Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
07A1340
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: RIBEIRO DE ALMEIDA
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRA CONTRATUAL
DIREITO À QUALIDADE DE VIDA
MUNICÍPIO
POLUIÇÃO
AMBIENTE
RECONSTITUIÇÃO NATURAL
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
NEXO DE CAUSALIDADE
PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: SJ200705290013406
Data do Acordão: 05/29/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
I - O n.º 2 do art. 40.º da LBA (Lei 11/87, de 07-04, com as alterações da Lei n.º 13/2002 de 09-02) prescreve que os cidadãos directamente ameaçados ou lesados no seu direito a um ambiente de vida humana sadia e ecologicamente equilibrado podem pedir no termos gerais de direito, a cessação das causa de violação e a respectiva indemnização.
II - Por força do preceituado nos arts. 71.º, n.º 2, da Lei 267/85, de 16-07, e 498.º, 304.º, n.º 1, e 306.º, n.º 1, todos do CC, o direito de indemnização prescreve no prazo de 3 anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete.
III - O facto praticado pelo Município - mudança da linha de água, «que trouxe a poluição para junto das habitações dos recorrentes» - é o facto determinante para a contagem do início do prazo para a prescrição, pois desde então que os recorrentes passaram a saber que tinham direito à indemnização.
IV - O facto gerador da responsabilidade extracontratual conducente ao pedido de indemnização esgotou-se na data em que ocorreu. É a ocorrência do facto e não a permanência ou esgotamento das suas consequências que releva para efeito da prescrição.
V - O que nada tem a ver com a indemnização são as consequências desse facto. Essas perduram no tempo, mas sendo a consequência do facto já se englobariam na indemnização arbitrada. Quer a indemnização seja em dinheiro quer se reporte à restituição natural a prescrição do direito ambas engloba.
VI - Assim o pedido de indemnização que os recorrentes peticionaram ao Município, já se encontrava prescrito à data em que a acção foi proposta, pois o desvio da linha de água e a destruição do caminho ocorreu pelo menos em 1988 e a acção foi intentada em 1993.
VII - Os agentes poluidores é que têm que cessar a sua actividade de modo a que os recorrentes tenham um ambiente saudável. Para fiscalizar esses poluidores há entidades competentes.
VIII - A cessação da poluição ambiental impende sobre o agente poluidor e não sobre o Município, que como resulta dos factos dados como provados não polui a linha de água a que se reportam os autos.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

No Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, M... da R... L... e Outros, demandam pela presente acção declarativa de condenação com processo ordinário, o Município de Palmela, pedindo a sua condenação:
No cessar das causas de violação dos seus direitos a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado, a uma habitação em condições de higiene e conforto, de bem estar físico e mental e de propriedade, executando obras de modo a repor condições normais de salubridade, e ainda no pagamento total aos Autores da indemnização de 25.250 contos e despesas com o processo em quantia não inferior a 600 contos.
Alegam, em síntese, que o Réu com uma sua conduta de desvio de uma linha de águas fluviais, destruição de caminho público e abertura de uma vala a céu aberto, junto das casas de habitação dos Autores, por onde passaram a correr efluentes, dejectos e excrementos provenientes de outros prédios, violou os seus direitos a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado, sem que até hoje tivesse alterado ou reposto tal situação.
O Réu veio contestar, por excepção, dizendo haver prescrição do direito dos Autores nos termos do art. 4980 do Código Civil, e por impugnação, dizendo, em suma, ser alheia a tal desvio, ter efectuado acções para resolver os problemas ambientais, sendo que a poluição é causada por descargas levadas a cabo por industriais e suinicultores, não tendo competência para as fiscalizar, evitar ou reprimir, pois a competência é da Direcção Regional de Hidráulica.
Foi proferido despacho saneador, seleccionada a matéria de facto dada como assente e elaborada a base instrutória. A reclamação foi desatendida. Relegou-se para decisão final a excepção invocada.
A acção veio a ser julgada parcialmente procedente, tendo-se decidido pela improcedência da excepção.
Interposto recurso a Relação veio a julgar procedente a excepção da prescrição e por isso improcedente a acção.
Inconformados com tal decisão recorrem de Revista, formulando estas conclusões:
a) Com fundamento na norma do nº 1 do artigo 498° do Código Civil, o douto Acórdão recorrido absolveu o Réu de fazer cessar as causas de violação dos direitos dos Autores a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado, de bem estar físico e mental, executando as obras necessárias de reparação sanitária no sítio da Cascalheira, por forma a repor as condições normais de salubridade, a que havia sido condenado em 1ª Instância.
b) Ora a norma do nº 1 do artigo 498° do Código Civil não opera a prescrição do direito de acção dos Autores nos termos do nº 4 do art 40° da Lei de Bases do Ambiente (Lei 11/87 de 7 de Abril).
c) Devia o Tribunal "a quo" confirmar nesta parte a sentença de 1ª Instância.
d) Não o fazendo, o Tribunal "a quo" violou o do nº. 4 do art°. 40° da Lei de Bases do Ambiente (Lei 11/87 de 7 de Abril) e o artigo 668° nº. 1 alíneas b) e c), por força do art°. 716°, nº. 1, ambos do Código Processo Civil, pelo que o Acórdão é nulo nesta parte.
e) Da análise dos factos vistos no seu todo, retira-se que o "facto" - sentido amplo - gerador de responsabilidade ainda persiste, com efeito:
O Município Réu procedeu (facto 31) ao desvio de uma linha de águas pluviais, conhecida por Vala da Salgueirinha, do seu curso centenário (facto 1) e destruiu um caminho que era público (factos 32 e 2 e 36) nele abrindo uma vala a céu aberto (facto 32).

O desvio da linha de águas pluviais foi executado sem autorização (facto 33) da Direcção Regional de Hidráulica do Tejo, que legalmente superintende os assuntos relacionados com linhas de águas pluviais, autorizações e fiscalizações (facto 3).

A abertura da vala - com destruição de um caminho público que sempre existiu na memória dos AA - não mereceu qualquer estudo, parecer ou autorização da mesma Direcção Regional (facto 34).

Os prédios dos AA M... L..., J... E... e A... L... ficaram privados do caminho que lhes era serventia desde há muitos anos (facto 4). Assim como os Autores A... R... e H... R... contavam com a serventia do dito caminho que confrontava com os logradouros dos seus prédios (facto 6).

Estes prédios, todos fazendo parte de um aglomerado vicinal, encontram-se separados ou confrontados desde há 5 anos por uma vala por onde correm todas as espécies de imundícies (facto 7).

Os moradores do Vale do Alecrim, em especial os AA M... L... e J... E..., protestaram desde o primeiro dia junto da C. Municipal de Palmela (facto 8)

A Administração Regional de Saúde de Setúbal oficiou o Réu exigindo a adopção imediata das disposições materiais adequadas a fim de repor as condições de salubridade do local (facto 22).

O Réu nada fez no decurso de 5 anos (facto 37).

f) O Município Réu tem o dever - ainda hoje - de repor as condições de salubridade e bem estar no Vale do Alecrim e de indemnizar, porque ao desviar a Vala da Salgueirinha e fazendo-a passar por um caminho contíguo aos prédios dos Autores, sem para isso estar autorizado ou licenciado, veio prejudicar e está a prejudicar os Autores nos seus direitos de personalidade e de propriedade.
Trata-se de um facto duradouro, que ainda persiste, conforme douto entendimento do Tribunal de 1ª Instância.
h) Devia o Tribunal "a quo" declarar o facto lesivo com continuidade no tempo e confirmar a sentença.
i) Não o fazendo, o Tribunal "a quo" violou as normas dos artigos 70º e 483º e seguintes, todas do Código Civil.

Nas suas contra-alegações a recorrida defende que se deve manter o decidido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Os Factos:
1. No sítio da Cascalheira, no Vale do Alecrim, Pinhal Novo, foi desviada uma linha de águas pluviais, conhecida por Vala da Salgueirinha, do seu curso centenário.

2. E foi destruído um caminho e nele aberta uma vala a céu aberto, por onde passaram a correr efluentes, dejectos e excrementos provenientes dos prédios vizinhos e, inclusivé, das indústrias recém instaladas no Parque Industrial do Vale do Alecrim.

3. É a Direcção Regional de Hidráulica do Tejo que legalmente que superintende os assuntos relacionados com linhas de água pluviais, designada mente a nível de licenciamento de obras de desvio das referidas linhas de água, autorizações e fiscalização.

4. Os prédios dos Autores M... L..., J... E... e A... L... ficaram privados do caminho que lhes era serventia desde há muitos anos, pois este caminho confrontava com os prédios dos AA a poente.

5. Teor do Doc. n°. 2, junto com a p.i, a fls. 22.

6. Assim como os Autores A... e H... R... contavam com a serventia do dito caminho que confrontava com os logradouros dos seus prédios.

7. Estes prédios, todos fazendo parte de um aglomerado vicinal, encontram-se separados, ou confrontados desde há mais de 5 anos por uma vala por onde correm todas as espécies de imundícies.

8. Acresce a esta situação descrita a construção pelo Réu de lagoas a céu aberto para tratamento de efluentes, dejectos e excrementos a uns 300 metros das moradias dos Autores já existentes há muitos mais anos.

9. Os moradores do Vale do Alecrim, em especial os Autores M... L... e J... E..., protestaram desde o primeiro dia junto da C. Municipal de Palmela.

10. Os responsáveis do Ré chegaram mesmo a afirmar em Maio de 1990 "que o problema dos esgotos na Vala iria ser largamente melhorado" conforme ofício remetido ao A A... L....

11. A referida estação de tratamento de efluentes, dejectos e excrementos, descrita em 8., não é regularmente vigiada.

12. Acontece que a estação extravasa com bastante frequência.

13. Correndo a partir dela, abundantemente, um "mosto" nauseabundo, de cor verde acastanhada, de cheiro pestilento, pela "linha de água" aberta que se espraia na Vala.

14. Na qual, com relativa facilidade e a todo o momento, se pode verificar, flutuando, excrementos humanos e de outros animais, restos, lixos e até um porco morto e putrefacto já por lá andou a banhos.

15. A Vala transborda muitas vezes, nomeadamente após dias de chuva, cobrindo com toda a espécie de porcarias e imundícies a propriedade do A. M... M....

16. Tendo-lhe destruído outras tantas vezes as suas sementeiras de hortaliças e batatas.

17. O caminho referido servia de limite aos prédios dos Autores.

18. A Vala é um foco de maus cheiros, de aparecimento de ratos, ratazanas, moscas, meigas e mosquitos, a 3, 5 e 8 metros das moradias dos Autores e suas famílias.

19. Esta Vala e as lagoas a céu aberto e a curta distância são precisamente o habitat óptimo e perfeito para ratos, ratazanas, moscas, meigas e mosquitos, que infestam a zona aos milhares.

20. Bicharocos indesejados que penetram nas habitações, poisam nas comidas, picam os A.A. e suas famílias e obrigam estes a um gasto excessivo e desusado de insecticidas, raticidas e outros produtos.

21. O Vale do Alecrim foi antes lugar saudável, arejado, onde só o cheiro a terra lavrada pairava no ar.

22. Teor do Doc. n°. 5, junto com a p.i, a fls. 25.

23. Teor do Doc. n°. 6, junto com a p.i, a fls. 26.

24. Os Autores M... L... e outros, em 1988 e 1993, mandaram analisar as águas dos seus poços, tendo sido todas elas consideradas impróprias para beber por apresentarem bactérias perigosas para a saúde.
25. Face a estas análises os Autores logo em 1988, recorreram à rede de águas dos serviços públicos e tendo a partir daí todos os AA passado a pagar mensalmente aos Serviços Municipalizados de Pai meia o fornecimento de água.

26. As águas dos poços dos Autores eram, antes dos factos descritos, a melhor da região.

27. Até porque foi precisamente aí, no sítio da Cascalheira ao Vale do Alecrim, a escassos 10 metros dos prédios dos Autores que a C.M. Palmela abriu um furo para abastecimento da rede pública do Pinhal Novo.
28. A Vala a céu aberto cai precisamente sobre o dito furo da rede pública.

29. A contaminação das águas dos poços dos AA, verificada em 1988, mantém-se até hoje.

30. A solução para o caso concreto traduz-se em mandar emanilhar 300 metros da Vala que está a céu aberto.

31. O Réu procedeu à alteração referida em 1.
32. E destruiu o caminho referido em 2., que era público, nele abrindo uma vala a céu aberto.

33. O desvio da linha de águas pluviais foi executado sem autorização da entidade referida em 3.

34. A abertura da vala - com destruição de um caminho público que sempre existiu na memória dos Autores - não mereceu qualquer estudo, parecer ou autorização da mesma Direcção Regional.

35. A empresa A. X... de L... canalizou o seu colector para a dita Vala.

36. O caminho referido em 4 era público.

37. Face ao facto referido em 22., o R. nada fez no decurso de 5 anos.

38. O facto referido em 1 e o referido em 2 ocorreu, pelo menos, em 1988.
39. A zona em causa nos autos ainda não está servida por qualquer rede pública de saneamento.

40. Tendo cada um dos proprietários as suas fossas para recolha dos seus despejos

41. Durante anos, na Vala da Salgueirinha apenas corriam águas pluviais.

42. Entretanto, desde os anos oitenta começou a verificar-se o lançamento clandestino nessa Vala de efluentes de suinicultura, matadouros e outras indústrias situadas na Quinta do Anjo, nomeadamente de salsicharia.
43. Tal situação causa poluição e degradação ambiental significativa.

44. Nos anos oitenta foi construída a 1 ª fase do sistema de tratamento de águas residuais que serve a zona, ETAR, tendo terminado a 2ª fase dessa ETAR nos anos noventa.

45. Por exigência do INAG tal ETAR não tratava efluentes industriais, mas apenas domésticos.

46. Sendo um dos principais agentes poluidores a S..., unidade industrial de salsicharia da Quinta do Anjo, o R. Exigiu que essa empresa criasse o seu próprio sistema de tratamento dos seus efluentes, industriais, tendo sido aprovado o respectivo projecto, pelas autoridades competentes, mas que nunca foi construído.

47. A água proveniente do furo referido em 27 não apresenta quaisquer indícios de contaminação.

48. O Réu serviu os Autores com a rede pública de abastecimento de água, obviando à contaminação dos seus poços.

Decidindo:

As conclusões das alegações delimitam o âmbito de apreciação do recurso, pelo que as questões postas prendem-se com nulidade do acórdão e com a não verificação da excepção da prescrição.

Entendem os recorrentes que o acórdão padece de nulidade prevista no Artigo 668 n.º 1 alíneas b) e c) do Código Processo Civil.
Nos termos desta norma é nula a sentença «quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão» e é também nula quando «os fundamentos estejam em oposição com a decisão».
Ao juiz cabe especificar os fundamentos de facto e de direito da decisão - Artigo 659 n.º 2 -. Ora só quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto e de direito é que se pode afirmar que existe a nulidade da alínea b).
Na alínea c) do n.º 1 do art. 668°, a lei refere-se à contradição real entre os fundamentos e a decisão: a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente.
Diversa desta situação, por não respeitar a um vício lógico na construção da sentença, mas a uma contradição aparente é a que deriva de simples erro material, harmonia com o disposto no art. 667º. Aqui o juiz escreveu coisa diversa do que queria escrever, enquanto na situação prevista na alínea c) do n.º 1 do art. 668° o juiz escreveu o que queria escrever, só que o seu raciocínio se revela contraditório.
Registe-se que a oposição entre os fundamentos e a decisão não se reconduz a uma errada subsunção dos factos à norma jurídica nem, tão-pouco, a uma errada interpretação dela. Situações destas configuram-se como erro de julgamento.
Daí a confusão que existe entre as nulidades imputadas á sentença e um possível erro de julgamento.
Entendeu a Relação que a prescrição cobria todo o pedido formulado pelos recorrentes, estes entendem, por um lado que a prescrição não operou por o facto ser continuado e por outro que ela não se estende ao direito que têm a um ambiente saudável conforme preceitua o n.º 4 do Artigo 40 da Lei 11/87 de 7 de Abril.
A Constituição da República Portuguesa inscreve no Capítulo dos Direitos e Deveres Sociais o direito à saúde - art. 64º, nº1 (após a revisão introduzida pela Lei Constitucional 1/97, de 20.9), estatuindo:
" Todos têm direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover" ¬ art. 64º,nº1, (o que passa pela criação de condições ambientais, económicas e sociais que garantam a melhoria das condições de vida, e pelo direito ao ambiente e qualidade de vida).
"Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender"- nº1 do art. 66º.
o nº2 deste normativo, elenca uma série de "compromissos" do Estado para garantir tal direito, no quadro de um desenvolvimento estável, visando, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos, "prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos ... "- al. a).
A constitucionalização das questões ambientais iniciou-se com o diploma Fundamental, de 1976 e tem vindo a ser mantida nas revisões a que se procedeu.
A Lei de Bases do Ambiente (LAB) - Lei 11/87, de 7 de Abril - definiu as "bases da política de ambiente, em cumprimento do disposto nos arts. 9º e 66º da Constituição da República" - seu artº1.

No art. 2° a LAB define os princípios gerais do seguinte modo:
"1 - Todos os cidadãos têm direito a um ambiente humano e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender, incumbindo ao Estado, por meio de organismos propnos e por apelo a iniciativas populares e comunitárias, promover a melhoria da qualidade de vida, quer individual, quer colectiva.
2 - A política de ambiente tem por fim optimizar e garantir a continuidade de utilização dos recursos naturais, qualitativa e quantitativamente, como pressuposto básico de um desenvolvimento auto-sustentado."

No art. 3º são enumerados os princípios específicos que devem ser observados para que se cumpra aquele objectivo fundamental, avultando os da prevenção, equilíbrio, cooperação, recuperação e responsabilização, sendo que este último, postula "uma equidade inter-generacional" - como a designa José de Sousa Cunha Sendim - in " Responsabilidade Civil por Danos Ecológicos"- pág. 99- conceito que foi acolhido na Revisão Constitucional de 1997- art. 66º nº2 d) da CRP.
o n.º 2 do Artigo 40 da LBA (com as alterações da Lei13/2002 de 9/02) prescreve que os cidadãos directamente ameaçados ou lesados no seu direito a um ambiente de vida humana sadia e ecologicamente equilibrado podem pedir no termos gerais de direito, a cessação das causa de violação e a respectiva indemnização. Mas o n.º 5 acrescenta que: «Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, é reconhecido ás autarquias e aos cidadãos que sejam afectados pelo exercício de actividades susceptíveis de prejudicarem a utilização dos recursos do ambiente o direito ás compensações por parte das entidades responsáveis pelos prejuízos causados.

O n.º 2 do Artigo 71 da Lei 267/85 de 16/07 estabelece que: «o direito de indemnização civil extracontratual dos entes públicos e dos titulares dos seus órgãos e agentes por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública, incluindo o direito de regresso prescreve nos termos do Artigo 498 do Código Civil.

Dispõe o Artigo 498 do Código Civil:
1 - O direito de indemnização prescreve no prazo de 3 anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete…..
Por força do disposto no art. 304°, nQ 1, do Código Civil, completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito.
O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido ¬ art, 306 nº 1, do Código Civil.
Assim o pedido de indemnização que os recorrentes peticionaram á Ré, já se encontrava prescrito á data em que a acção foi proposta, pois o desvio da linha de água e a destruição do caminho ocorreu pelo menos em 1988 e a acção foi intentada em 1993.

Não se pode entender como pretendem os recorrentes que a lesão do seu direito é contínua e duradoura, isto porque não foi ainda solucionada a ofensa aos seus direitos.
O facto praticado pela Ré - mudança da linha de água, «que trouxe a poluição para junto das habitações dos recorrentes» - é o facto determinante para a contagem do inicio do prazo para a prescrição, pois desde então que os recorrentes passaram a saber que tinham direito á indemnização. O facto gerador da responsabilidade extracontratual conducente ao pedido de indemnização esgotou-se na data em que ocorreu. É a ocorrência do facto e não a permanência ou esgotamento das suas consequências que releva para efeito da prescrição. O que nada tem a ver com a indemnização são as consequências desse facto. Essas perduram no tempo, mas sendo a consequência do facto já se englobariam na indemnização arbitrada. Quer a indemnização seja em dinheiro quer se reporte á restituição natural a prescrição do direito ambas engloba.
Não têm assim razão os recorrentes quanto á inexistência do prescrição.
Por outro lado, e como decorre das normas da LAS que se invocaram, a cessação da poluição ambiental impende sobre o agente poluidor e não sobre a recorrida, que como resulta dos factos dados como provados não polui a linha de água a que se reportam os autos. Efectivamente essa poluição resulta de uma pocilga e de uma fábrica, pelo menos.
Não há qualquer nexo de causalidade entre a poluição da linha de água operada por terceiros e o seu desvio.
Os agentes poluidores é que têm que cessar a sua actividade de modo a que os recorrentes tenham um ambiente saudável. Para fiscalizar esses poluidores há entidades competentes. Não sendo a recorrida poluidora não lhe podem exigir que faça cessar as causas da violação do seu direito.
Acresce a tudo quanto se deixou dito, que mesmo de outro modo, estando em causa uma indemnização por responsabilidade extra contratual a prescrição tanto engloba a indemnização em dinheiro como a restituição natural pretendida.
Face ao exposto acorda-se em negar a revista. Custas pelos recorrentes.

Supremo Tribunal de Justiça, 29 de Maio de 2007

Ribeiro de Almeida (relator)
Nuno Cameira
Sousa Leite