Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 1ª SECÇÃO | ||
Relator: | SEBASTIÃO PÓVOAS | ||
Descritores: | GRAVAÇÃO DA PROVA NULIDADE PROCESSUAL PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA | ||
Nº do Documento: | SJ | ||
Data do Acordão: | 02/02/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Sumário : | 1) O Supremo Tribunal de Justiça está limitado nos seus poderes sobre a matéria de facto, âmbito em que, de harmonia com o disposto nos artigos 26.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais – Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro - e 722.º, n.º 2 e 729.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, só lhe é lícito intervir em questão de prova vinculada ou perante desrespeito de norma reguladora do valor legal das provas.
2) Tratam-se de questões de direito, já que, em tais hipóteses, não há que apreciar as provas segundo a convicção de quem julga (artigo 655.º, n.º 1 do Código de Processo Civil) mas apenas determinar se para a prova de certo facto a lei exige, ou não, determinado meio de prova insubstituível, ou de decidir se determinado meio de prova tem, ou não, face à lei, força probatória plena . 3) Fora do âmbito da prova vinculada, cuja apreciação é pura matéria de direito, o erro na apreciação das provas e a consequente fixação dos factos da causa, isto é, a decisão da matéria de facto, é de livre apreciação do julgador nas instâncias no seu papel de apuramento da factualidade relevante, cabendo à Relação a última palavra. E mesmo a Relação só pode censurar o respondido à base instrutória através do exercício dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 712.º do Código de Processo Civil. 4) E só se, na fase de julgamento do mérito, o Supremo Tribunal de Justiça deparar com insuficiência de matéria de facto para decidir de direito, ou se o acervo factual contiver contradições inviabilizadoras dessa decisão, é que deve devolver o processo ao tribunal recorrido para ampliar a decisão de facto, desde que nos limites da matéria alegada (artigo 729.º, n.º 3, ainda do Código de Processo Civil). 5) A Relação, ao reponderar as provas registadas, deve ter em conta o conteúdo das gravações, que, contudo, irá valorar com a liberdade que lhe é conferido pelo artigo 655.º, tendo a possibilidade de formar uma convicção diferente da alcançada pela instância que a precedeu, mau grado as limitações resultantes da ausência de verdadeira imediação. 6) A deficiência (ou mesmo a inexistência) de gravação constitui nulidade secundária (artigos 201.º, n.º 1 e 204.º, “a contrario”) a arguir mediante reclamação, nos termos dos artigos 205.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil e 9.º do citado Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro. E este último diploma que estabeleceu a possibilidade de documentação ou registo das audiências finais e da prova nelas produzida, dispôs naquele artigo que “se, em qualquer momento, se verificar que foi omitida qualquer parte da prova ou que esta se encontra imperceptível, proceder-se-á à sua repetição sempre que for essencial ao apuramento da verdade.” 7) A nulidade pode ser arguida nas alegações do recurso de apelação. 8) Dizer-se que o conteúdo dos depoimentos se apreende “com razoável segurança” fica aquém do exigível que seria a apreensão “com toda a segurança”, ou, pelo menos, “com segurança bastante”. 9) Contudo, importa saber se a parte imperceptível é essencial para o apuramento da verdade (de acordo com o citado artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 39/95) havendo que considerar que esse pressuposto deve ser afirmado pelo recorrente, que tem de aduzir razões para de tal convencer o Tribunal. 10) É da experiência comum que os esclarecimentos finais pedidos pelo julgador são essenciais para alicerçar a sua convicção e surgem para firmar, infirmar ou detalhar o que foi dito pela testemunha no decurso da inquirição e da instância. 11) Só depois de ouvir integralmente os depoimentos e proceder à sua análise critica, por forma a assegurar, verdadeiramente, um duplo grau de jurisdição em matéria de facto, é que a Relação pode optar com segurança pela manutenção ou alteração do julgado em 1.ª instância. 12) A omissão (não audição) da gravação de parte de um depoimento equivale à ausência do seu registo, com as consequências acima referidas, tratando-se de depoimento, ou segmento, essencial. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça AA intentou acção, com processo ordinário, contra BB, pedindo se declare que é o dono do prédio urbano constituído por casa de habitação (com rés do chão amplo e 1.º andar com sete divisões) com área coberta de 76m2 situado em Maiorca – Alcobaça, condenando-se o Réu a reconhecer esse domínio e a restituir-lhe o logradouro com cerca de 216m2 que abusivamente ocupa. O Réu contestou e, deduzindo pedido reconvencional, pediu a condenação do Autor a reconhecer a propriedade do seu prédio confinante com maior parte do logradouro em litígio. No Círculo Judicial de Alcobaça a acção foi julgada parcialmente procedente declarando-se o Autor dono do prédio acima referido e condenando o Réu a reconhecer tal direito, mas absolvendo-o do mais pedido. A reconvenção foi julgada procedente. O Autor apelou para a Relação de Coimbra, que confirmou o julgado. Pede, agora, revista assim concluindo a sua alegação: Não foram produzidas contra alegações. A Relação deu por assente a seguinte matéria de facto: Foram colhidos os vistos. Conhecendo,
O recorrente insurge-se contra o segmento do Acórdão que reapreciou a matéria de facto baseado em registo fonográfico que, na sua perspectiva, era deficiente, por parcialmente inaudível. Ora, essas deficiências impediram o exercício do seu direito de obter /aceder a um segundo grau de jurisdição na parte em que se julga a matéria de facto “ex novo”. De outra banda, imputa ao Tribunal “a quo” a não audição dos depoimentos gravados, e o ter-se limitado a aderir à fundamentação e conclusões da primeira instância sem que pudesse ter formado uma convicção própria, e assim violando a alínea a) do n.º 1 do artigo 712.º do Código de Processo Civil. Antes de mais, cumpre enfatizar que o Supremo Tribunal de Justiça está limitado nos seus poderes sobre a matéria de facto, âmbito em que, de harmonia com o disposto nos artigos 26.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais – Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro - e 722.º, n.º 2 e 729.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, só lhe é lícito intervir em questão de prova vinculada ou no desrespeito de norma reguladora do valor legal das provas. Tratam-se de questões de direito, já que, em tais hipóteses não há que apreciar as provas segundo a convicção de quem julga (artigo 655.º, n.º 1 do Código de Processo Civil) mas apenas determinar se para a prova de certo facto a lei exige, ou não, determinado meio de prova insubstituível, ou de decidir se determinado meio de prova tem, ou não, face à lei, força probatória plena de facto. Fora do âmbito da prova vinculada, cuja apreciação é pura matéria de direito, o erro na apreciação das provas e a consequente fixação dos factos da causa, isto é, a decisão da matéria de facto, é de livre apreciação do julgador nas instâncias (no seu papel de apuramento da factualidade relevante) cabendo à Relação a última palavra. E mesmo a Relação só pode censurar o respondido à base instrutória através do exercício dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 712.º do Código de Processo Civil. E quando tal acontece, o Supremo Tribunal de Justiça só pode sindicar esse uso nos estritos limites de verificar se a Relação desrespeitou os pressupostos exigidos por aquele artigo. Mas então está apenas a sindicar erros de direito. E só se, na fase de julgamento do mérito, o Supremo Tribunal de Justiça deparar com insuficiência de matéria de facto para decidir de direito, ou se o acervo factual contiver contradições inviabilizadoras dessa decisão, é que deve devolver o processo ao tribunal recorrido para ampliar a decisão de facto, desde que nos limites da matéria alegada (artigo 729.º, n.º 3, ainda do Código de Processo Civil). 1.1. A parte pode, porém, impugnar perante a Relação, as respostas dadas aos quesitos devendo, então, indicar os pontos que considera incorrectamente julgados e os elementos probatórios vertidos nos autos que justificam essa diferença de pontos de vista (artigo 690-A do Código de Processo Civil, aqui aplicável; actualmente, e para as acções intentadas após 1 de Janeiro de 2008, vale o artigo 685-B que, no essencial, tem a redacção daquele). 2- Nulidade secundária A Relação, ao reponderar as provas registadas, deve ter em conta o conteúdo das gravações, que, contudo, irá valorar com a liberdade que lhe é conferido pelo artigo 655.º, tendo a possibilidade de formar uma convicção diferente da alcançada pela instância que a precedeu, mau grado as limitações resultantes da ausência de verdadeira imediação. Acontece, “in casu”, que o recorrente na sua alegação de recurso de apelação – e para além de imputar à 1.ª Instância deficiências no exame critico da prova – afirmou que a gravação era deficiente e que tal constituía nulidade conducente à repetição do julgamento. De seguida, louvou-se no artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro para concluir que não existe prazo para “arguição das anomalias ocorridas na gravação”. Vejamos, A deficiência (ou mesmo a inexistência) de gravação constitui nulidade secundária (artigos 201.º, n.º 1 e 204.º, “a contrario”) a arguir mediante reclamação, nos termos dos artigos 205.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil e 9.º do citado Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro. E este último diploma que estabeleceu a possibilidade de documentação ou registo das audiências finais e da prova nelas produzida, dispôs naquele artigo que “se, em qualquer momento, se verificar que foi omitida qualquer parte da prova ou que esta se encontra imperceptível, proceder-se-á à sua repetição sempre que for essencial ao apuramento da verdade.” A nulidade foi tempestivamente arguida, aqui aderindo ao Acórdão deste Supremo Tribunal de 23 de Outubro de 2008 – 08B2698 – que decidiu estar em tempo a arguição operada nas alegações de recurso de apelação (cf., ainda, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 2010 – 4323/05.4TBVIS.C1.S.1, de 15 de Maio de 2008 – 08B1099 e de 13 de Janeiro de 2009 – 08 A3741). E compreende-se que assim seja pois é da normalidade da vida forense que as partes não vão pedir a audição de todo o material áudio para verificar da perfeição técnica da gravação, a não ser no momento da elaboração da sua alegação para dela fazerem constar os concretos meios probatórios em que fundam a sua discordância, já que só, então, tem de identificar (ou transcrever) os pontos controvertidos. (Não se desconhece, em sentido contrário, arguição em dez dias contados da entrega da cópia do registo, o Acórdão de 16/9/2008 – P.º 2261/08 – 7.ª). Concluindo pela tempestividade da arguição do vício resta saber se ocorreu e se pode “influir no exame ou na decisão da causa” por ser “essencial ao apuramento da verdade” (cf., respectivamente, os artigos 201.º n.º 1 do Código de Processo Civil e 9.º do Decreto-Lei n.º 39/95). 2.1. No Acórdão recorrido, a Relação de Coimbra assim ponderou: “Todavia, no caso em análise, se é certo que uma ou outra palavra esparsa do depoimento das testemunhas J… F… da C… A… e M… V… de J… e uma ou outra passagem mais extensa da parte final do depoimento da testemunha A… de O… I…, concretamente a parte respeitante ao interrogatório conduzido pela Sra. Juiz, se apresenta imperceptível, isso não impede, todavia, de apreender com razoável segurança, a generalidade do seu conteúdo e de se ficar a conhecer a sua versão sobre a factualidade a que depuseram. E a prova de que essa deficiência de gravação não foi obstáculo ao exercício do direito de impugnar a matéria de facto pelo ora recorrente está na junção dos autos, com as suas alegações de fls. 346 e segs, da transcrição do depoimento de todas as testemunhas ouvidas e de que se socorre para impugnar a decisão de toda a matéria da base instrutória. Por tal motivo, concluímos não ocorrer a invocada nulidade processual de omissão de formalidade prescrita na lei, a impor a anulação do julgamento e a sua consequente repetição.” Crê-se que, neste segmento, o Acórdão recorrido é de censurar. Reconhece serem imperceptíveis “uma ou outra palavra esparsa” de dois depoimentos, e “uma ou outra passagem mais extensa da parte final” do depoimento de outra testemunha, esta referente à parte da inquirição feita pela Senhora Juiz. Mas, não obstante essas deficiências, a Relação considerou-se habilitada a proceder à reapreciação pedida. Daí que, ou se considera que essa opção se insere no âmbito dos poderes de reapreciação da matéria de facto o que só a tornaria sindicável por este Supremo Tribunal na ocorrência de violação dos respectivos pressupostos legais, ou se entende que a Relação considerou irrelevantes, por não essenciais para o apuramento da verdade, as frases em falta. Desde logo, é de ponderar a menos feliz redacção da parte acima transcrita pois dizer-se que o conteúdo dos depoimentos se apreende “com razoável segurança” fica aquém do exigível que seria a apreensão “com toda a segurança” ou, pelo menos, “com segurança bastante”. Contudo, importa saber se a parte imperceptível é essencial para o apuramento da verdade (de acordo com o citado artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 39/95) havendo que considerar que tal pressuposto deve ser afirmado pelo recorrente, que tem de aduzir razões para de tal convencer o Tribunal (cf., neste sentido, o já citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 2010: “Deveria o recorrente ter aduzido razões para convencer o Tribunal de que assim é “.). Ora, o recorrente, mau grado tenha procedido à transcrição dos depoimentos, fê-lo por forma a deixar em branco as partes imperceptíveis, ou inaudíveis, sendo que alegou que a ausência de tais pontos o impedem de impugnar a matéria de facto em toda a sua extensão, o que, no fundo, se traduz em afirmar a essencialidade do omisso. E o que mais perturba não é tanto o não alcance de “uma ou outra palavra esparsa” mas sim a “passagem mais extensa da parte final do depoimento da testemunha A… de O… I…, concretamente a parte respeitante ao interrogatório conduzido pela Sra. Juiz, (que) se apresenta imperceptível.” É da experiência comum que os esclarecimentos finais pedidos pelo julgador são essenciais para alicerçar a sua convicção e surgem para firmar, infirmar ou detalhar o que foi dito pela testemunha no decurso da inquirição e da instância. Assim sendo, não basta uma “razoável segurança” do que foi afirmado, devendo a Relação poder aceder com “toda a segurança” ao que foi dito, “maxime”, nessa parte crucial do depoimento, para poder exercer plenamente a sua função de reapreciação da prova. Só depois de ouvir integralmente os depoimentos e proceder à sua análise critica, por forma a assegurar, verdadeiramente, um duplo grau de jurisdição em matéria de facto, é que o Tribunal “a quo” pode optar com segurança pela manutenção ou alteração do julgado em 1.ª instância. A omissão (não audição) da gravação de parte de um depoimento equivale à ausência do seu registo, com as consequências acima referidas, tratando-se de depoimento, ou segmento, essencial. Procede, assim, a nulidade arguida quanto ao depoimento da testemunha A… O… I…, já não sendo relevantes (por, como diz a Relação, se tratar da não audição de “uma ou outra palavra esparsa” e, esta afirmação ser insindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça, por se situar na estrita apreciação fáctica) as omissões no registo dos depoimentos das testemunhas J… F… da C… A… e M… de V… de J…. 3- Conclusões Pode concluir-se que: a) O Supremo Tribunal de Justiça está limitado nos seus poderes sobre a matéria de facto, âmbito em que, de harmonia com o disposto nos artigos 26.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais – Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro - e 722.º, n.º 2 e 729.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, só lhe é lícito intervir em questão de prova vinculada ou perante o desrespeito de norma reguladora do valor legal das provas. b) Tratam-se, então, de questões de direito, já que, em tais hipóteses não há que apreciar as provas segundo a convicção de quem julga (artigo 655.º, n.º 1 do Código de Processo Civil) mas apenas determinar se para a prova de certo facto a lei exige, ou não, determinado meio de prova insubstituível, ou de decidir se determinado meio de prova tem, ou não, face à lei, força probatória plena. c) Fora do âmbito da prova vinculada, cuja apreciação é pura matéria de direito, o erro na apreciação das provas e a consequente fixação dos factos da causa, isto é, a decisão da matéria de facto, é de livre apreciação do julgador nas instâncias no seu papel de apuramento da factualidade relevante, cabendo à Relação a última palavra. E mesmo a Relação só pode censurar o respondido à base instrutória através do exercício dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 712.º do Código de Processo Civil. d) E só se, na fase de julgamento do mérito, o Supremo Tribunal de Justiça deparar com insuficiência de matéria de facto para decidir de direito, ou se o acervo factual contiver contradições inviabilizadoras dessa decisão, é que deve devolver o processo ao tribunal recorrido para ampliar a decisão de facto, desde que nos limites da matéria alegada (artigo 729.º, n.º 3, ainda do Código de Processo Civil). e) A Relação, ao reponderar as provas registadas, deve ter em conta o conteúdo das gravações, que, contudo, irá valorar com a liberdade que lhe é conferida pelo artigo 655.º, tendo a possibilidade de formar uma convicção diferente da alcançada pela instância que a precedeu, mau grado as limitações resultantes da ausência de verdadeira imediação. f) A deficiência (ou mesmo a inexistência) de gravação constitui nulidade secundária (artigos 201.º, n.º 1 e 204.º, “a contrario”) a arguir mediante reclamação, nos termos dos artigos 205.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil e 9.º do Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro. E este último diploma que estabeleceu a possibilidade de documentação ou registo das audiências finais e da prova nelas produzida, dispôs naquele artigo que “se, em qualquer momento, se verificar que foi omitida qualquer parte da prova ou que esta se encontra imperceptível, proceder-se-á à sua repetição sempre que for essencial ao apuramento da verdade.” g) A nulidade pode ser arguida nas alegações do recurso de apelação. h) Dizer-se que o conteúdo dos depoimentos se apreende “com razoável segurança” fica aquém do exigível que seria a apreensão “com toda a segurança”, ou, pelo menos, “com segurança bastante”. i) Contudo, importa saber se a parte imperceptível é essencial para o apuramento da verdade (de acordo com o citado artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 39/95) havendo que considerar que tal pressuposto deve ser afirmado pelo recorrente, que tem de aduzir razões para de tal convencer o Tribunal. j) É da experiência comum que os esclarecimentos finais pedidos pelo julgador são essenciais para alicerçar a sua convicção e surgem para firmar, infirmar ou detalhar o que foi dito pela testemunha no decurso da inquirição e da instância. k) A Relação só depois de ouvir integralmente os depoimentos e proceder à sua análise critica, por forma a assegurar, verdadeiramente, um duplo grau de jurisdição em matéria de facto, é que pode optar com segurança pela manutenção ou alteração do julgado em 1.ª instância. l) A omissão (não audição) da gravação de parte de um depoimento equivale à ausência do seu registo, com as consequências acima referidas, tratando-se de depoimento, ou segmento, essencial. Nos termos expostos, acordam conceder a revista, anulando o Acórdão recorrido, por procedência da nulidade arguida quanto à apreciação da matéria de facto na parte referente ao depoimento da testemunha A… de O… I…. Custas pelo vencido, a final.
Lisboa, 2 de Fevereiro de 2010 Sebastião Povoas (Relator) Moreira Alves Alves Velho |