Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
745/05.9TBFIG.C1.S2
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: RECURSO DE REVISTA
PODERES DO STJ
MATÉRIA DE FACTO
PROVA PERICIAL
LIBERDADE DE JULGAMENTO
Data do Acordão: 06/18/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO EM GERAL / INSTRUÇÃO DO PROCESSO / PROVA PERICIAL / DESIGNAÇÃO DOS PERITOS / PROPOSIÇÃO E OBJECTO DA PROVA PERICIAL / REALIZAÇÃO DA PERÍCIA / SEGUNDA PERÍCIA – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / ELABORAÇÃO DA SENTENÇA.
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / EXERCÍCIO E TUTELA DOS DIREITOS / PROVAS / CONFISSÃO / PROVA DOCUMENTAL / PROVA PERICIAL / PROVA TESTEMUNHAL.
Doutrina:
- José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil Anotado, Volume 3º, Tomo I, 2.ª edição, p. 162/163.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 467.º, 468.º, 475.º, 476.º, 485.º, 487.º, N.ºS 1 E 3 E 607.º.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 358.º, 364.º, 389.º E 393.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 06-05-2004, RELATOR ARAÚJO DE BARROS;
- DE 07-04-2005, RELATOR SALVADOR DA COSTA;
- DE 28-05-2009, RELATOR SANTOS BERNARDINO;
- DE 18-05-2011, RELATOR PEREIRA RODRIGUES;
- DE 23-02-2012, RELATOR TÁVORA VICTOR;
- DE 15-11-2012, RELATORA ANA PAULA BOULAROT;
- DE 24-09-2013, RELATOR AZEVEDO RAMOS;
- DE 02-12-2013, RELATORA ANA PAULA BOULAROT, TODOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :

I Decorre do disposto no artigo 607º do NCPCivil que no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre, segundo o qual o Tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir, para a existência ou prova do mesmo, qualquer formalidade especial, caso em que esta não pode ser dispensada.

II De acordo com este princípio, que se contrapõe ao princípio de prova legal, vinculada pois, as provas são valoradas livremente, sem qualquer grau de hierarquização, nem preocupação do julgador quanto à natureza de qualquer delas, cedendo o mesmo naquelas situações vulgarmente denominadas de «prova taxada», designadamente no caso da prova por confissão, da prova por documentos autênticos e dos autenticados e particulares devidamente reconhecidos, cfr artigos 358º, 364º e 393º do CCivil.

III Enquanto o princípio da prova livre permite ao julgador a plena liberdade de apreciação das provas, segundo o princípio da prova legal o julgador tem de sujeitar a apreciação das provas às regras ditadas pela Lei que lhes designam o valor e a força probatória e os poderes correctivos que competem ao Supremo Tribunal de Justiça quanto à decisão da matéria de facto, circunscrevem-se em verificar se estes princípios legais foram, ou não, no caso concreto violados.

IV Daí que a parte que pretenda, no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, censurar a decisão da matéria de facto feita nas instâncias só poderá fazê-lo – no rigor dos princípios - por referência à violação de tais regras e não também em relação à apreciação livre da prova, que não é sindicável por via de recurso para este Órgão Jurisdicional.

V Por outras palavras e em termos práticos, dir-se-á que o que o Supremo pode conhecer em matéria de facto são os efectivos erros de direito cometidos pelo tribunal recorrido na fixação da prova realizada em juízo, sendo que nesta óptica, afinal, sempre se está no âmbito da competência própria Supremo Tribunal de Justiça.

VI A apreciação da prova pericial está sujeita à liberdade de julgamento, uma vez que a força probatória das respostas dos peritos é livremente fixada pelo Tribunal nos termos expressos no normativo inserto no artigo 389º do CCivil.

VII Coisa diversa, será a imputação que poderá ser feita a tal meio de prova, quando eivado de vícios que lhe toldem a credibilidade e a idoneidade, que levem à sua invalidade.

VIII Requerida a realização de perícia singular, indicando-se para o efeito o Perito e os quesitos referentes ao objecto daquela, nos termos dos artigos 467º, 468º 475º e 476º do CPCivil, fica precludida a a possibilidade de a parte requerer tal meio de prova, subsequentemente, com a intervenção de mais de um perito.

IX O resultado da perícia pode ser objecto de reclamação e de esclarecimentos por parte do Perito, de harmonia com o preceituado no artigo 485º do CPCivil.

X Pode a parte, se ficar insatisfeita com o resultado apresentado pelo Perito, usar da faculdade prevista no artigo 487º, nº1 e 3 do CPCivil, e solicitar a realização de uma segunda perícia, com vista à correcção das inexactidões apontadas à primeira, não poderá é requerer a realização de uma perícia colegial.

(APB)

Decisão Texto Integral:

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I M, intentou acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra C, LIMITADA, G, J, L e  CÂMARA MUNICIPAL Y, pedindo:

- a condenação dos Réus a reconhecer o ser direito de propriedade sobre o prédio rústico identificado na petição inicial e a absterem-se da prática de quaisquer actos que perturbem, obstruam ou limitem esse direito, “nomeadamente no que respeita ao licenciamento”;

- a condenação dos 1º ao 4º Réus a “alterar as plantas, desenhos técnicos, memórias descritivas e justificativas e outros elementos técnicos que representem um área de implantação sobre o prédio da A., que passaram assim ilicitamente a ocupar, deixando-o livre de pessoas e bens”;

- a condenação dos 1º ao 4º Réus a “demolir e retirar toda a obra construída sobre o prédio da Autora” e a “restituir a parte do prédio da A. e de domínio público que ilicitamente ocupam, destituída de toda e qualquer construção que sobre ela impenda”;

- a condenação dos Réus a pagar à Autora, a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de €6.500,00, e a título de indemnização por danos patrimoniais, a quantia de €950,00 e nos juros sobre tais quantias até efectivo e integral pagamento.

Para basear a sua pretensão a Autora alegou, muito em síntese, que:

- é proprietária de um prédio rústico, que confina com um loteamento; desde a construção desse loteamento o seu prédio ficou delimitado, nas estremas nascente e sul de tal loteamento, por um muro de vedação aprovado por um projecto inicial da 1ª Ré;

- o prédio da Autora era delimitado, anteriormente à construção do muro de vedação que o separa dos lotes A, B, e C, por um declive natural, de terra, ficando o prédio da Autora abaixo da cota do prédio dos réus em 0,50 metros; a 1ª Ré alterou o projecto inicial do muro de vedação passando este a ser construído como um muro de suporte de terras, em betão armado, em toda a extensão do loteamento, com uma média de quatro metros de altura, sendo nalguns pontos superior;

- a construção do muro, na zona atribuída ao lote C, estendeu-se ao prédio da A. em 20 m2.; na zona atribuída ao lote B em 18,50 m2 e na zona do lote A em 22,31 m2;

- a sapata do muro do lote C, numa extensão de 30 metros, está implantada 1 metro dentro do prédio da Autora, ocupando ainda uma área correspondente a 12 metros aterrados, somando o total da área (pertencente ao prédio da A.) ocupada pelo lote C 42m2;

- o lote C estendeu-se ainda a uma faixa longitudinal de 40 m2 pertencente à via pública; o lote B estendeu-se a uma faixa longitudinal de 27,50 m2 pertencente à via pública;

- a situação referida e a omissão e tolerância do 5º R. Município da … provocou e vem provocando à A. forte angústia, sofrimento e ansiedade e provocou perturbação da paz do lar da A. que passou a ter frequentes discussões com o seu marido, bem como perturbação do sono da A. que passou a ver reforçada a sua medicação antidepressiva e ansiolítica;

- a Câmara Municipal Y, não obstante os requerimentos e os sucessivos pedidos de informação da A., não faculta as requeridas informações que permitem a A. conhecer da área ocupada do seu prédio, fazendo-a recorrer ao Tribunal Administrativo e Fiscal de … para fins de obtenção das informações e passagens de certidões;

- a Autora vive a correr para … a fim de acompanhar os processos de intimação, com a preocupação agravada e desgaste físico, emocional e psíquico daí resultante;

- a Autora despendeu com o acompanhamento administrativos dos processos, pedido de certidões e informações e as deslocações a quantia de €500,00 e com os levantamentos topográficos €450,00.

A Ré Câmara Municipal Y apresentou contestação, impugnando o valor da acção e invocando a ilegitimidade activa da Autora (por não estar acompanhada pelo seu marido), bem como a ilegitimidade passiva da Ré Câmara Municipal. Impugnou a generalidade dos factos articulados pela Autora.

                                                                             

A Ré L apresentou contestação arguindo a ilegitimidade activa da Autora, por não estar acompanhada do seu cônjuge, bem como a sua ilegitimidade passiva, por também não ter sido demandado o seu marido. Impugnou a generalidade dos factos articulados pela Autora e alegou ter adquirido o lote A na convicção de que os limites do seu lote e o muro ali construído respeitavam as estremas do prédio loteado. Mais aduziu que o prédio da Autora tem um valor de 5 euros por metro2 e a demolição do muro e a construção de um novo teria um custo superior a 10.000 euros, evidenciando a pretensão da Autora um abuso de direito.

                                                                              *

O Réu G apresentou contestação arguindo a ilegitimidade activa da Autora, por não estar acompanhada do seu cônjuge, bem como a sua ilegitimidade passiva, por também não ter sido demandada a sua esposa. Impugnou a generalidade dos factos articulados pela Autora. Alegou ter adquirido o lote C em 25.08.2004 já murado, com uma casa nele edificada (apenas a estrutura de alvenaria, sem acabamentos), com o projecto aprovado pela Câmara Municipal Y, na convicção de não prejudicar direito de outrem, sendo que o muro delimitador de Nascente e Sul do loteamento foi construído logo em 2000; aduziu ainda que o valor de 100 m2 do terreno pertencente à Autora é de 100 euros e que e demolição e reconstrução do muro de betão, com um sistema de drenagem de águas custaria um valor superior a €25.000, razão pela qual a pretensão da Autora excede manifestamente os limites impostos pela boa-fé e pelo fim social e económico do direito. Mais alegou que a Autora litiga de má-fé, pois sabe que o 2º R. só adquiriu o lote C em data muito ulterior a construção de todos os muros e à implantação da vivenda no seu lote; sabe também que o terreno do loteamento se situava, como situa, a uma cota muito mais elevada do que o terreno da Autora, diferença de nível essa que, em relação ao lote C, era superior a 3 metros; e sabe ainda que a linha divisória se situava na parte inferior do declive, pertencendo todo o talude ao loteamento.

                                                                             

A Ré C, Lda apresentou contestação arguindo igualmente a ilegitimidade activa da Autora, por não estar acompanhada do seu cônjuge e impugnou a generalidade dos factos articulados pela Autora. Alegou que o terreno da Autora onde existem eucaliptos não tem viabilidade para construção, sendo que o prejuízo causado aos réus com a demolição e reconstrução do muro atingiria as três dezenas de milhares de euros.

                                                                               

O Réu J apresentou contestação arguindo a ilegitimidade activa da Autora, por não estar acompanhada do seu cônjuge, bem como a sua ilegitimidade passiva, por também não ter sido demandada a sua esposa. Impugnou a generalidade dos factos articulados pela Autora, invocando que a pretensão da Autora integra a figura do abuso de direito.

                                                                             

A Autora apresentou respostas às contestações defendendo a improcedência das excepções e pugnando pela condenação dos Réus como litigantes de má-fé. Deduziu incidente de intervenção provocado do seu marido e dos cônjuges dos demandados. Posteriormente veio ainda requerer a habilitação dos adquirentes da fracção AA do lote B - M S e esposa S S - e da fracção BB do lote B - A G e esposa S P.

                                                                

Foi admitida a intervenção de J M F, marido da Autora; M C N, esposa do Réu J; R, esposa do Réu G; P, marido da Ré L – cfr. fls. 557 a 558.

                                                              

Foram habilitados os adquirentes da fracção A do lote B  e os adquirentes da fracção B do lote B – cfr. fls. 68 a 71 do apenso A.

                                                                             

Determinou-se a realização de arbitramento com vista a apurar do valor da parte do prédio alegadamente ocupada pelos réus e do custo da demolição da obra e retirada de materiais – cfr. fls. 558. Foi elaborado relatório e prestados esclarecimentos – cfr. fls. 602 a 604 e 679 a 680. Fixou-se o valor da acção em €18.387,87.

                                                                             

Foi proferido despacho saneador no qual foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade passiva arguida pelo Município Y.

Admitiu-se a perícia requerida pela Autora e fixou-se o seu objecto – cfr. 1286.

 

Foi elaborado relatório e prestados esclarecimentos – cfr. fls. 1307 a 1351 e 1397.

 

A Autora solicitou a realização de perícia colegial – fls. 1354 a 1360 e 1451 a 1457.

Determinou-se a realização de relatório complementar e indeferiu-se a realização da perícia colegial – cfr. fls. 1455.

Foi elaborado relatório complementar – fls. 1458 a 1469.

A Autora veio insurgir-se contra o relatório e requereu novamente a realização de perícia colegial – fls. 1473 a 1481.

Foi indeferida a realização da perícia colegial – fls. 1486 a 1487.

A Autora interpôs recurso do sobredito despacho.

O Tribunal da Relação de Coimbra não admitiu o recurso interposto como apelação autónoma dele não conhecendo – cfr. fls. 200 a 204 do apenso E.

No decurso da audiência a Autora veio requerer um aditamento à matéria de facto e a alteração do pedido – fls. 1582 a 1588, o que veio a ser indeferido ao abrigo do disposto no artigo 588.º n.º 4 do Código de Processo civil.

Foi proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente, com o seguinte dispositivo: «[C]ondenam-se os Réus e os Habilitados a reconhecer o direito de propriedade da Autora M sobre o prédio rústico identificado no ponto 1. da factualidade provada.

No mais, absolvem-se os Réus do restante contra si peticionado.

Como se disse supra, não se vislumbra litigância de má fé das partes.»

Inconformada com a sentença, recorreu a Autora de Apelação, a qual veio a ser julgado improcedente com a manutenção da sentença recorrida.

De novo irresignada, recorre agora a Autora de Revista, apresentando o seguinte acervo conclusivo:

- A ora recorrente, M, vem interpor Revista do Acórdão de 11 de Dezembro de 2018, que confirmou a sentença da 1-instância, do Tribunal da Comarca da …, que reconhecendo o direito de propriedade da autora/recorrente, julgou improcedente a apelação mantendo o despacho de 8.11.2016 e a sentença recorridos.

- Desde logo, sustenta a Recorrente a nulidade do despacho de 8.11.2016 porquanto o indeferimento da perícia colegial requerida ou o despacho que a não ordena oficiosamente apesar das graves violações das legis artis que subjazem a uma perícia judicial, e notórias deficiência, insuficiência, falta de diligência e zelo na sua realização que atentam contra a sua credibilidade e idoneidade de tal meio de prova para fundamentar um juízo critico e técnico-científico do tribunal a quo, consubstanciam intolerável e inadmissível preterição da prova e a violação do princípio da economia processual e da descoberta da verdade material.

- Na verdade a sentença recorrida fez assentar os seus fundamentos nas erradas premissas e conclusões da perícia, inválida como meio de prova técnico-científico por ter sido deficientemente realizada, ou seja, sem o perito proceder à inspecção e averiguação necessários à elaboração do relatório pericial, em violação do art. 480 n°1 do CPC, e sem ordenar e/ou "socorrer-se de todos os meios necessários ao bom desempenho da sua função" (art. 481 nº1), não tendo solicitado à A., nem sido ordenado oficiosamente, para descoberta da verdade material, ou seja, da área objectiva, concreta e realmente ocupada no prédio da autora pela sapata dita "invisível" que sabiam existir como a verificaram na data da inspecção judicial ao local em julgamento, em 7.12.2017, através da realização da escavação de uma vala longitudinal ao longo do muro de suporte de terras (nas traseiras dos três lotes A, B e C) para medir a sapata enterrada ou "não visível" que sabiam e verificaram então nessa data existir e cujas dimensões o Perito se limitou a presumir que seria excêntrica e para o lado "do terreno dos RR", "conforme o projecto" (no relatório inicial/complementar) quando, ao invés e na verdade, verificou na inspeção judicial em julgamento (a 7.12.2017) que a sapata não visível era em "L" a ocupar o terreno da A. ( cfr esquiço gráfico de 11.12.2017, ref citius 3804877), contudo não tendo tomado medições da sua largura e dimensão limitando-se, de novo, apenas a presumir as suas dimensões a partir de três buracos que a A/Recorrente escavou na data "à enxada" (e por sua iniciativa e apenas para mostrar que era em "L").

- Destarte, atento o erradamente decidido, com base em perícia invalida, que não constitui meio de prova idóneo e credível, devem todos os factos a ela inerentes serem julgados nulos e invalidados, repetindo-se a perícia que deve responder ao objecto de perícia proposto e requerido pela/Recorrente nos requerimentos de 29.09.2016 (rf citius 2710131) e de 17.05.2016 (ref citius 2285951), de 16.06.2016 (ref citius 70953996), e ainda a 11.02.2016 (ref citius 1954422 e ref citius 1962547 e 1962678), e proceder-se e ordenar-se a ampliação do pedido atento o requerido a 9.01.201 (ref citius 3869312) em face da inspeção judicial de 7.12.2017 e do "esquiço gráfico" do perito de 11.12.2017 (ref 3804877) e do objecto da perícia, o que foi indeferimento pelo Tribunal a quo por despacho de 11.02.2018.

- Efecivamente, o acórdão da Relação em crise enferma e assenta em erro de análise dos pressupostos processuais e fácticos dos autos, quanto à reclamada perícia singular e aos reiterados e requerimentos para a realização da perícia colegial ou de nova perícia, o que a A/Recorrente fez sempre, fundamentadamente.

 - Ao decidir como decidiu no Acórdão em crise, o Tribunal da Relação, ora recorrido, 468 nº1, al a) e al b) e 3, 469, nº1, 477 (2ª parte), 480 nº1, 481 n°1, 487 nº2 e 3, 489, 607 nº3, nº4 (faltando a análise critica das provas) e nº5 (segunda parte), 608 n°2 (no sentido da análise do tribunal recorrido dever ser efectiva em face da apontadas invalidade, contradições e deficiências ou insuficiência da perícia realizada) 611 nº1 (face à verificação da existência da sapata invisível em "L" somente na data da inspecção judicial de 7.12.2017, sem que tenham sido ordenadas diligencias para verificar toda a área ocupada por esta no subsolo no terreno da autora pelos três lotes A, B e C)..

- O Supremo Tribunal de Justiça é, organicamente, um tribunal de revista, pelo que a sua competência para a cognoscibilidade, em matéria de recurso (revista), está confinada a questões de direito (cf. arts. 674, nº 3, e 682, nº2 2, do NCPC (2013)), cabendo-lhe o papel residual de sindicar a forma e o modo como as instâncias procederam à aplicação das normas de direito probatório de que se serviram para obtenção dos juízos e veredictos que alcançaram por efeito da mesma.

- O Supremo Tribunal de Justiça pode sindicar a decisão da matéria de facto, provinda das instâncias, em duas hipóteses: (i) quando o tribunal recorrido tiver dado como provado um facto sem que se tenha produzido a prova que, segundo a lei, é indispensável para demonstrar a sua existência; ou (ii) quando tenham sido desrespeitadas as normas que regulam a força probatória de algum dos meios de prova admitidos no sistema jurídico português.

- No recurso da decisão sobre a matéria de facto, a lei não restringe a impugnação a um determinado número de factos, pelo que tendo o recorrente feito uma impugnação avantajada e ampla da decisão, desde que cumpra com o formalismo imposto na norma reguladora - (i) indicação dos concretos pontos de facto cuja decisão pretende ver alterada; (ii) indicação dos concretos meios probatórios que impõem diverso julgamento dos concretos factos indicados; e (iii) quando os meios probatórios tenham sido gravados, quais os depoimentos em que funda a discordância -, não pode o Tribunal da Relação abster-se ou eximir-se a conhecer do recurso, ainda que tenha que sindicar toda a prova produzida em lª instância.

- A segunda instância cabe proceder ao julgamento da decisão de facto por forma a corrigir erros de julgamento patentes nos tribunais de 1ª  instância.

- Neste sentido, sendo o Supremo Tribunal um Tribunal de Revista ao qual compete aplicar o regime jurídico que considere adequado aos factos fixados pelas instâncias, nº1 do artigo 674° do NCPCivil, sendo a estas e, designadamente à Relação, que cabe apurar a factualidade relevante para a decisão do litígio, a verdade é que o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa pode ser objecto do recurso de Revista, nas duas hipóteses previstas no nº3 do artigo 674º do CPCivil, isto é, quando haja ofensa de uma disposição expressa de Lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou haja violação de norma legal que fixe a força probatória de determinado meio de prova, como é o caso presente.

- Por outro lado, a Revista, no que tange à decisão da matéria de facto, pode ter por objecto situações em que o Tribunal recorrido tenha dado como provado determinado facto sem que se tenha realizado a prova que, segundo a lei, seja indispensável para demonstrar a sua existência; ou em que o Tribunal recorrido tenha desrespeitado as normas que regulam a força probatória dos diversos meios de prova admitidos no sistema jurídico; e ainda, quando o Supremo entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada ou ocorram contradições da matéria de facto que inviabilizem a decisão jurídica do pleito, caso específico do normativo inserto no artigo 682°, nº3 do CPCivil.

- Se o segundo grau fundamenta a alteração efectuada à materialidade impugnada fazendo apelo aos elementos de prova indicados pelo impugnante, cumpre desta sorte, de pleno, a função de reponderação que sobre si impende de harmonia com o disposto no artigo 662º, nº1 do CPCivil, exercendo as suas plenas competências na reapreciação da materialidade factual posta em causa, através de uma análise crítica dos depoimentos prestados acerca da mesma, conjugados com os elementos documentais.

- A reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem de ter, portanto, a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância.

- A Recorrente indicou nas suas conclusões de recurso, para além dos  pontos, de facto que no seu entender mereceriam resposta diversa, também quais os elementos de prova que no seu entendimento levariam à alteração proposta, tendo inclusivamente feito transcrever algumas declarações da Autora, dos Réus e das testemunhas, dando cabal cumprimento ao preceituado no artigo 640°, nº1, alíneas a) e b) do CPCivil.

- Sucede que logo a título prévio, a Recorrente, enunciou claramente nas alegações recursivas, ser patente a nulidade do despacho de 8.11.2016, designadamente como é notório da tramitação processual face  as inúmeras reclamações da autora à perícia, as quais nunca oram valoradas pelo tribunal a quo apesar das deficiências, insuficiências, obscuridade e falta de resposta do perito.

- No caso, o Tribunal da Relação indefere a invocada nulidade referindo (erradamente) apenas ter existido uma reclamação da autora à perícia -o que é falso e não corresponde à verdade -, prejudicando e comprometendo, assim, o juízo decisório proferido de indeferimento da "nulidade".

- O Acórdão ora recorrido enferma de erro notório sobre os pressupostos do recurso e da tramitação do processo, pois, como refere e conclui, erradamente, se "somente no dito requerimento" pugnou pela "realização de pericial colegial, louvando-se no art. 468° do CPC", "(...) se assim é, tal tem desde logo como consequência de que não formulou qualquer requerimento de segunda perícia, possível, e certo, ao abrigo do disposto no art. 487 e seguintes do mesmo CPC"

- Senão vejamos, no tocante à invocada nulidade do despacho de 8.11.2016, o acórdão recorrido decide, omitindo tramitação processual e, mais, alterando à verdade, ou seja, não corresponde à verdade, como se diz no Acórdão recorrido, que a autora "suscitou e requereu somente no dito requerimento, a realização de perícia colegial, louvando-se no art. 468a do CPC" (ponto 4.1. do acórdão).

- Tal afirmação do Tribunal Recorrido enferma de erro nos pressupostos de facto e processuais e, consequentemente, erro de apreciação e decisório, com a consequente errada subsunção dos factos e errada aplicação do direito.

- Discordando, resulta claramente da tramitação processual dos autos, ao invés do decidido, que a autora reclamou sempre da perícia singular do perito nomeado, por o mesmo falsear e omitir a realidade do existente no terreno da autora.

- Efectivamente, o perito apresentou o primeiro relatório pericial datado de 26.01.2016 em que faz pressupor ao tribunal que se deslocou ao local, o que, aliás, se impunha-se e era seu dever segundo as boas legis artis para verificar as áreas de ocupação no prédio da autora, por uma sapata de um muro de suporte de terras e ainda responder ao despacho de 8.10.2015, que fixou o objecto da perícia.

- O tribunal notifica as partes dessa perícia e a Autora/Recorrente logo, nesse momento reclamou, ao abrigo do disposto no art. 475 nº2 do CPC, invocando a falsidade da perícia, sustentado que o perito NUNCA se deslocou ao prédio da Autora para a sua realização. E para verificar e medir os elementos do muro que ocupavam o terreno da recorrente, nomeadamente o murete (nas traseiras do lote C, contíguo ao muro de suporte, com 0,17 cm de largura) e a sapata (vd. o requerimento no citius nº 1954422. de 11.02.2016).

- Concluiu, portanto, logo nessa primeira reclamação, a autora//Recorrente, pedindo a perícia colegial e ainda a ampliação da perícia em resultado de "todas as discrepâncias, deficiências, contradição evidenciadas e falta de fundamentação das respostadas dadas aos pontos 4 a 6 do relatório pericial, requer a Va. Ex"., ao abrigo do disposto nos art.s 468 nº1, al b), e 475°, nº1, do CPC, seja ordenada a perícia colegial, com a inerente deslocação ao local e utilização dos meios tidos por convenientes, para responderem "aos factos indicados sob os n° 1 a 9, no despacho constante de fls. 1262 e 1262 verso (1262 verso, pontos 8 e 9), de 03.09.2015", para o que se indicou perito e, ao abrigo do art. 475 n°1 e a titulo complementar ou para melhor esclarecimento do quesito da alínea a) doutamente fixado, por se entender que o mesmo deve ser desdobrado e clarificado em subpontos ou critérios para melhor se aferir de que moldes foi afectado o prédio da autora (vd os pontos b) e c) também doutamente fixados), indicou e precisou as questões a responder na perícia, no desenvolvimento dos pontos fixados (cfr o requerimento de Reclamação à perícia no citius nºs 1954422, e 1962547 e 1962678, de 11 e 15.02.2016)

- Em 29.04.2016, o perito veio prestar esclarecimentos com data de 28.04.2016 e confessa afinal existir um "erro grosseiro" na data em que alegadamente efectuou a "visita ao local" (em "19.01.2016"), não discriminando ou precisando a que "local" se refere já que, como declara, não entrou "na propriedade da A vedada com rede metálica, nas extremas norte/serventia, sul e poente" mas ainda assim, neste circunstancialismo, refere ainda que, alegadamente, "obteve toda a informação necessária para o desenvolvimento da perícia", salienta-se, portanto, elaborou o "relatório inicial" reclamado com base em plantas do projecto na Câmara Municipal que a A/Recorrente invocava na p.i serem falsas e não corresponderem à realidade da implantação e construção do muro de suporte de terras no terreno da A.! (cfr. requerimento com ref citius 2232338)

- A A./Recorrente, notificada de tais "esclarecimentos" do perito à reclamação da A., respondeu em requerimento de 17.05.2016 (ref citius 2285951), suscitando questões graves, de incompetência e negligência do perito, cfr requerimento da A/Recorrente de 17.05.2016, no citius sob o nº 2285951).

- Mais, confrontada com a falta de resposta do Tribunal a quo, a A/Recorrente insiste no pedido de visita pelo perito ao seu terreno para, para este verificar a área ocupada pelos RR (pela sapata e pelo murete contíguo ao muro de suporte de terras) no terreno da A, referindo que " notificada dos esclarecimentos do Sr. V sobre o Relatório Pericial que deu aos autos e tendo a Autora apresentado o seu requerimento de resposta a 17.05.2016, devidamente notificado aos Ilustres Mandatários da Contraparte, sem resposta, vem requerer a V.a Ex". se digne ordenar o que tiver por conveniente, designadamente atenta a falta de visita e/ou entrada no Sr. Perito nos prédios objecto da perícia ordenada e as deficiências, insuficiências e discrepâncias apontadas, conforme se reclamou ".(cfr o requerimento da A. de 16.06.2016, no citius sob o n° 2403406)

- Perante a reclamação e resposta da A/Recorrente, o Tribunal a quo, concluindo da falta da deslocação do perito ao local com as partes, profere despacho em 21.06.2016 para o Perito se deslocar então aos prédios e contactar e acordar, previamente, com os Mandatários a deslocação e elaborar um "relatório complementar", indeferindo a perícia colegial requerida pela A/Recorrente na sua reclamação à perícia por alegada "extemporaneidade" pois como sustenta "oportunamente ordenada a realização de perícia singular e fixado o respectivo objecto" (despacho de 21.06.2016, no citius nº 71720957)

- Sucede que, contrariamente ao despacho de 26.06.2016, a 1ª deslocação/visita do Perito ao prédio da A. já que no relatório inicial o Perito não entrou no prédio da A., com o acesso vedado.

- Donde, o "Relatório Complementar" foi o único relatório pericial realizado após a diligência, básica e fundamental, da deslocação ao local.

- A Recorrente confrontada com o teor do "relatório complementar" veio, de novo, reclamar, fundamentando e explicitando as razões de discordância, as discrepâncias, as deficiências e a insuficiências, que apontou concretizando, já que o Sr. Perito fez a assentar este relatório no "relatório pericial inicial de 26.01.2016", aquele que elaborou sem nunca ir ao local, ou seja, sem ter efectuado quaisquer medições (da sapata visível ou invisível ou do murete), sem ter ordenado quaisquer diligências, designadamente para verificar a existência de sapata enterrada (não visível) e a sua real configuração e dimensões, referindo, portanto, leviana e grosseiramente, como se transcreve: "(...) "b) altura do muro na zona do lote B: 3,00m2 até à zona demolida, sapata invisível, devendo ser excêntrica, conforme projecto, desenvolvendo-se integralmente nos terrenos dos RR" e, ainda, concluindo, "d) altura do muro na zona do lote A, na zona dos anexos: 3,30mts, afastado das construções da AAIanexos, entre, 0,10m e 0,40m e 0,74m, sapata não visível, devendo ser excêntrica, conforme projeto, desenvolvendo-se integralmente no terreno dos RR. (...)"

- Contrariamente ao acórdão em crise, reclamou, portanto, a autora, em 2ª reclamação à perícia e para a realização da segunda perícia "ao abrigo e nos termos do disposto no art. 468", nº1  al a) e b) e n°2 e no art. 475° n°1 do CPC" (cfr. o requerimento da A/Recorrente, de reclamação à perícia, datado de 29.09.2016, no citius 2710131)

- Nesse sentido, como conclui a A. no seu requerimento de 2- Reclamação à perícia, de 29.09.2016, pede, fundamentadamente, que "(...) atentas todas as discrepâncias, deficiências e contradição reclamadas e a manifesta falta de verificação e comprovação das questões levadas à perícia, nomeadamente na inspecção ao local na perícia singular realizada (que não tomou as alturas máxima e mínima do muro de suporte de terras de cada lote, nem efectuou escavações para verificar a natureza da sapata, nem consequentemente verificou a lage que ocupa o terreno da A., limitando-se a tecer presunções), requer a V. Ex". se digne ordenar a perícia colegial, ao abrigo e nos termos do disposto no art. 468°, nº1, al a) e b) e n°2 e no art. 475° nº1 do CPC, afim de verificarem os Sr. Peritos todos os elementos objecto da perícia, para o que se indica como perito: - Eng° civil, A (com a morada constante da lista oficial) ". (req. da A/Recorrente, de nova reclamação à perícia, no Citius 2710131, de 29.09.2016)

- Mais requereu a A/Recorrente, na sua reclamação à perícia (vd. o requerimento da A. de 29.09.2016), que para a realização da segunda perícia fosse nomeado um perito da especialidade da topografia "(...) afim de proceder ao levantamento das áreas dos lotes (conforme precisou o perito não ser sua área de competência técnica) afim de concluir das áreas ocupadas à A., serventia e via pública, quer no local, quer por comparação entre a planta do alvará de loteamento inicial com as telas finais dos lotes A, B e C" indicando, cumulativa e fundamentadamente, por ser pertinente e relevante para a boa decisão da causa, ao abrigo do disposto no art. 475º, nº1 do CPC, a titulo complementar ou para melhor esclarecimento do quesito da alínea a) doutamente fixado, que deve ser desdobrado e clarificado em subpontos ou critérios para melhor se aferir de que moldes foi afectado o prédio da autora (vd os pontos b) e c) também doutamente fixados), novos quesitos, mas de desenvolvimento dos fixados, (cfr. o requerimento de reclamação à perícia da A., de 29.09.2016, citius 2710131, com a junção ainda de 2 fotografias do local, a evidenciar as discrepâncias com o referido no relatório complementar reclamado e o resultado da perícia colegial no proc. 511/02 do 3e juízo do Tribunal da Comarca da …, também ao prédio da Autora e com os mesmos Réus (donos dos lotes), em divergência com o relatório pericial reclamado)

- Donde, diversamente do acórdão em crise que enferma de erro nos pressupostos processuais, da decisão e da aplicação do direito, como reclama e conclui então a A./Recorrente, em nova reclamação à perícia, por requerimento datado de 29.09.2016 (cfr plataforma citius 2710131), o perito parte de um primeiro relatório errado e sem qualquer fundamento por falta de deslocação ao prédio da autora e adopta o método de, no dito "relatório complementar", responder inclusive "por remissão" para o "relatório inicial", além de, de novo, nada ordenar para verificar, ou não, a existência da sapata "invisível" (enterrada) a ocupar o terreno da autora/recorrente.

- Assim nas respostas aos quesitos no relatório complementar (após a deslocação ao prédio da autora) o perito inclusive, não respondeu em função da deslocação ao local - ou seja, sabendo da existência de uma "sapata invisível" não ordenou qualquer diligência para verificar se efetivamente e na realidade era "excêntrica, como no projecto" como (erradamente) referia, e por outro lado, em outras respostas remete para o primeiro relatório pericial, aquele que elaborou sem se ter deslocado aos prédios objecto da perícia (vd a resposta ao ponto 3.1.a) "nada a acrescentar", respondida no relatório complementar relativamente ao relatório inicial de 26.01.2016)

- Donde, contrariamente ao acórdão em crise, proferido com omissão e valoração de todas as relações da Autora/Recorrente, o que constitui uma omissão de pronuncia do prédio acórdão e consubstancia uma nulidade, é manifesto e notório que contrariamente ao Acórdão em crise, a A/Recorrente reclamou, sempre, reiteradamente, do procedimento e do resultado do relatório inicial de 26.01.016, como dos esclarecimentos do perito de 28.04.2016, como do dito "relatório complementar" de 16.11.2016, invocando, sempre, falta de zelo, competência e diligência do perito, violação das legis artis na sua elaboração e nos "remendos" ("esclarecimentos" que apresenta) e bem assim, reclamando SEMPRE da sua deficiência, insuficiência, falsidade e das omissões das respostas e das conclusões nele vertidas, designadamente por nunca ter ordenado a realização de diligencias para verificar a dita "sapata invisível" que sabia existir no terreno da A.

- Por outro lado, como resulta já da inspecção judicial ao terreno da A., em julgamento, e confrontado o perito com os furos que a Autora escavou, não obstante o perito ter concluído que a sapata nesses locais - das traseiras dos lotes A, B e C era afinal em "L" - contrariando as suas conclusões no seu relatório complementar, o Perito continuou a não efetuar as medições de TODA A SAPATA ENTERRADA ("não visível") que era afinal com a configuração em "L", contrariando "o projecto" e a ocupar o terreno da AA.

- Ao decidir do indeferimento da nulidade invocada com fundamento as sucessivas reclamações da recorrente para que fosse realizada segunda perícia ou perícia colegial - e não unicamente "somente no dito requerimento", contrariamente ao decidido - é manifesto que o tribunal recorrido pretende manter uma FALSA perícia, que não corresponde à verdade do que existe no prédio da autora objecto de pericia, que o Perito não vistoriou, inspeccionou, nem lá se deslocou aquando da elaboração do primeiro relatório pericial de 26.01.2016, atrevendo-se de seguida e após determinação para ir ao prédio da autora, a elaborar o relatório complementar ordenado mas em que se limita a responder "por remissão" para o relatório pericial (que elaborou inicialmente sem a visita ao local e ao prédio da A), e sem nunca ordenar diligências e verificar "in loco" a existência da sapata, entre outros elementos!.

- Ora é manifesto que o Tribunal da Relação ora recorrido pretende dar como provado determinados factos emergentes da perícia em crise e criticável, sem que se tenha realizado a prova que, segundo a lei, seja indispensável para demonstrar a sua existência (a perícia com o objecto fixado por despacho de 8.10.2015, a fls 1286), e que a perícia singular nunca verificou.

- Na verdade, só na data da inspecção ao local pelo tribunal, em 7.12.2017, o perito então verificou que a sapata estava enterrada em "L" a ocupar o terreno da autora/recorrente, após a autora (desesperada) ter escavado uns buracos (um nas traseiras de cada lote B e C e dois nas traseiras do lote A) junto ao muro de suporte de terras.

- E foi, portanto, só na data da inspecção ao local pelo tribunal (em audiência de julgamento a 7.12.2017) que o perito tomou nota de algumas medidas da dimensão da sapata enterrada ("não visível"), depois da autora ter escavado apenas alguns buracos.

- A partir desses três ou quatro buracos o perito elaborou então um dito "esquiço gráfico" (ref citius 3804877, a 11.12.2017) em que extrapolou ou presumiu a largura da sapata "não visível" que ocuparia o terreno da A, que este não mediu entre os buracos escavados junto ao muro de suporte de terras, um em cada lote dos RR.

- O Tribunal ora recorrido, em face das sucessivas e anteriores reclamações à perícia apresentadas pela autora e verificada a manifesta insuficiência, deficiência, omissão do relatório pericial "inicial" e complementar" face à constatação da existência de uma sapata enterrada (dita "não visível") a ocupar o terreno da A. na data em que o Tribunal se deslocou ao local (7.12.2017), devia concluir da razoabilidade dos fundamentos das reclamações da autora à perícia inicial/complementar e da invocada necessidade do alargamento da perícia, ordenando oficiosamente a realização de uma nova perícia, segunda ou colegial, a fim de serem tomadas as reais dimensões da sapata "não visível a ocupar o terreno da autora, em todo o comprimento do muro do loteamento, e não apenas em 3 ou 4 buracos que a autora escavou "ad hoc" e o tribunal verificou no dia da inspecção ao local. 45.0 Tribunal recorrido, ao assim decidir, desrespeita as normas que regulam a força probatória dos diversos meios de prova admitidos no sistema jurídico, no caso, o valor e a força probatória de uma perícia, que deve ser realizada cabalmente, para se cumprir o objecto da perícia e da acção: a área da ocupação pelos réus do prédio da autor.

- O Tribunal de 1ª instância, e, agora, por omissão de pronuncia do próprio Acórdão da Relação, ao bastar-se com esclarecimentos assentes em juízos conclusivos do perito, de uma situação que o mesmo não verificou no local e no terreno da autora, limitando-se a elaborar um "croquis" ou "esquiço gráfico" só após a inspecção judicial do tribunal, em 7.12.2017 (ref citius 3804877, de 11.12.2017), somente com base no que verificou em 3 ou 4 buracos escavados pela autora, por sua livre iniciativa, na data da inspecção ao local do tribunal (7.12.2017), sem nunca ordenar quaisquer diligências para apurar a existência da dita sapata "não visível", afinal em "L" (contrariando o seu próprio relatório complementar de 16.09.2016, ref citius 2666950) a ocupar o prédio da Autora, como seja a escavação de uma vala contigua ao muro de suporte de terras para permitir concluir da largura da sapata do muro dos RR. que ocupa o prédio da autora, ao não valorar no Acórdão em crise as reiteradas reclamações à perícia da A., a invocar inclusive a necessidade do alargamento da perícia face ao observado só a 7.12.2017 (vd requerimento de 9.01.2018 ref citius 3869312) - bem como ignorando as anteriores reclamações ao tribunal a quo das deficiências, insuficiências e contradições da perícia singular (vd requerimentos da A, de 11.02.2016 de 17.05.2016, 16.06.2016, 29.09.2016) viola as mais elementares regras subjacentes à validade de uma perícia judicial, como meio e prova, que deve ser suficiente e adequadamente fundamentado, se necessário com a tomada de medições aos elementos edificados visíveis e invisíveis existentes no local, por forma a permitir formar um juízo técnico-científico sobre a realidade concretamente existente no terreno e não meramente presumida ou extrapolada.

- A perícia, através de perito nomeado pelo tribunal, não pode ser uma prova realizada "ad hoc", que e elaborada e corrigida "k medida" do desenrolar do processo (com alegados requerimentos de "esclarecimentos" do perito face às sucessivas deficiências, obscuridade e omissões reiteradamente reclamadas pela A/Recorrente), mais quando falha logo nos seus pressupostos básicos, como seja, ter sido realizada com a falta da visita do perito ao terreno para aferir do objecto da perícia (no caso, as áreas ocupadas no terreno da autora).

- Também a metodologia da perícia para chegar às conclusões não pode ser obscura, deficiente ou insuficiente sob pena dos factos apurados serem inócuos ou parciais, falsos ou claramente desvirtuados e manipulados.

- Não pode, em suma, a perícia que tem por objecto aferir das áreas ocupadas num prédio subsistir sem que tenha sido efectuada a visita ao local pelo perito.

- Consequentemente, não pode um relatório "complementar" responder aos quesitos "por remissão" para um relatório pericial inicial deficiente, obscuro ou, na prática, "inexistente" (por falta de observação no loca dos factos pelo perito) sob pena de reconduzir ao ridículo da intenção do julgador que determinou a deslocação ao local do perito (vd despacho de 21.06.2016), além de deturpar, comprometer e corromper a descoberta da verdade material.

- Deste modo, um relatório "complementar" com pretensas respostas - no caso maioritariamente "remissivas" para um relatório inicial deficiente e obscuro -, não obstante a aparência de tecnicidade e cientificidade, não constitui necessária ou obrigatoriamente um "juízo técnico" ou "cientifico" que possa ser valorizado como "perícia", afastando-se assim da "ciência de favor" e da propensão para esconder erros e deficiências nos factos e a metodologia empregue - o que apenas é evitável pela observância rigorosa das normas do processo e pela exposição clara e racional dos fundamentos da perícia.

- Discordando do decidido, a recorrente, além da reclamação ao relatório pericial inicial, também reclamou do relatório "complementar" no seu requerimento de 29.09.2016 (ref citius 2710131), como anteriormente também reclamou dos esclarecimentos do perito de 28.04.2016 (cfr o requerimento de reclamação da A/Recorrente de 17.05.2016, ref citius 2285951).

- A perícia está sujeita às regras do art. 6º, nº1 e nº3, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que estabelecem que deve ter subjacente um processo equitativo, ou seja, deve também ela sujeitar-se ao principio da igualdade de armas e do contraditório, devendo se assegurada a imparcialidade, transparência, clareza e suficiência cabal da perícia, designadamente através da necessidade de se realizar, a requerimento ou oficiosamente, uma segunda perícia ou uma perícia colegial.

- O principio da igualdade pressupõe que a cada parte seja permitida expor a sua pretensão e vê-la defendida da forma como a apresentou, nada obstando a que, requerendo fundamentadamente e salientando as imprecisões insuficiência, obscuridade e deficiência da pericial realizada, obtenha uma segunda perícia, ou seja, uma segunda opinião ou uma perícia colegial, até porque a simples possibilidade de discutir o relatório da perícia em audiência de julgamento pode não ser suficiente para que a questão objecto da perícia se considere cabalmente respondida ou esclarecida, designadamente se, como é o caso destes autos, o relatório pericial inicial for deficiente, obscuro ou insuficiente e o relatório complementar for simplesmente "remissivo", com a gravidade de somente na inspecção judicial do Tribunal a quo ao local se ter detectado a existência da sapata enterrada a ocupar o prédio da autora, a qual não tinha sido detetada, referida e medida nem no relatório pericial inicial, nem no relatório complementar!

- Tratando-se de uma perícia à área ocupada de um determinado prédio por um determinado elemento construtivo, uma base factual irrepreensível, com base na visita ao local pelo perito e na medição concreta e objectiva do elemento construtivo, é condição essencial e indispensável do acerto do "juízo cientifico" ou da sua aceitabilidade judicial, mesmo que para tal seja necessário proceder a escavações, valas ou furos par aferir da parte do elemento construtivo (sapata ou outro) edificado sob a cota natural do terreno.

- A exposição compreensiva e lógica da metodologia usada é outro requisito essencial.

- São os fundamentos fácticos e metodológicos que conduzem às conclusões da perícia que permitirão, por sua vez, ao tribunal verificar e aceitar a relação logico-cientifica que se estabelece entre os fundamentos e a conclusões do relatório, sem cair na mera adesão acrítica de uma aparente tecnicidade ou cientificidade, e fixar os factos.

- No caso, entende a recorrente que é criticável que o tribunal aceite o "relatório pericial (inicial de 26.01.2016 ou complementar de 16.09.2016) quando este não fornece os factos indispensáveis à sua compreensão ou quando os fornecidos não apontam nesse sentido ou não permitem concluir com certeza da situação existente - caso em que o Tribunal ora recorrido "teima" em aceitar um relatório pericial (inicial complementar) em que é manifesto a ausência de verificação da existência da sapata enterrada ou "não visível" a ocupar o terreno da autora (portanto além daquela que era visível), e a ausência de tomada de medições para aferir e concluir no relatório pericial da área, extensão e largura que a sapata enterrada ocupa no terreno da autora decorrente do muro de suporte de terras dos lotes A, B e C dos réus, desvalorizando o pedido da recorrente para a realização de uma nova perícia ou perícia colegial, em sucessivas reclamações da perícia singular realizada, preterindo assim o tribunal a quo, ao não censurar a decisão objecto de impugnação, a realização de nova perícia.

- Não pode deixar de ser criticada a actuação e decisão do tribunal de 1ª instância que perante as reiteradas reclamações da autora, fundamentadas, quer ao relatório pericial inicial, quer ao complementar, por ser omisso, insuficiente e deficiente, não ordena, oficiosamente, a segunda perícia.

- Como se refere no Acórdão de Fixação de Jurisprudência de 19-10-1995, "Nessas circunstâncias, impõe-se que o juiz, sem necessidade de qualquer sugestão das partes, ou mesmo contra a sua passividade, exercite aquele poder/dever de investigação oficiosa. Não o actuando, a matéria de facto em que assentam as conclusões poderá não constituir base suficiente para a matéria de direito ou mesmo inviabilizar essa decisão, caso em que o ST] terá o dever de, também ele, accionar os poderes de investigação oficiosa desses vícios", como impõe, actualmente, o art. 682º do CPC e o Acórdão de Fixação de Jurisprudência de 19-10-1995 (In DR, Série I-A, publicado a 28.12.1995)

- Deste modo, no que concerne à validade da perícia, ao tribunal cabe aferir se a prova foi produzida de acordo com a lei ou se não foi produzida contra proibições legais (como foi, no caso vertente, o relatório pericial "inicial" que foi produzido pelo perito sem a presença das partes ou dos seus mandatários e sem a visita ou deslocação do perito ao local dos prédios para aferir da área ocupada no prédio da autora, conforme o objecto determinado); tal como compete ao Tribunal examinar se o procedimento da perícia está de acordo com normas da técnica ou da prática corrente e das boas legis artis.

- No caso, tendo a autora reclamado, repetidamente, pela medição da sapata visível e enterrada a ocupar o seu terreno, impunha-se ao perito adotar as necessárias diligências e solicitar os meios necessários à sua verificação (por escavação, furos ou valas) ou ao tribunal a quo ordenar a realização de tais diligencias, oficiosamente, mesmo na falta de reclamação da parte, atenta a invocação dessa factualidade controvertida na petição inicial e no saneador, e atento objecto da acção e da perícia ordenada.

- Por outro lado, contrariamente ao Acórdão ora em crise, que nesta vertente omitiu a sua pronuncia, duvidas não há, de que um relatório pericial (quer o inicial, quer o complementar realizados nos presentes autos) em que a fundamentação seja insuficiente ou inexistente (no caso, em face das respostas remissivas do relatório "complementar" para o relatório pericial "inicial" efetuado sem a visita do perito ao prédio ocupado) é um meio de prova inválido.

- Neste sentido, basta atentar à ata da inspeção judicial do tribunal aos prédio da autora/recorrente, momento em que o perito verificou existir uma sapata enterrada (além da visivel) quando foi confrontado no local com três ou quatro buracos escavados ela autora "à enxada".

- Perante tal evidência, somente na data da inspeção judicial ao local, o perito apressou-se então a entregar nos autos um "croquis" ou "esquiço gráfico" datado de "7.12.2017" (ref citius 3804877) onde descreve uma "sapata em L" com a base edificada no terreno da autora, apresentando algumas medições presumidas a partir dos 3 ou 4 buracos escavados pela autora nas traseiras de cada lote, conforme representações "Pormenor A", "Pormenor B" e "Pormenor C" cujas "medições" nele apõe, medições essas que verificou apenas em cada um desses buracos, portanto, tirando, somente, medidas parciais.

- Foi, erradamente, a partir destas medidas parciais da sapata enterrada e posta à vista nesses buracos, que o perito extrapolou, presumindo, as dimensões da sapata a partir da distância entre os "buracos".

- Ora, ao assim actuar o perito e o tribunal a quo, sem ordenar quaisquer diligências tendentes à abertura de uma vala longitudinal e contigua ao muro de surte de terras para verificar a largura da sapata em "L", no terreno da autora, como resulta da junção pelo perito do aludido "croquis" aos autos, em 7.12.2014, tal conduta viola as legis artis da perícia, enquanto meio de prova técnico-cientifico.

- Por outro lado ainda, no que respeita à invocada nulidade da sentença recorrida, atento tudo o supra vertido, e o erro notório na apreciação da prova e do direito aplicável, salienta-se que mal andou o Acórdão Recorrido ao não reexaminar e proceder ao exame critico da prova e dos factos assentes na aludida perícia, que se reputa por invalida e de nenhum valor probatório por manifesta violação dos princípios da transparência, da imparcialidade, da certeza e da segurança jurídica, comprometendo assim o principio da descoberta da verdade material.

- Senão vejamos, em face da manifesta contradição entre o "esquiço gráfico" dado aos autos a 11.12.2017 pelo perito após a verificação, em julgamento, da existência da sapata (dita antes invisível) enterrada mas em "L" e não excêntrica e conforme o projecto, como antes concluía e presumia o perito no relatório inicial/complementar, a A/Recorrente, em coerência, veio requerer a ampliação da perícia e dos temas da prova em virtude da necessidade de alteração do pedido (ref. Citius 3869312, de 9.01.2018), concluindo, impugnando especificadamente os documentos juntos sob a ref citius 76222641, atenta a verificação da ocupação do terreno da A. também pela sapata "invisível" (além da ocupação pela sapata visível como já referida o perito no relatório pericial "complementar"), afinal agora verificada (em 7.12.2017), na inspecção judicial, ser em "L".

- Ora, mal andou o tribunal a quo, como pugnou a Recorrente no seu recurso, por manifesta preterição do direito da A. em ver cabalmente ancorada a ocupação do tereno da A. tornada notória na inspecção judicial e no esquiço gráfico de 11.12.2017, pela descoberta da sapata "não visível" ainda que de forma parcial, nos buracos escavados nessa data. Tal resultado determinava a ampliação do pedido, como a A. requereu, fundamentadamente, assim sendo nulo o despacho de indeferimento de 11.02.2018 e bem assim a sentença em crise, como ora se mantém por manifesta omissão de pronuncia do Tribunal recorrido, no acórdão em crise.

- Por outo lado, como foi provado por documentos, a Ré L bem sabia desde 2002 estar divorciada e ter realizado a partilha judicial, cabendo o lote A à mesma, tendo falsamente suscitado a intervenção provocada do cônjuge, residente no estrangeiro, sabendo que com tal conduta, além da demora da acção com a citação do cônjuge no estrangeiro, obrigava a A. a ter despesas com a transcrição dos articulados, cujo valor ascendeu, indevida e infundadamente, por ato da ré que nunca corrigiu até 2006, na quantia de 8.000,00€ documentada nos autos.

- Tal ato da ré L consubstancia despudorada litigância de má fé, pelo que mal andou o Acórdão recorrido ao não valorar essa concreta factualidade expressamente invocada no recurso da sentença, o que consubstancia omissão de pronuncia ou erro na apreciação e valoração da prova documental dada aos autos, no caso a certidão do divorcio e partilha junta pela autora/recorrente no pedido de litigância de má fé, assim devendo ser condenada, como pugnou.

- Violou assim o Acórdão em crise, por omissão de pronúncia e por errónea apreciação da matéria de facto, e deficiente interpretação ou aplicação do Direito, designadamente, o disposto nos art.s 468 nº1, al a) e al b) e 3, 469, n°1, 477 (2ª parte), 480º nº1, 481 nº1, 487 nº2 e 3, 489º, 607 nº3, n24 (faltando a analise critica das provas) e nº55 (segunda parte), 608 nº2 (no sentido da analise do tribunal recorrido dever ser efectiva em face da apontadas invalidade, contradições e deficiências ou insuficiência da perícia realizada) 611 nº1 (face à verificação da existência da sapata invisível em "L" somente na data da inspecção judicial de 7.12.2017, sem que tenham sido ordenadas diligencias para verificar toda a área ocupada por esta no subsolo no terreno da autora pelos três lotes A, B e C), o art. 615 nº1 al c) e d) e 674 nº1 al a), b) e c), todos do CPC e ainda o art. 6º, nº1 e nº3, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Os Recorridos não apresentaram contra alegações.

II Põe-se como questão a resolver no âmbito do presente recurso a da eventual nulidade no indeferimento da perícia colegial requerida e a sua influência na decisão de mérito.

As instâncias declararam como assentes os seguintes factos:

«1. Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de… sob o número …, a fls. 98 do Livro B 137 de …, e aí inscrito a favor da A. M e marido J M F pela Ap. 1 de 26.11.1975, o prédio composto de terra de cultura com árvores de fruto, sito na Rua da …, inscrito na respectiva matriz sob o artigo … - cfr. documento de fls. 39 a 42, cujo teor se dá aqui por reproduzido.

2. O prédio referido em 1. adveio à A. através de partilha, em herança, efectuada pela escritura lavrada em 10 de Abril de 1975 a fls. 50 do livro B72 do Segundo Cartório Notarial de…

3. Os pais da A. que adquiriram o prédio em data anterior a 1975, e ela própria, a partir de 26.11.1975 até ao presente, têm pago os impostos incidentes sobre o prédio, trabalhando e revolvendo a terra, semeando-a e cultivando-a; cuidando dos frutos das árvores e consumindo-os; e recolhendo o milho na eira, armazenando outros numa arrecadação do prédio.

4. A confinar com o prédio da A. foi aprovado um loteamento com a área total de 5.053 m2, de um prédio rústico descrito na Conservatória do Registo predial sob o n.º …, composto de três lotes ordenados de A a C, com alvará de loteamento n.º 1/2000, em nome da R. C, Lda. Foi autorizada a constituição dos três lotes, tendo o lote A a área de 1910m2, o lote B 1508m2 e o lote C 1004m2 – cfr. documento de fls. 46 a 57, cujo teor se dá aqui por reproduzido.

5. O lote C foi adquirido em 27.08.2004, por compra, pelo R. G e encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial da Figueira de… com o n.º… O lote B foi adquirido em 16.10.2003, por compra, pelo R. J – e encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de… com o n.º … O lote A foi adquirido, por compra, pela R. L – descrito na Conservatória do Registo Predial da Figueira de… com o n.º ...

6. A fracção A do lote B foi adquirida em 30.05.2005 ao Réu J e mulher pelos habilitados J M S e esposa S S e a fracção B do lote B foi adquirida em 08.09.2005 àqueles pelos habilitados A G e S P – cfr. certidão de escrituras de compra e venda de fls. 10 a 17 e 19 a 25 do apenso A, cujo teor se dá aqui por inteiramente reproduzido.

7. A primeira ré C é a titular do projecto de loteamento aprovado sendo em nome desta que as alterações ao mencionado loteamento são apresentadas na Câmara Municipal de…

8. Desde a construção do loteamento que o prédio da A. ficou delimitado, nas estremas nascente e sul do aludido loteamento, por um muro constante de um projecto inicial apresentado pela 1ª Ré e aprovado pela Câmara Municipal de...

9. O prédio da A. era delimitado, anteriormente à construção do muro que o separa dos lotes A, B, e C, por um declive natural, de terra, ficando o prédio da A. abaixo da cota do prédio dos réus.

10. A 1ª Ré alterou o projecto inicial do muro de vedação passando este a ser construído como um muro de suporte de terras, em betão armado, em toda a extensão do loteamento. A altura do muro varia, do lado do prédio da autora, entre 2,10m e 4,40m.

11. A 1ª Ré procedeu ao movimento de terras, enchendo os lotes contíguos à medida da altura do mencionado muro de suporte de terras.

12. A demolição e reconstrução de 46m2 do muro de betão, com um sistema de drenagem de águas custaria um valor aproximadamente €29.700,00 (vinte e nove mil e setecentos euros). (alterado pelo Tribunal da Relação)

E o seguinte em termos de factos “não provados”:

«a) O declive natural existente entre o prédio da A. e o prédio dos Réus era de 0,50 metros antes da construção do muro.

b) A construção do muro, na zona atribuída ao lote C, estendeu-se ao prédio da A. em 20 m2. E na zona atribuída ao lote B em 18,50 m2. E na zona do lote A em 22,31 m2.

c) A sapata do muro do lote C, numa extensão de 30 metros, está implantada 1 metro dentro do prédio da A., ocupando ainda uma área correspondente a 12 metros aterrados, somando o total da área (pertencente ao prédio da A.) ocupada pelo lote C, 42m2. d) O lote C estendeu-se ainda a uma faixa longitudinal de 40 m2 pertencente à via pública. E o lote B estendeu-se a uma faixa longitudinal de 27,50 m2 pertencente à via pública.

e) A situação referida nas alíneas b) a d) e a omissão e tolerância do 5º R. Município da … provocou e vem provocando à A. forte angústia, sofrimento e ansiedade.

f) Provocou perturbação da paz do lar da A. que passou a ter frequentes discussões com o seu marido e perturbação do sono da A. que passou a ver reforçada a sua medicação antidepressiva e ansiolítica.

g) A Câmara Municipal de …, não obstante os requerimentos e os sucessivos pedidos de informação da A., não faculta as requeridas informações que permitem a A. conhecer da área ocupada do seu prédio, fazendo-a recorrer ao Tribunal Administrativo e Fiscal de … para fins de obtenção das informações e passagens de certidões.

h) A A. vive a correr para … a fim de acompanhar os processos de intimação para comportamentos, com a preocupação agravada e desgaste físico, emocional e psíquico daí resultante.

i) A A. despendeu com o acompanhamento administrativos dos processos, pedido de certidões e informações e as deslocações a quantia de €500,00.

j) Os levantamentos topográficos custaram à A. €450,00.

k) O prédio da A. tem um valor de cinco euros por metro2.

l) O valor de 100 m2 do terreno pertencente à A. é de 100 euros.

m) O muro delimitador de Nascente e Sul do loteamento foi construído em 2000.

n) A Ré L adquiriu o lote A na convicção de que os limites do seu lote e o muro ali construído respeitavam as estremas do prédio loteado. Jamais idealizou que o mesmo pudesse, num qualquer dos seus limites, violar o direito de propriedade de terceiros, designadamente da Autora, razão pela qual ali edificou uma moradia e anexos.

o) O R. G adquiriu o lote C em 25.08.2004 já murado, com uma casa nele edificada (apenas a estrutura de alvenaria, sem acabamentos), com o projecto aprovado pela Câmara Municipal da …, na convicção de não prejudicar direito de outrem.

p) A A. sabe que o 2º R. só adquiriu o lote C em data muito ulterior a construção de todos os muros e à implantação da vivenda no seu lote.

q) Sabe também que o terreno do loteamento se situava, como situa, a uma cota muito mais elevada do que o terreno da A., diferença de nível essa que, em relação ao lote C, era superior a 3 metros.

r) Sabia ainda que a linha divisória se situava na parte inferior do declive, pertencendo todo o talude ao loteamento.

s) O terreno da A. não tem viabilidade construtiva.

t) Os Réus, actuando em comunhão de esforços e interesses, instruíram o processo de obras com requerimentos de alteração, anexando memórias descritivas das propostas alterações e peças desenhadas e escritas, reconfigurando todas as construções anteriormente aprovadas (moradias e muro de vedação), bem sabendo que lesavam o direito de propriedade da Autora.».

 

Vejamos.

Insurge-se a Autora contra o Acórdão recorrido, uma vez que na sua tese ocorreu a «nulidade do despacho de 8 de Novembro de 2016 porquanto o indeferimento da perícia colegial requerida ou o despacho que a não ordena oficiosamente apesar das graves violações das legis artis que subjazem a uma perícia judicial, e notórias deficiência, insuficiência, falta de diligência e zelo na sua realização que atentam contra a sua credibilidade e idoneidade de tal meio de prova para fundamentar um juízo critico e técnico-científico do tribunal a quo, consubstanciam intolerável e inadmissível preterição da prova e a violação do princípio da economia processual e da descoberta da verdade material.» E continua, «Na verdade a sentença recorrida fez assentar os seus fundamentos nas erradas premissas e conclusões da perícia, inválida como meio de prova técnico-científico por ter sido deficientemente realizada, ou seja, sem o perito proceder à inspecção e averiguação necessários à elaboração do relatório pericial, em violação do art. 480 n°1 do CPC, e sem ordenar e/ou "socorrer-se de todos os meios necessários ao bom desempenho da sua função" (art. 481 nº1), não tendo solicitado à A., nem sido ordenado oficiosamente, para descoberta da verdade material. Efecivamente, o acórdão da Relação em crise enferma e assenta em erro de análise dos pressupostos processuais e fácticos dos autos, quanto à reclamada perícia singular e aos reiterados e requerimentos para a realização da perícia colegial ou de nova perícia, o que a A/Recorrente fez sempre, fundamentadamente.».

O Supremo Tribunal é um Tribunal de Revista ao qual compete aplicar o regime jurídico que considere adequado aos factos fixados pelas instâncias, nº1 do artigo 674º do NCPCivil, sendo a estas e, designadamente à Relação, que cabe apurar a factualidade relevante para a decisão do litígio, não podendo este Tribunal, em regra, alterar a matéria de facto por elas fixada.

O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto do recurso de Revista, a não ser nas duas hipóteses previstas no nº3 do artigo 674º do CPCivil, isto é: quando haja ofensa de uma disposição expressa de Lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou haja violação de norma legal que fixe a força probatória de determinado meio de prova, cfr José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil Anotado, vol 3º, tomo I, 2ª edição, 162/163 e inter alia os Ac STJ de 6 de Maio de 2004 (Relator Araújo de Barros), 7 de Abril de 2005 (Relator Salvador da Costa), 18 de Maio de 2011 (Relator Pereira Rodrigues), de 23 de Fevereiro de 2012 (Távora Victor) e de 15 de Novembro de 2012 da ora Relatora, in www.dgsi.pt.

A Revista, no que tange à decisão da matéria de facto, só pode ter por objecto, em termos genéricos situações excepcionais, ou seja quando o Tribunal recorrido tenha dado como provado determinado facto sem que se tenha realizado a prova que, segundo a Lei, seja indispensável para demonstrar a sua existência; o Tribunal recorrido tenha desrespeitado as normas que regulam a força probatória dos diversos meios de prova admitidos no sistema jurídico; e ainda, quando o Supremo entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada ou ocorram contradições da matéria de facto que inviabilizem a decisão jurídica do pleito, caso específico do normativo inserto no artigo 782º, nº3 do NCPCivil.

Decorre do disposto no artigo 607º do NCPCivil que no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre, segundo o qual o Tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir, para a existência ou prova do mesmo, qualquer formalidade especial, caso em que esta não pode ser dispensada.

De acordo com este princípio, que se contrapõe ao princípio de prova legal, vinculada pois, as provas são valoradas livremente, sem qualquer grau de hierarquização, nem preocupação do julgador quanto à natureza de qualquer delas, cedendo o mesmo naquelas situações vulgarmente denominadas de «prova taxada», designadamente no caso da prova por confissão, da prova por documentos autênticos e dos autenticados e particulares devidamente reconhecidos, cfr artigos 358º, 364º e 393º do CCivil.

Enquanto o princípio da prova livre permite ao julgador a plena liberdade de apreciação das provas, segundo o princípio da prova legal o julgador tem de sujeitar a apreciação das provas às regras ditadas pela Lei que lhes designam o valor e a força probatória e os poderes correctivos que competem ao Supremo Tribunal de Justiça quanto à decisão da matéria de facto, circunscrevem-se em verificar se estes princípios legais foram, ou não, no caso concreto violados.

Daí que a parte que pretenda, no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, censurar a decisão da matéria de facto feita nas instâncias só poderá fazê-lo – no rigor dos princípios - por referência à violação de tais regras e não também em relação à apreciação livre da prova, que não é sindicável por via de recurso para este Órgão Jurisdicional.

Por outras palavras e em termos práticos, dir-se-á que o que o Supremo pode conhecer em matéria de facto são os efectivos erros de direito cometidos pelo tribunal recorrido na fixação da prova realizada em juízo, sendo que nesta óptica, afinal, sempre se está no âmbito da competência própria Supremo Tribunal de Justiça, pois o que compete a este tribunal é pronunciar-se, certamente mediante a iniciativa da parte, sobre a legalidade do apuramento dos factos, designadamente sobre a existência de qualquer obstáculo legal a que a convicção de prova formada nas instâncias se pudesse firmar no sentido acolhido.

In casu, a Recorrente insurge-se contra a manutenção da materialidade dada como não provada em primeiro grau, por parte do Tribunal da Relação, em sede de impugnação recursiva, a respeito, por si encetada, pois entende que houve violação de prova taxada, no casu, a perícia efectuada.

Conforme deflui do artigo 662º, nº1 do NCPCivil  a decisão de primeira instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

No caso sujeito, a Recorrente impugnou expressamente determinada matéria factual que no seu entender, face às incorrecções e irregularidades ocorridas na perícia a matéria referida nas alíneas a) a K) e m) foi declarada como não provada, concluindo que deveria ter merecido resposta diversa da obtida, o que, a ser deferido, conduziria a uma solução jurídica diversa da propugnada pelo primeiro grau.

A reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância pois só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição, cfr neste sentido inter alia o Ac STJ de 24 de Setembro de 2013 (Relator Azevedo Ramos), in www.dgsi.pt.

Com efeito, embora não se tratando de um segundo julgamento, mas antes de uma reponderação, até porque as circunstâncias não são as mesmas, nas respectivas instâncias, não basta que não se concorde com a decisão dada, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efectivamente, no caso, foram produzidos, mas não limita o segundo grau de sobre tais desconformidades previamente apontadas pelas partes, se pronuncie, enunciando a sua própria convicção, não estando, de todo em todo, limitada por aquela primeira abordagem pois não podemos ignorar que no processo civil impera o principio da livre apreciação da prova, cfr artigo 607º, nº5 do NCPCivil (anterior artigo 655º, nº1), cfr Ac STJ de 28 de Maio de 2009 (Relator Santos Bernardino) e de 2 de Dezembro de 2013, da aqui Relatora, in www.dgsi.pt.

Assim sendo, prima facie, há que concluir que a apreciação da prova pericial está sujeita à liberdade de julgamento, uma vez que a força probatória das respostas dos peritos é livremente fixada pelo Tribunal nos termos expressos no normativo inserto no artigo 389º do CCivil.

Coisa diversa, é a imputação que é feita a tal meio de prova, que no dizer da Recorrente está eivado de vícios que lhe toldam a credibilidade e a idoneidade.

Convém, contudo, fazer um sobrevoo sobre o processado, por forma a averiguar em que medida está ou não inquinado o sobredito meio de prova.

- A fls 1154 a 1156, a Autora, aqui Recorrente, apresentou o seu requerimento de meios de prova, onde, além do mais, peticionou o seguinte:

«renova a prova pericial requerida sobre a tomada de medições às áreas dos lotes A, B e C e do loteamento com alvará n°l/00 a fim de serem confrontadas as áreas declaradas pelos RR. (nas plantas e telas finais), com o índice urbanístico (construção) para os lotes e com as áreas ocupadas ao prédio da A. e ao domínio público, tudo conforme petição

inicial.                  

Requer, em conformidade, a nomeação de topógrafo pelo Tribunal da lista oficial de peritos a fim de tomar as aludidas medições mais devendo responder ao seguinte quesito;

- Qual o índice  urbanístico  de  construção  para   o   loteamento   e

respectivos lotes A, B e C à data?

As medições a efectuar à área real do loteamento e dos lotes destinam-se à prova dos seguintes factos; se em tais lotes era permitida a construção das moradias neles implantadas e, por essa via, na falta de área dos lotes, as áreas dos mesmos foram alteradas nas plantas e telas finais com a ocupação do prédio da A. e do domínio público.».

- Tal requerimento foi objecto do seguinte despacho a fls 1286:

«No que respeita à perícia, por a mesma não se afigurar impertinente, admite-se a mesma. A perícia será realizada por perito único, a nomear pelo tribunal, e terá por objecto os factos indicados sob os n.° 1 a 9. no despacho constante de fls. 1261 e 1261 verso.

A perícia versará ainda sobre os seguintes pontos:

a)            quais  as  alterações  verificadas  ao  longo  do  tempo  no

loteamento com o Alvará n.° 1/2000?

b)           através dessas alterações o prédio da autora foi afectado? Em

caso afirmativo, em que medida?

Para proceder à perícia nomeia-se o Eng° M, da lista oficial do Distrito Judicial de Coimbra (lista actualizada em 02.10.2015), que prestará o compromisso a que alude o artigo 479.° do CPC por escrito.

Prazo: 30 dias.».

- Na sequência de tal despacho foi apresentado pelo Perito nomeado o Relatório que faz fls 1305 a 1351, objecto de reclamação pela Autora, aqui Recorrente de fls 1354 a 1360, onde esta além do mais suscita ao Tribunal que seja ordenada uma perícia colegial.

- O Relatório pericial apresentado foi objecto de esclarecimento a fls 1397 por parte do Perito nomeado.

- Na sequência de tal esclarecimento a Autora, aqui Recorrente, vem de fls 1451 a 1454, insurgir-se de novo contra o relatório pericial e respectivo esclarecimento, bem como renovar o pedido de realização de uma perícia colegial, anteriormente pedida no seu requerimento de fls 1354 a 1360.

- Por despacho de fls 1455, proferido a 21 de Junho de 2016 e notificado à Recorrente, ali Requerente, em 23 de Junho de 2016, foi ordenada a realização de nova inspecção ao local e notificadas as partes para estarem presentes à diligência, bem como o Perito para remeter o relatório complementar ao Tribunal; nesse mesmo despacho foi emitida pronuncia sobre as perícias colegiais pedidas pela Recorrente, as quais foram indeferidas por extemporaneidade.

- De fls 1457 a 1469, consta o Relatório complementar apresentado pelo Sr Perito nomeado em cumprimento do supra aludido despacho.

- A fls 1473 a 1481, vem de novo a Autora aqui Recorrente, apresentar nova reclamação, agora incidente sobre o relatório complementar, e reiterar o seu requerimento para efectivação de uma perícia colegial, requerimento esse que veio a ser indeferido pelo despacho de fls 1486 e 1487, datado de 8 de Novembro de 2016, o qual foi objecto de recurso de Apelação, a qual foi instruída e julgada em separado (apenso E), pelo seu não conhecimento como apelação autónoma, cfr despacho singular do Relator de fls 200 a 204 do Apenso E. 

- Esse despacho assentou na seguinte fundamentação:

«[a] pretensão rejeitada, neste contexto processual e probatório pericial, constitui um incidente suscitado no quadro da prova pericial anterior, já admitida e realizada, visando-se abalar/controlar o seu valor probatório.

Não se trata, pois, de autónomo meio de prova, cuja rejeição desencadeasse a aplicação do preceito da al. d) do n.º 2 do art.º 644.º do NCPCiv., mas ainda de “incidente suscitado no âmbito da produção da prova” já produzida ou em produção, nos antípodas, pois, da rejeição do meio de prova (a prova pericial que havia sido requerida, admitida e produzida).

Não quer isto dizer que a decisão proferida não seja recorrível, mas apenas que não é suscetível de apelação autónoma, devendo ser impugnada, sendo o caso, a final, no recurso que venha a ser interposto da sentença dos autos (n.º3 do dito art.° 644.º) ou nos moldes do n.º 4 deste dispositivo legal.».

É na sequência dessa decisão tomada primeiramente pela Relação de Coimbra em sede de Apelação em separado, que a Recorrente no recurso de Apelação da sentença de primeiro grau produzida nestes autos, que vem repristinar a questão das irregularidades na produção da prova pericial, mormente no que tange ao indeferimento do pedido da perícia colegial.

O Acórdão recorrido, quanto a essa problemática concluiu do seguinte modo:

«[a] lógica da argumentação da A./recorrente é a de que o Tribunal a quo desacertadamente não admitiu a perícia colegial, não determinou a realização de segunda perícia (considerando não serem as razões de discordância, as insuficiências e as deficiências suficientes), nem se pronunciou sobre a requerida alteração das questões de facto fixadas.

Ocorre, desde logo, que tendo anteriormente sido requerido pela Autora ora recorrente a realização de prova pericial singular (isto é, sem pretensão de perícia colegial), foi a mesma admitida e como tal veio a ter lugar (cf. fls. 1305 a 1351), sendo que foi quando confrontada com o resultado da mesma, designadamente face ao “relatório complementar” (cf. fls. 1458 a 1469) elaborado pelo Sr. Perito que a realizou (Engº M), que a A./recorrente veio formular o requerimento, que foi objeto do despacho ora em apreciação, no qual concluía no sentido de «Termos em que, com o douto suprimento de Vª. Exª., atentas todas as discrepâncias, deficiências e contradição reclamadas e a manifesta falta de verificação e comprovação das questões levadas à perícia, nomeadamente na inspecção ao local na perícia singular realizada (que não tomou as alturas máxima e mínima do muro de suporte de terras de cada lote, nem efectuou escavações para verificar a natureza da sapata, nem consequentemente verificou a lage que ocupa o terreno da A., limitando-se a tecer presunções), requer a Vª. Exª. se digne ordenar a perícia colegial, ao abrigo e nos termos do disposto no art. 468º, nº1, al a) e b) e nº2 e no art. 475º nº1 do CPC, a fim de verificarem os Sr. Peritos todos os elementos objecto da perícia (…)».

Como é bom de ver, face ao teor literal do próprio enquadramento então feito pela A. ora recorrente, a mesma suscitou e requereu somente no dito requerimento, a realização de perícia colegial, louvando-se no art. 468º do n.C.P.Civil.

Ora se assim é, tal tem desde logo a consequência de que não formulou qualquer requerimento de segunda perícia, possível, é certo, ao abrigo do disposto no art. 487º e segs.do mesmo n.C.P.Civil.

Porém, face ao enquadramento e requerimento feito pela própria A., nada vemos que censurar à conclusão vertida no despacho recorrido de que o pedido de realização de perícia colegial era «manifestamente extemporâneo dado que a perícia já foi (anteriormente) requerida, admitida e realizada.»   

Sendo certo que não pode confundir-se um requerimento de perícia colegial (unicamente este foi objeto do despacho recorrido) com uma segunda perícia requerida pela parte (que neste recurso não está em causa, sendo nesta parte, salvo o devido respeito, completamente “desfocado” o pedido recursivo)...

Em todo o caso, efetuada que foi e estava a prova pericial que foi requerida de forma tempestiva, não vislumbramos qual seria o regime legal que poderia fundamentar a verificação de uma “nulidade” neste particular – nem a própria A./recorrente o identifica e especifica enquanto tal! – pois que de um desacerto da decisão apenas se trataria.

Termos em que, sem necessidade de maiores considerações, se indefere esta primeira questão recursiva.».

Quer dizer, o Tribunal da Relação, seguindo a argumentação encetada pela Autora, entendeu que esta havia pedido como meio de prova no requerimento de produção de meios de prova apresentado de fls 1154 a 1156, a realização de perícia singular, tendo para o efeito indicado o Perito e os quesitos referentes ao objecto daquela, nos termos dos artigos 467º, 468º 475º e 476º do CPCivil, sendo certo que a Lei é expressa, quando prevê que a parte possa, nessa altura específica, requerer a realização da diligência com a intervenção de mais de um perito, cfr alínea b) do nº1 do artigo 468º, o que a Recorrente não fez, podendo tê-lo feito.

E, porque o não fez, ficou precludida a possibilidade de voltar a requerer tal meio de prova, tendo o Tribunal ordenado a efectivação da perícia nos precisos termos em que a mesma havia sido requerida, o que veio a ser, na sua sequência, objecto de reclamação e de esclarecimentos por parte do Perito, de harmonia com o preceituado no artigo 485º do CPCivil.

Insatisfeita com o resultado apresentado pelo Perito, poderia a Autora, aqui Recorrente, ter usado da faculdade prevista no artigo 487º, nº1 e 3 do CPCivil, solicitando a realização de uma segunda perícia, com vista à correcção das inexactidões apontadas à primeira.

Todavia não foi isso que a Recorrente fez, tendo optado por apresentar reclamações ao relatório pericial e ao mesmo tempo, vide fls 1451 a 1454, veio renovar o pedido de realização de uma perícia colegial, anteriormente pedida no seu requerimento de fls 1354 a 1360.

Ora, esses pedidos de perícia colegial foram objecto de indeferimento por extemporaneidade, pelo despacho de fls 1455, produzido a 21 de Junho de 2016, despacho esse que foi notificado à Autora, aqui Recorrente, em 23 de Junho de 2016, e não foi objecto de qualquer impugnação, tendo transitado em julgado.

Tal significa que, aquando do terceiro requerimento para efectivação de uma perícia colegial, formulado de fls 1473 a 1481, e que veio a ser indeferido pelo despacho de fls 1486 e 1487, datado de 8 de Novembro de 2016, - objecto de recurso não conhecido – aquela questão já estava mais que decidida, pela impossibilidade da sua realização, pois sobre a mesma já havia incidido o despacho de 21 de Junho de 2016, que havia resolvido definitivamente aquela intercorrência, de harmonia com o disposto no artigo 620º, nº1 do CPCivil.

Daqui decorre que não se mostra violado pelo Tribunal a produção do meio de prova solicitado pela Recorrente, - perícia singular – tendo o mesmo sido realizado e efectuado nos precisos termos em que foi requerida, tendo sido ordenada a comparência do Perito em audiência, onde prestou os esclarecimentos que lhe foram solicitados, aliás como decorre da fundamentação da materialidade factual, cfr sentença de fls 1611 a 1624.

Outrossim, como deixamos exposto inicialmente, não se mostrando violado pelas instâncias qualquer meio de prova tabelado, pois a factualidade subjacente ao pedido e à causa de pedir insere-se em tema de livre apreciação da prova, artigo 607º, nº5 do CPCivil conjugado com os normativos insertos nos artigos 388º e 389º do CCivil, nenhuma alteração há a efectuar à materialidade apurada e consequentemente à sua subsunção normativa, o que faz soçobrar as conclusões de recurso.

III Destarte, nega-se a Revista, mantendo-se a decisão ínsita no Acórdão recorrido.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 18 de Junho de 2019

Ana Paula Boularot (Relatora)

Pinto de Almeida

José Rainho