Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
128/09.1YFLSB
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: NUNO CAMEIRA
Descritores: CONTRATO DE AGÊNCIA
DENÚNCIA
INCUMPRIMENTO DO CONTRATO
COMISSÃO
CAUSA DE PEDIR
ÓNUS DA PROVA
INDEMNIZAÇAO DE CLIENTELA
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 06/16/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA DA RÉ E CONCEDE-SE EM PARTE A DO AUTOR
Sumário :

I - Sendo o contrato ajuizado um contrato de agência, regulado pelo DL 178/86 (alterado pelo DL 118/93, de 11/4), cabia ao autor provar, por ser constitutivo do direito accionado e, nesse sentido, integrado na causa de pedir, o facto traduzido no acordo celebrado com a ré acerca do valor percentual da comissão relativamente a cada uma das vendas angariadas.

II - Feita essa prova demonstrado ficaria, do mesmo passo, o incumprimento da ré, que para se livrar da sua responsabilidade teria então de provar, por seu turno, que a falta de cumpri­mento não procedeu de culpa sua, conforme o artº 799º, nº 1, CC.

III - Uma vez que o contrato ajuizado começou a vigorar em Janeiro de 1985, por tempo indeterminado, a denúncia deveria ter sido comunicada com a antecedência mínima de três meses coincidindo o termo deste prazo com o último dia do mês – artº 28º, nº 1, c) e nº 2, do DL 178/86.

IV - O desres­peito do prazo de pré aviso por parte da ré não determina o prolongamento automático do contrato por mais três meses, porquanto a única espe­cialidade a considerar no caso de denúncia de contrato de agência é a resultante da lei estabelecer que a eficácia da denúncia só opera no último dia do mês a que respeitar, nos termos referidos no ponto III.

V - Provado que ao longo dos dezasseis anos de vigência da relação contratual o autor angariou clientes para a ré, que, por via da fidelização de tal clientela, beneficiou da actividade desenvolvida pelo autor; e, por outro lado, não se tendo provado nenhum dos factos impeditivos da concessão da indemnização que a lei autonomiza no nº 3 do artº 33º: cessação do contrato por razões imputáveis ao agente e (ou) cessão da sua posição contratual por acordo com a outra parte, não há qualquer dúvida de que se mostram preenchidos os requisitos de que a lei – artº 33º, nº 1, - faz depender a concessão da indemnização de clientela.

VI - O cálculo da indemnização de clientela deve fazer-se de harmonia com o artº 34º, procedendo-se a uma ponderação segundo a equidade da compensação a atribuir.

VII - Ao falar em “remu­nerações recebidas nos últimos cincos anos”, a lei parece não querer excluir aquelas que já depois de denunciado o contrato o próprio principal admite serem devidas (isto é, estarem incluí­das na prestação a que se vinculou perante a outra parte), apesar de, por qualquer razão, não lhe terem sido efectivamente pagas.

VIII - O benefício considerável a que a lei se refere é um conceito indeterminado, carecido de preenchimento valorativo, e reportado, pre­dominantemente, aos negócios concluídos depois do contrato deixar de vigorar; não é de exigir que se tenha registado um benefício no património do principal: basta um juízo de prognose sobre a verosimilhança, a probabilidade da con­cretização desse benefício ou vantagem. Não, porém, um qualquer benefício: o ganho do principal tem de revestir uma dimensão signi­ficativa, não irrisória.

Decisão Texto Integral: .
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:



I. Síntese dos termos essenciais da causa e dos recursos
No Tribunal de Vila Nova de Gaia, AA propôs uma acção ordinária contra BB, SA, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quan­tia de 234.452,12 € a título de comissões não pagas, comissões pagas em valor inferior ao devido, indemnização por denúncia do contrato sem respeito do prazo legal de pré-aviso e indemnização de clientela.
Alegou, em resumo, que foi agente da ré desde 1985 até 3.12.01, nesse período angariando vários clientes para a demandada, e que esta não lhe pagou diversas comissões, discriminadas na petição inicial, tendo denunciado unilateralmente o contrato sem cumprir o período de pré-aviso, mas continuando, apesar disso, a beneficiar da clientela que o autor angariou.
Contestando, a ré negou que o autor tenha sido seu agente e que existam dívidas em rela­ção às comissões, alegando que ele transferiu a sua actividade para a sociedade Equipamentos Hoteleiros CC, Ldª; com base nisto, pediu a improcedência da acção.
Na réplica o autor manteve a versão dos factos da petição inicial e requereu a intervenção principal provocada de referida sociedade, pretensão que foi deferida em despacho poste­rior.
Realizado o julgamento e estabelecidos os factos foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar à sociedade Equipamentos Hoteleiros CC, Ldª, a quantia de 56.753,17 €, acrescida de IVA à taxa legal sobre 23.033,17 €, e de juros de mora.
Apelaram o autor e a ré.
Por acórdão de 17.11.08 a Relação do Porto, julgando parcialmente procedentes ambas as apelações, decidiu:
1º) Condenar a ré a pagar ao autor:
a) 23.033,17 €, acrescidos de IVA à taxa legal;
b) 3.988 € referentes a indemnização por falta de pré-aviso atempado;
c) 30.293,83 € referente a indemnização de clientela;
d) Juros de mora à taxa legal para as empresas comerciais, desde a citação até efectivo pagamento sobre todas as quantias objecto da condenação.
2º) No mais, manter a decisão recorrida.
De novo inconformados, autor e ré recorreram para o STJ.
O primeiro concluiu, resumidamente e em termos úteis, o seguinte:
1º) Uma vez que a ré alegou, mas não provou, a existência de um acordo com o autor relativo ao valor das comissões por percentagem inferior a 10% - o que constitui defesa por excepção, não por impugnação - terá de considerar-se provada a matéria dos pontos 28º a 73º da Base Instrutória e, em consequência, condenar-se a recorrida a pagar ao autor também as importâncias das diferenças aí reclamadas, no montante global de 109.309,46 €, conforme o pedido;
2º) O recorrente tem direito a uma indemnização por falta de pré-aviso correspondente a 3 meses menos dois dias - e não 39 dias, como a Relação decidiu - porque a ré denunciou o contrato em 8.11.01 para produzir efeitos em 3.12.01 quando é certo que, segundo a lei, tais efeitos só deveriam verificar-se no final de Fevereiro seguinte (artºs 28º, nº 1, c), e 29º, nº 1, do DL 178/86 (1).);
3º) Atendendo, por outro lado, a que o cálculo deve ser feito considerando a remuneração paga no ano precedente à denúncia - e não, como a Relação também decidiu, no ano civil anterior – a referida indemnização terá que ser corrigida para o montante de 10.967,74 € (3.615,74 x 3 meses – 2 dias);
4º) E tomando em consideração, nos termos sustentados na 1ª conclusão, as diferenças de comissões para os referidos 10%, a indemnização por falta de pré aviso ascenderá a 19.526,65 € (6.656,81 x 3 meses – 2 dias);
5º) Quanto à indemnização de clientela deve ter-se em conta na “média anual das remu­nerações recebidas” a que alude o artº 34º da Lei do Contrato de Agência não só o efectivamente recebido, mas também o que deveria tê-lo sido, sob pena de se premiar o principal inadimplente;
6º) Consequentemente, há que incluir no cálculo dessa indemnização os valores não pagos ao autor, conforme as respostas dadas aos pontos 6º a 27º, que totalizam 23.033,17 € e originam , em termos de média anual dos últimos cinco anos, a importância de 34.900,44 €;
7º) Há ainda que incluir as comissões processadas e pagas em 2002, após a extinção do contrato de agência, mas reportadas a negócios angariados e efectuados pelo autor em 2000 e 2001, conforme as respostas dadas aos pontos 71º a 73º da base Instrutória, no valor de 18.300,88 €, o que tudo faz subir a média anual referida nas anteriores conclusões para 38.560,61 €;
8º) Se for atendida a questão posta na conclusão 1ª, respeitante às diferenças das comis­sões para 10%, a indemnização de clientela deverá então ser fixada num valor não inferior a 55.000,00 €.
A ré, por seu turno, concluiu, em resumo, nos seguintes termos:
1º) Ao condenar a recorrente na indemnização por falta de aviso prévio o acórdão da Rela­ção confunde o recorrido com a sociedade de que é sócio gerente, omitindo que desde Abril de 2001 o contrato de agência passou a vigorar com a interveniente, sem que para esta se tenham transmitido quaisquer direitos e obrigações adquiridos na vigência do contrato con­cluído entre autor e ré;
2º) Não se verificam os pressupostos legais da condenação da recorrente nas indemnizações por falta de aviso prévio e de clientela;
3º) O cálculo efectuado no acórdão recorrido para a atribuição da indemnização de clientela não obedece aos requisitos estabelecidos no artº 34º da Lei do Contrato de Agência;
4º) O direito à indemnização de clientela caducou, nos termos do artº 33º, nº 4, do mesmo diploma, porque o recorrido não lhe comunicou no prazo de um ano a contar da cessação do contrato que pretendia recebê-la e a acção não foi proposta no ano subsequente a essa comunicação;
5º) A recorrente, assim, apenas está obrigada a pagar à autora 23.033,17 €, devendo revo­gar-se o acórdão recorrido na medida em que a condena a pagar as restantes quantias, respeitantes à indemnização por falta de pré aviso (3.988,00 €) e de clientela (30.293,83 €).
O autor respondeu ao recurso da ré, defendendo a sua improcedência.
Tudo visto, cumpre decidir.

II. Fundamentação
a) Matéria de Facto:
1) Dá-se por reproduzido o teor de fls. 39 e 40 (carta datada de 3 1/10/01, dirigida ao Autor, com assunto “denúncia de contrato verbal de prestação de serviços” onde a Ré refere que denuncia o contrato verbal de prestação de serviços os vincula desde Janeiro de 1985 pela qual está obrigado a angariar compradores para os seus produtos, com efeitos a partir de 03/12/01, sendo fls. 40 o sobrescrito com registo de 08/11/01) – al. A.
2) Dá-se por reproduzido o teor de fls. 41 (cópia de carta enviada pela Ré a Associação de Melhoramentos e Bem Estar Social de DD, datada de 16/10/01, onde comunica que o Autor terminou o seu contrato verbal de prestação de serviços com a Ré e que irá indicar um colaborador) – al. B.
3) A actividade do Autor consistia na celebração de contratos de compra e venda de arti­gos fabricados pela Ré, nomeadamente produtos e equipamentos para a indústria de hotelaria - al. C.
4) Autor e Ré celebraram entre si um contrato verbal, por tempo indeterminado, com início em Janeiro de 1985 por força do qual o Autor se obrigou a promover em nome e por conta da Ré, em Portugal, a celebração dos contratos referidos na alínea C) com os clientes que angariava para a Ré (1º e 2º).
5) Mediante o contrato acima mencionado, o Autor recebia o pagamento de uma comissão variável, em regra de 10%, a incidir directamente sobre o valor das vendas, com exclusão de imposto sobre transacções e I. V. A. (3.°, 80.°, 81.º).
6) Mediante o contrato acima mencionado, o Autor recebia relativamente a vendas decor­rentes dos contratos promovidos pelo revendedor que o Autor tinha angariado uma comissão, em regra de 5%, sobre o valor das vendas decorrentes de contratos promovidos pelo revendedor, a incidir directamente sobre o valor das vendas, com exclusão de imposto sobre transacções e I V. A. (4.º).
7) Em finais de Janeiro de 2000, em reunião levada a cabo pela Ré, esta e o Autor aceita­ram uma alteração de zonas, reduzindo-a a escrito nos termos constantes de fls. 1256 a 1263 cujo teor se dá por reproduzido (facto 5.°).
8) No ano de 1997, nas comissões processadas em 06/02/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 75.875,70, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 4.061,47, acrescida de L V. A. (28.°).
9) No ano de 1997, nas comissões processadas em 17/03/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 12.210,11, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 768,76, acrescida de I. V. A. (29.°).
10) No ano de 1997, nas comissões processadas em 17/03/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 33.693,08, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.618,90, acrescida de I. V. A. (30.°).
11) No ano de 1997, nas comissões processadas em 17/03/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 36.609,20, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.278,03, acrescida de I. V. A. (31.°).
12) No ano de 1997, nas comissões processadas em 05/05/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 17.010,44, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 1.178,95, acrescida de I. V. A. (32.°).
13) No ano de 1997, nas comissões processadas em 02/06/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 13.556,27, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 870,53, acrescida de I. V. A. (33.°).
14) No ano de 1997, nas comissões processadas em 11/02/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 56.005,81, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 3.718,43, acrescida de I. V. A. (34.°).
15) No ano de 1997, nas comissões processadas em 04/11/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 39.188,66, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.653,49, acrescida de I. V. A. (35.°).
16) No ano de 1997, nas comissões processadas em 03/12/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 15.080,80, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 775,14, acrescida de I. V. A. (36.°).
17) No ano de 1997, nas comissões processadas em 19/12/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 37,409,84, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.992,79, acrescida de I. V. A. (37.°).
18) No ano de 1997, nas comissões processadas em 22/09/97, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 25.367,76, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 1.615,12, acrescida de I. V. A. (38.°).
19) No ano de 1998, nas comissões processadas em 20/02/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 33.294,18, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.145,23, acrescida de I. V. A. (39.°).
20) No ano de 1998, nas comissões processadas em 03/04/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 43.867,05, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.698,99, acrescida de I. V. A. (40.°).
21) No ano de 1998, nas comissões processadas em 13/05/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 23.294,14, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 1.248, acrescida de I. V. A. (41.º).
22) No ano de 1998, nas comissões processadas em 25/05/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 37.611,96, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.357,89, acrescida de I. V. A. (42.°).
23) No ano de 1998, nas comissões processadas em 19/06/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 47.401,87, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 3.448,02, acrescida de I. V. A. (43.°).
24) No ano de 1998, nas comissões processadas em 12/08/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 77.249,77, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 5.171,57, acrescida de I. V. A. (44.°).
25) No ano de 1998, nas comissões processadas em 05/09/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 17.884,83, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 1.370,94, acrescida de I. V. A. (45.°).
26) No ano de 1998, nas comissões processadas em 04/11/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 99.988,66, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 6.624,68, acrescida de I. V. A. (46.°).
27) No ano de 1998, nas comissões processadas em 14/12/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 34.794,89, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.551,24, acrescida de 1. V. A. (47.°).
28) No ano de 1998, nas comissões processadas em 31/12/98, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 28.466,77, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 1.958,72, acrescida de I. V. A. (48.°).
29) No ano de 1999, nas comissões processadas em 28/02/99, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 51.596,08, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 3.963,51, acrescida de I. V. A. (49.°).
30) No ano de 1999, nas comissões processadas em 06/05/99, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 97.753,93, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 5.630,41, acrescida de I. V. A. (50.°).
31) No ano de 1999, nas comissões processadas em 21/06/99, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 65.077,02, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 4.280,88, acrescida de I. V. A. (51.°).
32) No ano de 1999, nas comissões processadas em 05/08/99, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 78.002,75, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 4.852,48, acrescida de I. V. A. (52.°).
33) No ano de 1999, nas comissões processadas em 25/10/99, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 36.121,50, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.526,13, acrescida de I. V. A. (53.°).
34) No ano de 1999, nas comissões processadas em 24/11/99, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 38.304,15, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.681,29, acrescida de I. V. A. (54.°).
35) No ano de 1999, nas comissões processadas em 10/12/99, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 16.311,99, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 1.135,62, acrescida de I V. A. (55.°).
36) No ano de 2000, nas comissões processadas em 14/02/00, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 94.153,97, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 3.989,80, acrescida de I. V. A. (56.°).
37) No ano de 2000, nas comissões processadas em 14/03/00, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 42.136,74 o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.871,46, acrescida de I. V. A. (57.°).
38) No ano de 2000, nas comissões processadas em 18/04/00, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 14.377,61, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 946,65 acrescida de I. V. A. (58.°).
39) No ano de 2000, nas comissões processadas em 23/05/00, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 105.489,61, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 5.286,85, acrescida de I. V. A. (59.°).
40) No ano de 2000, nas comissões processadas em 18/07/00, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 61.517,26, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 3.681,46, acrescida de I. V. A. (60.°).
41) No ano de 2000, nas comissões processadas em 08/08/00, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 119.229,18, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 7.645,81 acrescida de I. V. A. (61.°).
42) No ano de 2000, nas comissões processadas em 09/10/00, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 60.109,67, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 3.866,29, acrescida de I. V. A. (62.°).
43) No ano de 2000, nas comissões processadas em 15/12/00, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 138.402,54, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 8.522,53, acrescida de I. V. A. (63.°).
44) No ano de 2001, nas comissões processadas em 16/01/01, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 67.182,12, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 4.250,94, acrescida de I. V. A. (64.°).
45) No ano de 2001, nas comissões processadas em 29/03/01, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 146.401,70, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 9.417,83, acrescida de I. V. A. (65.°).
46) No ano de 2001, nas comissões processadas em 18/06/01, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 123.959,70, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 4.337,86, acrescida de I. V. A (66.°).
47) No ano de 2001, nas comissões processadas em 05/07/01, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 104.428,78, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 5.927,25, acrescida de I. V. A (67.°).
48) No ano de 2001, nas comissões processadas em 11/09/01, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 119.257,78, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 6.031,06, acrescida de I. V. A (68.°).
49) No ano de 2001, nas comissões processadas em 29/10/01, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 45.717,27, com I.V. A., o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.092,22, acrescida de I. V. A (69.°).
50) No ano de 2001, nas comissões processadas em 10/12/01, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 39.991,90 o Autor recebeu de comissões a quantia de € 2.809,13, acrescida de I V. A. (70.°).
51) No ano de 2002, nas comissões processadas em 24/01/02, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 71.319,71, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 4.438,34, acrescida de I. V. A (71.°).
52) No ano de 2002, nas comissões processadas em 05/03/02, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 138.877,65, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 9.538,77, acrescida de I V. A (72.°).
53) No ano de 2002, nas comissões processadas em 22/05/02, relativos a fornecimentos angariados pelo Autor, no valor global de € 83.271,22, o Autor recebeu de comissões a quantia de € 4.323,77, acrescida de I. V. A (73.°).
54) O Autor nos anos de 1996 a 2001 efectuou vendas a revendedores que angariou (75.º).
55) O Autor, desde que iniciou o exercício da actividade referida em 1.º e 2.º angariou clientes para a actividade da Ré os quais se fidelizaram a esta assim beneficiando da actividade do Autor (77.° e 78.°).
56) O Autor, por si ou através de «Equipamentos Hoteleiros ... » perdeu os rendimentos que obtinha com os clientes que tinha angariado para a Ré (79.º).
57) O Autor, por volta de Abril de 2001, passou a exercer a actividade referida em 1.º e 2.º através da empresa «Equipamentos Hoteleiros CC, Lda.» (84.º).
58) O Autor desconhecia que a Ré desde, pelo menos, meados de Outubro de 2001, vinha enviando aos clientes angariados pelo Autor a carta de fls. 41 (89.º).

b) Matéria de Direito
Como se vê da síntese conclusiva de ambos os recursos (supra, I) as questões postas para decidir neste Tribunal são três, a saber:
1) - Comissões pagas por valor inferior ao devido;
2) - Indemnização por falta de pré-aviso;
3) - Indemnização de clientela.
Discutiu-se nas instâncias uma quarta questão - relativa a comissões não pagas - que, porém, está já em definitivo resolvida nesta fase. Efectivamente, e por um lado, as partes acordaram (cfr. audiência de julgamento de 11.9.07, a fls 1241) que a ré ficou a dever a esse título ao autor, por fornecimentos feitos a clientes que ele angariou entre 1994 e 2001, a importância de 23.033,17 €. Por outro lado, a Relação confirmou a decisão da 1ª instância que rejeitou o pedido do autor referente a comissões alegadamente não pagas entre 1996 e 2001 com o fundamento de que não se provou de que vendas se tratou e quais as comissões em falta, sendo certo que este segmento do acórdão recorrido passou em julgado visto que não foi impugnado na revista do autor.
Vejamos então aquelas três questões, pela ordem indicada.
a) Está assente, sendo aceite por todos, que o contrato ajuizado é um contrato de agência, regulado pelo DL 178/86 (alterado pelo DL 118/93, de 11/4).
Ficou provado que segundo o contratado o autor recebia uma comissão variável, em regra de 10%, a incidir directamente sobre o valor das vendas, com exclusão do imposto de transacções e IVA, e que autor e ré acordaram em Janeiro de 2000 uma “alteração de zonas” nos termos do documento de fls 1256/1263, que estabelece os critérios que presidem à variação da percentagem das comissões (factos 5 e 7). Os factos 8 a 53, inclusive, especificam as vendas e as comissões pagas ao autor. Ora, na sua tese, cabia-lhe a prova da “comissão-regra” de 10% (facto constitutivo), o que conseguiu, recaindo sobre a ré o ónus de provar as situações concretas em que não se verificaria a aplicação daquele regime, por ter havido acordo em sentido diferente (facto modificativo ou extintivo), demonstração esta que não foi obtida; assim sendo, prossegue o recorrente, terá de considerar-se pro­vada na íntegra a matéria dos quesitos 28º a 73º, cujas respostas (limitativas ou restritivas) ficaram a constituir os factos relatados sob os nºs 8 a 53, e, em consequência, condenar-se a recorrida no pagamento das quantias ali especificadas, representativas de comissões de 10% sobre o valor dos fornecimentos angariados pelo autor.
Em nosso entender esta argumentação repousa em dois equívocos que, conjugados, levam a um resultado que não pode ser acolhido. Com efeito, nunca poderia admitir-se que mediante a convocação das regras do ónus da prova e da sua aplicação à situação ajuizada o tribunal de revista pudesse ser levado a modificar o elenco dos factos da causa, corrigindo o julgamento das instâncias. E isto porque, como resulta claramente da lei, a competência do Supremo se limita à matéria de direito, cabendo-lhe acatar e fazer acatar a decisão das instâncias sobre a matéria de facto – artºs 722º, nº 2, e 729º, nºs 1 e 2, do CPC. Porém, não há dúvida de que ao sustentar, ainda que não declaradamente, a modifi­cação das respostas aos quesitos 28º a 73º no sentido atrás indicado, o recorrente está a partir do princípio de que o STJ pode imiscuir-se na decisão sobre os factos da causa, alterando, - se não de modo directo, mediante a afirmação duma convicção diversa, ao menos indirectamente, por via da “manipulação” (permita-se-nos a expressão) das regras do ónus da prova - o veredicto das instâncias. Este o primeiro equívoco a assinalar.
Assente, por isso, que os factos dados como provados no acórdão recorrido são imodi­ficáveis, segue-se que só poderá dar-se razão ao recorrente no caso de se concluir que face ao contratado as comissões devidas pela recorrida eram, não aquelas que o tribunal considerou provado terem sido processadas e recebidas pelo autor (descriminadas nos factos 8 a 53), mas outras, de percen­tagem mais elevada (10%, segundo a sua alegação). Semelhante conclusão, porém, não é possível, neste ponto residindo o segundo equívoco de que o recorrente partiu. Na ver­dade, como justamente se observa no acórdão recorrido, “o autor, ao alegar e provar que promoveu/angariou as vendas que discriminou e que sobre as mesmas incidia a aplicação de uma comissão, cumpriu, em parte, o ónus de alegação/afirmação dos factos e o ónus de prova dos factos constitutivos que caracterizam a existência daquela obrigação (artigo 342º, nº 1, do CC).
Mas será que tinha de provar qual era em concreto o valor percentual da comissão em relação a cada uma das vendas? Ou bastava alegar e provar, como fez, que, em regra, o valor era de 10%, competindo à ré provar qual era o valor percentual que em concreto era aplicável a cada venda?
Entendemos, salvo o devido respeito por opinião contrária, que a alegação e prova do valor percentual aplicável a cada umas das vendas era ónus do autor e não da ré.
Em primeiro lugar, porque o valor percentual não era sempre de 10%. A expressão “em regra” indicia isso mesmo. A percentagem era variável. Em regra seria de 10%, a não ser que se verificassem cir­cuns­tâncias que determinavam a aplicação de outro valor percentual. O documento de fls. 1256 a 1263, cujo teor o supra ponto 7 dá por reproduzido, indica quais os valores percentuais e os factores que determinam a sua variabilidade. Portanto, em relação a cada acto, a comissão devida ao autor variava em função do acordo celebrado com o comprador, pelo que a alegação e prova do concreto valor percentual era estrutural, genético à formação do direito invocado pelo autor, ou se quisermos, constitutivo do direito alegado.
Em segundo lugar, porque a invocação por parte da ré quanto à variabilidade da percentagem, negando que fosse sempre 10%, não se afigura que tenha carácter exceptivo, mas sim impugnativo, embora se trate de uma impugnação motivada. Ou seja, não se trata da alegação de factos que constituam causa impeditiva, modificativa ou extintiva do direito do autor, trata-se, antes, de factos que, impugnando e contra­ditando a versão do autor, invocam circunstâncias ou factos que caracterizam de modo diferente o direito alegado pelo autor (artigo 487.º, n.º 2, 1.ª parte, do CPC).
Na verdade, a ré ao impugnar a pretensão do autor em relação ao valor das comissões, não nega, nem questiona o direito ao seu recebimento, nem invoca qualquer circunstância donde resulte a modificação ou extinção do direito. A defesa assenta, outrossim, no mesmo campo em que o autor se colocou, ou seja, na discussão do quantum das comissões, discordando, pelas razões que aduz, do valor percentual das comissões em discussão. Este tipo de defesa não tem carácter exceptivo, mas sim impugnativo.
Havendo defesa através de impugnação motivada, é sobre o autor que recai o ónus de prova, ou seja, sobre ele impendia o ónus de provar que o valor percentual em relação a cada um dos actos de venda era aplicável a regra dos 10% e não uma percentagem inferior, com base na qual foram calculados os valores que lhe foram pagos.
Perante esta regra de repartição do ónus de prova, é sobre o autor que recaem as consequências do seu não acatamento. Logo, não tendo o autor provado que a percentagem aplicada era de 10% em relação a todas as vendas em discussão, improcede o seu pedido quanto às diferenças peticionadas baseado na aplicação de percentagem de valor inferior”.
Estas considerações são exactas, merecendo a nossa inteira concordância.
Com efeito, todo o raciocínio que o recorrente desenvolve está baseado no segundo equívoco a que nos referimos – o de considerar que o facto atrás posto em relevo não se integra na causa de pedir que ele próprio alegou como fundamento do seu direito.
Mas não é assim, como resulta de tudo quanto se expôs.
De resto, já no despacho de resposta à base instrutória e respectiva fundamentação o juiz da causa deixara claro que, relativamente ao valor das comissões que o autor deveria ter recebido, não se fez prova, logo acrescentando que “o autor (porque se trata de matéria integradora do seu direito – artº 342º, nº 1, do CC) teria de demonstrar que nas vendas onde foi aplicada uma percentagem inferior a 10% se aplicava tal percentagem por não haver desconto; ninguém em audiência o referiu e pensamos que nenhum dos documentos juntos aos autos o permite concluir” – fls 1275.
Não sofre dúvida, portanto, que cabia ao autor provar, por ser constitutivo do direito accionado e, nesse sentido, integrado na causa de pedir, o facto traduzido no acordo celebrado com a ré acerca do valor percentual da comissão relativamente a cada uma das vendas angariadas; feita essa prova demonstrado ficaria, do mesmo passo, o incumprimento da ré, que para se livrar da sua responsabilidade teria então de provar, por seu turno, que a falta de cumpri­mento não procedeu de culpa sua, conforme o artº 799º, nº 1, CC.
Improcede, assim, a 1ª conclusão da revista do autor.
b) Quanto à indemnização por falta de pré aviso, afigura-se manifesto que nenhum dos recursos tem bom fundamento, sendo inteiramente de manter o acórdão recorrido.
Uma vez que o contrato ajuizado começou a vigorar em Janeiro de 1985, por tempo indeterminado, a denúncia deveria ter sido comunicada com a antecedência mínima de três meses – artº 28º, nº 1, c). Por outro lado, segundo o nº 2 deste mesmo preceito, o termo do prazo a que se refere o nº anterior, salvo convenção em contrário, deve coinci­dir com o último dia do mês. Sendo assim, uma vez que o autor foi avisado por carta de 8.11.01 que o contrato cessaria em 3.12.01 (facto 1), a conclusão a extrair é a de que o prazo de pré aviso foi desrespeitado em 39 dias (o lapso de tempo que medeia entre 30.9.01 e 8.11.01). Isto porque, nada tendo sido convencionado em contrário, deve entender-se que a denúncia tornar-se-ia efectiva em 31.12.01 (cit. nº 2 do artº 28º), data até à qual o contrato se manteve válido e eficaz, o que implicaria a sua comunicação, no máximo, até 30.9.01 (cit. al. c) do nº 1). Contrariamente ao alegado pelo autor, o desrespeito do prazo de pré aviso por parte da ré não determina o prolongamento automático do contrato por mais três meses. Como se diz, e bem, no acórdão recorrido, a única espe­cialidade a considerar no caso de denúncia de contrato de agência é a resultante da lei estabelecer que a eficácia da denúncia só opera no último dia do mês a que respeitar, nos termos sobreditos. Certo está de igual modo o cálculo das instâncias respeitante à remuneração média mensal. Mandando a lei atender – artº 29º, nº 2 – a tal média “auferida no decurso do ano precedente, multiplicada pelo tempo em falta”, é evidente que o ano a ter em conta só pode ser o de 2000, visto que o contrato cessou no último dia de 2001. Com efeito, o ano que precede o da denúncia é 2000, e não, como sem qualquer base sólida defende o autor, 2001. Deste modo, as remunerações a considerar para estabelecer a men­cionada média anual terão de ser as especificadas nos factos 36) a 43), inclusive, que per­mitem chegar ao valor obtido na sentença e confirmado pela Relação – 3.988,00 €.
Também é inquestionável que o titular activo do direito a esta indemnização e, bem assim, da indemnização de clientela é ele, autor, como a Relação decidiu (nessa parte revo­gando a sentença da 1ª instância), não podendo acolher-se a conclusão em contrário extraída na revista da ré. Na verdade, para o efeito aqui considerado nenhuma confusão se regista entre o autor e a sociedade de que é sócio-gerente, pois, tal como se afirma no acórdão recorrido, “Ficou provado que o autor desde Janeiro de 1985 exercia actividade por conta da ré inserida na tipicidade daquele contrato de agência, que a ré denunciou, com efeitos a partir de 03.12.2001 (matéria que consta, essencialmente, dos supra pontos 1, 3 e 4 da factualidade provada).
Também se encontra provado que a partir de Abril de 2001, o autor passou a exercer a actividade característica do referido contrato de agência através da empresa Equipamentos Hoteleiros CC, Ld.ª (supra ponto 57).
Porém, também está provado que após esta data – Abril de 2001 – o contrato de agência que vigorava entre autor e ré produziu efeitos, tanto mais que só cessou com a denúncia, ocorrida em Dezembro de 2001. Para além disso, também está provado que o autor recebeu comissões processadas posteriormente a Abril de 2001, mais concretamente, entre Junho de 2001 a Maio de 2002 (supra pontos 46 a 53), relativas a fornecimentos por ele angariados.
Embora não esteja provada a data em que foram realizados os fornecimentos angariados, o certo é que se provou que foi o autor quem angariou os clientes e não a sociedade por si constituída.
Portanto, mesmo aceitando que decorre do supra ponto 57 que a partir de Abril de 2001, também aquela sociedade passou a ser agente da ré, a verdade é que da matéria de facto provada não decorre que em seu nome tenham sido realizados actos de angariação de clientes para a ré que justifiquem a referida condenação a seu favor.
Também não decorre da factualidade provada, nem sequer da matéria de facto alegada na petição inicial, nem na alegação relativa ao pedido de intervenção principal da referida sociedade, que tivesse ocorrido a favor desta cessão da posição contratual do autor a seu favor ou que tivesse existido uma sucessão de agentes, a coberto do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 178/86, na redacção dada pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 118/93.
Acresce, ainda, que em relação ao valor das comissões mencionadas nos artigos 6.º a 27.º da Base Instrutória, que se reportam a fornecimentos angariados entre 1994 a Setembro de 2001, portanto, algumas delas já após a constituição da sociedade Equipamentos Hoteleiros CC, Ld.ª, as partes acor­daram que as mesmas eram devidas ao autor, no montante de €23.033,17, pelo que a condenação desse valor a favor da interveniente principal, com preterição do autor, não tem qualquer fundamento, violando, inclusivamente, o acordo das partes”.
Improcedem, por consequência, as conclusões 2ª, 3ª e 4ª da revista do autor e 1ª e 2ª (1ª parte) da revista da ré.
c) Por fim, quanto à indemnização de clientela, importa referir, desde logo, que este Supremo Tribunal está impedido de apreciar a questão posta na 4ª conclusão do recurso da ré – extinção do direito pelo decurso do prazo do artº 34º, nº 4; e isto porque a Rela­ção se recusou a conhecê-la com o fundamento de se tratar duma questão nova, não apreciada nem decidida na 1ª instância, sendo certo que na presente revista a recorrente não questiona o acerto dessa decisão mediante, designadamente, a imputação ao acórdão recorrido do vício da omissão de pronúncia, nos termos do artº 668º, nº 1, d), do CPC.
Vistos os factos 55) e 56), não há qualquer dúvida de que se mostram preenchidos os requisitos de que a lei – artº 33º, nº 1, - faz depender a concessão da indemnização de clientela: angariação de novos clientes para a outra parte ou aumento substancial do volume de negócios com a clientela já existente; benefício considerável para a outra parte, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente; e ter este deixado de receber qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os clientes angariados ou já existentes. Como já referimos em anterior acórdão (Revª 2737/04, de 9.11.04) a finalidade da norma que atribui ao agente a indem­nização de clientela é compensá-lo pelos benefícios de que o principal continua a usufruir findo o contrato e que devam creditar-se à actividade do agente na vigência daquele. Não se justificará tal compensação se os factos apurados não permitirem concluir que destino tiveram os clientes angariados enquanto o contrato durou, nomeadamente, e em especial, se ficaram ou não fidelizados ao principal após a cessação daquele em consequência do trabalho que o concessionário realizou na sua vigência. No caso presente, porém, foi jus­tamente o contrário disto que sucedeu, pois ficou provado que ao longo dos dezasseis anos de vigência da relação contratual o autor angariou clientes para a ré, que, por via da fidelização de tal clientela, beneficiou da actividade desenvolvida pelo autor. Por outro lado, não se provou nenhum dos factos impeditivos da concessão da indemnização que a lei autonomiza no nº 3 do artº 33º: cessação do contrato por razões imputáveis ao agente e (ou) cessão da sua posição contratual por acordo com a outra parte.
O cálculo da indemnização de clientela faz-se de harmonia com o artº 34º, que dispõe:
“A indemnização de clientela é fixada em termos equitativos, mas não pode exceder um valor equivalente a uma indemnização anual, calculada a partir da média anual das remunerações recebidas pelo agente durante os últimos cinco anos; tendo o contrato durado menos tempo, atender-se-á à média do período em que esteve em vigor”.
As instâncias atribuíram a indemnização que matematicamente corresponde à soma das remunerações recebidas pelo autor entre 1997 e 2001 dividida por cinco, o que significa que, bem vistas as coisas, não procederam, como manda a lei, a uma ponderação segundo a equidade da compensação a atribuir; limitaram-se, no fundo, a fazer uma aplicação “automática” do preceito legal, omitindo indevidamente a ponderação em concreto das cir­cunstâncias do caso. A equidade, porém, assume aqui o papel de um pressuposto rela­ti­vamente autónomo, que se destina, na prática, a modelar o quantitativo a receber pelo agente, dentro das balizas fixadas pelo artº 33º, nº 1 (2). . Como observa o Prof. Luís Meneses Leitão (3), “desta norma resulta simultaneamente um vector de remissão para a equidade e a deter­minação de um limite máximo de indemnização, não podendo a avaliação equitativa ultrapassar esse limite. No entanto, a remissão para a equidade não pode extravasar dos pressupostos referidos no artº 33º, nº 1, dos quais resultará um valor bruto de indemnização (Rohausgleish), ao qual é aplicável o limite máximo referido, só podendo consequentemente o agente receber o menor dos dois valores”.
Na situação ajuizada, refazendo os cálculos elaborados na sentença, e tendo em conta a matéria de facto descrita nos pontos 8) a 53), a Relação concluiu ser de 151.469,17 € o valor total das remunerações dos últimos cinco anos e de 30.293,83 € o valor médio nesse período, decidindo que este último é o valor devido ao autor. Entende-se, todavia, - nesta parte reconhecendo o bem fundado do recurso do autor - que àquele valor total deverá somar-se a quantia de 23.033,17 €, correspondente a comissões que na pendência do processo a ré reconheceu serem-lhe devidas por fornecimentos a clientes que ele angariou no período compreendido entre 1994 e 2000. Isto porque, ao falar em “remu­nerações recebidas nos últimos cincos anos”, a lei parece não querer excluir aquelas que já depois de denunciado o contrato o próprio principal admite serem devidas (isto é, estarem incluídas na prestação a que se vinculou perante a outra parte), apesar de, por qualquer razão, não lhe terem sido efectivamente pagas. À luz do que, segundo qualificada doutrina (4), constitui a verdadeira natureza jurídica da indemnização de clientela uma compensação ao agente que visa repor o equilíbrio entre as prestações, rompido pela cessação do contrato afigura-se justo e inteiramente conforme ao espírito (ratio legis) da lei incluir no cálculo da indemnização as retribuições em causa. Temos, assim, que o valor médio anual dos últi­mos cinco anos será de 34.900,46 € (151.469,17+23.033,17:5) - o máximo da indemnização teoricamente atribuível, de harmonia com o exposto. Deve no entanto ponderar-se que os elementos coligidos (factos 55 e 56) são de algum modo escassos para se poder concluir com toda a segurança em que medida a ré beneficiou consideravelmente (ou ficou em condições de beneficiar consideravelmente), cessado o contrato, da actividade desenvolvida pelo autor enquanto agente. O benefício considerável a que a lei se refere é um conceito indeterminado, carecido de preenchimento valorativo, e reportado, pre­dominantemente, aos negócios concluídos depois do contrato deixar de vigorar. Como vem sendo referido pela doutrina e pela jurisprudência, não é de exigir que se tenha registado um benefício no património do principal: basta um juízo de prognose sobre a verosimilhança, a probabilidade da concretização desse benefício ou vantagem. Não, porém, um qualquer benefício: o ganho do principal tem de revestir uma dimensão significativa, não irrisória. Tal como refere o autor atrás citado essa dimensão “é determinada por comparação da extensão e duração dos negócios angariados pelo agente com outros negócios do principal em que ele não tenha tido intervenção” (4). Ora, justamente, a matéria de facto coligida não permite que com o desejável rigor se formule o juízo de prognose e comparativo a que se aludiu, já que, embora se tenha apurado que houve fidelização de clientela imputável à actividade do autor enquanto agente da ré, ficou por determinar qual o seu peso específico - quantitativo e qualitativo - no volume total de negócios da ré. Em contrapartida, há outros elementos concretos, no quadro do artº 34º, cujo peso é inegável, como seja por exemplo a relativamente longa duração do contrato (16 anos), o não negligenciável volume de negócios angariados pelo autor ao longo desse período e, sobretudo, o facto de não se ter provado que a ré deixou de ficar em condições de usufruir da actividade do autor enquanto durou o contrato por, desig­nadamente, a clientela por ele angariada ter sido desviada para outra empresa. Tudo pon­derado, entende-se que a indemnização de clientela deve ser equitativamente fixada em 33.000,00 €.
Procedem, assim, em parte as conclusões 5ª a 7ª da revista do autor, improcedendo as conclusões 2ª, 3ª e 5ª da revista da ré.

III. Decisão
Nos termos expostos, nega-se a revista da ré e concede-se em parte a do autor. Consequentemente, fixa-se no montante de 33.000,00 € a indemnização de clientela, em tudo o mais se mantendo o acórdão recorrido.
A ré suportará as custas da revista que interpôs; as da revista do autor ficarão a cargo dele e da ré, na proporção de vencido.

Lisboa, 16 de Junho de 2009
Nuno Cameira (Relator)
Sousa Leite
Salreta Pereira
_________________________

(1) Pertencerão a este diploma legal, salvo menção em contrário, todos os preceitos legais citados no texto do presente acórdão.
(2) Neste sentido, Carolina Cunha, a Indemnização de Clientela do Agente Comercial, pág. 331/333, em BFDUC, Studia Iuridica 71, Coimbra Editora, 2003.
(3) Em a Indemnização de Clientela no Contrato de Agência, pág. 65, Almedina, 2006.
(4) Cfr. Contratos de Distribuição Comercial, de António Pinto Monteiro, pág. 160 e sgs, Almedina, 2002.
(5) Cfr obra cit. na nota 3), pág. 52.