Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3ª SECÇÃO | ||
Relator: | ROSA TCHING | ||
Descritores: | RECURSO DE DECISÃO CONTRA JURISPRUDÊNCIA FIXADA NULIDADE OMISSÃO ACUSAÇÃO ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS DOLO | ||
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Data do Acordão: | 02/22/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA | ||
Decisão: | REJEITADO | ||
Área Temática: | DIREITO PROCESSUAL PENAL – JULGAMENTO / AUDIÊNCIA / PRODUÇÃO DA PROVA / SENTENÇA. | ||
Doutrina: | -Manuel Simas Santos e Manuel Leal Henriques, Recursos Penais, 8.ª edição, p. 183 e 209. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 358.º E 379.º, N.º 1, ALÍNEA C). | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 20-01-2014, PROCESSO N.º 29/08.0IDAVR-A.S1; - DE 13-02-2014, PROCESSO N.º 432/06.0JDLSB-O.S1; - DE 01-02-2017; - DE 01-02-2017, PROCESSO N.º 446/07.3ECLSB.L1-C.S1; - ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 1/2015, DE 11/20/2014, IN DR, 1ª SÉRIE – Nº18 - DE 27 DE JANEIRO DE 2015. | ||
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Sumário : | I - Contrariamente ao que entende o recorrente, nem o acórdão de 08-11-2016, que julgou improcedente a nulidade por ele arguida nos termos do art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP, relativamente ao acórdão proferido pelo mesmo tribunal da relação em 05-07-2016, nem este acórdão, foram proferidos contra a jurisprudência fixada constante do AFJ 1/2015. II - Nos referidos acórdão estava em causa a inclusão, na segunda sentença, de factos que, apesar de constarem da acusação pública, bem como do despacho de pronúncia e de se configurarem como essenciais para o preenchimento do tipo subjectivo dos ilícitos pelos quais o arguido e ora recorrente tinha sido objecto de condenação, não foram objecto de apreciação por parte do tribunal do primeiro julgamento, não se verificando, por isso, qualquer falta de descrição, na acusação e pronúncia, dos elementos subjectivos do crime, nem o tribunal recorreu ao mecanismo previsto no art. 358.º, do CPP. III - Diferentemente, a questão de direito decidida no AFJ 1/2015, reporta-se aos casos em que ocorre uma omissão total ou parcial, na acusação, de elementos constitutivos do tipo subjectivo do ilícito a que nela se faz referência, nomeadamente do dolo, que no dizer do referido acórdão, não pode ser suprida pelo tribunal do julgamento por recurso ao mecanismo previsto no art. 358.º, do CPP. | ||
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Decisão Texto Integral: | Recurso de Uniformização de Jurisprudência[1]
I. RELATÓRIO
1. AA, arguido melhor identificado nos autos supra referenciados, notificado do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, de 8 de novembro de 2016, que julgou improcedente a nulidade por ele invocada, nos termos do artigo 379.º, n.º 1, al. c) do CPP, relativamente ao acórdão proferido pelo mesmo Tribunal da Relação em 05.07.2016, vem, ao abrigo do disposto no artigo 446.º, nsº 1 e 2, do Código de Processo Penal, interpor recurso de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº1/2015, de 11/20/2014, publicado no DR, 1ª série – nº18 - de 27 de Janeiro de 2015, terminando a sua motivação com as seguintes conclusões: «(i) O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, ora recorrido, declarou a nulidade da sentença de 1.ª instância por violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do Código de Processo Penal. (ii) No entanto, o acórdão recorrido, ao remeter os autos à 1.ª instância, aditou elementos sobre a imputação subjetiva do crime ao recorrente, com vista a suprir a nulidade. (iii) Acontece que o Acórdão uniformizador de jurisprudência proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, a 20 de Novembro de 2014, dispõe que “A falta de descrição na acusação, dos elementos subjectivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no art. 358.º do CPP" (iv) O entendimento jurisprudencial postulado por este acórdão uniformizador não foi respeitado, e em consequência aplicado, pelo douto acórdão recorrido. (v) Face ao exposto, deverão os elementos aditados à sentença de 1.ª instância considerar-se por "não escritos" e, em consequência, ser o acórdão recorrido revogado, determinando a absolvição do Recorrente do crime pelo qual vem condenado. Nestes termos e nos demais de Direito, deverá o presente recurso ser admitido e julgado procedente e, em consequência, deverá o acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que aplique a jurisprudência fixada». 2. Respondeu a Exmª Magistrada do Ministério Público, nos seguintes termos: «(…) 1- De harmonia com o estatuído no artigo 446° do Código de Processo Penal é admissível recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça de qualquer decisão proferida contra jurisprudência por ele fixada, a interpor no prazo de 30 dias a contar do transito em julgado da decisão recorrida (nºl). O recurso pode ser interposto pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis e é obrigatório para o Ministério Público (nº2). 2- A questão a decidir consiste em saber se o acórdão recorrido proferido por este Tribunal da Relação de Évora ordenou à 1 a instância, ilegalmente, um aditamento de novos factos relativos à imputação subjectiva do crime ao recorrente em termos que contrariam o Acórdão Uniformizador acima indicado que fixou Jurisprudência no sentido de que « a falta de descrição, na acusação, dos elementos subjectivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no artigo 358º do CPP. 3- Sem prejuízo de se consignar que o acórdão recorrido foi proferido antes da decisão e publicação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência que, como se sabe, não dispõe para o passado e, sem prejuízo, de se sublinhar o que foi decidido no 2° ( segundo) acórdão deste Tribunal da Relação de Évora, de 05-07-2016, ou seja, que a matéria que o recorrente pretende ter sido, ilegalmente, aditada constava já, quer da acusação, quer da pronúncia e, por isso, se a relação observou que tal matéria constava da acusação e da pronúncia..., não faz sentido invocar agora o AU] n° 1/2015, pois este visou precisamente uniformizar a jurisprudência aplicável nas situações opostas à que ocorre aqui. Ou seja, é aplicável aos casos em que ocorre uma insuficiente descrição factual do dolo na acusação, deficiência, essa sim, que não pode vir a ser suprida em julgamento (acórdão citado) importará referir que a questão suscitada pelo recorrente foi decidida, com força de caso julgado, no primeiro acórdão proferido por este Tribunal da Relação e que o recurso em presença foi apresentado muito para além do prazo de 30 dias a contar da data do transito em julgado da decisão recorrida, ou seja, muito para além do prazo legalmente estatuído. 4- Nessa medida, e em conc1usão, inverificado o requisito temporal processualmente exigido para a prática do acto, o recurso interposto apresenta-se inadmissível.». 3. O assistente, BB, em resposta ao recurso interposto, concluiu nos seguintes termos: « 1- O acórdão do Tribunal da Relação de Évora, ora recorrido, considerou que a sentença da 1ª instância, que havia condenado o recorrente, era omissa quanto a alguns elementos para a imputação subjectiva do crime ao recorrente. 2- E era omissa, precisamente porque, foi “considerado que a matéria em causa, embora constante da acusação e da pronúncia, não havia merecido o tratamento que se impunha na “decisão de facto” da sentença”. 3- Assim, o acórdão do Tribunal da Relação de Évora decidiu devolver os autos à 1ª instância para o suprimento da omissão de pronúncia na sentença, relativamente a matéria de facto constante da acusação e da pronúncia, constatada pelo Tribunal de recurso. 4- No caso em apreço, nem se verificou qualquer “falta de descrição, na acusação [e pronúncia], dos elementos subjectivos do crime”, nem o Tribunal recorreu ao mecanismo previsto no artº. 358º, do CPP. 5- O que o acórdão do Tribunal da Relação de Évora considerou foi existir “uma omissão de pronúncia, relativa aos factos (…) constantes da acusação e que o tribunal a quo sobre os mesmos não se pronunciou, fosse nos factos provados, fosse nos factos não provados”. Circunstância geradora de “uma nulidade da decisão recorrida, nos termos do artº. 379º, nº. 1, al. c) do CPP, sanável pela baixa dos autos à 1ª instância para que seja proferida nova sentença”, nos termos do nº. 2 do mesmo preceito legal.
6- Deste modo, a previsão do acórdão uniformizador de jurisprudência de 20.11.2014, não tem aplicação ao caso em apreço, por serem absolutamente distintas as respectivas premissas, pelo que o acórdão recorrido não violou o entendimento jurisprudencial postulado no mesmo.
Pelo exposto, não se vislumbrando como é que o acórdão do Tribunal da Relação de Évora possa ter sido proferido contra jurisprudência fixada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20.11.2014, deverá o recurso interposto ser rejeitado ou, caso assim não de entenda, ser julgado improcedente por não verificação dos pressupostos de natureza substantiva previstos no artº. 446º do CPP.»
«(…) c) Segundo a certidão de fls. 34-35, o acórdão recorrido foi «notificado ao Magistrado do Ministério Público por termo nos autos em 08-11-2016 e por via postal expedida em 09-11-2016, aos sujeitos processuais», e que «transitou em julgado no dia 14 de dezembro de 2016». II a) Como se disse, o recorrente definiu como acórdão recorrido o proferido a 8 de Novembro de 2016, o qual, pela informação prestada na certidão, salvo alguma circunstância não relatada na mesma certidão, não transitou no narrado dia 14 de Dezembro de 2016. Com efeito presumindo-se notificado a 14 de Novembro de 2016 (terceiro dia útil posterior à expedição da carta), e não admitindo recurso ordinário, transitou decorridos 10 dias, e não dos contabilizados 30 dias. Assim, tendo transitado a 24 de Novembro, o recurso é tempestivo. b) Da oposição: Como se percepciona do texto do acórdão recorrido, este aresto elencou como questão a conhecer a Alteração de factos e violação do AUJ nº 1/2015 da segunda sentença (fls.84 – 3.2.a.1). E porque assim, consideramos o presente recurso tempestivo. Porém, como se expressa no acórdão recorrido a fls. 84 a 88, esta «questão aparece como nova, mas é-o apenas na vertente da sua suscitação em recurso». «(…) das questões trazidas agora pelo arguido, com o teor do primeiro acórdão da Relação (onde se encontram resolvidas), coberta pelo caso julgado está também a decisão – que o arguido renova portanto indevidamente – sobre a ilegalidade de um invocado aditamento de factos novos, pretensamente escorada agora no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência publicado em data posterior ao primeiro acórdão da Relação… Acontece que a questão colocada foi decidida pela Relação no acórdão anterior, que muito justamente ordenou a inclusão de tais factos no tema da prova. E ordenou-a, por ter precisamente considerado que a matéria em causa, embora constante da acusação e da pronúncia, não havia merecido o tratamento que se impunha, na “decisão de facto” da sentença. E se a Relação observou que tal matéria constava da acusação e da pronúncia (tendo sido, por isso, deixada fora da primeira sentença indevidamente), não faz sentido invocar agora o AUJ nº 1/2015, pois este visou precisamente uniformizar jurisprudência nas situações opostas à que ocorre aqui. Ou seja, é aplicável aos casos em que ocorre uma insuficiente descrição factual do dolo na acusação, deficiência, essa sim, que não pode vir a ser suprida em julgamento. Essa insuficiência não ocorria na hipótese presente». Em suma: O acórdão recorrido, pronunciando-se sobre as questões constantes do recurso da segunda sentença, nomeadamente da violação do AUJ, referiu, de forma cristalina, que esta segunda sentença cumpriu o primeiro acórdão da mesma Relação ao incluir factos que constavam da acusação sobre os quais a primeira sentença não se tinha pronunciado. Vale por dizer que o acórdão ora recorrido, defensor da tese jurisprudencial firmada, e de acordo com esta, decidiu que os factos relativos ao dolo já constavam da acusação e que a segunda sentença, cumprindo o primeiro acórdão da Relação, considerou-os na decisão, ao contrário do que sucedera com a primeira (sentença). Pelo exposto, e julgando-se desnecessárias outras considerações, por inexistência de oposição à jurisprudência fixada, deverá o recurso ser rejeitado – art. 441.º, n.º 1 do Cód. Proc. Penal.»
6. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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II- FUNDAMENTAÇÃO. 2.2. Traçadas as linhas gerais da admissibilidade do recurso para fixação de jurisprudência, importa, agora, apreciar o caso em apreço, tendo em conta, segundo a certidão junta a fls. 33 a 129 dos presentes autos, que:
a) No processo comum singular nº 3737/09.5TDLSB, que correu termos no ...º Juízo Criminal de ..., foi proferida uma primeira sentença que, para além do mais, condenou o arguido, AA, pela prática de crimes de difamação agravada, de um crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva agravado e no pagamento de indemnização aos demandantes civis.
b) Inconformado com esta decisão, dela recorreu este arguido para o Tribunal da Relação de Évora, que, proferiu acórdão, afirmando «Descendo ao concreto da situação dos autos, constata-se que o tribunal a quo não se pronunciou sobre matéria constante da acusação que se afigura como essencial para a fixação deste elemento subjectivo dos crimes em causa. Trata-se de três segmentos da acusação pública, acolhidos pela pronúncia, que o tribunal a quo ignorou, não os colocando nos factos provados nem nos não provados, os quais, sempre com o natural respeito por opinião contrária, se configuram como essenciais para o desenho da dimensão subjectiva dos ilícitos pelos quais o arguido AA foi objecto de condenação. São eles os seguintes: - “Os conteúdos das referidas notícias não correspondiam à verdade e os arguidos não tinham qualquer fundamento para os refutar verdadeiros” - “As notícias supra referidas e o destaque daquelas edições, ofenderam a credibilidade, o prestígio e a confiança devidos ao Ministério Público junto do departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa” - “Ao atribuírem àqueles magistrados a falta de promoção da detenção do alegado autor de vários crimes de abuso sexual de menores, quando era seu dever, decorrente do exercício das suas funções, sugeriram com clareza que aqueles magistrados estariam incursos na prática do crime de prevaricação e denegação de justiça”. (…) Há assim uma omissão de pronúncia, relativa aos factos atrás descritos, constantes da acusação e que o tribunal a quo sobre os mesmos não se pronunciou, fosse nos factos provados, fosse nos não provados. Esta circunstância gera uma nulidade da decisão recorrida, nos termos do art. 379º, nç1, al c) do CPP, sanável pela baixa dos autos à 1ª instância para que seja proferida nova sentença, nos termos do nº2 do mesmo comando legal. Caberá assim ao tribunal recorrido proferir nova decisão, onde se dê cumprimento ao atrás exposto de modo a suprir tal nulidade, a qual, sendo de conhecimento oficioso, pois trata-se de um vício reportado ao art. 374º do CPP, tem uma tramitação própria e diferenciada do regime geral das nulidades dos restantes actos processuais (…) ».
c) Na sequência deste acórdão, o tribunal a quo proferiu uma segunda sentença que, suprindo a denunciada omissão de pronúncia, decidiu, para além do mais, condenar o ora recorrente, AA, como autor de três crimes de difamação agravada, de um crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva agravado, na pena única de 495 dias de multa, à taxa diária de €8,00, e ainda a pagar a cada um dos assistentes BB e CC, a quantia de € 5.000,00, por danos não patrimoniais, absolvendo-o do remanescente pedido, sendo a quantia devida á assistente acrescida de juros.
d) Inconformado, de novo, com esta decisão, dela recorreu o arguido AA para o Tribunal da Relação de Évora, concluindo, para além do mais, que: «(…) 2. Entende o recorrente que a sentença proferida pelo tribunal a quo está em manifesta oposição com o Acórdão Uniformizados de Jurisprudência, proferido nos autos que, com o número 17/07.04GBOR.E2-A.S1 correram termos pelo Supremo Tribunal de Justiça. 3. Salvo melhor opinião, a decisão proferida naquele Acórdão impõe uma decisão nos presentes autos que absolva o recorrente do crime em causa. 4. Numa tentativa de sanar a omissão de não ter sido referido o elemento subjectivo, o tribunal a quo inseriu elementos que entendeu serem adequados a preencher o elemento subjectivo, em concreto os seguintes factos: 5. (…) 6. “43-A) A alusão nas notícias supra transcritas de que existia uma situação de flagrante delito não corresponde à verdade”; 7. “43-B) A alusão nas notícias supra transcritas de que o assistente poderia ter detido o suspeito não corresponde à verdade”; 8. “43-C) A alusão nas notícias supra transcritas de que as assistentes viram o menor deitado na cama do suspeito e que encontraram provas dos crimes aí cometidos não corresponde à verdade”; 9. “43-D) O arguido AA não tinha qualquer fundamento para reputar como verdadeira a situação de flagrante delito referida em 43-A)”; 10. “43-E) As notícias supra referidas e o destaque daquelas edições, ofenderam a credibilidade, o prestígio e a confiança devidos ao Ministério Público junto do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa” (…)».
e) No acórdão que proferiu em 05.07.2016 o Tribunal da Relação de Évora, conhecendo da questão suscitada pelo arguido/recorrente, afirmou: « questão aparece como nova, mas é-o apenas na vertente da sua suscitação em recurso». «(…) das questões trazidas agora pelo arguido, com o teor do primeiro acórdão da Relação (onde se encontram resolvidas), coberta pelo caso julgado está também a decisão – que o arguido renova portanto indevidamente – sobre a ilegalidade de um invocado aditamento de factos novos, pretensamente escorada agora no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência publicado em data posterior ao primeiro acórdão da Relação… Acontece que a questão colocada foi decidida pela Relação no acórdão anterior, que muito justamente ordenou a inclusão de tais factos no tema da prova. E ordenou-a, por ter precisamente considerado que a matéria em causa, embora constante da acusação e da pronúncia, não havia merecido o tratamento que se impunha, na “decisão de facto” da sentença. E se a Relação observou que tal matéria constava da acusação e da pronúncia (tendo sido, por isso, deixada fora da primeira sentença indevidamente), não faz sentido invocar agora o AUJ nº 1/2015, pois este visou precisamente uniformizar jurisprudência nas situações opostas à que ocorre aqui. Ou seja, é aplicável aos casos em que ocorre uma insuficiente descrição factual do dolo na acusação, deficiência, essa sim, que não pode vir a ser suprida em julgamento. Essa insuficiência não ocorria na hipótese presente». Termos em que considerou inexistir a invocada alteração de factos pretensamente não comunicada ao arguido e não ocorrer também violação ao AUJ do STJ nº 1/2015.
f) Inconformado com esta decisão, o arguido arguiu a nulidade deste acórdão, na sequência do que o Tribunal da Relação de Évora, em 8 de novembro de 2016, proferiu acórdão, que julgou improcedente a nulidade arguida nos termos do artigo 379.º, n.º 1, al. c) do CPP.
g) Este acórdão foi notificado ao Ministério por termo nos autos em 08-11-2016 e, por via postal, expedida em 09-11-2016, aos sujeitos processuais. * 2.3. Perante este quadro factual e começando pela apreciação dos pressupostos formais, importa, desde logo, afirmar a legitimidade do recorrente (arguido) bem como a tempestividade do recurso por ele interposto. Com efeito, tendo o arguido sido notificado do acórdão recorrido, por via postal, expedida em 09-11-2016 ( cfr. certidão de fls. 34), de harmonia com o disposto no art. 113º, nº2 do CPP, tal notificação presume-se feita no dia 14 de novembro de 2016 (terceiro dia útil posterior à expedição da carta). Acresce que, não sendo admissível recurso ordinário do acórdão em causa, o mesmo transitou em julgado decorridos 10 dias, ou seja, em 24 de novembro de 2016. E porque o requerimento de interposição do recurso deu entrada neste tribunal em 09.12.2016 (cfr. fls. 6), impõe-se concluir que, observando o prazo de 30 dias, o presente recurso é tempestivo. * Quanto à oposição de julgados, defende o recorrente que o acórdão recorrido contraria o Acórdão do STJ de fixação de Jurisprudência nº1/2015, de 11/20/2014, publicado no DR, 1ª série – nº18 - de 27 de Janeiro de 2015, que decidiu que: «A falta de descrição, na acusação, dos elementos subjectivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no artigo 358º do Código de Processo Penal ». Todavia, contrariamente ao que entende o recorrente, nem o acórdão de 08.11.2016, que julgou improcedente a nulidade por ele arguida nos termos do artigo 379.º, n.º 1, al. c) do CPP, relativamente ao acórdão proferido pelo mesmo Tribunal da Relação em 05.07.2016, nem este acórdão, foram proferidos contra a jurisprudência fixada no supra referido Acórdão do STJ nº 1/2015. É que, conforme resulta do teor dos referidos acórdãos ( cfr. as alíneas e) e f) do ponto 2.2), a questão de direito neles suscitada e decidida é bem distinta da questão de direito apreciada e decidida no citado acórdão de fixação de jurisprudência, cuja doutrina não foi, por isso, desrespeitada. Nos referidos acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Évora, estava em causa a inclusão, na segunda sentença, de factos que, apesar de constarem da acusação pública bem como do despacho de pronúncia e de se configurarem como essenciais para o preenchimento do tipo subjectivo dos ilícitos pelos quais o arguido e ora recorrente tinha sido objecto de condenação, não foram objecto de apreciação por parte do tribunal do primeiro julgamento, não se verificando, por isso, qualquer falta de descrição, na acusação e pronúncia, dos elementos subjectivos do crime, nem o tribunal recorreu ao mecanismo previsto no artº. 358º, do CPP. Diferentemente, a questão de direito decidida no acórdão de fixação de jurisprudência nº 1/2015, reporta-se aos casos em que ocorre uma omissão total ou parcial, na acusação, de elementos constitutivos do tipo subjectivo do ilícito a que nela se faz referência, nomeadamente do dolo, que no dizer do referido acórdão, não pode ser suprida pelo tribunal do julgamento por recurso ao mecanismo previsto no artigo 358º do Código de Processo Penal. Daí que, não havendo oposição de julgados, por falta de identidade de facto respeitante à mesma questão de direito, se imponha concluir pela rejeição do recurso interposto, nos termos do disposto no art. 441, nº1 do CPP.
Termos em que acordam os Juízes da 3ª Secção deste Supremo Tribunal em rejeitar, de harmonia com o disposto no art. 441º, nº1 do CPP, o presente recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada.
Custas pelo recorrente, nos termos dos artigos 513º, nº1 do CPP, fixando-se a taxa de justiça em 4 UCs.
Supremo Tribunal de Justiça, 22 de fevereiro de 2017 (Texto elaborado e revisto pela relatora – artigo 94.º, n.º 2, do CPP). Rosa Tching (Relatora) Santos Cabral ------------------ |