Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | BETTENCOURT DE FARIA | ||
Descritores: | SIMULAÇÃO MATÉRIA DE FACTO MATÉRIA DE DIREITO PRESUNÇÕES JUDICIAIS PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA | ||
Nº do Documento: | SJ200611140035842 | ||
Data do Acordão: | 11/14/2006 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
Sumário : | I - Saber se determinados factos integram uma divergência entre a vontade real e a declarada por forma a concluir pela existência de simulação é uma questão de direito. II - Saber se ocorreu um acordo simulatório, ou seja, saber qual era a vontade declarada e qual era a vontade real das partes é uma questão de facto que compete às instâncias decidir. III - As presunções judiciais constituem matéria de facto, não podendo o STJ apreciar a decisão da Relação que não retirou determinada presunção dos factos provados. IV - Apenas no caso positivo, quando a presunção é retirada, pode o Supremo apreciar do seu manifesto ilogismo. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I "AA" moveu a presente acção ordinária contra BB, CC e Empresa-A pedindo que se declare: que determinada fracção autónoma foi adquirida com dinheiro comum do ex-casal formado pela autora e pelo 1º réu, sendo, por isso, propriedade de ambos; que se declare a existência de acordo simulatório entre os réus, com vista a enganar e prejudicar a autora, constante de determinada escritura, com a consequente declaração de nulidade do contrato de compra e venda realizado entre o 2º réu e a 3ª ré; que os réus sejam condenados a reconhecer tal nulidade. Os réus CC e a ré sociedade deduziram contestações. Na réplica a autora deduziu o incidente de intervenção provocada da mulher do réu CC. O processo prosseguiu os seus trâmites e, feito o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente. Apelou a autora, mas sem êxito. Recorre a mesma novamente, apresentando nas suas alegações de recurso, em síntese, as seguintes conclusões: 1. Os elementos fornecidos pelos autos e demais circunstâncias fazem presumir a existência de intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração, o acordo entre o declarante e o declaratário e o intuito de enganar terceiros. 2. A prova da simulação tem de ser feita quase sempre por indícios e presunções. 3. No caso dos autos, podem detectar-se perfeitamente esses sintomas, indícios e factos circunstanciais susceptíveis de apontar, de acordo com as regras da experiência, para a existência de simulação. 4. Razão pela qual deverá o contrato de compra e venda ser declarado nulo. Corridos os vistos legais, cumpre decidir. II Nos termos do artº 713º nº 6 do C. P. Civil, consignam-se os factos dados por assentes pelas instâncias remetendo para o que consta de fls. 279 a 280. III Apreciando Pretende a recorrente que se julgue que houve simulação ao celebrar-se determinado contrato. Saber se determinados factos provados integram uma divergência concertada entre a vontade real e a vontade declarada dos contraentes é uma questão de direito. No entanto, a ocorrência do acordo simulatório, ou seja, a verificação de qual a vontade das partes (a real e a declarada) é uma questão meramente de facto. Não se determina recorrendo a conceitos normativos - como, por exemplo no caso da vontade apurada pela impressão do declaratário prevista no artº 236º nº 1 do C. Civil - , mas antes averiguando e provando, qual tenha sido realmente a intenção dos eventuais simuladores. Como é de jurisprudência deste STJ. Ac. STJ de 07.03.02 - Sumários 2002 101 - : "A determinação da intenção dos contraentes, designadamente do animus decipiendi, integra matéria de facto cujo apuramento é apanágio exclusivo das instâncias e cujo ónus de dedução e de prova impende sobre o demandante-arguente." Ac. STJ de 03.03.05 - Sumários Março de 2005 19 - : "Integra matéria de facto, do foro exclusivo das instâncias, a indagação, a pesquisa e o apuramento da intenção dos contraentes ou outorgantes em determinado negócio jurídico, bem como a questão de saber se o declaratário conhecia a vontade real do declarante e qual a vontade deste." A recorrente insurge-se pelo facto do Tribunal da Relação não ter valorado a prova no sentido de considerar demonstrado o acordo simulatório. Situa-se, portanto, no campo da matéria de facto de que não cabe recurso para este Supremo, de acordo com o disposto no artº 722º nº 2 do C. P. Civil. É certo que faz apelo à possibilidade de se poder presumir dos factos assentes tal acordo. No entanto, as presunções judicias, como é de jurisprudência firme, constituem ainda matéria de facto, sobre cujo acerto o STJ não se pode pronunciar, a não ser, no caso positivo - quando se retira a presunção - , enfermar ela de manifesto ilogismo. Logo, é agora insindicável a posição assumida pelo tribunal a quo. Acresce que a alteração da matéria de facto pode ser feita pela Relação ao abrigo do artº 712º do C. P. Civil. Esta, ao recusar-se presumir como pretendia a autora tomou uma decisão ao abrigo do mesmo preceito. Ora, o seu nº 6 prescreve que não há recurso para o STJ das decisões tomadas pela Relação conforme o previsto em tal artigo. Acresce também que os pontos da matéria de facto que versavam a questão - 17º a 21º - mereceram a resposta negativa. Como é de jurisprudência, não é possível fixar um facto por presunção judicial, se o mesmo facto constava da base instrutória e não logrou aí ficar demonstrado. Não é possível, pois, apreciar dos efeitos jurídicos da pretendida simulação, uma vez que não se prova o acordo simulatório. Termos em que falece a pretensão da recorrente, não merecendo censura o acórdão em apreço. Pelo exposto, acordam em negar a revista e confirmam o acórdão recorrido. Custas pela recorrente. Lisboa, 14 de Novembro de 2006 Bettencourt de Faria Pereira da Silva Rodrigues dos Santos |