Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
157/14.3TTSTR.E1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO LEONES DANTAS
Descritores: TRANSPORTES RODOVIÁRIOS
TEMPO DE TRABALHO
TEMPO DE DISPONIBILIDADE
RETRIBUIÇÃO
Data do Acordão: 05/02/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO – CONTRATO DE TRABALHO / PRESTAÇÃO DO TRABALHO / DURAÇÃO E ORGANIZAÇÃO DO TEMPO DE TRABALHO / NOÇÕES E PRINCÍPIOS GERAIS SOBRE DURAÇÃO E ORGANIZAÇÃO DO TEMPO DE TRABALHO / RETRIBUIÇÃO E OUTRAS PRESTAÇÕES PATRIMONIAIS.
Doutrina:
-Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 11.ª edição, Almedina, p. 439 e 447;
-Pedro Romano Martinez, Código do Trabalho Anotado, 2013, 9.ª Edição, Almedina, p. 477.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE TRABALHO (CT): - ARTIGO 197.º, N.º 1 E 258.º.
DL N.º 237/2007, DE 19 DE JUNHO, TRANSPÕE PARA A ORDEM JURÍDICA INTERNA A DIRECTIVA N.º 2002/15/CE, DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 11 DE MARÇO, RELATIVA À ORGANIZAÇÃO DO TEMPO DE TRABALHO DAS PESSOAS QUE EXERCEM ACTIVIDADES MÓVEIS DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO: - ARTIGO 2.º, ALÍNEA C).

Legislação Comunitária:
REGULAMENTO (CE) N.º 561/2006, DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 15 DE MARÇO DE 2006: - ARTIGO 1.º, N.º 1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


-DE 02-11-2004, PROCESSO N.º 340/04;
-DE 23-02-2005, PROCESSO N.º 3164/04;
-DE 09-05-2007, PROCESSO N.º 3211/06;
-DE 09-11-2008, PROCESSO N.º 08S0930;
-DE 05-11-2015, PROCESSO N.º 159/15.2T8TMR.E1;
-DE 07-07-2016, PROCESSO N.º 119/14.0TTFAR.E1;
-DE 07-09-2016, PROCESSO N.º 652/13.1TTFAR.E1;
-DE 16-02-2017, PROCESSO N.º 618/13.1TTFAR.E1, TODOS IN WWW.DGSI.PT.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:


-DE 17-12-2014, PROCESSO N.º 715/13.3TTVFX.L1-4, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I- O tempo de disponibilidade tal como resulta da alínea c) do artigo 2.º do Decreto-lei n.º 237/2007, de 19 de junho, não tem a natureza de tempo de trabalho para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 197.º do Código de Trabalho.

II – A compensação paga aos trabalhadores rodoviários pela sujeição às obrigações inerentes ao tempo de disponibilidade referido no número anterior não tem natureza retributiva, nos termos do artigo 258.º do Código do Trabalho, não relevando para o pagamento dos descansos compensatórios e na remuneração das férias, subsídios de férias e de Natal

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I

AA, BB, CC e Outros, instauraram, individualmente, ações declarativas de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra DD, SA., pedindo a condenação desta a pagar cada um dos autores a seguinte quantia: a) - 8. AA: € 43.784,35; b) - 11. BB: € 32.440,81; c) - 40. CC: € 34.017,01.

As diferentes ações foram posteriormente apensadas.

Alegaram, para o efeito e em síntese, serem, ou terem sido, trabalhadores da Ré, desempenhando as funções de motorista de veículos pesados de passageiros e que no desempenho dessas funções prestaram, com caráter regular e periódico, trabalho suplementar e noturno, tiveram o denominado “tempo de disponibilidade” e receberam o correspondente subsídio.

Acrescentaram que as quantias auferidas integram a sua retribuição, pelo que devem ser computadas na respetiva retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal.

Além disso, tendo prestado trabalho fora do horário de trabalho teriam direito ao descanso compensatório e, uma vez que o mesmo não lhes foi concedido, têm direito ao correspondente pagamento.

Contestou a Ré, por exceção e por impugnação: (i) por exceção, sustentando a prescrição dos juros de mora em relação aos alegados créditos vencidos há mais de 5 anos, bem como quanto à falta de gozo do descanso compensatório por realização de trabalho suplementar, face à falta de documento(s) idóneo(s); (ii) por impugnação, negando a aplicabilidade aos autos do AE invocado pelos autores e afirmando  que embora sempre tenha remunerado os autores por todas as horas compreendidas entre o início e o termo do respetivo horário de trabalho, ressalvados os intervalos de refeição – pagando-lhes as primeiras oito horas pelo valor normal e as horas seguintes com o acréscimo previsto para a remuneração de trabalho suplementar, mesmo que tenham ocorrido nos períodos durante os quais eles não exerceram, nem lhes foi solicitada, qualquer atividade – daí não decorre que o pagamento pela prestação de tal trabalho lhes dê (aos autores) direito ao descanso compensatório previsto no contrato coletivo de trabalho aplicável, uma vez que este apenas prevê o descanso compensatório pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal obrigatório e pela prestação de trabalho em dia feriado no estrangeiro.

Além disso, tais prestações não integram a retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal e, em conformidade, concluiu pela procedência das exceções e pela improcedência das ações.

Os autos prosseguiram os termos legais, tendo sido proferida sentença datada de 21 de novembro de 2016, cuja parte decisória, no que se refere aos autores supra citados, se transcreve:

«8. Condenar a Ré DD, SA a pagar ao Autor AA (Apenso G):

i) A quantia de € 311,06 (trezentos e onze euros e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados desde a citação, até efetivo e integral pagamento;

ii) a quantia correspondente a 25% (vinte e cinco por cento) das horas de trabalho suplementar efetivo (ou seja, descontado do “tempo de disponibilidade”, em que nenhuma atividade foi solicitada ao Autor pela Ré) realizado pelo Autor entre 1 de dezembro de 2003 e 31 de dezembro de 2008, a calcular em função da retribuição horária auferida em cada um dos meses em que deveria ter gozado o descanso compensatório, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor de € 10.176,84 [(dez mil, cento e setenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos), onde se deve englobar o valor líquido em que se condenou a Ré em i)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados desde a data da citação da Ré até efetivo e integral pagamento;

iii) as quantias de € 73,00 (setenta e três euros), € 160,98 (cento e sessenta euros e noventa e oito cêntimos), € 34,98 (trinta e quatro euros e noventa e oito cêntimos), € 15,10 (quinze euros e dez cêntimos), € 39,46 (trinta e nove euros e quarenta e seis cêntimos), € 66,72 (sessenta e seis euros e setenta e dois cêntimos), € 68,00 (sessenta e oito euros), € 41,20 (quarenta e um euros e vinte cêntimos), € 36,20 (trinta e seis euros e vinte cêntimos), € 43,42 (quarenta e três euros e quarenta e dois cêntimos), € 48,32 (quarenta e oito euros e trinta e dois cêntimos) e € 39,64 (trinta e nove euros e sessenta e quatro cêntimos), acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados desde 01.05.2011, 01.02.2012, 01.08.2003, 16.12.2003, 01.07.2004, 01.07.2005, 01.07.2006, 01.08.2007, 01.07.2008, 01.12.2009, 01.05.2011 e 01.02.2012, respetivamente, até efetivo e integral pagamento;

iv) a quantia em falta nas retribuições de férias e respetivos subsídios pagos ao Autor nos anos de 2002 a 2010, correspondente à média dos valores pagos a título de trabalho suplementar efetivo (apartado do “tempo de disponibilidade”, em que nenhuma atividade foi solicitada ao Autor pela Ré), nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;

v) a quantia em falta nos subsídios de Natal pagos ao Autor nos anos de 2002 e 2003, correspondente à média dos valores pagos a título de trabalho suplementar efetivo (apartado do “tempo de disponibilidade”, em que nenhuma atividade foi solicitada ao Autor pela Ré) nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;

vi) a quantia em falta na retribuição de férias e respetivo subsídio e subsídio de Natal pagos ao Autor no ano de 2002, correspondente à média dos valores pagos a título de subsídio noturno, nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;

vii) a quantia em falta na retribuição de férias e respetivo subsídio pagos ao Autor no ano de 2010, correspondente à média dos valores pagos a título de subsídio noturno, nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;»

«11. Condenar a Ré DD, SA a pagar ao Autor BB (Apenso J):

i) A quantia de € 246,89 (duzentos e quarenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados desde a citação, até efetivo e integral pagamento;

ii) a quantia correspondente a 25% (vinte e cinco por cento) das horas de trabalho suplementar efetivo (ou seja, descontado do “tempo de disponibilidade”, em que nenhuma atividade foi solicitada ao Autor pela Ré) realizado pelo Autor entre 1 de dezembro de 2003 e 31 de dezembro de 2008, a calcular em função da retribuição horária auferida em cada um dos meses em que deveria ter gozado o descanso compensatório, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor de € 11.684,40 [(onze mil, seiscentos e oitenta e quatro euros e quarenta cêntimos), onde se deve englobar o valor líquido em que se condenou a Ré em i)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados desde a data da citação da Ré até efetivo e integral pagamento;

iii) as quantias de € 21,22 (vinte e um euros e vinte e dois cêntimos) e € 6,38 (seis euros e trinta e oito cêntimos), acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados desde 01.09.2003 e 16.12.2003, respetivamente, até efetivo e integral pagamento;

iv) a quantia em falta nas retribuições de férias e respetivos subsídios pagos ao Autor nos anos de 2002 a 2008, correspondente à média dos valores pagos a título de trabalho suplementar efetivo (apartado do “tempo de disponibilidade”, em que nenhuma atividade foi solicitada ao Autor pela Ré), nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;

v) a quantia em falta nos subsídios de Natal pagos ao Autor nos anos de 2002 e 2003, correspondente à média dos valores pagos a título de trabalho suplementar efetivo (apartado do “tempo de disponibilidade”, em que nenhuma atividade foi solicitada ao Autor pela Ré) nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;

vi) a quantia em falta na retribuição de férias e respetivo subsídio e subsídio de Natal pagos ao Autor no ano de 2002, correspondente à média dos valores pagos a título de subsídio noturno, nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;»

39. Condenar a Ré DD, SA a pagar ao Autor CC (Apenso AM):

i) A quantia de € 15,96 (quinze euros e noventa e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados desde a citação, até efetivo e integral pagamento;

ii) a quantia correspondente a 25% (vinte e cinco por cento) das horas de trabalho suplementar efetivo (ou seja, descontado do “tempo de disponibilidade”, em que nenhuma atividade foi solicitada ao Autor pela Ré) realizado pelo Autor entre 1 de dezembro de 2003 e 31 de dezembro de 2008, a calcular em função da retribuição horária auferida em cada um dos meses em que deveria ter gozado o descanso compensatório, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor de € 9.913,70 [(nove mil, novecentos e treze euros e setenta cêntimos), onde se deve englobar o valor líquido em que se condenou a Ré em i)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados desde a data da citação da Ré até efetivo e integral pagamento;

iii) as quantias de € 10,78 (dez euros e setenta e oito cêntimos), € 14,00 (catorze euros), € 10,26 (dez euros e vinte e seis cêntimos), € 24,88 (vinte e quatro euros e oitenta e oito cêntimos), € 35,34 (trinta e cinco euros e trinta e quatro cêntimos), € 17,16 (dezassete euros e dezasseis cêntimos) e € 10,50 (dez euros e cinquenta cêntimos), acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados desde 01.07.2004, 01.07.2005, 01.07.2006, 01.02.2009, 01.02.2010, 01.02.2011 e 01.02.2012, respetivamente, até efetivo e integral pagamento;

iv) a quantia em falta nas retribuições de férias e respetivos subsídios pagos ao Autor nos anos de 2002 a 2008, correspondente à média dos valores pagos a título de trabalho suplementar efetivo (apartado do “tempo de disponibilidade”, em que nenhuma atividade foi solicitada ao Autor pela Ré), nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;

v) a quantia em falta nos subsídios de Natal pagos ao Autor nos anos de 2002 e 2003, correspondente à média dos valores pagos a título de trabalho suplementar efetivo (apartado do “tempo de disponibilidade”, em que nenhuma atividade foi solicitada ao Autor pela Ré) nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;

vi) a quantia em falta na retribuição de férias e respetivo subsídio e subsídio de Natal pagos ao Autor nos anos de 2002 e 2003, correspondente à média dos valores pagos a título de subsídio noturno, nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;

vii) a quantia em falta na retribuição de férias e respetivo subsídio pagos ao Autor no ano de 2007, correspondente à média dos valores pagos a título de subsídio noturno, nos 12 (doze) meses que antecederam tais pagamentos, a liquidar em incidente de liquidação, com o limite do pedido pelo Autor nessa sede [onde se deve englobar as quantias liquidas em que foi a Ré condenada em iii)], acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (quatro por cento) e nas demais que a vierem a suceder legalmente, calculados a partir da data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento;»

Inconformados com esta sentença, dela apelou a Ré, tendo desde logo arguido, expressa e separadamente, a nulidade da mesma, por omissão de pronúncia, e um outro autor - (35.º) EE veio arguir a nulidade da sentença, no que a si diz respeito, arguição essa, feita expressa e separadamente.

Além disso, todos os autores, com exceção da autora FF, (29.º),  vieram igualmente apelar da sentença, tendo formulado as seguintes conclusões:

«1. O presente recurso restringe-se à parte da sentença que não condenou a R. a incluir o “tempo de disponibilidade” no pagamento dos descansos compensatórios e na remuneração das férias, subsídios de férias e de Natal;

2. A sentença fez, quanto à matéria relativa à aplicabilidade do DL. 237/2007 de 19.06 e do conceito de “tempo de disponibilidade”, no caso em apreço, uma incorreta interpretação dos factos provados e uma errada aplicação do Direito;

3. O citado DL. 237/07 não se aplica aos presentes autos, uma vez que procedeu à transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva 2002/15/CE relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis de transporte rodoviário, a qual estabelece posições mínimas relativas à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis do transporte rodoviário;

4. O escopo desta Diretiva é o de “aumentar a segurança rodoviária, evita falsear a concorrência e garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores móveis”;

5. O DL. 237/2007 é totalmente omisso a qualquer aspeto relativo a descansos compensatórios, sendo certo que a própria definição de “tempo de disponibilidade” apenas tem eficácia no âmbito do mesmo normativo;

6. Ora, não se aplica ao caso em apreço o DL. 237/2007, sendo certo que este apenas se aplica aos motoristas cujos veículos não necessitem de aparelho de tacógrafo uma vez que a Diretiva 2002/15/CE refere o regulamento (CE) 3820/85 e não o Regulamento (CE) 3821/85 de 20/12.

7. A sentença deveria ter tomado em consideração que a R. é uma empresa que se dedica à atividade do transporte público de passageiros, sendo que os seus autocarros têm uma lotação entre os 25 e 70 lugares e utilizam tacógrafos, mediante os quais são registados os tempos de condução de descanso e de pausas de cada motorista, e não o fez;

8. Não se aplicando ao caso em apreço o DL. 237/2007, então cai pela base a perspetiva de aplicação do conceito “tempo de disponibilidade” no caso em apreço;

9. E deste modo, não pode a decisão sob recurso na parte do cálculo dos valores a que os recorrentes têm direito, proceder a qualquer “desconto” dos “tempos de disponibilidade” devendo a recorrida ser condenada a pagar aos recorrentes as quantias resultantes dos cálculos inerentes ao tempo de trabalho suplementar – quer para efeitos do pagamento do descanso compensatório não gozado, quer para efeitos do cálculo das remunerações de férias e de subsídio de férias - sem se cuidar de saber se é “tempo de disponibilidade” ou não;

10. Mas ainda que se entenda dever aplicar-se o citado DL. 237/07 de 19 de junho, o que apenas se admite como raciocínio e sem prescindir, sempre o mesmo normativo terá a sua aplicação apenas após a sua entrada em vigor e nunca antes, pois não tem eficácia retroativa;

11. Nesta perspetiva, o conceito de “tempo de disponibilidade” constante do referido diploma apenas se pode aplicar a situações localizadas no tempo em período posterior à entrada em vigor do mesmo;

12. Mas ao “descontar” o “tempo de disponibilidade” no trabalho suplementar realizado por alguns AA. (identificados no corpo destas alegações) mesmo antes de 19 de junho de 2007, mal andou a sentença;

13. Seja qual for a perspetiva pela qual se olhe para o diploma legal, sempre se deve concluir que a sentença violou o disposto nos artigos 1º e 2º do DL 237/2007 de 19 de junho, pelo que, tendo errado apenas nesta parte, deve ser revogada em tal parte».

O Tribunal da Relação conheceu dos recursos interpostos, por acórdão de 14 de setembro de 2017, com um voto de vencido, que integrou o seguinte dispositivo.

«Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em:

1. Indeferir a arguição de nulidades da sentença pela ré DD, S.A., bem como pelo autor EE;

2. Julgar improcedente quer o recurso interposto pela ré quer o recurso interposto pelos autores/recorrentes.

As custas do recurso interposto pela ré deverão ser por ela suportadas; sem custas em  relação ao recurso interposto pelos autores, atenta a isenção de que os mesmos gozam, sem prejuízo da sua responsabilidade pelos encargos a que tenham dado origem, uma vez que a sua pretensão foi totalmente vencida, nos termos do art. 4.º, n.º 6, do Regulamento das Custas Processuais, nem pelos reembolsos previstos no art. 4.º, n.º 7, do mesmo Regulamento.»

Irresignados com esta decisão, os autores AA, BB e CC recorrem de revista para este Supremo Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões:

«1. O presente recurso de revista restringe-se à parte do acórdão que não condenou a R. a incluir o "tempo de disponibilidade" no pagamento dos descansos compensatórios e na remuneração das férias, subsídios de férias e de Natal;

2. Quanto à matéria relativa à aplicabilidade do DL. 237/2007 de 19.06 e do conceito de "tempo de disponibilidade", no caso em apreço, o acórdão fez uma incorreta interpretação dos factos provados e uma errada aplicação do Direito;

3.O DL. 237/07 não se aplica aos presentes autos, uma vez que procedeu à transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva 2002/15/CE relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis de transporte rodoviário, a qual estabelece posições mínimas relativas à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis do transporte rodoviário;

4.O objetivo desta Diretiva é o de "aumentar a segurança rodoviária, evita falsear a concorrência e garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores móveis", sendo que o DL. 237/2007 é totalmente omisso quanto a qualquer aspeto relativo a descansos compensatórios, e a própria definição de "tempo de disponibilidade" apenas tem eficácia no âmbito do mesmo normativo;

5. O DL. 237/2007 apenas se aplica aos motoristas cujos veículos não necessitem de aparelho de tacógrafo uma vez que a Diretiva 2002/15/CE refere o regulamento (CE) 3820/85 e não o Regulamento (CE) 3821/85 de 20/12.

6.O acórdão deveria ter tomado em consideração que a R. é uma empresa que se dedica à atividade do transporte público de passageiros, sendo que os seus autocarros têm uma lotação entre os 25 e 70 lugares e utilizam tacógrafos, mediante os quais são registados os tempos de condução de descanso e de pausas de cada motorista;

7.Uma vez que não se aplica, neste caso, o DL. 237/2007, então cai pela base a perspetiva de aplicação do conceito "tempo de disponibilidade'';

8.E deste modo, não pode a decisão sob recurso manter a sentença da primeira instância que procede a "desconto" dos "tempos de disponibilidade";

9.Mas ainda que se entenda dever aplicar-se o citado DL. 237/07 de 19 de junho, o que apenas se admite como raciocínio e sem prescindir, sempre o mesmo normativo terá a sua aplicação apenas após a sua entrada em vigor e nunca antes, pois não tem eficácia retroativa;

10. Seja qual for a perspetiva pela qual se olhe para o diploma legal, sempre se deve concluir que o acórdão violou o disposto nos artigos 1.º e 2.º do DL 237/2007 de 19 de junho;

11. O voto de vencido relativamente ao acórdão sob recurso considera que a retribuição paga a título do chamado tempo de disponibilidade integra o conceito de retribuição e como tal deve entrar no pagamento dos descansos compensatórios, nas férias e no subsídio de férias e de Natal;

12. O Desembargador vencido assinala que "Face ao disposto nos art°s 263° n° 1 e 264° n° 1 e 2 do CT, parece-nos inquestionável que o pagamento da quantia relativa à disponibilidade do trabalhador deve integrar a retribuição das férias, e subsídios de férias e de Natal";

13. E acrescenta "O argumento de que o trabalhador sujeito à disponibilidade pode exercer outras atividades, não colhe, pois, como decorre dos factos provados, o trabalhador está deslocado da sua área de residência, pelo que não lhe será fácil encontrar outra atividade durante o tempo de espera. Além de que, nessa hipótese, deixaria de justificar-se o pagamento do tempo de disponibilidade. Na prática o trabalhador é pago para ficar inativo, longe do seu centro de vida, em virtude da natureza do seu trabalho. O trabalhador provou que está disponível conforme acordado e que como contrapartida é-lhe paga uma quantia, todos os meses, pelo que face ao disposto nos art°s 258° e 263° n° 1 e 264° n° 1 e 2 do CT deve considerar-se parte integrante da retribuição";

14. Os argumentos e as conclusões do Desembargador vencido, que com a devida vénia os recorrentes fazem seus, devem ser acatados;

15. Acresce que o facto de os trabalhadores estarem sempre contactáveis, não sendo embora obrigados a permanecer no espaço físico em que realizam as suas atividades, implica que estes estejam sempre "M..." ao serviço acabando por nunca "desligar" do mesmo, sendo impraticável qualquer atividade pessoal exterior ao desempenho do serviço;

16. Esta situação pode acarretar consequências muito nefastas para a vida do trabalhador, pois se a empresa quiser, o trabalhador pode estar sujeito ao "tempo de disponibilidade" horas sucessivas, considerando que não é "tempo de trabalho", sem que este acabe por ter direito ao descanso ou a "desligar" efetivamente do seu serviço;

17. E isso pode acontecer por tempo indeterminado, o que viola o direito à "organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar" (artigo 59° n° 1 al. b) da CRP) e viola também o direito ao "repouso e aos lazeres, a um limite de jornada de trabalho" (artigo 59° n° 1 al. b) da CRP);

18. O acórdão da Relação efetuou uma interpretação inconstitucional dos artigos 258° e 263° n° 1 e 264° n°s 1 e 2 do CT, ao considerar que a retribuição paga pelos tempos de disponibilidade não integra o conceito de retribuição, não contando, desse modo, para efeitos dos pagamentos dos descansos compensatórios, das férias e dos subsídios de férias e de Natal;

19. Com efeito a interpretação assumida pelo acórdão relativamente à matéria em causa (no fundo a interpretação dos artigos 258° e 263° n° 1 e 264° n°s 1 e 2 do CT), viola o artigo 59° n° 1 al. a) da Constituição da República Portuguesa na parte em que, assim, deixa de ser paga ao trabalhador a retribuição segundo a quantidade, qualidade e natureza do trabalho;

20. Os recorrentes invocam a inconstitucionalidade da interpretação que o acórdão deu aos normativos em apreço, por violação do artigo 59° n° 1, al. a), b) e d) da CRP, o que fazem para todos os efeitos legais;

21. Assim, mal andou o acórdão nesta parte, devendo o mesmo ser revogado, concedendo-se deste modo provimento ao presente recurso.»

A Ré respondeu ao recurso interposto integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões:

«1. Andou bem a Douta Decisão proferida pela Relação de Évora nos presentes autos.

2. É de concluir para os efeitos que nestes autos se discutem, que o tempo considerado como tempo de disponibilidade não é tempo de trabalho, pelo que, na contabilização do tempo do trabalho suplementar há que subtrair os períodos de disponibilidade.

3. Consubstancia-se tal entendimento na análise conjugada dos vários diplomas legais em vigor no setor dos transportes rodoviários.

4. O regulamento (CE) nº 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, que é relativo à harmonização de determinadas disposições em matéria social no domínio dos transportes rodoviários, veio alterar os Regulamentos (CEE) nº 3821/85 e (CEE) nº 2135/98 do Conselho e revogou o Regulamento (CEE) nº 3820/85 do Conselho.

 5. Por sua vez, o Dec. Lei nº 237/2007, de 19 de junho, que no seu Preâmbulo, diz: O presente decreto-lei procede à transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva nº 2002/15/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março, relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis de transporte rodoviário, regulando determinados aspetos da duração e organização do tempo de trabalho de trabalhadores móveis que participem em atividades de transporte rodoviário efetuadas em território nacional e abrangidas pelo Regulamento (CEE) nº 3820/85, do Conselho, de 20 de dezembro, ou pelo Acordo Europeu Relativo ao Trabalho das Tripulações dos Veículos que Efetuam Transportes Internacionais Rodoviários (AETR), aprovado, para ratificação pelo Decreto nº 324/73, de 30 de junho.

6. Sendo que é neste Dec. Lei 237/2007, no seu artigo 2º alínea c) que se define o conceito de tempo de disponibilidade como: “qualquer período, que não seja intervalo de descanso, descanso diário ou descanso semanal, cuja duração previsível seja previamente conhecida pelo trabalhador, nos termos previstos em convenção coletiva ou, na sua falta, antes da partida ou imediatamente antes do início efetivo do período em questão, em que este não esteja obrigado a permanecer no local de trabalho, embora se mantenha adstrito à realização da atividade em caso de necessidade, bem como, no caso de trabalhador que conduza em equipa, qualquer período que passe ao lado do condutor ou num beliche durante a marcha do veículo”.

7. Mais se estipulando no art 5º que o “tempo de disponibilidade” não é considerado tempo de trabalho.

 8. Acresce que, analisado o Código do Trabalho verifica-se que do mesmo não consta qualquer tipo de disposição referente a tempos de condução dos motoristas.

9. Ora, caso o Decreto-Lei 237/2007 se destinasse a regular aspetos apenas com aplicabilidade as períodos de condução e descanso dos motoristas nenhum sentido faria que o legislador sentisse necessidade de estabelecer que o diploma legal prevalecia sobre as normas correspondentes do Código do Trabalho

10. Assim e concluindo, consideramos que o Dec. Lei n.º 237/2007, de 19/06, que procedeu à transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva n.º 2002/15/CE de 11/03, inclui as atividades abrangidas pelo Regulamento (CE) n.º 3820/85, de 20/12, mas tal abrangência não exclui as atividades abrangidas pelo Regulamento (CE) n.º 3821/85, desde que estas se contenham no âmbito de aplicação daquelas.

11. Concluímos que também para os efeitos que nestes autos se discutem, o tempo considerado tempo de disponibilidade não é tempo de trabalho, pelo que, na contabilização do tempo do trabalho suplementar há que subtrair os períodos de disponibilidade.

Termos em que deverá ser negado provimento ao recurso interposto, [a]ssim se fazendo costumada justiça.»

Neste Tribunal a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta proferiu parecer, nos termos do n.º3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho pronunciando-se no sentido da confirmação da decisão recorrida.

Notificado este parecer às partes não motivou qualquer tomada de posição.

Sabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 3, e 639.º do Código de Processo Civil, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, estão em causa na presente revista saber:

a) Se os autores têm o direito a que o tempo de disponibilidade seja tomado em consideração no pagamento dos descansos compensatórios e na remuneração das férias, subsídio de férias e de Natal;

b) Se a interpretação dos artigos 258° e 263° n° 1 e 264° n°s 1 e 2 do Código do Trabalho subjacente à decisão recorrida viola do disposto no artigo 59° n° 1, al. a), b) e d) da Constituição da República.


II

1 - A decisão recorrida depois de invocar o disposto no n.º 6 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, sem qualquer oposição das partes, identificou a matéria de facto relevante para o conhecimento do objeto do recurso de apelação que discriminou.

Dessa factualidade têm interesse no âmbito do presente recurso de revista os seguintes factos:

«1. A Ré é uma empresa que se dedica à atividade industrial do transporte rodoviário de mercadorias e passageiros, exercendo a atividade de transporte público rodoviário de passageiros em todo o território nacional e no estrangeiro e realizando indistintamente serviços regulares, serviços regulares especializados e serviços ocasionais;

2. A atividade da Ré é marcada pela sua forte oscilação no que concerne aos períodos diários de execução, existindo dois períodos do dia em que há necessidade de afetar a grande maioria dos seus meios humanos e materiais: o primeiro na ponta da manhã (6h30m – 10h00) correspondente às deslocações casa / emprego / escola; o segundo, na ponta da tarde (16h30m – 20h30m) correspondente às deslocações escola / emprego / casa;

3. A Ré organiza a atividade diária dos motoristas por escalas de serviço, as quais mencionam, além de outros elementos, as horas de início e termo da jornada de trabalho, os intervalos de descanso, tempos de disponibilidade e os serviços de transporte que os trabalhadores devem assegurar, com indicação dos respetivos horários;

4. A descrição dos serviços de transporte constante da escala é feita cronologicamente, com indicação do horário de partida e do horário de chegada de cada serviço, pelo modo reproduzido nos documentos juntos com as contestações a fls. 39-106 dos autos principais, fls. 53-94 do apenso A, fls. 53-73 do apenso B, fls. 51-64 do apenso C, fls. 225-240 do apenso D, fls. 60-75 do apenso E, fls. 58-74 do apenso F, fls. 61-107 do apenso G, fls. 56-81 do apenso H, fls. 55-70 do apenso I, fls. 58-75 do apenso J, fls. 52-72 do apenso K, fls. 58-72 do apenso L, fls. 58-73 do apenso M, fls. 62-104 do apenso N, fls. 57-72 do apenso O, fls. 57-72 do apenso P, fls. 58-73 do apenso Q, fls. 60-73 do apenso R, fls. 59-75 do apenso S, fls. 59-75 do apenso T, fls. 55-70, do apenso U, fls. 53-72 do apenso V, fls. 60-90 do apenso W, fls. 56-71 do apenso X, fls. 57-80 do apenso Y, fls. 54-75 do apenso Z, fls. 55-76 do apenso AA, fls. 58-70 do apenso AC, fls. 54-73 do apenso AD, fls. 59-74 do apenso AE, fls. 60-81 do apenso AF, fls. 56-78 do apenso AG e CD junto aos autos com o nome de “Processo 569-13.0TTSTR” nas subpastas respeitantes aos Autores EE, GG, HH, II, JJ e KK, nos ficheiros com os nomes “Artº 202” e “Tempo de Disponibilidade”;

5. As escalas de serviço são comunicadas aos motoristas em regra, com pelo menos, um dia de antecedência, sendo que os serviços da segunda-feira são comunicados à sexta-feira;

6. Pela consulta da escala, os motoristas ficam a saber a que horas iniciarão e terminarão o trabalho diário, em que período gozarão o intervalo de descanso, quais os serviços de transporte que deverão realizar e quaisquer outras tarefas que lhes sejam exigidas;

7. Pela consulta da escala, os motoristas ficam a saber também em que períodos do dia, para além do intervalo de descanso, não terão qualquer tarefa atribuída;

8. Tais tempos de inatividade são todos os tempos intercalados no horário de trabalho, que não são intervalo para refeição, nem períodos de descanso, mas durante os quais os Autores motoristas não prestam ou prestaram, nem lhes foi solicitado que prestassem qualquer trabalho de condução ou de outra natureza;

9. Durante tais períodos de inatividade, os Autores motoristas e demais motoristas não estão obrigados a permanecer no espaço físico em que realizam as suas atividades laborais, nem sequer nas instalações da Ré, mas sabem que podem ser chamados para ocorrer à realização de qualquer serviço que não esteja previsto mas que seja necessário assegurar, devendo estar sempre contactáveis;

10. Nesses períodos, normalmente, os motoristas permanecem junto das instalações da Ré, das respetivas viaturas ou relativas imediações;

11. A Ré, pelo menos até março de 2014, sempre remunerou os seus motoristas com todas as horas compreendidas entre o início e o termo dos respetivos horários de trabalho, ressalvados os tempos de refeição e intervalo de descanso, quer se tratasse de tempo durante o qual eles exercessem efetivamente a atividade de motorista, quer se tratasse de tempo durante o qual nenhum trabalho de condução ou de outra natureza lhes fosse solicitado;

12. A Ré, pelo menos até março de 2014, remunerou as primeiras 8 horas ao valor normal da hora, sem qualquer acréscimo e as horas seguintes ao valor da hora normal com os acréscimos previstos para a remuneração do trabalho suplementar, mesmo que tivessem ocorrido períodos durante os quais os motoristas não tivessem exercido nem lhes tivesse sido solicitada qualquer atividade;

13. A Ré não celebrou qualquer acordo com os Autores motoristas para substituição dos descansos compensatórios pela prestação de trabalho suplementar em dia útil;

14. Os Autores motoristas nunca reclamaram, até ao momento em que fizeram dar entrada da petição inicial que deu origem aos presentes autos, o gozo dos dias de descanso que entendiam lhes serem devidos;

15. Nos recibos de vencimento emitidos pela Ré a base de carga horária vem expressa em quantidades de hora centesimal, em que uma hora corresponde a 100 quantidades;

16. A Ré fazia constar nos recibos de vencimento os valores a receber, indicando toda a extensão horária dos motoristas, fazendo menção à “hora extra 50%” e à “hora extra 75%”;

17. O pagamento da remuneração dos períodos referentes a “horas extra” ocorreu no mês seguinte ao da respetiva verificação;

18. A Ré sempre registou e liquidou aos Autores todo o trabalho suplementar realizado, com os acréscimos legais e regulamentares;

19. Não deu a gozar aos Autores quaisquer dias de descanso complementar pela prestação de trabalho suplementar em dia útil, em dia de descanso complementar e em dia feriado, nem liquidou qualquer quantia pelo não gozo desse descanso compensatório;

20. A Ré sempre liquidou aos Autores as férias, bem como os subsídios de férias e de Natal, somando o valor do salário base com as diuturnidades e o subsídio de agente único, não incluindo as médias da remuneração do trabalho suplementar e do subsídio noturno».



2 – A decisão recorrida respondeu negativamente à primeira questão que constitui o objeto do presente recurso de revista, com os seguintes fundamentos:

«2. Do tempo de disponibilidade e sua integração, ou não, no tempo de trabalho para efeito pagamento do descanso compensatório e da retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal (recurso dos autores)

Recorde-se que a 1.ª instância considerou, no que merece o aplauso da recorrida, que o tempo de disponibilidade não integra o tempo de trabalho; já os autores/recorrentes sustentam entendimento oposto, ancorando-se, no essencial, que o pagamento daquele assume natureza retributiva, devendo integrar o apuramento do descanso compensatório e da retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal.

A questão em causa já foi objeto de apreciação em diversos acórdãos deste tribunal, designadamente nos acórdãos de 05-11-2015 (Proc. n.º 159/15.2T8TMR.E1), de 07-07-2016 (Proc. n.º 119/14.0TTFAR.E1), ambos relatados pelo ora relator, e de 07-09-2016 (Proc. n.º 652/13.1TTFAR.E1), encontrando-se os dois últimos publicados em www.dgsi.pt).

Mais recentemente, em 16-02-2017, no Proc. n.º 618/13.1TTFAR.E1, também relatado pelo ora relator e disponível em www.dgsi.pt, também se abordou esta problemática.

Em todos os arestos se decidiu, com um voto de vencido no último acórdão, que o tempo de disponibilidade não é de considerar no apuramento do descanso compensatório nem no cálculo da retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal.

Acompanhemos o que, sobre a matéria, se escreveu nos referidos acórdãos.

Estipulava o artigo 82.º do Decreto-Lei n.º 49 408, de 24-11-1969 (LCT):

«1 - Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.

2 - A retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas feitas direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie.

3 - Até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador.».

Idêntico é o regime que decorre do artigo 249.º do Código do Trabalho de 2003 e, posteriormente, do artigo 258.º do Código do Trabalho de 2009.

Como assinala Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, 11.ª edição, Almedina, pág. 439), deduz-se daquele preceito que a retribuição é constituída pelo conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da atividade por ele desenvolvida, ou, mais rigorosamente, da força de trabalho por ele oferecida.

Assim, num primeiro momento, a retribuição, constituída por um conjunto de valores, é determinada pelo clausulado do contrato, por critérios normativos (como sejam o salário mínimo e o princípio da igualdade salarial) e pelos usos da profissão e da empresa; num segundo momento, a retribuição global - no sentido que exprime o padrão ou módulo do esquema remuneratório do trabalhador, homogeneizando e sintetizando em relação à unidade de tempo, a diversidade de atribuições patrimoniais realizadas ou devidas – engloba não só a remuneração de base, como também prestações acessórias, que preencham os requisitos de regularidade e periodicidade.

Constituindo critério legal da determinação da retribuição, a obrigatoriedade do pagamento da(s) prestação(ões) pelo empregador, dele apenas se excluem as meras liberalidades que não correspondem a um dever do empregador imposto por lei, instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, contrato individual de trabalho, ou pelos usos da profissão e da empresa, e aquelas prestações cuja causa determinante não seja a prestação da atividade pelo trabalhador – ou a sua disponibilidade para o trabalho –, mas sim causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade para este.

No que respeita à característica de periodicidade (no sentido de ser satisfeita por períodos aproximadamente certos) e regularidade (no sentido da sua constância) da retribuição, significa, por um lado, a existência de uma vinculação prévia do empregador (quando se não ache expressamente consignada) e, por outro, corresponde à medida das expectativas de ganho do trabalhador, conferindo dessa forma relevância no pagamento.

Como se afirmou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de maio de 2007 (Proc. n.º 3211/06 – 4.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt), «com a expressão “regular”, a lei refere se a uma prestação não arbitrária, que segue uma regra permanente, sendo, pois, constante. E exigindo caráter “periódico” para a integração da prestação do empregador no âmbito da retribuição, a lei considera que ela deve ser paga em períodos certos no tempo ou aproximadamente certos, de forma a inserir se na própria ideia de periodicidade típica do contrato de trabalho e das necessidades recíprocas dos dois contraentes».

No dizer de Monteiro Fernandes (obra citada, pág. 447), «a qualificação de certa atribuição patrimonial como elemento do padrão retributivo definido pelo art.º 82.º da LCT não afasta a possibilidade de se ligar a essa atribuição patrimonial uma cadência própria, nem a de se lhe reconhecer irrelevância para o cálculo deste ou daquele valor derivado da «retribuição»».

Todavia, importa ter presente que embora verificando-se a regularidade e periodicidade no pagamento, a prestação não constituirá retribuição se tiver uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade da força de trabalho, como acontece, por exemplo, com as ajudas de custo, despesas de transporte, abonos de viagem ou outra forma de compensação de despesas ou gastos tidos pelo trabalhador ao serviço do empregador, salvo na parte em que essas importâncias excedam os respetivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato, se devam considerar pelos usos como elemento integrante da remuneração do trabalhador.

De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 197.º do Código do Trabalho (a que corresponde o n.º 1 do artigo 155.º do CT/2003), “[c]onsidera-se tempo de trabalho qualquer período durante o qual o trabalhador exerce a atividade ou permanece adstrito à realização da prestação, bem como as interrupções e os intervalos previstos no número seguinte.”.

No n.º 2 do referido preceito são diversas pausas equiparadas a tempo de trabalho efetivo, como seja, por exemplo, o intervalo para refeição em que o trabalhador permaneça no espaço habitual de trabalho ou próximo dele, para poder ser chamado a prestar trabalho normal em caso de necessidade [alínea d)].

Assim, de acordo com aquele normativo legal – assim como do disposto no artigo 155.º do Código do Trabalho de 2003 – o tempo de trabalho corresponde ao período em que o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade empregador e no exercício da sua atividade ou das suas funções.

Todavia, em relação ao “tempo de disponibilidade”, a jurisprudência tem-se pronunciado no sentido de que apenas se considera como de trabalho se o trabalhador se mantém em presença física no local de trabalho.

Assim, como se observou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02-11-2004 (Revista n.º 340/04, com sumário disponível em www.stj.pt), “[s]e o trabalhador permanece no local de trabalho e está disponível para trabalhar, esse período de tempo deve considerar-se como tempo de trabalho; se o trabalhador permanece fora do seu local de trabalho, podendo ainda que de forma limitada, gerir os seus interesses e desenvolver atividades à margem da relação laboral, apesar de se encontrar disponível para trabalhar para esta, esse período de tempo não pode em regra considerar-se tempo de trabalho.”.

E acrescenta-se no referido acórdão: “Não pode entender-se como tempo de trabalho o chamado “tempo de localização”, ou seja, aquele em que o trabalhador não tinha que estar presente fisicamente na empresa, mas apenas contactável e disponível, podendo encontrar-se na sua residência ou em qualquer outro local da sua escolha e interesse, desde que lhe permitisse o referido contacto.”.

No mesmo sentido vai o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-02-2005, Proc. n.º 3164/04, disponível em www.dgsi.pt.

Mais recentemente, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-12-2014 (Proc. n.º 715/13.3TTVFX.L1-4, disponível em www.dgsi.pt), (…) sufragou também esse entendimento.

O Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de junho, veio regular determinados aspetos da organização do tempo de trabalho dos trabalhadores móveis em atividade de transporte rodoviário efetuadas em território nacional e abrangidas pelo Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006 (artigo 1.º, n.º 1).

Prescreve a alínea c) do artigo 2.º do referido diploma legal, que se considera «tempo de disponibilidade» “(…) qualquer período, que não seja intervalo de descanso, descanso diário ou descanso semanal, cuja duração previsível seja previamente conhecida pelo trabalhador, nos termos previstos em convenção coletiva ou, na sua falta, antes da partida ou imediatamente antes do início efetivo do período em questão, em que este não esteja obrigado a permanecer no local de trabalho, embora se mantenha adstrito à realização da atividade em caso de necessidade (…)”.

Como decorre deste diploma, o mesmo aplica-se a trabalhadores móveis em atividade de transporte rodoviário abrangida pelo Regulamento n.º 561/2006, entendendo-se por transporte rodoviário, “qualquer deslocação de um veículo utilizado para transporte de passageiros ou de mercadorias efetuada total ou parcialmente por estradas abertas ao público, em vazio ou em carga” [artigo 4.º, alínea a) do Regulamento].

E a alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º do mesmo Regulamento determina que se aplica ao transporte rodoviário de passageiros, “(…) em veículos construídos ou adaptados de forma permanente para transportar mais de nove pessoas, incluindo o condutor, e destinados a essa finalidade”.

É certo que o artigo 3.º do referido Regulamento exclui a sua aplicação a determinados transportes rodoviários, nomeadamente o transporte efetuado por veículos afetos ao serviço regular de transporte de passageiros, cujo percurso de linha não ultrapasse 50 quilómetros [alínea a)].

No entanto, a matéria de facto assente não permite concluir que o transporte em apreciação nos autos se enquadre em qualquer das exceções previstas no referido artigo 3.º.

Assim, nos termos do referido Decreto-Lei, rectius do seu artigo 2.º, alínea c), é «tempo de disponibilidade» aquele em que o trabalhador não está obrigado a permanecer no local de trabalho, embora se mantenha adstrito à realização da atividade em caso de necessidade; e de acordo com o artigo 5.º – em conformidade, aliás, como o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça que se deixou supra descrito – esse tempo de disponibilidade não é considerado tempo de trabalho.

Ou seja, face ao disposto na alínea c) do artigo 2.º do referido diploma legal, para além do tempo de trabalho e do tempo de descanso, em relação aos trabalhadores móveis em atividade de transporte rodoviário efetuado em território nacional, existe também um tertio genus, o “tempo de disponibilidade”, tempo em que o trabalhador não tem qualquer tarefa atribuída nem é chamado a realizar qualquer tarefa e que, de acordo com o artigo 5.º do diploma em referência, não é considerado tempo de trabalho.

De resto, como resulta do que já se disse, esta disposição legal encontra-se em conformidade com o que era a interpretação jurisprudencial, de que o tempo de disponibilidade não era de considerar como tempo de trabalho se o trabalhador permanecia fora do seu local de trabalho, podendo ainda que de forma limitada, gerir os seus interesses e desenvolver atividades à margem da relação laboral, apesar de se encontrar disponível para trabalhar para esta.

Ora, esta é a situação dos autores: durante tais períodos de inatividade/disponibilidade, os autores/motoristas não estavam obrigados a permanecer no espaço físico em que realizavam as suas atividades laborais, nem sequer nas instalações da ré, embora soubessem que podiam ser chamados para ocorrer à realização de qualquer serviço que não estivesse previsto e que fosse necessário assegurar, devendo estar sempre contactáveis (cfr. facto n.º 9); contudo, eles podiam dispor, ainda que de forma limitada, do seu tempo nesse período, a tal não obstando o facto de, normalmente, permanecerem junto das instalações da ré, das respetivas viaturas ou relativas imediações (cfr. facto n.º 10).

Assim, o tempo de disponibilidade dos autores, ou o equivalente no período anterior ao Decreto-Lei n.º 237/2007, tempo esse também designado por alguma doutrina “à chamada” (cfr. Pedro Romano Martinez, et alii, Código do Trabalho Anotado, 2013, 9.ª Edição, Almedina, pág. 477), não é de considerar tempo de trabalho, pelo que ainda que a compensação que lhe era paga a tal título tivesse caráter regular e periódico, a mesma não integra a retribuição, não sendo, por isso, de computar tal tempo para efeitos de apuramento/pagamento do descanso compensatório, bem como da retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

Como se assinalou no acórdão deste tribunal de 07-09-2016, também supra referido, «as quantias pagas para compensar este tempo de disponibilidade, embora traduzam uma componente remuneratória a que o trabalhador tem direito, não integram a retribuição do trabalhador nem gozam da proteção legal que a esta é conferida, pois visam compensar, não o trabalho prestado, mas a especial penosidade que decorre do facto de o trabalhador estar disponível para poder ser chamado em qualquer altura para prestar serviço».

Aqui chegados, nada mais resta acrescentar senão concluir pela improcedência, também nesta parte, das conclusões das alegações de recurso.»


III


1 - Os recorrentes  insurgem-se contra a aplicabilidade à relação de trabalho que os liga à Ré do disposto no Decreto-lei n.º 237/2007, de 19 de junho e, com o apoio do voto de vencido inserto na decisão recorrida, afirmam que «o argumento de que o trabalhador sujeito à disponibilidade pode exercer outras atividades, não colhe, pois, como decorre dos factos provados, o trabalhador está deslocado da sua área de residência, pelo que não lhe será fácil encontrar outra atividade durante o tempo de espera» e que «na prática o trabalhador é pago para ficar inativo, longe do seu centro de vida, em virtude da natureza do seu trabalho» e  uma vez que «provou que está disponível conforme acordado e que como contrapartida é-lhe paga uma quantia, todos os meses, pelo que face ao disposto nos art°s 258° e 263° n° 1 e 264° n° 1 e 2 do CT deve considerar-se parte integrante da retribuição».

Além disso, referem que «o facto de os trabalhadores estarem sempre contactáveis, não sendo embora obrigados a permanecer no espaço físico em que realizam as suas atividades, implica que estes estejam sempre "M..." ao serviço acabando por nunca "desligar" do mesmo, sendo impraticável qualquer atividade pessoal exterior ao desempenho do serviço»

Por outro lado, referem que esta situação de disponibilidade «pode acarretar consequências muito nefastas para a vida do trabalhador, pois se a empresa quiser, o trabalhador pode estar sujeito ao "tempo de disponibilidade" horas sucessivas, considerando que não é "tempo de trabalho", sem que este acabe por ter direito ao descanso ou a "desligar" efetivamente do seu serviço» e porque «isso pode acontecer por tempo indeterminado, o que viola o direito à "organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar" (artigo 59° n° 1 al. b) da CRP) e viola também o direito ao "repouso e aos lazeres, a um limite de jornada de trabalho" (artigo 59° n° 1 al. b) da CRP)».

Terminam assim referindo que «o acórdão da Relação efetuou uma interpretação inconstitucional dos artigos 258° e 263° n° 1 e 264° n°s 1 e 2 do CT, ao considerar que a retribuição paga pelos tempos de disponibilidade não integra o conceito de retribuição, não contando, desse modo, para efeitos dos pagamentos dos descansos compensatórios, das férias e dos subsídios de férias e de Natal».

2 – O Decreto-lei n.º 237/2007, de 19 de junho, tem o seu âmbito de aplicação definindo pelo respetivo artigo 1.º que é o seguinte teor:


«Artigo 1.º

Âmbito e objeto


1 - O presente decreto-lei regula determinados aspetos da organização do tempo de trabalho dos trabalhadores móveis em atividades de transporte rodoviário efetuadas em território nacional e abrangidas pelo Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, relativo à harmonização de determinadas disposições em matéria social no domínio dos transportes rodoviários, adiante referido como regulamento, ou pelo Acordo Europeu Relativo ao Trabalho das Tripulações dos Veículos Que Efetuam Transportes Internacionais Rodoviários (AETR), aprovado, para ratificação, pelo Decreto n.º 324/73, de 30 de junho.

2 - O presente decreto-lei transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2002/15/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março, relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis de transporte rodoviário.

3 - O disposto nos artigos 3.º a 9.º prevalece sobre as disposições correspondentes do Código do Trabalho.»

Resulta do n.º 2 deste dispositivo que aquele diploma transpõe para o ordenamento jurídico interno a «Diretiva n.º 2002/15/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março, relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis de transporte rodoviário».

O âmbito daquele Decreto-Lei não se limita a essa transposição, regulando, conforme decorre do n.º 1 do referido artigo 1.º «determinados aspetos da organização do tempo de trabalho dos trabalhadores móveis em atividades de transporte rodoviário efetuadas em território nacional e abrangidas pelo Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, relativo à harmonização de determinadas disposições em matéria social no domínio dos transportes rodoviários, adiante referido como regulamento, ou pelo Acordo Europeu Relativo ao Trabalho das Tripulações dos Veículos Que Efetuam Transportes Internacionais Rodoviários (AETR), aprovado, para ratificação, pelo Decreto n.º 324/73, de 30 de junho».

Para que não surgissem quaisquer dúvidas sobre a eficácia normativa da disciplina que consagra, por força do n.º 3 deste artigo 1.º o disposto nos artigos 3.º a 9.º prevalece sobre as disposições correspondentes do Código do Trabalho.

Para determinação do sentido deste artigo 1.º do referido Decreto-lei n.º 237/2007, de 19 de junho, importa que se tenha presente que o Regulamento n.º 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de março de 2006 revogou o Regulamento n.º 3820/85 do Conselho de 20 de dezembro de 1985, assumindo o seu âmbito normativo, tendo mantido, embora com alterações, o Regulamento 3821/85 do Conselho, de 20 de dezembro de 1985.

Os regulamentos 3820/85 e 3821/85, ambos de 20 de dezembro de 1985, articulavam-se entre si, sendo que o primeiro tinha por objeto a «harmonização de determinadas disposições em matéria social no domínio dos transportes rodoviários», enquanto que o segundo se referia à introdução de um «aparelho de controlo no domínio dos transportes rodoviários», tendo uma função claramente instrumental na realização dos objetivos definidos pelo primeiro.

O controlo dos tempos de trabalho em matéria de transportes realiza uma multiplicidade de fins que vão da saúde dos trabalhadores à segurança dos transportes rodoviários, num pano de fundo de normalização da concorrência, objeto sempre presente neste tipo de intervenções comunitárias.

Na data em que Diretiva n.º 2002/15/CEE, de 11 de março de 2002, entrou em vigor, o Regulamento n.º 3820, ainda se encontrava em vigor, o que já não sucedia quando foi publicado o referido Decreto-Lei n,º 237/2007, de 19 de junho, que a transpôs para o ordenamento jurídico interno, uma vez que já tinha entrado em vigor o mencionado Regulamento n.º 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006.

Resulta do disposto na alínea c) do artigo 2.º daquele Decreto-Lei que se entende por tempo de disponibilidade «qualquer período, que não seja intervalo de descanso, descanso diário ou descanso semanal, cuja duração previsível seja previamente conhecida pelo trabalhador, nos termos previstos em convenção coletiva ou, na sua falta, antes da partida ou imediatamente antes do início efetivo do período em questão, em que este não esteja obrigado a permanecer no local de trabalho, embora se mantenha adstrito à realização da atividade em caso de necessidade, bem como, no caso de trabalhador que conduza em equipa, qualquer período que passe ao lado do condutor ou num beliche durante a marcha do veículo».

Por sua vez resulta do artigo 5.º daquele diploma que o tempo de disponibilidade «previsto na alínea c) do artigo 2.º, não é considerado tempo de trabalho».

O conceito de tempo de disponibilidade resultava da alínea b) do artigo 3.º da Diretiva 2002/15/CE, de 11 de março de  2002, que o definia nos seguintes termos:

«b) "Tempo de disponibilidade":

- os períodos não correspondentes a períodos de pausa ou de repouso, durante os quais o trabalhador móvel não é obrigado a permanecer no seu posto de trabalho, mantendo-se no entanto disponível para responder a eventuais solicitações no sentido de iniciar ou retomar a condução ou de efetuar outros trabalhos. São considerados tempo de disponibilidade, nomeadamente, os períodos durante os quais o trabalhador móvel acompanha um veículo embarcado num ferry-boat ou transportado de comboio, bem como os períodos de espera nas fronteiras ou devido a proibições de circulação.

Estes períodos e a sua duração previsível devem ser previamente conhecidos do trabalhador móvel, isto é, antes da partida ou imediatamente antes do início efetivo do período em questão, ou de acordo com as condições gerais negociadas entre os parceiros sociais e/ou definidas pela legislação dos Estados-Membros,

- para os trabalhadores móveis que conduzem em equipa, o tempo passado ao lado do condutor ou numa couchette durante a marcha do veículo.»

Importa ainda que se tenha presente que o Regulamento n.º 3821 do Conselho foi revogado pelo Regulamento (EU) n.º 165/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 4 de fevereiro de 2014, entrado em vigor no dia seguinte ao da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia, que ocorreu em 28 de fevereiro de 2014.

Resulta do n.º 1 do artigo 1.º deste Regulamento, que o mesmo «estabelece as obrigações e os requisitos relacionados com a construção, instalação, utilização, ensaio e controlo dos tacógrafos utilizados nos transportes rodoviários para verificar o cumprimento do Regulamento (CE) n.º 561/2006, da Diretiva 2002/15/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (14) e da Diretiva 92/6/CEE do Conselho (15)».

A disciplina que emerge do referido Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de junho, abrange o universo das relações de trabalho na área dos transportes rodoviários sujeitos ao Regulamento n.º 561/2006 e à Diretiva 2002/15/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, sujeitos ou não às obrigações decorrentes do Regulamento n.º 3821/85 do Conselho e do diploma que agora o revogou.

3 – Tal como os recorrentes delimitaram o objeto do presente recurso, está em causa saber se o tempo de disponibilidade deve ser tomado no pagamento dos descansos compensatórios e na remuneração das férias, subsídio de férias e de Natal.

Os autores auferiam uma compensação relativa ao tempo de disponibilidade e não é essa compensação que está em causa no presente recurso.

O que se discute é se a compensação auferida deve ser considerada como retribuição de trabalho, para os efeitos do pagamento dos descansos compensatórios e da remuneração das férias, subsídio de férias e de Natal.

A decisão recorrida considerou que tal compensação não podia ser considerada como retribuição de trabalho prestado nos termos dos artigos 249.º do Código do Trabalho de 2003 e do artigo 258.º do Código do Trabalho de 2009 e que o tempo de disponibilidade não podia ser considerado como tempo de trabalho.

Merecem a nossa adesão as judiciosas considerações feitas na decisão recorrida sobre essa questão.

Sem porem diretamente em causa esse segmento da decisão, entendem os recorrentes que a orientação subjacente ao decidido deixa nas mãos do empregador sujeitar o trabalhador a um tempo de trabalho indeterminado, o que violaria o direito à "organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar" (artigo 59° n° 1 al. b) da CRP) e o direito ao "repouso e aos lazeres, a um limite de jornada de trabalho" (artigo 59° n° 1 al. b) da CRP)».

Além disso tal orientação violaria segundo os recorrentes «o artigo 59° n° 1 al. a) da Constituição da República Portuguesa "na parte em que, assim, deixa de ser paga ao trabalhador a retribuição segundo a quantidade, qualidade e natureza do trabalho"».

Tal como acima se referiu, a orientação subjacente ao direito da União Europeia, em matéria de tempo de trabalho dos trabalhadores dos transportes rodoviários, contrapõe

«tempo de trabalho» a «tempo de disponibilidade».

No âmbito do tempo de trabalho inclui, conforme decorre da a) do artigo 3.º da Diretiva 2002/15/CEE, de 11 de março, o seguinte: 

«a) "Tempo de trabalho":

1. No caso dos trabalhadores móveis, o período compreendido entre o começo e o fim do trabalho, durante o qual o trabalhador se encontre no seu posto de trabalho, à disposição do empregador e no exercício das suas funções ou atividades, ou seja:

- o tempo consagrado a todas as atividades de transporte rodoviário. Essas atividades incluem, nomeadamente:

i) condução;

ii) carga e descarga;

iii) assistência aos passageiros que entrem ou saiam do veículo;

iv) limpeza e manutenção técnica;

v) todas as restantes tarefas destinadas a assegurar a segurança do veículo, carga e passageiros ou a satisfazer as obrigações legais ou regulamentares diretamente ligadas à operação específica de transporte em curso, incluindo o controlo das operações de carga e descarga, formalidades administrativas com a polícia, alfândegas, serviços de imigração, etc.

- os períodos durante os quais não pode dispor livremente do seu tempo, sendo-lhe exigida a presença no posto de trabalho, pronto para retomar o trabalho normal, desempenhando certas tarefas associadas ao serviço, nomeadamente períodos de espera pela carga ou descarga cuja duração previsível não seja antecipadamente conhecida, isto é, antes da partida ou imediatamente antes do início efetivo do período em questão, ou de acordo com as condições gerais negociadas entre os parceiros sociais e/ou previstas pela legislação dos Estados-Membros.

2. No caso dos condutores independentes é aplicável a mesma definição de período comprendido entre o começo e o fim do trabalho, durante o qual o trabalhador independente se encontre no posto de trabalho, à disposição do cliente e no exercício das suas funções ou atividades, exceto se se tratar de trabalho administrativo geral não diretamente ligado à operação especifica de transporte em curso.

São excluídos do tempo de trabalho os períodos de pausa referidos no artigo 5.º, os períodos de repouso referidos no artigo 6.º e ainda, sem prejuízo da legislação dos Estados-Membros ou de acordos entre os parceiros sociais que prevejam a compensação ou limitação desses períodos, o tempo de disponibilidade referido na alínea b) do presente artigo».

Sobre os períodos de pausa e de repouso disciplinam os referidos artigos 5.º e 6.º do seguinte teor:


«Artigo 5.º

Períodos de pausa


1. Os Estados-Membros tomam as medidas necessárias para que, sem prejuízo do nível de proteção previsto no Regulamento (CEE) n.o 3820/85 ou, quando aplicável, no Acordo AETR, as pessoas que exerçam atividades móveis de transporte rodoviário, sem prejuízo do n.º 1 do artigo 2.º, não trabalhem em circunstância alguma durante mais de seis horas consecutivas sem uma pausa. O tempo de trabalho é interrompido por uma pausa de, pelo menos, 30 minutos se o total de horas de trabalho estiver compreendido entre seis e nove e de, pelo menos, 45 minutos se o total de horas de trabalho for superior a nove.

2. As pausas podem ser subdivididas em períodos de, pelo menos, 15 minutos cada.»


«Artigo 6.º

Períodos de repouso


Para efeitos da presente diretiva, os formandos e aprendizes estão submetidos, em matéria de períodos de repouso, às mesmas disposições de que beneficiam os outros trabalhadores móveis em aplicação do Regulamento (CEE) n.º 3820/85 ou, quando aplicável, do Acordo AETR.»

Por outro lado, como bem demonstra a Exm.º Procuradora Geral Adjunta no seu parecer, com apoio na jurispudência deste Tribunal e no direito da União Europeia, este período de tempo, ao não exigir a presença do trabalhado no seu local de trabalho, não pode ser considerado como tempo de trabalho para efeitos retributivos.

Tem deste modo inteiro cabimento nesta área a jurisprudência fixada no acórdão desta Secção desta Secção de 19 de novembro de 2008, proferido no processo como o n.º 08S0930[1], de que foi extraído o seguinte sumário:

«I – O direito comunitário, como o nosso direito interno, dividem o tempo de cada trabalhador por conta de outrem, em duas grandes categorias dicotómicas: tempo de trabalho e tempo de descanso.

II – O tempo de trabalho corresponde ao período em que o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade empregadora e no exercício da sua atividade ou das suas funções; o tempo de descanso obtém-se por exclusão, de onde decorre que o respetivo conceito pressupõe a prévia e necessária integração da primeira modalidade (tempo de trabalho).

III – A disponibilidade relevante, para efeitos da sua qualificação como tempo de trabalho, pressupõe que o trabalhador permaneça no seu local de trabalho.

IV – Assim, se o trabalhador permanece no seu local de trabalho e se encontra disponível para trabalhar, esse período de tempo deve considerar-se como tempo de trabalho; se o trabalhador permanece disponível ou acessível para trabalhar, mas fora do seu local de trabalho ou do local controlado pelo empregador (por exemplo, no seu domicílio), esse período de tempo deve considerar-se como tempo de repouso.»

No que se refere aos períodos de disponibilidade já acima referidos, carece de qualquer fundamento a afirmação dos recorrentes de que os mesmos deixam os trabalhadores nas mãos do empregador, podendo ser sujeitos a um tempo de trabalho indeterminado, o que no seu entender violaria o direito à "organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar" (artigo 59° n° 1 al. b) da CRP) e viola também o direito ao "repouso e aos lazeres, a um limite de jornada de trabalho" (artigo 59° n° 1 al. b) da CRP)».

Na verdade, os períodos de disponibilidade são do conhecimento do trabalhador quando inicia qualquer jornada de trabalho.

Com efeito, refere expressamente a Diretiva na alínea b) do artigo 3.º acima transcrito que «Estes períodos e a sua duração previsível devem ser previamente conhecidos do trabalhador móvel, isto é, antes da partida ou imediatamente antes do início efetivo do período em questão, ou de acordo com as condições gerais negociadas entre os parceiros sociais e/ou definidas pela legislação dos Estados-Membros».

Nesta linha, a definição que consta do artigo 3.º alínea c) do Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de junho, exige expressamente que antes do início de um período de atividade seja dado conhecimento ao trabalhador desses períodos.

O tempo de disponibilidade libertando o trabalhador da obrigação de permanecer no seu local de trabalho, embora sujeito à obrigação de manter contacto com o empregador, é também um dos elementos estruturantes da gestão do tempo de trabalho e da realização dos objetivos que estão subjacentes ao Direito da União Europeia nesta área.

Não sendo tempo de prestação efetiva de trabalho e não conferindo direito a uma retribuição em sentido técnico, nem por isso a disponibilidade que lhe está subjacente deixa de motivar o pagamento de uma compensação adequada.

Fazendo parte da organização do tempo de trabalho dos trabalhadores dos transportes rodoviários, o tempo de disponibilidade não confere ao empregador qualquer dimensão de arbitrariedade na gestão do tempo de trabalho dos trabalhadores e não põe em causa os princípios constitucionais decorrentes alíneas a), b) e d) do artigo 59.º da Constituição da República.

Resulta daqueles dispositivos que «1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito: a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna; b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar; d) Ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas».

Tal como acima se referiu, a disciplina dos tempos de trabalho dos trabalhadores rodoviários realiza objetivos que se prendem com a salvaguarda da sua saúde, da segurança dos transportes e dos valores que por via indireta a mesma realiza.

O tempo de disponibilidade, contraposto ao tempo de trabalho, aos períodos de pausa e de repouso, é parte integrante deste modelo e contribui de forma relevante para a realização dos objetivos que lhe estão subjacentes, e, por outro lado, responde a preocupações que se prendem com os fundamentos da União Europeia, nomeadamente na sua dimensão económica, com expressão na tutela da concorrência.

A não consideração do tempo de disponibilidade como tempo de trabalho e o não reconhecimento à compensação paga de natureza retribuitiva decorre da especificidade das obrigações a que o trabalhado está sujeito durante aquele período de tempo, em que não presta efetivamente a atividade contratada com o empregador.

Com efeito, durante esse período de tempo o trabalhador tem de estar contactável pelo empregador e ter disponibilidade para retomar o exercício de funções  - «estar adstrito à realização da atividade em caso de necessidade», mas, apesar dessas limitações, pode dispor livremente do seu tempo, não tendo de permanecer no seu local de trabalho.

A essa sujeição respeita uma compensação específica paga pelo empregador que, por não ser contrapartida da prestação efetiva de serviço, não tem natureza retributiva nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 258.º do Código do Trabalho.

A natureza das obrigações a que o trabalhador está sujeito durante este período de tempo determina que tal compensação não tenha natureza retributiva, não decorrendo daí qualquer lesão dos direitos que emergem das alíneas a), b) e d) da Constituição da República.


IV


Em face do exposto, acorda-se em negar a revista e em confirmar a decisão recorrida.

Sem custas, uma vez que os recorrentes beneficiam da isenção decorrente da alínea h) do n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais e sem prejuízo do disposto n.º 6 do mesmo artigo, no que se refere aos encargos, uma vez que a pretensão dos recorrentes foi integralmente vencida.

Junta-se sumário do acórdão.

Lisboa, 2 de maio de 2018

António Leones Dantas (Relator)

Júlio Gomes

Ribeiro Cardoso

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[1] Disponível nas Bases de Dados Jurídicas da DGSI.