Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
08A3497
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: FONSECA RAMOS
Descritores: SOCIEDADE COMERCIAL
PODERES DE REPRESENTAÇÃO
DESTITUIÇÃO DE GERENTE
CESSÃO DE QUOTA
REGISTO COMERCIAL
FALTA DE REGISTO
TERCEIRO
INOPONIBILIDADE DO NEGÓCIO
Nº do Documento: SJ20081209034976
Data do Acordão: 12/09/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA REVISTA
Sumário :
I - Provado que, em 18 de Agosto de 2000, quando o proclamado representante da Autora celebrou a escritura de compra e venda, pela qual alienou à Ré o prédio identificado nos autos, pese embora tenha exibido uma acta da Autora, lavrada a 10 de Agosto de 2000, subscrita por ele mesmo e pelo então sócio X, de onde consta a deliberação da venda daquele património social e o mandato a si conferido para outorgar a competente escritura pública de compra e venda, já não era gerente da Autora, por ter sido destituído da gerência em 7.10.1999, é manifesto que o destituído deixou se ser legal representante da Autora e, como tal, de vincular a sociedade, sendo assim inquestionável que agiu sem poderes de representação da sociedade Autora.
II - Porém, ao tempo da celebração da escritura de compra e venda, o facto da destituição não tinha sido registado na CRCom, pelo que, não pode a autora, que não procedeu ao registo da destituição do seu gerente, opor à Ré, enquanto entidade terceira, a falta de poderes de representação daquele que interveio em seu nome, depois de destituído.
III - Constando da acta de 10.8.2000, que a Autora reuniu a sua Assembleia-geral sem prévia convocatória, mas estando presentes todos os sócios que deliberaram a venda do imóvel e mandataram o destituído gerente para outorgar na escritura, tem de se considerar tal assembleia, como universal apenas na aparência, isto porque, já antes da data em que ocorreu, o referido gerente não era sócio da Autora, pois que, em 29.4.1999, tinha procedido à divisão da sua quota na sociedade-Autora, quota que cedeu integralmente aos seus quatro filhos.
IV - Como tal divisão e cessões da quota não foram, todavia, registadas, senão em data posterior à venda do imóvel à Ré, o acto não é oponível a terceiro.
V - Efectivamente, a omissão do registo da cessão de quota social não impede a produção de efeitos entre as partes e os seus herdeiros - art. 13.º, n.º 1, do CRCom - mas já não assim, em relação a terceiros, a quem não pode ser oponível se não tiver sido registada.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


Fábrica de F... e T... de E...., S.A. intentou, em 18.9.2003, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Valongo – 1º Juízo – acção declarativa de condenação com processo comum, na forma ordinária, contra:

SEI – S.... I...., SA”,

Pedindo, que na procedência da acção:

a) - Se declare ineficaz em relação à Autora e se proceda à anulação do contrato de compra e venda celebrado com a Ré, no dia 18 de Agosto de 2000, por escritura pública lavrada no Segundo Cartório Notarial de Guimarães, constante do documento junto à petição inicial como nº6;

b) - Se proceda ao cancelamento da inscrição G-2 (Ap.21/08092000), da descrição nº01146, da freguesia de Ermesinde, da Conservatória do Registo Predial de Valongo, relativa ao registo de aquisição da Ré.

Para tanto alega a Autora, em síntese, que:

- em 16.04.1991, deteve um capital social de 60.000.000$00 distribuído por três sócios, a sociedade “P....-C.... e T..., Ldª”, AA e BB;

- em 24 de Março de 1999, o sócio AA dividiu a sua quota em quatro quotas que cedeu a CC, DD, EE e FF;

- perdendo a sua qualidade de sócio da autora, mas manteve a sua gerência por direito especial constituído na escritura de cessão de quotas;

- sendo-lhe ainda atribuída a faculdade de comprar e vender viaturas automóveis, celebrar quaisquer contratos de locação financeira, tomar de arrendamento quaisquer locais, bem como alterar ou rescindir os respectivos contratos, adquirir por trespasse quaisquer estabelecimentos comerciais ou industriais, confessar, desistir e transigir em juízo;

- na assembleia-geral de 07.10.1999 foi deliberada a destituição do gerente AA, o que lhe foi imediatamente comunicado e foi averbada tal destituição na Conservatória do Registo Comercial, em 12.10.2000, tendo sido nomeados como gerentes da Autora os sócios CC e DD;

- em 18.08.2000, o referido AA, actuando como sócio e único gerente da Autora, procedeu à venda à Ré, por escritura pública, do prédio sito na Rua ......., ..., ... e ..., em Ermesinde, pelo preço declarado de 100.000.000$00, que a autora nunca recebeu, tendo agido sem poderes de representação da Autora, pelo que o negócio celebrado é ineficaz para esta.

A Ré apresentou contestação, entendendo dever a acção ser julgada improcedente, por não provada, absolvendo-a do pedido.

Alegando, em síntese, que:

- da certidão comercial da Autora, emitida pela Conservatória do Registo Comercial de Valongo, e da acta de 10.08.2000, consagrando a deliberação da venda e a mandatar o AA para outorgar a escritura de compra e venda, não resulta o alegado pela Autora, impugnando o alegado pela mesma, referindo, ainda, que pagou efectivamente o valor do preço da escritura de 18.08.2000;

- por outro lado, a escritura de cessão de quotas de 24.03.1999 é anulável, tendo o filho consanguíneo do cedente intentado uma acção judicial para declaração da nulidade ou anulabilidade da escritura de cessão de quotas referida, a qual foi registada pela apresentação 25/990727, onde houve desistência dos pedidos formulados, tendo as cessões de quotas sido levadas a registo apenas em Outubro de 2001 e a destituição de António de Sá Pereira de gerente apenas foi levada a registo em Outubro de 2000;

- resultando ainda que a Autora e os seus sócios e actuais accionistas, o seu actual conselho de administração aceitaram como válida, ratificando-se, se algum vício tivesse, a compra e venda de 18 de Agosto de 2000, na hipótese de o AA a ter outorgado sem poderes, sendo que a Ré desconhecia que, aquando da outorga da escritura de compra e venda que teve por objecto a transmissão do direito de propriedade a seu favor do prédio urbano descrito na CR Predial de Valongo sob o n.º 1146.º/Ermesinde, o AA, que a outorgou em representação da Autora, não era seu sócio-gerente;

- a Autora e os seus actuais sócios e membros do Conselho de Administração aceitaram e reconheceram como válida a transmissão do prédio referido, ratificando-a pelo que, com a presente acção, excederam manifestamente os limites impostos pela boa-fé a que os obriga o artigo 334.º do Código Civil “venire contra factum proprium”.

Foi elaborado o despacho saneador onde não foi apreciada a excepção de abuso de direito invocada, tendo sido organizados a matéria de facto assente e a base instrutória, mantendo-se os pressupostos de validade e regularidade da instância.
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A final, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu e Ré dos pedidos.
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Inconformada, a Autora recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, que, por Acórdão de 2.6.2008 – fls. 435 a 453 – julgou a apelação improcedente e confirmou a sentença recorrida.
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De novo inconformada, a Autora recorreu para este Supremo Tribunal e, alegando, formulou as seguintes conclusões:

1. A questão a decidir nos autos é a de saber se o vício de que padece a escritura pública de compra e venda objecto de impugnação é, ou não, oponível à Ré (adquirente do prédio transmitido).

2. A deliberação de venda de imóveis é da competência exclusiva da assembleia-geral da sociedade.
Assim, a resposta à questão enunciada terá de se aferir no âmbito da declaração de vontade da sociedade, plasmada na acta que instruiu a escritura pública de compra e venda de 18 de Agosto de 2000 e já não na circunstância de, naquele momento, AA se apresentar como gerente da sociedade, apesar de já destituído (mas sem que tal destituição tivesse sido levada a registo).

3. A acta que instruiu a escritura de compra e venda — documento de fls. 58 — é subscrita por AA e por BB.
Alegadamente reproduz o conteúdo de uma assembleia-geral de sócios, datada de 10 de Agosto de 2000, e reunida ao abrigo do disposto no art. 54º do CSC (sem a observância de formalidades prévias), estando todos os sócios presentes, os quais manifestarem o propósito de deliberar sobre a venda das instalações fabris da sociedade e a nomeação de representante da sociedade para a outorga da competente escritura pública.

4. Em 10 de Agosto de 2000, AA não era sócio da sociedade comercial Fábrica de F.... e T... de E..., porquanto em 24 de Março de 1999 havia procedido à divisão da sua quota de vinte e um milhões de escudos em quatro quotas de cinco milhões duzentos e cinquenta escudos cada, as quais cedeu aos seus filhos CC, DD, EE e FF.

5. O escrito em que se delibera a venda do imóvel em apreço e se mandata AA para outorgar a respectiva escritura pública de compra e venda não espelha qualquer efectiva assembleia-geral universal, porque assinado por quem já não era sócio (e porque não assinado por quem era sócio).

6. A deliberação da assembleia-geral de venda de património imobiliário não é facto sujeito a registo.

7. A cessão de quotas de AA para os seus descendentes produziu efeitos imediatos relativamente à sociedade (art. 228°, n°2, do CSC).

8. O registo da aquisição de participação social é um acto pessoal, com reflexo na esfera jurídico-patrimonial pessoal do adquirente da quota e que visa, fundamentalmente, dar publicidade à sua aquisição, tornando-a, desse modo, oponível a terceiros.

9. A sociedade comercial não dispõe de qualquer mecanismo legal que lhe permita compelir o sócio ao registo da aquisição da sua participação social.
Do mesmo modo, desse registo não depende a produção de efeitos da cessão para com a própria sociedade.

10. Pela não concretização de um poder/dever eminentemente pessoal (o do registo da aquisição de uma participação social) a decisão recorrida julga a sociedade recorrente vinculada a um acto que ela não quis praticar e, na realidade, nunca praticou.

11. À sociedade não cabe promover o registo das transmissões das participações sociais dos seus sócios, razão pela qual não poderá ser afectada em actos próprios pela não realização de actos de terceiro.

12. A partir do momento da formalização da cessão (e independentemente do respectivo registo) o órgão deliberativo da sociedade passou a constituir-se em conformidade com a nova composição social.

13. Os actos próprios da sociedade e da competência exclusiva da respectiva assembleia-geral só podem ser emanados por quem, no momento em concreto, represente a vontade colectiva da sociedade.

14. Quando outorgou a escritura de 18 de Agosto de 2000, AA celebrou um negócio em nome da sociedade sem ter poderes para o fazer, porque alicerçado numa declaração de vontade inexistente.

15. A questão dos autos não deverá ser resolvida no âmbito da oponibilidade registral, mas sim no âmbito do instituto da representação sem poderes.

16. A venda do imóvel é ineficaz em relação à recorrente, porque praticada por quem para tal não estava habilitado e ainda porque por ela não foi ratificada (art. 268°, nº1, Código Civil).

17. A tutela jurisdicional da sociedade adquirente decorre do art. 291° do Código Civil e não do art. 14° do Código do Registo Comercial, sendo que a acção dos autos foi intentada e registada antes de decorrido o prazo de três anos sobre a conclusão do negócio.

18. A sentença recorrida violou as disposições constantes dos arts. 246° e 228° do CSC e 268° do Código Civil.

Dando provimento à presente revista e proferindo decisão que revogue o Acórdão recorrido e julgue procedente a demanda da recorrente, farão Justiça.

A Ré contra-alegou, batendo-se pela confirmação da sentença.
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Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta a seguinte a matéria de facto:

1) - A Autora é uma sociedade comercial que se dedica à actividade industrial de fiação e tecelagem de algodão e outras fibras têxteis – (Alínea A) dos Factos Assentes);

2) - A Autora foi constituída como sociedade por quotas por contrato de sociedade datado do ano de 1930 e teve como sócios fundadores a própria sociedade – com quotas próprias – AA e BB – (Alínea B) dos Factos Assentes);

3) - Após cessões e unificações de quotas anteriores, em 16/04/1991, a Autora foi objecto de um reforço de capital e de uma alteração do contrato de sociedade, tendo passado a deter um capital social de sessenta milhões de escudos, distribuídos por três sócios, a saber, a sociedade “P...-C... e T..., Ldª.” (com uma quota do valor nominal de trinta milhões de escudos) AA (com uma quota do valor nominal de vinte e um milhões de escudos) e BB (com uma quota do valor nominal de nove milhões de escudos) – (Alínea C) dos Factos Assentes);

4) - Da escritura pública junta a fls. 203 a 209 sob o título “Cessão de Quotas” datada de vinte e quatro de Março de 1999, figuram como outorgantes, além do mais:

a) - Primeiros: AA e mulher GG;
b) - Segunda: CC;
c) -Terceiro: DD;
d) - Quarto: EE;
e) - Quinta: FF;
f) - Sextos: AA e BB, este por si e ambos como únicos sócios da sociedade comercial “P... - C... e T..., Lda.”;
g) - Sétimo: HH;
h) - Oitavo: II – (Alínea D) dos Factos Assentes);

5) - Da mesma escritura consta que o outorgante AA “é titular de uma quota da “Fábrica de F... e T... de E...., Ldª” no valor nominal de vinte e um milhões de escudos” e que “após ele...ter dividido aquela indicada quota no valor nominal de vinte e um milhões de escudos, em quatro novas quotas, no valor nominal de cinco milhões duzentos e cinquenta mil escudos, cada, cede uma a cada um dos segunda, terceiro, quarto e quinta outorgantes, seus filhos”(Alínea E) dos Factos Assentes);

6) - Da mesma escritura consta que os segunda, terceiro, quarto e quinta outorgantes aceitam na parte que a cada um diz respeito estas cessões – (Alínea G) dos Factos Assentes);

7) - Da mesma escritura consta que os segundo, terceiro, quarto, quinto, sexto e ainda o primeiro, são os únicos sócios da sociedade em causa – (Alínea H) dos Factos Assentes);

8) - E ainda que estes alteram o artigo sexto do contrato de sociedade que fica com a redacção a seguir transcrita: “A gerência da sociedade fica atribuída a AA, cuja assinatura é bastante e suficiente para obrigar a sociedade em todos os seus actos e contratos” (Alínea I) dos Factos Assentes);

9) - Da mesma escritura consta ainda que “em ampliação dos seus poderes normais, pode o gerente:

a) - comprar e vender viaturas automóveis;
b) - celebrar quaisquer contratos de locação financeira;
c) - tomar de arrendamento quaisquer locais, bem como alterar ou rescindir os respectivos contratos;
d) - adquirir, por trespasse, quaisquer estabelecimentos comerciais ou industriais;
e) - confessar, desistir e transigir em juízo” – (Alínea J) dos Factos Assentes);

10) - Do documento de fls. 183 e segs. consta que “Aos 7 dias do mês de Outubro de 1999, às 14 horas, reuniram-se... todos os sócios da sociedade comercial “Fábrica de F... e T... de E...., Lda.” e a seguir designados: “P....-C.... e T..., Ldª.”; CC; GG; DD; EE e BB,... deliberam unanimemente... Suspender e destituir o único gerente da sociedade acima identificada, de seu nome AA, com justa causa” – (Alínea K) dos Factos Assentes);

11) -Do mesmo documento consta que “Ficou deliberado por maioria, já que estes sócios representam 85% do capital social, a suspensão e destituição do gerente em funções Sr. AA, com efeitos imediatos”(Alínea L) dos Factos Assentes);

12) - Da certidão da Conservatória de Registo Comercial da sociedade Fábrica de F.... e T.... de E...., Limitada, com a matrícula nº.... junta a fls. 12 e ss. consta que Av. 1 - Ap. 02/20001012 - Provisória por natureza...e dúvidas – Cessação de funções do gerente AA, em 7 de Outubro de 1999, por destituição e Av. 2 – Ap. 15/20011127-Convertida – (Alínea M) dos Factos Assentes);

13) - Do documento de fls. 183 e segs. consta que “foi proposto pela sócia FF a atribuição da gerência a dois sócios em conjunto, aqui presentes, de seus nomes CC e DD, com efeitos imediatos. Posta a votação, votou contra o sócio BB e votaram a favor os sócios CC, também em representação da sócia “P...-C... e T...., Lda.”, FF, DD e EE, sendo assim aprovada por maioria, ficando desde já nomeados gerentes os referidos sócios”(Alínea N) dos Factos Assentes);

14) - Em 30 de Dezembro de 2002, a Autora, por escritura pública lavrada no Primeiro Cartório Notarial do Porto, foi transformada em sociedade anónima, tendo sido designados os membros do Conselho de Administração: Presidente – AA; Vogal – CC e Vogal – DD – (Alínea O) dos Factos Assentes);

15) - Da cópia certificada da Conservatória de Registo Predial de Valongo, junta a fls. 49 e segs., consta que sob o n.° ...... se encontra registado o prédio urbano sito na Rua ....., ..., ... e ... – a) edifício com 3 pavilhões e 7 dependências – Coberta: 4 650 m2; descoberta: 3 000 m2; b) edifício de 1 pavimento – Coberta: 349 m2; c) edifício de 1 pavimento – Coberta: 130 m2; d) edifício de 1 pavimento – Coberta: 196 m2; e) Casa Térrea – Coberta: 154 m2; F) edifício de 1 pavimento – Coberta: 259 m2 – (Alínea P) dos Factos Assentes);

16) - Do mesmo documento consta sob a cota G-1 Ap. 14/181131 - Aquisição a favor da “Fábrica de F.... e T.... de E...., Limitada”, com sede na R. ....., freguesia de Ermesinde, Valongo, – compra a “F..., I..., Limitada”, com sede no Porto – (Alínea Q) dos Factos Assentes);

17) - No dia 18 de Agosto de 2000, AA, actuando como sócio e único gerente da Autora, procedeu à outorga, junto do Segundo Cartório Notarial de Guimarães, da escritura pública de compra e venda, por via da qual declarou transmitir para a ré, em nome da autora, a propriedade do prédio urbano a que se vem aludindo, sito na Rua ...., n°s ..., ... e ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Valongo sob o nº01146, da freguesia de Ermesinde, e inscrito na matriz predial respectiva sob os arts. 249.°, 250.°, 252.°, 253.°, 5361.° e 1454.°, respectivamente – (Alínea R) dos Factos Assentes);

18) - O preço declarado na referida venda foi de cem milhões de escudos – (Alínea S) dos Factos Assentes);

19) - A escritura de compra e venda em apreço foi instruída com uma acta da Autora, lavrada a 10 de Agosto de 2000, subscrita pelo AA e pelo então sócio BB, a deliberar a venda daquele património social e a mandatar AA para outorgar a competente escritura pública de compra e venda – (Alínea T) dos Factos Assentes);

20) - A Ré, em 18/08/2000, celebrou um contrato promessa de compra e venda do referido imóvel com a sociedade “P....-C.... e T....., Ldª.”- (Alínea U) dos Factos Assentes);

21) -Resulta da cláusula oitava do dito contrato que o prédio urbano será transmitido para a sociedade P...., Lda. ou a quem a mesmo vier a designar, livre de quaisquer ónus ou encargos – (Alínea V) dos Factos Assentes);

22) - E pela cláusula nona foi acordado que “na eventualidade de a representada do segundo outorgante pretender transmitir a terceiros estranhos os direitos à celebração da prometida escritura definitiva de compra e venda, fica desde já acordado um pacto de preferência nos seguintes termos:
a) - O pacto é a favor do 1.° outorgante Joaquim Pinheiro Fernandes;
b) - A representada do 2.° outorgante obriga-se a dar conhecimento ao 1.° outorgante de todas as condições essenciais da cedência dos direitos, como tal se entendendo a identificação completa do cessionário, preço e condições de pagamento;
c) -Tal conhecimento deverá ser dado através de qualquer meio postal registado, a enviar para a residência do 1.° outorgante (...);
d) - Entende-se que a cedência não é feita a terceiros estranhos – caso em que não haverá direito de preferência – se o cessionário/transmissário for o próprio 2.° outorgante; AA, ou uma qualquer sociedade em que este ou a aqui representada detenham uma participação social não inferior a 10% – (Alínea X) dos Factos Assentes);

23) - Com data de 5 de Setembro de 2002 a aqui Ré recebeu uma carta da sociedade “P...-C... e T..., Ldª”, informando-a que cedeu a sua posição de promitente compradora do contrato promessa de compra e venda celebrado em 18.08.2000, à “Fábrica de F... e T... de E..., Ldª” – (Alínea Z) dos Factos Assentes);

24) - A referida carta é assinada por AA na qualidade de gerente da promitente “P...-C... e T...., Ldª.” - (Alínea AA) dos Factos Assentes);

25) - Com data de 30 de Abril de 2003 a “Fábrica de F.... e T.... de E..., S.A.” enviou carta a JJ, registada com aviso de recepção, dando-lhe conhecimento que nos termos da cláusula nona do contrato promessa de compra e venda do prédio urbano descrito na CRP de Valongo sob o n.° 1146.° de Ermesinde celebrado em 18.08.2000, iria ceder a sua posição de promitente compradora do identificado prédio à sociedade “Honra e Juste – Empreendimentos Imobiliários, Lda.” pelo preço e condições aí referidas – (Alínea AB) dos Factos Assentes);

26) - Carta essa que motivou a resposta de Joaquim Pinheiro Fernandes, dirigido à “Fábrica de F... e T.... de E...., S.A.”, datada de 19.05.2003 – (Alínea AC) dos Factos Assentes);

27) - Em resposta à carta de 19/05/2003 respondeu a “Fábrica de F.... e T.... de E...., S.A.”, em carta datada de 27/05/2003, registada com aviso de recepção dirigida a JJ, tendo como assunto “Cessão de Posição Contratual” e informando:

a) -Que a “P.... – C... e T...., Lda.” é detentora de 24% do capital social de “Fábrica de F.... e T.... de E...., S.A.”;
b) - Que nos termos da alínea g) da cláusula nona do contrato promessa referente ao prédio descrito na CRP de Valongo sob o nº1146° é referido que: “Entende-se que a cedência não é feita a estranhos – caso em que não haverá direito de preferência – se o cessionário/transmissário for o próprio 2.° outorgante, AA, ou uma qualquer sociedade em que este ou a aqui sua representada (Pesafil) detenham uma participação social não inferior a 10%;
c) - Assim, não poderá V. Exa. negar de que a cessão da posição operada a n/favor é absolutamente legítima face ao disposto e acordado no aludido contrato promessa – (Alínea AD) dos Factos Assentes);

28) - Em resposta, JJ dirige carta à “Fábrica de F.... e T... de E...., S.A.”, com data de 9 de Junho de 2003, solicitando a esta prova do alegado na sua carta de 27 de Maio de 2003, nomeadamente o envio da certidão comercial actualizada – (Alínea AE) dos Factos Assentes);

29) - Com data de 18 de Junho de 2003 a “Fábrica de F..... e T.... de E...., S.A.”, responde ao JJ e envia-lhe cópia da certidão de registo comercial dessa sociedade – (Alínea AF) dos Factos Assentes);

30) - Por cartas registadas com aviso de recepção, datadas de 1 de Agosto de 2003 a “Fábrica de F... e T... de E..., S.A.” dirige-se a JJ e à aqui Ré – “S...-S... I...., S.A.”, comunicando-lhes que a escritura de compra e venda do prédio sito em Ermesinde e descrito na CRP de Valongo sob o n.° 1146 será celebrada no 1.° Cartório da Secretaria Notarial de Matosinhos, no próximo dia 18 de Agosto pelas 12,00 horas – (Alínea AG) dos Factos Assentes);

31) - No dia 18 de Agosto de 2003, pelas 12,00 horas, a aqui ré devidamente representada deslocou-se à Secretaria Notarial de Matosinhos, por causa da escritura no artigo anterior, apenas se encontrando agendada uma escritura de compra e venda, não se encontrando identificados os outorgantes, nem a existência de quaisquer documentos necessários à realização da mesma – (Alínea AH) dos Factos Assentes);

32) - Por carta datada de 18 de Agosto de 2003 a “Fábrica de F... e T... de E...., S.A.” comunica à “S... - S... I...., S.A.” e a JJ, recebidas em data posterior a esta data, que a escritura agendada para este dia 18/08/2003, relativa à compra e venda do prédio descrito na CRP de Valongo sob o n.° 1146 de Ermesinde não se pode realizar devido a súbita e inesperado problema de saúde de um dos seus Administradores, adiando-a para 29/08/2003 às 15.00 horas – (Alínea AI) dos Factos Assentes);

33) - A destituição supra referida em 11) foi imediatamente comunicada a AA– (Resposta ao Quesito 1.º);

34) - A ré pagou o preço de Esc. 100.000.000$00 – (Resposta ao Quesito 2.º);

35) - Por meio de dois cheques datados de 18/08/2000 – (Resposta ao Quesito 3.º);

36) - Sendo um de Esc. 10.000.000$00 – (Resposta ao Quesito 4.º);

37) - E um outro de Esc. 90.000.000$00 – (Resposta ao Quesito 5.º);

38) - Emitidos a favor do António de Sá Pereira – (Resposta ao Quesito 6.º).


Fundamentação:

Sendo pelo teor das conclusões das alegações do recorrente que, em regra, se delimita o objecto do recurso – afora as questões de conhecimento oficioso – importa saber, se a venda do imóvel identificado nos autos, feita por escritura pública de 18.8.2000, em nome da Autora, à Ré, é ineficaz quanto àquela (recorrente-vendedora).

Tal questão foi decidida, nas instâncias, em sentido desfavorável à Autora, por se considerar que quem interveio em sua representação – AA – ao tempo tinha sido destituído da gerência, mas interveio no dito contrato de compra e venda sem que tal destituição constasse do registo comercial e, como tal, é inoponível à Ré compradora o facto de ter intervindo sem deter a qualidade que se arrogava.

Autora e Ré são sociedades por quotas.

Não se questiona a legitimidade da destituição do gerente AA, no âmbito da previsão do art. 257º do Código das Sociedades Comerciais (CSC).

A recorrente sustenta que a questão da invalidade (lato sensu) do negócio, não deve ser dirimida à luz dos preceitos registrais, mas antes no quadro do instituto da representação sem poderes.

Vejamos o essencial dos factos provados:

“Do documento de fls. 183 e segs. consta que:

“Aos 7 dias do mês de Outubro de 1999, às 14 horas, reuniram-se... todos os sócios da sociedade comercial “Fábrica de F.... e T... de E...., Lda.” e a seguir designados: “P...-C... e T..., Ldª.”; CC; FF; DD; EE e BB... deliberam unanimemente... Suspender e destituir o único gerente da sociedade acima identificada, de seu nome AA, com justa causa” – (Alínea K) dos Factos Assentes) – [destaque e sublinhado nosso].

- Do mesmo documento consta que:

“Ficou deliberado por maioria, já que estes sócios representam 85% do capital social, a suspensão e destituição do gerente em funções Sr. AA, com efeitos imediatos”(Alínea L) dos Factos Assentes);

- Da certidão da Conservatória de Registo Comercial da sociedade Fábrica de F.... e T... de E..., Limitada, com a matrícula nº3392/181030 junta a fls. 12 e ss. consta que Av. 1 - Ap. 02/20001012 - Provisória por natureza...e dúvidas – Cessação de funções do gerente AA, em 7 de Outubro de 1999, por destituição e Av. 2 – Ap.15/20011127-Convertida – (Alínea M) dos Factos Assentes);

- No dia 18 de Agosto de 2000, AA, actuando como sócio e único gerente da Autora, procedeu à outorga, junto do Segundo Cartório Notarial de Guimarães, da escritura pública de compra e venda, por via da qual declarou transmitir para a Ré, em nome da Autora, a propriedade do prédio urbano a que se vem aludindo, sito na Rua ...., n°s ..., ... e ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Valongo sob o nº01146, da freguesia de Ermesinde, e inscrito na matriz predial respectiva sob os arts. 249.°, 250.°, 252.°, 253.°, 5361.° e 1454°, respectivamente – (Alínea R) dos Factos Assentes);

- O preço declarado na referida venda foi de cem milhões de escudos – (Alínea S) dos Factos Assentes);

- A escritura de compra e venda em apreço foi instruída com uma acta da autora, lavrada a 10 de Agosto de 2000, subscrita pelo AA e pelo então sócio BB, a deliberar a venda daquele património social e a mandatar AA para outorgar a competente escritura pública de compra e venda – (Alínea T) dos Factos Assentes)”.

Dos factos transcritos é evidente que o proclamado representante da Autora – AA – quando, em 18 de Agosto de 2000, celebrou a escritura de compra e venda, pela qual alienou à Ré o prédio identificado em 17) dos factos provados, pelo preço declarado de 100.000.000$00, pese embora ter exibido uma acta da Autora, lavrada a 10 de Agosto de 2000, subscrita por ele mesmo e pelo então sócio BB, de onde consta a deliberação da venda daquele património social e o mandato conferido a si conferido para outorgar a competente escritura pública de compra e venda – não era gerente da Autora, por ter sido destituído da gerência em 7.10.1999.

Com efeito, é manifesto que, após a sua destituição de gerente, com justa causa, que não consta ter sido por si judicialmente contestada, o destituído deixou se ser legal representante da Autora e, como tal, de vincular a sociedade.

Como se provou – facto 33) – a destituição foi imediatamente comunicada a AA – produzindo logo efeitos entre a sociedade e o destituído.

É assim inquestionável que este agiu sem poderes de representação da sociedade Autora.

O negócio seria ineficaz em relação à Autora – art. 268º, nº1, do Código Civil – visto não ter havido ratificação. Porque o sistema jurídico constitui uma unidade a postular uma aplicação integrada e coerente, importa operar com as regras do Código do Registo Comercial (CRC) no que respeita à exigência de inscrição no registo de certos actos e saber em que termos e qual a eficácia dos que devendo ser registados não o foram, ponderação, que, com o devido respeito, a recorrente parece desconsiderar na sua relevância jurídica, “in concreto”.

Ora, ao tempo da celebração da escritura de compra e venda, o facto da destituição não tinha sido registado na Conservatória do Registo Comercial.

Nos termos do disposto no artigo 3º, nº1, alínea m) do Código de Registo Comercial, ao tempo vigente, a cessação de funções de qualquer administrador da sociedade, que não seja causa do decurso do tempo está sujeita a registo.

Todavia, tal omissão não impede a produção de efeitos entre as partes e os seus herdeiros, por força do disposto no artigo 13,º nº1, do mesmo Código.

O registo definitivo da destituição de AA foi posterior à data da venda do imóvel, que o mesmo fez, em representação da Autora, à Ré.

Decorre do artigo 14º, nº1, do Código de Registo Comercial, que os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo.

Como se pode ler, in “Noções de Direito Registral (Predial e Comercial)”, de J.A. Mouta Guerreiro, pág. 315:

“O registo comercial visa publicitar a situação dos comerciantes, sociedades comerciais e demais entidades a ele sujeitas, com vista à segurança do comércio jurídico.
Trata-se de uma publicidade registral, visto que não se limita a tornar público, ou seja, a dar notícia do facto registado, mas ainda indissoluvelmente lhe acrescenta a produção dos efeitos legalmente previstos…O registo comercial é, pois, o meio legal e técnico através do qual o Estado prossegue o fim específico de dar publicidade registral à situação jurídica pessoas singulares ou colectivas ligadas à vida mercantil”.

Sob a epígrafe “oponibilidade a terceiros”, o art. 14° do Código do Registo Comercial [redacção anterior às alterações introduzidas pelos DL. 76-A/2006, de 29.3 e 8/2007, de 17.1], dispõe o seguinte:

“1. Os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo.
2. Os factos sujeitos a registo e publicação obrigatória nos jornais oficiais só produzem efeitos contra terceiros depois da data da publicação.
3. A falta de registo não pode ser oposta aos interessados pelos seus representantes legais.
4. O disposto neste artigo não prejudica o estabelecido no Código das Sociedades Comerciais.”

Uma sociedade comercial não pode opor a terceiros um acto sujeito a registo enquanto este não for efectuado (artigos 168º, nº4, do Código das Sociedades Comerciais e 14º, nº1, do Cód. Reg. Com.).
Mas os terceiros podem, se nisso tiverem interesse, prevalecer-se de um acto não registado (artigo 168º, nº1, do Código das Sociedades Comerciais)”Anotação do Prof. M. Henrique Mesquita ao Acórdão deste S.T.J. de 18.05.1999, in RLJ 133-303.
O Acórdão comentado foi publicado na CJSTJ, 1999, II, 92.

“A cessação de funções, por qualquer motivo que não seja o decurso de tempo, dos membros dos órgãos de administração está sujeito a registo e publicação obrigatórios, pelo que só produz efeitos contra terceiros depois da data da publicação.
A falta de registo não pode ser oposta aos interessados pelos representantes legais da sociedade a quem incumbe a obrigação de o promover” – Acórdão deste S.T.J. de 25.7.1996, in BMJ, 458-354.

Neste entendimento não pode a Autora, que não procedeu ao registo da destituição do seu gerente, opor à Ré, enquanto entidade terceira, a falta de poderes de representação daquele que interveio em seu nome, depois de destituído.

Como refere o Professor Menezes Cordeiro, quando alude, in “Manual de Direito Comercial” – 2007 – pág. 405 – à invocação da eficácia da aparência:

“…Assim, o acto sujeito a registo e não inscrito só produz efeitos entre as partes; porém, o terceiro poderá prevalecer-se dele.
De certo, bastaria que estivesse de má fé para já não se poder acolher à tutela da aparência.
Mas de modo algum se admite que o próprio que não tenha registado venha, daí, a retirar vantagem”.

Argumenta ainda a recorrente, que, como consta da acta, nº100, de 10.8.2000, junta a fls. 58 a 60, reuniu a sua Assembleia-geral sem prévia convocatória, mas estando presentes todos os sócios que deliberaram a venda do imóvel e mandataram o referido AA para outorgar na escritura pública – ut. facto provado 19) – nos termos do art. 54º Artigo 54º -Deliberações unânimes e assembleias universais.
“1 – Podem os sócios, em qualquer tipo de sociedade, tomar deliberações unânimes por escrito, e bem assim reunir-se em assembleia geral, sem observância de formalidades prévias, desde que todos estejam presentes e todos manifestem a vontade de que a assembleia se constitua e delibere sobre determinado assunto.
2 – Na hipótese prevista na parte final do número anterior, uma vez manifestada por todos os sócios a vontade de deliberar, aplicam-se todos os preceitos legais e contratuais relativos ao funcionamento da assembleia, a qual, porém, só pode deliberar sobre os assuntos consentidos por todos os sócios.
3 – O representante de um sócio só pode votar em deliberações tomadas nos termos do nº 1 se para o efeito estiver expressamente autorizado”.
do CSC – pelo que a deliberação aí tomada “não espelha qualquer efectiva assembleia-geral universal, porque assinado por quem já não era sócio (e porque não assinado por quem era sócio)”.

Tratar-se-ia de uma assembleia-geral universal, porque inexistiu prévia convocatória mas, alegadamente, estariam presentes todos sócios da Autora.

Sobre o tema o Acórdão deste S.T.J., de 18.5.2006, in CJSTJ, 2006, II, 93, sentenciou:

I – O artigo 54º, nº1, do C.S.C. consagra as figuras das deliberações unânimes por escrito e das assembleias totalitárias ou universais, permitindo, respectivamente, que a vontade social se manifeste fora do conclave ou em assembleia não regularmente convocada, ou sobre assunto não previamente tabelado.
II – São requisitos de regularidade da assembleia universal a presença de todos os sócios – pessoalmente ou devidamente representados por mandatário com poderes especiais –, estar ínsito o propósito de deliberar sobre assuntos de interesse para a sociedade e existir acordo unânime de deliberar sobre determinado tema.
III – A deliberação final da assembleia totalitária não exige unanimidade, sendo aprovada nos termos gerais. […]”.

Mas, com o devido respeito, a argumentação da recorrente não colhe, pelas mesmas razões antes aduzidas e que determinam a ineficácia do negócio quanto à Ré.

Com efeito, tem de se considerar tal assembleia, como universal apenas na aparência, isto porque, já antes da data em que ocorreu, AA não era sócio da Autora, pois que, em 29.4.1999, tinha procedido à divisão da sua quota na sociedade-Autora, quota que cedeu integralmente aos seus quatro filhos. Tal divisão e cessões da quota não foram, todavia, registadas, senão em data posterior à venda do imóvel à Ré.

A cessão de quotas é um acto sujeito a registo – art. 3º, al.c) do CRC – mas, como resulta da certidão de fls. 12, aquela cessão só foi definitivamente registada em 27.11.2001 (registo provisório de 11.10.2000), após a venda à Ré.

O art. 14° do mesmo diploma legal estatui que: “Os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo”.

Mais uma vez, não tendo o acto da cessão sido registado a divisão e cessão da quota de AA não é oponível a terceiro.

O nº3 do art. 228º do CSC estabelece que – A transmissão de quota entre vivos torna-se eficaz para com a sociedade logo que lhe for comunicada por escrito ou por ela reconhecida, expressa ou tacitamente.

Ora, a Autora, por um lado sustenta que AA, por não dispor de poderes, [visto ter sido destituído de gerente], não podia vincular a sociedade, mas contraditoriamente, advoga que a cessão de quotas (feita em momento ulterior à destituição) produziu os seus efeitos em relação aos cessionários – nº2 do art. 228º do CSC – “ A cessão de quotas não produz efeitos para com a sociedade enquanto não for consentida por esta, a não ser que se trate de cessão entre cônjuges, entre ascendentes e descendentes ou entre sócios”.

Seja como for “Os factos sujeitos a registo só produzem efeito em relação a terceiros depois da data do respectivo registo.
A transmissão de quotas e a designação e cessação de funções dos órgãos da administração das sociedades comerciais estão sujeitas a registo.
Um contrato assinado por A, como gerente de certa sociedade, vincula esta se, na data dele constante, não se mostra efectuado o registo da cessão de quotas e renúncia à gerência efectuadas por escritura pública anterior àquele contrato– Acórdão da Relação do Porto, de 23.3.1999, JTRP00025593, in www.dgsi.pt.

A omissão do registo da cessão de quota social não impede a produção de efeitos entre as partes e os seus herdeiros – art. 13º, nº1, do CRC – mas já não assim, em relação a terceiros, a quem não pode ser oponível se não tiver sido registada.

Pelo quanto dissemos o recurso soçobra.

Decisão:

Nestes termos nega-se a revista.

Custas pela Autora/recorrente.


Supremo Tribunal de Justiça, 9 de Dezembro de 2008

Fonseca Ramos (Relator)
Cardoso Albuquerque
Salazar Casanova