225.661.804$ e vincendos àquela taxa.


À acção atribuiu o valor de 1.429.191.432$00.


Em síntese bem apertada, e sem visar de todo completude quanto ao conteúdo do articulado inicial, a Autora alega:


A referência às actividades que constituem o respectivo objecto social, bem como o da 1.ª Ré, que no acto de constituição teve como administradores entre outros o 2.º Réu, este até final de Março de 1992, tendo o 3.º Réu trabalhado desde 10/4/1991 para a 1.ª Ré, assumindo a direcção efectiva e a assumindo a gestão diária daquela, sendo a 4º, 5.ª e 6.ª Réus clientes da 1.ª Ré desde início e simultaneamente titulares de contratos de conta corrente de operações na bolsa.


A 1.ª Ré, sob a direcção e representação do 3.º Réu, a partir de determinada data, solicitou à Autora operações de compra e venda de títulos cotados, para vários clientes, na Bolsa de ....


A Autora cumpriu ou mandou cumprir tais operações em nome e por conta da 4.ª, 5.º e 6.ª Réus, creditando directamente as contas bancárias dos clientes da 1.ª R., e recebendo os pagamentos e títulos que os clientes da 1.ª R., 4.º a 6.º RR. lhes deviam entregar, num volume diário de milhões de contos, efectuando a Autora a compensação de créditos das operações com depósito do saldo financeiro em conta indicado pelo 3.º R., em representação da 1.ª R., com o respectivo conhecimento.


Praticou desconto no preço das operações, sem exigir à 1.ª Ré depósito prévio dos títulos ou outra forma de posse efectiva somente após a operação concretizada, com base na confiança existente e idoneidade do sistema financeiro e da 1ª R., com cumprimento pontual das obrigações.


A partir de 17/2/92, a Autora efectuou entrega de títulos sem qualquer contrapartida financeira, por confiar no 3.º, 2.ª e 1.ª Réus, tendo sido forçada a aceitar determinadas operações visto que houve títulos excluídos do mercado, sendo forçada a contrair um empréstimo bancário para suprir a ruptura financeira emergente e obviar a maiores prejuízos de terceiros.


A 1.ª Ré, sob as ordens do 3º Réu e com o necessário conhecimento e autorização do 2.º Réu, intermediava a compra e venda de acções, em nome dos 4.º a 6.º Réus e aludidos clientes. Operações estas realizadas de forma criteriosa no tempo, para que o produto da venda permitisse a compra dos títulos, aproveitando a prática distinta das operações realizadas na Bolsa de Valores de ....


Tais condutas determinaram grave lesão no património da Autora, consequência directa do plano de enriquecimento pessoal e ilícito dos 3.º, 4.º, 5.º e 6.º Réus, com autorização e apoio directo do 2.º Réu e lucro indirecto da 1.ª Ré, e omissão pelos 3 primeiros Réus de deveres legais e contratuais para com a Autora, havendo ligações familiares entre o 3.º e 6.ª Réus, entre os 4.º e 5.º Réus e a 6.ª Ré.


Com efeito e em particular.


Através da 2.ª Ré eram realizadas operações de venda a descoberto configuradas como crime de burla e manipulação de mercado, p. e p. respectivamente pelo arts. 301º ex vi do art. 313º, 2, e art. 667º do Código de Mercado e Valores Mobiliários. Assim a 1.ª Ré, sob as ordens do 3.º Réu, e com necessário conhecimento e autorização do 2.º Réu, obtinha em nome e para o 4.º a 6.º Réus e demais clientes referidos na PI somas avultadíssimas de dinheiro pela simples oferta de venda e consequentemente recebimento de preço de títulos que sabiam inexistentes. E na posse de tais somas, a 1.ª Ré, sob as ordens do 3.º Réu e com o necessário conhecimento e autorização do 2.º Réu, intermediava a compra e venda de acções, em nome dos 4.º a 6.º Réus e aludidos clientes. Operações essas realizadas de forma criteriosa no tempo para que o produto da venda permitisse a compra dos títulos com cuja antecipada e falsa venda obtivera inicial financiamento da compra de acções, por forma que sobejasse um lucro para os Réus.


A 1.ª R tinha interesse directo nas operações a descoberto uma vez que os clientes recebiam mais taxas de corretagem e obtinha lucros com financiamento à custa alheia.


Da parte dos três primeiros Réus ocorreu violação dos deveres de boa fé, informação e lealdade a que estavam obrigados pelo 762º, 2, 798º, 1, e 800º do Código Civil, e por força do disposto na al. d) do art. 184º e n.os 1 e 2 do art. 657º do Código de Mercado de Valores Mobiliários.


A 1.ª Ré é responsável pelas consequências danosas dos actos e omissão dos seus representantes, 2.ª e 3.º Réus, no âmbito e exercício das suas funções, verificando-se culpa própria na escolha do 3.º Réu como seu representante e omissão de fiscalização e vigilância dos actos deste último, com violação do disposto nos arts. 165º, 798º, 800º, ex vi do n.º 2 do art. 799º, 483º, 490º, 1 e 2, e aplicação do art. 500º do Código Civil. Sendo que o 3.º Réu praticou actos em representação dos 4.º a 6.º Réus como representante da 1ª R, emergindo responsabilidade dos arts. 1163º, 218º, 2, 325º, 2 e 352º do Código Civil, assim como a violação do princípio geral da boa fé vertido nos arts. 227º, 334º e 762º, 2 do Código Civil.


Quanto à 4.ª Ré, casada com o 5.º Réu, e à 6.ª Ré, casada com o 3.º Réu, verifica-se o proveito comum do casal.


Encontrando-se todos os Réus constituídos no dever solidário de pagar à Autora o crédito equivalente às despesas que teve de efectuar para evitar prejuízos de terceiros, resultado directo e necessário dos actos dos RR.


2. Foram apresentadas Contestações pela 1.ª e 2.º Réus («BSN Leader» e AA), por um lado, e pelos 3.º a 6.º Réus, por outro, finalizando com a absolvição dos pedidos e requerendo-se em ambas a condenação em má fé da Autora.


A Autora apresentou Réplica.


3. Foi admitida a intervenção de HH como assistente da Autora, no pressuposto de que a Autora se obrigou a pagar 40% do valor que vier a recebe dos Réus na presente demanda.


4. Foi proferido despacho saneador, seguido de especificação e questionário, e realizada audiência de discussão e julgamento em várias sessões, de acordo com as actas constantes dos autos.


Foi proferida decisão sobre a matéria de facto, alterada após reclamações.


Foram apresentadas alegações de Direito.


5. Foi proferida sentença na ... Vara Cível de …, na qual, identificando-se as questões decididendas – “Se os RR, mormente o 3.º agindo em representação da 1.ª R e com o conhecimento do 2.º, violaram norma que regia a respectiva actividade e com violação dos princípios de confiança e boa fé e com a sua conduta causaram danos à A.”; “Da responsabilidade civil aquiliana.”; “Da actuação do 3.º R como comissionista.”; “Da indemnização à A., e suas consequências no que tange à Assistente nos autos.”; “Da litigância de má fé da A.” –, se julgou a acção improcedente, por não provada, absolvendo-se os Réus do pedido formulado pelas Autoras e Assistente, e se condenou a Autora em litigância de má fé em multa de 10 UCs e indemnização no valor de € 3.000 a favor dos Réus, no montante de € 500 a cada um deles a suportar pela Autora e a pagar directamente aos Mandatários.


6. Inconformada, veio a Autora interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, que conduziu a ser proferido acórdão, no qual, vistas as questões delimitadas no objecto recursivo, (i) foi indeferida a nulidade arguida com base no art. 615º do CPC, (ii) foi reapreciada a decisão sobre a matéria de facto, com rejeição (baseada na aplicação do art. 640º, 1, 2, b) e c), do CPC) e improcedência, sem prejuízo do aditamento de novo facto provado com base em documento autêntico, e, (iii) quanto ao mérito da apreciação da responsabilidade civil que funda o pedido da Autora, julgou improcedente o recurso; por fim, julgou ainda improcedente o pedido de litigância de má fé da Autora com a Apelação; confirmando-se no dispositivo a decisão recorrida.


7. Novamente sem se resignar, a Autora interpôs recurso de revista para o STJ, ao abrigo dos arts. 671º e 674º do CPC 2013, em cujas Conclusões identificou e desenvolveu as duas questões que fariam merecer a revogação do acórdão recorrido e a condenação dos Réus como pedido: “demonstrar o nexo de causalidade entre as operações de bolsa e os prejuízos da Autora invocados”; “demonstrar que a responsabilidade em causa é contratual, mas mesmo considerada como responsabilidade aquiliana, a matéria provada determina também a procedência da acção” (cfr. Conclusão 3.ª).


Os Réus CC, DD, representado pelos seus herdeiros habilitados, CC, EE, FF e GG, e EE apresentaram contra-alegações: (i) o recurso não é admissível por aplicação do art. 671º, 3, do CPC 2013 (“dupla conformidade”); (ii) apreciando do mérito, e sem qualquer fundamento para qualquer reapreciação da matéria de facto nos termos do art. 674º, 3, do CPC, deve ser negada a revista, mantendo-se o acórdão recorrido.


O 3.º Réu BB apresentou contra-alegações: (i) o recurso não é admissível por aplicação do art. 674º, 3, e do art. 671º, 3, do CPC 2013 (“dupla conformidade”); (ii) admitindo-se, deve improceder e absolver-se o aqui 3.º Réu como os demais Réus de todos os pedidos formulados pela Autora; (iii) peticiona e pugna pela procedência da litigância de má fé da Autora Recorrente em revista; (iv) condenar-se a Autora Recorrente em taxa sancionatória excepcional nos termos do art. 531º do CPC.


Os 1.ª e 2.º Réus «Banco Santander Totta» e AA apresentaram contra-alegações: (i) o recurso não é admissível por aplicação do art. 721º, 3, do CPC 1961, na versão conferida pelo DL 303/2007, de 24 de Agosto, em face da norma transitória do art. 7º, 1, da Lei 41/2013, que aprovou o CPC 2013 (“dupla conformidade” antes da modificação operada pelo actual art. 671º, 3, do CPC); (ii) no mérito, em face da matéria de facto provada à qual se subsume a disciplina legal da responsabilidade, deve improceder; (iii) peticionam que se julgue procedente a condenação da Autora Recorrente na revista como litigante de má fé.


8. A Autora atravessou ainda requerimento nos autos com pedido de rectificação de lapso material no acórdão recorrido no que respeita à “transcrição informática do rol dos factos provados”, exercício do contraditório quanto à questão prévia de inadmissibilidade de recurso (sendo de afastar o regime da “dupla conformidade” do art. 721º, 3, do CPC 1961 na versão de 2007) e ao pedido de condenação em litigância de má fé (pugnando pela improcedência).


O 3.º Réu BB apresentou pronúncia nos termos do art. 3º, 3, do CPC, assim como os 4.º a 6.º Réus.


9. A Autora e os 1.º e 2.º Réus apresentaram a junção aos autos de Pareceres Jurídicos, com exercício ulterior de contraditório nos autos, também relativamente à conduta de má fé processual da Autora evidenciada nessa junção.


10. Foram proferidos despachos pelo aqui Relator de admissão nos autos da junção dos referidos Pareceres Jurídicos e de anotação da mudança da sede da Autora e aqui Recorrente.


11. Foi proferido pelo aqui Relator despacho no âmbito e para o efeito previsto pelo art. 655º, 1, do CPC, tendo em conta a aplicação do art. 721º, 3, do CPC 1961, na versão introduzida pelo DL 303/2007, de 24 de Agosto (dupla conformidade decisória).


A Autora e Recorrente respondeu, pugnando pela não aplicação do regime da “dupla conformidade decisória”, seja qual for o regime legal convocado, em função da interpretação sustentada para o art. 7º, 1, da Lei 41/2013, de 26 de Junho. Subsidiariamente, no caso de prevalecer a solução conducente à inadmissibilidade da revista, requer o julgamento ampliado da revista nos termos do art. 686º e ss do CPC.


Os Réus e Recorridos apresentaram igualmente pronúncias, batendo-se pela inadmissibilidade da revista.


Foi proferido pelo aqui Relator despacho de não conhecimento do objecto do recurso, ao abrigo do regime do art. 652º, 1, do CPC.





Impugnado tal despacho através de Reclamação para a Conferência pela Autora e Recorrente «Caixa – Banco de Investimento, S.A.», foi, após mudança de Relator por vencimento, proferido acórdão em que, aferindo-se da interpretação e âmbito de aplicação dos arts. 11º, 1, do DL 303/2007, e 5º, 1, e 7º, 1, da Lei 41/2013, de 26 de Junho, em matéria de “dupla conformidade” decisória impeditiva da revista, se julgou procedente a Reclamação, revogando o despacho reclamado e, em sua substituição, “sendo o recurso próprio (de revista), interposto tempestivamente, por quem tem legitimidade e nada havendo que obste ao conhecimento do seu objeto”, admitiu o recurso (transitado em julgado após acórdão sucessivo sobre arguição de nulidade, que a indeferiu, por maioria do Colectivo).


Nesse primeiro acórdão o aqui Relator votou Vencido, apondo declaração em conformidade.


12. Subsequentemente, por decisão do Senhor Presidente do STJ, foi designado o aqui Relator (originário) para lavrar o acórdão, em detrimento do Relator por vencimento no acórdão que admitira o recurso.


A decisão foi notificada às partes, sem qualquer resposta ou pronúncia.





Cumprido para obtenção de vistos o previsto no art. 657º, 2, do CPC, cumpre apreciar e decidir sobre o mérito da impugnação da Recorrente.


II) FUNDAMENTAÇÃO


1. Factualidade assente


Foi dada como assente nas instâncias a seguinte factualidade:


Da especificação


A) A A. constituiu-se por escritura pública de 12/11/90 e tem como objecto social a compra e venda de valores mobiliários por conta própria ou por conta de terceiros e a subscrição de valores mobiliários de rendimento fixo ou variável emitidos por entidades de direito privado ou de direito público e a intervenção na colocação desses valores, com ou sem tomada firme da totalidade ou de partes das respectivas emissões bem como a participação, dentro dos limites consentidos por lei, no capital de sociedades que não sejam corretoras nem financeiras de corretagem e concessão, nos termos e condições legalmente definidos, de financiamentos a clientes, para a aquisição de valores mobiliários e, também o processamento de carteiras de clientes, a guarda de valores mobiliários e a cobrança dos respectivos rendimentos, bem como, se devidamente autorizado pelos clientes, o exercício de outros direitos sociais.


B) A 1ª R. constituiu-se em 10/4/91 com o capital social realizado de 500.000.000$00 e tem por objecto social a "compra e venda de valores mobiliários por conta própria ou por conta de terceiros, bem como a realização de quaisquer outras operações exercício de actividades de prestação de serviços como os legalmente consentidos às sociedades financeiras de corretagem".


C) Nessa mesma data a 1.ª R. adquiriu e integrou o estabelecimento de corretagem individual incluindo trabalhadores, locais e clientes o que tudo era propriedade de II, corretora oficial na Bolsa de Valores ... (B.V. ..., doravante).


D) Razão pela qual, só a partir desta data de 30/4/91, e na mesma B.V. do ..., passou então a 1ª R. a operar directamente e em seu próprio nome.


E) Relativamente à Bolsa de Valores ... (B. V. …, doravante), a 1ª R. só a partir de 24/1/92 foi autorizada a operar directamente, e em seu próprio nome, nos termos legais, nomeadamente do disposto no art. 209 do CMVM (DL 142/A/91 de 10/4).


F) A 1ª R. até 16/9/93 denominava-se "BCI – Valores, Sociedade Financeira de Corretagem, SA" e, a partir desta data, mudou-a para a que actualmente usa (doc.1).


G) No acto da constituição da 1.ª R. ficaram como seus administradores, a aludida II, o ora 2° R, e JJ, KK e LL, estes três residentes em Espanha.


H) Em acta n.º 2 de assembleia geral da 1.ª R. ficou consignado em 28.07.1991 a renúncia dos administradores JJ e KK, e


I) A nomeação, na mesma data e para os mesmos cargos, de MM e NN, ambos também residentes em Espanha.


J) Em 17.10.91 pela mesma forma e por acta n.º 3, foram nomeados administradores daquela R., OO e PP.


L) Tendo o 1º renunciado a tais funções que nunca chegou a exercer, em 6.12.91 e,


M) Na mesma data de 6.12.91 a então e até aí presidente do Conselho de Administração da 1.ª R., II, renunciou também a tal cargo.


N) Em conformidade, a 1ª R., representada pelo 2° R., e outro administrador, deu poderes ao 3º R. para emitir ordens de transferência bancária e de emitir/assinar os seus cheques para pagamento aos seus clientes sem qualquer limite, com a assinatura conjunta de um outro seu funcionário QQ.


O) Enquanto não obteve autorização, para intermediar/realizar operações na Bolsa de Valores ..., por conta e ordem dos seus clientes, a 1ª R., através dos seus legais representantes, socorria-se das corretoras acreditadas/ autorizadas na praça ... para que aqui lhe efectuassem as pretendidas operações, da mesma forma que no primeiro mês da sua actividade na B.V. ... usara a corretora Drª II.


P) Foi uma prática de colaboração entre sociedades corretoras enquanto cada uma não dispunha de autorização administrativa para operar simultaneamente em ambas as bolsas do país.


Q) Esta prática era efectuada como forma de melhor administrar e realizar os interesses dos respectivos clientes e mandantes, pois as cotações e as oportunidades de negócios bolsistas variavam, da Bolsa ... relativamente à de ….


R) O 3° R. confirmou, relembrando então o seu fax do dia 18 (doc. 52) que mais 7 pessoas, por ele angariadas, algumas delas ainda funcionários da 1ª R. estavam disponíveis para com ele, iniciarem funções para a A., de acordo com as categorias profissionais e salários que ele 3° R. se propunha negociar, em nome delas, com a A.


S) Nessa ocasião, prontificou-se a planear um levantamento de todas as necessidades humanas e técnicas de tal escritório com orçamento respectivo afirmando que nos dias seguintes iria enviar tal estudo.


T) A A. emitiu e entregou ao 3º R. a pedido do mesmo, uma "Declaração" da qual constava que: "Encontrando-se o senhor Dr. BB liberto de quaisquer compromissos profissionais no momento presente, a Sofin, pela presente lhe assegura desde já, lugar compatível com os seus dotes profissionais nos seus quadros ou em qualquer das empresas do seu grupo criadas ou a criar quer ao nível de direcção quer de Administração".


U) Às 17h30m do dia 25/2/92 o Banco de Portugal informou a A. que faltavam na sua conta junto deste, para a liquidação/compensação desse dia, cerca de 1.138.056.401$00 correspondente à sua obrigação de pagamento das operações de bolsa do dia 19, perante o sistema, razão pela qual não iria ser feita a compensação desse dia.


V) Invocando tais razões, o 2º R. recusou-se a assumir qualquer responsabilidade da 1ª R. pelos factos referidos.


X) O que custou 2.438.817.600$00, que teria de ser pago aos respectivos vendedores na liquidação financeira do dia 5/3/92, conforme docs. 75, 76 e 77, juntos à pi.


Z) Após 5 de Março de 92 e os factos acima descritos veio a A. a saber que a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários instaurou no final de Fevereiro de 1992, à 1.ª, 2° e 3° RR., um processo contra-ordenacional o qual, veio a culminar com a decisão punitiva aos três RR..


AA)


Os ali arguidos e ora 1.ª e 2° RR. dela interpuseram o respectivo recurso para o Tribunal de Polícia competente, e, veio este, a proferir a sentença cuja cópia, dando-se já por reproduzida, e consta aliás da Col. Jur. Tomo III 1993 pag. 19 e sgs.


BB) Na aludida sentença foi decidido quanto à 1.ª R.: "Condenar a arguida BCI Valores pela prática de uma contra-ordenação prevista e punida pelos artigos 184° n.º 1, c), 410° n.º 3 a) e 671° n.º 7 b) do C.M.V.M., por factos ocorridos em 24 de Janeiro de 1992, numa coima de 7.000.000$0( (sete milhões de escudos), pela prática de outra contra-ordenação, prevista e punida pelos mesmo: artigos, por factos ocorridos em 17, 18 e 19 de Fevereiro de 1992, numa coima de 9.000.000$0( (nove milhões de escudos) e pela a prática de uma contra-ordenação prevista e punida pelos artigos 657° n.º2 e 672° b) do C.M.V.M., numa coima de 600.000$00 (seiscentos mil escudos).


Nos termos dos artigos 32° do Decreto-Lei 433/82 e 78° do Código Penal, condeno a arguida BCI Valores na coima única de 13.500.000$00 (treze milhões e quinhentos mil escudos).


Nos termos dos artigos 673° n.º1, a) do C.M.V.M. e 24° do Decreto-Lei n.º 433/82, determine a apreensão, à arguida BCI Valores, da quantia de 1.347.944$00 (um milhão, trezentos e quarenta e sete mil novecentos e quarenta e quatro escudos), que reverterá a favor do Estado, a qual deverá ser depositada por esta arguida, à ordem deste processo".


CC) Quanto ao 2° R. foi decidido: "Condenar o arguido AA, pela prática de uma contra-ordenação prevista e punida pelos artigos 657° n." 2 e 672° b) do C.M.V.M., numa coima de 600.000$00, e, absolver o arguido AA, da acusação da prática de um" contra-ordenação prevista e punida pelos artigos 184° n.ºl c), 410° n.º 3 e 671 ° n.º 7 b) do C.M.V.M., revogando a decisão da C.M.V.M. na parte em que condenou o arguido pela prática desta infracção.


Revogo a sanção acessória, aplicada pela Comissão do M.V.M., ao arguido AA, de interdição, durante três meses, do exercício de qualquer actividade profissional de intermediação prevista no C.M.V.M ".


DD) Quanto ao 3° R. foi decidido: "Manter nos seus precisos termos a condenação ao arguido BB, que não interpôs recurso da decisão da Comissão do M.V.M. que se passa a citar «O arguido BB, pela prática das contra-ordenações previstas e punidas pelos artigos 671º n.º 7 b) e 10, vai condenado na coima de 3.000.000$00 (três milhões de escudos) na sanção acessória da publicação, a expensas do arguido, pela prática da contra-ordenação, ao abrigo da norma contida no artigo 673° n.º 1 c) do Código.


Tendo em conta a actividade desempenhada pelo arguido e a natureza da contra-ordenação pela qual é responsável, vai ainda o arguido condenado, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 673 do Código, na sanção acessória da inibição do exercício de funções de administração, direcção chefia ou fiscalização e, em geral de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito do exercício de qualquer das actividades profissionais de intermediação previstas no artigo 6080 do Código do Mercado de Valores Mobiliários, durante cinco anos»".


EE) Foi ainda decidido "Nos termos do artigo 673, n.º 1 d) do C.M.V.M. determina-se a publicação da presente sentença, que ficará a cargo da Comissão da M.V.M., sendo a respectiva despesa suportada pelos três arguidos, solidariamente, em partes iguais".


FF) Como consequência da tardia liquidação financeira do dia 25/2 e da divulgação pública que o caso conheceu, a Comissão do Mercado dos Valores Mobiliários instaurou dois processos de contra ordenação:


a. Um, com o nº 10/92, teve como arguidos os aqui 1°, 2° e 3° RR.;


b. Outro, com o nº 11/92, teve como arguidos a Sofin, os administradores da Sofin, Drª HH (Presidente do Conselho de Administração) e RR, o Director Geral SS, o funcionário TT e o aqui 3° R., Dr. BB.


GG) No proc. 10/92, em que foi em 1° lugar, arguida a BCI-Valores, foram dadas como provadas as vendas a descoberto dos dias 17, 18 e 19/2 e, ainda, uma outra, sem interesse para estes autos, realizada no dia 24/1 anterior do montante de 262.000 FIP's 89.


HH) No proc. 11/92, em que foi, em 1º lugar, arguida a Sofin, foram dadas por provadas, em parte respeitante às operações da A. e do 3° R., as seguintes vendas a descoberto:


a) Em 2/9/91, 150.000 obrigações Capital BPI 87, 2000 Obrigações Marconi-Port, 2.000 Obrigações FIP 87 e 2950 Obrigações EFACEC;


b) Em 17/9/91, 100.000 Obrigações Capital BPI 87, 3.000 Obrigações FIP's 97 e 12.300 títulos de participação BPSM 86;


c) Em 17/9/91, 170.00 obrigações Capital BPI 87, 12.300 títulos de participação BPSM 86 e 3.00 obrigações FIP 87;


d) Entre 16 e 23/12/91, oito vendas consecutivas de Obrigações FIP 89, no quantitativo total de 321.500 destas obrigações;


e) Em 21/2/92, .....00 Obrigações FIP 89;


f) Em 24/2/92, .....60 Obrigações FIP 87.


II) A prova das vendas a descoberto efectuadas pela A. e apuradas no proc. nº 11/92 foi efectuada com o concurso da confissão da própria A. que, na sua defesa, escreveu, conforme consta da síntese feita pelo relator respectivo:


"1.1. A Sofin-Sociedade Financeira Internacional de Corretagem, SA confessa a existência de vendas a descoberto".


LL) A A. não recorreu da sentença, proferida no proc. 11/92 que transitou.


MM) A 1ª R. vincula-se com duas assinaturas.


NN) Ao R. BB foram conferidas, entre outras, as seguintes competências (cfr. doc. n° 3 da p.i.) :


(i) "Fiscalizar e garantir a boa execução de todas as operações em que o escritório ... intervenha, no rigoroso cumprimento das disposições legais em vigor e dos princípios ético e deontológicos que vinculam toda a actividade social da empresa";


(ii) "Informar prontamente (…) de todas as ocorrências (...) que possam de qualquer modo influenciar o bom exercício da actividade social";


(iii) "Comunicar imediatamente (…) quaisquer infracções ou seus indícios, eventualmente praticados nos serviços a seu cargo";


(iv) "Dar pronto conhecimento (…) de todas e quaisquer operações intermediadas pela Sociedade que não sejam pontualmente liquidadas, quer física quer financeiramente".


OO) Ao R. BB foram conferidos pela 1ª R. os poderes constantes da procuração cuja fotocópia foi junta como doc nº1.


PP) (…) – Eliminada por acordo das partes.


QQ) O R. BB tinha ainda poderes genéricos para recepcionar dos clientes ordens de compra e venda, a serem executadas em Bolsa.


RR) Em 2/9/91 a 4ª R. tinha assinado e dirigido à 1ª R. a carta junta, como doc. 11, autorizando que a 6ª R. "pode movimentar a minha conta" (sic), a qual era do conhecimento do 3° R. e dos funcionários da 1ª R. Srs. QQ e UU, dos seus serviços financeiros e contabilisticos, e não podia ser desconhecida do 2° R.


SS) Todas as operações de Bolsa realizadas foram operações a contado e a liquidação financeira destas ocorria, (por força do regulamento da B.V. …, então em vigor), no termo do prazo de D + 4 (Dia da operação + quatro dias úteis) através do Banco de Portugal.


TT) E a compensação de títulos ("liquidação física") ocorria por entrega real de saldos físicos entre os intermediários financeiros do total das compras e vendas em bolsa durante cada quinzena, efectuando-se a sessão de compensação/entrega na data do último dia útil da quinzena + quatro dias úteis.


UU) Assim após verificação do nº total de títulos entregue, aquele banco depositário da 1ª R., cerca das 15 horas, emitiu recibo de recepção de 137.301 FIP 89, conforme doc. 65 que se dá por reproduzido


VV) No exercício das suas competências e no uso dos respectivos poderes, o R. BB estava obrigado a respeitar os limites definidos na "Informação Interna" que integra o doc. 113 da p.i.


XX) E a observar as "Normas de Ética e Independência da BCI-Valores" que aqui se juntam como doc. n° II, normas estas de que ele tomou conhecimento (doc. nº III da contestação do 1º e 2º RR.).


ZZ) De acordo com as referidas "Informação Interna" e "Normas de Ética", o R. BB estava proibido, enquanto representante da R. BSN Dealer, de intervir, ordenar ou executar ordens de Bolsa "descoberto".


AA-1) Sempre que a R.BSN Dealer recebia de um seu cliente uma ordem relativa à BV... transmitia tal ordem para um corretor autorizado a operar nesta praça, designadamente para a A..


BB-l) Indicando expressamente o nome do comitente (i.e., do cliente ordenador), por conta e em nome da qual a RBSN Dealer estava a actuar.


CC-I) Nas operações de corretagem a A. remetia para a R. BSN Dealer o verbete confirmativo (ou "contrato provisório”) da operação executada, com a indicação expressa do nome do comitente, seguido, entre parêntesis, da sigla BCI-Valores.


DD-1) E remetia à R. BSN Dealer a respectiva nota de débito da corretagem devida pela cliente-comitente.


EE-1) Em conformidade com a natureza da operação constante do "verbete" comprovativo da operação, R. BSN Dealer lançava na conta-títulos do cliente o respectivo movimento (débito de títulos, se se tratava de uma venda; crédito dinheiro, se se tratava de uma compra).


FF-l) De igual modo se procedia com a conta-corrente financeira do cliente na contabilidade da R. BSN Dealer.


GG-I) As despesas de corretagem apresentadas à R. BSN Dealer pela A., eram pagas pela própria R. BSN Dealer e de seguida debitadas na respectiva conta-corrente/financeira do cliente.


HH-1) O Director geral da A., SS, porque de facto em nome de um dos clientes dos 4° a 6º RR. e VV, WW e XX existiam 40.020 FIP/89, mandou que um funcionário da A. enviasse à BCI o fax cuja redacção o próprio 3° R. telefonicamente lhe pedira, e junto como doc. 46 da p.i.


II-1) A 4ª, 5° e 6ª RR, figuravam como clientes da 1ª R. desde o início do exercício do seu objecto social, porque assim já figuravam, na corretora II.


II-2) O 3° R. enviou à A. o cheque cuja cópia consta de fls. 585 dos autos.


II-3) No mesmo dia 20, a A. telefonou ao 3° R. informando-o das condições em que era possível obter aqueles títulos.


II-4) O 3º R. na qualidade formal de mandatário das 4ª e 6ª RR. tomou a iniciativa nos dias 24 e 25/2/92 de comprar alguns títulos.


II-5) No dia 5/3/92 o 3º R. enviou à A. o fax de fls. 637 dos autos, com o teor que aí consta.


II-6) O 2° R.., pelas 9 h do dia 20/2/92 mandou congelar todos os depósitos físicos e financeiros que estavam titulados na 1ª R., em nome da 4ª R., conforme às indicações destes.


Do questionário (seleccionada pela Relação por relevante para a decisão, sem prejuízo do fixado em 1.ª instância)


(…)


13º VV, WW e XX figuravam como clientes da 1ª R.


(…)


17º A fls 96 constam as assinaturas das RR. CC e EE estando as fls. 94 a 96 rubricadas ao alto direito pelos 2ºs e 3º RR.


18º As 4ª e 6ª RR. estavam inscritas como titulares na 1ª R., de contas correntes de operações de bolsa com o nº ....31 e com o nº 304263.


19º O 5º R. estava inscrito como titular na 1ª R., de uma conta corrente de operações de bolsa, com o nº 304532.


20º WW estava inscrito como titular na 1ª R., de uma conta corrente de operações de bolsa, com o nº 304417.


21º VV estava inscrita como titular na 1ª R., de uma conta corrente de operações de bolsa, com o nº 304416.


22º XX estava inscrita como titular na 1ª R. de uma conta corrente de operações de bolsa.


(…)


24º O 2º R. enviou o doc. de fls. 97 a 100 dos autos, manuscrito e assinado por este.


(…)


28º, 29º e 30º O 3º R., no período de Abril de 1991 a 21/2/92, indicando como clientes os 4º, 5º e 6º RR. e VV, WW e XX, solicitou à A. que fossem efetuadas as operações que constam nos docs. de fls. 105 a 188 e 293 a 553, que esta aceitou e executou.


(…)


34º Durante o período referido em 30º, a A. não teve qualquer contacto direto e pessoal com as pessoas aí referidas.


35º Dos pagamentos em execução de operações de bolsa a favor destas pessoas, sempre a A. dava conhecimento ao 3º R.


(…)


39º A A. ao efectuar o pagamento do saldo mensal de operações referidas em 30º, na execução de desconto, devolvia, pelo menos algumas vezes, em nome dos clientes em nome dos quais eram efectuadas as operações, uma percentagem da taxa bruta de corretagem que facturava em cada operação de intermediação.


(…)


43º A A. enviou à 1ª R., o fax de fls. 561/562, dos autos.


(…)


54º Na aceitação e execução das ordens de bolsa referidas em 30º, a A. não exigia da 1ª R. ou das pessoas aí indicadas que estes fizessem ou mandassem fazer, a liquidação antecipada das operações, ou seja, que relativamente às operações de compra de títulos, lhe fizessem prévia entrega do meio de pagamento respectivo, ou de provisão/preparo, para pagamento do preço de compra.


55º Identicamente, quanto às operações de venda de títulos, a A. não lhes exigia o depósito prévio, à sua guarda, dos respectivos títulos, ou outra forma de prova da posse efectiva dos títulos objeto de venda.


56º Só após a concretização das operações solicitadas a A. exigia, ou o preço, ou a entrega dos títulos, consoante se tratasse de uma compra ou de uma venda, dentro dos prazos de liquidação das operações.


57º O referido em 54º, 55º e 56º era baseado em relações de confiança e era prática noutras sociedades corretoras quando a relação era com um cliente institucional.


58º Tendo, desde Abril 1991, operações no valor de muitos milhões de contos, nunca a 1ª R. e ou as pessoas referidas em 30º, haviam deixado de cumprir integralmente para com a A. todas as suas obrigações nas respectivas datas.


59º Em 21/1/92 a A. verificou que teria que receber até à data de 06/02/92, por ordens de bolsa e operações já realizadas nos dias antecedentes por ordem do 3º R., um montante de FIP89 que valia aproximadamente 6,5 milhões de contos.


(…)


62º O cheque mencionado em II-2, destinava-se a garantir o pagamento da quantia referida em 59º.


63º O 3º R. providenciou para que a A. recebesse os títulos em falta, sendo que no final de Janeiro de 1992 não existia qualquer dívida para com esta, havendo mesmo um crédito.


(…)


74º-A O 3º R. tinha sido sondado pela Presidente do Conselho de Administração da A. para eventualmente poder vir a trabalhar numa empresa denominada “P.......... . ...... .. ........, SA”.


75º Ou mesmo vir a integrar-se na própria A., chefiando a futura delegação ....


76º Era intenção daquela administradora, abrir futuramente uma delegação da A. no ..., o que foi declarado ao 3º R.


(…)


85º O fax de fls. 586 dos autos foi enviado, pelas 13h27 para as instalações no ... da 1ª R.


86º No dia 20/2, pelas 16h30, o 3º R. telefonou ao Diretor Geral da A. solicitando que esta, em nome da 4ª R. procurasse obter vendedor, fora de bolsa, do total de .....21 FIP89, com a específica condição de que tais títulos deveriam ser entregues à 1ª R. até ao dia 25/2/92 para crédito na respectiva conta da 4ª e 6ª RR.


87º Informou então que tais títulos tinham sido vendidos a descoberto pela 1ª R. no escritório de … e que esta entregaria o preço obtido contra a entrega prévia dos mesmos títulos, resolvendo assim o problema quanto à liquidação física dos mesmos, aprazada para 6/3/92.


88º A A. no mesmo dia 20/2 tinha obtido vendedor de um lote global de .....00 FIP89, pelo preço unitário de Esc. 10.445$00, com a condição de entrega dos títulos até ao dia 25 seguinte.


(…)


93º Relativamente a esta entrega o 3º R. tinha dito ao representante da A. SS, que contra a entrega dos títulos à 1ª R. os pagaria de imediato, pois já teria o montante equivalente.


(…)


97º As operações relativas aos .....00 FIP 89, foram registadas no dia 21/2/92.


(…)


99º O 3º R. alegou então que existia um desentendimento entre ele e o 2º R., pelo que necessitava de um fax da A. dirigido à 1ª R. e ao cuidado do 2º R., comprovativo de que os .....21 FIP89 seriam entregues na 1ª R. em … e até dia 25, conforme ele e a A. haviam acordado, tendo a A. enviado o fax de fls. 591 dos autos.


(…)


101º No dia 21/2/92 o 3º R. solicitou à A. as operações de compra e venda em nome da 4ª R. e da VV, que com esta data constam dos docs. de fls. 105 a 188, 293 a 389, 527 a 530 e 531 a 546.


(…)


115º Os faxes de fls. 586 e 591, foram enviados “para” BCI Valores” “A/C Exmº Senhor Dr. BB” sendo que no de fls. 586 consta ainda, entre o mais, “para onde V. Exa. canalizava as ordens para esta sociedade”.


(…)


117º Como consequência das operações de Bolsa realizadas, incluindo a de dia 19/2/92, em nome da 4ª R. e em nome de VV, a A. tinha no dia 25/2/92 inscrito nos seus extratos de “movimento financeiro” de fls. 105 a 188 e 527 a 530 dos autos, um débito de Esc. 85.947.672$00 para a conta em nome da 4ª R. e, na mesma data, um crédito vencido sobre a conta em nome de VV no valor de Esc. 1.191.358.357$00.


118º Como consequência de operações, realizadas desde o princípio do mês de fevereiro, a A. tinha inscrito nos seu “Extrato de Clientes – Conservadoria” de fls. 531 a 546 dos autos, um crédito na conta em nome de VV, a ser liquidado até 6/3/92, data da liquidação física da quinzena: ....20 FIP87 da 1ª a 3ª Série: ....00 FIP89; ....05 obrigações de capital BPI87.


(…)


120º Pelas operações de Bolsa efectuadas e registadas no dia 20, a A. tinha inscrito no seu extrato de “movimento financeiro no período de 1/1/92 a 21/2/92”, um saldo credor a liquidar dia 26, na conta inscrita em nome de VV, a quantia de Esc. 6.633.233$00, e tinha um saldo devedor, a liquidar no mesmo dia à 4ª R,. a quantia de Esc. 95.693.586$00.


121º Por força das operações efectuadas incluindo as relativas aos .....00 FIP89, registadas a 21, a A. tinha inscrito no seu extrato de “movimento financeiro no período de 1/1/92 a 21/2/92 um saldo devedor com data-valor de 27, relativo à conta inscrita em nome da 4ª R., a quantia de 2.158.646.119$00 e um saldo credor relativo à conta inscrita em nome de VV a quantia de 918.907.147$00.


122º No plano físico, por força, quer das operações sobre os .....00 FIP89 registadas a 21, a A. tinha inscritos os seguintes saldos credores sobre a conta de VV: ....20 FIP 87 (1ª e 3ª série); .....00 FIP 89; ....05 Obrigações Capital BPI 87.


123º A A. deveria ter a situação destes títulos regularizada, até à data de compensação/liquidação de Bolsa da última quinzena, que se realizaria em 6/3/92.


(…)


127º A A. entregou à 1ª R. ....00 FIP89, tendo informado previamente essa entrega através do fax de fls. 605/606 dos autos.


128º No dia 24/2/92, pelas 18h26, o 3º R. enviou à A. o fax de fls. 607 a 609 dos autos, com a redacção que aí consta, nomeadamente “(…) informo que creditei na v/conta (…) com data valor de 25/02/92 (…) pelo valor de 1.105.410.685$00”.


129º Este valor é referente ao “saldo global” referido no facto 117º.


(…)


131º O 3º R. enviou no dia 25 à A. cópia do fax que se encontra a fls. 611 a 616, que já tinha enviado ao 2º R.


(…)


139º A A., na pessoa da Presidente do seu Conselho de Administração, HH, telefonou à 1ª R., na pessoa do 2º R., no dia 25/2/92, mostrando-se preocupada pelo facto dos 1º, 4º e 6º RR. não terem efectuado à A. os pagamentos até essa data.


(…)


142º O 2º R. alegou então desconhecer qualquer obrigação das 4ª e 6ª RR., de entregarem títulos e pagamentos à A.


(…)


148º TT foi funcionário da A .


(…)


158º A fls. 613 a 616 dos autos, constam cópias de “procurações” conferidas por CC e EE, ao 3º R., nos termos que aí constam.


(…)


161º A Associação da Bolsa de Valores ... emitiu no dia 26, o doc. cuja cópia consta de fls. 618 dos autos.


162º As 4ª e 6ª RR. assinaram o doc. de fls. 619 e o 3º R. o doc. de fls. 620, ambos dirigidos à 1ª R., tendo esta enviado a comunicação de fls. 621, assinada pelo 2º R.


163º No dia 26/2/92 o 3º R. ordenou através do doc. de fls. 622 dos autos, uma transferência bancária pelo valor de 1.453.408.818$00 destinado ao pagamento à A. dos montantes devidos a 25 e 26 pelas bolsas dos dias 19 e 20.


164º A A. pediu um empréstimo bancário, de modo a que no dia 26, referido no doc. de fls. 618, pudesse pagar as operações que efectuara indicando o nome dos clientes, nomeadamente, 4ª, 6ª RR. e VV, para que o Banco de Portugal efetuasse assim a compensação.


165º Por este empréstimo a A. pagou os juros nos montantes referidos nos docs. de fls. 623 a 625.


(…)


172º VV e WW prestaram à CMVM as declarações que constam de fls. 630 a 632 dos autos, nas quais, e entre o mais, estes referiram que o ora 3º R. lhes disse “que precisaria até ao meio-dia de 5 de março, de 1,5 milhões de contos, pelo prazo de oito dias. Nós acedemos ao pedido do Dr. BB, porque o prazo era curto, e contactámos o BCP que, depois de analisado o pedido decidiu não aceitar a operação”.


(…)


175º Em 27/2/92 o 3º R. dispôs-se a insistir junto da 1ª R. para que esta transferisse a carteira de títulos que em nome das 4ª e 6ª RR. possuía e que deveria, desde o dia 26, ser entregue a A. para garantia.


(…)


180º A A. recebeu o fax de fls. 657.


(…)


188º Em 15/3/92 a A. recebeu o fax assinado pela 4ª R. que consta do doc. de fls. 657/658 dos autos a autorizar “movimentar livremente a carteira de títulos de que sou titular nessa sociedade, uma vez que os títulos que a compõem são propriedade do Sr. Dr. BB”.


189º A A. não pôde pagar o mútuo prestado pelo BNU, tendo assim este executado o penhor sobre os títulos da 4ª e 6ª RR. e iniciado a partir dessa data a sua venda em bolsa, com o que obteve o montante liquido de Esc. 1.108.092.012$00.


(…)


192º No doc. de fls. 689 dos autos consta que a 4ª R. é sogra do 3º R.


(…)


198º O 3º R. ordenou várias operações de bolsa consistentes na venda de títulos na Bolsa de ..., que não possuía fisicamente depositados nos intermediários financeiros de …, assim conhecidas por "operações a descoberto".


(…)


213º L... ......... . ...... .. ......., SA, passou em nome da 1ª R. as “facturas” de fls. 695 a 700 e enviou a esta as “notas de débito” de fls. 702 a 704.


(…)


218º O primeiro dia em que a 1ª R. actuou em nome próprio na Bolsa de ... foi 24/1/92.


(…)


222º No dia 24/1/92 a 1ª R. executou a venda na BV ... e obteve a quantia de Esc. 2.682.880.000$00, fazendo anunciar que possuía .....00 FIP89 para venda.


223º A 1ª R. obteve para tal oferta o preço de Esc. 10.240$00 por título.


(…)


226º No dia 17/2/92 a 1ª R. executou a venda na BV ... de .....80 FIP89.


(…)


228º No dia 18/2/92 a 1ª R. executou a venda na BV ... de ....00 FIP 89.


(…)


230º No dia 19/2/92 a 1ª R. executou a venda na BV ... de .....00 FIP89.


(…)


232º O 3º R. apresentou o seu pedido de demissão à 1ª R.


233º A venda de dia 17/2/92, deveria ser paga pelo comprador até ao dia 21 seguinte.


234º A venda de dia 18/2/92, deveria ser paga pelo comprador até ao dia 24 seguinte.


235º A venda de dia 19/2/92, deveria ser paga pelo comprador até ao dia 25 seguinte.


236º No dia 20/2/92 pelas 9h00 na então sede social da 1ª R., no ..., os 2º e 3º RR. reuniram-se, na companhia de YY para discutirem a sua declaração de rescisão.


(…)


239º Pelas 9h00 de 20/2/92, o 3º R. apresentou ao 2º R. a sua declaração de rescisão.


240º Foram enviados à BCI, no ..., diversos extratos de conta corrente de clientes da Sofin.


(…)


245º Tendo a essa hora constatado que o 3º R. já havia emitido e assinado, no uso das suas funções, com outro legal representante da 1ª R., um cheque no valor de Esc: 1.134.463.306$00 a favor da 4ª R., cliente da 1ª, por conta das operações de bolsa por esta intermediada a 17 desse mês, mandou de imediato que o Banco cancelasse tal cheque, alegando para tanto que havia sido "emitido em condições irregulares."


(…)


259º No mesmo dia da reunião referida em 236, o 2º R. emitiu a “comunicação interna de fls. 707, na qual, entre o mais, mandou suspender todas as entregas de títulos aos clientes tratados pelo 3º R., incluindo das 4ª a 6ª RR. e VV, WW e XX.


260º A A. enviou os faxes de fls. 586, 591, 605/606 e 617.


(…)


264º O 2º R. não conhecia o “sistema de liquidação física antecipada da Bolsa ...”.


(…)


269º Algumas devoluções de corretagem e liquidações de bolsa eram depositadas numa conta solidária entre o 3º e a 6ª RR.


270º-A Nas operações canalizadas pela 1º R. para a A. todos os movimentos eram processados apenas entre estas, incluindo os movimentos físicos relativos a títulos e os movimentos financeiros relativos a pagamentos e recebimentos.


(…)


275º A A. não referenciou, normalmente, no seu sistema informático as contas dos RR. CC, DD, EE, VV, WW e XX, com a menção “BCI - Valores”, como fez normalmente, com outras contas canalizadas pela 1ª R.


(…)


284º Paralelamente às contas abertas na 1ª R. em nome de CC, DD, EE, VV, WW e XX, foram abertas na A. outras tantas contas em nome das mesmas pessoas.


(…)


285º As contas abertas na 1ª R., no ..., eram essencialmente compradoras e por via delas eram canalizadas a maior parte das ordens de compra.


(…)


288º, 294º e 300º No dia 21/2/92 a A. decidiu executar a dupla ordem que lhe havia sido dada pelo 3º R. no sentido de comprar em nome de VV e simultaneamente vender ao BCP. .....00 Obrigações FIP/89, que sabia que esta não dispunha.


289º E sem que tivesse confirmado tais ordens junto da administração da 1ª R.


290º A A. executou as ordens referidas em 288º, sem pedir ao R. BB e/ou à 1ª R. os respetivos meios financeiros para a compra.


291º Como também de se certificar, nomeadamente junto da 1ª R., da disponibilidade ou bloqueio das .....00 Obrigações FIP/89 simultaneamente vendidas.


(…)


302º Era o R. BB quem geria efectivamente e de acordo apenas com a sua vontade, as seguintes contas: na 1ª R., em nome de CC, a conta nº ....31 no ... e na A., em nome de CC a conta nº ....20, em nome de VV, a conta nº .....-8, em nome de WW, a conta nº .....-6, e em nome de XX a conta nº .....-0.


(…)


304º O R. BB era quem destas contas se servia para operar no seu interesse no mercado de títulos, sendo o beneficiário de pagamentos efetuados quer pela A. quer pela 1ª R.


305º Nenhuma das contas tinha fichas de clientes assinadas pelas pessoas mencionadas em 302º.


(…)


312º A A. recebia comissões pelas operações que intermediava.


(…)


320º Alguma correspondência relativa às operações era enviada para os escritórios do ... da 1ª R., onde o 3º R. se encontrava a trabalhar como diretor.


321º A A. remetia à R. correspondência por operações por si intermediadas a pedido desta.


(…)


324º Apesar do atraso na liquidação do dia 25 e da venda para a qual não dispunha dos respetivos títulos do dia 24 de .....60 FIP87 e 70.000 Capital BPI87, a A. liquidou a favor de ZZ o montante de Esc. 89.060.363$00.


(…)


327º A A. não tinha a disponibilidade de .....09 FIP87, necessários para colmatar o saldo negativo de valores mobiliários e que deviam ser entregues na liquidação física de 6/3.


(…)


335º O doc. de fls. 96 foi assinado pelo 3º R. e outra pessoa, no local referenciado “BCI – Valores Sociedade Financeira de Corretagem SA”.


(…)


336º O 3º R. sabia, ainda, que os valores em dinheiro e em títulos, que constituíam os saldos financeiro e físico das contas correntes que tinha na A. não eram suficientes para fazer face ao pagamento de preço da recompra.


(…)


341º A A. organizou a sua escrita de tal forma que o saldo negativo surgiu, não em nome de WW mas sim em nome de CC.


(…)


343º Em 26/2/92, o saldo consolidado das contas inscritas em nome de CC, VV e WW, era credor de Esc. 163.181.667$00.


(…)


350º O 3º R. deixou de exercer funções na 1ª R. em 20/2/92.


Facto aditado pela Relação


Os 3º e 6ª RR. e a 4ª e 5º RR. eram, ao tempo dos factos, casados entre si, em regime de comunhão de bens adquiridos.


2. Objecto recursivo


A Recorrente apresentou as seguintes Conclusões, que, nos termos dos arts. 635º, 2 a 4, e 639º, 1 e 2, do CPC, delimitam o objecto da presente revista:


1ª.- Na interpretação dos factos que vêm dados como provados é especialmente relevante a sua contextualização no teor da petição inicial, como é o caso do teor das alíneas N), U), V), X), SS) e UU, da especificação – pois sem este enquadramento preliminar, torna-se difícil compreender o seu exacto alcance e conteúdo.


2ª.- A presente revista tem por objecto nuclear as duas questões pelas quais o douto acórdão recorrido julgou improcedente a apelação – apesar de ter corrigido alguns dos erros maiores da sentença.


3ª.- Assim, constituem o âmbito da revista, demonstrar o nexo de causalidade entre as operações de bolsa e os prejuízos da Autora invocados, bem como demonstrar que a responsabilidade em causa é contratual, mas mesmo considerada como responsabilidade aquiliana, a matéria provada determina também a procedência da acção.


4ª.- Os prejuízos que a Autora alegou constituem, em primeiro lugar, no custo de juros – de 1.907.466$00 – que pagou, por os 1ª e demais RR., não terem pago até ao dia 25 de Fevereiro de 1992, o saldo financeiro das operações de bolsa que aquela 1ª R. lhe havia ordenado, até ao dia antecedente – dia 19.


5ª.- Esta é a matéria de facto que se encontra provada, por ordem cronológica, nos factos 117, 128, 129, alínea U, 139, 142, alínea V), 161, 164, 165, 163 e alínea FF).


6ª.- O restante e maior pedido da acção deriva de a 1ª R. ter ordenado à Autora, em 20.02.1992, uma ordem de compra e simultânea ordem de venda de .....21 FiP89 (obrigações do Tesouro), com a promessa de que, contra a entrega física, "os pagaria de imediato pois já tinha o montante equivalente" (facto 93) – e, logicamente, à semelhança e na sequência de milhares de anteriores operações, lhe faria a entrega dos títulos ordenados vender, a tempo da respectiva compensação física.


7ª. - Mas tendo a Autora entregue fisicamente 173.201 FiP89, do total da ordem de compra, a 1ª Ré não cumpriu com o pagamento respectivo.


8ª.- E quanto à ordem de venda de títulos que a Autora executou, a 1.ª Ré não entregou os .....21 FIP89, cuja venda ordenara, dentro do prazo a que estava obrigada de acordo com as regras da compensação física da Bolsa de Valores ... [factos das alíneas SS) e TT)].


9ª.- Perante este incumprimento, expressamente declarado à Autora, no dia 25.02.1992, pelo 2º R. – factos de alínea U), 139, 142 e alínea V), interpretado este no contexto de arts. 263.º ao 265.º da petição inicial – a Autora, como intermediária financeira e mandatária da 1ª R. naquela venda de .....21 FiP89 que realizou para ela, por ordem do 3º R. seu então director, estava obrigada ao cumprimento das disposições aplicáveis ao caso, no art. 463.º n.º 1 do então vigente Código do Mercado de Valores Mobiliários.


10ª.- Nas operações de recompra para poder ter obtido aquela quantidade de FiP89, para fazer a sua entrega na compensação física da Bolsa de ..., de 6 de Março de 1992, a Autora gastou cerca de 2.438.817.600$00 – como provado na teor da alínea X), devidamente contextualizado no teor de art. 304º da petição inicial.


11ª.- O conjunto essencial desta matéria de facto encontra-se designadamente, e por esta ordem cronológica do seu encadeamento, nos factos 198, 204, 205, 226, 228, 230, 233, 234, 235, 85, 86, 87, alínea II-3, 88, 93, 97, 101, 118, 120, 121, 122, 127, alínea UU), 123, 327, 336, e alínea X).


12ª.- Por força do disposto naquele art. 463.º do CMVM, designadamente os seus nos 1 e 3, o crédito da Autora seria daqueles 2.438.817.600$00 – não fosse o caso de os Réus terem transferido para a Autora, após 6 de Março de 1992, valores mobiliários que naquela data tinham em depósito na 1ª. Ré, bem como outros em depósito na Autora, e terem autorizado que esta se pagasse com o produto da venda.


13ª.- Ora esta amortização foi de 1.108.092.012$00 – tudo como se encontra provado sob os factos de alínea II-5), e 175, 180, 188, 189, bem como fls. 641 à 650 – da autoria e assinatura do 2º Réu.


14ª.- Razão pela qual o pedido desta acção corresponde à parte restante daquele saldo global das operações de recompra – tendo assim uma origem causal na dupla ordem de bolsa do dia 20, de venda e simultânea compra, dos FiP89, na entrega física de 172.301 à 1ª R., nos dias 24 e 25 de Fevereiro [factos de alínea UU) e n.º 127], bem como na falta de entrega à Autora da totalidade de títulos devidos, pela 1ª R., conforme factos provados nºs 122 e 123.


15ª.- O pagamento, amortizando o custo das recompras no valor de 1.108.092.012$00, tem de ser valorado, de acordo com as regras da vida, de conhecimento comum e dos negócios em geral, como um efectivo reconhecimento pelos Réus, tanto da origem do direito creditício da Autora nas ordens de bolsa do dia 20, como no seu incumprimento perante a Autora, com a legitimidade desta em ter efectuado as recompras impostas pelo art. 463.º do CMVM.


16ª.- Aquele pagamento em amortização deve ser interpretado nos termos do disposto no art. 217.º n.º 1 do Cód. Civil, aplicável ao facto do pagamento ser concordante, em si mesmo, com o teor do pedido nesta acção, da parte restante do mesmo crédito.


17ª.- Pois, o art. 295.º do Cód. Civil expressamente manda que aquela mesma regra do art. 217.º n.º 1 se aplique aos factos idênticos a negócios ­– sendo certo que no caso, o pagamento de um valor tão elevadíssimo implica um óbvio juízo, do seu autor, de concordância e reconhecimento da dívida.


18ª.- De modo que, é absurdo não se reconhecer a narrativa e o nexo causal entre, por um lado, os factos provados quanto à dupla ordem de bolsa do dia 20.02.1992, o seu também duplo incumprimento pela 1ª Ré (quanto ao preço e quanto aos títulos), como a causa pela qual a Autora teve de recomprar títulos para a compensação de 6 de Março de 1992, e por outro, o saldo remanescente, após amortização, pelos Réus, peticionado nesta acção.


19ª.- Pois, os Réus, com a amortização de 1.108.092.012$00 ao saldo inicial daquelas recompras, demonstram que conheceram e aceitaram aquele nexo de operações da Autora como os actos pelos quais eles são responsáveis.


20ª.- Nesta matéria, perante os factos provados e perante a evidência desta amortização do crédito da Autora, o julgamento do Tribunal deve sustentar-se no essencial dos factos provados – e afastar as "dúvidas" que naturalmente sempre surgem em milhares de detalhes, sobretudo em operações de bolsa… julgadas passados 20 anos.


21ª.- O conjunto de factos que se encontra provado sob o teor da alínea X) – na sua referência quer para os documentos nele mencionados, quer para o art. 304º da petição inicial de onde provem – representa o núcleo dos prejuízos da Autora causados pela falta da 1ª Ré, de entrega atempada, dos .....21 FiP89 vendidos ao mercado, pela Autora, conforme a ordem de bolsa do dia 20, recebida do 3º R.


22ª.- Os detalhes, o como e o porquê a Autora teve de adquirir FiP87 – como se documenta na dita alínea X) – não podem constituir objecção a três verdades fundamentais:

a. A Autora repôs no mercado, na compensação de 6 de Março, da Bolsa de Valores ..., os .....21 FiP89 – caso contrário, os autos haveriam de revelar que o Banco de Portugal ou a Bolsa de Valores teriam usado os poderes do art. 463.º do Cód. MVM e portanto, a discussão dos autos não poderia ocultar tal hipótese.

b. Os Réus nem sequer tentaram provar que foram eles quem, após aquela ordem do dia 20 hajam entregue à Autora aqueles .....21 FiP89.

c. PORTANTO logicamente, como a Autora não os fabricou, e os Réus não lhos deram, teve de os obter de alguém.


23ª.- Ora esta aquisição logicamente não podia ser gratuita, pois vem provado que o valor de cada um dos FiP89 era de 10.445$00 – logo, se a Autora tivesse conseguido recomprar em Bolsa por este mesmo valor, os .....21 FiP89 custariam 2.205.158.845$00.


24ª.- A circunstância de o valor provado na alínea X) ser maior do que este não destrói as três verdades constantes na supra conclusão 21 – mas tem uma explicação que resulta de dois factos notórios:

a. Como é sabido, quando o mercado percebe a urgência e necessidade de alguém a comprar, aumenta o preço – e a Autora agia no espaço de escassos dias, coagida por força do art. 463.º do CMVM;

b. Mais do que isso: a Autora não pôde comprar aqueles .....21 FiP89 no mercado da Bolsa de Valores pela simples razão de que naqueles dias eles estiveram suspensos de negociação, por força do seu regime legal.


25ª.- Com efeito, nos dias 24, 25, 26, 27 e 28 de Fevereiro de 1992, os FiP89 estiveram fora da negociação da Bolsa de Valores, porque o seu regime legal, constante no Despacho do Ministro das Finanças de 17 de Março de 1989 (Diário da República, II Série, n.º 65, de 18 de Março, 1989), estabelece, no seu n.º 6, que os juros eram pagos ao dia 1 de Março.


26ª.- Ora, estando provado na alínea RR) que o prazo para a liquidação era de 5 dias, então, por força do teor disposto no n.º 1, aliena d) do art.º 447.º do Cód. MVM ("Interrupção da negociação"), e face ao calendário daquele mês de Fevereiro 1992, é óbvio o resultado probatório: nos dias 24, 25, 26, 27 e 28 de Fevereiro de 1992 os FiP89 não foram negociados em Bolsa de Valores.


27ª.- Tratando-se isto de uma ilação jurídico-legal, derivada de um acto normativo, como é o regime legal dos FiP89, trata-se aqui de um facto notório nos termos e para os efeitos do disposto no art. 412.º n.º 1 do CPC – ou seja, não carecem de prova, são assunções que o Tribunal deve sempre efectuar.


28ª.- Portanto, como também é notório, assim no caso, na falta de um mercado, o preço e a obtenção de um produto tornam-se altíssimos, senão até impossível de comprar.


29ª.- A Autora havia alegado – no quesito 149 – que tendo comprado FiP87 constantes na alínea X), o fizera para poder obter por troca, com a Caixa Geral de Depósitos, os FiP89 – o que, no entanto, a 1ª instância não deu como provado.


30ª.- Mas, a falta de saber qual foi o meio, ou do como a Autora obteve os FiP89, sendo certo que não foram os Réus que lhos entregaram, não pode servir para destruir o que se encontra provado como essencial ao custo das recompras e que é:

a. A Autora cumpriu na liquidação de 6 de Março entregando .....21 FiP89, que não recebeu dos Réus;

b. A Autora gastou cerca de 2.438.817.600$00 comprando FiP87, numa semana em que os FiP89 estavam suspensos de negociação em Bolsa e portanto, só podiam ser negociados particularmente.


31ª.- Portanto, os factos provam bem a origem dos danos da Autora, requerem uma interpretação mais atenta, o que o modo de organizar a sentença dificultou. Mas discutir ou ficar perdido no "emaranhado" de operações de recompra em causa – como parece ter sido o caso do douto acórdão da Relação, e depois de os Réus terem pago em amortização daquele prejuízo da Autora cerca de 1.108.092.012$00, constitui um erro gravíssimo, porque desvirtua o essencial e se reduz ao detalhe irrelevante. E causa uma injustiça brutal à Autora, vítima do ilícito enriquecimento dos Réus.


32ª.- A obrigação de a 1ª R. pagar à A. o custo das recompras, que os Réus amortizaram em quase metade, não é de matriz nem regime aquiliano, mas reside no teor expresso do art. 463.º n.º 1 do então Cód.MVM, o qual representa um corolário dos princípios da proibição de enriquecimento à custa alheia, proibição de abuso do direito e, regra geral da boa-fé.


33ª.- Com efeito, as ordens de bolsa são reguladas nos artigos 425.º e seguintes do Código dos Valores Mobiliários, dirigem-se à formação de contratos, constituindo sempre, em conjugação com a aceitação por parte do intermediário financeiro, contratos de mandato ou comissão, tendo como efeito a obrigação de este praticar negócios jurídicos de execução por conta do seu cliente e o correspondente poder para agir por conta de outrem (artigo 1180.º do Código Civil e artigo 266.º do Código Comercial).


34ª.- Esta relação contratual pode estabelecer-se entre intermediários financeiros: os corretores normalmente intervêm por conta de terceiro, o qual pode ser um outro intermediário financeiro que igualmente se encontre a actuar em nome de um outro terceiro, como salienta a doutrina.


35ª.- Os contratos entre a Autora e a 1.ª existem: são as concretas ordens de bolsa que formam a causa de pedir, dadas à Autora pelo Director da BCI-Valores no exercício das suas funções, ordens que, uma vez aceites pela Autora, se traduziram em singulares contratos de mandato ou comissão.


36ª.- Estes singulares contratos são, assim, aqueles que correspondem às concretas ordens de bolsa que constituem a causa de pedir, a saber:

• As ordens de bolsa dadas pelo Director da BCI-Valores até aos dias 19, 20 e 21 de Fevereiro de 1992, em relação às quais não se verificou a correspondente entrega da totalidade dos títulos até à data da compensação/liquidação, marcada para 6 de Março (factos 118 a 122);

• A dupla ordem de compra e venda dada pelo mesmo Director em 20 de Fevereiro desse ano e executada pela Autora no dia seguinte (factos 86 a 88; 288).


37ª.- Nos termos do artigo 163.º do Código Civil, a representação da pessoa colectiva, em juízo ou fora dele, cabe a quem os estatutos determinarem ou, na falta de disposição estatutária, à administração, ou a quem for designado pela própria administração.


38ª.- Como caso paradigmático de atribuição de poderes representativos por via de factos concludentes, de há muito se reconhece pacificamente, na jurisprudência e na doutrina, a situação que se traduz na atribuição a certa pessoa de uma posição que, segundo os usos de tráfico, está tipicamente ligada à atribuição de poderes representativos.


39ª.- Os poderes representativos resultam logo da designação de determinada pessoa para desempenhar dentro da empresa uma função que implica a prática de negócios e actos jurídicos: a legitimação representativa decorre, assim, directamente da própria posição atribuída a tal pessoa no interior da organização do ente colectivo titular da empresa.


40ª.- Deste modo, se alguém foi legitimado para o desempenho de determinada função no âmbito de uma empresa, essa legitimação abrange poderes representativos para os negócios e actos jurídicos próprios dessa função: a designação de alguém para director de um serviço de uma empresa coenvolve a delegação nele dos poderes que integram a competência de director.


41ª.- Foi o que sucedeu no caso dos autos: a designação do R. BB como Director da BCI-Valores, com a expressa incumbência de receber e executar ordens de bolsa para os clientes da sua entidade empregadora, coenvolveu a delegação nele dos poderes representativos para a prática dos negócios e actos jurídicos próprios dessa função de Director.


42ª.- A consequência do exercício de poderes representativos traduz-se na circunstância de os actos praticados pelo representante serem considerados juridicamente actos de representado (artigo 258.º do Código Civil): o negócio jurídico celebrado pelo representante de uma pessoa colectiva é directamente imputado a essa pessoa colectiva, vinculando-a perante o terceiro que concluiu o negócio com o representante.


43ª.- Daqui decorre que os singulares contratos correspondentes às ordens de bolsa que constituem a causa de pedir vincularam directamente a pessoa colectiva BCI-Valores: tais contratos foram concluídos por aquele Director a quem a BCI-Valores, na sua organização de empresa, tinha atribuído poderes representativos para a vincular, justamente no âmbito da conclusão de contratos inerentes às ordens de bolsa.


44ª.- O problema está, aliás, particularmente clarificado, pois a matéria de facto é absolutamente esclarecedora, não só quanto à expressa atribuição de funções ao R. BB como Director da empresa, como até, de forma igualmente expressa, quanto ao conteúdo e âmbito dos poderes representativos correspondentes a tais funções.


45ª.- Deste modo, o não cumprimento das obrigações resultantes da conclusão dos referidos contratos é um directo não cumprimento da pessoa colectiva BCI-Valores, com a inerente aplicação das regras da responsabilidade contratual (artigo 798.º e seguintes do Código Civil) e consequente necessidade de indemnizar a Autora pelos danos causados, devidamente demonstrados e contabilizados nos autos.


46ª.- De tais regras resulta, desde logo, que sobre a BCI-Valores recai a presunção de culpa no não cumprimento das obrigações resultantes dos contratos correspondentes às concretas ordens de bolsa que constituem a causa de pedir (artigo 799.º, n.º 1).


47ª.- A Autora procedeu de forma inteiramente correcta ao dar execução à dupla ordem de venda dada pelo Director da BCI-Valores, no dia 20 de Fevereiro, não havendo dúvidas quanto à validade da operação mesmo sem ter exigido a prévia entrega dos títulos vendidos, e o dinheiro, para os comprados.


48º.- Com efeito, uma vez executadas as duas ordens, a única consequência que daqui resulta para o corretor, no plano contratual, é a de ficar obrigado, se o comitente não cumprir, a colocar no sistema, através de operações de recompra, os títulos necessários à liquidação física da operação na data marcada – o que naturalmente não exclui a responsabilidade contratual do intermediário financeiro que deu a ordem de venda ao corretor, pelos prejuízos causados a este último, como se determina no artigo 463.º, n.os 1, 2 e 3 do CMVM.


49ª- São as seguintes as situações de incumprimento contratual por parte da BCI-Valores:

• Não entrega da totalidade dos títulos relativos às ordens de bolsa dadas pelo Director da BCI-Valores para clientes desta sociedade até 21 de Fevereiro de 1992 – factos 118 a 123. O que teve como consequência que, por imperativo do artigo 463.º do CMVM, a Autora tivesse sido obrigada a proceder a operações para recomprar e obter os títulos em causa, nas condições de mercado na altura existentes, cujo custo global foi de Esc.: 2.483.817.600$00 – alínea X) da sentença.

• Falta de pagamento do preço de 172.301 títulos FIP 89, ao custo unitário de Esc.: 10.445$00, que a Autora entregou à BCI-Valores, para a conta das clientes desta sociedade, as ora 4.ª e 6.ª RR., por ordem de bolsa dada pelo respectivo Director em 20 de Fevereiro de 1992 e executada pela Autora no dia seguinte – alínea UU) e factos 127, 86, 87 e 88.


50ª.- Ao mesmo resultado se chega partindo directamente do artigo 165.º do Código Civil: com efeito, também com base nesta norma se revela inequívoca a responsabilidade contratual da pessoa colectiva BCI-Valores: as pessoas colectivas respondem civilmente pelos actos ou omissões dos seus representantes, agentes ou mandatários nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos actos ou omissões dos seus comissários.


51ª.- Esta norma, aplicável às sociedades comerciais, quer pela sua natureza de pessoas colectivas, quer pelo artigo 6.º, n.º 5, do Código das Sociedades Comerciais, abrange tanto a responsabilidade contratual, como a responsabilidade delitual.


52ª- Tratando-se de responsabilidade contratual, a remissão do artigo 165.º é feita para o artigo 800.º, nos termos do qual a pessoa colectiva responde perante o credor pelos actos dos seus representantes como se tais actos fossem praticados pela própria pessoa colectiva.


53ª. Acresce que, mesmo que se considere que a remissão do artigo 165.º é feita para o artigo 500.º, o regime é o mesmo, em virtude de o não cumprimento contratual se dever sempre considerar como tendo ocorrido no exercício da função que foi confiada ao representante, agente ou mandatário.


54ª.- Deste modo, também pela via do artigo 165.º não restam dúvidas de que a BCI-Valores é responsável pelos prejuízos resultantes do não cumprimento das obrigações decorrentes dos singulares contratos de comissão, correspondentes às concretas ordens de bolsa que formam a causa de pedir, nos termos já clarificados.


55ª.- Quanto ao nexo de causalidade entre o referido prejuízo e o facto do incumprimento contratual:

• Relativamente à ordem de compra de títulos FIP 89, dada em 20 de Fevereiro de 1992, o dano do não recebimento do preço é naturalmente causado pelo não cumprimento do contrato de comissão corporizado nessa ordem de bolsa;

• Relativamente ao não recebimento da totalidade dos títulos que deveriam ter sido entregues à Autora pela BCI-Valores, é evidente que foi o não cumprimento dos correspondentes contratos de comissão que obrigou a Autora a ter de realizar as operações de recompra identificadas e contabilizadas nos autos.


56ª.- Acresce que as questões do dano e do nexo de causalidade estão aqui particularmente facilitadas, pois o artigo 463.º do CMVM clarifica quais são os danos, qual a sua causa e quem os deve suportar, como já se expôs.


57ª.- Na hipótese académica, de todo sem conceder, de se considerar que o caso não se inseria no campo da responsabilidade contratual, a BCI-Valores continuava a ser responsável pelos prejuízos causados à Autora: estaríamos então perante actos praticados pelo R. BB, no exercício das suas funções de Director, o que desencadearia de novo a aplicação do artigo 165.º do Código Civil, sendo agora feita para o artigo 500.º a remissão contida naquele preceito.


58ª.- Nos termos do artigo 500.º, a pessoa colectiva responde pelos actos dos seus representantes ou agentes praticados no exercício das suas funções, mesmo que tais actos sejam praticados intencionalmente ou contra as instruções da pessoa colectiva (n.º 2 do preceito).


59ª.- De acordo com a orientação inteiramente pacífica da jurisprudência e da doutrina, em aplicação desta norma, a pessoa colectiva responde pelos actos dos seus representantes ou agentes praticados em vista de fins puramente pessoais, integrados no quadro geral das suas competências, aproveitando o representante ou agente a aparência social, perante terceiros, de estar a actuar no âmbito das suas competências.


60ª.- Deste modo, a invocação de que o Director da BCI-Valores se servia de determinadas contas de clientes referidos nos autos para operar no seu interesse no mercado de títulos é absolutamente irrelevante para efeitos da responsabilidade da BCI-Valores, face ao facto, provado nos autos, de o R. BB surgir e actuar abertamente perante a Autora e perante todos os restantes intermediários financeiros como Director da BCI-Valores.


61ª.- Mas o 3º R. ao actuar ocultando da A. toda a trama de interesses pessoais que confessa ter tido naquelas operações, pelas quais foi condenado nos dois processos da CMVM provados nos autos, prevalecendo-se da confiança que a A. depositava na 1ª R. como sua instituição actuou com culpa e ilicitude grosseiras.


62ª.- E os danos que os seus actos causaram na A. correspondem, logicamente, pelo menos aos créditos que a A. não recebeu, pelos títulos que entregou à 1ª R., da operação do dia 20 e pelas recompras que teve de fazer face à não entrega de títulos por vendas à sua ordem.


63ª- Verificam-se, portanto, nos termos e para os efeitos da responsabilidade da 1ª R., conforme o disposto no art.º 500.º do Cód. Civil, ex vi art.º 165.º do mesmo Código, e art.º 6.º n.º 5 do Cód. Soc. Comerciais, todos os requisitos da responsabilidade subjectiva do 3º R. nos factos de onde emerge o pedido da acção.


64ª- De resto, o 2º R. também actuou com culpa grave, por falta de vigilância sobre o 3º R. e por falta de paralisação imediata, na manhã do dia 20, das operações a descoberto na própria 1ª R., pois podia e devia tê-las impedido e comunicado à CMVM – razões pelas quais foi condenado, como está provado sob os factos de alínea CC).


65ª.- Também a própria 1.ª R. organizou os serviços defeituosamente, pois está provado na matéria de facto que, sendo todos os seis intervenientes nas operações de bolsa que constituem a causa de pedir eram clientes da BCI-Valores, ela não exigia a esses seus clientes nem o depósito prévio dos títulos que anunciava para venda, nem tão-pouco o depósito prévio do dinheiro correspondente à compra de títulos efectuada em seu nome – o que evidencia a prática de vendas a descoberto por parte da BCI-Valores, no que se incluem as concretas vendas a descoberto dos dias 17, 18 e 19 de Fevereiro de 1992, que estão em causa no presente litígio (alínea II-1 e factos 198, 204, 205, 222 ao 235 e alíneas ZZ) à DD).


66ª.- Em suma: os prejuízos, identificados e contabilizados nos autos, resultantes destas operações de recompra recaem sobre a BCI-Valores, ora 1.ª Ré, por força do n.º 1 e do n.º 3 do artigo 463.º do Código do Mercado de Valores Mobiliários.


67ª.- De resto, constituem venire contra factum proprium os argumentos da 1.ª Ré, segundo os quais, a Autora não devia ter aceitado a dupla ordem do dia 20, pois o R. BB já não estaria em funções, quando, os factos provados, designadamente o facto 12 demonstra que a Ré deixou a Autora e o mercado na ignorância de tal hipotética situação, durante todo o dia 20 e também dia 21, pois a Ré nem sequer demonstrou a hora em que deu conhecimento daquela cessão de funções.


68ª.- A 6ª R. é solidariamente responsável com o 3º R., pelo facto de aproveitar, pelo regime de bens do casamento, dos actos daquele.


69ª.- A 4ª e 5º RR., porque foram beneficiários da operação de compra de FiP89 do dia 20, como aquela reconheceu, ao ordenar à 1ª R. a transferência de títulos para a Autora, e ao autorizar a Autora a executar os títulos que também nela estavam depositados, para os vender; o que sucedeu e assim, pagara em amortização da sua dívida, cerca de 1.108.092.012$00 – estando em causa nesta acção, afinal e tão simplesmente, a exigência da parte restante do mesmo crédito.


3. Fundamentação de direito


3.1. Atenta a questão da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil imputada aos Réus, a sentença de 1.ª instância alinhou a seguinte argumentação:


“Como ressuma dos autos, centram as Partes a sua posição na responsabilidade que reciprocamente enjeitam no que tange ás consequências das operações a descoberto realizadas na bolsa em causa, de que na perspectiva da A resultaram prejuízos, os quais, segundo a 1.ª, 2.º 3 demais RR contestantes somente na esfera daquela se podem repercutir.


Na perspectiva dos 1.º e 2.ºs RR as operações de venda a descoberto realizadas para clientes da A nos dias 21 e 24 de Fevereiro de 1992 – em que a A funda o seu alegado prejuízo) – são nulas (por celebradas contra a lei nos termos do art. 294 do Código Civil, e como tal declaradas independentemente de estarem verificados os pressupostos da responsabilidade civil (que não estão no entender daqueles), não pudendo a A reclamar qualquer prejuízo decorrente da nulidade. Ainda que assim não fosse, improcederia a acção por não terem resultado provados dos quais se extraia o preenchimento dos requisitos da responsabilidade civil da 1.ª e 2.º RR a título contratual ou extracontratual, a saber: os factos ilícitos e culposos, dos quais emerja o dano, e o nexo causal.


Ainda que assim não fosse, improcederia a acção por não terem resultado provados dos quais se extraia o preenchimento dos requisitos da responsabilidade civil da 1.ª e 2.º RR a título contratual ou extracontratual, a saber: os factos ilícitos e culposos, dos quais emerja o dano, e o nexo causal.


Pois como decorre da factualidade apurada as operações foram realizadas e executadas pela A no âmbito de relações directas do 3.ª R com a A, quer como cliente quer como colaborador e sempre após a cessação do exercício de funções como director da 1.ª R, que era do conhecimento da A a partir pelo menos de 21-2- 1992.


Antes de mais atente-se na matéria que não foi dada como provada pelo Tribunal por referência aos pontos do questionário:


36.º (Não provado) Mensalmente a Autora efectuava a compensação de créditos e operações e, depositava o saldo financeiro na conta e em nome do beneficiário que a 1ª Ré, através do 3º Réu lhe indicava.


51º (Não Provado) A Autora enviou em 2 de Dezembro de 1991 à 1ª Ré, o fax de fls. 578-579, dos autos).


53º (Não provado) A Autora enviou em 3 de Janeiro de 1992 à 1ª Ré, o fax de fls. 580-584, dos autos.


60º (Não Provado) Como forma de titular e garantir minimamente tal crédito, a Autora exigiu ao 3º Réu que as directas beneficiárias de tal montante, 4ª e 6ª Rés, lhe emitissem um cheque no montante de 6,5 milhões de contos.


61º (Não Provado) Mais lhe exigiu que no final do mês então em curso tal crédito de títulos estivesse totalmente extinto.


65º (Não Provado) Após 24/01/92 a 1ª R. continuou a solicitar à A. que lhe intermediasse operações de bolsa.


Facto 72.º (Não Provado): O 3º R. garantiu sempre à A. que os títulos relativamente aos quais lhe pedia a realização de operações de bolsa estavam na aposse da 1º R. ou outros intermediários


82º (Não Provado) Cerca das 11 horas do dia 20-02-1992 o 3º Réu, das instalações da 1ª Ré, no porto, telefonou ao director geral da Autora e representante desta na gestão corrente, SS e, omitindo que nesse dia já havia apresentado o seu pedido de demissão, e que o mesmo já havia sido aceite, pelo 2º Réu – o que a Autora veio posteriormente a apurar – alegou então ter um acordo com o 2º Réu, pelo qual a partir de 24-02-1992 deixaria de transmitir ordens de bolsa à Autora conforme vinha a fazer para aqueles clientes da Ré.


83º (Não Provado) Referiu ainda nesse telefonema que seria necessário que a A. enviasse para a 1ª R. um fax a informar que em nome dos clientes desta, 4ª, 5ª e 6ª RR. e VV, WW e XX, existiam 38.000 ou 39.000 FIP89, na sua posse efectiva


89º (Não Provado) O telefonema referido em II-3) foi efectuado para a sede da 1ª R.


90º (Não Provado) O 3º R. solicitou então que a A. procedesse às operações de Bolsa necessárias, indicando como vendedor de tais títulos ao BCP, VV, com a obrigação da entrega dos mesmos em 6/03/1992.


91º (Não Provado) A A. realizou as operações referidas, nos mesmos termos em que tinha realizado todas as anteriores solicitadas pelo mesmo R..


Facto 94.º (Não Provado) Tendo referido que com a entrega efectiva dos títulos faria chegar simultaneamente o respectivo pagamento por transferência bancária.


Facto 98.º (Não Provado) Após o fecho da operação em causa e ainda no mesmo dia pelas 18h30, o mesmo representante da A. telefonou para as instalações da 1ª R., tendo falado com o 3º R. e informado este que o pedido estava executado?


Facto 96.º (Não Provado) Nessa sequência o referido representante da A. ordenou que esta fechasse as mencionadas operações em nome da 4ª R. e VV?


Facto 98.º (Não Provado) Após o fecho da operação em causa e ainda no mesmo dia pelas 18h30, o mesmo representante da A. telefonou para as instalações da 1ª R., tendo falado com o 3º R. e informado este que o pedido estava executado?


Facto 104.º (Não Provado) Neste momento o 3º R. informou-o que deixara de ser Director da 1ª R. e que poderia iniciar de imediato a actividade na A., no escritório do ... ou na a sociedade “P..........”, referindo que se estariam a perder excelentes oportunidades de negócio e correspondentes lucro.


Facto 106.º (Não Provado) Referiu ainda que a partir do dia 24 seguinte os 4º a 6º RR., VV, WW e XX, deixariam de ser clientes da 1ª R. e passariam a ser da A., passando ele a procurador destes, uma vez que só eram clientes da primeira por sua influência.


107º (Não Provado) O Director da A. levou tais assuntos ao administrador desta, RR, uma vez que a Presidente do Conselho de Administração se encontrava no estrangeiro?


108º (Não Provado) Na reunião tida com SS e RR, o 3º Réu confirmou novamente que contra a entrega dos .....21 FIP89 à 1ª Ré, no dia 25/02/1992 em nome da 4ª Ré esta receberia da 4ª R. à A. receberia da 4ª ou 6ª RR. o correspondente valor financeiro para pagar o seu saldo financeiro negativo, uma vez que, contra aquela entrega, a 4ª R. receberia da 1ª R. o valor equivalente?


109º (Não Provado) Referiu ainda que quanto ao saldo físico referente às operações sobre .....00 FIP89 que haveria a devolver ao BCP na compensação física de 6/03/1992, em nome de VV bem como os demais saldos negativos na conta desta na A. seria tudo pontualmente cumprido, pois havia entregue ao 2º R. cópia dos saldos desta e da 4ª R., quanto às operações intermediadas pela A. e cuja liquidação física e financeira ainda estava pendente?


110º (Não Provado) Mais confirmou que a partir do dia 24 seguinte iria transferir da 1ª R. para a A., as carteiras de títulos das 4ª a 6ª RR. e de VV, WW e XX?


111º (Não Provado) E referiu ainda que, para que ele ficasse legalmente autorizado a gerir tais carteiras, conforme até aí vinha fazendo na qualidade de Director da 1ª R., entregaria à A. na semana iniciada em 24/02/1992, procurações e fichas de abertura de conta daqueles?


Facto 130.º (Não Provado) No dia 25, o 3º afirmou à A. que a liquidação do preço dos títulos seria efectuada nesse mesmo dia, em simultâneo com a respectiva entrega, por transferência bancária normal da 1ª R., por conta da 4ª e 6ª R. e da conta desta última do Banco comercial de Macau, conforme fax que lhe iria dar conhecimento brevemente.


Facto 133.º (Não Provado) A quantia referida no fax de fls. 611 a 616 era contrapartida e por conta da entrega da A. à 1ª R. de ....00 FIP89 no dia 24/02/1992 e de .....21 FIP89 a entregar no dia seguinte?


134º (Não provado) A A. entregou então à 1ª R. .....21 FIP89, tentando sincronizar ambas operações, para que a 1ª R. pagasse à 4ª e 6ª R. o valor indicado no fax de fls. 611 a 616, de Esc. 1.780.745.571$00 e estas pudessem assim pagar à A. os títulos no mesmo dia?


Facto 141.º (Não Provado) Tendo o 2.º R alegado desconhecer que fossem devidas à A pela 1.ª R ou pelos seus clientes quaisquer pagamentos.


143º (Não provado) Tendo alegado ainda desconhecer qualquer relacionamento ente a A. e a 1ª R., no âmbito da execução por si dos mandatos daqueles.


144º (Não provado) No mesmo dia 25 e de seguida ao telefonema referido no facto 139º, a Presidente do Conselho de Administração da A. e um Administrador desta, RR, telefonaram ao 3º R., pedindo-lhe explicações sobre a falta de liquidação da Bolsa de dia 19 e dos FIP89 entregues nesse dia na 1ª.


145º (Não provado) O 3º R. disse-lhes então que o 2º R., na qualidade de Administrador da 1ª R., já lhe havia dito no dia 20/02/1992 que não assumiria qualquer responsabilidade perante o A. relativamente às operações de Bolsa que esta efectuara para as 4ª a 6ª RR. e VV, WW e XX.


146º (Não provado) Mais afirmou então que o 2º Réu lhe comunicara esta decisão já no dia 20 no qual apresentar a sua demissão de director geral da 1ª Ré.


147º (Não Provado) O facto II-4) foi praticado também na qualidade formal de mandatário de VV e de WW e para ajudar a A. a cumprir a liquidação física de 6/03/1992 com a entrega de títulos que faltavam na conta em nome de VV desde o princípio de Fevereiro do mesmo ano.


149º (Não Provado) Os FIP89 foram suspensos do mercado da Bolsa e da cotação oficial, por decisão da CMVM no dia 24/02/1992 com efeitos no dia 25 seguinte, motivo pela qual a A. aceitou uma troca com FIP87 que a CGD lhe propôs.


150º (Não Provado) Para este efeito tivera o 3º Réu, em colaboração com o dito TT, de criar, em nome de WW, um saldo físico negativo equivalente ao total de FIP 87 a dar em troca dos FIP 89 necessários a colmatar o saldo físico de VV.


151º (Não Provado) Tudo de forma que a Autora, pudesse ficar na posse dos títulos FIP 89 necessários para ocorrer à compensação/liquidação respectiva prevista para o dia 6 de Março.


152º (Não Provado) Perante esta então informação, a Autora constatou que, sem que os seus administradores ou o seu director geral SS soubessem e, contrariando aliás ordens expressas deste quanto à proibição de vendas a descoberto, o dito seu funcionário TT tinha colaborado com o 3º Réu no sentido de, para colmatarem a falta de FIP 89 e dos outros títulos na conta de VV, verificados por operações até 21-02-1992, porque estes entretanto ficaram excluídos do mercado, criaram um novo “buraco”, em FIP 87, em nome de WW, no total de .....09 os quais teriam de ser agora recomprados para cumprir, quanto a eles, a compensação/liquidação do próximo dia 6 de Março.


155º (Não Provado) No dia 25/02/1992 o 3º R. disse à A. que no dia seguinte faria com que as suas mandatárias lhe pagassem o saldo financeiro das operações de Bolsa de 19 e 20, que liquidavam a 25 e 26.


156º (Não Provado) Que também nesse dia 26 providenciaria para que as mesmas transferissem para a posse da Autora os títulos de que dispunham na 1ª Ré.


157º (Não Provado) Que iria também providenciar à Autora meios financeiros para que esta pudesse pagar os 233.707FIP 87 substitutos dos FIP 89 entregues à 1ª Ré que, teria a recomprar para entregar na liquidação de 06-03-1992.


159º (Não Provado) Nessa altura a A. tinha um desembolso global superior a 2,5 milhões de contos, sendo que na mesma altura, as 4ª e 6ª R., originais beneficiárias dos FIP89 entregues nos dias 24 e 25 de Fevereiro de 1992, tinham depositado na A. títulos que apenas cobriam, cerca de 1 milhão de contos.


160º (Não Provado) No dia 26/02/1992, a A. teve conhecimento que a 4ª e 6ª RR., diligenciavam para transferir para a sua posse títulos de crédito que estavam depositados na 1ª R..


166º (Não provado) No dia 26/02/1992, o A. tomou conhecimento e concluiu com base no documento de fls. 626, que não iria receber atempadamente os títulos referidos em 160º e 162º, que teria que entregar na compensação de 6/03/1992, nomeadamente os 233.707 FIP87.


167º (Não provado) Para obter tais FIP 87, tendo em conta tal quantidade, os mesmos só poderiam ser recomprados em bolsa.


168º (Não provado) Para os obter em bolsa a tempo de os poder entregar na data de 06-03-1992 a Autora teria de proceder à ordem de compra até, no máximo, ao dia 28 de Fevereiro.


169º (Não provado) Face à incerteza de no dia 28, último dia, obter ou não vendedores para tão significativo volume de títulos, logo no dia 27, a Autora, para evitar o maior risco e prejuízo de terceiros que seria ela não ter para lhes entregar .....09 FIP 87 e ....00 Obrigações Capital BPI 87, na liquidação do dia 6, ordenou a compra, para a conta/carteira de WW, dessa quantidade, à cotação então em vigor.


Facto 171.º (Não Provado) Mais uma vez o 3º Réu disponibilizou-se para diligenciar que, até à data de 05-03-1992, a Autora recebesse pelos seus alegados mandantes a soma referida em X), referente aos títulos mencionados no quesito 169º), declarando que pusera as suas mandantes e, VV e WW a par da questão.


173º (Não Provado) Sustentado nos documentos de fls. 612 a 616, o 3º R., ordenou a venda de títulos que a A. tinha na sua posse na conta da 4ª R., destinando tal montante para a conta financeira negativa de WW e assim poder obter o valor da liquidação para 5/03/1992.


174º (Não Provado) Dispôs-se também a obter dinheiro até aquela data para completar os valores que faltassem.


176º (Não Provado) Tendo então entregue à A. a cópia de lista de títulos que consta de fls. 633 a 636 dos autos, de que a 1ª R. seria depositária e se destinavam à venda e pagamento do valor a pagar na liquidação de 5/03/1992.


177º (Não provado) No dia 4 de Março de 1992 à noite o 3º R. comunicou à Presidente do Conselho de Administração da A. que nem ele nem os seus mandantes tinham obtido o dinheiro necessário para o pagamento do dia seguinte.


178º (Não provado) E que por essa razão os mesmos autorizavam desde logo a venda ou utilização dos títulos que a A. detinha nas respectivas contas e os que tinha a receber da 1ª R., e aceitavam ainda a transferência e utilização do saldo financeiro positivo que viesse a resultar da conta de VV.


179º (Não provado) Tudo como forma de a Autora poder no dia seguinte pagar o montante de 2.438.817.600$00. Facto 193.º: Não Provado. O 2º R. sabia pelo menos desde Abril de 1991 que o 3º R. tinha saído do anterior emprego na CGD, em virtude deste ter cometido diversas irregularidades financeiras.


181.º (não provado) O único valor financeiro disponível à A no dia 5-3-1992 182.ºA Autora procedeu à compensação financeira das contas dos 4º a 6º RR., VV e WW no dia 5 de Março de 1992.


182.º (Não Provado) A Autora procedeu à compensação financeira das contas dos 4º a 6º RR., VV e WW no dia 5 de Março de 1992.


Facto 183.º (Não Provado) A 1.ª R após ter efectuado a compensação entre si e os 44.ºs e 6.ºs RR, VV e WW, nunca enviou à A o saldo final referido a fls. 651 nem qualquer outro.


Facto 187.º (Não Provado) A 6ª R. participou pessoalmente no dia 27/02/1992 no acto da conferência e transferência de títulos da 1ª R. para a A.


Facto 193.º: Não Provado. O 2º R. sabia pelo menos desde Abril de 1991 que o 3º R. tinha saído do anterior emprego na CGD, em virtude deste ter cometido diversas irregularidades financeiras.


194º (Não provado) Nessa altura a accionista e Administradora da “BCI Investimentos”, AAA preveniu o 2º R. de tal situação e que o 3º não era pessoa de confiança para as funções de Director com os poderes que aquele lhe delegara.


Facto 207.º (Não provado) A 1ª Ré actuava sem depender de previamente existir ordem específica ou concreta, autorização ou conhecimento dos 4º a 6º Réus, VV, WW e XX.


Facto 212.º (Não Provado) A 1ª Ré pagava ao 3º Réu, como suplemento do seu salário mensal, uma comissão de 30% a 50% sobre as corretagens nas operações de Bolsa que aquela intermediasse para clientes angariados por este, como era o caso dos 4ª a 6º Réus e VV, WW e XX?


Facto 224.º (Não Provado) No dia 30-01-1992 de idêntica forma, a 1ªRé obteve para a 4ª Ré a quantia de 205.200.000$00, fazendo anunciar que possuía para venda 20.000 FIP 89.


Facto 225.º (Não provado) A 1ª R. obteve para tal oferta o preço de Esc. 10.260$00 por título.


Facto 227.º (Não Provado) A 1ª R. obteve para tal oferta o preço de Esc. 10.360$00 por título, além deste valor incluir também juros vencidos por título.


Facto 229.º (Não Provado) A 1ª R. obteve para tal oferta o preço de Esc. 10.360$00 por título, além deste valor incluir também juros vencidos por título.


Facto 231.º (Não Provado) A 1ª Ré obteve para tal oferta o preço de Esc. 10.370$00 por título, além deste valor incluir também juros vencidos por título.


241º (Não provado) Durante o dia 20, o 3º Réu ainda se manteve no exercício das suas funções e poderes de director geral da 1ª Ré, com o acordo intencional do 2º Réu.


242º (Não provado) O 2º Réu deixou e permitiu deliberadamente que, mesmo após ter sido aceite pelas 09h00 a demissão do 3º Réu, este se mantivesse ainda em funções nesse mesmo dia.


243º (Não provado) Mas que se mantivesse no uso dos poderes de representação da 1ª Ré apenas perante a Autora e não no uso de tais poderes perante ela própria 1ª Ré e outros.


244º (Não provado) O facto referido em II-6), foi também praticado relativamente aos 5º e 6º Réus, VV, WW e XX. 253º(Não provado)Com a aceitação do recebimento pela 1ª Ré das liquidações financeiras respectivas aos dias seguintes, 21, 24 e 25 e, a sua entrega à 4ª Ré.


248º (Não provado) Na reunião referida em 236º, o 2º Réu comprovou que as vendas dos dias 17, 18 e 19, efectuadas pela 1ª Ré para a 4ª Ré foram “vendas a descoberto”.


249º (Não provado) Na mesma reunião o 3º Réu deu conta ao 2º Réu da posição credora da Autora, quer em dinheiro quer em títulos da 4ª Ré e VV, e entregou-lhe cópias dos extractos de contas.


250º (Não provado) Na reunião referida do dia 20, com o 3º Réu, o 2º Réu verificou que 4ª Ré e 6ª Ré e VV, não tinham dinheiro para pagar à Autora nem o valor de 1.105.410.685$00 da liquidação financeira da bolsa do dia 19.


251º(Não provado) Nem os títulos para entregar à Autora, resultantes do documentos de fls. 531 a 546, pois perante a própria 1ª Ré, a 4ª e 6ª Rés deviam .....80 FIP89.


252º (Não provado) Os 2º e 3º Réus nessa reunião decidiram consumar as operações de vendas a descoberto dos dias 17, 18 e 19 na mesma Ré.


253º (Não provado) Com a aceitação do recebimento pela 1ª Ré das liquidações financeiras respectivas aos dias seguintes, 21, 24 e 25 e, a sua entrega à 4ª Ré.


254º(Não provado) Com a obtenção, prévia a esta entrega, dos .....80 FIP 89 em falta à 1ª Ré.


Facto 270.º-E (Não Provado) Todas as comissões (ou “devoluções de corretagens”) pagas pela Autora em conexão com operações por esta efectivamente canalizadas pela 1ª Ré foram-no directamente à 1ª Ré e não aos clientes desta.


271º (Não provado) A “Acta Adicional” cuja cópia consta de fls. 689 dos autos foi assinada pelo Réu BB à revelia da 1ª Ré e sem autorização desta.


272º (Não provado)A 1ª Ré só teve conhecimento desta “Acta” após a desvinculação do Réu BB.


273º (Não provado) Os extractos mencionados no fax de fls. 713/714 foram enviados apenas ao Réu BB.


276.º (Não Provado) A Autora nunca pagou à 1ª Ré quaisquer “devoluções de corretagem” relacionadas com as operações por aquela efectuadas nas contas junto de si abertas em nome dos Réus CC, DD, EE, VV, WW e XX.


Facto 278.º (Não Provado) Devoluções essas que a 1ª Ré desconhecia em absoluto.


Facto 278.º-B (Não Provado) Face ao descoberto verificado na Autora derivado das operações efectuadas em nome das Rés CC, EE e VV, aquela não contactou a Administração da 1ª Ré.


278º-C (Não provado) A Autora pediu directamente ao Réu BB que lhe entregasse o cheque mencionado em II-2)


Facto 278.º-E (Não Provado) A Autora não pediu à 1ª Ré qualquer cheque de garantia para cobrir o valor dos títulos então em falta, nem solicitou quaisquer esclarecimentos sobre o descoberto.


287.º-A (Não provado) As contas abertas na 1ª Ré em …, eram essencialmente vendedoras e por via delas eram canalizadas a maior parte das ordens de venda.


287.º-B (Não provado) A conta da Ré CC no ... (leia-se na 1ª Ré) abastecia em termos de títulos a conta da mesma Ré CC em ... (leia-se na Autora), bem como a de VV e a de WW. Facto 308: Não provado. As fichas existentes na A foram preenchidas por alguém dos seus próprios serviços no total desconhecimento dos respectivos titulares e a própria assinatura de XX foi aposta por punho de funcionário da A.


287.º-C (Não provado) Pela conta da Ré EE faziam-se todas as liquidações financeiras de todas as contas existentes.


287.º-D (Não provado) Foi com este “esquema de carteiras” que o Réu BB actuou relativamente a todas as operações mencionadas pela Autora, sendo esse “esquema” do conhecimento da Autora.


293.º (Não provado) A mesma sabia ainda que a maior parte das .....00 Obrigações FIP89 compradas e simultaneamente vendidas ao BCP iriam entretanto ser entregues à 1ª Ré em nome da Ré CC.


303.º (Não provado) A existência destas contas era desconhecida pelos respectivos titulares que não tinham acesso aos seus movimentos e ignoravam a realização de ordens de compra e de venda de títulos dadas através delas.


Facto 323.º (Não Provado) A Autora quando tinha de expedir no mesmo dia correspondência respeitante a múltiplas operações, umas deveras com a 1ª Ré, outras com o 3º Réu, separava os envelopes, metendo dentro de cada um o que a cada um dizia respeito.


Facto 307.º (Não provado) No caso das contas abertas na A, existiam fichas dos respectivos titulares, mas as contas abertas em nome da 4.ºR, de VV e WW não estavam assinadas por estes, seus titulares formais, e a aberta em nome de XX, continha uma assinatura que não foi aposta pelo próprio punho desta, não coincidindo tão pouco com a assinatura constante do seu bilhete de identidade.


Facto 308.º (Não provado) As fichas existentes na A foram preenchidas por alguém dos seus próprios serviços no total desconhecimento dos respectivos titulares e a própria assinatura de XX foi aposta por punho de funcionário da A.


Facto 310.º (Não provado) A A sabia do que consta a 309.


Facto 314.° (Não provado) Em escassos onze meses (desde I de Abril de 1991 até 26 de Fevereiro de 1992) a Autora e o 3° Réu, dentro do descrito quadro, efectuaram transacções de bolsa no montante de 59,826 milhões de contos.


Facto 315.° (Não provado) Por estas transacções a Autora cobrou comissões da quantia global de Esc.149.566.932$00.


Facto 317.º (Não provado) Os saldos de títulos de que o 3° Réu, através das múltiplas contas, era credor, permaneciam em custódia na Autora.


Facto 319° (Não provado) Estes saldos não foram nunca remetidos pela Autora para a 1 a Ré, ou para qualquer dos titulares formais das contas (CC, VV, WW ou XX).


Facto 323° (Não provado) A Autora quando tinha de expedir no mesmo dia correspondência respeitante a múltiplas operações, umas deveras com a la Ré, outras com o 3° Réu, separava os envelopes, metendo dentro de cada um o que a cada um dizia respeito.


Facto 326.º (Não Provado) E efectuou compras no dia 26 solicitadas pelo Réu BB, das quais resultaram um saldo contra este de Esc. 604.488.004$00.


Facto 329.º (Não Provado) Impediu, assim, o 3º Réu de comprar os títulos em falta, deixando “a meio” duas operações que foram efectuadas com o seu acordo e que eram iguais a todas as que a Autora e o 3º Réu vinham efectuando desde Abril de 1991.


Facto 330.º (Não Provado) Se a Autora não tivesse proibido o 3º Réu de operar no mercado, este, mesmo diminuindo voluntariamente às operações, teria comprado os títulos em falta e, em pouco tempo, com recurso à Carteira de títulos que tinha na própria Autora e na 1ª Ré, fechava o ciclo das vendas a descoberto, sem prejuízo para ninguém.


Facto 337.º (Não Provado) Foi por isso que a Autora deu ordens na 1ª Ré para que esta transferisse para si todas as acções e outros valores mobiliários que ali tinha em depósito.


Facto 338º (Não provado) Ao fazer chegar à Autora os títulos que tinha em depósito na 1ª Ré pretendeu o 3º Réu oferecer à Autora uma garantia patrimonial que cobrisse a insuficiência de valores existentes ou depositados na Autora para fazer face à indicada recompra.


Facto 339º (Não provado) E o que, na circunstância, acordou com a Autora, que o aceitou, foi entregar os títulos como caução do valor em dívida - tanto aos que vieram da 1ª Ré como os que estavam depositados na Autora.


Facto 345.º (Não Provado) A conta n.º .....-0 em nome de CC não era devedora financeira e era credora de títulos.


Facto 346º (Não provado) A única conta devedora de títulos era apenas a n.º .....-6 em nome de WW, relativamente a .....09 FIP87 e ....00 Capital BPI87, sendo que nenhuma delas era devedora financeira.


*


Como em outro tempo e local destes autos já se fez constar, sendo a A e 1.ª R sociedades comerciais revestem natureza de pessoas colectivas, dotadas assim de personalidade jurídica, são tratadas pelo legislador como meras ficções com vista à satisfação do tráfego comercial mas no que tange aos seus actos terão de ser representadas por pessoas físicas, que legalmente e de acordo com específicas normas legais, nomeadamente, são definidos. Assim, e à cabeça pelo art. 405 do Código das Sociedades Comerciais, o qual preceitua como regra a representação legal pelos seus Administradores. De onde flui que se só os representantes das pessoas colectivas praticam os factos, apurar se tais actos podem ou não ser imputados na responsabilidade da pessoa colectiva é uma questão de interpretação.


No caso sub iudice, coloca-se essa questão de forma premente visto que a A imputa à 1.ª R responsabilidade pelo dano alegadamente causado através da conduta nomeadamente dos 2.º e 3.º RR.


Cura, destarte, apurar se os actos por aqueles praticados – sobretudo pelo 3.º R com o conhecimento do 2.º – devem ou não repercutir-se na esfera jurídica da 1.ª R responsabilizando-a.


Para indagar de tal questão importa saber então se os factos respectivamente vertidos nos pontos que comportam tal matéria de facto foram ou não dados provados.


Remetendo-se para o quanto se deixou escrito e para o próprio elenco de uns e de outros.


(…)


Assim, e sendo certo que, do prisma do art. 342 do Código Civil, é à A. quem compete provar os factos constitutivos do direito que se arroga, cabendo aos RR a respectiva impugnação, o que resultou dos autos provado, de forma expressiva pela negação de factos por banda do 2.º R e por confissão de outros por parte do 3.º R, é que este último executou diversas operações em bolsa, sendo que algumas por via dos mandatos expressos nos contratos com as 4º e 6º Rés, confiadas pela 1ª Ré através do 2º Réu àquele. Mas o que não decorre de forma linear provada, como aliás se fundamenta no local próprio, é a circunstância de ter agido naquelas operações enquanto diretor da 1ª R.


Igualmente não se logrou a prova por confissão das RR EE, nem assim por parte das responsáveis à data da 1.ª R.


A fragilidade da prova testemunhal por seu turno emerge da resposta à matéria controvertida para qual, de novo, se remete, já por espelhar as razões da apreciação lúcida da mesma, quer por desnecessária e entediante se revelar a sua reprodução.


O que se apurou foi que sem qualquer aproximação à versão dos factos carreados pela A, sem vínculos contratuais da natureza por ela descrita, ou pelo menos expressos que revestissem a actuação entre o 3.º e 4.º a 6.º RR, o 3º R. actuava em nome das pessoas em causa, não correspondendo muitas vezes contudo o envio de comunicações por faz a quaisquer operações em concreto, sem prejuízo de outras operações intermediadas pela A, mas não as aqui em causa, resultando inequívoca a prática normal das operações “a descoberto”.


Tal como ficou provada a colaboração entre A e 3.º R nas operações invocadas.


Não se provou ainda que a actuação do 3.º R como é descrita que tenha solicitado e concretizado em representação da 1.ª R, que esta através do 2.º R tenha omitido qualquer situação a coberto da qual o 3.ª R através daquela 1.º R estivesse a actuar, ou seja num momento em que já com ela não tinha vinculo o que era do conhecimento do 2.º R em representação da 1.ª, as operações a que a A alude, nem a actuação do 3.º R que tivesse dado origem aos proveitos indicados na sua esfera patrimonial à custa da diminuição do património da A, nem que esta estivesse sequer vinculada a tanto.


Nessa medida pois não pode concluir-se que o empréstimo contraído pela A para colmatar a diferença registada por falta de títulos ou meios financeiros físicos, seria o único meio de lhe evitar o prejuízo, nem tão pouco, o que não é somenos importância, que a própria A com a sua conduta para a consequência de tal divergência não tenha contribuído.


Tendo-se pois, por outro lado, provado que a A. não podia deixar de saber que os títulos necessários não estavam contabilizados.


E que o 3.º R não poderia deixar de o saber, pois era ele próprio que dava as ordens e sabia que não dispunha quer dos títulos que anunciava para venda quer de quantia suficientes para pagar os que dizia comprar, no momento em que efetuava as operações).


Por outro lado, também não ficou demonstrado que os RR. não tivessem conhecimento de nenhuma das operações realizadas.


Nesta análise importa não olvidar que quer a A quer os 1.º a 3.º RR no âmbito das actividades que exerciam, e chamada à discussão nos presentes, foram condenados, por contra-ordenação conforme al. Z a LL) da Especificação embora a respectiva análise se centre no âmbito de tais processos não deixa de ser revelador da postura por eles e cada um tida. Ou seja as operações em causa ocorriam.


Mas, mais que isso, resultou provado que, no dia 21 de fevereiro de 1992 a Autora decidiu executar a dupla ordem que lhe havia sido dada pelo 3º R. no sentido de comprar e simultaneamente vender ao BCP. .....00 Obrigações FIP/89. E ainda que o fez sem que tivesse confirmado tais ordens junto da administração da 1ª Ré. Bem assim como que a Autora executou as ordens referidas (no ponto 288 do questionário), sem pedir ao Réu BB e/ou à 1ª Ré os respetivos meios financeiros para a compra. Como também de se certificar, nomeadamente junto da 1ª Ré, da disponibilidade ou bloqueio das .....00 Obrigações FIP/89 simultaneamente vendidas.


Sendo que não ficou demonstrado cabalmente que o 3.º R por delegação de poderes do 2.º R, em representação da 1.ª R, de forma concertada com o 4.º a 6.º RR, ludibriaram a A, o que nem seria verosímil dada a experiência que a A, naturalmente através das pessoas que a representavam tinham na área, considerando os anos de actividade bolsista.


Autora essa que, se confiou, sem se certificar nas operações desencadeadas pelo 3.º, das eventuais consequências na sua esfera patrimonial, e na de terceiros, nem outrossim se coibindo de aceitar a colaboração do 3.º R na sua actividade, se o fez, sem cuidar de levar a cabo as certificações a que se alude nos autos, rebus sibi imputet.


Aliás era do conhecimento da A que o 3.º R à data de 21-2-1993 necessitara da soma de 200 mil contos de financiamento.


E nem se diga que a A agiu a solicitação dos RR visto que era dela o dever, o interesse e obrigação legal de não as aceitar, não se descortinando normativo legal que impedisse os RR. de pedir as ordens.


Do que vem sendo de referir flui que, de onde quer que se busque o fundamento de responsabilidade dos RR, não é possível fugir à conduta causal da A no desencadear da situação desfavorável que apresentou em Juízo.


Com efeito, e não obstante a violação dos normativos que regulam a actividade a que a A se dedicava – facto sem discussão ante a condenação por banda da CMVM e depois mantida por decisão judicial – numa análise do vínculo contratual estabelecido, não se perscruta na conduta de qualquer ou de todo os RR, mercê da violação do principio geral da boa-fé (a que alude o art. 227, num momento embrionário, e o n.º 2 do art. 762 do Código Civil, ambos na redacção vigente à data dos factos), nem que por falta de cumprimento da obrigação os torne responsáveis perante a A, desde logo por se considerar que em face da factualidade apurada, o prejuízo existente não pode ser assacado desde logo por falta de nexo de causalidade a qualquer dos RR.


Não havendo responsabilidade da pessoa singular – no caso dos 2.º e 3.º RR – inviável se torna assacar a responsabilidade à 1.ª R, representada.


O mesmo se dirá da responsabilidade da escolha do 3.º pela 1.ª R, o que aliás fica prejudicado dado o apuramento factual levado a cabo em audiência e com reflexo na respectiva resposta á matéria de facto tal como se mostra vazada em despacho próprio nos autos.


Na ausência pois de acto da responsabilidade do 3.º R causal do prejuízo invocado pela A, não pode buscar-se na 1.ª R qualquer culpa; aliás por provar ficou mesmo a representação no que tange à operação apontada como causadora do prejuízo da A. Nem no 2.º R enquanto representante da 1.ª R.


O mesmo se pode dizer no que tange ao 4.º a 6.º RR que só por via do mandato e do proveito comum do casal pela circunstância do casamento poderiam vir a responder.


Quanto à reclamada obrigação de indemnizar fundada no disposto no art. 485 e 486 do Código Civil, respigue-se o texto da norma principal, que estabelece como princípio geral em sede do instituto da responsabilidade civil: «1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. 2. Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei».


Ora, do elenco de factos provados não se retira que o 3.º R a pedido e no proveito dos 4.os a 5.º RR em representação da 1.ª R, representada pelo 2.º R tenha, através da violação de qualquer direito da [Autora], ou mesmo por violação de norma destinada a proteger interesses alheios, tenha causado prejuízo à A por forma a responder pelo mesmo.


É que em primeira linha o prejuízo sofrido pela A tal como o configura, e que decorre da necessidade de contrair o aludido empréstimo para suprir o descoberto resultante das operações realizadas conforme supra exposto, à própria desde logo pode ser imputado por falta de certificação também acima explanada e dada como provada.


Será então a 1.ª R responsável nos termos do art. 500/1 e 2 do Código Civil pela consequência danosas dos actos e omissão dos seus representantes 2.º e 3.º RR no âmbito e exercício das suas funções? E por culpa própria na escolha do 3.º R como seu representante e por omissão de fiscalização e vigilância dos actos deste último e ocultação à A?


Do leque de factos provados não consta – porque não se provou – que o 3.º R tenha actuado em representação da 1.º R junto da A nem como comissionário, mas antes que actuava exclusivamente por si e por sua conta relativamente às ordens por ele dadas à A, ou em nome do RR CC, DD e EE, e outras pessoas identificadas pela A, o que era do conhecimento desta.


Assim, corolário da falta de prova da actuação do 3.º em representação da 1.ª R, temos como comprometido de forma irremediável qualquer incumprimento a assacar à 1. Ré.


Cai pois por terra a responsabilidade da 1.ª R, e consequentemente do 2.º R. No mais os demais RR também não poderiam ser responsabilizados visto que são aplicáveis por força do n.º 3 do art. 182 do CMVM aprovado pelo DL 142-A/91, de 10-4, as regras da representação sem mandato. Assim só as pessoas representados pelo 3.º R são responsáveis não a 1.ª R.


Caso se entendesse que o 3.º R actuou representando a 1.ª R tal teria então sucedido, o que não ficou provado, no âmbito de uma comissão – aplicando-se o disposto no art. 183/3 do CMVM. Sendo que a ter o 3.º R agido com abuso de poderes face à A sempre seriam serão ineficazes os actos do 3.º R junto da A no âmbito da relação contratual versada.


Mais, rezando o art. 334 do Código Civil que é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito, por essa via também estando vedado à A o acesso à indemnização. Visto que as operações em causa eram proibidas na legislação m vigor à data como infra se exporá.


Logo, mercê da disposição legal que se convoca na discussão em apreço, a saber, o art. 570 do Código Civil, não cura de atribuir qualquer indemnização à A.


Eis a redacção que nos orienta, aqui chegados: «1. Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.


2. Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar».


Ora, a A agiu não só com violação das normas da actividade a que se dedicava, como resulta provado e firmado na ordem jurídica por sentença transitada em julgado (sendo que nessa matéria e específica já não existe qualquer análise a acrescentar por de forma exaustiva se ter discorrido sobre a mesma), como actuou sem cuidar de se certificar de que poderia levar a cabo as operações que, segundo a mesma, levaram ao resultado danoso. Autora essa com anos de larga experiência no sector. Ao invés dos 4.º, 5.º, 6.º RR.


Evidencia-se, de qualquer forma, escrevíamos, a nulidade das ditas operações, a qual emerge da violação do art. 184/1/c), 410/3, 425/3 e 657/1 e 2 todos do CMVM, na redacção dada pelo DL 142-A/91 de 10-4, vigente à data, dispondo então:


(…);


o art. 410/3 do DL 142-A/91


(…).


E o art. 425/4:


(…).


Aliás nunca poderia resgatar-se consequência válida de tal situação tendo por base a mesma como teve uma operação considerada nula á luz do CMVM à data em vigor.


Com efeito, as operações em causa de harmonia com o CMVM de 1991, eram proibidas.


Não podendo dessa forma constituir qualquer tutela com cobertura legal das expectativas da [Autora], ainda que assentes em prática existente nalguns sectores do mercado bolsista.


Na verdade, e como preceitua o art. 294 do Código Civil, os negócios celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são nulos, salvo nos casos em que outra solução resulte da lei.


O que nos reconduz, de forma inexorável, ao naufrágio da pretensão da A.”


3.2. Ainda que com fundamentos diversos, a argumentação do acórdão recorrido fez naufragar a pretensão da Autora quanto ao cerne da discutida responsabilidade civil dos Réus (com diferentes projecções em face dos Réus demandados, como é evidente).


Transcreve-se:


“Fundamenta-se a acção em invocada responsabilidade dos RR., ora apelados, pelos prejuízos decorrentes de alegado acordo, entre a apelante e os RR., dirigido à intermediação de determinadas operações de bolsa, em nome e por conta daqueles.


Trata-se do negócio a que alude o art. 425º do CMVM, aprovado pelo DL 142-A/91, de 10/4, ao tempo em vigor.


Os prejuízos cujo ressarcimento a apelante pretende radicam em alegados custos acrescidos das ordens de bolsa, por si realizadas, por conta e no interesse dos RR.


A sentença recorrida, depois de transportar a questão para a sede da responsabilidade aquiliana, fez improceder a demanda com fundamento em nulidade das operações efectuadas, por violarem lei expressa; e na inobservância do ónus da prova referente ao nexo causal entre os invocados prejuízos e as descritas ordens de bolsa.


No que respeita ao tipo de responsabilidade em causa, entende-se que, muito embora tal violação se tenha verificado no âmbito de uma relação de intermediação e, como tal, de natureza contratual, se trata aqui de responsabilidade extracontratual.


Não se sufraga, porém, o entendimento constante da sentença apelada, no sentido da nulidade, por violação de lei imperativa, das apuradas operações de bolsa.


As "ordens de bolsa" eram, ao tempo, reguladas pelo citado art. 425º do CMVM, o qual, sob a epígrafe "Definição e princípios gerais", prescrevia que:


"1 – As ordens relativas às operações de compra ou de venda em bolsa de quaisquer valores mobiliários denominam-se ordens de bolsa e podem ser dadas pelos interessados:


a) Directamente ao corretor que as deva executar, quer se trate de ordens de compra quer de ordens de venda, e ainda que, neste último caso, os valores titulados ou escriturais a que as ordens respeitam não se encontrem depositados ou registados em contas abertas junto dele pelos ordenadores;


b) Tratando-se de ordens de venda, aos intermediários financeiros que tenham a seu cargo as contas em que estejam depositados ou registados os valores que delas são objecto;


c) Tratando-se de ordens de compra de valores titulados, a qualquer intermediário financeiro legalmente autorizado a receber do público valores mobiliários para custódia e administração e ordens de bolsa para a respectiva transacção;


4 – O corretor não dará execução a qualquer ordem de bolsa sem que:


a) Tratando-se de operação a contado, e verificando-se qualquer das situações previstas na alínea a) do nº 1 e no nº 3 do presente artigo, se mostrem cumpridas as condições aplicáveis do nº3 do artigo 410º, e, quando for o caso, o intermediário autorizado em que os valores a transaccionar se encontrem registados ou depositados, se não for o próprio corretor, confirme a efectiva disponibilidade desses valores e o seu bloqueio para transacção nos termos dos artigos 68º ou 93º, respectivamente.”


Ora, o CMVM, ao tempo em vigor, referia expressamente o modo de proceder quando estivessem em causa situações de compra e venda a descoberto.


Na verdade, dispunha o art. 458º que:


"1 – A liquidação de uma operação de bolsa consiste na entrega ou colocação dos valores que dela são objecto à disposição do comprador e no pagamento ao vendedor do respectivo preço.


2 – Poderá ainda ser abrangido pela liquidação o cumprimento de outras obrigações que directamente decorram da operação realizada".


E como se acentua no parecer junto pela apelante, o art. 463º do mesmo diploma prescrevia que, havendo incumprimento na liquidação:


"1 – Se o comitente, depois de lhe haver sido comunicada, nos termos do artigo 457º, a realização da operação ordenada, ou de ter sido especialmente notificado para o efeito, não cumprir quaisquer obrigações de que a liquidação da operação dependa, e nomeadamente se, havendo o corretor executado a transacção sem observância do disposto na al. a) do nº3 ou no nº4 do artigo 410º, o comitente não efectuar, após essa comunicação ou notificação, a entrega dos valores vendidos ou o pagamento do preço da compra, o corretor poderá proceder desde logo na bolsa, a expensas do comitente, à recompra dos valores vendidos ou à revenda dos valores comprados, ou, tratando-se de operação sujeita a caução, à execução da caução recebida.


2 – Sempre que, seja qual for o facto que o determine, o corretor ou outro intermediário financeiro que tenha realizado uma operação não efectue a sua tempestiva liquidação, o sistema de liquidação e compensação procederá automaticamente por si próprio, a expensas do corretor ou intermediário financeiro em falta, às recompras ou revendas que se tornem necessárias ou, quando for o caso, à execução da caução constituída.


3 – A realização das recompras e das revendas e a execução de cauções nos termos dos números anteriores tornam as entidades cujo incumprimento determina a sua necessidade responsáveis por todos os custos dessas operações e por todos os demais prejuízos que do incumprimento resultem, sem prejuízo das sanções disciplinares ou contra-ordenacionais em que incorram.


4 – Nos casos em que as recompras ou revendas ou a execução da caução prestada sejam imediatamente desencadeadas pelo sistema de liquidação e compensação de conformidade com o disposto no nº 2 do presente artigo, não poderá o corretor proceder às mesmas nos termos do nº1, ficando-lhe apenas salvos os seus direitos contra o comitente ao abrigo do nº3, quando ao comitente seja imputável o facto determinante do incumprimento na liquidação.”


Por outro lado, sob a epígrafe “Operações a contado sobre valores mobiliários”, dispunha o art. 410º, nº1, que:


“São operações a contado aquelas em que as obrigações recíprocas dos contratantes, compreendendo a entrega dos títulos a que respeitam, quando a ela houver lugar, e o pagamento do respectivo preço, devem ser cumpridas no próprio dia em que se efectuam ou num prazo mínimo após a sua realização, de acordo com as regras que para o efeito se encontrem estabelecidas ou aprovadas pela CMVM, tendo em atenção os sistemas de negociação e de liquidação aplicáveis.”


Do regime enunciado resulta, pois, afastada a nulidade assacada na sentença às operações em causa (vendas a descoberto), porquanto da lei resulta a respectiva validade, assegurando a sua eficácia com os procedimentos a que alude o art. 463º do CMVM – que estabelecia expressamente a responsabilidade do comitente, estendendo-a a todos os custos da operação e demais prejuízos resultantes do incumprimento, nos casos em que era o corretor a efectuar as operações de recompra.


Não restam dúvidas que nos autos se configura uma relação de intermediação financeira.


Efectivamente, estabelecia o art. 289º do CMVM que:


“1 – São actividades de intermediação financeira:


a) Os serviços e actividades de investimento em instrumentos financeiros;


b) Os serviços auxiliares dos serviços e actividades de investimento (…)”.


E no art. 293º:


“1 – São intermediários financeiros em instrumentos financeiros:


a) As instituições de crédito e as empresas de investimento que estejam autorizadas a exercer actividades de intermediação financeira em Portugal (...)”.


A proposta e aceitação da intermediação traduz, assim, “um contrato de mandato ou contrato misto com uma componente de mandato porque tem como efeito comum a obrigação de o intermediário financeiro praticar negócios jurídicos de execução por conta do seu cliente (art 1157º CC) e o correspondente poder atribuído ao intermediário financeiro para agir por conta de outrem" (Ferreira de Almeida, “As transacções por conta alheia no âmbito da intermediação no mercado de valores mobiliários”, in Direito dos Valores Mobiliários – Lisboa 1997, pág. 296).


Discorda-se, todavia, da sentença, na parte em que entendeu ter o 3º R., ao acordar com a apelante a execução de concretas operações de bolsa, agido em nome próprio.


Na verdade, como se decidiu em acórdão do TRP, de 4/1/2011 – 201101041921/08.8TJVNF.P1:


"As situações em que o intermediário financeiro recebe, transmite e executa as ordens dadas pelos investidores são operações por conta alheia: o intermediário financeiro actua no interesse e por conta dos seus clientes, sendo na esfera jurídica destes que se repercutem as consequências – positivas e negativas – das operações de subscrição ou transacção de valores mobiliários.


Essa actuação do intermediário financeiro pressupõe a existência de um negócio antecedente – designado normalmente como negócio de cobertura – que serve de base à subscrição ou transacção de valores mobiliários, assumindo-se estas operações como negócios de execução da relação de cobertura.


Os negócios de cobertura, que no CVM aparecem designados como contratos de intermediação, estão regulamentados nos artigos 321º e seguintes deste diploma, constando entre eles as ordens, cuja disciplina está definida nos artigos 325° a 334° do mesmo Código.


No caso das ordens, para serem vinculativas para o intermediário é necessário que exista uma prévia relação de clientela, sem o que este poderá recusá-la (cfr. art. 326°, n° 3, do CVM)”.


Estando a acção assente na responsabilidade decorrente do art. 463º do CMVM, ao tempo em vigor, serão factos constitutivos do direito a que a apelante se arroga:


- Existência de ordens de bolsa emanadas dos RR., representados pelo 3º R., e dirigidas à apelante.


- Violação culposa por aqueles de norma legal destinada a proteger interesses alheios.


- Aceitação destas ordens pela apelante.


- Identificação das concretas ordens de bolsa, em relação às quais houve omissão da contraprestação devida pelos RR.


- Concreto valor do dano e nexo causal entre este e a conduta dos RR. provocado por tal omissão.


Ora, no caso concreto, apurou-se que :


- O 3º R. foi diretor da 1ª R., até ao dia 20/2/92.


- Os 4º a 6º RR eram clientes, com contas de depósitos, da 1ª R. e emitiram procurações ao 3º R., para em seu nome efectuar designadamente operações de bolsa.


- No dia 21/2/92, o 3º R. solicitou à A. as operações de compra e venda em nome da 4ª R. e de VV, que com esta data constam dos docs. de fls. 105 a 188, 293 a 389, 527 a 530 e 531 a 546 (facto 101).


- Como consequência das operações de bolsa realizadas, incluindo a do dia 19/2/92, em nome da 4ª R. e de VV, a A. tinha no dia 25/2/92 inscrito nos seus extractos de “movimento financeiro” de fls. 105 a 188 e 527 a 530, um débito de Esc. 85.947.672$00 para a conta em nome da 4ª R. e, na mesma data, um crédito vencido, sobre a conta de VV, no valor de Esc. 1.191.358.357$00 (facto 115).


- Como consequência de operações realizadas desde o princípio do mês de Fevereiro, a A. tinha inscrito no seu “Extracto de Clientes - Conservadoria” de fls. 531 a 546, um crédito na conta em nome de VV, a ser liquidado até 6/3/92, data da liquidação física da quinzena: ....20 FIP87 da 1ª a 3ª Série: ....00 FIP89; ....05 obrigações de capital BPI87 (facto 118).


- Pelas operações de bolsa efectuadas e registadas no dia 20, a A. tinha inscrito no seu extracto de “movimento financeiro no período de: 1/1/92 a 21/2/92”, um saldo credor a liquidar dia 26, na conta em nome de VV, de Esc. 6.633.233$00, e um saldo devedor a liquidar, no mesmo dia, à 4ª R., de Esc. 95.693.586$00 (facto 120).


- Por força das operações efectuadas, incluindo as relativas aos .....00 FIP89, registadas a 21, a A. tinha inscrito no seu extracto de “movimento financeiro, no período de 1/1/92 a 21/2/92, um saldo devedor com data-valor de 27, relativo à conta inscrita em nome da 4ª R., de 2.158.646.119$00 e um saldo credor, relativo à conta em nome de VV, de 918.907.147$00 (facto 121).


- No plano físico, por força, quer das operações sobre os .....00 FIP89 registadas a 21, a A. tinha inscritos os seguintes saldos credores sobre a conta de VV: ....20 FIP 87 (1ª e 3ª série); .....00 FIP 89; ....05 Obrigações Capital BPI 87 (facto 122).


- No dia 24/2/92, o 3º R. enviou à A. o fax de fls. 607 a 609, donde consta, nomeadamente, “informo que creditei na v/conta com data valor de 25/2/92 pelo valor de 1.105.410.685$00” (facto 128).


- Este valor é referente ao “saldo global” referido no facto 117 (facto 129).


Da enumeração dos factos ora elencados, resulta que aquela contabilizava em nome dos RR. várias operações com saldos diversos, ora devedores, ora credores, violando regras de procedimento.


Por outro lado, apurou-se o lançamento de diversas operações contabilísticas que a apelante levou a cabo, inscrevendo, em conta corrente dos 4º a 6º RR. e outros, débitos ou créditos, que todavia não se demonstrou corresponderem aos factos concretos que fundamentariam a pretendida condenação.


E no emaranhado de compras e vendas de obrigações aparecem, indistinta e confusamente, operações de bolsa dos dias 17, 18 e 19/2/92 e depois a 20 e 21/2, liquidações físicas a 25/2 e 6/3, sem que haja a apelante procedido à cabal diferenciação destes actos e respectivos pagamentos.


Deste modo, não se provou a existência de nexo causal entre os invocados prejuízos e as operações de bolsa concretamente efectuadas.


Não tendo logrado a apelante, como lhe incumbia, provar os factos constitutivos do direito invocado, terá, assim, de improceder o pedido por si deduzido.”

3.3. Pela bondade dos argumentos utilizados na interpretação, em especial, dos arts. 425º, 450º e 463º, do CMV, aplicáveis à data da celebração e prática dos factos sob escrutínio, é de sufragar o acórdão recorrido, assim como, na parte relevante, da sentença de 1.ª instância, a cuja argumentação se adere nos termos do art. 663º, 5, 2ª parte, ex vi art. 679º CPC.

3.4. Discute-se uma responsabilidade que é de qualificar como extra-negocial, à luz da configuração normativa do art. 463º do CVM aprovado pelo DL 142-A/91 – norma central da pretensão indemnizatória da Autora e Recorrente –, em particular os n.os 1 a 3 (sem prejuízo da relação contratual de intermediação financeira estabelecida para a recepção, transmissão e execução de ordens)1.

Em causa, a segunda modalidade de ilicitude delitual: violação de «disposição legal destinada a proteger interesses alheios».


Para esse efeito, atenta a causa de pedir, avultam os seguintes factos:

“86º No dia 20/2, pelas 16h30, o 3º R. telefonou ao Diretor Geral da A. solicitando que esta, em nome da 4ª R. procurasse obter vendedor, fora de bolsa, do total de .....21 FIP89, com a específica condição de que tais títulos deveriam ser entregues à 1ª R. até ao dia 25/2/92 para crédito na respectiva conta da 4ª e 6ª RR.


87º Informou então que tais títulos tinham sido vendidos a descoberto pela 1ª R. no escritório de … e que esta entregaria o preço obtido contra a entrega prévia dos mesmos títulos, resolvendo assim o problema quanto à liquidação física dos mesmos, aprazada para 6/3/92.


88º A A. no mesmo dia 20/2 tinha obtido vendedor de um lote global de .....00 FIP89, pelo preço unitário de Esc. 10.445$00, com a condição de entrega dos títulos até ao dia 25 seguinte.


93º Relativamente a esta entrega o 3º R. tinha dito ao representante da A. SS, que contra a entrega dos títulos à 1ª R. os pagaria de imediato, pois já teria o montante equivalente.


97º As operações relativas aos .....00 FIP 89, foram registadas no dia 21/2/92.


99º O 3º R. alegou então que existia um desentendimento entre ele e o 2º R., pelo que necessitava de um fax da A. dirigido à 1ª R. e ao cuidado do 2º R., comprovativo de que os .....21 FIP89 seriam entregues na 1ª R. em … e até dia 25, conforme ele e a A. haviam acordado, tendo a A. enviado o fax de fls. 591 dos autos.


101º No dia 21/2/92 o 3º R. solicitou à A. as operações de compra e venda em nome da 4ª R. e da VV, que com esta data constam dos docs. de fls. 105 a 188, 293 a 389, 527 a 530 e 531 a 546.


115º Os faxes de fls. 586 e 591, foram enviados “para” BCI Valores” “A/C Exmº Senhor Dr. BB” sendo que no de fls. 586 consta ainda, entre o mais, “para onde V. Exa. canalizava as ordens para esta sociedade”.


117º Como consequência das operações de Bolsa realizadas, incluindo a de dia 19/2/92, em nome da 4ª R. e em nome de VV, a A. tinha no dia 25/2/92 inscrito nos seus extratos de “movimento financeiro” de fls. 105 a 188 e 527 a 530 dos autos, um débito de Esc. 85.947.672$00 para a conta em nome da 4ª R. e, na mesma data, um crédito vencido sobre a conta em nome de VV no valor de Esc. 1.191.358.357$00.


118º Como consequência de operações, realizadas desde o princípio do mês de fevereiro, a A. tinha inscrito nos seu “Extrato de Clientes – Conservadoria” de fls. 531 a 546 dos autos, um crédito na conta em nome de VV, a ser liquidado até 6/3/92, data da liquidação física da quinzena: ....20 FIP87 da 1ª a 3ª Série: ....00 FIP89; ....05 obrigações de capital BPI87.


120º Pelas operações de Bolsa efectuadas e registadas no dia 20, a A. tinha inscrito no seu extrato de “movimento financeiro no período de 1/1/92 a 21/2/92”, um saldo credor a liquidar dia 26, na conta inscrita em nome de VV, a quantia de Esc. 6.633.233$00, e tinha um saldo devedor, a liquidar no mesmo dia à 4ª R,. a quantia de Esc. 95.693.586$00.


121º Por força das operações efectuadas incluindo as relativas aos .....00 FIP89, registadas a 21, a A. tinha inscrito no seu extrato de “movimento financeiro no período de 1/1/92 a 21/2/92 um saldo devedor com data-valor de 27, relativo à conta inscrita em nome da 4ª R., a quantia de 2.158.646.119$00 e um saldo credor relativo à conta inscrita em nome de VV a quantia de 918.907.147$00.


122º No plano físico, por força, quer das operações sobre os .....00 FIP89 registadas a 21, a A. tinha inscritos os seguintes saldos credores sobre a conta de VV: ....20 FIP 87 (1ª e 3ª série); .....00 FIP 89; ....05 Obrigações Capital BPI 87.


123º A A. deveria ter a situação destes títulos regularizada, até à data de compensação/liquidação de Bolsa da última quinzena, que se realizaria em 6/3/92.


127º A A. entregou à 1ª R. ....00 FIP89, tendo informado previamente essa entrega através do fax de fls. 605/606 dos autos.


128º No dia 24/2/92, pelas 18h26, o 3º R. enviou à A. o fax de fls. 607 a 609 dos autos, com a redacção que aí consta, nomeadamente “(…) informo que creditei na v/conta (…) com data valor de 25/02/92 (…) pelo valor de 1.105.410.685$00”.


129º Este valor é referente ao “saldo global” referido no facto 117º.


131º O 3º R. enviou no dia 25 à A. cópia do fax que se encontra a fls. 611 a 616, que já tinha enviado ao 2º R.


139º A A., na pessoa da Presidente do seu Conselho de Administração, HH, telefonou à 1ª R., na pessoa do 2º R., no dia 25/2/92, mostrando-se preocupada pelo facto dos 1º, 4º e 6º RR. não terem efectuado à A. os pagamentos até essa data.


142º O 2º R. alegou então desconhecer qualquer obrigação das 4ª e 6ª RR., de entregarem títulos e pagamentos à A.


158º A fls. 613 a 616 dos autos, constam cópias de “procurações” conferidas por CC e EE, ao 3º R., nos termos que aí constam.


161º A Associação da Bolsa de Valores ... emitiu no dia 26, o doc. cuja cópia consta de fls. 618 dos autos.


162º As 4ª e 6ª RR. assinaram o doc. de fls. 619 e o 3º R. o doc. de fls. 620, ambos dirigidos à 1ª R., tendo esta enviado a comunicação de fls. 621, assinada pelo 2º R.


163º No dia 26/2/92 o 3º R. ordenou através do doc. de fls. 622 dos autos, uma transferência bancária pelo valor de 1.453.408.818$00 destinado ao pagamento à A. dos montantes devidos a 25 e 26 pelas bolsas dos dias 19 e 20.


164º A A. pediu um empréstimo bancário, de modo a que no dia 26, referido no doc. de fls. 618, pudesse pagar as operações que efectuara indicando o nome dos clientes, nomeadamente, 4ª, 6ª RR. e VV, para que o Banco de Portugal efetuasse assim a compensação.


165º Por este empréstimo a A. pagou os juros nos montantes referidos nos docs. de fls. 623 a 625.


275º A A. não referenciou, normalmente, no seu sistema informático as contas dos RR. CC, DD, EE, VV, WW e XX, com a menção “BCI - Valores”, como fez normalmente, com outras contas canalizadas pela 1ª R.


284º Paralelamente às contas abertas na 1ª R. em nome de CC, DD, EE, VV, WW e XX, foram abertas na A. outras tantas contas em nome das mesmas pessoas.


285º As contas abertas na 1ª R., no ..., eram essencialmente compradoras e por via delas eram canalizadas a maior parte das ordens de compra.


288º, 294º e 300º No dia 21/2/92 a A. decidiu executar a dupla ordem que lhe havia sido dada pelo 3º R. no sentido de comprar em nome de VV e simultaneamente vender ao BCP. .....00 Obrigações FIP/89, que sabia que esta não dispunha.


289º E sem que tivesse confirmado tais ordens junto da administração da 1ª R.


290º A A. executou as ordens referidas em 288º, sem pedir ao R. BB e/ou à 1ª R. os respetivos meios financeiros para a compra.


291º Como também de se certificar, nomeadamente junto da 1ª R., da disponibilidade ou bloqueio das .....00 Obrigações FIP/89 simultaneamente vendidas.


302º Era o R. BB quem geria efectivamente e de acordo apenas com a sua vontade, as seguintes contas: na 1ª R., em nome de CC, a conta nº ....31 no ... e na A., em nome de CC a conta nº ....20, em nome de VV, a conta nº .....-8, em nome de WW, a conta nº .....-6, e em nome de XX a conta nº .....-0.


304º O R. BB era quem destas contas se servia para operar no seu interesse no mercado de títulos, sendo o beneficiário de pagamentos efetuados quer pela A. quer pela 1ª R.

Visto este acerto factual, na sua globalidade de matéria de facto provada, em conjunto com a factualidade não provada e destacada em 1.ª instância, não se lograram demonstrar, desde logo, as normas legais de tutela de interesses alheios (neste caso, em benefício da Autora), específicas hoc sensu por protegerem contra um risco ou perigo especial (proibindo ou impondo um comportamento), que baseassem o preenchimento da normatividade de responsabilização em sede de solicitação das operações de bolsa junto da Autora.

Depois, visto igualmente o que antecede na materialidade, também falece a tese de que se poderia ir buscar a responsabilidade ao regime dos arts. 165º, 800º ou 500º (comitente-comissário) do CCiv., em função de o Réu BB ter ordenado operações de bolsa em representação ou como comissário da sua entidade patronal, 1.ª Ré.

3.5. Por outro lado, em especial, discutiu-se – ponto crítico das alegações da Autora e Recorrente nesta revista – a necessidade de se conformar com o art. 563º do CCiv (nexo de causalidade) a relação entre os prejuízos invocados pela Autora – “custos acrescidos das ordens de bolsa, por si realizadas, por conta e no interesse dos RR.” – e as operações de bolsa efectuadas no âmbito da “intermediação financeira”, concretizada nas operações de compra e venda de valores mobiliários por conta e no interesse de outrem.

Pela nossa parte, o art. 563º do CCiv. remete-nos para o conceito de causa juridicamente relevante, consagrado positivamente: «A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão».


O que significa que, em termos simples e de acordo com a melhor interpretação, só temos causa adequada se, para além de, em concreto, uma certa causa ter sido condição de um determinado efeito, também em abstracto, pela sua “natureza geral” e “segundo o curso normal das coisas”, se revele apropriada para produzir esse efeito, de acordo com um juízo de probabilidade na imputação do dano. A condição não será imputável à esfera ou âmbito de responsabilidade do agente lesante quando era de todo indiferente para o surgir de um tal dano e se tornou uma condição dele em virtude de circunstâncias extraordinárias ou anormais (formulação negativa da “causalidade adequada”); a inadequação “existirá quando o evento, segundo o normal decurso das coisas e a experiência da vida, não eleva ou favorece, nem modifica o círculo de riscos da verificação do dano”2. E, nesse contexto, o julgador tem de se referir “ao momento da prática do facto, considerando não apenas as circunstâncias eventualmente conhecidas pelo (eventualmente) obrigado à indemnização, mas igualmente todas aquelas que, nessa altura, eram cognoscíveis ou reconhecíveis a um observador experimentado, ou com cuja existência ele tinha de contar de acordo com a experiência da vida (é a chamada ‘prognose posterior objectiva’ (…)”, na medida do “conhecimento de circunstâncias que não foram ao tempo reconhecíveis pelo agente, mas que o seriam para um qualquer terceiro”3.


O que se exige é que o facto seja objectivamente uma causa adequada para a produção lesiva tendo em conta o processo factual que conduziu ao dano, pois é este que “há-de caber na aptidão geral ou abstracta do facto para produzir o dano”4. Por outras palavras: é causa adequada o facto – neste caso, activo e, acima de tudo, omissivo – se e quando os danos são uma sua consequência normal, típica e “ordinária” segundo a “regra comum”5 (e, por regra, previsível na esfera concreta do sujeito lesante), desde que, para além das situações de certeza inequívoca, o critério da probabilidade medeie a causalidade.


Em suma: é necessário demonstrar que essa actuação se revelou apropriada, pela sua natureza, geral e abstracta, e segundo o decurso normal das coisas e as regras da experiência, a produzir ou a agravar a situação conducente ao dano, de acordo com um juízo de previsibilidade e probabilidade na óptica de um observador experimentado médio, colocado na posição concreta do sujeito e em referência ao momento da verificação ou agravamento do resultado-dano, quanto à imputação dessa situação à conduta6.


Em contraponto (numa outra visão explicativa – e abundam, como se sabe, na dogmática civilística – do art. 563º do CCiv.), portanto, só há actuação causalmente adequada se o dano se situa imputacionalmente na esfera ou círculo de riscos que sejam de prever (enquanto “cognoscibilidade do potencial lesante da esfera de risco que assume, que gera ou que incrementa”) e se assume como possibilidade derivada do desvio da conduta, de tal modo que era de exigir o comportamento contrário ou alternativo para evitar os resultados. Em consequência, exclui-se a imputação quando o risco não foi criado ou quando haja diminuição de risco pela actuação do sujeito.7


Em concreto: não se deu como provado que estivéssemos perante uma acção – em rigor, acções relativas às ordens e concretizações das operações em mercado de bolsa – incluídas na “esfera de risco encabeçada pelo lesado, pelos terceiros que compõem teluricamente o horizonte de actuação daquele, e ainda com a esfera de risco geral da vida" e a “esfera de risco titulada pelo lesado” (role responsability), isto é, na esfera de risco que se assumiu com a relação de intermediação financeira e as consequentes ordens para operações sobre valores mobiliários, na qual se encaixasse o dano enquanto evento a evitar – ou que seria de evitar – com o cumprimento das normas legais e diligência devida no que respeita ao quadro-sistema de compensação/liquidação de valores-títulos sobre que incidiram tais operações (em especial “vendas a descoberto”), desde logo porque é com essa esfera que dialoga a previsibilidade (enquanto “cognoscibilidade do potencial lesante da esfera de risco que assume, que gera ou que incrementa”)8 e, por maioria de razão, a probabilidade causal, conducentes à responsabilidade.


Ao invés: os danos alegados, considerando os factos, resultam de uma factualidade complexa imputável fundamentalmente à conduta ilícita, omissiva e negligente, da Autora enquanto receptora das ordens para a celebração das operações financeiras solicitadas no âmbito da intermediação acordada.





Concluíram, com acerto e sumariamente, as decisões das instâncias:


1.ª instância (sublinhado nosso)


“Assim, e sendo certo que, do prisma do art. 342 do Código Civil, é à A. quem compete provar os factos constitutivos do direito que se arroga, cabendo aos RR a respectiva impugnação, o que resultou dos autos provado, de forma expressiva pela negação de factos por banda do 2.º R e por confissão de outros por parte do 3.º R, é que este último executou diversas operações em bolsa, sendo que algumas por via dos mandatos expressos nos contratos com as 4º e 6º Rés, confiadas pela 1ª Ré através do 2º Réu àquele. Mas o que não decorre de forma linear provada, como aliás se fundamenta no local próprio, é a circunstância de ter agido naquelas operações enquanto diretor da 1ª R.


Igualmente não se logrou a prova por confissão das RR EE, nem assim por parte das responsáveis à data da 1.ª R.


(…)


O que se apurou foi que sem qualquer aproximação à versão dos factos carreados pela A, sem vínculos contratuais da natureza por ela descrita, ou pelo menos expressos que revestissem a actuação entre o 3.º e 4.º a 6.º RR, o 3º R. actuava em nome das pessoas em causa, não correspondendo muitas vezes contudo o envio de comunicações por faz a quaisquer operações em concreto, sem prejuízo de outras operações intermediadas pela A, mas não as aqui em causa, resultando inequívoca a prática normal das operações “a descoberto”.


Tal como ficou provada a colaboração entre A e 3.º R nas operações invocadas.


Não se provou ainda que a actuação do 3.º R como é descrita que tenha solicitado e concretizado em representação da 1.ª R, que esta através do 2.º R tenha omitido qualquer situação a coberto da qual o 3.ª R através daquela 1.º R estivesse a actuar, ou seja num momento em que já com ela não tinha vinculo o que era do conhecimento do 2.º R em representação da 1.ª, as operações a que a A alude, nem a actuação do 3.º R que tivesse dado origem aos proveitos indicados na sua esfera patrimonial à custa da diminuição do património da A, nem que esta estivesse sequer vinculada a tanto.


Nessa medida pois não pode concluir-se que o empréstimo contraído pela A para colmatar a diferença registada por falta de títulos ou meios financeiros físicos, seria o único meio de lhe evitar o prejuízo, nem tão pouco, o que não é somenos importância, que a própria A com a sua conduta para a consequência de tal divergência não tenha contribuído.


Tendo-se pois, por outro lado, provado que a A. não podia deixar de saber que os títulos necessários não estavam contabilizados.


E que o 3.º R não poderia deixar de o saber, pois era ele próprio que dava as ordens e sabia que não dispunha quer dos títulos que anunciava para venda quer de quantia suficientes para pagar os que dizia comprar, no momento em que efetuava as operações.


Por outro lado, também não ficou demonstrado que os RR. não tivessem conhecimento de nenhuma das operações realizadas.


Nesta análise importa não olvidar que quer a A quer os 1.º a 3.º RR no âmbito das actividades que exerciam, e chamada à discussão nos presentes, foram condenados, por contra-ordenação conforme al. Z a LL) da Especificação embora a respectiva análise se centre no âmbito de tais processos não deixa de ser revelador da postura por eles e cada um tida. Ou seja as operações em causa ocorriam.


Mas, mais que isso, resultou provado que, no dia 21 de fevereiro de 1992 a Autora decidiu executar a dupla ordem que lhe havia sido dada pelo 3º R. no sentido de comprar e simultaneamente vender ao BCP .....00 Obrigações FIP/89. E ainda que o fez sem que tivesse confirmado tais ordens junto da administração da 1ª Ré. Bem assim como que a Autora executou as ordens referidas (no ponto 288 do questionário), sem pedir ao Réu BB e/ou à 1ª Ré os respetivos meios financeiros para a compra. Como também de se certificar, nomeadamente junto da 1ª Ré, da disponibilidade ou bloqueio das .....00 Obrigações FIP/89 simultaneamente vendidas.


Sendo que não ficou demonstrado cabalmente que o 3.º R por delegação de poderes do 2.º R, em representação da 1.ª R, de forma concertada com o 4.º a 6.º RR, ludibriaram a A, o que nem seria verosímil dada a experiência que a A, naturalmente através das pessoas que a representavam tinham na área, considerando os anos de actividade bolsista.


Autora essa que, se confiou, sem se certificar nas operações desencadeadas pelo 3.º, das eventuais consequências na sua esfera patrimonial, e na de terceiros, nem outrossim se coibindo de aceitar a colaboração do 3.º R na sua actividade, se o fez, sem cuidar de levar a cabo as certificações a que se alude nos autos, rebus sibi imputet.


Aliás era do conhecimento da A que o 3.º R à data de 21-2-1993 necessitara da soma de 200 mil contos de financiamento.


E nem se diga que a A agiu a solicitação dos RR visto que era dela o dever, o interesse e obrigação legal de não as aceitar, não se descortinando normativo legal que impedisse os RR. de pedir as ordens.


Do que vem sendo de referir flui que, de onde quer que se busque o fundamento de responsabilidade dos RR, não é possível fugir à conduta causal da A no desencadear da situação desfavorável que apresentou em Juízo.


Com efeito, e não obstante a violação dos normativos que regulam a actividade a que a A se dedicava – facto sem discussão ante a condenação por banda da CMVM e depois mantida por decisão judicial – numa análise do vínculo contratual estabelecido, não se perscruta na conduta de qualquer ou de todo os RR, mercê da violação do principio geral da boa-fé (a que alude o art. 227, num momento embrionário, e o n.º 2 do art. 762 do Código Civil, ambos na redacção vigente à data dos factos), nem que por falta de cumprimento da obrigação os torne responsáveis perante a A, desde logo por se considerar que em face da factualidade apurada, o prejuízo existente não pode ser assacado desde logo por falta de nexo de causalidade a qualquer dos RR.


Não havendo responsabilidade da pessoa singular – no caso dos 2.º e 3.º RR – inviável se torna assacar a responsabilidade à 1.ª R, representada.


(…)


Na ausência pois de acto da responsabilidade do 3.º R causal do prejuízo invocado pela A, não pode buscar-se na 1.ª R qualquer culpa; aliás por provar ficou mesmo a representação no que tange à operação apontada como causadora do prejuízo da A. Nem no 2.º R enquanto representante da 1.ª R.


O mesmo se pode dizer no que tange ao 4.º a 6.º RR que só por via do mandato e do proveito comum do casal pela circunstância do casamento poderiam vir a responder.


Quanto à reclamada obrigação de indemnizar fundada no disposto no art. 485 e 486 do Código Civil, respigue-se o texto da norma principal, que estabelece como princípio geral em sede do instituto da responsabilidade civil: «1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. 2. Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei».


Ora, do elenco de factos provados não se retira que o 3.º R a pedido e no proveito dos 4.os a 5.º RR em representação da 1.ª R, representada pelo 2.º R tenha, através da violação de qualquer direito da [Autora], ou mesmo por violação de norma destinada a proteger interesses alheios, tenha causado prejuízo à A por forma a responder pelo mesmo.


É que em primeira linha o prejuízo sofrido pela A tal como o configura, e que decorre da necessidade de contrair o aludido empréstimo para suprir o descoberto resultante das operações realizadas conforme supra exposto, à própria desde logo pode ser imputado por falta de certificação também acima explanada e dada como provada.


Será então a 1.ª R responsável nos termos do art. 500/1 e 2 do Código Civil pela consequência danosas dos actos e omissão dos seus representantes 2.º e 3.º RR no âmbito e exercício das suas funções? E por culpa própria na escolha do 3.º R como seu representante e por omissão de fiscalização e vigilância dos actos deste último e ocultação á A?


Do leque de factos provados não consta – porque não se provou – que o 3.º R tenha actuado em representação da 1.º R junto da A nem como comissionário, mas antes que actuava exclusivamente por si e por sua conta relativamente às ordens por ele dadas à A, ou em nome do RR CC, DD e EE, e outras pessoas identificadas pela A, o que era do conhecimento desta.


Assim, corolário da falta de prova da actuação do 3.º em representação da 1.ª R, temos como comprometido de forma irremediável qualquer incumprimento a assacar à 1. Ré.


Cai pois por terra a responsabilidade da 1.ª R, e consequentemente do 2.º R. No mais os demais RR também não poderiam ser responsabilizados visto que são aplicáveis por força do n.º 3 do art. 182 do CMVM aprovado pelo DL 142-A/91, de 10-4, as regras da representação sem mandato. Assim só as pessoas representados pelo 3.º R são responsáveis não a 1.ª R.


Caso se entendesse que o 3.º R actuou representando a 1.ª R tal teria então sucedido, o que não ficou provado, no âmbito de uma comissão – aplicando-se o disposto no art. 183/3 do CMVM. Sendo que a ter o 3.º R agido com abuso de poderes face à A sempre seriam serão ineficazes os actos do 3.º R junto da A no âmbito da relação contratual versada.”


Relação


“(…) resulta que aquela [Autora] contabilizava em nome dos RR. várias operações com saldos diversos, ora devedores, ora credores, violando regras de procedimento.


(…) apurou-se o lançamento de diversas operações contabilísticas que a apelante levou a cabo, inscrevendo, em conta corrente dos 4º a 6º RR. e outros, débitos ou créditos, que todavia não se demonstrou corresponderem aos factos concretos que fundamentariam a pretendida condenação.


E no emaranhado de compras e vendas de obrigações aparecem, indistinta e confusamente, operações de bolsa dos dias 17, 18 e 19/2/92 e depois a 20 e 21/2, liquidações físicas a 25/2 e 6/3, sem que haja a apelante procedido à cabal diferenciação destes actos e respectivos pagamentos.


Deste modo, não se provou a existência de nexo causal entre os invocados prejuízos e as operações de bolsa concretamente efectuadas.”


Neste contexto, não se logrou demonstrar que a conduta dos Réus foi a responsável por desencadear os alegados prejuízos na esfera jurídica da Autora, uma vez que tais danos se revelam indiferentes ao processo causal impulsionado pelos Réus, que não aumentou nem condicionou essencialmente o risco de verificação do dano que se intenta ressarcir na esfera jurídica da Autora Recorrente.


3.6. Destaque-se que ao STJ compete apenas e só aplicar o direito aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido. Está vedado ao STJ, como regra, afastar-se desta regra de conhecimento e, portanto, a esta instância, não cabe corrigir ou superar o inconformismo das partes em face da materialidade consolidada e à qual subsume o regime jurídico aplicável (art. 682º, 1, 2, 1.ª parte, do CPC).


3.7. Assim sendo, é irrelevante e fica prejudicada a apreciação do abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”, tal como invocada pela Recorrente na Conclusão 67.ª, relativamente à defesa da Ré no que respeita à cessação de funções do Réu BB na sua relação com a 1.ª Ré.


Em conformidade, não merecem provimento as Conclusões da Recorrente, obstando à mudança do resultado do litígio.


Por fim.


3.8. Os Recorridos 1.º e 2º Réus (Conclusões aa) a cc)) e 3.º Réu (Conclusões 138.ª e 139.ª) pediram nas suas contra-alegações a condenação da Autora e Recorrente de revista em ligitância de má fé e decretamento de indemnização correspondente (5% do valor da acção no caso da pretensão do 3.º Réu).


A Autora Recorrente contestou, no exercício do contraditório.


Apreciemos, restritos à instância desencadeada em sede de revista.


O art. 542º do CPC determina:


«1 – Tendo litigado de má fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.


2 – Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:


a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;


b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;


c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;


d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.»


A litigância de má fé censurável – com dolo ou negligência grave – não se confunde com a discordância na interpretação e aplicação da lei aos factos, a diversidade de versões sobre certos factos ou a defesa convicta de uma posição jurídica, ainda que diversa daquela que a decisão judicial acolhe e ampara, sem lograr que ela se imponha nas diversas instâncias judicativas9


Assim visto.


Não se nos afigura que o Recorrente litigue junto do STJ, nomeadamente com a culpa qualificada que a lei exige, com violação grave dos deveres de cooperação, boa fé processual e correcção recíproca (arts. 7º, 1, 8º e 9º, 1, CPC) na sua relação com as partes e com o Tribunal: seja porque fosse de exigir sem qualquer dúvida conhecimento ou cognoscibilidade da falta do fundamento recursivo, tendo em conta a diligência exigível para a “pessoa média”, colocada nesta situação em concreto, quanto à pretensão deduzida em face da disciplina jurídica em causa (de acordo com a al. a) do art. 542º, 1, do CPC); seja porque tenha feito uma adulteração ostensiva e flagrante para enganar o tribunal no momento da decisão da causa (al. b) do art. 542º, 1, do CPC); seja porque fosse de entender que o recurso esteve apenas ao serviço da obtenção dos fins considerados ilegítimos na al. d) do art. 542º, 1, do CPC; seja porque tenha junto Parecer Jurídico a patrocinar a sua posição, com o conteúdo que nele se integra e possa ser alvo de crítica e rejeição.


É certo que a Recorrente não se conforma com as consequências jurídicas do acórdão recorrido e entendeu que ainda tinha ao seu dispor a revista como meio de acesso à jurisdição do STJ. Porém, aproveitar deste meio recursivo, de acordo com a sua visão dos factos e da disciplina legal que considera aplicável, não permite concluir por si só que foram violados os deveres processuais incompatíveis com uma actuação eivada da promoção de expedientes censuráveis e dilatórios, susceptível de desencadear a forte sanção punitiva que o CPC reserva para comportamentos abusivos em sede adjectivo-processual.


A Recorrente não infringiu com desconsideração manifesta e grosseira esses deveres, em aproveitamento da aparelhagem legal que considera ainda poder acudir à sua pretensão, ainda que tal compreensão não tenha manifestamente colhimento legal, com o que tem que se conformar.


Razão pela qual não logra proceder o pedido dos Recorridos que peticionaram e se absolve a Recorrente de tal pedido.


III) DECISÃO


Pelo exposto, julga-se improcedente a revista.


Custas da revista pela Recorrente, julgando-se improcedente, por não preenchimento dos requisitos legais, o pedido de aplicação da taxa sancionatória prevista pelo art. 531º do CPC.

Custas do incidente relativo à litigância de má fé a cargo dos Recorridos (1.º, 2.º e 3.º Réus) que lhe deram causa, em partes iguais, que se fixa em taxa de justiça correspondente a 1,5 UC.

STJ/Lisboa, 17 de Outubro de 2023


Ricardo Costa (Relator)


António Barateiro Martins


Luís Espírito Santo


SUMÁRIO DO RELATOR (art. 663º, 7, 679º, CPC).


______________________________________________________

1. No actual CVM, aprovado pelo DL 486/99, de 13 de Novembro, este regime está absorvido, em termos gerais, no art. 282º, que finaliza a disciplina da “liquidação de operações” no mercado regulamentado ou em «sistemas de negociação multilateral ou organizado»: «Salvo caso de força maior, cada um dos participantes responde pelos danos causados pelo incumprimento das suas obrigações, incluindo o custo dos procedimentos de substituição».↩︎

2. V., também para as transcrições, RUI DE ALARCÃO, Direito das obrigações, Texto elaborado por Sousa Ribeiro / J. Sinde Monteiro / Almeno de Sá / J. C Proença, FDUC, Coimbra, 1983, págs. 281-283, ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, Volume I, 10.ª ed., 2000 (reimp. 2005), págs. 887 e ss, 899-901, ALMEIDA COSTA, Direito das obrigações, 12.ª ed., Almedina, Coimbra, 2009, págs. 763-764.↩︎

3. RUI DE ALARCÃO, Direito das obrigações cit., págs. 284-285; v. ainda ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, Vol. I cit., págs. 892-893.

Desenvolvidamente, FRANCISCO PEREIRA COELHO, O problema da causa virtual na responsabilidade civil, Almedina, Coimbra, 1998 (reimp. 1955), pág. 175: “o momento decisivo para a averiguação do nexo de causalidade (condicionalidade) entre o facto e o dano é, obviamente, o próprio momento em que o dano (real) se verifica. (…) É neste momento que deve ser proferido o juízo de adequação, pois aqui, como se sabe, supõe-se o efeito ainda não verificado e pergunta-se se a acção era capaz, segundo a sua natureza geral, de produzir um efeito danoso daquele género; é claro, porém, que se se trata de apurar a condicionalidade da acção para o efeito realmente verificado, o juízo de condicionalidade não pode ser proferido em momento anterior àquele em que o efeito danoso real se verifica. Mas também não deve ser proferido em momento posterior, pois o processo causal efectivo, como alguma coisa que aconteceu e atingiu, com a produção efectiva do efeito danoso, o seu termo, não pode, evidentemente, ser influenciado por circunstâncias futuras, quaisquer que sejam, hipotéticas ou mesmo reais. (…) não se compreende que o momento em que se julga sobre a relação de condicionalidade entre o facto e o dano real seja retardado para além do momento da verificação do dano, pois o dano real é uma entidade fixa e não se concebe como é que aquela relação de condicionalidade possa ser influenciada por factos posteriores.”↩︎

4. V. ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, Vol. I cit., págs. 896-897.↩︎

5. Tal como sustentado no estudo referencial, ainda antes do CCiv. de 1966, de FRANCISCO PEREIRA COELHO, “O nexo de causalidade na responsabilidade civil”, BFDUC, 1951, págs. 215-217.↩︎

6. Para o diálogo entre a “probabilidade” e a “previsibilidade” da situação concreta do sujeito e das suas circunstâncias no nexo da causalidade, v. PEREIRA COELHO, “O nexo de causalidade na responsabilidade civil”, loc. cit., págs. 218 e ss, CARNEIRO DA FRADA, Teoria da confiança e responsabilidade civil, Almedina, Coimbra, 2004, págs. 318 e ss, NUNO PINTO OLIVEIRA, Princípios de direito dos contratos, Coimbra Editora, Coimbra, 2011, págs. 664 e ss.↩︎

7. Em sede do “nexo de imputação objectiva”, v. MAFALDA MIRANDA BARBOSA, Lições de responsabilidade civil, Principia, Cascais, 2017, págs. 269-270.↩︎

8. MAFALDA MIRANDA BARBOSA, “Algumas considerações acerca da causalidade e da imputação objectiva ao nível da responsabilidade médica", Direito da Saúde – Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Guilherme de Oliveira, Volume 2, Profissionais de saúde e pacientes. Responsabilidades, Almedina, Coimbra, 2016, pág. 68 (sublinhado nosso); “Novas perspetivas em torno da causalidade na responsabilidade médica”, Cadernos do CEJ, 2017, n.º 1, págs. 12, 36-37, 38-39 (“O julgador só deve recusar a imputação quando haja prova da efetiva causa do dano ou quando haja prova da elevada probabilidade de que a lesão se teria realizado mesmo sem o desvio na conduta.”); “Responsabilidade civil médica e nexo de causalidade. Tópicos de compreensão de um problema clássico do direito delitual”, Saúde, novas tecnologias e responsabilidades – Nos 30 anos do Centro de Direito Biomédico, Cadernos Lex Medicinae, Vol. II, Instituto Jurídico da FDUC, Coimbra, 2019, págs. 361-363. Para considerações mais desenvolvidas e delimitação de tal “nexo de imputação objectiva”, v. Lições de responsabilidade civil cit., págs. 255 e ss, em esp. 265-274, e 426-427.↩︎

9. ABRANTES GERALDES/PAULO PIMENTA/LUÍS PIRES DE SOUSA, “Artigo 542º”, Código de Processo Civil anotado, Vol. I, Parte geral e processo de declaração. Artigos 1.º a 702.º, Almedina, Coimbra,2018, pág. 593.↩︎