Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06A3369
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MOREIRA ALVES
Descritores: VENDA JUDICIAL
INEFICÁCIA
ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
CASO JULGADO
TERCEIRO
PENHORA
REGISTO
CANCELAMENTO DE INSCRIÇÃO
Nº do Documento: SJ20061114033691
Data do Acordão: 11/14/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário :
I - Tendo na acção executiva sido lavrado protesto pela reivindicação intentada contra o ora exequente, do qual o adquirente na subsequente venda judicial teve pleno conhecimento, e tendo na acção de reivindicação sido proferida sentença a reconhecer os reivindicantes como os legítimos
proprietários dos lotes em questão, e portanto que esses lotes, à data da penhora, já não pertenciam à executada, ordenando-se o levantamento das penhoras e cancelamento dos respectivos registo, é de concluir que a venda judicial fica sem efeito, como resulta do disposto no art. 909.º, n.º 1, al. d), do CPC, na redacção anterior à reforma de 1995, que é a aqui aplicável (seria idêntica a solução face à actual redacção do preceito).
II - A não intervenção do arrematante na acção de reivindicação não impede que a decisão de procedência aí proferida produza efeitos contra ele, já que tal sentença constitui caso julgado contra o comprador.
III - Não é o facto de o adquirente ter logrado registar a aquisição judicial a seu favor que terá a virtualidade de alterar a solução, tanto mais que o adquirente, conhecedor do protesto e da procedência da acção reivindicatória, ao proceder ao registo, agiu de má fé.
IV - Declarada ineficaz a venda executiva, não pode subsistir o registo da aquisição a favor do comprador, que deve ser tido sem efeito, ordenando-se o cancelamento da respectiva inscrição.
Decisão Texto Integral:
Acordão no Supremo Tribunal de Justiça



Relatório


Neste processo de execução para julgamento de quantia certa, instaurado em 8/7/93, em que é exequente,
AA – gabinete de Estudos Técnicos, S.A.,
e executada
BB – Empreendimentos Turísticos S.A..,
foram penhorados diversos imóveis, entre os quais (únicos que aqui interessa considerar) o Lote de terreno para construção urbana nº00 e o Lote nº 00, situados em ..., freguesia de Vau, Óbidos, o 1º descrito sob o nº 00122/290487 e o 2º sob o nº 00126/290487, na Conservatória do Reg. Pred. de Óbidos.
Em 18/3/98 (antes da venda judicial), CC e marido DD, vieram à execução lavrar protesto pela reivindicação dos referidos prédios, em virtude de terem proposto acção ordinária, nos termos do Art.º 910 do C.P.C. contra a exequente, a fim de provarem que os lotes penhorados lhe pertencem em exclusivo, devendo, em consequência ser-lhes restituídos.
Entretanto e após diversas e complicadas vicissitudes, os referidos lotes acabaram por serem vendidos (venda judicial na modalidade de propostas em carta fechada) a EE, tendo a venda sido precedida da legal publicidade, incluindo a informação do aludido protesto e da pendência da acção de reivindicação.

Depositado o respectivo preço, por despacho de fls. 296, foi ordenado o cancelamento das inscrições registrais nos termos do Art.º 888 do C.P.C. e 824 nº2 e 3 do C.C. e ordenada a passagem da respectiva certidão, após trânsito.
No mesmo despacho, adjudicaram-se os lotes em causa ao arrematante/comprador, EE (fls. 296).

Da parte deste despacho que ordenou o cancelamento das inscrições, foi inerposto recurso de agravo pelos autores do acima referido Protesto, (fls. 301 e sg.), que foi admitido (fls. 456).
Posteriormente foi emitida certidão do despacho que ordenou o cancelamento das inscrições registrais, despacho que veio, depois, a ser declarado nulo (despacho de fls. 405 e sgs.).
A fls. 609 e seg. e 641 e seg. os mencionados CC e marido DD vieram aos autos dar notícia de que obtiveram vencimento (com trânsito em julgado) na acção de reivindicação acima referida, que assim os reconheceu como os únicos proprietários dos prédios em causa, requerendo em consequência, que no processo executivo se declare nula a venda executiva que incidiu sobre os lotes em lide.

Sobre o assim requerido, recaiu o despacho de fls. 811/819, que decidiu... “Assim, face a todo o exposto, e ao abrigo do disposto no .......... 909 nº1 d) do C.P.C. declaro a ineficácia da venda judicial dos lotes de terreno descritos na Conservatória do Registo Predial de Óbidos sob os nº 00122 e 00126 da Freguesia de Vau.

No mesmo despacho declarou-se, sem reacção, a inutilidade do agravo acima referido (que, por isso, não foi apreciado).

Mas, desse despacho e no que se refere à declaração da ineficácia das ditas vendas, veio agravar a exequente AA, recurso que veio a ser admitido (fls. 825, 830 e 876).

Também as reivindicantes CC e marido recorreram desse despacho, em ........... subordinadamente (fls. 860 e 876).

Posteriormente, por requerimento de fls. 833/834, vieram aqueles CC e marido, requerer que o Tribunal ordene o cancelamento da inscrição G2 – registo da aquisição a favor do comprador EE da venda judicial dos lotes em questão, venda essa que o Tribunal de execução já declarara ineficaz.
Por despacho de fls. 838, foi indeferida tal pretensão.

Desse despacho de indeferimento recorreram os interessados CC e marido, recurso que foi admitido como de agravo (fls. 845 e 876).

Temos, portanto 3 agravos (sendo um subordinado) que a Relação apreciou, tendo decidido pela improcedência do agravo da exequente AA e do agravo subordinado a este.
Julgou, porém, procedente o agravo de fls. 838, intentado do despacho de fls. 833/834, acima referido e consequentemente, revogou esse despacho, tendo em sua substituição decidido “ declarar que fica sem efeito o registo de aquisição a favor do comprador EE, da venda judicial dos lotes de terreno descritos na Conservatória do Registo Predial de Óbidos, sob os números 00122 e 00126 da freguesia de vau, ordenando, consequentemente, o cancelamento da inscrição G2 incidente sobre as descrições, números 00122 e 00126 da freguesia de Vau (registo da aquisição a favor do comprador EE, da venda judicial dos lotes de terreno descritos na Conservatória do Registo Predial de Óbidos, sob os números 00122 e 00126 da freguesia de Vau).
É deste douto acórdão, que inconformada veio a exequente agravar, agora para este S.T.J., na parte em que negou provimento ao agravo por si intentado do despacho que declarou a ineficácia da aludida venda judicial e na parte em que concedeu provimento ao agrave dos interessados CC e marido e em consequência declarou sem efeito o registo de aquisição a favor do comprador EE e ordemou, consequentemente o respectivo cancelamento.

Conclusão

Apresentadas tempestivas alegações, formulou a recorrente as seguintes conclusões:
Conclusão do Recurso
1°.
Nesta acção executiva em que são partes principais a ora agravante e a executadá BB - Empreendimentos Turísticos, S.A., foram penhorados em 1992 dois lotes de terreno descritos na Conservatória do Registo Predial de Óbidos, sob os nOs. 00122 e 00126 da Freguesia do Vau.
Em 1993 os interessados CC e marido deduziram embargos de terceiro para levantamento dos arrestos que foram julgados improcedentes e posteriormente intentaram no Tribunal Judicial da Comarca de Caldas da Rainha contra a exequente, ora agravante, acção de reivindicação de propriedade relativa aos dois lotes de terreno, por os terem comprado, através de escritura pública de compra e venda datada de 11.09.1987, à executada BB - Empreendimentos Turísticos, S.A., mas não efectuaram o respectivo registo de aquisição a seu favor na Conservatória do Registo Predial de Óbidos.
Na pendência desta acção de reivindicação, foram, em 2001, os dois lotes de terreno adjudicados a um terceiro, através de venda judicial nesta execução, tendo sido registada, definitivamente, na Conservatória do Registo Predial de Óbidos ta] aquisição e cancelados todos os restantes registos que então incidiam sobre os imóveis, em conformidade com o disposto no art.º 824°., n°, 2 do Código Civil.
4°.
À data em que os dois lotes de terreno foram vendidos e adjudicados neste processo executivo ainda não tinha sido proferida qualquer decisão - Sentença ou Acórdão - pelas instâncias e pelo Supremo Tribunal de Justiça, na acção de reivindicação de propriedade intentada pelos interessados CC e marido.
5°.
Os interessados CC e marido obtiveram vencimento na acção de reivindicação proposta contra a ora agravante, tendo sido decidido e reconhecido o seu direito de propriedade, apenas quanto ao fundamento relativo à aquisição derivada do contrato de compra e venda titulado pela escritura de 11 .09.1987.
6°.
Os interessados CC e marido não Impugnaram o despacho de adjudicação proferido nestes autos a favor de um terceiro comprador.
7°.
A questão em apreciação é, pois, a de apurar quais os efeitos da decisão proferida nos autos de acção de reivindicação proposta pelos interessados CC e marido, relativamente aos dois lotes de terreno objecto de venda judicial nesta execução.
8°.
As Instâncias decidiram declarar a ineficácia da venda judicial dos dois lotes de terreno, por entenderem que o confronto de posições jurídicas dá-se entre os adquirentes do direito de propriedade sem registo - os interessados CC e marido - e a exequente, ora agravante, com registo de penhora e não de aquisição.
Porém, não é esta a situação espelhada nos autos e no registo e no registo predial, porquanto:
9°.
O registo de penhora a favor da ora agravante foi cancelado no seguimento da venda e adjudicação judicial a um terceiro comprador, assim como foram cancelados todos os restantes registos.
Este terceiro comprador, não sendo parte principal nesta acção executiva é também interessado na decisão proferida, atento o disposto no art°. 680°., n°. 2 do C.P. Civil e em igualdade de circunstâncias com os interessados CC e marido.
10º
Até ao cancelamento. dos registos que incidiam sobre os dois imóveis, em cumprimento do disposto no art°. 824°. n°. 2 do C. Civil, a inscrição da aquisição (G-1) a favor dos interessados CCe marido é ineficaz em relação à exequente, a recorrente, uma vez que o seu registo foi efectuado depois do registo de penhora, atento o disposto no art°. 819°. do C. Civil.
Não podem, pois, ser cancelados registos que já nâo têm existência legal.
11°.
O confronto de posições jurídicas dá-se, pois, entre os adquirentes do direito de propriedade, sem registo - os interessados CC e marido e o comprador com registo de aquisição inscrito,. feito através de uma venda em execução.
12°.
Porque a venda foi feita aos interessados CC e marido não foi inscrito nos registos, o conflito com a aquisição posterior, através de venda e adjudicação nesta execução, feita ao interessado comprador, deve ser resolvido a favor da venda executiva: em conformidade com o Acórdão do SIJ, publicado na CJ, Ano VII TomoII - 1999, fls. 164 a 168, de 07 de Julho de 1999, uma vez as duas vendas têm o mesmo transmitente e quer os interessados CCe marido quer o comprador na venda executiva, são terceiros para efeitos do art°. 5°., n°, 4 do Código do Registo Predial, por ambas serem aquisições derivadas.
13°.
Deve, pois, concluir-se que da decisão relativa à propriedade dos dois lotes de terreno, proferida na acção de reivindicação não resulta a ineficácia da venda judicial, devendo esta ser mantida e considerada válida e eficaz, assim como deve ser mantido o registo de aquisição a favor do comprador na venda judicial.
14°.
As Instâncias ao decidirem declarar a ineficácia da venda judicial dos dois lotes de terreno e declarado sem efeito o registo de aquisição a favor do comprador em venda judicial EE dos dois lotes de terreno, ordenando, consequentemente o cancelamento da inscrição G-2 incidente sobre as descrições nºs. 00122 e 00126 da Freguesia do Vau - Óbidos, erraram na aplicação do disposto nos art°s. 819°., 824°., nº2 do Código Civil, 888°. do C. P. Civil e 5°., n°. 4 do Código do Registo Predial, pelo que deve ser dado provimento ao presente agravo e revogar-se o douto Acórdão recorrido, com todas as legais consequências.
Assim confiadamente se espera ver julgado corno é de
JUSTIÇA

Contra-alegaram os recorridos, suscitando a questão prévia da não admissibilidade do recurso.


OS FACTOS

Para além do processado resumido no antecedente relatório, a matéria de facto a considerar é a seguinte:

Em 18.03.1998, os interessados apresentaram o protesto a que alude o disposto no art.º 910º do C.P.C. e cujo termo se encontra a fls. 71 dos autos: onde fizeram constar que haviam proposto a acção ordinária 129/97 a correr termos no Tribunal de Circulo de Caldas da Rainha, mediante a qual pretendiam provar e ver julgado que os bens descritos no auto de arresto) an. 1283 e 1284 urbanos da freguesia do Vau, concelho de Obidos) são sua propriedade exclusiva) .devendo-lhes ser restituídos..
Tal protesto ficou consignado quer nos editais afixados) cuja cópia se encontra a fls. 267 e 268, quer nos anúncios que publicitaram a venda) conforme fls. 273.
Em 23.01.2001) procedeu-se à diligência de abertura de propostas relativas aos urbanos mencionados no ponto anterior tendo-se aceite a subscrita por EE) pelo valor de 2 500 000$00 para cada prédio) tudo conforme consta do auto de fls. 280.
Por despacho de fls. 296) datado de 28.03.2001: foi ordenado o cancelamento das inscrições registrais que então incidiam sobre os prédios em questão e foram adjudicados a EE esses imóveis.
Afls.302 foi interposto recurso do despacho a que se alude no ponto anterior, no que concerne à parte que ordenou o cancelamento das inscrições
Encontra-se junto aos autos; a fls. 646 cópia certificada da sentença proferida na acção de processo ordinário no 207/1999 do 2° Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha, em que são A.A. CC e Ré AA - Gabinete de Estudos Técnicos) S.A.) na qual se condenou a ré a reconhecer que os A.A. são os únicos proprietários dos artigos urbanos 1283 3 1284 da freguesia do Vau, concelho de Óbidos, por os ter adquirido por compra datada de 11.09.1987 e ainda por os ter adquirido por usucapião, bem como a abster-se de qualquer acto que perturbe a passe e direito de propriedade dos mencionados artigos urbanos; ordenando-se o levantamento das penhoras e o cancelamento dos respectivos registos.
Encontra-se junto aos autos a fls. 662 o Ac. de TRL. de 26.11.2002, proferido no âmbito do recurso interposto da sentença a que se refere a ponta anterior; no qual se decidiu julgar improcedente a apelação e; em consequência, confirmar a sentença recorrida, mas no que respeita ao reconhecimento ao direito de propriedade dos A.A. apenas quanto ao fundamento relativo à aquisição derivada do contrato de compra e venda titulado pela escritura de 11.9.1987.
Encontra-se junto aos autos, a fls. 677, o Ac. do STJ de 12.06.2003, proferido no âmbito do recurso interposto do aresto mencionado no ponta anterior, no qual se decidiu negar provimento ao agravo e à revista.
Fundamentação.


Questão Prévia.

Como se vê das alegações o objecto do agravo abrange quer a decisão da Relação que confirmou o despacho que declarou a ineficácia da venda judicial em lide (e portanto negou provimento ao agravo interposto pela ora recorrente), quer a decisão que, no provimento do agravo dos ora recorridos, declarou ficar sem efeito o registo de aquisição da venda judicial dos lotes em causa a favor do adquirente EE .
Ora, entendem os ora recorridos que o 1º segmento do agravo não é susceptível de recurso para o S.T.J. face ao disposto no Art.º 754º nº2 e 3 do C.P.C., e quanto ao 2º segmento, não tem a recorrente legitimidade para impugnar a decisão da Relação por não ser ela a prejudicada.
Tal legitimidade pertenceria, apenas, ao arrematante/ comprador.


Acontece que não lhe assiste razão.
Por isso, no despacho prévio do relator se disse, nada obstar ao conhecimento do objecto do recurso, remetendo para o acórdão a melhor justificação dessa decisão.
É certo que, face à redacção do Art.º 754 do C.P.C. introduzido pela reforma de 95 ( D.L. 329-A/95 de 12/12) ............. como perante a actual, conferida pelo D.L. 375-A/99 de 20/9, não seria, de facto, admissível o agravo continuado ora em apreço (em relação a qualquer dos segmentos referidos pelos recorridos) visto não se verificarem quaisquer das situações excepcionais previstas no nº 2 e 3 do preceito (o acórdão recorrido não tem qualquer voto de vencido, não existe oposição de acórdãos e a decisão limitou-se a decidir um incidente processual, sem autonomia, no âmbito da execução, sem pôr termo ao processo executivo que poderá prosseguir com a eventual penhora de outros bens. Também não ocorre qualquer das situações a que se referem os nº2 e 3 do Art.º 678 do C.P.C.).
porém a redacção do nº2 do preceito emergente do D.L. 329-A/95 não tem aplicação aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, como determina o Art.º 25 nº1 do citado diploma, assim como a actual redacção se aplica apenas aos processos novos e não aos pendentes (Art.º 8 nº1 do D.L. 375-A/99), daí que, tendo a presente execução sido instaurada em 1993 lhe seja aplicável a redacção do preceito a essa data em vigor. Ora, face a essa redacção, atento o valor processual, era admissível o recurso de agravo continuado para o S.T.J.
Mas, sendo admissível o agravo continuado, como é, e tendo a recorrente manifesta legitimidade para recorrer da decisão que negou provimento ao seu próprio agravo (1º segmento do presente agravo), não pode deixar de ter legitimidade quanto à decisão que deu provimento ao agravo dos ora recorridos (2º segmento), visto que as matérias a que se referem os 2 agravos se encontram de tal modo ligados entre si, que não faria sentido admitir que o ora recorrente pudesse reagir quanto à decisão do 1º e o não pudesse fazer em relação à decisão do 2º.
A ser assim, poderia verificar-se a situação contraditória e absurda de vir a ser revogada a decisão que julgou ineficaz a venda judicial, considerando-a, então válida e operante, mantendo-se, todavia, a decisão que deu sem efeito o registo da aquisição e mandou cancelar a respectiva inscrição registral pois, em relação a esta decisão a exequente/agravante não teria legitimidade para recorrer).
É óbvio que a exequente tem manifesto interesse em impugnar qualquer das aludidas decisões dado a ligação lógica entre as matérias a que elas dizem respeito (a questão da subsistência do registo de aquisição é consequência lógica do que se decidir sobre a ineficácia da venda judicial).

Quanto ao mérito do agravo.

Como se sabe, foi proferida decisão em acção ordinária de reivindicação, proposta pelos aqui recorridos contra a aqui recorrente (antes da venda judicial e na sequência de protesto pela reivindicação), que reconhece os recorridos como os únicos proprietários dos lotes em causa, por os terem adquirido por compra (escritura de 11/9/1987) e, em consequência, ordenou o levantamento dos penhores e o cancelamento dos respectivos registos.
Tal decisão transitou em julgado.
Porém, por um lado, os recorridos não dispõem de registo anterior ao registo dos penhores e por outro, os lotes foram vendidos na execução e adjudicados ao comprador antes da decisão na mencionada acção de reivindicação, encontrando-se registada a aquisição emergente da venda judicial em nome do adquirente, registo efectuado antes do registo dos recorridos.
Portanto a questão colocada no recurso é a de saber se a decisão proferida na acção de reivindicação podia ou não ter determinado a ineficácia da venda judicial, entendendo a recorrente que não podia, daí que, na sua opinião, tal venda permanece plemanente válida e eficaz, não podendo a decisão proferida na acção de reivindicação ser oposta, quer à exequente, quer ao adquirente.

Ora, as questões suscitadas foram tratadas com todo o promenor e boa fundamentação pelo acórdão recorrida.
Assim, uma vez que se concorda inteiramente, quer com essa fundamentação quer com a respectiva decisão, não vamos repetir a argumentação exposta no acórdão, para o qual se remete nos termos do Art.º 713 nº5 do C.P.C.

Salienta-se, no entanto, que as questões suscitadas no recurso se encontram mal equacionados porquanto o recorrente não considera um facto essencial demonstrado nos autos e que, só por si, atento o quadro factual em presença, condiciona a solução a dar ao caso concreto.
É que, como resultou provado, antes da venda judicial os recorridos lavraram protesto pela reivindicação dos lotes penhorados e intentaram a competente acção de reivindicação contra o exequente, nela obtendo vencimento, isto é, o reconhecimento de que são os únicos proprietários dos lotes em causa.
Ora, era contra a exequente que a acção de reivindicação tinha de ser intentada no caso concreto, pois foi ela que arrestou os prédios e requereu posteriormente a conversão do arresto em penhora, o que equivale à nomeação à penhora daqueles prédios. É que tal conduta da exequente implica a afirmação de que os bens pertenccem à executada.
Portanto como ensina Alberto dos Reis (Proc. Ex. – II – 465)...” O litígio vem, afinal travar-se entre o exequente, que atribui ao executado a propriedade dos bens e o reivindicante, que se propõe demonstrar ser ele o proprietário.
Aliás, a acção não podia ser intentado contra o adquirente, pois é anterior à venda judicial.
Porém, a não intervenção do adquirente não impede que a decisão de procedência proferida na acção de reivindicação produza efeitos contra ele, já que, como ensina o citado mestre a sentença proferida a favor do reivindicante na acção proposta contra o exequente constitui caso julgado contra o comprador (ob. cit).
Assim, tendo sido lavrado protesto pela reivindicação, do qual o arrematante teve pleno conhecimento, e tudo na acção de reivindicação sido proferida sentença a reconhecer os reivindicantes como os legítimos proprietários dos lotes em questão e portanto, que esses lotes, à data da penhora já não pertenciam à executada, é claro que a venda judicial fica sem efeito como resulta directa e expressamente do disposto no Art.º 909 do C.P.C., na redacção anterior à reforma de 95, que é aqui aplicável (de resto seria idêntica a solução face à actual redacção do preceito).

E não será o facto de o adquirente ter logrado registar a aquisição judicial a seu favor que terá a virtualidade de alterar a solução, tanto mais que o adquirente, conhecedor do protesto e da pendência da acção reivindicatória ao proceder ao registo agiu de má-fé (dado o referido conhecimento prévio da situação controvertida dos prédios).
A questão é, pois, muito diversa da que foi tratada no Ac. do S.T.J. de 7/7/99 referido pela agravante, como bem se explica no acórdão recorrido. Aí não se colocava qualquer questão relacionada com a eficácia de venda executiva, como acontece no caso concreto.
Sendo a acção de reivindicação sido contra o exequente, antes da venda e tendo ocorrido protesto pela reivindicação, parece claro que a eficácia da venda judicial ficou, à partida, condicionada pela sorte da acção de reivindicação.
Por outro lado deve notar-se que, quer o protesto, quer a acção, não suspendem a acção executiva, que, por isso, apesar deles, continua a ser normalmente processada.
Deste modo, chegado a fase da venda dos bens penhorados, essa venda terá de realizar-se normalmente, nada impedindo que o adquirente de bens imóveis diligencie pelo respectivo registo da aquisição, apesar de não haver ainda decisão na acção de reivindicação em curso.
Certo é, ..........., que a aquisição da propriedade do bem vendido na execução fica dependente da sorte da acção de reivindicação por força do regime estabelecido para “protesto pela reivindicação, sob pena de tal protesto não produzir qualquer resultado útil.
Na verdade a ser como pretende a recorrente o disposto no Art.º 909º do C.P.C. ficaria esvaziado de sentido, defraudando-se assim a lei.
Por conseguinte decidido com trânsito em julgado que os lotes são propriedade dos recorridos, que, oportunamente protestaram, no processo executivo, pela reivindicação deles, e ordenado o levantamento das penhoras e o cancelamento dos respectivos registos, a solução é declarar a ineficácia da venda como resulta directamente da lei.
E, cancelada a penhora e respectivos registos e declarada ineficaz a venda executiva é também claro que não pode subsistir o registo da aquisição a favor do comprador, que deve ser tido sem efeito, ordenando-se o cancelamento da respectiva inscrição matricial como se decidiu, fundamentalmente no acórdão recorrido.

Improcedem assim as conclusões do agravo.

Decisão

Termos em que acordam neste S.T.J. em negar provimento ao agravo, e consequentemente em confirmar o acórdão recorrido.

Custas pela agravante.

Lisboa, 14/11/2006

Moreira Alves (relator)
Alves Velho
Camilo Moreira Camilo