Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
03S2561
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MÁRIO PEREIRA
Descritores: ADMISSÃO DO RECURSO
COLIGAÇÃO ACTIVA
VALOR DA CAUSA
Nº do Documento: SJ200401140025614
Data do Acordão: 01/14/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL PORTO
Processo no Tribunal Recurso: 1071/02
Data: 02/03/2003
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: DECIDIDO NÃO TOMAR CONHECIMENTO.
Sumário : I - No caso de coligação activa voluntária, é em função do valor de cada uma das acções cumuladas, e não da soma desses valores, que se afere a admissibilidade do recurso em razão da alçada.
II - Por isso, não excedendo nenhum dos valores individualmente peticionados pelos vários autores o valor da alçada da Relação e não se verificando qualquer das hipóteses excepcionais previstas nos n.ºs 2 a 6 do art.º 678º do CPC, é inadmissível recurso de revista para o STJ.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

I - "A" e B intentaram, em 18.12.2001, contra a Ré C a acção de processo comum n.º 562/2001 do Tribunal do Trabalho de Santo Tirso em que, invocando despedimento sem justa causa e não pagamento de algumas retribuições, pediram que:
A) fosse declarado ilícito o despedimento das AA. e, consequentemente:
B) que a Ré fosse condenada:
1. a pagar indemnização pela antiguidade, no montante actual de:
a) 1.254.000$00 (19 meses x 66.000$00 ), actualizável à data da sentença, à Autora A;
b) 1.650.000$00 (25 meses x 66.000$00), actualizável à data da sentença, à Autora B;
2. a pagar-lhes as retribuições pecuniárias vencidas após o despedimento e até à sentença e que nesta data somam, a cada uma delas, 66.000$00;
3. a pagar-lhes os proporcionais de férias, de respectivo subsídio e de subsídio de Natal, correspondentes à duração do contrato no ano da cessação, no montante de 198.000$00, a cada uma das AA..
4. a pagar a cada uma das AA. as retribuições a partir de 1.9.2000 a 31.12.2000, no montante de 297.000$00.
Assim - referem -, deve a R., nesta data:
À Autora A a quantia de 1.815.000$00;
À Autora B a quantia de 2.211.000$00;
Quantias a que acrescem juros, à taxa legal, desde 21.12.2000 até integral pagamento.

As AA. indicaram, na p.i., como valor processual da causa o de 4.026.000$00.

Após julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a R. a pagar à Autora. A a quantia de 1.688.575$00 e à A. B a de 2.084.575$00, acrescidas de juros, à taxa de 7%, contados desde 20.12.2000 até pagamento.

Dela apelou a R., tendo o Tribunal da Relação do Porto revogado a sentença, com a absolvição da R. do pedido.
II - Inconformadas, as AA. recorreram de revista, em que formulam as seguintes conclusões:
1ª. Vem o presente recurso do acórdão da Relação do Porto na medida em que este:
- julgou improcedente a questão suscitada pelas aqui Recorrentes, sob o ponto I das suas alegações de Recorridas para o Tribunal da Relação do Porto;
- considerou verificada excepção de caducidade alegada pela Recorrida;
- julgou não verificada a questão da inconstitucionalidade do disposto no artigo 25º, n.º 2 do Regime Jurídico anexo ao DL n.º 64-A/89, de 27.2;
2ª. No caso dos autos verifica-se de facto que a aqui Recorrida não suscitou nas conclusões a questão da nulidade da sentença, por isso, impõe-se concluir, nos termos do disposto no artigo 684º, n.º 3 do CPC, que não é possível conhecer de tal matéria.
Sem prescindir, nem conceder
3ª. O art.º 25º do Regime Jurídico anexo ao DL n.º 64-A/89 apenas se aplica quando os Autores queiram impugnar o despedimento colectivo nos termos estritos estipulados por aquela norma.
4ª. Há que ter em conta que as Recorrentes não vieram aos autos impugnar qualquer despedimento colectivo, mas sim um despedimento individual que reputaram de ilícito.
5ª. A Recorrida deixou transitar em julgado a sentença na parte em que foi julgada improcedente a excepção de erro na forma de processo.
6ª. O art.º 38º do regime jurídico do contrato individual de trabalho anexo ao DL n.º 49.408, de 24.11.1969, fixa um prazo de prescrição de créditos laborais. Ao invés, o art.º 25º do Regime Jurídico anexo ao DL n.º 64-A/89 prevê um prazo de caducidade para que o trabalhador possa, querendo, impugnar ou os factos que foram carreados para o processo de despedimento colectivo, ou impugnar a inobservância de algum dos requisitos processuais.
7ª. Quanto à questão da inconstitucionalidade da norma do art.º 25º do Regime Jurídico anexo ao DL n.º 64-A/89 impõe-se considerar o seguinte:
8ª. As normas contidas no art.º 25º, particularmente a que reduz o prazo para propor a acção de impugnação do despedimento estão feridas de inconstitucionalidade orgânica.
9ª. O acórdão em recurso violou assim o disposto nos art.ºs 38º e 25º do Regime Jurídico anexo ao DL n.º 64-A/89 e ainda a norma do art.º 168º, n.º 1, al. b) da Constituição da República.
Terminam pedindo que seja julgada procedente a revista, com as legais consequências.
A Ré contra-alegou.
Suscitou a questão prévia da inadmissibilidade do recurso ou, se assim não for entendido, a improcedência do recurso.
O Ex.mo Relator proferiu, a fls. 214, douto despacho sobre a referida questão prévia, admitindo o recurso interposto para este Supremo.
No seu douto parecer, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto pronuncia-se no sentido da inadmissibilidade do recurso.
Notificados desse parecer, as partes nada disseram.

III - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que há que conhecer, em primeiro lugar, da eventual não admissibilidade do recurso, suscitada pelo Ministério Público, sendo que, como tem sido jurisprudência unânime do STJ, o despacho do Relator que admite o recurso não faz caso julgado formal, sendo provisório já que pode ser modificado pela conferência por iniciativa do próprio relator, dos seus adjuntos e até das próprias partes (art.º 704º do CPC, aplicável ao recurso de revista, por força do seu art.º 726º) (1).
A situação dos autos reconduz-se a uma hipótese de coligação activa voluntária .
E como se escreveu no recente acórdão de 26.11.2003, proferido na Revista n.º 1889/03, que acompanharemos de perto, na linha da posição unânime desta Secção, "a coligação traduz-se praticamente na cumulação de várias acções conexas" (Prof. Alberto dos Reis, CPC Anot., 1º vol., p.99), "visto que os autores se juntam, não para fazer valer a mesma pretensão ou para formularem um pedido único, mas para fazerem valer, cada um deles, uma pretensão distinta e diferenciada" (cit. Autor," Comentário ao Cód. de Proc. Civil ", 3º vol., 146). Ou seja, como refere o Prof. Antunes Varela, ("Manual de Processo Civil", 1985, p.161)," na coligação à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações materiais litigadas".
E daí que se venha a entender, nesta Secção Social, que há-de ser em função do valor de cada uma das acções cumuladas pelos diversos autores que terá de ser decidida a admissibilidade do recurso que seja interposto relativamente à correspondente matéria (2).
Ora, no caso, as autoras atribuíram à causa o valor processual global de 4.026.000$00, que resulta da soma dos valores dos pedidos formulados (de 1.815.000$00 pela Autora A e de 2.211.000$00 pela Autora B).
E acontece que estes valores processuais parcelares tornaram-se definitivos, por acordo das partes, sem dissentimento do juiz, nos termos do art.º 315º do CPC.
Ora, o valor da alçada da Relação é de 3.000.000$00, nos termos do art.º 24º, n.º 1 da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (em vigor a partir de 1 de Junho de 1999), por força do seu art.º 151º, n.º 2 e do art.º 75º do DL n.º 186-A/99, de 31.5.
Ou seja, os valores processuais de cada um dos pedidos das AA estão contidos nessa alçada, o que significa que não é admissível recurso para este Supremo do acórdão da Relação do Porto ( art.º 678º, n.º 1 do CPC ) - não estamos perante qualquer das hipóteses excepcionais previstas nos seus n.ºs 2 a 6 em que é sempre admissível recurso.
IV - Assim, acorda-se em não tomar conhecimento do recurso.
Custas pelas recorrentes, sem prejuízo do apoio judiciário que lhes foi concedido.
Revi e rubriquei o texto,

Lisboa, 14 de Janeiro de 2004
Mário Pereira
Fernandes Cadilha
Salreta Pereira
----------------------------------------
(1) - Ver Abílio Neto, em nota ao art.º 687º, no " Cód. Proc. Civil Anotado", 13:ª ed. actualizada, p.282, e acórdãos aí citados.
(2) - Neste sentido, que, repete-se, vem sendo uniformemente defendido nesta Secção, vejam-se - para além do já citado aresto -, por exemplo, os acórdãos de 6.12.2000, proc.º 2373/00, de 14.11.2001, proc.ºs 710/01, 1588/01, 1821/01 e 1959/01, de 20.2.2002, proc.º 3899/01, de 6.11.2002, proc.º 2766/02, de 13.11.2002, proc.º 2772/02, de 19.12.2002, proc.º 3063/02, de 15.1.2003, proc.º 2085/02, de 5.2.2003, proc.º 4398/02, de 6.3.2003, proc.ºs 3705/02 e 4607/02, de 4.6.2003, proc.º 1071/03, e de 24.9.2003, proc.º 2175/03.