Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
08B357
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MOTA MIRANDA
Descritores: CARTÃO DE CRÉDITO
CARTÃO DE DÉBITO
BANCO
CONTA BANCÁRIA
CONTA CONJUNTA
CONTA SOLIDÁRIA
CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
COMUNICAÇÃO
NULIDADE
ASSINATURA
LETRA
EXCLUSÃO DE CLÁUSULA
EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE
ÓNUS DA PROVA
INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA
MEIOS DE PROVA
PRESUNÇÃO
COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS
RECONHECIMENTO DA DÍVIDA
Nº do Documento: SJ2008051503577
Data do Acordão: 05/15/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE
Sumário :
I - O banco X utiliza no clausulado dos cartões (de crédito e de débito) uma letra de dimensão reduzida, com um espaço entre as linhas também muito reduzido, formando um texto muito compacto que torna a sua leitura difícil e cansativa mesmo para quem possua uma visão média, dificultando, consequentemente, a compreensão e apreensão do sentido do texto; daí que tal clausulado tenha de ser excluído dos contratos singulares, devendo o banco X abster-se da sua utilização em futuros contratos - arts. 8.º e 9.º, n.º 2, al. a), e n.º 3, da Lei n.º 24/96, de 31-07, e art. 8.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10.
II - Nos contratos de adesão relativos aos cartões (de crédito e de débito) do banco Y, a assinatura do aderente localiza-se antes das cláusulas contratuais gerais que se encontram apostas em folha imediatamente a seguir; porém, consta dos mesmos contratos em local situado antes da assinatura do aderente, uma declaração em que o aderente afirma ter tomado conhecimento e aceitar as condições de utilização do cartão.
III - A exigência legal de a assinatura se localizar após as cláusulas para que estas sejam relevantes sobrepõe-se ao conhecimento manifestado pelo aderente; daí que tais cláusulas, por localizadas após, para além, a seguir à assinatura do aderente, em violação do art. 8.º, al. d), do DL 446/85, sejam inválidas e excluídas dos contratos, devendo o réu banco Y abster-se da sua futura utilização.
IV - Do clausulado dos cartões do banco Y resulta que o banco se exclui de qualquer responsabilidade que possa resultar das operações realizadas, com os cartões, entre o aderente, titular do cartão, e terceiros; ora, dispondo-se no art. 18.º, al. c), do DL n.º 446/85, que são proibidas as cláusulas que excluam ou limitem de modo directo ou indirecto a responsabilidade por não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso, em caso de dolo ou de culpa grave, e determinando-se no art. 21.º, al. d), do mesmo DL que são proibidas as cláusulas que excluam os deveres que recaiam sobre o predisponente, em resultado de vícios da prestação, ou estabeleçam nesse âmbito reparações ou indemnizações pecuniárias pré-determinadas, tem de se concluir pela sua proibição e consequente nulidade - art. 12.º do DL n.º 446/85.
V - Naquele clausulado estabelece-se uma confissão de dívida do titular do cartão; tal responsabilidade está, porém, excluída, nos casos de as ocorrências serem devidas a culpa ou negligência do banco e nos casos de uso abusivo ou fraudulento do cartão ocorridos após comunicação ao banco e nos casos de uso indevido ou fraudulento ocorridos antes dessa comunicação no que ultrapassar o limite estabelecido na cláusula 22.ª; assim, a distribuição de responsabilidade entre o banco e o titular do cartão obedece aos princípios da boa fé, não ocorrendo violação do disposto no art. 21.º, als. f) e g), do DL n.º 446/85.
VI - Quanto à 2.ª parte da cláusula 17.ª, cria-se ali um meio de prova bastante - os registos informáticos -, atribuindo-se-lhe uma força probatória em contrário do que resultaria da utilização de meios legais de prova, admissíveis em direito, excluindo-o do âmbito do princípio geral de livre apreciação dos meios de prova; quanto a esta parte da cláusula ocorre nulidade por violação do disposto no art. 21.º, al. g), do DL n.º 446/85.
VII - Na cláusula 23.ª estabelece-se, para os casos de violação (com culpa grosseira ou dolo) daquelas obrigações de cuidado pelo titular do cartão, a exclusão dos benefícios que, para esse titular do cartão, resultariam de cláusulas que tenham por finalidade evitar ou reduzir os danos; esta cláusula não atribui ao banco a faculdade ou o direito de interpretar a conduta do titular do cartão, por isso tem-se esta cláusula por válida.
VIII - Na cláusula 34.ª estabelece-se que, havendo divergência entre os valores conferidos por dois empregados do banco, quando procederem à abertura dos envelopes, e os valores digitados pelo depositante, a prova do valor real e efectivo do depósito cabe ao depositante; não havendo qualquer inversão do ónus da prova, não ocorre violação do art. 21.º, al. g), do DL n.º 446/85.
IX - Nos contratos de adesão relativos aos cartões (de crédito e de débito) do banco Z, autorizando-se o banco a proceder a compensação, debitando qualquer conta do titular do cartão pelas quantias não pagas, permite-se que o banco também debite e proceda a essa compensação com contas de que o titular do cartão não é o único titular da conta, com contas conjuntas ou solidárias; daí que, com tal autorização, o banco está a impor ao titular do cartão a aceitação de débitos e compensação com créditos de terceiro, com créditos de quem não é titular do cartão, o que não pode aceitar-se, sendo tal cláusula proibida.
X - Nos contratos de adesão relativos aos cartões (de crédito e de débito) do banco X, estabelece-se, na cláusula 9.ª, para além da obrigação de pagamento, pelo aderente ao banco, de uma quantia por ano, a possibilidade de alteração unilateral pelo banco, mediante prévia comunicação ao titular do cartão; nela não se indica o seu montante, nem o critério para a sua actualização, nem o prazo para que a comunicação de alteração possa produzir efeitos, nem ainda quais os meios de que dispõe o titular do cartão para reagir, aceitando ou resolvendo o contrato.
XI - Na cláusula 29.ª, por sua vez, estabelece-se também a possibilidade de alteração unilateral do limite de crédito concedido ao titular do cartão; aqui também não se indica qualquer critério nem se aponta qualquer fundamento para essa alteração, nem qual o prazo a partir do qual a alteração desse limite produzirá efeitos; tais cláusulas - 9.ª e 29.ª - são nulas por violação do disposto no art. 22.º, al. c), do DL n.º 446/85.
XII - Na cláusula 12.ª estabelece-se uma presunção - presunção de uso do cartão, presunção de que foi utilizado pelo titular quando for correcta a digitação do PIN e presunção de que o uso foi consentido ou facilitado culposamente pelo titular quando for utilizado por terceiro; estas presunções encontram-se em consonância com as regras que estabelecem a distribuição do ónus da prova; esta cláusula é, portanto, válida.
XIII - De várias cláusulas resulta a atribuição ao banco do poder de cobrar, debitando na conta-cartão, as quantias por despesas, encargos, taxas de juro e sobretaxas resultantes da celebração do contrato ou de utilização do cartão; em tais cláusulas não se indicam os seus montantes nem os critérios para a sua determinação; ora, não é permitido que o predisponente imponha ao aderente obrigações que não conhece integralmente e que, por isso, não pode ponderar antes de aderir ao contrato - arts. 5.º e 8.º, al. a), do DL n.º 446/85.
XIV - A cláusula 22.ª mantém a responsabilidade do titular do cartão findo o contrato e até à efectiva devolução do cartão; esta cláusula é nula por violação do disposto no art. 21.º, al. f), do DL n.º 446/85 - (proibição de alteração das regras de distribuição do risco).
XV - É válida a cláusula 23.ª que permite ao banco alterar unilateralmente as condições gerais de utilização, produzindo efeito se o aderente titular do cartão não resolver o contrato no prazo de 15 dias a contar da informação dessa alteração.
XVI - A cláusula 26.ª estabelece a irresponsabilidade do banco nos casos de não aceitação do cartão, pelo deficiente atendimento ou má qualidade dos bens ou serviços obtidos com a utilização do cartão pelo seu titular; esta cláusula é nula por violação do disposto nos arts. 18.º, al. c), e 21.º, al. g), do DL n.º 446/85.
XVII - Na cláusula 30.ª estabelece-se a presunção de que o titular do cartão recebeu, na morada indicada, o extracto e impõe-se ao titular do cartão o reconhecimento da dívida se não houver reclamação no prazo de 15 dias; esta cláusula é nula por violação do disposto no art. 19.º, al. d), do DL n.º 446/85.
XVIII - Na cláusula 45.ª estabelece-se a obrigação do titular do cartão de utilizar sempre o MBNet nas operações em ambientes abertos e determinou-se ainda que, em caso de incumprimento desta obrigação pelo titular do cartão, o banco pode inviabilizar a operação, não sendo de imputar ao banco qualquer responsabilidade por eventuais prejuízos, quer o banco inviabilize ou não inviabilize essa operação realizada sem utilização de MBNet; esta cláusula é válida.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

Associação Portuguesa para Defesa do Consumidor – DECO instaurou, em 14/7/2003, acção declarativa, com processo ordinário, contra Banco AA, S.A. e Crédito Predial Português, S.A., agora ambos, devido a fusão, Banco BA, S.A., contra Banco Português de Investimento, S.A. e contra Caixa Geral de Depósitos, S.A., pedindo que sejam declaradas nulas as cláusulas que indica, relativas a contratos de emissão e utilização de cartões de crédito e débito, condenando as RR. a absterem-se de as utilizar e de dar publicidade a essa proibição, afixando o teor da sentença em todos os seus balcões, bem como publicando-a nos jornais, diários e semanários de maior tiragem, com uma dimensão não inferior a ¼ de página.
Citadas, as RR. contestaram, pugnando pela improcedência da acção.
No saneador, foi a Ré Banco Português de Investimento, S.A. absolvida da instância por ilegitimidade e, conhecendo-se de mérito, decidiu-se:
a) Declarar nulas as seguintes cláusulas:
- Relativamente ao cartão da CGD: 5, 8.1, 24, 26, 30.1, 45, 52.1 e 52.2;
- Relativamente ao cartão do Totta: 9, 10, 11, 17, 2ª parte, 23 e 34;
- Relativamente ao cartão do CPP: 9, 10, 11, 17, 2ª parte, 23 e 34.
b) Condenar as RR. a não mais utilizar nos seus contratos com os particulares as referidas cláusulas consideradas nulas, fazendo-as desaparecer das cláusulas tipo das respectivas “Condições gerais”.
c) Considerar válidas as restantes, absolvendo as RR. desse pedido.
d) Absolver as RR. do pedido de publicitação da decisão.
e) Remeter cópia ao Gabinete de Direito Europeu (Portaria 1093/95, de 06/09).
Inconformadas, A. e RR. Banco BA, e Caixa Geral de Depósitos apelaram para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão, revogou parcialmente a sentença recorrida, decidindo nos seguintes termos:
a) Declarar a nulidade das cláusulas insertas no clausulado dos cartões da CGD, por violação dos art. 8º e 9º n.º 2, a) e n.º 3 da Lei 24/96 de 31/7, art. 8º, c) do DL 446/85 de 25/10, na redacção DL 220/95 de 31/8 e DL 249/99 de 7/7.
b) Declarar nula a cláusula 51 dos cartões TottaGold e Super Satisfação do Banco AA e cartões Classic e Cartão + Casa do Crédito Predial Português, declarando a sua nulidade por violação dos art. 16º e 19º, d) do DL 446/85 de 25/10, na redacção DL 220/95 de 31/8 e DL 249/99 de 7/7.
c) Declarar nula a cláusula 26 dos cartões TottaGold, Super Satisfação, Classic e Cartão + Casa dos Bancos AA e Crédito Predial, por violação do art. 21º, f) do DL 446/85 de 25/10, na redacção DL 220/95 de 31/8 e DL 249/99 de 7/7.
d) Declarar nulas as cláusulas 9, 10 e 11 dos cartões TottaGold, Super Satisfação, Crédito Super Classic e + Casa, por violação dos art. 18º, c) e 21º, d) do DL 446/85 de 25/10, na redacção DL 220/95 de 31/8 e DL 249/99 de 7/7.
e) Declarar nulas as cláusulas 17, 2a parte, e 34 dos cartões TottaGold, Super Satisfação, Crédito Predial Classic e + Casa, por violação do art. 21º, g) do DL 446/85 de 25/10, na redacção DL 220/95 de 31/8 e DL 249/99 de 7/7.
f) Declarar nula a cláusula 23 dos cartões TottaGold, Super Satisfação, Crédito Predial Classic e + Casa, por violação do art. 18º, e) do DL 446/85 de 25/10, na redacção DL 220/95 de 31/8 e DL 249/99 de 7/7.
g) Declarar válidas as cláusulas constantes dos contratos de adesão das RR., à excepção da Caixa Geral de Depósitos, não obstante as assinaturas dos aderentes terem sido apostas antes das condições gerais, inexistindo violação do art. 8º, d) do DL 446/85 de 25/10, na redacção DL 220/95 de 31/8 e DL 249/99 de 7/7.
h) Declarar válidas as cláusulas 17, 1ª parte e 22 dos cartões TottaGold, Super Satisfação, Classic e Cartão + Casa dos Bancos AA e Crédito Predial, bem como as cláusulas 15, 15.1, 12 e 12.1 dos cartões Visa e Soma da Caixa Geral de Depósitos.
i) Confirmar quanto ao mais a sentença recorrida.
j) Condenar as RR. a absterem-se de utilizar as cláusulas declaradas nulas em todos os contratos que, de futuro, venha a celebrar.
Inconformadas, as RR. e a A. subordinadamente, interpuseram recurso de revista para este S.T.J., apresentando alegações, nas quais formularam as seguintes conclusões:
— A Ré Banco BA
A) Pelo aresto que ora se impugna foram consideradas nulas as cláusulas 9, 10 e 11 dos cartões TottaGold, Super Satisfação, Crédito Predial Classic e Cartão + Casa por alegada violação do art. 18º, aI. c) e do art. 21º, aI. c) do DL 446/85, de 25/10 (RJCCG).
B) Sucede que tais disposições do RJCCG se reportam ao cumprimento defeituoso ou ao incumprimento do convencionado em cada situação concreta – in casu, ao cumprimento defeituoso ou ao incumprimento dos contratos de utilização em apreço.
C) De facto, o art. 18º, alínea c), ao referir-se aos “vícios da prestação”, e o art. 21º, n.º 1, alínea c), ao referir-se ao “não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso”, têm, julga-se que manifestamente, por objecto os contratos onde se inserem as cláusulas sindicadas, que, no caso em apreço, são, como se disse, contratos de utilização de cartões de débito/crédito.
D) Ora, as cláusulas em questão dirigem-se a uma realidade jurídica totalmente distinta, que é a da relação entre o titular do cartão e terceiros, maxime o comerciante/prestador de serviços.
E) Ou seja, os indicados normativos, e as cláusulas em apreço versam matéria completamente diversa, pelo que não é possível que estas violem aqueles.
F) Acresce que, não faria qualquer sentido que o recorrente, por ter celebrado contratos de utilização e emitido cartões, fosse responsabilizado, v. g., pelo defeito de um bem adquirido com o cartão ou por um acidente sofrido pelo titular num estabelecimento comercial aquando de uma compra com o cartão.
G) Já relativamente à não execução, ou execução defeituosa, de operação cuja instrução tenha sido recepcionada pelo Banco, a responsabilidade será, naturalmente, deste último, como aliás, consta dos contratos em apreço - vd. respectivas cláusulas 12.
H) Pelo aresto ora impugnado foi também considerada nula a segunda parte da cláusula 17 dos cartões TottaGold, Super Satisfação, Crédito Predial Classic e Cartão + Casa por alegada violação do art. 21º, aI. d) do RJCCG.
I) Ora, tais cláusulas respeitam à prova relativa a operação não autorizada pelo titular do cartão, em caso de diferendo entre este e o Banco quanto a tal operação.
J) Para o efeito, tais cláusulas, como se viu, estipulam que o ónus da prova caberá ao Banco, e que esta poderá ser efectuada mediante os registos informáticos e mecanográficos relativos à operação em causa.
L) Ora, julga-se que as indicadas cláusulas não modificam os critérios de repartição do ónus da prova – e, se o fizessem, sempre seria em desfavor do Banco – nem restringem os meios probatórios legalmente admitidos.
M) Por outro lado, a estipulação de que os registos do Banco constituem prova bastante da realização das operações também não é ilegal, designadamente por restringir os meios probatórios legalmente admitidos.
N) De facto, no ordenamento jurídico português a regra é a da admissibilidade de qualquer meio de prova idóneo a demonstrar a realidade de um facto, desde que obtido de forma lícita (art. 341º do C.C., e 515º do C.P.C.).
O) E, os meios de prova são, regra geral, livremente apreciados pelo julgador (art. 358º, n.º 3 e 4, 361º, 366º, 389º, 391º e 396º do C.C., e 655º, n.º 1. do C.P.C.).
P) Ora, é entendimento maioritário que os instrumentos onde são registadas as informações computorizadas (como é o caso dos registos em apreço) podem ser incluídos na categoria das reproduções mecânicas, regulada no art. 368º do C.C..
Q) Sendo que, consoante prescreve tal normativo, as reproduções mecânicas “fazem prova plena dos factos e das coisas que representam, se a parte contra quem os documentos são apresentados não impugnar a sua exactidão”.
R) Julga-se patente que as cláusulas em apreço estão em perfeita consonância com o citado preceito, sendo, por conseguinte, legais.
S) De facto, a consideração dos registos informáticos dos Bancos como fazendo prova da realidade das operações corresponde à sua natureza de reproduções mecânicas, e não afasta, evidentemente, a prova em contrário.
T) Acresce que, o relevo probatório (perfeitamente legal, como se viu) dos registos informáticos bancários no que concerne ao sistema de pagamentos electrónicos corresponde às necessidades e características específicas de tal sistema.
U) O aresto que ora se impugna considerou também nulas as cláusulas 9 e 23 dos cartões TottaGold, Super Satisfação, Crédito Predial Classic e Cartão + Casa por alegada violação do art. 18º, aI. e), do RJCCG.
V) Ora, não se vislumbra de que forma a cláusula em apreço atenta contra os critérios de repartição do ónus da prova ou os meios probatórios legalmente admitidos, ou sequer qual é a sua relação com tal matéria.
X) Tal cláusula configura corolários contratuais de outras obrigações que a precedem em termos de lógica negocial, limitando-se a estipular que, em caso de incumprimento das obrigações do titular relativas à segurança do cartão (previstas na cláusula 14 e, também, na 15) de dolo e de negligência grosseira, aquele não poderá fazer valer as cláusulas que limitam os seus danos em caso de incidente.
Z) Pelo aresto que ora se impugna foram igualmente consideradas nulas as cláusulas 34 dos cartões Totta Gold, Super Satisfação, Crédito Predial Classic e Cartão + Casa por alegada violação do art. 21º, aI. g), do RJCCG.
AA) Ora, julga-se que também a cláusula 34 não ofende os critérios de repartição do ónus da prova.
AB) Tal cláusula dispõe que a abertura dos envelopes utilizados para depósito é efectuada por dois empregados do Banco e que, em caso de divergência entre os valores conferidos e os digitados, o ónus da prova é do depositante.
AC) Ou seja, a cláusula em apreço visa regular situações em que, v.g., o cliente afirma ter depositado € 1.000, quantia que digitou, e os empregados do Banco, que abriram o envelope respectivo, dizem que no mesmo só estavam € 100.
AD) Ora, em tais situações afigura-se que é o cliente que se arroga um direito – in casu, o direito ao crédito, ou à titularidade, da importância que afirma estar em falta – pelo que, face ao disposto no art. 342º, n.º 1, do C.C., é sobre o cliente/reclamante que impende o ónus da prova.
AE) Acresce que, a eventual eliminação desta cláusula (que, há anos, se utiliza no caso dos chamados “cofres nocturnos”) passando, ao arrepio da lei, o ónus da prova para o Banco, geraria, não tenhamos ilusões, inúmeros problemas e litígios, pois os clientes menos escrupulosos não deixariam de, como no exemplo supra, digitar 1.000,00 e só depositar € 100,00.
AF) Pelo acórdão ora recorrido foram consideradas nulas as cláusulas 51 dos cartões TottaGold, Super Satisfação, Crédito Predial Classic e Cartão + Casa por alegada violação dos art. 19º, aI. d), e 16º, do REGCCG, pois foi entendido que as mesmas “impõem uma ficção de aceitação por parte do titular do cartão”.
AG) Ora, salvo o devido respeito, julga-se que não é esse o caso das cláusulas em causa, sendo de notar que as mesmas se limitam a concretizar um dos princípios lógicos em que assenta o sistema de pagamentos electrónicos, isto é, que o titular do cartão é, à partida, responsável pelos montantes correspondentes aos movimentos e operações efectuados com o cartão, os quais, em consequência, são debitados na sua conta.
AH) Princípio esse abundantemente regulado nos contratos de utilização em apreço – vd., para além da cláusula 51, também as cláusulas 2, 17, 48, 49 e 50.
AI) Não há, pois, qualquer “ficção de manifestação de vontade”, mas antes um acto expresso do titular do cartão, ao assinar o contrato, a autorizar o débito da sua conta para pagamento das importâncias correspondentes à utilização do cartão.
AJ) A autorização de débito em apreço é, pois, bem clara e absolutamente compatível (mesmo inerente) ao quadro negocial padronizado (art. 19º do RJCCG).
AL) Cumprindo, a propósito, notar que é entendimento jurisprudencial maioritário que os Bancos podem compensar os seus créditos com os montantes constantes das contas dos seus clientes/devedores, mesmo sem o acordo expresso destes.
AM) Sendo que, in casu, tal acordo do cliente existe e traduziu-se na assinatura do contrato de utilização.
AN) Falece também razão ao acórdão impugnado quando afirma que a autorização para a compensação contida nos contratos inclui contas de que o cliente não seja titular.
AO) Com efeito, para além do absurdo que configuraria tal estipulação, basta ler as cláusulas em apreço para verificar que a autorização de débito só abrange contas pertencentes ao cliente, isto é, de que o mesmo seja titular – “qualquer conta do titular do cartão existente no Banco e por este movimentável”, é o que se acha escrito no clausulado.
— A Ré C.G.D. —
1. A recorrente invocou abuso de direito por parte da recorrida, dado que muitas das cláusulas cuja nulidade foi pedida por esta constam das condições gerais com redacção muito idêntica do cartão da recorrida, não tendo sido tal questão apreciada por ter sido considerado que implicaria o julgamento da validade das cláusulas contratuais gerais contidas no cartão da recorrida.
2. Porém, a decisão sobre a existência ou não de abuso de direito não implica o julgamento da validade das cláusulas inseridas no cartão DECO, mas apenas a verificação da similitude de conteúdo das cláusulas utilizadas por recorrente e recorrida.
3. Concluindo-se por tal identidade, deverá considerar-se que ao invocar a nulidade de determinadas cláusulas inseridas nas Condições Gerais de Utilização da recorrente, a recorrida actuou com abuso de direito, por ter inseridas cláusulas nas condições gerais do seu cartão de crédito idênticas ou de conteúdo semelhante àquelas que invoca serem nulas por se encontrarem inseridas no clausulado da recorrente.
4. As Condições Gerais de Utilização do Cartão de Crédito Visa que a recorrente apresenta aos seus clientes permitem uma leitura fácil, sem necessidade de pausas ou de um esforço excessivo para concentração. As referidas cláusulas são facilmente compreendidas e apreendidas pelos aderentes.
5. Ao considerar nulas as cláusulas inseridas nos condições gerais da CGD, a decisão recorrida violou o disposto no art. 8º, alínea c) do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro e no n.º 5 do Aviso do Banco de Portugal n.º 11/2001.
6. A cláusula 9 cumpre não só a invocada alínea c) do n.º 1 do art. 22º, como também a alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo, permitindo à parte resolver o contrato por discordar com a nova anuidade.
7. O valor da anuidade inicialmente devida pelo titular do cartão consta do próprio impresso em que se formaliza a proposta de adesão e quanto à faculdade de o titular resolver o contrato por discordar com a nova anuidade aplica-se a cláusula 23.
8. Quanto à cláusula 29, é manifesto que ao limite do crédito não é aplicável o art. 22º, n.º 1, alínea c), em virtude de a matéria estar regulada na aI. b) do n.º 2, dado tratar-se de um contrato duração continuada, duradoura ou indeterminada.
9. A cláusula 29 é bilateral, pois também o titular do cartão poderá solicitar a alteração do limite de crédito.
10. Acresce que contrariamente ao entendido no acórdão recorrido, à recorrente não é indiferente a redução do limite de crédito, pois o limite de crédito é fixado ao utilizador casuisticamente num determinado valor, tendo em conta avaliação do perfil financeiro do mesmo, análise que é realizada pelo Banco.
11. Deste modo, se o utilizador deixar de auferir determinados rendimentos seria completamente injusto, pretender impedir a CGD de proceder a alteração do limite de crédito, nomeadamente diminuindo-o.
12. As cláusulas 9. e 29. são válidas, cumprindo com o exigido no art. 22º, n.º 1, alíneas a ) e c) e n.º 2, alíneas a) e b) do Decreto-lei n.º 446/85.
13. Cláusula de conteúdo idêntico às impugnadas se pode encontrar nas condições gerais de utilização do cartão de crédito da DECO, cláusula 8.
14. As cláusulas 18, 18.1, 32, 32.1, 32.3, 34, 34.1 e 35 cumprem o estipulado no identificado Aviso, dado que o mesmo se refere apenas a encargos emergentes da celebração do contrato e da utilização do cartão, a suportar pelos titulares dos cartões, não se aplicando a meras despesas de carácter puramente esporádico e acidental, nem a encargos derivados de relações com terceiros.
15. Atento o exposto, não podem ser consideradas inválidas as cláusulas 18 e 18.1 porque se referem a despesas de expediente, a cláusula 32.3, porque relativa a impostos e a cláusula 35, porque se refere a despesas de cobrança, nem a cláusula 18 (despesas de expediente) a cláusula 18.1 (também despesas de expediente) a cláusula 32.3 (impostos) a cláusula 35 (despesas de cobrança) e a cláusula 41 (taxa devida à entidade gestora da rede VISA).
16. Quanto às cláusulas 32, 32.1 e 34, a taxa de juro praticada aquando da celebração do contrato consta expressamente do anexo às Condições Gerais de Utilização inseridas no impresso da proposta de adesão e sempre que a taxa inicialmente fixada é alterada o titular do cartão é avisado através do extracto que mensalmente lhe é enviado.
17. No que se refere à cláusula 34.1 a taxa consta de Portaria, pelo que não é necessário indicá-la no contrato.
18. A sentença proferida pelo tribunal a quo bem julgou válidas tais cláusulas, por os encargos, anuidades, comissões e taxas de juro nelas previstos serem determináveis, não sendo por isso atentatórias da boa fé.
19. A cláusula 22.1 não versa matéria referente à repartição de ónus da prova, nem à restrição de meios probatórios, proibidas pelo art. 21, f), pelo que aquela cláusula foi interpretada erradamente.
20. Tal cláusula limita-se a esclarecer que o respectivo titular continua responsável pelas dívidas e encargos emergentes da continuação da utilização do cartão que deveria ter devolvido e não devolveu, pelo que se trata de uma estipulação de prorrogação do contrato (como refere a parte final da cláusula “nos mesmos termos em que o era anteriormente”) se o cartão continua a ser utilizado, ou da definição de uma situação de responsabilidade civil numa fase de liquidação do contrato e conforme à regras gerais desta matéria ou, porventura, de um caso válido de pós-eficácia do contrato (ou até de responsabilidade pós-contratual).
21. Termos em que a cláusula 22.1 é válida, por não violar o disposto no art. 21º, f) e g) do Decreto-lei 446/85.
22. A cláusula 23 é válida, atento o disposto no art. 19º, aI. d) do Decreto-lei 446/85, pois não estipula qualquer ficção de recepção, porquanto o prazo referenciado pela mesma apenas começa a correr após a efectiva recepção da comunicação pelo titular do cartão, competindo à CGD o ónus da prova da recepção.
23. Por outro lado, o valor jurídico do silêncio após o efectivo conhecimento do conteúdo da alteração é regulado pelo art. 218º do C.C., que lhe confere relevância quando esse valor lhe é atribuído por lei, uso ou convenção.
24. Acresce que o art. 19º, aI. d) do Decreto-lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, exige como requisito para a proibição das cláusulas que imponham ficções de recepção, de aceitação ou de outras manifestações de vontade, que estas se baseiem em factos para tal insuficientes, o que não sucede.
25. Acrescente-se que, caso o titular não exerça o direito de resolução estipulado na cláusula 23, dado que se trata de contrato de duração indeterminada, sempre poderá denunciar o contrato com 30 dias de antecedência, atento o estipulado na cláusula 20. Da conjugação das duas regras, resulta a protecção equilibrada do interesse na continuidade do contrato sem impor uma aceitação da alteração por período superior a 30 dias.
26. A cláusula em apreço corresponde inteiramente ao teor da disposição do n.º 8.3 do Aviso do Banco de Portugal n.º 11/2001, de 6 de Novembro, bem como da Carta Circular n.º 2/2006/DPG, de 19 de Janeiro de 2006 do Banco de Portugal, nos termos da qual: “O emitente deve comunicar todas as eventuais alterações das condições contratuais, com um pré-aviso mínimo de 15 dias, ficando este com o direito de reaver a anuidade paga, na parte proporcional ao período ainda não decorrido, se pretender resolver o contrato por motivo de discordância com as alterações introduzidas”.
27. Assim o foi já entendido pelo Acórdão do STJ de 14/2/2002, in www.dgsi.pt.
28. Cláusula de teor semelhante pode ser encontrada nas condições gerais de utilização do cartão de crédito DECO, cf. cláusula 8.
29. A cláusula 26 (actual 25) é válida, devendo ser interpretada no sentido em que estipula que a CGD, enquanto emitente do cartão, é alheia à relação comercial de natureza não bancária de onde emerge a dívida que é satisfeita através da utilização do cartão.
30. Aliás, é este o sentido do ponto 7.1 da Recomendação da Comissão 88/590/CEE, de 17 de Novembro, que dispõe que o emissor só será responsável perante o titular pela não execução ou execução defeituosa das operações do titular referidas no ponto 1 e por operações não autorizadas pelo titular.
31. O contrato celebrado entre o titular do cartão de crédito e o comerciante ou prestador de serviço aderente consiste num contrato de compra e venda ou de prestação de serviço normal, sendo que o facto de ser utilizado cartão de crédito, não altera a qualificação jurídica do contrato ou da estrutura do mesmo. A única especificidade consubstancia-se na utilização do cartão de crédito como meio de pagamento e não em dinheiro, cheque, cartão de débito.
32. Novamente, cláusula semelhante se pode encontrar nas condições gerais de utilização do cartão de crédito DECO, a cláusula 14, penúltimo parágrafo.
33. A cláusula 30.1 (actual 29.1) não estabelece qualquer presunção de recepção, nem altera as regras de repartição do ónus da prova, pois o prazo estipulado de sete dias conta-se a partir da data de recepção do extracto. Logo, cabe à apelante o ónus da prova da data em que foi recebido o extracto pelo titular do cartão, conforme resulta do disposto no art. 342º, n.º 1 do C.C..
34. Refira-se a cláusula 15, último parágrafo das condições gerais de utilização do cartão de crédito DECO com conteúdo idêntico.
35. As cláusulas 36 e 50.6 são válidas por não violarem o disposto nos art. 16º e 19º, d) do Decreto-lei 446/85, dado que somente estipulam que o titular do cartão autoriza a CGD a debitar a quantia em dívida em qualquer outra conta de depósito de que aquele seja titular ou co-titular solidário, podendo proceder à compensação nos termos gerais, ou seja, o titular do cartão quando celebra o contrato dá o seu acordo expresso, autorizando a CGD a efectuar a compensação, pelo que não há qualquer ficção posterior ao contrato ou qualquer ficção de aceitação baseadas em factos insuficientes, tal como exigido pela alínea d) do art. 19º.
36. Trata-se de uma compensação convencional cuja validade, mesmo nas contas solidárias, não suscita dúvidas, nem na doutrina (Menezes Cordeiro, “Depósito Bancário e Compensação” em Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Inocêncio Galvão Telles, Coimbra, págs. 90 e 91) nem na jurisprudência (Acórdão Relação de Lisboa de 3/5/2001, in www.dgsi.pt).
37. A sentença a quo julgou e bem tais cláusulas válidas, por não violarem qualquer dispositivo da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, acrescentando ainda o seguinte argumento importante: “A conta solidária pode ser movimentada por qualquer dos titulares, individual e livremente. Independente do regime da movimentação do saldo, a questão da propriedade do mesmo respeita às relações entre os vários titulares da conta, a ela sendo alheio o banqueiro. Uma vez que qualquer dos titulares pode levantar a totalidade do saldo, também poderá constituir débitos ou fazer aplicações financeiras e, por maioria de razão, onerar o depósito para garantir obrigações alheias, podendo o banco compensar o crédito que tenha sobre algum dos contitulares, até à totalidade do saldo”.
— A A. DECO —
1. Decidiu mal o acórdão recorrido interpretando e aplicando erradamente a al. d) do art. 8º, contentando-se com o cumprimento formal do dever de informação previsto nos art. 5º e 6º do DCCG e não considerando, como deveria fazer, que a norma da al. d) do art. 8º do DCCG é independente dos deveres de informação constantes dos art. 5º e 6º já referidos e, portanto, que a declaração que consta dos contratos é irrelevante para este efeito uma vez que a assinatura dos consumidores é aposta antes das condições gerais e não depois como obriga a lei. Assim, tais cláusulas devem ser consideradas excluídas das respectivas propostas contratuais como vem sendo aliás jurisprudência desse Tribunal.
2. Decidiu igualmente mal o acórdão recorrido ao considerar válidas as cláusulas 17, 1a parte, 22 (Banco AA e Crédito Predial), 15 e 15.1 (Caixa Geral de Depósitos) ao arrepio, aliás do que vem sendo decidido quer pelo Tribunal da Relação de Lisboa quer por esse Tribunal, já que nem tais cláusulas procedem a uma justa repartição do risco – o consumidor não se apercebe nas actuais fraudes de que o seu PIN foi copiado ou o cartão “clonado”, ao contrário do Banco uma vez que estas fraudes abrangem habitualmente um número significativo de cartões e de vários Bancos alertando o sistema – nem os Bancos estão totalmente isentos de culpa nas situações em causa – na verdade são os Bancos que controlam as condições de segurança dos cartões que disponibilizam aos seus clientes e, apesar de se saber há muito que os cartões com banda magnética não são seguros só muito recentemente foram disponibilizados os cartões com chip – nem a comunicação ao Banco é o momento adequado para terminar a responsabilidade do consumidor – quando o consumidor se apercebe da fraude (no extracto de conta) e, portanto, pode comunicá-la, já o prejuízo é efectivo. Pelo contrário, o critério aferidor da responsabilidade do consumidor tem que ser a sua actuação negligente ou culposa.
3. Decidiu erradamente o acórdão recorrido ao considerar válidas as cláusulas 12 e 12.1 (Caixa Geral de Depósitos) já que a realidade não sustenta tais presunções uma vez que as fraudes actuais permitem a cópia do PIN ou a “clonagem” do cartão sem que o consumidor disso se aperceba.
4. Por outro lado, o funcionamento das duas presunções em conjunto é ainda mais grave. Na verdade a serem consideradas lícitas tais presunções e sem conceder, o consumidor teria que provar, em primeiro lugar, que não digitou o PIN e em segundo lugar que não o revelou ou facilitou a sua revelação a terceiros. Convenhamos que é um regime de prova praticamente diabólica pois tratando-se de um código pessoal e intransmissível, o consumidor não disporá de testemunhas que demonstrem não só um facto negativo como um facto de que ele, por imposição contratual, não deu conhecimento a ninguém que é: onde guarda e quais os meios de segurança que utiliza, para proteger o seu PIN!
5. Por fim, ao contrário do que é referido pelo acórdão recorrido, nos termos do n.º 1 do art. 342º do C.C. é à CGD que cabe provar que foi o titular do cartão que digitou o PIN ou que autorizou um terceiro a utilizar o cartão e não ao consumidor. Pelo exposto não há fundamento relevante para o estabelecimento de presunções deste género em detrimento das regras gerais do Código Civil. Antes pelo contrário, existe sim clara violação do preceituado no art. 21º, al. g) do DCCG. Devem assim as cláusulas 12 e 12.1 da CGD ser consideradas nulas.
6. Decidiu também erradamente o acórdão recorrido ao considerar válida a cláusula 45 (CGD) dado que é claro e evidente que esta cláusula tem como objectivo limitar, ou melhor, excluir o risco da CGD quando o consumidor actua em ambientes abertos e mesmo que utilize o cartão disponibilizado pela CGD para esses ambientes! Melhor esteve o tribunal de primeira instância que, percebendo todo o alcance da cláusula em análise a julgou nula. Seria, no mínimo, desproporcional e violador dos art. 18º, aI. c) e 21º, al. d) do DCCG, apesar de muito conveniente ao Banco que, com os benefícios que aufere resultantes desta relação tripartida, ficasse alheado de qualquer responsabilidade para além da que advém da relação entre ele estabelecida e o cliente/utilizador do cartão. Pelo exposto, deve tal cláusula ser considerada nula, como o foi na 1ª instância por violadora dos art. 18º, aI. c) e 21º, al. d ) do DCCG.
7. Por fim decidiu erradamente o acórdão recorrido ao considerar válidas as cláusulas 52.1 e 52.2 (Caixa Geral de Depósitos) uma vez que é à CGD, nos termos do art. 342º, n.º 1 do C.C. que cabe provar os factos constitutivos do direito que invoca e, assim, neste caso é à CGD que cabe provar que a quantia que escriturou é a quantia que foi depositada pelo titular. Ao prever uma presunção de que são esses os valores que prevalecem a CGD está a alterar o ónus da prova passando-o para o consumidor. Por isso, esteve bem a douta sentença da 1ª instância, em consonância, aliás, com o que tem vindo a ser decidido por esse Venerando Tribunal, ao determinar que a divergência entre o Banco e o cliente quanto ao montante dos valores entregues terá que ser resolvida mediante o fornecimento das provas legalmente admitidas e livremente apreciadas pelos Tribunais, configurando a cláusula em apreço uma inversão do ónus da prova em violação do disposto no art. 21º, aI. g) do DCCG. Ao invés, errou o acórdão recorrido que interpretou e aplicou mal a aI. g) do art. 21º do DCCG e o n.º 1 do art. 342º do C.C.. Pelo exposto, a presente cláusula deve ser considerada nula.
Em contra alegações, a A. pugna pela improcedência dos recursos das RR. e estas defendem a improcedência da revista subordinada da A..
Cumpre decidir as questões suscitadas pelas recorrentes nas conclusões das suas alegações (art. 684º, n.º 3 e 690º, n.º 1 do C.P.C.).
Para tanto, há que considerar os factos que vêm dados como provados pela Relação, para onde se remete, ao abrigo do disposto nos art. 713º, n.º 6 e 726º do C.P.C..
E, perante os factos provados e aquelas conclusões, há que resolver, essencialmente, a questão de saber se naqueles cartões de crédito/débito propostos pelas RR. existem cláusulas que devam ser declaradas nulas, como foi pedido pela A., por violação do disposto no regime estabelecido para as cláusulas contratuais gerais.
Ora, não se mostra controvertido estar-se perante pedido de declaração de nulidade de cláusulas contratuais gerais, sujeitas ao regime estatuído pelo dec.-lei 446/85 de 25/10, dado tratar-se de cláusulas insertas em contratos, previamente elaboradas sem qualquer negociação entre as partes, em que os destinatários não estão determinados e que se limitam a aceitar ou a subscrever (cf. art. 1º do dec.-lei 446/85).
Assim, há que começar por analisar o clausulado que vêm sendo objecto de controvérsia e declarar, se for o caso, a sua nulidade e condenação das RR. a absterem-se da sua utilização.
Foi pedido pela A., e declarado nulo no acórdão recorrido, o clausulado dos cartões da CGD por utilizar um tipo de letra demasiado pequena e de difícil leitura, em violação do disposto nos art. 8º e 9º, n.º 2, al. a) e n.º 3 da Lei 24/96 de 31/7 e art. 8º, al. c) do dec.-lei 446/85.
Ora, determina-se no art. 8º, n.º 1 da Lei 24/96 de 31/7, que o prestador de serviços deve, tanto nas negociações como na celebração de um contrato, informar de forma clara, objectiva e adequada o consumidor.
E no art. 9º, n.º 1 da mesma Lei estabelece-se que o consumidor tem direito à protecção dos seus interesses económicos, impondo-se nas relações jurídicas de consumo a igualdade material dos intervenientes, a lealdade e a boa fé, nos preliminares, na formação e ainda na vigência dos contratos.
E como prevenção de abusos de contratos pré-elaborados, o fornecedor de bens e o prestador de serviços estão obrigados à redacção clara e precisa, em caracteres facilmente legíveis, das cláusulas contratuais gerais, ficando a sua inobservância sujeita ao regime estabelecido para as cláusulas contratuais gerais (art. 9º, n.º 2, al. a) e n.º 3 daquela Lei 24/96 e art. 8º e 12º do dec.-lei 446/85).
Por sua vez, estabelece-se no art. 5º do dec.-lei 446/85 de 25/10 que as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes de modo adequado para que se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência, sendo excluídas dos contratos singulares quando não comunicadas nesses termos (art. 8º do dec.-lei 446/85).
E bem se compreende esta imposição de informação, com as consequências da sua violação, neste tipo de contratos em que — ao contrário do que ocorre com os contratos negociados em que o seu conteúdo corresponde ao acordo de vontades dos contraentes — uma das partes, a proponente, se encontra numa posição que se impõe ao aderente em termos de, em muitos casos, restar a este apenas aderir ou não aderir à celebração do contrato.
Esta informação, para que possa alcançar o seu objectivo de adequada formação da vontade do aderente, tem de obedecer a certos requisitos formais em ordem a garantir o particular contra o risco de desconhecimento das condições gerais que o predisponente deseja integrar no contrato, certo que se deve partir do princípio de que o aderente desconhece frequentemente aspectos significativos do conteúdo do contrato “porque as condições gerais não lhe foram apresentadas, não teve tempo de as ler ou possibilidade de as compreender (redigidas em termos técnicos e pouco acessíveis) ou porque não quis dar a impressão de desconfiar da honestidade do seu “partenaire” até porque pouco ou nada lhe adiantaria” – António Pinto Monteiro em Cláusulas Limitativas e de Exclusão de Responsabilidade Civil, pág. 348.
Daí que se deva impor formalidades que passam pela conformação externa do documento contratual ou de certas cláusulas nele inseridas com padrões de dimensão, de cor de formato, de impressão, para evitar cláusulas ilegíveis ou ocultas (P. Monteiro, ob. cit., pág. 348).
Por isso, impõe o referido art. 5º, ao exigir o conhecimento efectivo e completo do clausulado, a legibilidade do texto do ponto de vista formal-exterior, obstando a que por dificuldades de leitura ou compreensão, o aderente ganhe uma convicção desconforme ao conteúdo efectivo das cláusulas (Sousa Ribeiro em O Problema do Contrato, pág. 381 e 402).
E daí também que no Aviso n.º 11/2001 de 20 /11 do Banco de Portugal se disponha que os contratos “devem dispor de uma apresentação gráfica que permita a sua leitura fácil por um leitor de acuidade média”.
Essa exigência legal não se contenta com uma mera legibilidade do conteúdo do texto; exige-se uma “legibilidade fácil, o que demanda a utilização de caracteres de tamanho tal que se possam ler sem necessidade de um esforço excessivo da visão, sem que provoque cansaço desproporcionado, que não imponham pausas para descanso, retomar o fio perdido ou re-centrar a atenção, que não constituam obstáculo a uma leitura integral sem necessidade de paragens” – Acórdão da Relação de Lisboa de 3/5/2001, no Proc. n.º 2861/2001.
Ora, resulta da factualidade provada (teor dos documentos de fls. 60 a 64) que a CGD utiliza naquele clausulado dos cartões um letra de dimensão reduzida, com um espaço entre as linhas também muito reduzido, formando um texto muito compacto que torna a sua leitura difícil e cansativa mesmo para quem possua um visão média, dificultando, consequentemente, a compreensão e apreensão do sentido do texto — embora legível, para um homem comum ou homem médio tal escrito exige, para a sua leitura e de modo desnecessário, um esforço e uma perda de tempo inútil, e sem garantia de total compreensão do conteúdo daquelas cláusulas, extensas e compactas e de letras diminutas, dificuldades acrescidas pelo facto, inerente a este tipo de cláusulas, de o aderente não ter tido intervenção na sua elaboração.
A boa fé que deve presidir a tais contratos impõe, porém, que o aderente possa de modo claro e com facilidade (o que se exige na lei não é uma mera legibilidade do texto, mas sim uma legibilidade fácil) aperceber-se de todo o clausulado, assimilando correcta e adequadamente o seu conteúdo para que se possa, livre e conscientemente, determinar na celebração ou não do contrato de adesão, evitando-se a sua subscrição sem uma leitura ponderada e conscienciosa do seu teor.
Por isso, com este tipo de clausulado, a CGD não cumpre a sua obrigação de informar adequadamente, de forma facilmente apreensível, todos os termos do contrato, em violação, portanto, do disposto nesses preceitos legais.
Daí que tal clausulado tenha de ser excluído dos contratos singulares, devendo a C.G.D. abster-se da sua utilização em futuros contratos como decidido no acórdão recorrido.
Foi também pedido pela A. (se bem que sem sucesso) a declaração de nulidade do clausulado inserto após a assinatura do aderente dos cartões do Banco Totta e Açores e Crédito Predial por violação do art. 8º, al. d) do dec.-lei 446/85.
Segundo este preceito legal devem considerar-se excluídas do contrato as cláusulas insertas em local abaixo, a seguir, ou depois (em termos de espaço e não em termos temporais – as alterações unilaterais após a conclusão do contrato não vinculam as partes) da assinatura.
Com tal exclusão, procura-se evitar a adesão a um contrato sem a devida ponderação e conhecimento do clausulado, presumindo-se naturalmente que sendo a assinatura colocada em local posterior o aderente não possa ter tido a devida percepção do conteúdo do contrato.
Essa cognoscibilidade, que deve existir no momento da conclusão do negócio, tem de se traduzir no conhecimento exacto do conteúdo de todas as cláusulas para as poder avaliar e conscientemente decidir pela sua aceitação
“Não basta aqui a possibilidade de conhecimento, que se sabe, à partida, não ser utilizada, pelo aderente médio”. “É necessária a garantia sólida de que o conteúdo dessas estipulações é efectivamente consciencializado e tido em conta na decisão contratual” (Sousa Ribeiro em ob. cit. pág. 404).
É como se diz no Acórdão deste S.T.J de 13/1/2005, na Revista 3874/04 “É prática tradicional e segura a de que se deve assinar só o que se lê e é esta prática que o legislador claramente acolhe, na previsão de que … os contraentes apenas atentarão e tomarão consciência do conteúdo do contrato até ao ponto onde apõem, intervindo fisicamente, as suas assinaturas”.
Ora, nos contratos de adesão relativos aos cartões TottaGold, Super Satisfação, Classic e + Casa do Banco Totta e Açores e Crédito Predial (fls. 48 a 59) a assinatura do aderente localiza-se antes das cláusulas contratuais gerais que se encontram apostas em folha imediatamente a seguir.
Daí que, segundo tal normativo essas cláusulas devam ser excluídas do contrato — são cláusulas que não constam do documento que é apresentado pelo predisponente para subscrição pelo aderente, cláusulas exteriores, portanto, ao contrato (cf. Acórdão do S.T.J. de 11/9/2007, na Revista 2209/07; de 15/3/2005, na Revista 282/05; e de 3/5/2007, na Revista 1650/06).
Porém, consta dos mesmos contratos em local situado antes da assinatura do aderente, uma declaração em que o aderente afirma ter tomado conhecimento e aceitar as condições de utilização do cartão (é a seguinte essa declaração “Declaro ainda que tomei conhecimento e aceito as Condições Gerais e Particulares de Utilização do(s) Cartão(ões)”.
Com esta declaração, situada antes da assinatura, poder-se-ia concluir que o aderente, ao subscrever o contrato, tem conhecimento do conteúdo dessas outras cláusulas, podendo determinar-se segundo o conteúdo dessas mesmas cláusulas.
Porém, de tal declaração apenas se obtém a certeza de que o aderente declarou conhecer essas cláusulas; não que essa declaração corresponda efectivamente à realidade.
E com a exigência de comunicação na íntegra, estabelecida no art. 5º daquele dec.-lei 446/85, pretende-se “assegurar que, após a leitura das cláusulas, o aderente possa aperceber-se, com exactidão, do seu alcance prescritivo” (Sousa Ribeiro em ob. cit., pág. 381) certo que é sobre o proponente que recai o dever de comunicação adequada e efectiva (art. 5º, n.º 3 do dec.-lei 446/85).
A exigência de que a assinatura deve seguir-se a todas as cláusulas (art. 8º, al. d) daquele dec.-lei 446/85) está para além do conhecimento efectivo pelo aderente — não é este conhecimento efectivo que aqui releva; o que releva é a localização das cláusulas para evitar adesões impensadas.
O legislador, ao consagrar tal norma, para além da comunicação que impende sobre o predisponente, pretende exercer um controlo efectivo ao nível da formação do acordo de adesão, considerando que, independentemente do caso concreto e da sua comunicação, as cláusulas para poderem ser válidas devem anteceder a assinatura do aderente (cf. Acórdão do S.T.J. de 27/3/2007, na Revista 279/2007) para afastar o risco de os aderentes apenas atentarem e tomarem consciência do conteúdo do contrato até ao ponto onde apõem, intervindo fisicamente, as suas assinaturas (Acórdão do S.T.J. de 13/1/2005, na Revista 3874/2004).
E na verdade, com uma declaração deste tipo pode impedir-se que o aderente saiba, sem qualquer dúvida, quais as reais cláusulas a que fica sujeito, podendo ser um meio para um predisponente menos escrupuloso inserir no contrato cláusulas que não são objecto de apreciação e reflexão pelo aderente.
Por isso, a exigência legal de a assinatura se localizar após as cláusulas para que estas sejam relevantes se sobrepõe ao conhecimento manifestado pelo aderente — aquela vontade manifestada naqueles termos pelo aderente cede pela necessidade de uma efectiva formação e consciencialização do conteúdo do proposto, certo que legalmente é considerado irrelevante o localizado após a assinatura, tendo em conta que as cláusulas não foram objecto de negociação.
Daí que tais cláusulas por localizadas após, para além, a seguir à assinatura do aderente, em violação daquele art. 8º, al. d), sejam inválidas e excluídas dos contratos, devendo a Ré Banco BA abster-se da sua futura utilização (art. 32º do dec.-lei 446785).
Assim, apesar de inadmissíveis tais cláusulas por violação daquelas regras formais destinadas a dar a conhecer, de modo adequado e efectivo, os termos do negócio, há ainda que conhecer, por ter sido pedido, eventual nulidade de determinadas cláusulas por o seu conteúdo violar regras específicas consagradas pelo legislador em defesa do aderente contra eventuais abusos de poder da parte predisponente, certo que a invocação dessa eventual nulidade não fica prejudicada pelo facto de ter sido cumprido devidamente o determinado quanto ao modo de comunicação dessas cláusulas — a cognoscibilidade do aderente não torna válidas as cláusulas que contrariem as proibições específicas estabelecidas no dec.-lei 446/85; “só a prévia negociação individual (art. 1º) é de molde a produzir esse efeito” (Pinto Monteiro, ob. cit., pág. 371).
Por isso, há que analisar essas cláusulas e determinar se o seu conteúdo viola ou não as proibições estabelecidas no referido dec.-lei 446/85.
Vejamos, pois, cada uma das cláusulas controvertidas, começando pelas utilizadas pela Ré BA.
Assim, vêm controvertidas as cláusulas 9, 10 e 11 do cartão TottaGold e do Super Satisfação, bem como do Crédito Predial Classic e Cartão + Casa — tais cláusulas foram declaradas nulas no acórdão recorrido, confirmando a sentença de 1ª Instância, por violação do disposto no art. 18º, al. c) e 21º, al. d) do dec.-lei 446785, contra o que defende a Ré Banco BA.
É o seguinte o conteúdo dessas cláusulas:
– Relativamente ao Cartão TottaGold –
Cláusula 9 – “O Banco não é responsável pela não aceitação por terceiros do cartão TottaGold, por deficiências de atendimento ou por qualquer vício dos bens ou serviços obtidos através do cartão”.
Cláusula 10 – “O Banco é terceiro em todos os incidentes ou questões que se possam suscitar entre o Titular do cartão TottaGold e o Comerciante/Prestador de Serviços”.
Cláusula 11 – “A resolução, revogação ou incumprimento de qualquer contrato ou acordo estabelecido pelo Titular do cartão TottaGold com terceiros não é oponível ao Banco”.
– Relativamente ao cartão Super Satisfação –
Cláusula 9 – “O Banco não é responsável pela não aceitação por terceiros do cartão Super Satisfação, por deficiências de atendimento ou por qualquer vício dos bens ou serviços obtidos através do cartão”.
Cláusula 10 – “O Banco é terceiro em todos os incidentes ou questões que se possam suscitar entre o Titular do cartão Super Satisfação e o Comerciante/Prestador de Serviços”.
Cláusula 11 – “A resolução, revogação ou incumprimento de qualquer contrato ou acordo estabelecido pelo Titular do cartão Super Satisfação com terceiros não é oponível ao Banco”.
– Relativamente ao Cartão Predial Classic –
Cláusula 9 – “O Banco não é responsável pela não aceitação por terceiros do cartão Classic, por deficiências de atendimento ou por qualquer vício dos bens ou serviços obtidos através do cartão”.
Cláusula 10 – “O Banco é terceiro em todos os incidentes ou questões que se possam suscitar entre o Titular do cartão Classic e o Comerciante/Prestador de Serviços”.
Cláusula 11 – “A resolução, revogação ou incumprimento de qualquer contrato ou acordo estabelecido pelo Titular do cartão Classic com terceiros não é oponível ao Banco”.
– Relativamente ao Cartão + Casa –
Cláusula 9 – “O Banco não é responsável pela não aceitação por terceiros do cartão + Casa, por deficiências de atendimento ou por qualquer vício dos bens ou serviços obtidos através do cartão”.
Cláusula 10 – “O Banco é terceiro em todos os incidentes ou questões que se possam suscitar entre o Titular do cartão + Casa e o Comerciante/Prestador de Serviços”.
Cláusula 11 – “A resolução, revogação ou incumprimento de qualquer contrato ou acordo estabelecido pelo Titular do cartão + Casa com terceiros não é oponível ao Banco”.
De tais cláusulas, de conteúdo semelhante naqueles cartões, resulta que o Banco se exclui de qualquer responsabilidade que possa resultar das operações realizadas, com os cartões, entre o aderente, titular do cartão e terceiros.
Ora, o banco emissor dos cartões não é de todo alheio a essas relações entre o titular do cartão e o terceiro, comerciante ou prestador de serviços — há aqui uma interligação entre o banco e o aderente/utilizador do cartão, entre esse titular do cartão e o terceiro, comerciante ou prestador de serviços, e entre o banco emissor do cartão e esses terceiros com quem o banco acordou a aceitação do cartão como meio de pagamento.
Esta tríplice relação interpenetra-se, não podendo, sem mais, ser dissociada uma da outra, excluindo-se o banco de toda e qualquer responsabilidade por eventuais danos, designadamente, resultantes de vícios da sua prestação.
Por isso, dispondo-se no art. 18º, al. c) daquele dec.-lei que são proibidas as cláusulas que excluam ou limitem de modo directo ou indirecto a responsabilidade por não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso, em caso de dolo ou de culpa grave, e determinando-se no art. 21º, al. d) do mesmo dec.-lei que são proibidas as cláusulas que excluam os deveres que recaiam sobre o predisponente, em resultado de vícios da prestação ou estabeleçam nesse âmbito reparações ou indemnizações pecuniárias pré-determinadas, tem de se concluir pela sua proibição e consequente nulidade (art. 12º do dec.-lei 446/85).
De outro modo estar-se-ia a excluir o banco de responsabilidade, mesmo nos casos em que uma sua actuação danosa lhe fosse imputada a título de dolo ou culpa grave.
Há, portanto, que confirmar, a declaração de nulidade destas cláusulas.
Também as cláusulas 17 e 22 dos mesmos cartões da Ré BA vêm controvertidas, o que impõe a sua apreciação.
Diz-se nessas cláusulas:
– Relativamente ao Cartão TottaGold –
Cláusula 17 – “Com excepção dos casos em que as ocorrências sejam devidas a culpa ou negligência do Banco e dos débitos por uso abusivo ou fraudulento do cartão que sejam posteriores à comunicação ao Banco que é prevista nos números seguintes ou, se anteriores, que ultrapassem o limite de responsabilidade fixado em 22, o titular do cartão TottaGold assume-se como devedor perante o Banco de todas as importâncias levantadas ou transferidas em ATM ou levantadas em Bancos, bem como das importâncias resultantes da aquisição de bens ou serviços obtidos em estabelecimentos aderentes às redes Eurocard/Mastercard, Multibanco e Redunicre. Em caso de diferendo relativamente a operação electrónica não autorizada pelo Portador, o ónus da prova é do Banco, sendo bastante que demonstre que a operação está evidenciada nos registos informáticos e mecanográficos do sistema operativo do uso do cartão TottaGold e que não foi afectada por falha técnica ou outra deficiência”.
Cláusula 22 – “A responsabilidade global do Titular do cartão TottaGold perante o Banco, decorrente das utilizações do cartão devidas a furto, roubo, perda ou falsificação, verificadas antes da comunicação a que se alude na cláusula anterior, não pode ultrapassar na vertente débito, o valor igual ao saldo credor que, no momento da primeira operação abusiva ou fraudulenta, estiver disponível na conta de Depósitos à Ordem associada ao cartão, acrescido do valor do limite da linha de crédito do descoberto em DO autorizado para a conta e que seja do conhecimento do Titular do cartão TottaGold e, na vertente de crédito, a responsabilidade global do Titular do cartão não poderá ultrapassar o valor, à data da primeira operação considerada irregular, do saldo disponível face ao limite de crédito da conta cartão que seja do conhecimento do titular”.
– Relativamente ao Cartão Super Satisfação –
Cláusula 17 – “Com excepção dos casos em que as ocorrências sejam devidas a culpa ou negligência do Banco e dos débitos por uso abusivo ou fraudulento do cartão que sejam posteriores à comunicação ao Banco que é prevista nos números seguintes ou, se anteriores, que ultrapassem o limite de responsabilidade fixado em 22, o titular do cartão Super Satisfação assume-se como devedor perante o Banco de todas as importâncias levantadas ou transferidas em ATM ou levantadas em Bancos, bem como das importâncias resultantes da aquisição de bens ou serviços obtidos em estabelecimentos aderentes às redes Visa Internacional e Multibanco. Em caso de diferendo relativamente a operação electrónica não autorizada pelo Portador, o ónus da prova é do Banco, sendo bastante que demonstre que a operação está evidenciada nos registos informáticos e mecanográficos do sistema operativo do uso do cartão Super Satisfação e que não foi afectada por falha técnica ou outra deficiência”.
Cláusula 22 – “A responsabilidade global do Titular do cartão Super Satisfação perante o Banco, decorrente das utilizações do cartão devidas a furto, roubo, perda ou falsificação, verificadas antes da comunicação a que se alude na cláusula anterior, não pode ultrapassar o valor, à data da primeira operação considerada irregular, do saldo disponível face ao limite de crédito da conta cartão que seja do conhecimento do titular”.
– Relativamente ao Cartão Classic –
Cláusula 17 – “Com excepção dos casos em que as ocorrências sejam devidas a culpa ou negligência do Banco e dos débitos por uso abusivo ou fraudulento do cartão que sejam posteriores à comunicação ao Banco que é prevista nos números seguintes ou, se anteriores, que ultrapassem o limite de responsabilidade fixado em 22, o titular do cartão Classic assume-se como devedor perante o Banco de todas as importâncias levantadas ou transferidas em ATM ou levantadas em Bancos, bem como das importâncias resultantes da aquisição de bens ou serviços obtidos em estabelecimentos aderentes às redes Visa Internacional e Multibanco. Em caso de diferendo relativamente a operação electrónica não autorizada pelo Titular, o ónus da prova é do Banco, sendo bastante que demonstre que a operação está evidenciada nos registos informáticos e mecanográficos do sistema operativo do uso do cartão Classic e que não foi afectada por falha técnica ou outra deficiência”.
Cláusula 22 – “A responsabilidade global do Titular do cartão Classic perante o Crédito Predial Português, decorrente das utilizações do cartão devidas a furto, roubo, perda ou falsificação, verificadas antes da comunicação a que se alude na cláusula anterior, não pode ultrapassar o valor, à data da primeira operação considerada irregular, do saldo disponível face ao limite de crédito da conta cartão que seja do conhecimento do titular”.
– Relativamente ao Cartão+ Casa –
Cláusula 17 – “Com excepção dos casos em que as ocorrências sejam devidas a culpa ou negligência do Banco e dos débitos por uso abusivo ou fraudulento do cartão que sejam posteriores à comunicação ao Banco que é prevista nos números seguintes ou, se anteriores, que ultrapassem o limite de responsabilidade fixado em 22, o Titular do cartão + Casa assume-se como devedor perante o Banco de todas as importâncias levantadas ou transferidas em ATM ou levantadas em Bancos, bem como das importâncias resultantes da aquisição de bens ou serviços obtidos em estabelecimentos aderentes às redes Visa Internacional e Multibanco. Em caso de diferendo relativamente a operação electrónica não autorizada pelo Titular, o ónus da prova é do Banco, sendo bastante que demonstre que a operação está evidenciada nos registos informáticos e mecanográficos do sistema operativo do uso do cartão + Casa e que não foi afectada por falha técnica ou outra deficiência”.
Cláusula 22 – “A responsabilidade global do Titular do cartão + Casa perante o Banco, decorrente das utilizações do cartão devidas a furto, roubo, perda ou falsificação, verificadas antes da comunicação a que se alude na cláusula anterior, não pode ultrapassar o valor, à data da primeira operação considerada irregular, do saldo disponível face ao limite de crédito da conta cartão que seja do conhecimento do titular”.
Com tal cláusula 17, estabelece-se na 1ª parte uma confissão de dívida do titular do cartão.
Tal responsabilidade está, porém, excluída nos casos de as ocorrências serem devidas a culpa ou negligência do banco e nos casos de uso abusivo ou fraudulento do cartão ocorridos após comunicação ao banco e nos casos de uso abusivo ou fraudulento ocorridos antes dessa comunicação no que ultrapassar o limite estabelecido na cláusula 22.
Assim, a responsabilidade do titular do cartão recai sobre todas as importâncias levantadas ou transferidas ou que resultem de aquisição de bens ou serviços, resultantes de uso lícito do cartão pelo seu titular, o que não merece qualquer reparo.
E essa responsabilidade também recai sobre o titular do cartão nos casos de uso indevido antes da comunicação ao banco e desde que não sejam devidos a culpa ou negligência do banco.
Só que aqui a responsabilidade do titular do cartão encontra-se limitada — não pode ultrapassar o limite estabelecido na cláusula 22, o que faz recair sobre o banco a responsabilidade pelo excedente.
Estabelece-se, assim, aqui uma repartição de responsabilidade em casos em que não existe culpa, nem do titular do cartão nem do banco.
Com efeito, esta repartição de responsabilidade entre banco e titular do cartão justifica-se porquanto sendo certo que o banco só estará em condições de impedir o uso indevido do cartão após a comunicação do seu titular, se bem que a ele caiba providenciar pela segurança do sistema, também não é menos certo que o titular do cartão pode não ter conhecimento prévio da utilização abusiva e pode nem ter tido qualquer responsabilidade nessa utilização, certo ainda que o conhecimento dessa utilização só lhe pode advir após os actos ilícitos de terceiro sem qualquer violação dos deveres de diligência.
Daí não se mostrar justo, segundo critérios de boa fé, fazer recair sobre o utilizador a responsabilidade exclusiva pelo uso indevido, tanto mais que se o cliente tem vantagens na utilização do cartão também o banco não deixa de auferir benefícios pelo seu uso generalizado.
Assim, a distribuição de responsabilidade entre o banco e o titular do cartão obedece aos princípios da boa fé que devem presidir na formação e celebração dos contratos e que estão na base da protecção estabelecida pelo dec.-lei 446/85.
Não há, por isso, que declarar proibida e nula essa cláusula 17, 1ª parte, por violação do disposto no art. 21º, al. f) do dec.-lei 446/85, como pretende a A., havendo que confirmar a decisão recorrida.
E com a cláusula 22, a Ré Banco BA fixa, ao titular do cartão, um máximo de responsabilidade nos casos de furto, roubo, perda ou falsificação do cartão e antes da sua comunicação ao banco.
Aqui não se estabelece ou se impõe a responsabilidade do titular do cartão antes da sua comunicação ao banco nos casos de furto, roubo perda ou falsificação, nem se fixa o montante de responsabilidade do titular do cartão — determina-se apenas que essa responsabilidade, a existir, não pode exceder determinada quantia; limita-se a responsabilidade do titular perante o banco.
E este limite de responsabilidade, donde resulta caber ao banco suportar a restante responsabilidade, mostra-se equilibrado e razoável.
Com efeito, não havendo culpa do titular do cartão nem do banco, nos casos de furto, roubo, perda ou falsificação e antes de comunicação ao banco e tendo de ser repartida entre o banco e o titular do cartão essa responsabilidade pelo uso indevido do cartão, o limite estabelecido não se mostra desrazoável, desequilibrado, ofensivo das regras da boa fé.
Assim, ao contrário do que defende a A., não ocorre violação do disposto no art. 21º, al. f) e g) do dec.-lei 446/85 (tais normas prevêem a modificação das regras de distribuição do risco e dos critérios de repartição do ónus de prova ou restrição dos meios de prova legais e aqui, nesta cláusula, não se trata de qualquer modificação desse tipo ou natureza; nesta cláusula 22, limita-se a responsabilidade do titular do cartão, fixando-lhe uma responsabilidade máxima, naqueles casos em que não ocorre culpa, nem do banco nem do titular).
Conclui-se, portanto, não ser proibida a cláusula 22, como foi decidido.
Quanto à 2ª parte da cláusula 17, cria-se ali um meio de prova bastante – os registos informáticos – atribuindo-se-lhe uma força probatória em contrário do que resultaria da utilização de meios legais de prova admissíveis em direito, excluindo-o do âmbito do princípio geral de livre apreciação dos meios de prova (art. 655º, n.º 1 do C.P.C.).
Com esta cláusula, ao banco não se atribui o dever de provar que a operação registada corresponde à realidade, que se encontra correcta que não enferma de qualquer erro ou vício, mas apenas provar que a operação está nos registos informáticos.
E assim sendo, o banco pouco ou nada tem de provar, impondo ao titular do cartão um meio de prova por si elaborado, com valor de prova favorável ao seu autor (contra o que resulta do princípio da força probatória dos documentos – art. 374º e 376º do C.C.) e que o titular do cartão não pode controlar e dificilmente contestar.
Ora, determina-se no art. 21º, al. g) do dec.-lei 446/85 que são nulas as cláusulas que modifiquem os critérios de repartição do ónus de prova ou restrinjam a utilização de meios probatórios legalmente admitidos.
Daí que tratando-se de uma cláusula que estabelece um critério de repartição do ónus de prova, que também restringe a utilização e valoração dos meios de prova, tem de se declarar a sua nulidade.
Conclui-se, portanto, pela nulidade da cláusula 17, 2ª parte, em conformidade com o decidido no acórdão recorrido.
A cláusula 23, também controvertida, tem o seguinte conteúdo:
– Relativamente ao Cartão TottaGold –
Cláusula 23 – “A inobservância ou violação da cláusula 14, a actuação dolosa ou a negligência grosseira exclui o Titular do cartão TottaGold do benefício de qualquer cláusula que tenha por fim evitar, reduzir ou limitar os seus danos ou prejuízos, em caso de incidente”.
– Relativamente ao Cartão Super Satisfação –
Cláusula 23 – “A inobservância ou violação da cláusula 14, a actuação dolosa ou a negligência grosseira exclui o Titular do cartão Super Satisfação do benefício de qualquer cláusula que tenha por fim evitar, reduzir ou limitar os seus danos ou prejuízos, em caso de incidente”.
– Relativamente ao Cartão Classic–
Cláusula 23 – “A inobservância ou violação da cláusula 14, a actuação dolosa ou a negligência grosseira exclui o Titular do cartão Classic do benefício de qualquer cláusula que tenha por fim evitar, reduzir ou limitar os seus danos ou prejuízos, em caso de incidente”.
– Relativamente ao Cartão + Casa –
Cláusula 23 – “A inobservância ou violação da cláusula 14, a actuação dolosa ou a negligência grosseira exclui o Titular do cartão + Casa do benefício de qualquer cláusula que tenha por fim evitar, reduzir ou limitar os seus danos ou prejuízos, em caso de incidente”.
No acórdão recorrido decidiu-se pela nulidade da cláusula por violação do disposto no art. 18º, al. e) daquele dec.-lei 446/85, que proíbe as cláusulas que confiram a quem as predisponha a faculdade exclusiva de interpretar qualquer cláusula do contrato.
Entende-se que tal cláusula não é proibida e, portanto, não é nula.
Com efeito, nesta cláusula estabelece-se, para os casos de violação daquelas obrigações de cuidado pelo titular do cartão, a exclusão dos benefícios que, para esse titular do cartão, resultariam de cláusulas que tenham por finalidade evitar ou reduzir os danos.
Esta cláusula não atribui ao banco a faculdade ou o direito de interpretar a conduta do titular do cartão, qualificando-a como violadora daquelas obrigações — apenas estabelece a exclusão de um benefício, como resultado de uma conduta grosseiramente culposa, sendo que o que deve ser entendido, em concreto, como violador dessas obrigações, não está conferido, em exclusividade, ao banco.
Por isso, tem-se esta cláusula 23 por válida, como defende a Ré Banco BA e ao contrário do decidido no acórdão recorrido.
A cláusula 34 dos mesmos cartões foi também declarada nula na decisão recorrida, por violação do disposto no art. 21º, al. g) do dec.-lei 446/85, contra o que defende a recorrente Banco BA, sendo, o seguinte, o seu conteúdo:
– Relativamente ao Cartão TottaGold –
Cláusula 34 – “A abertura dos envelopes e a conferência dos valores depositados será feita por dois empregados do Banco. Havendo divergência entre os valores conferidos e os digitados, o ónus da prova é do depositante”.
– Relativamente ao Cartão Super Satisfação –
Cláusula 34 – “A abertura dos envelopes e a conferência dos valores depositados será feita por dois empregados do Banco. Havendo divergência entre os valores conferidos e os digitados, o ónus da prova é do depositante”.
– Relativamente ao Cartão Classic–
Cláusula 34 – “A abertura dos envelopes e a conferência dos valores depositados será feita por dois empregados do Banco. Havendo divergência entre os valores conferidos e os digitados, o ónus da prova é do depositante”.
– Relativamente ao Cartão + Casa –
Cláusula 34 – “A abertura dos envelopes e a conferência dos valores depositados será feita por dois empregados do Banco. Havendo divergência entre os valores conferidos e os digitados, o ónus da prova é do depositante”.
Estabelece esta cláusula que, havendo divergência entre os valores conferidos por dois empregados do banco, quando procederem à abertura dos envelopes, e os valores digitados pelo depositante, a prova do valor real e efectivo do depósito cabe ao depositante.
Aqui não se inverte o ónus de prova — a prova do valor do depósito cabe ao depositante — este é que invocará o direito a uma quantia que o banco se recusa a conferir-lhe direito. E quem invoca o direito cabe provar os factos constitutivos desse direito (art. 342º, n.º 1 do C.C.).
Por isso, não havendo qualquer inversão do ónus de prova, não se pode declarar nula essa cláusula com base em violação daquele art. 21º, al. g) que proíbe a inversão do ónus de prova.
Por outro lado, ao contrário do que se disse no acórdão recorrido, entende-se que com esta cláusula não se dá qualquer prevalência a qualquer meio de prova, valorando, em caso de divergência, a prova do banco em detrimento da prova do titular do cartão.
Os meios de prova que cada um, banco ou titular do cartão, poderá apresentar não estão aqui hierarquizados — daqui não se infere que vale mais a prova dos empregados do que a prova da digitação, o que afasta a violação do princípio da livre apreciação da prova.
Conclui-se, portanto, ao contrário do decidido no acórdão recorrido, pela validade da referida cláusula 34.
E, por fim, quanto aos cartões da Ré Banco BA, também a cláusula 51 se mostra controvertida, sendo o seu conteúdo:
– Relativamente ao Cartão TottaGold –
Cláusula 51 – “O Banco AA fica desde já autorizado a debitar qualquer conta do titular do cartão TottaGold, existente no Banco e por este movimentável, pelas importâncias não pagas nos respectivos vencimentos e para extinção total ou parcial da dívida por compensação”.
– Relativamente ao Cartão Super Satisfação –
Cláusula 51 – “O Banco AA fica desde já autorizado a debitar qualquer conta do titular do cartão Totta Super Satisfação, existente no Banco e por este movimentável, pelas importâncias não pagas nos respectivos vencimentos e para extinção total ou parcial da dívida por compensação”.
– Relativamente ao Cartão Classic–
Cláusula 51 – “O CPP fica desde já autorizado a debitar qualquer conta do titular do cartão CPP Classic, existente no Banco e por este movimentável, pelas importâncias não pagas nos respectivos vencimentos e para extinção total ou parcial da dívida por compensação”.
– Relativamente ao Cartão + Casa –
Cláusula 51 – “O CPP fica desde já autorizado a debitar qualquer conta do titular do cartão CPP Cartão + Casa, existente no Banco e por este movimentável, pelas importâncias não pagas nos respectivos vencimentos e para extinção total ou parcial da dívida por compensação”.
Esta cláusula 51 foi entretanto alterada, passando a ter a seguinte redacção:
– Relativamente ao Cartão Super Satisfação –
Cláusula 51 – “O Banco fica desde já autorizado a debitar qualquer conta do titular do cartão Totta Super Satisfação, existente no Banco e por este movimentável, pelas importâncias não pagas nos respectivos vencimentos e para extinção total ou parcial da dívida por compensação”.
– Relativamente ao Cartão Predial Classic –
Cláusula 51 – “O Banco fica desde já autorizado a debitar qualquer conta do titular do Cartão + Casa, existente no Banco e por este movimentável, pelas importâncias não pagas nos respectivos vencimentos e a compensar o respectivo montante com débitos de igual valor e independentemente da verificação dos requisitos da compensação legal”.
Tal cláusula foi declarada nula no acórdão recorrido por violação do disposto no art. 19º, al. d) do dec.-lei 446/85 (proibição de cláusula que imponha ficções de receptação, de aceitação ou de outras manifestações de vontade com base em factos para tal insuficientes) com a invocação de que tal cláusula permite compensar dívidas através de contas de que o titular do cartão, embora as possa movimentar, não é titular, como por exemplo, quando se trata de procurador.
Ora, resulta da cláusula 51 daqueles cartões que o Banco fica autorizado a proceder a compensação, debitando qualquer conta do titular do cartão pelas quantias não pagas.
Daqui não resultaria, em princípio, sendo o titular do cartão o único titular da conta, qualquer abuso — havendo créditos e débitos recíprocos, o banco procede a compensação de créditos, o que traduz uma forma de extinção de obrigações perfeitamente legítima, sem que se possa dizer que se trata de imposição do predisponente sobre o aderente atentatória das regras da boa fé, pressuposto da proibição das cláusulas contratuais gerais (art. 15º do dec.-lei 446/85 e art. 847º do C.C.).
Mas, a compensação já não seria admissível se, como se diz no acórdão recorrido, o banco pudesse proceder a compensação com quantias depositadas em conta de que o titular do cartão não fosse também titular da conta — seria permitir a compensação com depósitos e contas de terceiros.
Todavia, em tal cláusula, apesar de nela se referir “conta por este movimentável”, não se está a permitir que o banco proceda a pagamento da dívida do titular do cartão com dinheiro depositado em conta de que não é titular — a compensação referida na cláusula só pode reportar-se a conta do titular do cartão, conta essa que por este é movimentável e não a conta apenas movimentável pelo titular do cartão.
Tal cláusula não confere, portanto, ao Banco a possibilidade de debitar ou proceder a compensação de créditos com importâncias depositadas em contas de que o titular do cartão não seja titular — os débitos e a compensação ocorrem entre credor e devedor e relativamente a contas estabelecidas e acordadas entre as mesma partes.
Porém, tal cláusula — ao autorizar o Banco a proceder a compensação, debitando qualquer conta do titular do cartão pelas quantias não pagas — permite que o Banco também debite e proceda a essa compensação com contas de que o titular do cartão não é o único titular da conta, com contas conjuntas ou solidárias.
Ora, sendo vários os titulares da conta, presume-se que as suas quotas sejam iguais (art. 516º do C.C. e Acórdãos do S.T.J. de 27/1/98 e de 17/6/99, na C.J. – S.T.J. – 1998-1-42 e 1999-2-152).
Daí que, com tal autorização, o Banco está a impor ao titular do cartão a aceitação de débitos e compensação com créditos de terceiro, com créditos de quem não é titular do cartão, o que não pode aceitar-se.
E não justifica essa imposição o facto de o titular do cartão e contitular da conta poder movimentar a totalidade do depósito — é que não há que confundir as relações do Banco com o titular do cartão e contitular da conta com as relações entre os diversos contitulares de uma conta de depósito.
Acresce que também se impõe ao titular do cartão a compensação independentemente da verificação dos requisitos legais sem se indicar concretamente quais sejam então os requisitos exigíveis.
Daí que tal cláusula 51, como foi decidido, no acórdão recorrido, se deva considerar proibida.
Impõe-se agora analisar as cláusulas predisponibilizadas pela Ré C.G.D. que se mostram controvertidas, ou seja, as cláusulas 9; 12; 12.1; 15; 15.1; 18; 18.1; 22.1; 23; 26; 29; 30.1; 32; 32.1; 32.3; 34; 34.1; 35; 36; 45; 50.6; 52.1; 52.2.
Vejamos o conteúdo de cada uma delas e se devem ou não ser declaradas proibidas por violação do dec.-lei 446/85, como pretende a A., DECO.
Cláusula 9 – “Por cada cartão será cobrada uma anuidade, actualizável pela CGD mediante prévia comunicação ao titular”.
Cláusula 29 – “A CGD fixará um limite de crédito que será comunicado confidencialmente ao titular. O referido limite poderá ser alterado pela CGD por sua iniciativa ou a solicitação do titular”.
Estabelece-se, nesta cláusula 9, para além da obrigação de pagamento, pelo aderente à CGD, de uma quantia por ano, a possibilidade de alteração unilateral pela CGD, mediante prévia comunicação ao titular do cartão.
Nela não se indica o seu montante, nem o critério para a sua actualização, nem o prazo para que a comunicação de alteração possa produzir efeitos, nem ainda quais os meios de que dispõe o titular do cartão para reagir, aceitando ou resolvendo o contrato.
Na cláusula 29, por sua vez, estabelece-se também a possibilidade de alteração unilateral do limite de crédito concedido ao titular do cartão.
Aqui também não se indica qualquer critério nem se aponta qualquer fundamento para essa alteração, nem qual o prazo a partir do qual a alteração desse limite produzirá efeitos.
Tais cláusulas foram declaradas nulas, no acórdão recorrido, por violação do disposto no art. 22º, al. c) do dec.-lei 446/85 (prevê-se aqui a nulidade de cláusula que atribua a quem a predisponha o direito de alteração unilateral, excepto se existir razão atendível que as partes tenham convencionado).
E efectivamente, tais cláusulas, nos termos em que se encontram elaboradas, têm de ser declaradas proibidas e nulas.
Com efeito, embora seja de admitir a possibilidade de a CGD proceder a alteração unilateral da anuidade e do limite de crédito (tem de se atentar que o contrato é de execução continuada, podendo prolongar-se por vários anos, logo sujeito a alterações das condições de utilização e de capacidade económica do titular do cartão) essas alterações têm de salvaguardar a posição do aderente titular do cartão, com a concessão de prazo razoável para, conhecendo-as, se poder determinar, aceitando-as ou resolvendo o contrato.
Por isso, não estando clausulado as razões para essas alterações e sem a garantia de conhecimento atempado das alterações e possibilidade de aceitação ou resolução, gera-se uma situação de desigualdade entre as partes e uma violação do princípio de confiança que as deve orientar.
Conclui-se, portanto, como na Relação, pela nulidade das cláusulas 9 e 29.
Cláusula 12 – “Sempre que o cartão tiver sido utilizado com correcta digitação do NIP, presume-se que o foi pelo titular”.
Cláusula 12.1 – “Se o cartão for utilizado por terceiro, presume-se que tal utilização foi consentida ou culposamente facilitada pelo titular”.
Entende a A., recorrente, que tais cláusulas devem ser declaradas nulas por modificarem o critério de repartição do ónus de prova, violando o disposto no art. 21º, al. g) do dec.-lei 446/85.
Estas cláusulas foram declaradas válidas na 1ª Instância, decisão que a Relação confirmou.
Em tais cláusulas estabelece-se uma presunção — presunção de uso do cartão; presunção de que foi utilizado pelo titular quando for correcta a digitação do NIP e presunção de que o uso foi consentido ou facilitado culposamente pelo titular quando for usado por terceiro.
Com esta dupla presunção faz-se recair sobre o aderente a prova de que o cartão não foi por si usado ou de que consentiu ou facilitou culposamente o seu uso a terceiro.
Simplesmente, esta presunção encontra-se em consonância com as regras que estabelecem os princípios que norteiam as normas de distribuição do ónus de prova (art. 342º e segs. do C.C.).
Efectivamente, a atribuição do cartão é pessoal, cabendo ao seu titular a obrigação de manter secreto o PIN que lhe foi atribuído.
Daí que o uso por terceiro ou o conhecimento por terceiro desse PIN, pela ordem natural das coisas, resulte de incumprimento dessas obrigações do titular do cartão.
E assim sendo, ao titular do cartão caberá fazer a prova de que o cartão não foi por si usado, nem que não consentiu no seu uso, fazendo a prova da factualidade contrária; o banco não estaria em condições de provar que não foi o titular que o usou — é esta a regra que, de boa fé, deve presidir às relações entre o Banco e o titular do cartão.
Por isso, não há aqui qualquer inversão do ónus de prova, retirando-a do banco e fazendo-a recair sobre o titular do cartão.
Estas cláusulas 12 e 12.1 são, portanto, válidas, como foi decidido nas Instâncias.
Cláusula 15 – “A responsabilidade global do titular decorrente das utilizações do cartão devidas a furto, roubo, perda ou falsificação, verificadas antes da notificação a que se refere o n.º 13 não pode ultrapassar, salvo havendo dolo ou negligência grosseira do titular, no caso de o cartão ser utilizado como cartão de crédito, o valor, à data da primeira operação considerada irregular, do saldo disponível face ao limite de crédito que seja do conhecimento do titular”.
Cláusula 15.1 – “Caso o cartão seja utilizado como cartão de débito, a referida responsabilidade global não pode ultrapassar, salvo havendo dolo ou negligência grosseira do titular, o valor, à data da primeira operação considerada irregular, do saldo disponível na conta associada ao cartão, incluindo o resultante de crédito outorgado que seja do conhecimento do titular”.
Nestas cláusulas fixa-se um limite de responsabilidade ao titular do cartão por utilizações ilícitas de terceiros.
Valem aqui as considerações referidas supra quanto às cláusulas 17 e 22 dos cartões utilizados pelo Banco BA, concluindo-se pela sua validade, como decidido (cf. Acórdão deste STJ de 23/11/99, na CJ – STJ – 1999-3-100).
Cláusula 18 – “As despesas de expediente a que houver lugar, incluindo as de colocação em lista negra, captura do cartão por motivos imputáveis ao titular, bem como as resultantes da sua substituição, serão da responsabilidade do titular, ficando a CGD autorizada a debitar a conta-cartão a que se refere o n.º 30.2 pelo respectivo montante”.
Cláusula 18.1 – “As despesas serão cobradas de acordo com o tarifário então em vigor divulgado nos termos da lei”.
Cláusula 32 – “Sobre as quantias utilizadas pelo titular em virtude da operação de adiantamento de dinheiro (cash advance) serão devidos juros a partir da data de emissão do extracto que as inclua caso as mesmas não sejam liquidadas até ao 20º dia posterior ao daquela emissão”.
Cláusula 32.1 – “Sobre as quantias correspondentes às operações de aquisição de bens ou serviços realizadas pelo titular apenas serão devidos juros contados desde a data da emissão do extracto, caso as mesmas não sejam liquidadas até ao 20º dia posterior ao daquela emissão”.
Cláusula 32.3 – “Aos juros acrescerão o imposto de selo e outros encargos legais eventualmente devidos”.
Cláusula 34 – “Constituindo-se o titular em mora, a taxa dos juros remuneratórios contratualmente devidos será agravada com uma sobretaxa de 4% ao ano, podendo a CGD exigir o pagamento antecipado e imediato de tudo quanto estiver em dívida”.
Cláusula 34.1 – “Se não houver lugar a juros remuneratórios, será aplicada a taxa supletiva de juros remuneratórios estabelecida para os créditos de que sejam titulares empresas comerciais”.
Cláusula 35 – “Sem prejuízo do agravamento atrás citado, a CGD poderá ainda debitar ao titular os encargos de cobrança”.
De tais cláusulas resulta a atribuição à CGD do poder de cobrar, debitando na conta-cartão, as quantias por despesas, encargos, taxas de juro e sobretaxas resultantes da celebração do contrato ou de utilização do cartão.
Em tais cláusulas, não se indicam os seus montantes, nem os critérios para a sua determinação, remetendo-se antes para elementos estranhos ao documento que é proposto para subscrição.
Ora, dispõe-se no art. 5º do dec.-lei 446/85 que as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes, com a antecedência necessária para que se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo.
E determina-se no art. 8º, al. a) do mesmo diploma legal que se consideram excluídas dos contratos as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos daquele art. 5º.
Daqui resulta não ser permitido que o predisponente imponha ao aderente obrigações que não conhece integralmente e que, por isso, não pode ponderar antes de aderir ao contrato.
Daí que, não sendo, ao aderente, devidamente comunicados aqueles encargos, se tenha de os considerar não permitidos por contrários àquelas normas legais, como foi decidido no acórdão recorrido.
Cláusula 22.1 – “O titular continuará, no entanto, a ser responsável pelas dívidas e encargos emergentes da eventual utilização do cartão após a extinção do contrato, e até à efectiva devolução do cartão, nos mesmos termos em que o era anteriormente”.
Esta cláusula foi declarada nula no acórdão recorrido por violação do disposto no art. 21º, al. f) do dec.-lei 446/85 (proibição de alteração das regras de distribuição do risco).
Esta cláusula mantém a responsabilidade do titular do cartão, findo o contrato, até à efectiva devolução do cartão.
Há aqui um prolongamento da responsabilidade para além da vigência do contrato – o titular é responsável nos mesmos termos em que o era enquanto vigorou o contrato.
Ora, tal cláusula não mereceria certamente qualquer controvérsia sobre a sua validade se a responsabilidade do titular do cartão se reconduzisse apenas aos casos em que o titular, apesar da extinção do contrato, mantém a utilização do cartão.
Todavia, o cartão pode ser abusivamente utilizado, sem qualquer culpa do titular, não sendo aceitável que o risco por essa utilização recaia sobre o titular do cartão, certo que o Banco tem possibilidades de proceder, de imediato, ao cancelamento do cartão.
Tem, assim, de se afirmar a nulidade da cláusula 22.1, confirmando o decidido pela Relação.
Cláusula 23 – “A CGD reserva-se o direito de alterar, unilateralmente, as presentes Condições Gerais de Utilização. A alteração produzirá efeito se o titular, no prazo de quinze dias, a contar da informação da alteração, não resolver o presente contrato. Em caso de resolução, o titular terá o direito de reaver a anuidade paga na parte proporcional ao período não decorrido”.
Esta cláusula 23 permite à CGD alterar unilateralmente as condições gerais de utilização, produzindo efeito se o aderente titular do cartão não resolver o contrato no prazo de 15 dias a contar da informação dessa alteração.
Com esta cláusula, a CGD parece estabelecer duas presunções, das quais retira consequências que podem atentar contra os interesses do titular do cartão, impondo-lhe regras com que pode não contar.
Efectivamente, poderá dizer-se que a CGD pressupõe que a informação, que foi prestada ao titular do cartão, chegou ao seu conhecimento e que a CGD retira do silêncio do titular do cartão a conclusão de aceitação das alterações que, unilateralmente, introduziu.
Todavia, o seu conteúdo não pode ser considerado, como o foi na decisão recorrida, violador da regra estabelecida no art. 19º, al. d) do dec.-lei 446/85 que proíbe a ficção de receptação ou de aceitação com base em factos insuficientes.
Na verdade, segundo o art. 224º, n.º 1 do C.C., a declaração que tem um determinado destinatário só se torna eficaz quando chega ao seu poder ou é dele conhecida.
Daí que a informação referida na cláusula se tenha de entender no sentido de ter sido do conhecimento do titular do cartão; só há informação quando ela chega ao conhecimento do interessado; antes não se pode afirmar ter ocorrido informação do banco ao titular do cartão. E é este conhecimento efectivo que marca o início do prazo para a aceitação ou resolução.
Por outro lado, e quanto ao silêncio, tem de se atentar que o silêncio não é de todo irrelevante no nosso ordenamento jurídico.
O silêncio assume relevância nos termos do art. 218º do C.C..
E no caso concreto, o titular do cartão teve a possibilidade de, conhecendo a cláusula, se determinar pela sua aceitação, no uso da sua liberdade de vinculação.
Não pode, por isso, a cláusula 23 considerar-se proibida, como o fora no acórdão recorrido, por violação do disposto no art. 19, al. d) daquele dec.-lei 446/85 (cf. no mesmo sentido da sua validade, o que fora decidido neste S.T.J., em idêntica cláusula, no Acórdão de 3/12/98, na C.J. – STJ – 1998-3-144 e no Acórdão de 14/2/2002, proferido no Processo n.º 4301/01).
Cláusula 26 – “A CGD, sem prejuízo de adoptar as medidas que entender convenientes, não pode, em circunstância alguma, ser responsabilizada pela não aceitação do cartão nem pelas deficiências de atendimento ou má qualidade dos bens e serviços obtidos por seu intermédio”.
Esta cláusula estabelece a irresponsabilidade da CGD nos casos de não aceitação do cartão, pelo deficiente atendimento ou má qualidade dos bens ou serviços obtidos com a utilização do cartão pelo seu titular.
E foi declarada nula no acórdão recorrido, confirmando a sentença de 1ª Instância, por violação do disposto nos art. 18º, al. c) e 21º, al. g) do dec.-lei 446/85.
Tal cláusula consagra um regime de irresponsabilidade do predisponente idêntico ao fixado nas cláusulas 9, 10 e 11 dos cartões da Ré Banco Santander, também consideradas nulas.
Por isso, valem aqui também as considerações ali enunciadas, dado que o banco não pode, sem mais, ficar alheio a essas relações entre o titular do cartão e o terceiro comerciante ou prestador de bens ou serviços, sob pena de se excluir a responsabilidade do banco, mesmo nos casos em que uma sua actuação danosa lhe fosse imputada a título de dolo ou culpa grave.
Há, portanto, que confirmar, a declaração de nulidade desta cláusula 26.
Cláusula 30.1 – “O extracto será enviado para a morada do titular indicada na proposta de adesão, considerando-se a dívida reconhecida por ele se não for recebida pela CGD qualquer reclamação por escrito no prazo de sete dias seguidos, contados da data da recepção do extracto na referida morada”.
Esta cláusula foi declarada nula no acórdão recorrido por violação do disposto no art. 19º, al. d) do dec.-lei 446/85 (cláusula que impõe ficção de recepção, de aceitação com base em factos para tal insuficientes).
Com efeito, nesta cláusula estabelece-se a presunção de que o titular do cartão recebeu, na morada indicada, o extracto e impõe-se ao titular do cartão o reconhecimento da dívida se não houver reclamação no prazo de 15 dias.
Ora, não se pode extrair do facto de a remessa do extracto ter sido remetida para a morada acordada, a conclusão de que o titular do cartão o recebeu e deu o seu acordo.
Aqui ficciona-se uma recepção (o recebimento do extracto) e consagra-se uma aceitação (o reconhecimento da dívida).
Ora, o silêncio, com força vinculativa (nada dizendo, considera-se a dívida reconhecida pelo titular do cartão) tem aqui como pressuposto um facto presumido (o de que o titular do cartão recebeu o extracto por ter sido remetido para a sua morada) facto que se não pode inferir (nem sempre a correspondência é entregue a quem o devia ser) sendo que é desta recepção na morada que a CGD faz decorrer o prazo para o reconhecimento da dívida ou para reclamação.
Assim, a cláusula 30.1 da CGD, como foi decidido, é nula por violação daquele art. 19º, al. d) do dec.-lei 446/85.
Cláusulas 36 e 50.6 – “Sem prejuízo da constituição do titular em mora, a CGD fica desde já autorizada a debitar a quantia em dívida em qualquer outra conta de depósito de que aquele seja titular ou co-titular solidário, podendo ainda proceder à compensação nos termos legais”.
Estabelece-se aqui a possibilidade de compensação de créditos entre as partes, mesmo relativamente a outras contas do titular do cartão na CGD..
O conteúdo de tais cláusulas foi declarado proibido e nulo no acórdão recorrido, por violação do disposto no art. 19º, al. d) e 16º do dec.-lei 446/85.
Considera-se também aqui existir essa nulidade, essencialmente nos termos referidos quanto à cláusula 51do Banco BA.
A compensação estabelecida permite ao Banco pagar-se com créditos de terceiros, forma ilegítima de extinção de obrigações.
Improcede, portanto, nesta parte, a pretensão da recorrente CGD, porquanto estas cláusulas 36 e 50.6 enfermam daquela invalidade.
Cláusula 45 – “O titular obriga-se a utilizar sempre o MBNet em todas e quaisquer operações que venha a efectuar em ambientes abertos, podendo a Caixa inviabilizar as operações em que o referido Serviço não seja utilizado, não sendo, em qualquer caso, responsável por eventuais prejuízos sofridos pelo titular”.
Estabelece-se nesta cláusula a obrigação do titular do cartão de utilizar sempre o MBNet nas operações em ambientes abertos. E determinou-se ainda que, em caso de incumprimento desta obrigação pelo titular do cartão, a CGD pode inviabilizar a operação, não sendo de imputar à CGD qualquer responsabilidade por eventuais prejuízos, quer a CGD inviabilize ou não inviabilize essa operação realizada sem utilização de MBNet.
No acórdão recorrido, considerou-se tal cláusula válida por não violar, ao contrário do que pretende a A., o disposto no art. 18º, al. c) do dec.-lei 446/85 (são nulas as cláusulas que excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto a responsabilidade pelo não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso, em caso de dolo ou culpa grave).
Trata-se de imposição de uma obrigação, ao titular do cartão, de utilização de MBNet em todas as operações em ambientes abertos, obrigação que faz parte do objecto do contrato, comunicada ao aderente — aqui não se estabelece qualquer exoneração ou limitação de responsabilidade da CGD por um seu incumprimento. Apenas se exclui a responsabilidade da CGD por uma utilização contratualmente ilícita do titular do cartão, quer a CGD a tenha quer a não tenha inviabilizado, o que se encontra em consonância com o princípio geral de que a responsabilidade recai sobre o incumpridor.
E sendo o incumpridor, o aderente, utilizador do cartão, não se pode afirmar existir qualquer imposição violadora das regras de boa fé que devem presidir à elaboração das cláusulas.
Conclui-se, portanto, pela não proibição desta cláusula 45 da CGD, como decidido no acórdão recorrido.
Cláusula 52.1 – “A abertura de envelopes e a conferência dos valores depositados serão feitas por dois empregados da CGD ou de outra entidade por ela mandatada para o efeito. Havendo divergência entre os valores conferidos e os digitados pelo titular, prevalecerão os valores encontrados por aqueles empregados, os quais lavrarão uma acta na qual mencionarão os valores por eles efectivamente apurados”.
Cláusula 52.2 – “Até prova em contrário, os valores depositados são os que tiverem sido escriturados na acta, nos termos do número antecedente”.
Estas cláusulas, declaradas válidas na decisão recorrida, encontram-se muito próximas do conteúdo referido na cláusula 34 dos cartões utilizados pelo Banco BA, sendo, como se disse quanto àquela, cláusulas não proibidas por não proceder a modificação dos critérios de repartição do ónus de prova, nem restringir meios legais de prova (art. 21º, al. g) do dec.-lei 446/85).
A prova do valor do depósito cabe ao depositante (art. 342º, n.º 1 do C.C.) não havendo qualquer hierarquização de meios de prova do efectivo e real valor depositado — sem a prova do valor indicado pelo depositante (valor certamente superior ao indicado pelo Banco) terá de valer o indicado pelo Banco, que constitui o máximo que o Banco aceita como depositado.
Não são, assim, proibidas estas cláusulas 52.1 e 52.2 da CGD, como decidido no acórdão recorrido.
Analisadas as cláusulas cuja validade vinha questionada, impõe-se, agora, apreciar e decidir se a A., ao solicitar a declaração de nulidade, actua com abuso de direito por utilizar no seu cartão cláusulas idênticas às que pretende que aqui sejam declaradas nulas.
Porém, a decisão sobre tal questão de abuso de direito da A. pressupõe e exige a prova de determinados factos – a prova da existência de utilização pela A. de cartão com as cláusulas invocadas pela recorrente CGD.
Mas, a recorrente não indicou na contestação (local próprio para a apresentação de toda a defesa – art. 489º, n.º 1 do C.P.C.) a factualidade relevante para que se possa afirmar a existência de abuso de direito. Apenas foi invocada pela recorrente nas alegações de recurso para a Relação (o que constitui questão nova – art. 676º, n.º 1 do C.P.C.).
Ora, sem factos provados (os invocados pela CGD até foram contraditados pela A. que afirma não ser emitente, nem comercializar e nem aprovar o que quer que seja no domínio dos cartões de crédito) sobre a existência de cartão da A. com cláusulas idênticas às que pretende ver declaradas nulas, não pode proceder a invocação de abuso de direito.
Pelo exposto, julgando parcialmente procedentes as revistas, acordam neste S.T.J. em:
A) Revogar o acórdão recorrido na parte que julgou válidas as cláusulas localizadas após a assinatura do aderente quanto aos cartões da Ré Banco BA, declarando-as inválidas por violação do disposto no art. 8º, al. d) do dec.-lei 446/85, devendo ser excluídas dos contratos e a Ré Banco BA abster-se da sua futura utilização.
B) Revogar o acórdão recorrido na parte que declarou nulas:
— as cláusulas 23 e 34 da Ré Banco BA;
— a cláusula 23 da Ré Caixa Geral de Depósitos.
C) Confirmar no mais a decisão recorrida.
Custas pelos recorrentes, na proporção de 1/3 para cada, sendo que a A. beneficia de isenção.
Remeta-se certidão, oportunamente (art. 34º daquele dec.-lei 446/85 e Portaria n.º 1093/95 de 6/9).


Lisboa, 15 de Maio de 2008

Mota Miranda (Relator)
Alberto Sobrinho
Maria dos Prazeres Beleza