Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4221/06.4TBALM.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: MOREIRA CAMILO
Descritores: CONVERSÃO DO NEGÓCIO
Data do Acordão: 01/27/2010
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: CJASTJ, ANO XVIII, TOMO I/2010, P. 41
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
1ª – A conversão de um negócio nulo ou anulado em negócio válido, nos termos do artigo 293º do CC, está dependente não só da verificação no negócio inválido dos requisitos de forma e de substância necessários para a validação do negócio sucedâneo, como também da alegação de factos que permitam ao julgador concluir pela verificação da vontade hipotética das partes, a qual deve ser aferida segundo a boa fé e os demais elementos atendíveis, por referência às circunstâncias temporais da celebração do contrato.

2ª – A alegação de tal factualidade tem de ocorrer na própria acção onde o julgador, perante a inevitável declaração da nulidade do negócio, por vício existente, poderá concluir que as partes quiseram firmar um outro negócio, decretando, se for caso disso, a competente conversão.

3ª – Não tendo sido alegada tal factualidade e não tendo sido requerida a conversão – a qual não é do conhecimento oficioso do tribunal –, opera o princípio da preclusão.

4ª – Assim, tendo sido proferida decisão, com trânsito em julgado, a declarar nulo o contrato-promessa celebrado pelos aqui Autor e Réus (onde até se ordenou a repetição do julgamento, com ampliação da matéria de facto, visando apenas apurar o que cada uma das partes deveria devolver à outra, por força da aludida declaração de nulidade e nos termos do artigo 289º do CC), não pode agora o Autor pretender, em nova acção, que se declare a conversão do negócio, alegando factualidade que deveria ter vertido na acção anterior e invocando que tem 20 anos – prazo ordinário de prescrição – para, após a declaração de nulidade, pedir a conversão do negócio.
Decisão Texto Integral:


I – No Tribunal Judicial da Comarca de Almada, AA, em acção com processo ordinário, intentada contra BB e mulher CC (com o falecimento desta, foram habilitados, como seus sucessores, o referido BB e CC, filho daquela), pediu que, com a procedência da acção, se decida decretar a conversão do contrato-promessa nulo em promessa unilateral de venda ao Autor das três lojas identificadas na petição inicial e, em consequência, sejam os Réus condenados na outorga da respectiva escritura pública de compra e venda, translativa da propriedade das referidas três lojas para a esfera jurídica do Autor, pagando este o remanescente do preço acordado, devendo ainda ser fixado um prazo para a celebração da escritura pública mencionada.

Na sua contestação, os Réus defenderam-se por excepção, invocando a ineptidão da petição inicial, a violação de caso julgado e litispendência e a ilegitimidade da Ré, e por impugnação, pedindo a sua absolvição da instância ou, assim não se entendendo, a improcedência da acção.

Houve réplica.

Foi proferido despacho saneador, onde se decidiu julgar improcedente a invocada nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial, bem como a arguida excepção dilatória de ilegitimidade da Ré, tendo-se julgado verificada a excepção dilatória de caso julgado, invocada pelos Réus, com a sua consequente absolvição da instância.

Após recurso do Autor, foi, no Tribunal da Relação de Lisboa, proferido acórdão, segundo o qual se negou provimento ao recurso, confirmando-se integralmente o saneador-sentença recorrido.

Ainda inconformado, veio o Autor interpor recurso de tal acórdão, o qual foi admitido.

O recorrente apresentou alegações e respectivas conclusões, pedindo que se profira acórdão que determine a remessa dos autos à 1ª instância, para que prossigam os seus ulteriores termos.

Contra-alegaram os recorridos, defendendo a confirmação do acórdão impugnado.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – No acórdão recorrido, e com interesse para o julgamento do mérito do recurso, foi considerada a seguinte factualidade:
1. Por sentença proferida em 7 de Agosto de 1999, na acção declarativa de condenação intentada pelo aqui recorrente contra os aqui recorridos, que correu termos pelo 1º Juízo Cível de Almada, sob o nº 171/95, o tribunal de 1ª instância declarou nulo o contrato-promessa de compra e venda havido entre o Autor e os Réus, tendo por objecto três lojas, e absolveu os Réus dos pedidos.
2. Em sede de recurso de apelação, e por acórdão de 13 de Março de 2001, a Relação de Lisboa veio a confirmar a sentença, no que tange à declaração da nulidade do invocado contrato-promessa, mas ordenou a repetição do julgamento, para ampliação da matéria de facto, com vista a apurar-se o que cada uma das partes deveria devolver à outra, por força da declaração da aludida nulidade e nos termos do artigo 289º do Código Civil.
3. Interposto recurso de revista de tal acórdão, o STJ, por acórdão de 23 de Outubro de 2001, veio a confirmar a decisão que declarou a nulidade do ajuizado contrato-promessa, embora com fundamentação diversa da adoptada pela Relação.
4. Na presente acção, intentada em 12 de Julho de 2006, o Autor, ora recorrente, pede, a título principal, que seja proferida sentença, tendente a decretar a conversão do contrato-promessa nulo havido entre o Autor e os Réus em promessa unilateral de venda ao Autor das três lojas em questão, e, em consequência, sejam os Réus condenados na outorga da respectiva escritura pública de compra e venda, translativa da propriedade das referidas três lojas para a esfera jurídica do Autor, pagando este o remanescente do preço acordado, devendo ainda ser judicialmente fixado um prazo para a celebração da mencionada escritura pública.

III – 1. Para fundamentar o seu pedido de revogação do acórdão recorrido, o recorrente alega, no essencial, que não há caso julgado, pois os pedidos e as causas de pedir das duas acções que propôs são diferentes, que a presente demanda é causa prejudicial da outra que havia intentado, onde se declarou a nulidade do contrato-promessa, que não era obrigado a pedir a conversão do negócio nulo noutro negócio na outra acção, pois que dispõe do prazo de 20 anos (prazo de prescrição) para requerer tal conversão em tempo e na sede própria.

2. No tocante à invocada falta de identidade de pedidos, pode ler-se no acórdão recorrido:
“No caso sub judice, a pretensão formulada a título principal pelo ora Autor/Apelante em ambas as acções é, substancialmente, a mesma: a execução específica do Contrato-Promessa de Compra e Venda alegadamente concluído entre as partes, tendo por objecto três lojas sitas na Rua Soeiro Pereira Gomes, nº ..., A e B, Marisol, Charneca da Caparica.
Irreleva, para este efeito, que, na presente acção, o Autor peticione também que se decrete a conversão do contrato-promessa bilateral nulo em promessa unilateral de venda ao Autor das três lojas supra identificadas. Summo rigore, não se está aqui sequer perante um verdadeiro pedido autónomo, a se: o que ocorre é tão só que o Autor, pretendendo a execução específica dum contrato-promessa bilateral de compra e venda, mas antevendo que o tribunal possa reconhecer oficiosamente a nulidade formal de tal negócio (decorrente do facto de o documento particular, em que ficaram reduzidas a escrito as declarações de vontade de ambas as partes, se não mostrar subscrito por um dos contraentes: cfr. o Assento do STJ de 29/11/1989 [publicado in Diário da República, 1ª Série, nº 46, de 23/2/1990 e também in BMJ nº 391, p. 101]), invoca a factualidade tendente a possibilitar a conversão de tal negócio (nos termos do art. 293º do Cód. Civil), de contrato-promessa bilateral nulo em promessa unilateral de venda, em ordem a obstar a que o tribunal, na sequência da declaração da nulidade do contrato-promessa bilateral de compra e venda cuja execução específica é pretendida pelo Autor/Apelante, se limite a condenar as partes a restituir uma à outra tudo quanto prestaram, nos termos do art. 289º-1 do Cód. Civil (como justamente ocorreu na acção nº 171/95 que correu termos pelo 1º Juízo Cível de ALMADA).
Sendo, portanto, o efeito jurídico pretendido pelo Autor/Apelante em ambas as acções substancialmente o mesmo, existe identidade de pedidos.”.

3. No tocante à alegada falta de identidade das causas de pedir, no acórdão recorrido, depois de se aludir a determinados normativos legais, a doutrina e a jurisprudência, incidentes sobre esta matéria, concluiu-se:
“À luz de quanto precede, logo se vê que, no caso dos autos, como o contrato-promessa de compra e venda cuja execução específica é pretendida pelo Autor/Apelante, em ambas as acções, é precisamente o mesmo e como, por outro lado, os factos concretos aduzidos para fundamentar o alegado incumprimento definitivo desse contrato, por parte dos promitentes-vendedores, ora Réus/Apelados, são rigorosamente os mesmos, em ambos os processos, existe identidade de causas de pedir numa e noutra acção, irrelevando que, em sede de enquadramento jurídico, o Autor/Apelante tenha qualificado de modo diverso o mesmo negócio jurídico (contrato-promessa bilateral válido, na Acção nº 171/95 que correu termos pelo 1º Juízo Cível de ALMADA, e promessa unilateral de venda, na presente acção).
Assim sendo, conclui-se que – contrariamente ao sustentado pelo Apelante – existe identidade de sujeitos, de pedidos e de causas de pedir entre a presente acção e a que, sob o nº 171/95, correu termos pelo 1º Juízo Cível de ALMADA.
Acresce que o caso julgado tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior (cit. artigo 497º do C.P.C.).
Ora, na hipótese em apreço, a decisão a proferir na presente acção – pressupondo que o contrato-promessa bilateral de compra e venda declarado nulo na acção nº 171/95 do 1º Juízo Cível de ALMADA ainda pode, afinal, ser salvo através do legal instituto da conversão, nos termos do art. 293º do Código Civil, convertendo-se num negócio sucedâneo válido (promessa unilateral de venda) – entraria, necessariamente, em contradição com a decisão anteriormente proferida na referida acção nº 171/95.
Efectivamente, decidido que está, definitivamente, que o contrato-promessa celebrado entre as partes é nulo, tal situação jurídica não pode mais ser alterada.
Uma vez decidido, por decisão já transitada em julgado proferida na mencionada acção nº 171/95 do 1º Juízo Cível de ALMADA, que o contrato-promessa em questão é nulo, tendo a respectiva declaração de nulidade os efeitos previstos no art. 289º do CC, isto é, obrigando as partes unicamente à restituição de todas as prestações efectuadas, como se o negócio não tivesse sido realizado – havendo aquela acção prosseguido tão somente para efeitos de ser apurada a medida da restituição devida por força da declaração de nulidade do contrato –, não pode a substituição do negócio já declarado nulo por outro, ao abrigo da conversão prevista no citado art. 293º do Cód. Civil, ser pedida, noutra acção diferente, intentada posteriormente ao trânsito em julgado daquela primeira acção.
É certo que a conversão pressupõe a declaração de nulidade, ou seja, a verificação de que o negócio não pode produzir os seus efeitos próprios (cit. art. 293º).
Todavia, como o pedido da conversão se situa no domínio da mesma relação jurídica já anteriormente considerada nula, com trânsito em julgado da respectiva decisão – o aludido contrato-promessa –, caso esse pedido seja exercido em acção autónoma, e não na acção em que teve lugar a declaração de nulidade do negócio (como deveria ter sido), a apreciação dum tal pedido redunda na reapreciação da eficácia do negócio anteriormente invocado (sem êxito) pelo autor.
Consequentemente, a decisão que, porventura, viesse a julgar procedente um tal pedido de conversão, formulado em acção autónoma, nunca poderia afectar a decisão, já antes transitada, que declarou nulo o mencionado contrato-promessa e que, por isso, haveria sempre de prevalecer sobre aquela (nos termos do art. 675º, nº 1, do CPC).
O que tudo nos conduz à conclusão de que a presente acção ofende a autoridade do caso julgado material formado na acção nº 171/95 do 1º Juízo Cível de ALMADA, quanto à nulidade do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre o Autor/Apelante e os Réus/Apelados e quanto às consequências jurídicas decorrentes dessa nulidade – obrigação de as partes restituírem todas as prestações efectuadas, como se o negócio não tivesse sido realizado (art. 289º, nº 1, do Código Civil).”.

4. Pretende o recorrente, através desta acção, obter a declaração de conversão de negócio, há muito declarado nulo, numa outra acção.

É por demais evidente que tal pretensão não pode proceder.

Segundo o artigo 293º do Código Civil, “O negócio nulo ou anulado pode converter-se num negócio de tipo ou conteúdo diferente, do qual contenha os requisitos essenciais de substância e de forma, quando o fim prosseguido pelas partes permita supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a invalidade”.

Sendo a nulidade de conhecimento oficioso (cfr. artigo 286º do Código Civil), por encontrar os seus fundamentos em razões de interesse público, já o interesse em causa na conversão de um negócio nulo ou anulado é de ordem particular, que é o daquele a quem a invalidade do negócio não interessa.
Logo, terão de ser os interessados na conversão a requerer e a pedir que o negócio nulo ou anulado produza outros efeitos.

A conversão opera para satisfazer a confiança das partes na protecção jurídica, tendo em vista as finalidades práticas visadas pelos interessados, pelo que não pode converter-se um negócio inválido contra a vontade e os interesses das partes.
Estamos, portanto, no domínio da disponibilidade das partes.

Assim, não sendo a conversão dos negócios de conhecimento oficioso, como efectivamente não é, a sua possibilidade fica sempre dependente não só da verificação no negócio inválido dos requisitos de forma e de substância necessários para a validação do negócio sucedâneo, como também da alegação de factos que permitam ao julgador concluir pela verificação da vontade hipotética das partes, a qual deve ser aferida segundo a boa fé e os demais elementos atendíveis, por referência às circunstâncias temporais da celebração do contrato (vide, sobre este ponto, v.g., António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, Tomo I, págs. 885 e 886, Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral da Relação Jurídica, págs. 486 e 487, Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 5ª edição, págs. 759 e seguintes, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4ª edição, págs. 268 e 269, Heinrich Ewald Hörster, A Parte Geral do Código Civil Português, pág. 600, Carvalho Fernandes, RDES, págs. 369 a 372, Ana Prata, Contrato-Promessa, 1995, pág. 512, nota 1424, Teresa Luso Soares, A Conversão do Negócio Jurídico, págs. 58 e 59, e Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, pág. 434).

Este último consagrado Mestre coimbrão deixou mesmo dito que “a conversão só se realiza, portanto, quando seja de admitir que as partes teriam querido o negócio sucedâneo caso se tivessem apercebido da deficiência do negócio principal e não o pudessem ter realizado com a observância do requisito infringido. Esta vontade hipotética será a alma do negócio sucedâneo, mas construído sobre a base do negócio principal (…), tendo em vista a sua natureza típica e particularidades concretas”.

Isto significa que tinham de ser as partes a alegar a factualidade necessária e suficiente que permitisse ao julgador, confrontado com a nulidade do negócio, converter o mesmo para um sucedâneo, dentro dos princípios do chamado favor negotii, que o Código Civil actual consagra.

Mas – e aqui surge a segunda questão – onde é que as partes deveriam ter alegado a factualidade que, postos os julgadores perante a nulidade do negócio, seria necessária à sua consideração e ao seu atendimento, nos limites previstos no artigo 293º do Código Civil, ou seja, aquela factualidade que, inviabilizado o primeiro negócio, por vício a determinar a sua nulidade, permitisse aos julgadores concluir que elas, nesse caso, teriam querido firmar um outro?

Logicamente que a resposta só pode ser a de que tal factualidade deveria sido alegada na referida 1ª acção, para, aí, ser considerada, desde que, como é óbvio, fosse provada.

Aqui entra, assim, em jogo o princípio da preclusão.

Como é sabido, o caso julgado incide sobre uma decisão que deve considerar a matéria de facto, tal como ela se apresenta finda a discussão (cfr. artigo 663º, nº 1, do Código de Processo Civil/CPC).

Desta ideia decorre que as partes devem, sob pena de preclusão, alegar os factos nos articulados normais, excepção feita aos casos de admissibilidade de apresentação de articulados supervenientes, nos termos previstos nos artigos 506º e 507º do CPC.

Isto significa que, da parte da defesa, o réu, após a apresentação daqueles articulados, fica inibido de, em qualquer outro momento – dentro ou fora do processo – alegar algo de novo em sua defesa, perante a “queixa” apresentada por parte do autor.

O âmbito da preclusão é, porém, substancialmente diferente para o autor.
Para este, ela é definida exclusivamente pelo caso julgado: só ficam precludidos os factos que se referem ao objecto apreciado e decidido por sentença transitada em julgado (o caso vulgar de, numa acção de denúncia de contrato de arrendamento por necessidade da casa – um dos elementos constitutivos do direito do autor – só formar caso julgado em relação ao circunstancialismo temporal vertido na petição).

Ora, o que se verifica, no caso dos presentes autos, é que, tanto do lado dos Autor, como da parte dos Réus, não foram invocadas as razões fácticas que possibilitariam, na acção já julgada e transitada, ao julgador a aplicação do estatuído no artigo 293º do Código Civil.

Não pode, pois, em nova acção, pretender agora o Autor reacender a discussão que, há muito, está definitivamente julgada.

Na 1ª acção, tendo os Réus suscitado, na sua contestação, a nulidade do contrato, deveria o Autor, na réplica, ter requerido que o tribunal considerasse a conversão do contrato-promessa bilateral, nulo, em promessa de venda unilateral, válido, ao abrigo do citado artigo 293º, alterando o pedido em conformidade, o que não fez, igualmente não o fazendo até ao encerramento da discussão em 1ª instância – cfr. artigo 273º do CPC (só o fez nas conclusões das alegações do recurso de revista aí interposto).

Dir-se-á, a finalizar que, como bem assinala Miguel Teixeira de Sousa, “a preclusão incide igualmente sobre as qualificações jurídicas que o objecto alegado pode comportar e que não foram utilizadas pelo tribunal. Se, por exemplo, a parte arguiu, num processo, a nulidade de uma cláusula contratual, não pode invocar, em processo posterior, a conversão da mesma cláusula” (Estudos Sobre O Novo Processo Civil, página 586).

Uma nota final para enfatizar o total desacerto da invocação do instituto da prescrição, por parte do recorrente, como se algum direito de crédito estivesse reconhecido e, porventura, a parte contrária, na qualidade de devedora, tivesse invocado, a seu favor, tal excepção peremptória.

O recorrente esquece que, se, na 1ª acção, o tribunal tivesse todos os elementos necessários para, em cumprimento do disposto no artigo 289º do Código Civil, determinar a restituição de tudo o que fora prestado, tê-lo-ia feito, ficando definitivamente solucionado o litígio entre as partes.

Será que, mesmo assim, o recorrente entenderia que ainda teria o prazo de 20 anos da prescrição ordinária para requerer a conversão do negócio, fazendo tábua rasa daquela decisão do tribunal, transitada em julgado?

5. Resulta, assim, do exposto que não colhem as conclusões do recorrente, tendentes ao provimento do recurso, pelo que a decisão recorrida terá de ser confirmada.

IV – Podem, pois, extrair-se as seguintes conclusões:
1ª – A conversão de um negócio nulo ou anulado em negócio válido, nos termos do artigo 293º do CC, está dependente não só da verificação no negócio inválido dos requisitos de forma e de substância necessários para a validação do negócio sucedâneo, como também da alegação de factos que permitam ao julgador concluir pela verificação da vontade hipotética das partes, a qual deve ser aferida segundo a boa fé e os demais elementos atendíveis, por referência às circunstâncias temporais da celebração do contrato.
2ª – A alegação de tal factualidade tem de ocorrer na própria acção onde o julgador, perante a inevitável declaração da nulidade do negócio, por vício existente, poderá concluir que as partes quiseram firmar um outro negócio, decretando, se for caso disso, a competente conversão.
3ª – Não tendo sido alegada tal factualidade e não tendo sido requerida a conversão – a qual não é do conhecimento oficioso do tribunal –, opera o princípio da preclusão.
4ª – Assim, tendo sido proferida decisão, com trânsito em julgado, a declarar nulo o contrato-promessa celebrado pelos aqui Autor e Réus (onde até se ordenou a repetição do julgamento, com ampliação da matéria de facto, visando apenas apurar o que cada uma das partes deveria devolver à outra, por força da aludida declaração de nulidade e nos termos do artigo 289º do CC), não pode agora o Autor pretender, em nova acção, que se declare a conversão do negócio, alegando factualidade que deveria ter vertido na acção anterior e invocando que tem 20 anos – prazo ordinário de prescrição – para, após a declaração de nulidade, pedir a conversão do negócio.

V – Nos termos expostos, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se, em consequência, a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.


Lisboa, 27 de Janeiro de 2010

Moreira Camilo (Relator)
Urbano Dias
Paulo Sá