Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
5477/07.0TTLSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: TAP
CONTRATAÇÃO COLECTIVA
RETRIBUIÇÃO
ACRÉSCIMOS SALARIAIS
FÉRIAS
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
SUBSÍDIO DE NATAL
Data do Acordão: 07/13/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática: DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO COLECTIVO DE TRABALHO - PRESTAÇÃO DO TRABALHO - RETRIBUIÇÃO E OUTRAS ATRIBUIÇÕES PATRIMONIAIS
Doutrina: - Daniel Santos, O Direito a Férias e ao Subsídio de Férias, pág. 10.
- Jorge Leite, Direito do Trabalho vol. II, Coimbra 1999, pág. 175.
- Joana Vasconcelos, Código do Trabalho, (Romano Martinez), anotação ao artigo 255º.
- Lobo Xavier, Regime Jurídico do Contrato de Trabalho (anotado), Coimbra 1972, pág. 170; Curso de Direito do Trabalho, Verbo, 1992, pág. 389.
- Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho”, Almedina, 12.ª edição, ano de 2005, págs. 455, 457, 458, 460, 467, 470.
Legislação Nacional: ACORDO COLECTIVO DE TRABALHO (ACT/78) PUBLICADO NO BTE, 1ª SÉRIE N.º 20, DE 21-05-1978, COM PORTARIA DE EXTENSÃO (PE) PUBLICADA NO BTE, 1ª SÉRIE N.º 5, DE 08.02.1979: - CLÁUSULAS 83ª, NºS 1 E 2, 84ª, 85ª, 87ª.
ACORDO DE CONCERTAÇÃO SOCIAL, DE 24-1-1996: - ARTIGOS 1.º, 2.º, Nº 1.
AE/94, PUBLICADO NO BTE, 1ª SÉRIE N.º 28, DE 29-07-1994;
AE/97, PUBLICADO NO BTE, 1ª SÉRIE N.º 46, DE 15-12-1997;
AE/2005, PUBLICADO NO BTE, 1ª SÉRIE N.º 44, DE 29-11-2005.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT)/ 2003, APROVADO PELA LEI N.º 99/2003 DE 27-08 : - ARTIGOS 8º N.º 1, 211º E SS., 249.º, 250.º, Nº 2, ALÍNEA A), 255.º.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): -ARTIGOS 55.º, 56.º, NºS 3 E 4, 59.º, N.º1, ALÍNEA D).
-DL N.º 49.408 DE 24/11/1969, LEI DO CONTRATO DE TRABALHO (LCT): - ARTIGOS 13.º, 57º, 82.º, 86.º
DL N.º 874/76 DE 28-12, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELO DL N.º 397/91 DE 16-10, LEI DAS FÉRIAS, FERIADOS E FALTAS (LFFF): - ARTIGOS 6.º, 31.º
DL N.º 88/96 DE 03-07, LEI DO SUBSÍDIO DE NATAL (LSN).
REGIME SUCEDÂNEO (RS), DE 24-04-1981, PUBLICADO NO D.R. 2ª SÉRIE DE 12-08-1981; DESPACHO CONJUNTO DE 6/5/1985, PUBLICADO NO DR, II SÉRIE DE 15/5/85; E DESPACHO CONJUNTO Nº A-16/93-XII, DE 30/3/93, PUBLICADO NO DR, II SÉRIE DE 31/3/93: - ARTIGO 131º DO RS DE 1985.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 13/01/1993, CJSTJ, T. I, PÁG. 226;
-DE 12/2/92, BMJ 414/365.
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:
-DE 5/5/87, CJ, 319/2.
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:
-DE 6/5/85, CJ, 286/3.
Sumário : I - A retribuição é constituída pelo conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da actividade por ele desenvolvida, ou, mais rigorosamente, da força de trabalho por ele oferecida.

II - Estão excluídas da determinação da retribuição aquelas prestações cuja causa determinante não seja a prestação da actividade pelo trabalhador, ou a sua disponibilidade para o trabalho, mas tenham uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade para este.

III - Resultando provada a irregularidade e a intermitência da prestação, pelo Autor, de trabalho pago sob a designação de «horas-extra», não se pode concluir pela verificação dos requisitos da constância, da regularidade reiterada e da consequente previsibilidade de prestação de trabalho extraordinário/suplementar, não se pode concluir que os valores auferidos pelo Autor a este título constituam retribuição.

IV - Apurando-se que a razão de ser do pagamento, ao Autor, de um acréscimo remuneratório denominado «trabalho nocturno» – devido nas situações em que o número de horas trabalhado à noite ultrapassasse as 30 horas mensais – se destinava a compensá-lo da maior penosidade e desgaste deste trabalho durante a noite, também está afastada a possibilidade de qualificar esse acréscimo remuneratório como retribuição, por lhe faltar o requisito da contrapartida do trabalho que este conceito exige e pressupõe.

V – Assim, não deve a média dos valores recebidos pelo A a estes títulos, integrar a retribuição das férias nem do subsídio de férias.

VI – Resultando da contratação colectiva aplicável que os trabalhadores têm direito a um subsídio de Natal que integra a remuneração mensal constante das tabelas salariais e as prestações fixas, regulares e periódicas, não devem os valores recebidos pelo trabalhador a título de horas extra e acréscimo por trabalho nocturno integrar tais subsídios, pois o DL nº 88/96 3/7, que o generalizou a todos os trabalhadores, salvaguardou a aplicabilidade das convenções colectivas na determinação das prestações que o integram.
Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 

1---

 

            AA instaurou uma acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra

 “TAP PORTUGAL, SA”, alegando em síntese, que foi admitido ao serviço da R., em 22/10/1973, para, sob a autoridade e orientação da mesma, prestar a sua actividade de “Técnico de Manutenção de Aeronaves” e que a R lhe pagou, durante onze meses por ano, entre outros, os seguintes subsídios:

- Subsídio de horas extra;

- Subsídio de trabalho nocturno;

- Subsídio de disponibilidade TMA;

- Subsídio de transporte.

 

Em todos os anos o A. gozou férias, recebeu o respectivo vencimento e subsídio, bem como o subsídio de Natal, cujos montantes eram compostos pela parte fixa da retribuição, ou seja o vencimento base, anuidades, subsídio de compensação especial de trabalho e subsídio de turno, sem, contudo, contemplar o acréscimo da parte variável da retribuição.

Ora, os referidos subsídios de horas extra, de trabalho nocturno, de disponibilidade TMA e de transporte, com a regularidade que sempre foram pagos ao A., constituem a parte variável da sua retribuição e, como tal, deveriam ter sido tomados em linha de conta pela R. no cômputo do pagamento da retribuição das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, tal como acontece quanto ao subsídio de compensação especial de trabalho e subsídio de turno, que a R integra nesses complementos.

Tendo assim direito ao pagamento, desde 1974 a 2007, das diferenças de retribuição relativas a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, num total de € 24.740,25, pede a condenação da R neste montante, acrescido de juros de mora às respectivas taxas legais, até efectivo e integral pagamento.

 

Designada a audiência das partes e frustrada a tentativa de conciliação nela realizada, foi a R. notificada para contestar, vindo alegar, em síntese, que se as diferenças pedidas pelo A. lhe fossem devidas, estariam extintas por prescrição todas as respeitantes ao passado anterior ao dos últimos 60 meses contados a partir da data de citação da R. (07.01.2008), o mesmo sucedendo com os pedidos de juros de mora.

Por outro lado, alega que, se eventualmente se viesse a entender que o A. está a exercer um direito seu – que não está – os benefícios que peticiona são de tal modo anómalos e chocantes que nenhuma ideia de justiça postula a tutela de tal direito, verificando-se uma situação de abuso de direito.

Para além disso, o A. só passou a desempenhar funções de “Técnico de Manutenção de Aeronaves” a partir de 1 de Outubro de 1994

Os erradamente apelidados de subsídio de horas extra, subsídio de trabalho nocturno, subsídio de disponibilidade TMA e o subsídio de transporte, correspondem a diferentes condições de prestação de trabalho, especificamente caracterizadas na regulamentação colectiva de trabalho e na regulamentação interna da TAP aplicáveis aos TMAs e, para além disso, os correspondentes quantitativos que as notas de vencimento reflectem como tendo sido pagos ao A., são computados com base em critérios próprios distintos uns dos outros e que foram variando ao longo da relação de trabalho.

Tais subsídios não integram a retribuição ilíquida mensal do A. já que não corresponde à verdade que o A. os tenha recebido ao longo dos anos regular, habitual e periodicamente.

A maior parte das denominadas horas extra corresponde a trabalho normal prestado em dia feriado e mais raramente a mesma expressão é também usada na TAP para identificar trabalho prestado fora dos limites do horário normal, ou seja, o trabalho suplementar, o qual dá lugar à atribuição de abonos diferenciados uns dos outros por códigos, e conforme a situação de trabalho de que constitui pressuposto factual, dá lugar a acréscimo variável de caso para caso.

No que respeita à regulação específica do “trabalho nocturno”, o mesmo é remunerado como trabalho normal através da atribuição do subsídio de turnos por todos os IRCTs, que está incluído nas prestações consideradas “componentes da retribuição ilíquida mensal”.

Em todas as convenções colectivas aplicáveis desde o ACT de 1978, a regra é a não cumulação do subsídio de turnos com a remuneração do trabalho nocturno e, a partir de 1985, passou a prever-se que aos TMAs que recebam subsídio de turno, seja pago, com acréscimo, o trabalho nocturno normal, mas só na medida em que, ocasionalmente, o exercício da actividade (entre as 20 e as 7 horas) exceda 30 horas em cada mês.

Em nenhum dos IRCTs aplicáveis, o acréscimo por trabalho nocturno consta do elenco de prestações que integram a “retribuição”.

O subsídio de disponibilidade TMA foi um aditivo pecuniário que apenas vigorou entre Junho de 1994 e Julho de 2001, criado com o específico fim de compensar as despesas, os incómodos e os inconvenientes para a vida pessoal dos trabalhadores, derivados da implementação de horários de trabalho em regime de modulação.

O subsídio de transporte foi instituído em Abril de 1994 e visava, claramente, a compensação de despesas, dependendo da zona onde se situa a residência do trabalhador para ser abonado.

Por outro lado, os usos da TAP levam a considerar os abonos dos autos como elemento não integrante da retribuição, mas apenas como quantitativos recebidos pelos seus trabalhadores se e quando se verificar a concreta causa da sua atribuição, diversa da remuneração do trabalho.

Conclui no sentido da procedência das invocadas excepções, com as legais consequências; e, caso assim se não entenda, deve a acção ser julgada improcedente, por não provada, absolvendo-se a R. dos pedidos formulados pelo A.

 

Respondeu o A. alegando, em síntese, que as excepções invocadas pela R. devem se julgadas improcedentes, ao mesmo tempo que pede a condenação desta como litigante de má-fé.

 

Foi proferido despacho saneador no qual foi julgada improcedente a excepção de prescrição invocada pela R.

E tendo-se relegado para a decisão final a apreciação da excepção de abuso de direito, dispensou-se a selecção de matéria de facto assente e controvertida.

Foi por fim designada data para audiência de discussão e julgamento, em cujo decurso a R apresentou diversos pareceres jurídicos sobre o “thema decidendum”.

E tendo as partes acordado sobre a matéria de facto pertinente para a decisão da causa, foi proferida sentença nos seguintes termos:

1- julgo  a acção parcialmente procedente e, em consequência:

a)-condeno a Ré a pagar ao Autor o valor das diferenças de remunerações complementares pedidas e não incluídas, referentes aos montantes não incluídos na remuneração de férias e subsídio de férias, atinentes a subsídio hora extra e subsídio nocturno, acrescidas de juros de mora, às taxas legais em vigor em cada momento para os créditos civis, contados desde o vencimento de cada parcela e até integral e efectivo pagamento;

b)-condeno a Ré a pagar ao Autor o valor das diferenças de remunerações complementares pedidas e não incluídas, referentes aos montantes não incluídos no subsídio de Natal até Novembro de 2003, atinentes a subsídio hora extra e subsídio nocturno, acrescidas de juros de mora, às taxas legais em vigor em cada momento para os créditos civis, contados desde o vencimento de cada parcela e até integral e efectivo pagamento;

c)- absolvendo-se a Ré do demais peticionado pelo Autor.

2- julgo improcedente a invocada excepção de abuso de direito.

Inconformada com esta sentença, dela apelou a R, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa julgado a apelação procedente, e revogando a sentença apelada, absolveu a R do pedido.

           

É agora o A, que irresignado, nos traz revista, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões:

1º: O presente recurso será estruturado, suscitando três questões basilares, quanto ao carácter regular e periódico dos suplementos (acréscimos) remuneratórios, pagos ao trabalhador, no período de 1974 a 2007, a titulo de:
-              Trabalho suplementar (Horas extras);

-              Trabalho nocturno;

E se os mesmos devem relevar para o cômputo da remuneração de férias e dos subsídios de férias e de Natal.

2º: Quanto ao trabalho suplementar (horas extras), o douto acórdão, embora reconheça que o recorrente prestou trabalho suplementar com o conhecimento da entidade patronal e sem a sua oposição, considera que tal prestação de horas extras, não tem um carácter fixo, regular e periódico, não integrando a noção de retribuição.

3º: Ora, tal situação não corresponde à verdade.

No caso em apreço verifica-se que: - O trabalho suplementar (Horas extras) foi pago, 11 meses em 1974, 10 meses no ano de 1975, 12 meses no ano de 1976, 12 meses no ano de 1977, 11 meses no ano de 1978, 8 meses no ano de 1979, 9 meses no ano de 1980, 9 meses no ano de 1981, 11 meses no ano de 1982, 10 meses no ano de 1983, 10 meses no ano de 1984, 12 meses no ano de 1985, 7 meses no ano de 1986, 10 meses no ano de 1987, 10 meses no ano de 1988, 10 meses no ano de 1989, 10 meses no ano de 1990, 8 meses no ano de 1991, 7 meses no ano de 1992, 10 meses no ano de 1993, 7 meses no ano de 1994, 8 meses no ano de 1995, 7 meses em 1996, 5 meses em 1997, 3 meses em 1998, 6 meses em 1999, 7 meses no ano de 2000, 7 meses no ano de 2001, 11 meses no ano de 2002, 8 meses no ano de 2003, 9 meses no ano de 2004, 9 meses no ano de 2005, 7 meses no ano de 2006, e 9 meses em 2007., o que confirma o carácter de regularidade desta prestação laboral, sendo maior o numero de vezes em que foi percebido do que aquele que o não foi em relação à média.

4º: Na verdade, ao invés do que foi decidido, ficou provado, na primeira instância, um elevado número de meses em que se liquidaram seis (6) ou mais vezes, anualmente, o referido subsídio, sendo por isso maior o número de vezes que o referido subsídio foi pago do que aquele em que não foi pago, (em 34 anos recebeu 32) o que confirma o carácter de regularidade e de habitualidade do subsidio.

5º: Quanto à segunda questão, acréscimo remuneratório por trabalho nocturno, sustenta o douto acórdão recorrido, confundindo o trabalho normal com o trabalho por turnos, que o referido trabalho nocturno só é devido após a prestação da trigésima horas (o que apesar de constar nos instrumentos de regulamentação colectiva, contraria as disposições legais que mandar liquidar, "todo" o trabalho nocturno efectuado) com o acréscimo de 100%, mas ainda assim, tal acréscimo tem carácter ocasional, porque só ocorre a partir da trigésima hora de trabalho prestado entre as 20 e as 07 horas de cada mês, carecendo tal acréscimo de periodicidade, pelo que não tem natureza retributiva.

6º: Ora, tal assumpção tem até natureza contraditória, primeiro porque o trabalho nocturno foi prestado, e mesmo após a trigésima hora "oferecida" à entidade patronal, depois e, ainda assim, foi efectuado com carácter de periodicidade e habitualidade, o que, com o devido respeito não faz qualquer sentido.

7º: No caso em apreço

- O trabalho nocturno, foi pago, 9 meses no ano de 1987, 8 meses em 1988, 11 meses em 1989, 10 meses em 1990, 6 meses em 1991, 8 meses em 1992, 10 meses em 1993, 9 meses em 1994, 11 meses no ano de 1995, 11 meses em 1996, 1 meses no ano de 1997, 4 meses no ano de 1998, 11 meses no ano de 1999, 10 meses no ano de 2000, 12 meses no ano de 2001, 11 meses no ano de 2002, 11 meses no ano de 2003, 11 meses no ano de 2004, 12 meses no ano de 2005, 10 meses no ano de 2006, e 12 meses em 2007.

8º: Também quanto a este acréscimo remuneratório se constata, nos termos da Lei, o carácter de regularidade e habitualidade do subsídio, isto é, para além das primeiras 30 horas de trabalho nocturno que o recorrente efectuou (e não ganhou, porque por convenção colectiva, estas primeiras 30 horas nocturnas efectuadas são para a empresa, quiçá a troco do pagamento do subsídio de turnos), o recorrente ainda efectuou trabalho nocturno, de forma regular, periódica e habitual, sendo mais as vezes que recebeu do que aquelas que não recebeu, ou seja, em cerca de 21 anos, efectuou acima da média 19 anos de trabalho nocturno e remunerado, como ficou provado na douta sentença da 1ª Instância.

9º: Tais componentes retributivas constam dos instrumentos de regulamentação colectiva:

-              AE publicado no BTE, Iª Série n° 46 de 15/12/1997, cls. 60ª e 61ª;

-              AE publicado no BTE, Iª Série n° 44 de 29/11/2005, cls 60ª e 61ª, ao invés do que se decidiu no douto acórdão, estando aí perfeitamente definido o que é trabalho suplementar e o que é trabalho nocturno e quais as devidas compensações.

10° - Esta matéria de facto reflecte, sem margem para dúvidas, que o trabalho suplementar (horas extras) e o trabalho nocturno, estavam implantados, assumindo, por isso, as características básicas da previsibilidade, estabilidade e segurança que enformam a prestação normal de trabalho.

11° - As regras da experiência comum, revelam que alguém que recebe uma quantia de forma regular e periódica, conta com a mesma para fazer face às despesas pessoais e do seu agregado familiar, tal configurando um facto notório que não carece de alegação e prova - art° 514° do CPC.

12°: No caso dos autos essa expectativa está mais que justificada e sedimentada, considerando o período de tempo, bastante alargado, de recebimento dessas quantias.

13°: Há, pois, que concluir que os referidos montantes pagos, referentes a trabalho suplementar e trabalho nocturno, por terem sido pagos regular e periodicamente, com o conhecimento e sem oposição da entidade empregadora, criaram no recorrente a legítima expectativa de continuarem a ser recebidos e orçamentados nas suas despesas pessoais e familiares, e integram o conceito de retribuição.

14°: Acresce no que tange ao trabalho suplementar, e perante normas (D.L 421/83, revogado pelo D.L 398/91 de 16/10) a doutrina e a jurisprudência divergiram quanto ao significado a atribuir-lhes, no que tange ao pagamento do trabalho suplementar.

15°: Sucede, porém que o Tribunal Constitucional, com o seu Acórdão de 23/11/99, publicado no D.R., II série n° 68, de 21/03/200, a pag, 5349, veio julgar inconstitucional a norma do art° 6º n° 1 do Dec. Lei 421/83, quando interpretada no sentido de considerar não exigível o pagamento do trabalho suplementar prestado com o conhecimento do empregador e sem a sua oposição, por violação dos art°s 59° n° 1 alíneas a) e d) e art° 18° n° 2 da Constituição da República.

16°: Quanto à prova, conforme estatui o n° 1 do art° 350° do C.C. quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto (mas mesmo assim o recorrente provou documentalmente a existência do trabalho prestado, a sua regularidade e o seu recebimento), importando a existência desta presunção a inversão do ónus da prova - art° 344° do CC.

17°: É pena que o douto acórdão, recorrido relativamente à remuneração por trabalho suplementar (horas extras) e por trabalho nocturno, não tenha acolhido a douta sentença que decidiu "resulta dos pontos 5 a 15 dos factos provados que o Autor as auferiu porque prestou trabalho para além do seu horário, e porque prestou serviço entre as 20 e as 07 do dia seguinte (vd. Cláusulas 57ª e 58ª do ACT/78; 88ª, 90ª, 126ª e 127ª do AE/85, 36ª, 60ª e 61ª do AE/94 e 60ª e 61ª do AE/2005).

18°: Aliás, como muito bem se decidiu na primeira instância, constitui entendimento pacífico, na doutrina e na jurisprudência que a remuneração por trabalho suplementar e por trabalho nocturno, quando auferida com carácter de regularidade, deve integrar o cálculo da remuneração de férias, do subsídio de férias, bem como do subsídio de Natal" (vide Ac. STJ de 06/02/2002, Ac Doutrinário do STA, 490, 1384; de 19/02/2003, Ac. Doutrinário do STA, 503, 1702; e da Relação de Lisboa de 21/01/2004, CJ. Tomo I, pág. 145).

19°: Como já ficou dito na referência que se efectuou ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/09/2008, no âmbito do Procº 4800/08-4, :"No que respeita ao ónus da prova de verificação dos pressupostos condicionantes da atribuição de natureza retributiva a qualquer prestação pecuniária paga pelo empregador ao trabalhador, a lei consagrou um regime favorável dos trabalhadores, ao preceituar, no n° 3 do referido art° 82° da LCT e no n° 3 do art° 249° do Cod. Trabalho que, até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda a prestação da entidade patronal ao trabalhador, estabelecendo-se, pois, neste normativo uma presunção “iuris tantum” no sentido de que qualquer atribuição patrimonial efectuada pelo empregador em benefício do trabalhador, SALVO PROVA EM CONTRÁRIO, constitui parcela da retribuição.

Conforme estatui o n° 1 do art° 350° do Cod. Civil, quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz. A existência de presunção legal importa, assim, a inversão do ónus da prova - art° 344° do C.C.

Deste modo, não obstante os aludidos pressupostos constituírem factos constitutivos do direito invocado pelo autor e de, em princípio, lhe caber a prova desses factos, face ao disposto no n° 1 do art° 342° do CC, a existência da citada presunção legal inverte o ónus da prova, incumbindo ao Réu a demonstração da inexistência de tais pressupostos legais. AO AUTOR CABE. POIS, SOMENTE PROVAR A PERCEPÇÃO DAS INVOCADAS PRESTAÇÕES PECUNIÁRIAS, COMPETINDO AO RÉU PROVAR A NÃO VERIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS INTEGRANTES DO CONCEITO LEGAL DE RETRIBUIÇÃO, A FIM DE OBSTAR A QUE LHE SEJA CONFERIDO NATUREZA RETRIBUTIVA.

20°: Ainda sobre o conceito de retribuição, não se pode concordar com a posição assumida pelo douto acórdão recorrido, que aliás está em oposição com o julgado na douta sentença na primeira instância. Vejamos os fundamentos do douto acórdão:

- Quanto à retribuição respeitante ao período de férias, estabelecem os instrumentos de regulamentação colectiva que "não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo" e quanto ao subsídio de férias que este deve ser "de montante igual ao dessa retribuição". E quanto ao subsídio de Natal, verifica-se que ele foi estabelecido convencionalmente ainda antes de a Lei o tornar obrigatório, sendo definido no AE de 1985, como um mês de retribuição igual à efectivamente auferida no mês de vencimento, mas depois o seu valor passou a ser estabelecido através da remissão para noção de retribuição constante de cláusula específica nas sucessivas versões da convenção aplicada. E acrescenta " convém também referir que desde o AE de 1978, todas as convenções estabelecem a noção de retribuição como sendo " a remuneração mínima mensal e todas as prestações fixas, regulares e periódicas, feitas directamente em dinheiro" e, além disso desde 1978 passou a existir nas diversas convenções, em disposição própria, uma enumeração das componentes da remuneração mensal. Remunerações da tabela salarial, anuidades, por isenção de horário de trabalho, subsídio de turnos, entre outros, conforme cláusulas 120ª, 123ª, 125ª (1985); cláusulas 38ª (1993), 56ª (1994 e 1997) 57ª (2005), existindo também disposições de carácter negativo, isto é, identificativas de prestações excluídas do âmbito da retribuição (subsídio de refeição, ajudas de custo, despesas de transporte, subsídio de disponibilidade e outros, cláusulas 84ª n° 2 do ACT78, 39ª de 1993, cláusulas 57ª do AE94, cláusula 57ª do AE97 e cláusula 58ª do AE 2005).

21°: Quer o D.L. 874/76 de 28 de Dezembro, quer o D.L. 88/96 de 13 de Junho, quer ainda os art°s 255° e 254° do C. Trabalho, têm carácter imperativo e prevalecem sobre as cláusulas dos sucessivos instrumentos de regulamentação de trabalho, que as partes aceitam ser aplicados, que é o regime mais favorável aos trabalhadores, quando interpretadas no sentido de que da remuneração de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, serem excluídas todas as prestações especiais ou complementares com a excepção das diuturnidades, visto que assim sendo essas cláusulas são nulas e totalmente ineficazes, nos termos do art° 6º n° 1 al. b) do D.L 519-C1/79, de 09 de Dezembro, e art° 533° n° 1, a) do C.Trabalho, por estabelecerem um regime menos favorável ao trabalhador. Neste sentido pronunciaram-se os Acórdãos do STJ de 04/12/2002 (Revista n° 3606/02-43 Secção, disponível em texto integral em www.dgsi.pt, de 19/02/2003 (Revista n° 3740/02-43 Secção, disponível em sumário), em www.dqsi.pt, e 19/03/2003 (CJ-STJ Ano XXVIII, Tomo I, pag. 271.

22°: Por outro lado, segundo o art° 82° do regime do contrato individual de trabalho, aprovado pelo D.L. 49408, de 24 de Novembro de 1969, (RJCIT), também designado por LCT, que consagra os princípios gerais sobre a retribuição, esta abrange o conjunto dos valores pecuniários ou não que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o empregador está obrigado a pagar, regular e periodicamente ao trabalhador, como contrapartida do seu trabalho, ou mais rigorosamente (da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida n°s 1 e 2, presumindo-se, até prova em contrário, constituir retribuição, toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador - n° 3. A este preceito corresponde, com alterações que ao caso não interessa considerar, os n°s 1 e 3 do art° 249° do Código do Trabalho. A retribuição é, pois, um conjunto de valores expressos ou não em moeda a que o trabalhador tem direito, por título contratual ou normativo, correspondente a um dever da entidade patronal.

23°: A aplicação do regime previsto, quer no art° 82° n°s 2 e n° 3 da LCT, quer nos n°s 1 e 3 do art° 249° do Código do Trabalho é muito mais favorável ao trabalhador do que o regime previsto nos AE's, devendo ser aplicado, até 01/12/2003 a LCT e a partir desta data o Código do Trabalho e não os instrumentos de regulamentação colectiva.

24°: Quanto aos subsídios de Natal, vencidos depois da entrada em vigor do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 99/2003, de 27 de Agosto, que com a devida vénia se transcreve, ficou vincada a posição do recorrente quanto esta matéria, no acórdão do TRL, 4a secção, Procº 2935/07-4:

" De acordo com a Exposição de Motivos da Proposta de lei n° 29/IX (Código do Trabalho) publicada no Diário da Assembleia da República, II série - A, n° 42/IX/l, de 15 de Novembro de 2002, págs. 1292-1400 e na separata n° 24/IX do Diário da Assembleia da República, de 15 de Novembro de 2002, a orientação que presidiu à elaboração do Código do Trabalho pode ser sintetizada através dos seguintes vectores:

a)- abertura à introdução de novas formas de trabalho, mais adequadas às necessidades dos trabalhadores e das empresas;

b)-   promoção   da   adaptabilidade   e   flexibilidade   da   disciplina   laboral, nomeadamente quanto à organização do tempo, espaço e funções laborais, de modo a aumentar a competitividade da economia das empresas e o consequente crescimento do emprego;

c)- Mais acessibilidade e compreensão do regime existente;

d)- sistematização da legislação dispersa, elaborada em épocas distintas;

e)- integração de lacunas e resolução de algumas dúvidas suscitadas na aplicação das normas agora revogadas;

f)- incentivo à participação dos organismos representativos de trabalhadores e empregadores na vida laboral, em particular, no que respeita à contratação colectiva.

25°: Assim, tem de entender-se que o subsídio de Natal, após 01/12/2003, terá de continuar a abranger, também, a média das prestações complementares auferidas pelo trabalhador, uma vez que estas prestações pela sua regularidade e habitualidade fazem parte da retribuição.

26°: O douto acórdão, ora recorrido, ao decidir como decidiu, contraria a profusa jurisprudência quer do Tribunal da Relação de Lisboa, quer do Supremo Tribunal de Justiça, e que para comodidade aqui se referem: - Acórdão da Relação de Lisboa de 09/10/85 (BTE, II série, n° 5-6/88, pág.884, 21/01/2004 (CJ, Ano XXIX, tomo I, pág. 145) e 08/11/2006, www.dgsi.pt e os Acórdão do STJ de 24/01/1990 (AJ, 5°/90, pág. 19), de 11/04/2000 (AD, 471, pag.478), de 19/03/03 (CJ/STJ, ano XXVIII, Tomo I, pág. 271), de 18/01/2006 (CJ/STJ, Ano XIV, tomo I, pag.241) e de 17/01/2007 (www.dgsi.pt).

-              Acórdão do Tribunal Constitucional de 23/11/1999, publicado no Diário da República, II série n° 68, de 21/03/2000, pág. 5349.

-              Acórdão do STJ de 24/06/2003, sendo Relator o Sr. Juiz Conselheiro Ferreira Neto

-              Os Acs de 8.3.00, CJ-STJ, ano VIII, I, pág.277, de 16/5..., CJ-STJ, ano VIII, II, pág. 264, de 2/10/02, proc. n° 1699/01 e de 12.3.03, proc. n° 2238/02);

-              Acórdão do STJ de 09/05/2007, Procº 06S3211, sendo relator o SR. Juiz Conselheiro Vasques Dinis, e Acórdão do STJ de 16/01/2008, Procº 07S3790, sendo Relator o Sr. Juiz Conselheiro Pinto Hespanhol;

-              Ac. do Tribunal da Relação de 12/09/2008, no âmbito do Procº 4800/08.4, Ac. do Tribunal da Relação de 11/09/2008, no âmbito do procº 7104/08-4, Ac. 09/05/2008 no âmbito do procº 4095/08-4, Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 8/11/2006;

-              Ac. STJ de 06/02/2002, Ac Doutrinário do STA, 490, 1384; de 19/02/2003, Ac. Doutrinário do STA, 503, 1702; e da Relação de Lisboa de 21/01/2004, CJ. Tomo I, pág. 145;

-              Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/09/2008, proc.º 4800/08-4;

-              Ac. do STJ de 17/01/2007, Procº 06S2188, sendo Relator o Sr. Juiz Conselheiro Sousa Peixoto;

27º - Acresce a tudo isto a questão aflorada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25/03/2010, no âmbito do processo 1052/05.2TTMTS.S1, que teve como Relator o Exmo Senhor Conselheiro Vasques Dinis, que relativamente às dúvidas que se levantam na doutrina, nomeadamente no caso dos pareceres juntos, quanto à inclusão dos complementos remuneratórios no cálculo do subsídio de Natal e outros, que a Jurisprudência deste Tribunal orientou-se no sentido de considerar tal inclusão".

28º- Mais refere o citado Acórdão do STJ de 25/03/2010 no que tange à questão da definição do vocábulo RETRIBUIÇÃO, depois de elencar exaustivamente as várias interpretações que: "O emprego do vocábulo retribuição em todas as referidas normas, particularmente nos artigos 83. ° a 85. °, aponta no sentido de que as prestações quantitativamente variáveis, regular e periodicamente auferidas, para além da remuneração base, designadas de complementos salariais, entre as quais se compreendem as comissões por vendas - que, não se incluindo nas atribuições patrimoniais referidas no artigo 87,° -. assumem, de algum modo, o carácter de contrapartida do trabalho prestado e, pois, natureza retributiva.

29° Ao decidir como decidiu, o douto acórdão e a douta sentença da 1ª Instância no que tange ao subsídio de disponibilidade TMA, e quanto ao montante do subsídio de Natal a partir de 01/12/2003, violaram a Lei, designadamente o disposto nos n°s 1 e 2 do art° 6° do D.L. 874/76 de 28 de Dezembro, o art° 2º do D.L. 88/96 de 03 de Julho, art° 87° da LCT, art° 6º n° 1, al.b), do Dec. Lei 519-C1/79 de 09/12, art° 82° n°s 1 e 3 da LCT, os art°s 249° n°s 1 a 3, art° 250° n° 1 e art° 254° n° 1, art° 255°, artº 533° n°l al.a), todos do Código do Trabalho, os art°s 59° n° 1 al. a) e d) e art° 18° n° 2 da Constituição da República Portuguesa, art° 668° n° 1 al.d), 2a parte do CPC; e ainda os art° 344°, 350°, 524° n° 1, 804°, 805° n° 2 al. a), 806° e 559°, todos do Código Civil

Pede-se assim que se conceda a revista, e revogando-se o acórdão recorrido, se confirme a sentença da primeira instância, condenando-se a recorrida TAP PORTUGAL, SA a pagar ao trabalhador AA, as quantias correspondentes às diferenças de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, vencidos nos anos de 1974 a 2007, inclusive, tendo em conta as quantias auferidas pelo Autor a título de remuneração por trabalho suplementar (horas extras) e trabalho nocturno, tudo com juros de mora às taxas legais em cada momento em vigor, desde a data em que cada verba deveria ter sido posta à disposição do Autor, e até efectivo pagamento.

A R também alegou, rematando a sua alegação com as seguintes conclusões:

- Os abonos vertidos na alegação do Recorrente, mesmo que considerados como remuneração em sentido amplo, não integram seguramente o conceito técnico-jurídico de «retribuição», tal como configurado no artº 82º da LCT e agora no artº 249º do CT.

1-Só as prestações que integram a «retribuição» estão sujeitas ao regime legal de tutela, caracterizada, além do mais, pela respectiva intangibilidade e irredutibilidade. As prestações remuneratórias “lato sensu” podem ser retiradas ao trabalhador, se desaparecerem as condições da sua atribuição, sem que tal importe violação do predito regime de tutela.

2-É a própria lei ordinária (citados artºs 82º da LCT e 249º do CT) que, em estrita observância de princípios constitucionais – designadamente o da autonomia colectiva consagrado no artº 56º, nº 3, da CRP –, confia à contratação colectiva a missão de, com plena autonomia, reger a matéria da retribuição nas suas diversas facetas, modalidades, tempos de atribuíção e correspectividade com a actividade que constitui objecto do contrato de trabalho.

3-Por devolução da lei ordinária, cabe assim às convenções colectivas de trabalho estabelecer o conjunto das regras, à luz das quais determinada atribuição patrimonial deve ser havida como prestação remuneratória em sentido amplo ou como prestação retributiva propriamente dita[1].

4-As prestações remuneratórias e retributivas que emergem de cláusulas de convenções colectivas de trabalho têm de ser apreciadas em bloco e de forma conjugada, e nunca isoladamente, sob pena de quebra irreparável do equilíbrio geral do sistema remuneratório convencional. A convenção colectiva de trabalho é criada à mesa das negociações para valer como um todo, pelo que qualquer apreciação avulsa duma vantagem, desgarrada do conjunto, tem como resultado fatal a perda do equilíbrio convencional conseguido pelas partes contratantes[2].

5-De harmonia com a teoria da conglobação limitada que norteia a interpretação de cláusulas de convenções colectivas do trabalho, estas devem ser apreciadas por grupos incindíveis – ou seja, considerando como um todo o conjunto das normas relativas a determinadas matérias, v.g., promoções, remunerações, formação profissional, benefícios sociais, etc – e não cada cláusula vista isoladamente, por forma a não afectar o equilíbrio geral e a vontade das partes outorgantes do IRCT. Só assim a convenção colectiva será interpretada como um todo, sob pena de conduzir a soluções desequilibradas e injustas – que as partes contratantes rejeitaram – e legitimar reivindicações não queridas, e até repudiadas, pelas partes contratantes.

6-Posto isto, analisemos os errados fundamentos da sentença da 1ª instância (que o Recorrente quer teimosamente ver ressurgida), rejeitados «in totum» pelo douto Acórdão recorrido.

7-São elementos integradores do conceito de retribuição propriamente dita a verificação cumulativa dos seguintes requisitos essenciais (a falta de algum dos requisitos que se passam a indicar impede a caracterização da prestação como retribuição):

a)corresponder a prestação a um direito do trabalhador e a um dever do empregador;

b)decorrer do próprio contrato, das normas que o regem ou dos usos;

c)ser contrapartida da disponibilidade da força de trabalho que, em execução do contrato, o trabalhador põe ao serviço do empregador;

d)ser regular e periódica[3], só e na medida em que se possa configurar como contrapartida da actividade contratada[4];

e)ter natureza patrimonial (ser avaliável em dinheiro).

8-A douta sentença errou ao qualificar como prestação retributiva os  diversos adicionais remuneratórios processados como «horas extra» que não integram o conceito técnico-jurídico de retribuição, já porque não são contrapartida do trabalho, já porque não se provou que a expressão «horas extra» seja sinónimo de trabalho suplementar. E, mesmo quando «horas extra» possa excepcionalmente significar trabalho suplementar (dizemos excepcionalmente porque a expressão «horas extra» muito raramente é usada com tal sentido), falta-lhe a característica da regularidade e periodicidade e visa apenas compensar os trabalhadores pela agravada penosidade física associada à exigência de trabalho para além do seu período normal de trabalho diário. Acresce que, no regime de turnos rotativos (laboração contínua) em que o A. operava, a expressão «horas extra», se usada no sentido de trabalho suplementar, refere-se a uma situação que forçosamente só pode ter verificação ocasional, visto que no regime de turnos rotativos está logicamente afastada a possibilidade de trabalho para além do horário normal de trabalho diário, uma vez que, em tal regime, todos os trabalhadores saem no final do seu turno, entrando outros trabalhadores para a execução do novo turno, o que torna desnecessário o trabalho suplementar (que se teria de traduzir no escusado prolongamento do trabalho de elementos do turno anterior, quando todos os postos de trabalho já estavam ocupados por elementos do novo turno acabado de entrar).

9-A douta sentença também errou ao qualificar como retributiva a prestação do acréscimo por trabalho nocturno, que é uma prestação meramente remuneratória prevista para os TMA no AE/TAP.

9.1. Em princípio o trabalho nocturno prestado regularmente em regime de turnos rotativos (laboração contínua) é compensado pelo subsídio de turnos, o qual a contratação colectiva trata como parte integrante da retribuição e, como tal, o subsídio de turnos é, e sempre foi, tomado em conta pela TAP para efeitos do cômputo da retribuição e subsídio de férias e subsídio de Natal. 

9.2. Aquilo a que o A. chama (muito mal) “subsídio de trabalho nocturno” não é contrapartida do trabalho prestado. É um acréscimo (majoração) de 100% abonado aos TMA para os compensar pelo modo específico como é distribuído o seu tempo de trabalho, importando uma maior penosidade inseparavelmente ligada à prestação de trabalho durante a noite, mas apenas se e quando forem eventualmente excedidas as primeiras 30 horas mensais prestadas entre as 20h e as 7h. As primeiras 30 horas mensais no período nocturno estão cobertas pelo subsídio de turno – prestação fixa que se vence mensalmente – que não é cumulável com qualquer outra retribuição de trabalho nocturno. 

9.3. Assim, por definição, o acréscimo dos 100% tem de ser havido como ocasional, porque só ocorre, quando ocorre, a partir da trigésima primeira hora de trabalho (por turnos) no período nocturno entre as 20h e as 7h. Não pode este abono, pela sua aleatoriedade e variabilidade, ser qualificado como retribuição, já porque não é contrapartida do trabalho contratado, já porque serve para compensar a maior penosidade do labor nocturno a partir da 31ª hora entre as 20h e as 7h, quando e se caso disso. Não é certo nem seguro que, em cada mês, vai ser realmente ultrapassado o limite das 30h (prestadas entre as 20h e as 7h), nem que, sendo-o, seja constante o número de horas prestadas.

9.4. Os aspectos acabados de sublinhar constam “expressis verbis” dos AEs TAP/ SITEMA aplicáveis (publicados no BTE nº 28/94 e no BTE nº 46/97), que o Tribunal não pode ignorar (“jura novit curia”).

10- Tanto a qualificação das verbas processadas sob a designação comum de «horas extra» como trabalho suplementar, como a qualificação do acréscimo por trabalho nocturno acima das 30 horas mensais no período entre as 20h e as 7h, feitas pelo Mmº Juiz a quo, são manifestamente desgarradas do conjunto das disposições convencionais sobre remuneração e redundam na simples «soma aritmética» das vantagens patrimoniais avulsas do A., sem ponderar o equilíbrio global do sistema remuneratório convencional. A sentença da 1ª Instância foi pelo facilitismo, em vez de cuidar da interpretação jurídica que não seria difícil retirar da ponderação conjugada de todas as regras sobre remuneração constantes dos instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho, os quais, como matéria de direito que são, o Julgador é obrigado a conhecer.

11- O critério seguido pela sentença de contabilizar tudo quanto foi processado ao A. sob a designação genérica de «horas extra» (que apressada e erradamente qualificou como “trabalho suplementar”) e do acréscimo por ocasional trabalho nocturno acima das 30 horas mensais no período entre as 20h e as 7h para, sem mais, concluir pela regularidade e periodicidade das prestações é arbitrário e insustentável, quer porque a unidade de tempo a que se reporta essa pretensa periodicidade, regularidade varia consoante as prestações identificadas por uma série de discrepantes Códigos Informáticos, quer porque, a haver necessidade de considerar uma unidade de tempo para efeitos de determinação da regularidade e periodicidade das prestações em apreço, tal unidade de tempo teria que ser o ano completo (12 meses), em conformidade com a regra estabelecida na lei sobre a retribuição variável (art. 252º nº 2 do CT) à qual o próprio A. se reporta no petitório.

12- Tivera o Mmº Juiz da 1ª instância seguido este critério, e, mesmo na errada lógica da douta sentença, só poderiam ser hipoteticamente tidos em conta os anos em que o trabalhador recebeu aquelas verbas nos doze meses do ano.

13- Mas, o maior erro na qualificação como prestação retributiva das verbas processadas com a designação de «horas extra» e de «acréscimo por trabalho nocturno» está em o Tribunal de 1ª Instância ter pecado por defeito, uma vez que lhe cabia avaliar também a existência dos demais requisitos essenciais do conceito técnico-jurídico de retribuição (V. nº 7 supra), o que, pura e simplesmente, foi ignorado.

14- As discrepantes atribuições remuneratórias processadas sob a designação genérica de «horas extra», nos casos em que tal designação abarca aquela pequena parcela em que «horas extra» possa significar trabalho suplementar, não são uma contrapartida do trabalho contratado, mas sim uma compensação específica pela maior penosidade física associada à exigência de maior trabalho para além da carga horária normal contratualmente estabelecida. Por outro lado, se, no nosso quadro legislativo, o recurso ao trabalho suplementar é sempre excepcional, no caso «sub judice» (em que trabalhadores TMA estão sujeitos ao regime de turnos rotativos), a possibilidade de prestação de trabalho para além do período normal de trabalho diário (isto é, fora dos limites do turno) surge forçosamente como ocasional, o que afasta ainda mais a ideia da prestação de trabalho suplementar com regularidade e periodicidade.

15- Para além do infundado e precipitado critério de que se socorreu o Mmº Juiz, a parte das «horas extra» que possa significar “trabalho suplementar” nunca pode integrar o conceito de retribuição propriamente dita, não só porque o que ao trabalhador é pago não é contrapartida do trabalho contratado, mas também porque não é configurável como prestação regular e periódica; de resto, ainda que houvesse regularidade e periodicidade – que não há –, este pressuposto só ganharia relevância se estivéssemos perante o correspectivo da actividade laboral a que o trabalhador se obrigou.

16- Acresce que, ao equiparar “subsídio” de «horas extra» à remuneração por trabalho suplementar, a sentença da 1ª Instância alargou desmesuradamente o âmbito do trabalho suplementar, que a lei delimita em termos restritivos.

17- Trata-se de vantagens patrimoniais irregulares atribuídas ao trabalhador no campo das condições específicas da execução do trabalho, as quais, pelo seu carácter aleatório e imprevisível, não têm aptidão para gerar expectativas de recebimento: tanto a sua atribuição como o seu montante dependem de circunstâncias acidentais e fortuitas. 

18- O A. alegou que os abonos (que absurdamente faz reconduzir a uma componente variável da sua retribuição) foram por ele percebidos de forma regular, periódica e constante (vejam-se, por exemplo, os artºs 7º, 8º, 26º, 27º, 36º e 44º da PI), traduzida no pretenso pagamento ao A., regular e habitualmente, “onze (11) meses” (V. artºs 8º da PI), que o A. “sempre recebeu, todos os meses” (V. artº 27º da PI) – mas tal não é verdade, como o regista a matéria de facto dada como provada na própria sentença da 1ª Instância. Nem eram contrapartida do trabalho, nem se traduziram – ao contrário do alegado pelo A. – numa prestação mensal, regular e periódica.

19- É inaceitável a estranha ideia do A. de computar a pretensa retribuição “variável” (artºs 9º a 14º, 27º, 38º, 40º, 41º e 44º da PI) adicionando à toa parcelas de cada espécie de abono recebido em apenas alguns meses do ano, para depois dividir a soma assim conseguida pelo número de meses do calendário, exibindo com esta insólita operação uma suposta média mensal virtual, que jamais a média mensal real.

20- Sobretudo no que respeita àquilo que o A. chama “subsídio” de «horas extra», trata-se de uma rubrica genérica dos recibos mensais de vencimento que agrupa várias situações dissemelhantes de prestação de trabalho para lá do eventual e não provado trabalho suplementar, todas elas de natureza excepcional, como aliás o é o próprio trabalho suplementar, o qual, nos termos da lei (artº 86º da LCT) e das convenções colectivas aplicáveis ao caso, não constitui, em regra, retribuição.

21- O regime convencional que tem vindo a governar a relação “sub judice” obsta a que o pagamento feito sob a designação global de «horas extra» seja qualificado como retribuição, quando é certo que tal pagamento emerge das mais diversas ocorrências (cada qual com o seu Código Informático) e não corresponde a uma única atribuição do empregador. Em boa verdade, a rubrica «horas extra» com uma variedade de Códigos Informáticos é, do ponto de vista jurídico, erroneamente unificadora, se entendida no sentido de abranger realidades díspares e de carácter tendencialmente não retributivo, quando pela forma como está configurada, é evidente que foi concebida, por técnicos de programação informática, apenas para ser utilizada nas operações de cálculo e processamento informático de vencimentos, estendendo-se a respectiva utilização até para o processamento de  meras penalidades ou compensações (como a consignada no ponto 22 dos fundamentos de facto). 

22- Perante este regime, a percepção pelo A. (em dado mês e até em vários meses de um ano) de determinadas quantias sob a designação abrangente de «horas extra» não permite, só por si, concluir, como o fazem o A. e a sentença da 1ª Instância, pela prestação reiterada (e imaginariamente habitual) de trabalho suplementar.

23- Na verdade, a simples leitura das 452 Notas de Vencimentos juntas aos autos evidencia a diversidade e a imprevisibilidade dos motivos que levaram à feitura dessas apelidadas «horas extra», motivos esses revelados por Códigos Informáticos diferenciados que também indicam as diferentes percentagens de acréscimo que correspondem a cada uma dessas situações de facto/motivos: HX02 – 50%; HX03 – 75%; HX04 – 100%; e HX06 – 200%. Tendo em conta que o que acaba de ser dito está detalhadamente regulamentado nas convenções colectivas aplicáveis, não se pode cair no facilitismo de medir tudo pela mesma rasa para concluir que de horas suplementares se trata exclusivamente.

24- As mesmas 452 Notas de Vencimentos mais evidenciam uma clara irregularidade do pagamento das ditas «horas extra», também no aspecto temporal ou de periodicidade, havendo, em cada ano, meses em que a tal título não houve sequer pagamentos.

25- O grosso das chamadas «horas extra» corresponde, realmente, a trabalho normal em dia feriado[5], sabido que, na laboração contínua em regime de turnos rotativos, os feriados (tal como o sábado ou o domingo) são dias normais de trabalho para quem calha ser abrangido pela escala de serviço. A única atribuição que decorre da contratação colectiva para quem é escalado para trabalhar em dia feriado é o pagamento do acréscimo de 100%. Tecnicamente chama-se a isto pagar com majoração o trabalho normal em dia feriado. Como terá, então, sido possível à sentença da 1ª Instância amalgamar este trabalho normal com trabalho suplementar?!

26- No que respeita ao conceito de retribuição as noções gerais do artº 82º da LCT e do artº 249º do CT não podem sobrepor-se às normas específicas que, ao abrigo do princípio da autonomia colectiva, são chamadas a reger, em cada sector de actividade, a matéria retributiva, mormente nos períodos curtos de ausência do trabalho (pense-se, por exemplo, nos dias de férias, de faltas injustificadas ao trabalho, de dias de não trabalho por adesão à greve), devendo nestes casos prevalecer um conceito abstracto de «retribuição modular», cuja validade temporal (seja para abonar seja para descontar) se restringe a esses mesmos períodos curtos de ausência do trabalho.

27- De harmonia com as regras dos artºs 252º, nº 1, e 264º do CT, a retribuição é calculada em função do número de horas de trabalho (tempo de trabalho), com recurso à seguinte fórmula: (retribuição mensal x 12 meses) : (52 semanas x período normal de trabalho). Assim, para uma retribuição mensal de 1.000,00€, a retribuição horária será de 5,77€, a retribuição diária de 46,16€ e a retribuição semanal de 230,80€. A referida fórmula de cálculo corresponde à do artº 29º da LFFF e do artº 264º do CT.

28- Desta fórmula resulta que a bitola pela qual se determina a retribuição não tem em conta os tempos de descanso semanal.

29- O que ela permite é a fixação do valor da retribuição horária e, a partir desta, a retribuição diária (por dia útil). A primeira serve, por exemplo, para determinar o acréscimo por trabalho suplementar e, simultaneamente, para determinar o valor do desconto na retribuição em razão dos atrasos; a segunda serve para determinar a retribuição de cada dia útil do período de férias e, simultaneamente, para descontar cada dia de faltas injustificadas ou de ausência ao trabalho por adesão à greve.

30- Tal significa que o generoso empolamento da retribuição pelo critério da sentença da 1ª Instância é uma faca de dois gumes:  tanto pode “inchar” a retribuição para o efeito positivo do seu recebimento, como pode “inchá-la” para o efeito negativo do desconto, por exemplo no caso de o trabalhador ter aderido à greve.

31- Num caso e noutro o “padrão retributivo” (definido pelos artºs 82º da LCT e 249º do CT) a ter em conta terá de ser precisamente o mesmo, isto é, o aferido pela predita fórmula da lei. 

32- Acresce que o aumento do volume da retribuição mediante uma indevida injecção dos apelidados “subsídios” de «horas extra» e de “trabalho nocturno” privilegiaria alguns trabalhadores dando-lhes retribuição e subsídio de férias e subsídio de Natal superiores, o que seria contrário às regras de igualdade retributiva [artº 59º, 1, a) da CRP e artº 263º do CT], podendo-se chegar ao ponto de (a título de retribuição e subsídio de férias e subsídio de Natal) alguns subordinados ganharem mais do que a respectiva chefia, envolvendo uma insólita inversão do posicionamento na escala salarial.

33- Aqui fica mais uma reflexão a confirmar que os caminhos trilhados pela sentença da 1ª Instância não podem, por todas as razões já expostas, servir de parâmetro retributivo.  

34- Em face de todo o exposto, merece ser totalmente confirmado o douto Acórdão recorrido, de cujo teor resulta, com toda a evidência, que a sentença da 1ª Instância violou, entre outras, as seguintes normas jurídicas:

 

a) O artº 56 da Constituição da República Portuguesa

Þ  O Mmº Juiz a quo violou o princípio da autonomia da contratação colectiva com a eficácia que lhe é garantida pelo artº 56º, nº 3, da Constituição da República Portuguesa, estando, por isso, a sentença da 1ª Instância ferida de inconstitucionalidade que a Ré expressamente argui para todos os devidos e legais efeitos.

b) Os arts. 82º da LCT e 249º do CT 

Þ pois ao decidir como decidiu, aplicando um critério que não se sujeita a regras para balizar quantitativamente o conceito de habitualidade, preteriu, injustificadamente, as normas constantes das convenções colectivas sucessivamente aplicáveis (por força e nos termos da própria lei geral);

Þ de tais normas resulta que a qualificação de uma prestação como retribuição pressupõe que, em conformidade com o respectivo regime, constitua contrapartida do trabalho, seja uma prestação mensal, fixa, regular e periódica e corresponda a uma das enumeradas na cláusula referente a componentes da retribuição;

Þ nada disto sucedia, quer quanto à remuneração das chamadas “horas extra”, quer quanto ao “acréscimo remuneratório por trabalho nocturno”, que no sistema dos IRCTs aplicáveis claramente não eram qualificáveis como retribuição. 

c) Os arts. 90º da LCT e 265º do CT

Þ porque, existindo no caso IRCTs aplicáveis, os quais estabeleciam critérios claros quanto à qualificação como retribuição das prestações em apreço, a sentença não os considerou;

Þ porque, quando existem esses critérios, o julgador não tem competência para a eles se substituir;

Þ e ainda porque, na solução casuística por que enveredou, se serviu de um critério arbitrário, contrariando o disposto nas referidas normas, que mandam atender à “prática da empresa e aos usos do sector”.

d) O regime convencional relativo às “horas extra” e ao acréscimo de trabalho nocturno constante dos instrumentos sucessivamente aplicáveis

Þ porque assimila, sem mais, horas “extra” e trabalho suplementar, bem como o acréscimo por trabalho nocturno e remuneração do trabalho nocturno, ignorando a especificidade destes abonos e desconsiderando a respectiva regulamentação, com desrespeito do próprio critério geral do art. 86º da LCT.

e) Os arts. 82º da LCT e 249º do CT

Þ pois ao determinar a natureza retributiva dos abonos de “horas extra” e dos “acréscimos por trabalho nocturno” com base numa noção “quantitativa” de “habitualidade”, preteriu os critérios legais de regularidade e periodicidade;

Þ ou seja, utilizou um critério diverso do que estabelece a lei, sem que, contudo, tal opção  correspondesse aos casos nela admitidos (norma convencional, usos).

f) Os arts. 82º da LCT e 1º, nº 2, do DL nº 88/96, bem como neste ponto específico novamente o princípio da autonomia colectiva, constitucionalmente consagrado (art. 56º da CRP): 

Þ ao não aplicar ao cálculo dos subsídios de Natal vencidos entre 1978 e 2003 as normas dos sucessivos instrumentos que vinculavam a TAP e os seus TMA (e que definiam o que deveria considerar-se retribuição mensal para tal efeito, excluindo outras prestações neles previstas, como os vários abonos a que respeita a pretensão do A.);

Þ porque antes do DL nº 88/96, de 3 de Junho, radicando a atribuição do “13º mês” na contratação colectiva, era a esta que competia definir qual o respectivo montante bem como a sua base de cálculo;

Þ e porque mesmo após a entrada em vigor do DL nº 88/96, de 3 de Junho, que deixou imprejudicada a aplicação da contratação colectiva – mesmo anterior - que regulasse especificamente o subsídio de Natal (art. 1º, nº 3), continuava a ser esta – caso existisse – a definir qual o respectivo montante, bem como a sua base de cálculo.

g) Os arts. 82º da LCT e 249º do CT, bem como, novamente, o princípio da autonomia colectiva, constitucionalmente consagrado (art. 56º da CRP): 

Þ ao não aplicar ao cálculo da retribuição e subsídio de férias vencidos desde 1978 as normas dos sucessivos instrumentos que vinculavam a TAP e os seus TMA (e que definiam o que deveria considerar-se retribuição mensal para tal efeito);

Þ pois no sistema dos AE/RS, sempre ficariam excluídas do cálculo da retribuição e subsídio de férias outras prestações neles previstas – como os vários abonos a que respeita a pretensão do Autor;

Þ o princípio de ser devido ao trabalhador no período de férias a retribuição que ele receberia “se estivesse em serviço efectivo”, assenta no conceito abstrato de retribuição, i.e., referido a um “padrão” que afasta da sua base de cálculo prestações – como o subsídio de transporte, subsídio de disponibilidade, acréscimo por trabalho nocturno e «horas extra» – dependentes, quanto à sua atribuição e montante, da ocorrência de pressupostos excepcionais ou não normais; 

Þ acresce que nenhum dos referidos abonos, pelas suas particularidades, patentes na respectiva regulamentação colectiva, reveste tais características, pelo que, mesmo não sendo expressamente excluídos desse cômputo pelo regime convencional que os cria, ainda assim sempre seriam de considerar excluídos por força dos princípio que enformam o regime legal aplicável.

h) Os arts. 6º da LFFF e 255º do CT : 

Þ ao considerar abrangidos na base de cálculo da retribuição e subsídio de férias os denominados “subsídios” por “horas extra” e por “trabalho nocturno”;

Þ porque o art. 6º da LFFF e o art. 255º, nº 1, ao referirem-se à retribuição que os trabalhadores receberiam “se estivessem em serviço efectivo”, referem-se a um conceito de retribuição modular, abstracta, um padrão de cálculo[6] que só abrange contrapartidas do trabalho, regulares e periódicas, sendo que nenhum dos abonos dos autos, pelas suas particularidades, patentes na regulamentação convencional, reveste tais características, pelo que são de considerar excluídos da previsão destas normas;

Þ quanto ao art. 255º, nº 2, do CT, não parece que as “demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico de prestação do trabalho” abranjam estes subsídios de origem convencional, estreitamente associados, na sua percepção e montante, a um desempenho em circunstâncias “não normais” ou mesmo excepcionais e não à normal prestação de trabalho e às específicas contingências que quotidianamente a rodeiam.

Pede-se assim que se confirme o acórdão recorrido.

Subidos os autos a este Supremo Tribunal, foram os mesmos com vista à Ex.mª Procuradora Geral Adjunta que emitiu parecer no sentido de se considerar retribuição as atribuições patrimoniais cujo pagamento ocorre todos os meses de actividade do ano, no seguimento da orientação jurisprudencial deste Supremo Tribunal. Como porém a matéria apurada nos autos não contém estas referências, sustenta-se que os autos sejam remetidos ao Tribunal recorrido para ampliação da matéria de facto, julgando-se a causa nos termos do artigo 730º nº 1 do CPC.

E corridos os vistos legais, cumpre decidir.

2----

 

Para tanto, as partes acordaram na seguinte materialidade:

Da petição inicial:

1) O A. foi admitido para prestar serviço, por conta e sob autoridade e orientação da Ré, em 22/10/1973;

2) Ao serviço da Ré se manteve, ininterruptamente, até 28/02/2009, data em que se reformou;

3) É empregado da Ré, com o número de companhia, 12757/1, pertencendo ao grupo profissional de Técnico de Manutenção de Aeronaves;

4) É sindicalizado e filiado no SITEMA, Sindicato Técnico de Manutenção de Aeronaves;

5) Exerceu as funções de Técnico de Manutenção de Aeronaves, desde a data da sua admissão até 28/02/2009;

6) A Ré organizou sempre, e ainda organiza o trabalho, por escalas de serviço, atribuídas, na sua totalidade, por equipamentos e disponíveis para consulta no local conveniente, com a antecedência mínima de sete (7) dias;

7) Nos anos que medeiam entre 1974 e até à data da entrada da p.i., o autor recebeu da ré diversas quantias pagas sob a epígrafe/denominação “Horas extras” “Horas Noct/turnos”, “Subsídio de Disponibilidade TMA” e subsídio de "TRANSPORT - PT" dando-se por reproduzidos os docs. 1 a 452 juntos com a petição inicial;

8) Em todo o período supra indicado o Autor gozou férias, recebeu a respectiva retribuição e subsídio de férias, e subsídio de Natal, sem incorporação nos mesmos das rubricas indicadas no ponto 7) dos Factos Provados;

Da contestação:

9) O trabalho normal do A. era prestado em regime de turnos rotativos;

10) Na cadência de horários em regime de turnos rotativos, cada turno termina o seu trabalho precisamente no momento em que o outro turno inicia a sua actividade;

11) Por vezes, num ou noutro feriado, verificava-se falta de pessoal em virtude de este ou aquele trabalhador escalado aproveitar o feriado para meter férias, dando lugar a falhas nas equipas, que tinham de ser colmatadas por elementos de reforço cuja actividade era paga pela ré como trabalho suplementar;

12) As horas prestadas a mais no final do turno justificavam-se por um atraso imprevisto do colega no início de turno seguinte, um seu impedimento de ocasião por doença ou para a prestação de assistência à família ou, para concluir uma concreta tarefa que o A. tinha entre mãos e em que não se justificava, nem se recomendava, que transitasse para outro colega;

13) Os abonos identificados pelo A. através da rubrica denominada “horas extra”, que consta das Notas de Vencimentos (Docs. 1 a 468 juntos com a PI) podiam corresponder a uma das seguintes situações de facto: trabalho prestado em dias úteis fora do horário normal; trabalho prestado em dia de descanso semanal ou obrigatório ou complementar; trabalho prestado em dia de descanso compensatório, situações essas remuneradas como trabalho suplementar mediante a aplicação ao A. dos Códigos HX02, HX03 e HX06 que davam origem a acréscimos diferentes de 50%, de 75% e de 200%, respectivamente;

14) Quando o trabalho normal do A. decorrente da escala de turnos calhava em dia feriado a ré pagava um acréscimo de 100%, também processado ao A. sob a designação genérica de “horas extra” já referida no art. 25, modelada em termos informáticos, com a simultânea utilização do Código Informático HX04. A carga horária normal do autor era de 7,5h;

15) Os diversos Códigos Informáticos supra referidos e utilizados para o conjunto das diversas situações englobadas nas “horas extra” são reportadas ao trabalho realizado no mês anterior ao do processamento;

16) Conforme registos do A. no sistema de ponto (disponível a partir de 1994), constata-se que estando escalado para trabalhar segundo o seu regime normal de turnos:

a. No ano de 1994, o A. prestou a sua actividade nos dias 1 de Janeiro, 15 de Fevereiro, 25 de Abril, 1 de Maio, 10 de Junho, 15 de Agosto, 1 de Novembro, 1, 8 de Dezembro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

b. No ano de 1995, o A. prestou a sua actividade nos dias 1 de Janeiro, 28 de Fevereiro, 14 e 25 de Abril, 1 de Maio, 10 e 13 de Junho, 5 de Outubro, 1 de Novembro e 1, 8 de Dezembro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

c. No ano de 1996, o A. prestou a sua actividade nos dias 1 de Janeiro, 20 de Fevereiro, 10 e 13 de Junho, 15 de Agosto, 5 de Outubro, 1 de Novembro e 1, 8 e 25 de Dezembro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

d. No ano de 1997, o A. prestou a sua actividade nos dias 1 de Janeiro e 11 de Fevereiro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

e. No ano de 1998, o A. prestou a sua actividade no dia 5 de Outubro, dia este que foi feriado e foi pago pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

f. No ano de 1999, o A. prestou a sua actividade nos dias 16 de Fevereiro, 3, 10 e 13 de Junho, 5 de Outubro, dia este que foi feriado e foi pago pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

g. No ano de 2000, o A. prestou a sua actividade nos dias 21 de Abril, 10, 13 e 22 de Junho, 5 de Outubro, 1 de Novembro e 1 de Dezembro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

h. No ano de 2001, o A. prestou a sua actividade nos dias 27 de Fevereiro, 10 e 14 de Junho, 1 de Novembro e 1, 8 e 25 de Dezembro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

i. No ano de 2002, o A. prestou a sua actividade nos dias 1 de Janeiro, 12 de Fevereiro, 1 e 30 de Maio, 10 de Junho, 15 de Agosto, 1 de Novembro e 1, 8 Dezembro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

j. No ano de 2003, o A. prestou a sua actividade nos dias 1 de Janeiro, 18 de Abril, 1 de Maio, 10, 13 e 19 de Junho, 15 de Agosto, 5 de Outubro, 1 de Novembro e 1, 8 e 25 de Dezembro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

k. No ano de 2004, o A. prestou a sua actividade nos dias 1 de Janeiro, 24 de Fevereiro e 25 de Abril, 1 de Maio, 10 e 13 de Junho, 15 de Agosto, 5 de Outubro, 1 de Novembro e 1, 8 e 25 de Dezembro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

l. No ano de 2005, o A. prestou a sua actividade nos dias 1 de Janeiro, 8 de Fevereiro, 25 e 27 de Março, 25 de Abril, 1 e 26 de Maio, 13 de Junho, 5 de Outubro, 1 de Dezembro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

m. No ano de 2006, o A. prestou a sua actividade nos dias, 13 e 15 de Junho, 5 de Outubro, dias estes que foram feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

n. No ano de 2007, o A. prestou a sua actividade nos dias, 10 e 13 de Junho, 15 de Agosto, 5 de Outubro, 1 de Novembro e 1 e 25 de Dezembro, dias estes que são feriados e foram pagos pela R. com acréscimo de 100%, sob a dita rubrica genérica “horas extra” Código HX04;

17) A partir de 1985 passou a prever-se que aos TMAs que recebam subsídio de turno, fosse pago, com acréscimo de 25%, o trabalho nocturno normal, quando o exercício da actividade excedesse 30 horas em cada mês prestadas entre as 20 e as 7 horas;

18) Tal acréscimo convencional passou a ser de 100% a partir de 1993. E cada hora normal acima de 30 horas em cada mês, realizada entre as 20h e as 7h (período nocturno) passou a ser remunerada pelo dobro (ou seja, com o aumento de 100%) desde 1993;

19) Quando, no cumprimento do seu horário normal de turnos rotativos em H24, acontecia o A. ter que prestar trabalho em turno nocturno, as horas que prestasse entre as 20h00 e as 07h00 (além de darem lugar ao pagamento de subsídio de turno) eram remuneradas com o mencionado acréscimo convencional de 100%, na parte que eventualmente excedesse em cada mês o plafond de 30 horas;

20) O “Subsídio de Disponibilidade TMA” foi um aditivo pecuniário aplicado na ré entre Julho de 1994 e Julho de 2001 (mês e ano em que foi extinto), regulamentados na convenção colectiva;

21) Durante todo o período a que se ateve a petição inicial (Janeiro de 1974 a Dezembro de 2007), o A. prestou a sua actividade ininterruptamente como Técnico de Manutenção de Aeronaves.

22) Quando o trabalhador no turno da noite não podia interromper o tempo de trabalho para a tomada de refeição (ceia), haveria um abono em substituição da refeição que a empresa não lhe pôde fornecer, abono esse de montante equivalente a uma hora suplementar, mas que não representava trabalho.

3----

E decidindo:

A 1ª instância teve que apreciar a questão posta pelo A que reclamava da R diferenças nas férias, nos subsídios de férias e de Natal que lhe foram pagos desde 1974 e até ao ano de 2007, em virtude  da empresa não ter incluído nos valores que lhe pagou as médias anuais da remuneração auferida por “subsídio de horas extras”, “subsídio de trabalho nocturno”, “subsídio de trabalho TMA” “e subsídio de transporte”.
Tendo a acção sido julgada parcialmente procedente, condenou-se a empregadora a pagar ao Autor o valor das diferenças de remunerações complementares referentes aos montantes não incluídos na remuneração de férias e subsídio de férias, atinentes a subsídio de horas extra e subsídio de trabalho nocturno; e condenou-se ainda a Ré a pagar ao Autor o valor das diferenças de remunerações complementares referentes aos montantes não incluídos no subsídio de Natal até Novembro de 2003, atinentes a subsídio horas extra e subsídio de trabalho nocturno, tudo acrescido de juros de mora, absolvendo-se a R do restante pedido.
Desta sentença, apenas a R recorreu, pelo que temos de concluir desde já, que transitou em julgado a decisão da primeira instância, na parte em que, não reconhecendo carácter retributivo aos subsídios de trabalho TMA e aos subsídios de transporte, destes absolveu a R.
Por outro lado, também temos de considerar que transitou em julgado o segmento da decisão da primeira instância que não reconheceu ao A o direito a diferenças nos subsídios de Natal posteriores a Novembro de 2003.
           
            Por seu turno, a R apelou da sentença em virtude de não se ter conformado com a qualificação como retribuição das quantias que o A terá recebido a título de horas extra e subsídio por trabalho nocturno e sua integração nas quantias a receber nas férias, subsídio de férias e Natal, pretensão que foi acolhida no acórdão da Relação que considerou que aquelas atribuições patrimoniais não tinham carácter retributivo, com a consequente absolvição da R de todo o pedido.

            É agora o A que na revista sustenta que se reconheça carácter retributivo a estes valores por si recebidos a título de horas extra e subsídio por trabalho nocturno, devendo assim integrar a retribuição das férias e os montantes dos subsídios de férias e Natal.
            Pondo-se a questão nestes termos, vejamos então como decidir.
  
3.1---

            Dada a abrangência do pedido do recorrente, que abarca os anos de 1974 a 2007, constatamos que estiveram em vigor os seguintes regimes e que vão ser aplicáveis ao caso:

o Decreto-Lei n.º 49.408 de 24/11/1969, vulgarmente designado por Lei do Contrato de Trabalho (LCT);

o Decreto-Lei n.º 874/76 de 28-12, com as alterações introduzidas pelo Decreto- -Lei n.º 397/91 de 16-10, usualmente designada por Lei das Férias, Feriados e Faltas (LFFF);

 e ainda o Decreto-Lei n.º 88/96 de 03-07, normalmente conhecido por Lei do Subsídio de Natal (LSN).

Por outro lado, a partir de 1 de Dezembro de 2003, começou a vigorar o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003 de 27-08 (Código do Trabalho /2003), diploma que, revogando aqueles outros, estabeleceu, no entanto, no seu art. 8º n.º 1 que «sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes, ficam sujeitos ao regime do Código do Trabalho os contratos de trabalho e os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho celebrados ou aprovados antes da sua entrada em vigor, salvo quanto às condições de validade e aos efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente àquele momento».

Por isso, será este o regime a aplicar a partir de 1 de Dezembro de 2003, data em que entrou em vigor.

É certo que, em 12 de Fevereiro de 2009, foi aprovado, através da Lei n.º 7/2009, um novo Código do Trabalho, que revogando o de 2003, vigora desde 17 de Fevereiro de 2009.

No entanto, a sua regulamentação não abrange o presente caso, pois o pedido do A termina em 2007.

Além disso, tendo o A entrado ao serviço da R em 22/10/1973, onde integrava o grupo profissional de “Técnico de Manutenção de Aeronaves”, e sendo filiado no “SITEMA – Sindicato de Técnicos de Manutenção de Aeronaves”, também deveremos levar em consideração a seguinte contratação colectiva:

Acordo Colectivo de Trabalho (ACT/78) celebrado entre a TAP e diversos sindicatos representativos de trabalhadores seus e que foi publicado no BTE, 1ª Série n.º 20, de 21-05-1978, com Portaria de Extensão (PE) publicada no BTE, 1ª Série n.º 5, de 08.02.1979;

AE/94, publicado no BTE, 1ª Série n.º 28, de 29-07-1994;

AE/97, publicado no BTE, 1ª Série n.º 46, de 15-12-1997;

e ainda o AE/2005, publicado no BTE, 1ª Série n.º 44, de 29-11-2005.

Acresce que, na sequência da declaração da TAP em situação económica difícil entre 1981 e 1994, as relações laborais entre esta e os seus trabalhadores foram reguladas por um chamado Regime Sucedâneo (RS), aprovado por despacho conjunto dos Ministros do Trabalho e dos Transportes e Comunicações, de 24-04-1981, publicado no D.R. 2ª Série de 12-08-1981, a que se seguiu o resultante do despacho conjunto dos Secretários de Estado dos Transportes e do Trabalho de 6/5/1985, publicado no DR, II série de 15/5/85; e por último o resultante do despacho conjunto nº A-16/93-XII, dos Ministros das Finanças, dos Transportes e Comunicações e do Emprego e Segurança Social de 30/3/93, publicado no DR, II série de 31/3/93.

 

 É, pois, todo este conjunto de diplomas, com excepção do referido Código do Trabalho de 2009, que constitui o regime jurídico que deveremos ter em conta na apreciação das questões suscitadas pelo A no presente recurso.

        

Ora, é certo que entre 1974 e a data da entrada desta acção (Dezembro de 2007), o autor recebeu da ré diversas quantias pagas sob a epígrafe/denominação “Horas extra”, “Horas Noct/turnos”, “Subsídio de Disponibilidade TMA” e subsídio de "TRANSPORT - PT".

No entanto, na determinação do valor da retribuição paga nas férias, nos subsídios de férias e nos subsídios de Natal, a R não integra o valor destes complementos remuneratórios.

Agora, apenas nos interessa determinar se os valores recebidos pelo A, a título de horas extra e subsídio por trabalho nocturno, devem integrar tal retribuição.

            Vejamos então.

3.1.1---

Quanto ao subsídio de Natal temos de dizer que o mesmo só foi consagrado, com carácter geral, com a entrada em vigor do DL nº 88/96 de 3/7 (LSN).

Por isso e independentemente da qualificação a dar aos valores recebidos e reclamados pelo A, a título de horas extra e subsídio por trabalho nocturno, o certo é que, até à entrada em vigor desta Lei, o subsídio de Natal (ou 13º mês como também é vulgarmente designado) tem a sua fonte na contratação colectiva, por inexistir disposição legal da LCT ou doutro diploma que impusesse a obrigação do seu pagamento a todos os trabalhadores subordinados.

Assim sendo, tendo a sua atribuição resultado da contratação colectiva, nomeadamente da cláusula 85ª do ACT/78 e do artigo 131º do RS de 1985, a esta competia também definir as componentes retributivas que o integravam.

Ora, resultando desta cláusula 85ª e do artigo 131º do RS que tal subsídio corresponde a um mês de retribuição, a satisfazer na altura do Natal, esta devia corresponder à efectivamente auferida no mês do seu vencimento, a qual compreende a remuneração de base mensal e todas as prestações mensais fixas, regulares e periódicas”[7], nestas se incluindo apenas as remunerações constantes da tabela salarial, as anuidades, a remuneração por isenção de horário, o subsídio de turno e o subsídio por condições especiais de trabalho, (cláusula 87ª do ACT de 1978, regime que se manteve na contratação colectiva subsequente e nos RS)[8].

Donde termos de concluir que até à entrada em vigor do Decreto-Lei nº 88/96, o pedido do A quanto a diferenças no subsídio de Natal é absolutamente insubsistente, qualquer que seja a qualificação que se venha a atribuir às componentes retributivas reclamadas pelo recorrente, pois a empresa pagou-lhe de acordo com o que estipulava a contratação colectiva e mais tarde o regime sucedâneo.

            Efectivamente, reconhecendo o próprio A que todos os anos recebeu subsídio de Natal, cujo montante era composto pela parte fixa da retribuição, ou seja a remuneração base, as anuidades, a remuneração por isenção de horário de trabalho, o subsídio de compensação especial de trabalho e o subsídio de turno, nada mais a R lhe tinha de pagar, tanto mais que a contratação colectiva e os regimes sucedâneos, expressamente consideravam que não tinham carácter retributivo os restantes “abonos” pagos ao trabalhador (v.g.subsídio de refeição, ajudas de custo, despesas de transporte, subsídio para educação especial, comparticipação para despesas de infantário, complemento de abono de família e subsídio para material escolar, conforme resultava da cláusula 84ª do ACT/78, orientação que se manteve nos instrumentos de regulamentação colectiva e nos regimes sucedâneos que lhe sucederam).

            Assim, nada lhe é devido a título de diferenças nos subsídios de Natal até à entrada em vigor do DL nº 88/96. 

3.1.2---

Vejamos agora qual a solução a adoptar a partir da vigência deste diploma.

 

Colhe-se do preâmbulo do diploma que embora a generalidade das convenções colectivas já tenha instituído o direito ao subsídio de Natal, o mesmo não está ainda consagrado em alguns sectores de actividade e para certos grupos profissionais.

Por esse motivo, o acordo de concertação social, celebrado entre o Governo e os parceiros sociais em 24 de Janeiro de 1996, previa a sua generalização por via legislativa a todos os trabalhadores, competindo assim àquele diploma proceder à concretização desta medida.

Mais se referiu no preâmbulo que “em conformidade com alguns comentários feitos ao projecto, é necessário salvaguardar a aplicabilidade das convenções colectivas que instituíram o subsídio de Natal e o regulam especificamente, tendo em conta que o objectivo do diploma não é o de estabelecer um regime legal imperativo desta prestação, mas assegurar a atribuição do correspondente direito aos trabalhadores que dele não são titulares, em conformidade com as tendências reveladas pela contratação colectiva”.    

Nesta linha, estabeleceu-se no artigo 1º nº 1 que o diploma era aplicável aos trabalhadores vinculados por contrato de trabalho (incluindo os trabalhadores rurais, a bordo e de serviço doméstico), exceptuando-se os trabalhadores abrangidos por contratação colectiva que já regula especificamente o subsídio de Natal (nº 2), a quem se aplicaria o diploma se a contratação colectiva estabelecesse um subsídio inferior a um mês de retribuição (nº 3), caso em que passaria a ter direito a um mês (artigo 2º nº 1).

Concluímos assim que aquele diploma tornou obrigatório o pagamento do subsídio de Natal à generalidade dos trabalhadores, mas com carácter marcadamente supletivo[9]

Face a este contexto, temos de concluir que depois da entrada em vigor deste diploma, nada impedia a R de pagar um subsídio de Natal que abrangia a parte fixa da retribuição, (ou seja o vencimento base, anuidades, subsídio de compensação especial de trabalho e subsídio de turno) conforme estabelecia a contratação colectiva que negociou com o sindicato do A[10], pois a lei salvaguardou expressamente os regimes já regulados especificamente por esta.

E nem se invoque aqui o princípio do tratamento mais favorável, constante do artigo 13º da LCT, pois foi intenção expressa do legislador salvaguardar a regulamentação advinda dos instrumentos de regulamentação colectiva que especificamente previssem tal subsídio, bem como as componentes remuneratórias que integrassem a retribuição correspondente, e que inequivocamente exprimiu tal desiderato na primeira parte do nº 2 daquele artigo da LCT.

Concluímos assim que, quanto aos subsídios de Natal nada é devido ao trabalhador, pois a R pagou-lhe os subsídios de Natal vencidos na vigência do DL nº 88/96, de acordo com as normas estabelecidas na contratação colectiva do sector, conforme permitia este diploma.

Efectivamente, o legislador partiu do pressuposto de que a contratação colectiva constitui a fonte privilegiada para regular as relações laborais entre empregadores e trabalhadores, seja qual for o sector de actividade económica, o que fez em homenagem ao valor da liberdade sindical, por um lado, por força do qual os trabalhadores têm a faculdade de se organizarem, tendo em vista a melhor defesa dos seus direitos e interesses (art. 55º da CRP) e em homenagem ainda ao direito à contratação colectiva, consagrado no art. 56º n.º 3, por força do qual compete às associações sindicais o direito de exercer a contratação colectiva, direito que é garantido nos termos da lei, a quem cabe ainda estabelecer as regras respeitantes à legitimidade para celebração de convenções colectivas de trabalho, bem como as respeitantes à eficácia das respectivas normas – nº 4.

Desempenhando, neste caso, a contratação colectiva um papel essencial na regulamentação dos direitos e deveres subjacentes ao relacionamento laboral das partes, salvaguardou-se a sua prevalência neste aspecto específico do direito ao subsídio de Natal.

E assim sendo, improcede a pretensão do recorrente quanto a diferenças nos subsídios de Natal, pois o DL nº 88/96 vigorou até à entrada em vigor do Código de Trabalho de 2003, sendo de notar que depois de Novembro de 2003 a própria sentença da 1ª instância não lhe reconheceu quaisquer direitos quanto a este pedido (tendo transitado em julgado nesta parte).

3.2---

  Quanto às diferenças nas férias e nos subsídios de férias: 

As férias correspondem a um período de tempo em que os trabalhadores têm o direito de não trabalhar, mantendo contudo o direito à remuneração.

Trata-se dum direito garantido pela nossa Constituição como um direito de todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião e convicções políticas ou ideológicas, conforme resulta do seu artigo 59º, nº 1 e alínea d), in fine.

Mas constitui um direito recente dos trabalhadores portugueses, tendo sido consagrado, pela primeira vez, na lei 1952 de 10/3/37, diploma que regulamentou pela primeira vez o contrato de trabalho em Portugal.

Por outro lado, o fundamento deste direito nem sempre foi o mesmo ao longo destas sete décadas de regulamentação do contrato de trabalho.

Efectivamente, no domínio da referida lei, este direito tinha características duma recompensa ao trabalhador, uma contrapartida salarial pelo bom e efectivo serviço prestado, desde que ocupasse determinada posição na estrutura da empresa e esta possuísse uma certa dimensão económica[11].

No entanto, com a regulamentação do contrato de trabalho introduzida pelo DL nº 47 032 de 27/5/66, o fundamento deste direito é profundamente alterado em relação ao regime anterior, tendo-se acompanhado aqui a evolução do direito laboral doutros países europeus, onde se entendia que o direito ao gozo dum determinado período de férias não podia estar subordinado a quaisquer requisitos, devendo ser assegurado a todos os trabalhadores pela simples condição de o ser, de molde a este poder refazer-se do desgaste físico e mental resultante da prestação de trabalho.

Era o regime que resultava do artigo 55º daquele último diploma legal, regime que passou para a LCT de 1969 (DL nº 49 408 de 29/11/69), onde apenas se exigia um mínimo de tempo de trabalho prestado para as férias vencidas no ano seguinte ao da admissão, e dependendo o direito a férias nos anos seguintes da mera existência do contrato de trabalho, conforme resultava do artigo 55º nºs 1, 2 e 3.

Com o advento do DL nº 874/76 de 28/12 e suas alterações constantes do DL nº 397/91 de 16/X, o direito a férias também não estava condicionado à assiduidade ou efectividade do serviço do trabalhador, conforme dispunha o artigo 2º, nº 2, salvo as situações integráveis no nº 2 do artigo 28º e no nº 2 do artigo 11º.

Por isso, constituía um direito resultante da mera existência do contrato de trabalho, devendo efectivar-se de modo a possibilitar a recuperação física e psíquica do trabalhador e a assegurar-lhe condições mínimas de disponibilidade pessoal, de integração na vida familiar e de participação social e cultural - artigo 2º/4.

Nesta linha, teve o legislador uma grande preocupação em garantir o seu gozo efectivo, conforme se colhe da forma como regula a situação de doença do trabalhador durante as férias (artigo 12º), na repressão da violação do direito a férias (artigo 13º), na proibição clara do exercício pelo trabalhador doutra actividade durante as férias (artigo 14º) e na consagração inequívoca do princípio da irrenunciabilidade deste direito do trabalhador - artigo 2º/4.

Quanto ao regime do CT 2003 (Lei 99/2003), o mesmo consta do artigo 211º e seguintes do Código do Trabalho, e corresponde, com algumas alterações, ao que fora consagrado pelo anterior e acima referido, correspondendo as férias a um direito de todos os trabalhadores, constitucionalmente consagrado – alínea d) do nº 1 do artigo 59º da CRP.

Por outro lado, deve efectivar-se de modo a possibilitar a recuperação física e psíquica do trabalhador e a assegurar-lhe condições mínimas de disponibilidade pessoal, de integração na vida familiar e de participação social e cultural, conforme proclama, no seguimento do regime anterior, o artigo 211º nº 2, constituindo portanto um período de tréguas na limitação de liberdade pessoal e de renúncia da disponibilidade de cada um que a prestação do trabalho implica.

Além disso, continua a consagrar-se que o seu gozo é irrenunciável, conforme impõe o artigo 211º nº 3 do CT, visando-se proporcionar ao trabalhador uma recuperação física e psicológica com vista à possibilidade de lhe proporcionar um período de repouso efectivo e eficaz em cada ano de serviço.

3.2.1---

Já dissemos que o CT só se aplica a partir de 1 de Dezembro de 2003, vigorando a LCT até 1 de Janeiro de 1977 (artigo 31º do DL nº 874/76) e depois desta data, este último diploma (que vigorou até 1/12/03).

Ora, a LCT não consagrava o direito a subsídio de férias, que só foi consagrado pela primeira vez, e com carácter geral, pelo artigo 6º nº 2 do DL nº 874/76.

Donde se conclui que em relação a 1974, 1975 e 1976, o pedido do A, quanto a diferenças nos subsídios de férias, não tem qualquer fundamento, pois sendo este direito estabelecido pela contratação colectiva a ela pertencia também a definição do respectivo montante, pois a lei geral nada dizia a este respeito[12].

Por outro lado e quanto ao direito a férias, resultava do artigo 57º da LCT que a sua duração era de seis dias úteis nos dois primeiros anos do contrato; de 12 dias úteis quando a antiguidade do trabalhador fosse de dois a dez anos; e de 18 dias úteis quando a antiguidade do trabalhador fosse superior a 10 anos.

Assim sendo, e considerando que o A tinha entrado ao serviço da R em 1973, temos de concluir que o regime da contratação colectiva era manifestamente mais favorável, pois teve direito a um mês de férias, conforme o próprio A alega, quando pela lei geral teria apenas direito a seis dias úteis em 1974 e 1975, e a doze dias úteis em 1976.

Sendo o regime da contratação colectiva mais favorável, quer em termos de duração das férias, quer quanto à respectiva retribuição, cujo montante era composto pela remuneração base, anuidades, subsídio de compensação especial de trabalho e subsídio de turno, conforme reconhece o recorrente, é a ela que temos de recorrer, ao abrigo do artigo 13º nº 1 e 2 da LCT.

Donde resulta também que o pedido do autor, respeitante a diferenças na remuneração das férias no período anterior a 1 de Janeiro de 1977, não tem qualquer fundamento.

3.2.2---

Quanto ao período entre 1 de Janeiro de 1977 e 1 de Dezembro de 2003:

Estabelecia o artigo 6º do Decreto-Lei n.º 874/76, de 28 de Dezembro que:

 “1. A retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo e deve ser paga antes do início daquele período.

2. Além da retribuição mencionada no número anterior, os trabalhadores têm direito a um subsídio de férias de montante igual ao dessa retribuição”.

Assim sendo, o problema da existência de diferenças salariais nas férias e nos subsídios de férias respeitantes a este período, passa fundamentalmente, pela interpretação do termo «retribuição» empregue pelo legislador naquele preceito.

Ora, estipulava o artigo 82.º, da LCT que:

1 - Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.

2 - A retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas feitas directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.

3 - Até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador.

Por outro lado, resultando do artigo 249.º do CT, que se considera retribuição «aquilo a que, nos ter do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho» (n.º 1), incluindo-se na contrapartida do trabalho «a retribuição base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie» (n.º 2), e que «até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador» (n.º 3), constatamos que não ocorrem diferenças assinaláveis entre os regimes da retribuição da LCT e do Código de Trabalho de 2003.

Deduz-se destes preceitos, que a retribuição é constituída pelo conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da actividade por ele desenvolvida, ou, mais rigorosamente, da força de trabalho por ele oferecida[13].

Assim, num primeiro momento, a retribuição, constituída por um conjunto de valores, é determinada pelo clausulado do contrato, por critérios normativos (como sejam o salário mínimo e o princípio da igualdade salarial) e pelos usos da profissão e da empresa; num segundo momento, a retribuição global – no sentido de que exprime o padrão ou módulo do esquema remuneratório do trabalhador, homogeneizando e sintetizando em relação à unidade de tempo, a diversidade de atribuições patrimoniais realizadas ou devidas – engloba não só a remuneração de base, como também prestações acessórias, que preencham os requisitos de regularidade e periodicidade e se possam considerar como contrapartida do trabalho, ou da força de trabalho que o trabalhador disponibiliza, o que revela que o conceito civilístico da contrapartida do trabalho foi ultrapassado no moderno direito do trabalho, que passou a integrar no domínio da retribuição outros benefícios outorgados pelo empregador, regular e periodicamente concedidos.

Ora, constituindo critério legal da determinação da retribuição, a obrigatoriedade do pagamento da(s) prestação(ões) pelo empregador, dele devem ser excluídas as meras liberalidades, porque não correspondem a um dever do empregador.

Mas também temos de excluir da determinação da retribuição aquelas prestações cuja causa determinante não seja a prestação da actividade pelo trabalhador, ou a sua disponibilidade para o trabalho, mas tenham uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade para este[14].

Assim é necessário que se possa detectar uma contrapartida específica -diferente da disponibilidade da força de trabalho, para que se possa colocar determinada prestação do empregador à margem do salário global[15]

Por outro lado e no que respeita à característica de periodicidade e regularidade da retribuição, tal significa, por um lado, a existência de uma vinculação prévia do empregador (quando se não ache expressamente consignada) e, por outro, corresponde à medida das expectativas de ganho do trabalhador[16], conferindo, dessa forma, relevância ao nexo existente entre as retribuições e as necessidades pessoais e familiares daquele.

Com efeito, com a expressão “regular”, a lei refere-se a uma prestação não arbitrária, que segue uma regra permanente, sendo, pois, constante. E, ao exigir o carácter “periódico”, a lei considera que a prestação deve ser paga em períodos certos no tempo ou aproximadamente certos, de forma a inserir-se na própria ideia de periodicidade típica do contrato de trabalho e das necessidades recíprocas dos dois contraentes[17].

Por isso, este critério definidor e interpretativo, em que o elemento fundamental da qualificação de certa prestação como retribuição assenta na regularidade e periodicidade dos benefícios patrimoniais auferidos pelo trabalhador, pode não se revelar suficiente, pois o intérprete deve ter sempre presente se a atribuição patrimonial paga ao trabalhador deriva duma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade deste.

Assim e conforme ensinava Jorge Leite, (Direito do Trabalho vol. II, Coimbra 1999, pág. 175) a dificuldade da determinação quantitativa da retribuição genericamente referenciada resulta, em boa medida, da relatividade da própria noção de retribuição, isto é, dos vários sentidos com que a mesma expressão pode ser usada em diferentes normas, o que exigirá uma cuidada tarefa interpretativa com recurso aos cânones hermenêuticos adequados, tendo em conta o contexto normativo correspondente.

E isto apesar de, no que respeita à prova da verificação dos respectivos pressupostos, o trabalhador gozar da presunção de integrar a retribuição qualquer prestação que lhe é paga pelo empregador (nº 3 do artigo 82º da LCT e 249º nº 3 do CT), regime extremamente favorável em termos probatórios, pois bastar-lhe-à provar a percepção duma prestação pecuniária, competindo à entidade patronal a prova da não verificação dos elementos integrantes do conceito legal de retribuição.

Finalmente, convém ainda salientar que, segundo os IRCT aplicáveis a esta relação de trabalho, a noção de retribuição se tem mantido desde o ACT de 1978.

Assim, destes resulta também que, só se considera retribuição aquilo que, nos termos desses IRCT, o trabalhador tem direito, regular e periodicamente, como contrapartida do trabalho, compreendendo a retribuição mínima mensal (retribuição base) e todas as prestações mensais, fixas, regulares e periódicas, previstas neste ACT, feitas directamente em dinheiro (cfr. cláusula 83ª, n.ºs 1 e 2 do ACT de 1978 que aparece repetida em todos IRCT subsequentes e nos RS).

Por outro lado, as componentes da retribuição ilíquida mensal, igualmente invariáveis desde o ACT de 1978, têm sido: a remuneração constante da tabela salarial; as anuidades; a remuneração por isenção de horário de trabalho; o subsídio de turno e o subsídio por condições especiais de trabalho (cláusula 87ª), pois a contratação colectiva afasta o carácter retributivo dos outros “abonos diversos” tais como, o subsídio de refeição; as ajudas de custo; as despesas de transporte; o subsídio de disponibilidade (AEs de 1994 e de 1997); subsídio de educação especial; comparticipação para despesas de infantário; complemento de abono de família e subsídio para material escolar (cláusula 84ª, regime que se manteve nos ircts subsequentes e nos RS).

De qualquer forma e apesar da relatividade da noção de retribuição, face aos vários sentidos com que a expressão é usada pelo legislador, resultando do n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 874/76, que a retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo, daqui só podemos concluir que o legislador teve em vista que o trabalhador em férias não fosse penalizado em termos retributivos, sendo-lhe por isso devida a retribuição correspondente à que auferiria como se estivesse ao serviço.

Por outro lado, o subsídio de férias devido nos termos do n.º 2 do referido preceito tem que ser igual à retribuição auferida durante as férias. 

Ora, face ao teor literal das normas examinadas e tendo sobretudo em conta o fim visado pelo legislador, que quis que o trabalhador em férias não fosse penalizado em termos retributivos, temos de considerar que na retribuição de férias e no respectivo subsídio deve atender-se ao todo retributivo.

Esta conclusão é também válida para a retribuição durante as férias à luz do Código do Trabalho de 2003, pois o artigo 255º continua a estabelecer que «a retribuição do período de férias corresponde à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo» (n.º 1).

Por seu turno e relativamente ao subsídio de férias, o n.º 2 do citado artigo 255.º estatui que “o trabalhador tem direito a um subsídio de férias cujo montante compreende a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução de trabalho”.

Analisando estas alterações, diz Joana Vasconcelos, Código do Trabalho, anotado, Romano Martinez e outros, em anotação àquele preceito, que o subsídio de férias deixa de ser de montante igual ao das férias, o que representa uma ruptura com o direito anterior, passando a abranger somente a retribuição base a as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução de trabalho.

   Sabemos em que consiste a retribuição base que está definida no artigo 250º, nº 2, alínea a).

Mas as demais prestações retributivas que são contrapartida do modo específico da prestação do trabalho, já são mais dificilmente identificáveis, pois a formulação legal abre espaço para muitas dúvidas, conforme reconhece Monteiro Fernandes[18].

De qualquer forma, devem ser incluídos nos subsídios de férias os complementos que se referem à própria prestação do trabalho, às especiais contingências que a rodeiam, ou seja os que se referem ao seu condicionalismo externo (nomeadamente os subsídios de penosidade, isolamento, toxicidade, turnos rotativos, trabalho nocturno), em detrimento daqueles subsídios que respeitam ao próprio trabalhador e ao seu desempenho (tais como prémios, gratificações, comissões), ou que consistam na assumpção de pelo empregador de despesas em que o trabalhador incorreria por causa da prestação de trabalho (subsídios de refeição e de transporte).[19]     

3.2.3---

Posto isto, e apesar de termos concluído que a retribuição das férias e do respectivo subsídio deverem integrar o todo retributivo, vejamos agora se as prestações auferidas pelo A., a título de acréscimo remuneratório por trabalho prestado em período nocturno e acréscimo remuneratório por “horas extra”, fazem parte integrante da sua base de cálculo, pois o Autor sempre recebeu a retribuição correspondente às férias e o respectivo subsídio de férias sem incorporação da média dos valores que recebeu a coberto daquelas rubricas, dado que a Ré lhe pagou tendo em conta a parte fixa da retribuição.

           

Ora, quanto ao trabalho extraordinário/suplementar, temos de ter em consideração o regime do artigo 86º da LCT, donde resulta que, em regra, “não se considera retribuição a remuneração por trabalho extraordinário, salvo quando se deva entender que integra a retribuição do trabalhador”.

A propósito desta norma escrevia Lobo Xavier, Regime Jurídico do Contrato de Trabalho (anotado), Coimbra 1972, pgª 170, “parece que tal remuneração se integra na retribuição do trabalhador quando pela permanência ou regularidade com que é prestada e ainda pelo seu volume, pesa sensivelmente no montante recebido pelo trabalhador, em termos de ele contar com tal remuneração”[20].

Donde resulta que o critério seguido pelo legislador se fixou mais na regularidade e constância do seu recebimento, do que porventura, no elemento da contrapartida que é essencial ao conceito de retribuição.

Ou seja, neste ponto o legislador foi mais sensível à medida das expectativas de ganho do trabalhador, pois exigindo a referida disposição legal que a remuneração por trabalho extraordinário integrará a retribuição do trabalhador quando a sua prestação for constante, reiterada e por isso previsível, é natural que face a tais factores ele conte com tal remuneração face à previsibilidade da sua prestação.

Neste sentido se pronunciava também a jurisprudência, exigindo-se que tal trabalho extraordinário fosse prestado de forma regular e continuada, durante anos[21], e com regularidade constante e permanente[22], para que a sua remuneração integrasse a retribuição do trabalhador.

Igualmente o Supremo Tribunal de Justiça[23], a propósito da remuneração especial de duas horas de trabalho extraordinário por dia, prevista na cláusula 74ª nº 7 da contratação colectiva dos motoristas afectos ao serviço internacional, e que qualifica como retribuição, realça também a regularidade e a continuidade da prestação do trabalho extraordinário, pois só desta forma é que tal circunstancialismo é susceptível de criar no espírito do trabalhador a convicção de que se trata dum complemento da retribuição.

Postos estes parâmetros, vejamos se o A prestou trabalho extraordinário com a constância e regularidade reiterada que o artigo 86º da LCT exige para ser considerado retribuição. 

 Ora, embora o A, tenha incluído na sua petição inicial uns gráficos contendo os montantes que recebia mensalmente a título de horas extra, o certo é que eles não constam do elenco dos factos acordados pelas partes.

De qualquer forma, como se deram por reproduzidos os documentos 1 a 452 juntos com a petição inicial, sempre podemos concluir que o recorrente prestou trabalho, que lhe foi pago a título de Horas extra, 11 meses em 1974, 10 meses no ano de 1975, 12 meses no ano de 1976, 12 meses no ano de 1977, 11 meses no ano de 1978, 8 meses no ano de 1979, 9 meses no ano de 1980, 9 meses no ano de 1981, 11 meses no ano de 1982, 10 meses no ano de 1983, 10 meses no ano de 1984, 12 meses no ano de 1985, 7 meses no ano de 1986, 10 meses no ano de 1987, 10 meses no ano de 1988, 10 meses no ano de 1989, 10 meses no ano de 1990, 8 meses no ano de 1991, 7 meses no ano de 1992, 10 meses no ano de 1993, 7 meses no ano de 1994, 8 meses no ano de 1995, 7 meses em 1996, 5 meses em 1997, 3 meses em 1998, 6 meses em 1999, 7 meses no ano de 2000, 7 meses no ano de 2001, 11 meses no ano de 2002, 8 meses no ano de 2003, 9 meses no ano de 2004, 9 meses no ano de 2005, 7 meses no ano de 2006, e 9 meses em 2007.

Neste conspecto, não se justifica a ampliação da matéria de facto, conforme sustenta a Senhora Procuradora Geral Adjunta no seu parecer, pois colhe-se desta documentação a materialidade relevante para o julgamento desta questão. 

 

Assim e prosseguindo na análise deste quadro, podemos constatar o carácter irregular e intermitente da prestação de trabalho pago sob a designação de “horas extra”, que tanto aparece prestado em 12 meses (1976, 1977 e 1985) e em 11 meses nos anos de 1974, 1978, 1982 e 2002, como aparece prestado somente em três meses (1998), cinco meses em 1997, seis meses (1999), sete meses em sete anos, oito meses em quatro anos, nove meses em quatro anos e durante 10 meses em 8 anos.

Ora, tal irregularidade e intermitência advém da circunstância do A trabalhar em regime de turnos rotativos, em que cada turno termina o seu trabalho precisamente no momento em que o outro turno inicia a sua actividade, não se justificando por isso, um recurso sistemático a trabalho suplementar.

No entanto e por vezes, num ou noutro feriado, verificava-se falta de pessoal em virtude de este ou aquele trabalhador escalado aproveitar o feriado para meter férias, dando lugar a falhas nas equipas que tinham de ser colmatadas por elementos de reforço, cuja actividade era paga pela ré como trabalho suplementar.

Por outro lado, as horas prestadas a mais no final do turno justificavam-se por um atraso imprevisto do colega no início de turno seguinte, um seu impedimento de ocasião por doença ou para a prestação de assistência à família ou, para concluir uma concreta tarefa que o A. tinha entre mãos e em que não se justificava, nem se recomendava, que transitasse para outro colega.

Assim, só se justificando que a R recorresse a trabalho suplementar quando ocorriam as circunstâncias referidas, compreende-se tal falta de regularidade e constância da sua prestação pelo A.

Por outro lado, os abonos identificados pelo A. através da rubrica denominada “horas extra”, conforme consta das notas de vencimentos constantes dos documentos 1 a 468 e juntos com a PI, podiam corresponder a uma das seguintes situações de facto: trabalho prestado em dias úteis fora do horário normal; trabalho prestado em dia de descanso semanal ou obrigatório ou complementar; trabalho prestado em dia de descanso compensatório, situações essas remuneradas como trabalho suplementar mediante a aplicação ao A. dos Códigos HX02, HX03 e HX06 e que davam origem a acréscimos diferentes de 50%, de 75% e de 200%, respectivamente.

No entanto, quando o trabalho normal do A. decorrente da escala de turnos calhava em dia feriado a ré pagava um acréscimo de 100%, que também era processado sob a designação genérica de “horas extra”, com a utilização do código informático HX04, apesar de não se tratar de trabalho extraordinário/suplementar no verdadeiro sentido do termo[24], pois não era prestado para além do horário normal ou fora dele.  

Logo, trabalhando o autor 7,5h em cada um dos feriados trabalhados (e foram vários em cada ano, conforme se colhe da matéria de facto), mais se reforça a ideia de que muito daquele trabalho pago sob a rubrica de horas extra não correspondeu a uma efectiva prestação de trabalho extraordinário (ou trabalho suplementar, conforme o designava o DL nº 421/83 de 2/12).

Além disso, desde a vigência deste diploma legal a prestação de trabalho suplementar assume carácter excepcional, pois o legislador teve a intenção de impor a distribuição do trabalho existente pelo maior número possível de trabalhadores, só admitindo a sua prestação nos casos em que o mesmo se mostre necessário para fazer face a acréscimos de trabalho que não justificam a admissão de novos trabalhadores, ou quando a sua prestação for indispensável para prevenir ou reparar prejuízos graves para as empresas ou para assegurar a sua viabilidade.

Donde advém a razão de ser da fixação dum limite máximo anual de 160 horas (mais tarde aumentado para 200 horas pelo DL nº 398/91 de 16/X).

Face ao exposto, não se pode concluir pela verificação dos requisitos da constância, da regularidade reiterada e da consequente previsibilidade da prestação de trabalho extraordinário/suplementar, para que apela o artigo 86º da LCT ao qualificar a sua remuneração como retribuição.

Acresce, por último, que os apontados IRCTs não incluem nas componentes retributivas os mencionados acréscimos de trabalho extraordinário (suplementar).

Assim e atentas estas razões, não se podendo concluir pelo carácter retributivo dos montantes auferidos pelo A sob a designação de “horas extra”, nenhumas diferenças lhe são devidas por a R não ter incluído a média de tais valores na remuneração das férias e do respectivo subsídio.

Improcede portanto o recurso também nesta parte.

 

3.3---

           

Quanto ao período posterior a 1 de Dezembro de 2003:

O Código do Trabalho de 2003, não contém qualquer norma de conteúdo idêntico ao do artigo 86º da LCT.

Ora, mesmo que se sufrague o entendimento de Monteiro Fernandes, quando sustenta que “cremos que o facto do preceito não ter correspondência no CT decorre apenas da sua evidente redundância”[25], ainda assim e face às considerações constantes do ponto anterior, temos de julgar também improcedente a pretensão do trabalhador à luz do Código do Trabalho.

3.4---

           

  Quanto ao processamento nos recibos de vencimento e consequente pagamento de remunerações a título de acréscimo por “Trabalho Nocturno”, demonstrou-se que o A., por operar em regime de turnos rotativos, por vezes auferiu, sob a designação de “Trabalho Noct/Turnos”, horas mensais nocturnas prestadas a partir da 31ª hora, entre as 20 horas e as 7 horas.

Efectivamente, nos termos dos IRCTs aplicáveis, trata-se de um acréscimo remuneratório de 100% sobre o valor/hora resultante da tabela salarial, a que têm direito os trabalhadores que recebem subsídio de turno (ou seja, trabalhadores que laboram em regime de turnos) e que, nessa medida, efectuam trabalho nocturno entre as 20 horas de um dia e as 7 horas do dia seguinte, por força da sua integração nos turnos respectivos.

No entanto, tal acréscimo apenas lhes é conferido desde que o trabalho prestado nessas circunstâncias exceda as 30 horas mensais (conforme advinha da cláusula 60ª do AE de 2005, que mantém a solução que já vinha dos anteriores instrumentos de regulamentação colectiva).

Com efeito, a prestação de trabalho nocturno normal por esses trabalhadores durante aquelas horas, já é compensada pela atribuição do subsídio de turno.

Assim, não está em causa o trabalho nocturno normal, já que o seu pagamento está incluído no subsídio de turno, que sempre foi levado em consideração no cálculo da retribuição das férias, subsídio de férias e de Natal; mas apenas o trabalho nocturno acima das 30 horas mensais, prestado pelo trabalhador sujeito ao regime de turnos.

Assim sendo, parece legítimo concluir que a razão de ser deste pagamento extra de 100%, visa compensar a maior penosidade que representa trabalhar durante a noite quando o número de horas por mês ultrapassa as 30 horas de trabalho entre as 20 horas de um dia e as 7 horas do dia seguinte e o maior desgaste no organismo que tal trabalho provoca.

Por isso, faltando-lhe o requisito da contrapartida do trabalho que o conceito de retribuição exige e pressupõe, é indiferente que o trabalhador tenha recebido tal acréscimo com regularidade, pois basta que falte aquele elemento constitutivo da retribuição para que uma determinada atribuição patrimonial não seja considerada como tal.

Efectivamente e como dissemos já, temos de excluir da determinação da retribuição aquelas prestações cuja causa determinante não seja a prestação da actividade pelo trabalhador, ou a sua disponibilidade para o trabalho, mas tenham uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade para este.

Sendo este o caso, pois tal atribuição patrimonial tem uma causa determinante diversa da prestação da actividade pelo trabalhador, ou da sua disponibilidade para o trabalho, tendo portanto outra causa específica, não devem tais valores integrar a retribuição das férias e respectivo subsídio.

Acresce que os apontados IRCTs não incluem nas componentes retributivas os mencionados acréscimos por trabalho nocturno.

Deste modo, concluímos que a R não tinha que incluir estas verbas que pagou ao trabalhador a este título, na retribuição das férias e respectivo subsídio, improcedendo por isso, também este pedido do A.

Donde resulta, face a tudo o exposto, que o recurso improcede na íntegra, sendo de manter, a decisão do acórdão recorrido, embora, parcialmente, com diferente fundamentação.

4----

            Termos em que, se acorda em negar a revista.

As custas serão da responsabilidade do A.

Lisboa, 13 de Julho de 2011.

Gonçalves Rocha (Relator)

Sampaio Gomes

Pereira Rodrigues

___________________________

[1] As convenções colectivas de trabalho também são fonte de direito, com força de lei porque é a própria lei ordinária que lhes atribui tal força, acolhendo os seus dispositivos e fazendo-os prevalecer como se seus fossem.
[2] Além do perigo – potenciado por alguma jurisprudência que, à revelia dos requisitos essenciais, de verificação cumulativa, do conceito de retribuição, se contenta com a mera regularidade e periodicidade de uma qualquer prestação, e que carece de ser repensada por qualificar mal as prestações que as partes contratantes vão criando no âmbito do processo negocial da convenção colectiva – de, no futuro, as partes negociadoras, com a confiança na contratação colectiva inteiramente perdida, não mais quererem, à mesa das negociações, novas vinculações em matéria salarial, limitando-se a medir a prestação salarial, pelo que, em cada momento, vai sendo padronizado na lei geral. Esta será a factura que a contratação colectiva poderá ter que pagar pela perda de confiança na capacidade de a convenção colectiva governar livremente a matéria salarial. Porque acções judiciais como a presente, alimentadas pela dita jurisprudência que navega em águas pouco límpidas, atentam frontalmente contra a autonomia colectiva constitucionalmente garantida, nenhum sindicato se dispôs, até hoje, a patrocinar os demandantes, cujas pretensões egoístas colidem frontalmente com o interesse colectivo dos filiados.
[3] A regularidade pressupõe uma prestação não arbitrária, mas constante; a periodicidade implica a atribuição da prestação em períodos certos no tempo.
[4] Não se consideram retribuição, por não se enquadrarem na estrutura sinalagmática, prestações pecuniárias do empregador ao trabalhador que não sejam correspectivo da actividade integradora do objecto do contrato de trabalho.
[5] Afigurando-se óbvio que as chamadas «horas extra» mencionadas em cada Nota de Vencimento se reportam ao mês anterior, por um lado, salta logo à vista que no mês anterior houve um ou mais feriados e, por outro lado, facilmente se constata que houve uma atribuição com o Código HX04 HORAS EXTRA 100%, com a quantidade correspondente a 7,5h ou múltiplos de 7,5h (que é precisamente a carga horária de cada dia normal de trabalho, como consta dos IRCT aplicáveis). Nestes casos, o acréscimo de 100% respeita ao trabalho normal prestado em dia feriado, nada tendo a ver com o trabalho suplementar.
[6] Que, através da fórmula do artº 264º do CT, permite aferir a retribuição horária ou por dia útil, cuja validade (seja para abonar seja para descontar) se restringe aos períodos curtos de ausência do trabalho, tais como retribuição de cada dia útil do período de férias ou retribuição de cada dia útil de ausência por adesão à greve.
[7] Conforme estipula a cláusula 83ª do ACT/78, regime que se manteve em todos os IRCTs subsequentes  e nos RS.
[8] No ACT de 1975, BTE nº 35, de 22/9/75, a cláusula 124ª estabelecia o direito dos trabalhadores da TAP ao subsídio de Natal (13º mês), que correspondia à retribuição auferida, na qual se incluíam a remuneração constante das tabelas salariais a que acresciam as prestações fixas, regulares e periódicas (cláusula 122ª, nºs 2 e 5). E já no ACT de 1970, Boletim do INTP, nº 19, de 15/X/70, a cláusula 97ª estabelecia o direito a uma “gratificação” correspondente à remuneração normal auferida em Dezembro, a qual incluía a remuneração constante das tabelas salariais e noutras prestações fixas, regulares e periódicas.
[9] Neste sentido, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 12ª edição, 2005, pgª 467.
[10] Assim continuaram a estabelecer as cláusulas 65ª e 56ª dos AE/94 e AE/97.
[11] Neste sentido Daniel Santos, O Direito a Férias e ao Subsídio de Férias, pgª 10, e artigo 7º da lei 1952
[12] No ACT de 1975, os trabalhadores da TAP tinham direito a 30 dias de férias (cláusula 98ª,1), período durante o qual tinham que receber a retribuição normal (nº 2), tendo também direito a um mês de retribuição normal a título de subsídio de férias (nº 3), a qual correspondia à remuneração mínima constante das tabelas salariais e às prestações fixas, regulares e periódicas (122ª nºs 2 e 5).
Por outro lado, já no ACT de 1970 se estabelecia na cláusula 63ª/1 o direito dos trabalhadores da TAP a 30 dias de férias, bem como a igual período a título de subsídio de férias (96ª), cuja retribuição era correspondente à remuneração mensal prevista nas tabelas salariais a que acresciam outras prestações de carácter fixo, regular e periódico (cláusula 91ª/1).    
[13] Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho”, Almedina, 12.ª edição, ano de 2005, pág. 455)
[14] Monteiro Fernandes, obra citada, 457.
[15]  Mesmo autor, pgª 458.
[16] Mesmo autor, pgª 457.
[17] Acórdão do STJ, de 13/01/1993, in CJSTJ, t. I, pág. 226).
[18] Obra citada, pgª 460.
[19] Joana Vasconcelos, Código do Trabalho, (Romano Martinez), anotação ao artigo 255º.
[20] Ideia também veiculada por Lobo Xavier, no Curso de Direito do Trabalho, Verbo, 1992, pgª 389, onde se escreveu que ”com esta fórmula perturbadora se deve pretender dar cobertura a situações em que a habitualidade na prática de horas extraordinárias e a percepção das respectivas remunerações, leva o trabalhador a contar com os respectivos quantitativos como complemento salarial”.

[21]  Acórdão da Relação de Évora de 5/5/87, CJ, 319/2.
[22] Acórdão da Relação do Porto de 6/5/85, CJ,286/3 (texto do acórdão).
[23] Acórdão de 12/2/92, BMJ 414/365
[24] O artigo 46º nº 1 da LCT, definia o trabalho extraordinário como aquele que era prestado para além do período normal, enquanto que os artigos 16º nº 1 do DL nº 409/71 de 27/9 e 2º nº 1 do DL nº 421/83 de 2/12, consideravam como extraordinário e como trabalho suplementar o que era prestado fora do horário normal.
[25] Obra citada, 470.