Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
9637/16.5T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: CHAMBEL MOURISCO
Descritores: PENSÃO DE REFORMA
BANCÁRIO
CONTRIBUIÇÃO PARA A SEGURANÇA SOCIAL
Data do Acordão: 02/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Área Temática:
DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS E DEVERES ECONÓMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS DIREITOS E DEVERES SOCIAIS.
Legislação Nacional:
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 63.º, N.º 4.
BOLETIM DE TRABALHO E EMPREGO, N.º 3 DE 22-01-2011.
DECRETO-LEI N.º 187/2007, DE 12 DE MAIO.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 12-05-2010, PROCESSO N.º 160/07.0TTBCL.P1.S1;
-DE 27-10- 2010, PROCESSO N.º 1889/06.5TTLSB.L1.S1;
-DE 06-12-2016, PROCESSO N.º 4044/15.0T8VNG.P1.S1.
Sumário :

I. O número 3.º da cláusula n.º 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário ao referir no seu segundo segmento “entregando estes (os trabalhadores que passem à reforma) à Instituição (de Crédito) a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza” pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e que efetuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários.

II. As expressões utilizadas na referida cláusula “a diferença entre o valor desses benefícios” na parte final do n.º 1, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” no segundo segmento do n.º 2 e “benefícios da mesma natureza” na parte final do n.º 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respetivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:



                                                           I

 Relatório:

 1. AA intentou ação declarativa comum contra o Banco BB, S.A., pedindo a condenação deste:

- A reconhecer-lhe o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzido do valor correspondente à percentagem de 26,31%, ou seja, € 211,99 € mensais, correspondente aos anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;

- A pagar-lhe o montante de € 2.653,32, correspondente ao diferencial mensal que a ré indevidamente lhe descontou até à data da propositura da ação, e ainda o diferencial mensal que ocorrerá, mensalmente, até trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo e, ou, ao início do cumprimento da obrigação;

- Pagar os juros moratórios à taxa legal, calculados sobre cada uma das prestações pedidas, desde o respetivo vencimento até ao efetivo e integral pagamento, e que na presente data se cifram em € 153,23, bem como os juros que se vencerem até trânsito em julgado.

Para o efeito, em síntese, alegou o seguinte:

Foi admitido ao serviço da ré em 1 de março de 1979, tendo passado à situação de reforma, em 24/06/2015, integrado no nível 12 ACT para o Sector Bancário, passando a auferir uma pensão de reforma, paga catorze vezes por ano, composta pela mensalidade base de € 1.391,45, acrescida de € 276,99 de diuturnidades e de € 94,96 de anuidades;

 Previamente, a ré informou-o, por escrito, que devia requerer de imediato a reforma junto do Centro Nacional de Pensões (CNP) e remeter cópia do respetivo requerimento à DRH do BB, tendo-o ainda informado: “que a partir da data em que lhe seja atribuída a pensão pelo CNP, ou que devesse ser atribuída, ao montante da pensão a cargo do Banco, conforme previsto na cláusula 136.º do ACT, será deduzido o valor da pensão atribuída, ou que devesse ser atribuída, decorrente dos períodos considerados pelo Banco no cálculo da sua antiguidade”;

 Quando começou a receber a pensão de reforma a ré passou a descontar-lhe o montante mensal de € 448,19, ao que sempre se opôs sustentando que, nos termos do ACT para o Sector Bancário, cláusula 136.ª, a ré apenas tem direito a descontar 26,31% da pensão que lhe foi atribuída pelo CNP e não 55,63 % do valor de tal pensão, como vem acontecendo;

Ao longo da sua carreira contributiva verificaram-se três momentos distintos de descontos:

 De 1966 a 1979, antes de ter sido admitido ao serviço da ré, efetuou os descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de atividade dependente remunerada;

Já enquanto trabalhador bancário, efetuou os descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB);

A partir de Janeiro de 2011 passou a descontar para a Segurança Social, até passar à situação de reforma, por força do Decreto-lei n.º 1-A/2011, de 3 de janeiro, por via do qual a CAFEB foi extinta por integração no Instituto de Segurança Social, I.P. (ISS, I.P.), passando os seus beneficiários a serem aqui integrados.

A ré tem apenas direito a fazer seu o valor resultante da percentagem correspondente aos 5 anos da CAFEB no ISS, I.P., o que equivale a 26,31% por ser esse o período coincidente entre o Regime da Segurança Social e o do Sistema Bancário previsto na cl.ª 136/3.

2. A ré contestou pugnando pela improcedência da ação na medida em que, em seu entender, a interpretação a dar à expressão legal “benefícios decorrentes de contribuições para Instituições ou Serviços de Segurança Social”, a que alude a cláusula 136.ª do ACT não pode ser considerado apenas o fator “tempo”, devendo também considerar-se o fator “densidade contributiva”. Ora, a fórmula que usou para descontar a percentagem que o autor contesta teve em consideração os citados fatores - de tempo e de “densidade contributiva” – interpretando assim corretamente a citada cláusula 136.ª do ACT e foi oportunamente explicada ao autor.

3. Foi proferido despacho saneador e dispensada a fixação da base instrutória, relegando-se para momento posterior o conhecimento da invocada prescrição dos juros moratórios invocados.

Em sede de audiência de discussão e julgamento as partes acordaram quanto à matéria de facto e seguidamente foi proferida sentença que julgou a ação procedente por provada, tendo decidido:

a) Reconhecer ao autor o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzido do valor correspondente à percentagem de 26,31%, ou seja, € 211,99 mensais, correspondente aos anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;

b) Condenar a ré a pagar ao autor o valor de € 2.653,32 correspondente ao diferencial mensal que a ré indevidamente se locupletou até à data da propositura da ação, e ainda o diferencial mensal que ocorrerá, mensalmente, até trânsito em julgado da decisão, acrescida de juros moratórios à taxa legal, calculados sobre cada uma das prestações pedidas, desde o respetivo vencimento até ao efetivo e integral pagamento, bem como os juros que se vencerem até trânsito em julgado.

 4. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação, que decidiu julgá-lo procedente, revogando a sentença recorrida e absolvendo a ré do pedido.

 5. Inconformado com esta decisão, o autor interpôs recurso de revista, tendo formulado as seguintes conclusões:

1. A sentença proferida em Primeira Instância não merece qualquer reparo.

2.                Pelo contrário, o Acórdão em crise viola a Lei e a Constituição da República Portuguesa.         

3.                Fundamentalmente, o que o Recorrente pretende ver apreciado pelo Tribunal ad quem (já que o foi erradamente feito pelo a quo, com a violação dos dispositivos legais enunciados) é i) entender o que são os benefícios da mesma natureza; ii) o que se considera como "densidade contributiva" e "contribuições" e a aplicação do conceito à causa; iii) e qual a fórmula de cálculo a utilizar para se encontrar o valor justo e equitativo desses benefícios da mesma natureza a que a Recorrida tem direito - ou seja, como interpretar a cl.ª 136,ª de harmonia com a lei geral (DL 18/2007) e a Constituição da República Portuguesa.

4.                Os benefícios da mesma natureza são aqueles auferidos pelo Recorrente a partir da integração - neste momento, e agora nas vestes de pensionista, o trabalhador reformado passaria a auferir duas pensões de reforma pelos mesmos meses de descontos.

5.                Pretendeu então o legislador, no ACT citado, regular essa discrepância de modo a que as Instituições Financeiras adiantassem ao trabalhador reformado o correspondente ao montante de cada mês de desconto para a Segurança Social, criando neste a obrigação de, uma vez atingida a idade para junto deste organismo solicitar a pensão por invalidez presumível, e informar o Banco do montante da pensão que lhe é atribuído, com base nos cálculos e regras previstas no Decreto-Lei n.º 187/2007.

6.                A Recorrida locupletou-se dos montantes referidos sem qualquer motivo ou imperativo legal, recorrendo a um enunciado ou conceito vago e sem definição jurídica concreta que é o da "densidade contributiva".

7.                A Recorrida ousou erigir um logro que acaba por ser erradamente caucionado pelo Sr. Juiz a quo, que foi o de procurar aplicar o conceito de "densidade contributiva" à questão em discussão, quando tal conceito como aqui é tido não passa de um jargão quase popular (com o devido respeito) sem conexão concreta com o que se discute nos presentes autos.

8.                O art. 12.º do Decreto-Lei n.º 187/2007 prevê e define o que é a "densidade contributiva", que não é mais do que o número total de dias que o beneficiário da segurança social deverá ter no registo de remunerações para lhe ser considerado 1 (um) ano para efeitos do preenchimento do prazo de garantia. A redação do artigo é clara e não dá azo a qualquer tipo de dúvida - trata-se de um conceito determinado com um clausulado fechado.

9.                O Tribunal da Relação confunde o conceito de "densidade contributiva" enquanto previsão legal para a obtenção do período de garantia de um trabalhador dependente remunerado com um "conceito" que apelida de "peso", que o traduz e identifica numa visão economicista, pois traduz o quantum remuneratório anual do trabalhador em determinado ano.

10. Na verdade, não existe qualquer "peso" a pesar (passe o pleonasmo) na obtenção da pensão de reforma do trabalhador. A Recorrente pretende é confundir "densidade contributiva" com "fórmula de cálculo da pensão" e com um conceito (também ele ad hoc) de "peso", que não encontram qualquer correspondência na letra da lei, muito pelo contrário, já que pretende que sejam derrogadas as regras previstas no Decreto-Lei citado, para obter vantagens patrimoniais indevidas aos anos de descontos do trabalhador em momentos em que o mesmo não prestou serviço à Instituição Financeira.

11. A Recorrida pretende através de um mecanismo de desproporcionalidade na aferição do valor a devolver e, frustrando as expectativas" (legais e constitucionais) dos trabalhadores, tributar a sua reforma, por via de uma taxa de esforço ficcionada, arbitrária e sem qualquer abrigo legal.

12. Se eticamente é reprovável, porque a Recorrida entende que os anos de trabalho têm um "peso" absoluto diferente, consoante diferente for a sua remuneração, juridicamente é inadmissível, porque, além do referido, cria uma desigualdade gritante entre anos de trabalho, entre o esforço do trabalhador ao longo de cada ano da sua carreira contributiva.

13. Isto é, a Recorrida entende que o esforço, que taxa, é financeiro, quando o regime previdencial em qualquer Estado de Direito contemporâneo considera igual o trabalho, qualquer que seja a sua remuneração.

14. A admitir-se este raciocínio, que o Acórdão recorrido acolhe, estamos perante uma violação do art.º 13,º da Constituição da República Portuguesa - Princípio da Igualdade - considerando que estamos a tratar por desigual, - trabalho - o que é igual - trabalho.

15. A douta decisão em crise, na fundamentação, formula um juízo sobre a expressão "contribuições" que conduz à decisão caindo logo ab initio com estrondo.

16. E é aqui que soçobra definitivamente o douto aresto, já que, não só ignora as regras de cálculo legalmente impostas, como cria ad hoc um conceito de "peso" ao registo de remunerações dos trabalhadores, confundindo a regra, o conceito e a densidade contributiva, para caucionar uma fórmula desproporcional e que viola flagrantemente a lei geral citada e também a fundamental.

17. Ou seja, pretende o Tribunal a quo destrinçar os anos de remuneração com base naquilo que apelida de "peso" e que confunde com "contribuições", que parece ao Recorrente não ser mais do que uma visão ilegal e violadora dos art.º 28.º e 29.º do DL 187/2007, uma vez que esse conceito não existe, e as regras para o apuramento das pensões estão já bem definidas em tal diploma.

18. Em recente acórdão proferido pelo STJ, foi decidido do seguinte:

19. "Atribuída pela Segurança Social uma pensão de reforma por velhice a um trabalhador bancário em que, para além de 5 anos relativos ao tempo de serviço militar obrigatório, nos termos do artigo 48.° do Decreto‑Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, foi ponderado um período contributivo por atividade bancária de 3 anos, o banco empregador deverá descontar da pensão que lhe paga o correspondente a 37,5% do valor da pensão da Segurança Social atribuída ao mesmo trabalhador, referente ao período em que trabalhou no banco empregador e tomado em consideração no cálculo da pensão resultante da aplicação do ACT aplicável.

20. O Acórdão proferido e agora recorrido não vai ao encontro da fórmula consagrada pela Segurança Social, que se encontra no processo.

21. Na verdade, o banco empregador apenas pode descontar do montante da pensão prevista no ACT aplicável a parte proporcional da pensão da Segurança Social que corresponda ao período em que o trabalhador exerceu funções no setor bancário, uma vez que o trabalhador não pode receber duas pensões pela mesma prestação de trabalho de 3 anos na instituição bancária.

22. Só assim é respeitado o princípio da não acumulação de prestações emergentes do mesmo facto, bem como o princípio constitucional, consagrado no n.º 4 do artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa, de acordo com o qual todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do setor de atividade em que tiver sido prestado.

23. O facto de não se terem provado descontos para a Segurança Social relativos ao período de prestação do serviço militar obrigatório, não obsta ao cálculo da percentagem a compensar nos termos supra descritos."

24. Esta decisão, que se aplaude e que é irrecorrível, abriga toda a argumentação que tem sido aduzida pelo recorrente: a proporcionalidade, no tempo de descontos, deve ser garantida e nunca racionada, nos termos propostos!

25. Em suma, ao decidir como decidiu, ao aderir aos fundamentos da Recorrida e ao aduzir novos fundamentos, como fica exposto, a decisão recorrida violou os art.º 13 e 64/4 da Constituição da República Portuguesa, viola os artigos 12.º, 26.º, 27.º, 28.º e 32.º do Decreto-Lei n.º º 187/2007, de 10/05, o art.º 9.º do Código Civil; os art. 1.º a 10.º do Decreto-Lei n.º 1-A/2011, 03/01 e, em último caso, interpretando a cl.ª 136.ª do ACT para o Sector Bancário, da maneira que o faz, viola o art.º 64/4 da CRP.

 6. A ré contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso interposto pela autora, formulando as seguintes conclusões:

1.                O Tribunal a quo fez uma corretíssima aplicação do direito aos factos provados e produziram um Acórdão que, como se disse, não merece o reparo que lhe faz o Recorrente.

2.                O Tribunal a quo procedeu a uma corretíssima interpretação da Cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do Sector Bancário, proferindo decisão que é, diga-se, absolutamente acertada e que nega o que seria a pretensão do Recorrente que, com o devido respeito, não pode deixar de ser tida como abusiva.

3.                Decidiu bem o Tribunal a quo no sentido de que o benefício da mesma natureza, ou seja, a pensão atribuída ao ora Recorrente pela segurança social, teve em conta não apenas a prestação de serviço no sector bancário, mas também a situação contributiva do ora Recorrente no período anterior à sua admissão no ora Recorrido, isto é, a atividade profissional exercida pelo ora Recorrente entre 1996 e Fevereiro de 1979, relevando apenas para o efeito dos presentes autos o beneficio correspondente às contribuições para a segurança social provenientes do sector bancário, ou seja, as contribuições realizadas pelo Recorrente posteriores a Janeiro de 2011, momento em que ocorreu a completa integração dos trabalhadores bancários no regime geral de segurança social.

4.                A pensão que é paga ao Recorrente pela segurança social é calculada nos termos do artigo 33.° do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, ou seja, integra uma parcela designada por P1 e uma outra designada por P2, sendo que esta última considera toda a carreira contributiva, ou seja, considera as contribuições feitas entre 1966 e fevereiro de 1979, e pelo Decreto-Lei n.º 1-A/2011, também as contribuições feitas a partir de janeiro de 2011.

5.                Com a integração, operada a 1 de janeiro de 2011, dos trabalhadores bancários inscritos na CAFEB (Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários) no regime geral de segurança social, imposta pelo Decreto-Lei n.º 1 - A/2011, de 3 de janeiro, esses trabalhadores passaram a deter um regime de segurança social complexo no que importa à reforma por invalidez presumível (velhice).

6.                Nessa altura, os trabalhadores bancários repartiam-se por 3 grupos distintos: Um primeiro e mais numeroso grupo de trabalhadores inscritos na CAFEB, que beneficiavam exclusivamente do regime de segurança social do sector bancário de benefício definido, cujas pensões eram pagas exclusivamente pelos bancos através dos seus fundos de pensões; Um segundo grupo de trabalhadores (como era o caso dos trabalhadores do ex-Banco CC), não inscritos na CAFEB, que já tinham sido inscritos, por razões históricas, no regime geral de segurança social mas que beneficiavam, complementarmente, do regime de segurança social do sector bancário de benefício definido; Um terceiro grupo, composto pelos trabalhadores que sejam admitidos no sector a partir de 3 de março de 2009, comumente designado por "novos bancários" que são, por força do Decreto-Lei n.º 54/2009, de 2 de março, inscritos no regime geral de segurança social, beneficiando complementarmente de um regime de contribuição definida.

7.                Os trabalhadores bancários inscritos na CAFEB foram inscritos no regime geral aplicando-se regras específicas quanto às contribuições: 3% pelos trabalhadores (igual ao que já contribuíam para a CAFEB) e 23,6% pelos bancos (até então os bancos faziam apenas dotações para os fundos de pensões para provisionarem as suas responsabilidades por pensões) - cfr. artigo 3.°-A da Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro.

8.                Não obstante a integração daqueles trabalhadores no regime geral de segurança social, os bancos continuam a garantir, de forma complementar, o regime de reformas que já existia no regime do sector bancário plasmado na cláusula 137.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do Sector Bancário.

9.                Note-se que a antiguidade, quer antes de 1.1.2011, quer depois dessa data, continua a ser reconhecida àqueles trabalhadores bancários para efeitos de cálculo dos benefícios de segurança social, designadamente para efeitos do cálculo das pensões de reforma devidas pelos bancos.

10. Todavia, os bancos têm direito, de acordo com o disposto na pré-existente cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do Sector Bancário, a deduzir, ao benefício que tenham que suportar, o benefício que o trabalhador tenha do regime geral de segurança social decorrente de contribuições feitas durante o tempo que lhe seja contado na antiguidade.

11. A redação da cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do Sector Bancário é manifestamente clara, a saber: nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de segurança social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas Instituições ou seus familiares - como sucede com o Recorrente, a partir de 1.1.2011, dada a sua integração no regime geral de segurança social por imposição do Decreto-Lei n.º 1-A/2011 -, apenas será garantida, pelas Instituições de Crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos no Acordo - cfr. 2.ª parte do n.º 1 da cláusula 136ª.

12. Convém sublinhar, a este propósito, que o Recorrente, como bem se faz notar no douto Acórdão recorrido, não questiona que o Recorrido tem o direito de deduzir na pensão que lhe paga o valor do benefício que o Recorrente obtenha da segurança social, correspondente ao período de Janeiro de 2011 a 23.6.2015.

13. O benefício atribuído pela segurança social não considera apenas o fator “tempo" mas sim quer o fator "tempo", quer o fator "peso", conceito que, ao contrário do alegado pelo Recorrente, é um conceito concreto e que reveste uma fundamental utilidade.

14. Como facilmente se compreende, o "peso" das contribuições é diferente no ano de 1979 para o ano de 2011.

15. O Recorrente erra ao defender que a parte do benefício a que o Recorrido tem direito é meramente um pro rata temporis, isto é, uma parte proporcional do benefício meramente em função do tempo, chegando à percentagem de 26,31% que corresponde a 5 anos e 18 meses de descontos no total de 18 anos considerados pelo CJSTP.

16. A correta interpretação da cláusula 136.ª do ACT do Sector Bancário, conduz ao entendimento de que o benefício a considerar corresponde ao benefício decorrente das contribuições feitas no período de 5 anos em que esteve integrado no regime geral de segurança social por força do disposto no Decreto-Lei n.º l-A/2011, tal como alegou o Recorrido, muito bem, considerou o Tribunal a quo.

17. Como se disse, o ora Recorrido procedeu, após outros cálculos decorrentes das sucessivas informações que foram prestadas pela segurança social, ao apuramento do valor a que o Recorrente tem direito.

18. A tese que o Recorrente insiste em defender nas doutas alegações é absolutamente incongruente, pois levaria a que os anos considerados para o cálculo da pensão da segurança social tivessem, todos eles, o mesmo "peso", independentemente do montante das retribuições que serviram de base às contribuições.

19. A tese do Recorrente, como se disse, conduziria a que 1 ano (por exemplo o ano de 2011), em que as contribuições incidiram sobre a remuneração total de € 43.349,06, tivesse exatamente o mesmo "peso" que outro ano (por exemplo o ano de 1967) em que as contribuições incidiram sobre a remuneração total (revalorizada) de € 4.197,01 - Cfr. Doc.4, página 2, junto com a petição inicial.

20. Repetindo: o Recorrente insiste na sua pretensão de que um ano em que as contribuições incidiram sobre a remuneração total de € 43.349,06 tenha exatamente o mesmo "peso" que um ano em que as contribuições incidiram sobre a remuneração total (revalorizada) de € 4.197,01.

21. O que, a proceder - sem conceder -, sempre implicaria um manifesto enriquecimento sem causa pois, como se disse, o benefício atribuído pela segurança social não considera apenas o fator "tempo" mas sim quer o fator "tempo", quer o fator "peso" ou, se se pretender - para não deixar dúvidas ao Recorrente -, o montante das retribuições que serviram de base às contribuições.

22. A cláusula 136.ª alude, precisamente, a benefício decorrente das contribuições com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador.

23. Ao contrário do alegado pela ora Recorrente, decidiu bem o Tribunal a quo, ao considerar que o cálculo efetuado pelo ora Recorrido do valor da parcela da pensão da segurança social correspondente apenas ao período contributivo apresentado pelo ora Recorrente posteriormente à integração da CAFEB na Segurança Social viole, de alguma forma, o disposto no artigo 63.°, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.

24. Impõe-se duas conclusões finais: A primeira para sublinhar que o facto de se dar relevo diferente a anos com contribuições diferentes não constitui - ao contrário do que pretende o Recorrente - qualquer violação de qualquer comando constitucional, designadamente do invocado, pelo Recorrente, artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa.

25. Na verdade, tal invocação é absolutamente incompreensível pois, não só não estamos perante a igualdade entre cidadãos, mas também porque se, por absurdo, procedesse tal entendimento, então todo o regime geral de segurança social seria inconstitucional, pois, como o Recorrente deve saber, o cálculo da pensão de reforma tem, precisamente, em consideração o "peso" da carreira contributiva dos cidadãos.

26. A segunda, para também sublinhar que o douto Acórdão desse Venerando Supremo Tribunal de Justiça, de 6 de dezembro de 2016, proferido no processo n.º 4044/15.0, que o Recorrente cita nas suas alegações, trata de caso distinto do destes autos, pois ali estava em causa a contagem de tempo de serviço militar, período em que não houve contribuições, nos termos de outro IRCT, sendo outra instituição de crédito e, sobretudo porque a questão em causa nestes autos não foi ali objeto de discussão, sendo, por isso, esta a primeira vez que esse Venerando Supremo Tribunal é chamado a decidir sobre a vexata quaestio destes autos.

27. Já o mesmo não sucede com o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10.10.2016, que apreciou precisamente a mesma questão que aqui se discute e que, por se revelar de manifesto interesse para estes autos e não se encontrar disponível no site dgsi.pt, se juntou com as alegações de recorrente em sede Apelação.

 28. Decidiu corretamente o douto Acórdão recorrido no sentido de acolher a posição defendida pelo ora Recorrido, julgando a ação improcedente, neste sentido, absolvendo o ora Recorrido dos pedidos contra si formulados.

7. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Excelentíssimo Senhor Procurador‑Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser declarado que a ré apenas tem direito a compensar na pensão de reforma a percentagem correspondente ao período de tempo em que o recorrido prestou trabalho para aquela com descontos para a Segurança Social, devendo pois, ser revogado o acórdão em análise e repristinada a sentença proferida em 1.ª instância, assim se concedendo revista.

8. A ré respondeu defendendo que deve ser confirmado o acórdão recorrido.

9. Nas suas conclusões, o autor/recorrente suscita a questão de saber como deve ser calculada a parte da pensão que lhe é paga pela Segurança Social e que deve ser entregue ao réu, atento o disposto na cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho aplicável.

                                                           II

A) Fundamentação de facto:

Foi considerada a seguinte factualidade:

1. O Banco Réu é uma instituição de crédito e exerce a atividade bancária.

2. Participou nas negociações e outorgou o ACT para o sector bancário, cuja última versão integral se encontra publicada no B.T.E., 1ª Série, n.º 3, de 22/01/2011, pág. 353 e seguintes, instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que aplicou e aplica aos trabalhadores integrados nos seus quadros.

3. O A. encontra-se filiado no Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, onde figura como o sócio nº 32.386.

4. O A. foi admitido ao serviço da R. em 1 de março de 1979, à data Banco DD.

5. Por carta datada de 6 de março de 2015, a R. informou o A. da sua passagem à situação de reforma, a 24/06/2015, bem como que deveria requerer de imediato a reforma junto do Centro Nacional de Pensões e remeter cópia do respetivo requerimento à DRH do BB, nos precisos termos constantes de fls. 20-21, cujo teor se dá integralmente por reproduzido.

6. A referida carta refere, ainda, que: “a partir da data em que lhe seja atribuída a pensão pelo CNP, ou que devesse ser atribuída, ao montante da pensão a cargo do Banco, conforme previsto na cláusula 136.ª do ACT, será deduzido o valor da pensão atribuída, ou que devesse ser atribuída, decorrente dos períodos considerados pelo Banco no cálculo da sua antiguidade”.

7. O A. foi entretanto informado por carta do Centro Nacional de Pensões datada de 14 de abril de 2015 de que “o montante provável da sua pensão seria de € 560,61, tendo por base a carreira contributiva disponível e que se encontra discriminada no verso deste ofício”, nos precisos termos constantes de fls. 24 cujo teor se dá integralmente por reproduzido.

8. Esse montante foi, depois, corrigido para € 805,56, através de comunicação de 13 de agosto de 2015 nos precisos termos constantes de fls. 28-31, cujo teor se dá integralmente por reproduzido.

9. A essas duas cartas, o Banco Réu respondeu com a carta de 27 de agosto de 2015, concluindo que do valor total a cargo do CNP, o valor da pensão a deduzir pelo BB, a seu favor, é de € 448,19, nos precisos termos constantes de fls. 32-34, cujo teor se dá integralmente por reproduzido.

11. O trabalhador sempre se opôs a esta posição do Banco.

12. O A. passou à situação de reforma integrado no nível 12 ACT para o Sector Bancário, passando a auferir uma pensão de reforma, pagável 14 vezes por ano, com a mensalidade base de € 1.391,45, acrescido de € 276,99 de diuturnidades e de € 94,96 de anuidades.

13. A R. começou, então, a descontar à pensão de reforma o valor mensal de € 448,19, o que se mantém na presente data.

14. O CNP considerou para a atribuição da pensão ao A., que este teve a seguinte carreira contributiva:

- De 1966 a 1979 o A. efetuou os descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de atividade dependente remunerada, antes de ter sido admitido ao serviço do R. (cf. fls. 24-29, cujo teor aqui se dá integralmente por reproduzido);

- O A., enquanto trabalhador bancário, efetuou os descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB);

- A partir janeiro de 2011 o A. passou a descontar para a Segurança Social, até passar à situação de reforma (cf. fls. 24-29, cujo teor aqui se dá integralmente por reproduzido).

15- No dia 15-10-2013 decorreu nas instalações da DRH do Banco Réu uma reunião com todos os sindicatos do sector onde foram prestados todos os esclarecimentos sobre as regras seguidas pelo banco nestes casos.

B) Fundamentação de Direito:

B1) Os presentes autos respeitam a ação declarativa de condenação instaurada em 13 de abril de 2016, tendo o acórdão recorrido sido proferido em 27 de setembro de 2017.

Assim sendo, o regime processual aplicável é o seguinte:

- O Código de Processo do Trabalho, na versão operada pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto;

- O Código de Processo Civil, na versão conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.

B2) Como já se referiu, a questão que foi colocada pelo recorrente neste recurso de revista consiste em saber como deve ser calculada a parte da pensão que lhe é paga pela Segurança Social e que deve ser entregue ao réu, atento o disposto na cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho aplicável.

O autor foi admitido ao serviço da ré em 1 de Março de 1979, tendo passado à situação de reforma, em 24/06/2015, integrado no nível 12 ACT para o Sector Bancário, passando a auferir uma pensão de reforma, paga pela ré catorze vezes por ano, composta pela mensalidade base de € 1.391,45, acrescida de € 276,99 de diuturnidades e de € 94,96 de anuidades.

Por ter efetuado descontos para a Segurança Social, nessa altura, começou também a receber desta entidade uma pensão no montante de € 805,56.

O Centro Nacional de Pensões, para efeitos de atribuição da referida pensão, considerou a seguinte carreira contributiva do autor:

- De 1966 a 1979, o autor efetuou os descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de atividade dependente remunerada, antes de ter sido admitido ao serviço do Banco réu;

- O autor, enquanto trabalhador bancário, efetuou os descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB);

- A partir de janeiro de 2011, o autor passou a descontar para a Segurança Social, até passar à situação de reforma.

Quando começou a receber a pensão de reforma a ré passou a descontar-lhe o montante mensal de € 448,19, invocando o disposto na cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, nº 3 de 22/01/2011. 

Esta cláusula tem a seguinte redação:

1. As Instituições de Crédito, por si ou por serviços sociais privativos já existentes, continuarão a garantir os benefícios constantes desta Secção aos respetivos trabalhadores, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas Instituições ou seus familiares, apenas será garantida, pelas Instituições de Crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos neste Acordo.

2. Para efeitos da segunda parte do número anterior, apenas serão considerados os benefícios decorrentes de contribuições para Instituições ou Serviços de Segurança Social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos das Cláusulas 17.ª e 143.ª

3. As Instituições adiantarão aos trabalhadores abrangidos pelo Regime Geral da Segurança Social as mensalidades a que por este Acordo tiverem direito, entregando estes à Instituição a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza.

Esta Secção do Supremo Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre esta cláusula, firmando jurisprudência que continua a ser atual e que passaremos a enunciar:

Acórdão de 12-05-2010, Processo n.º 160/07.0TTBCL.P1.S1:

I - A cláusula 136.ª do ACTV para o sector bancário não permite que o trabalhador bancário acumule a pensão a que tem direito ao abrigo do referido ACTV com a pensão que recebe das instituições de segurança social, na parte em que esta tem por base a mesma prestação de trabalho daquela.

II - Nesses casos, o trabalhador só tem direito à diferença existente (se a houver) entre o valor da pensão que é paga pela instituição de crédito e o da pensão que lhe é paga pelas instituições de segurança social, continuando, todavia, a instituição de crédito obrigada a adiantar ao pensionista a totalidade da pensão que lhe é devida ao abrigo do ACTV e este obrigado a entregar à instituição de crédito a totalidade das quantias que, a título de pensão de reforma, receber dos serviços de segurança social.

Acórdão de 06-12-2016, Processo n.º 4044/15.0T8VNG.P1.S1:

 Os trabalhadores bancários beneficiam de um regime específico de segurança social que resulta dos instrumentos de regulamentação coletiva aplicáveis (…) Esse regime específico de proteção articula-se com outros regimes de segurança social que abranjam os trabalhadores bancários, nomeadamente com o Regime Geral, permitindo às instituições bancárias responsáveis pelo pagamento das específicas prestações consagradas a favor destes trabalhadores, o desconto nas prestações por si pagas dos benefícios que os trabalhadores aufiram de outros sistemas, com fundamento na prestação de atividade bancária, para evitar duplicação de benefícios.

Como resulta da jurisprudência citada a referida cláusula visa impedir que o trabalhador bancário na situação de reforma receba duas pensões pela mesma prestação de trabalho: aquela que lhe foi adiantada por força do Acordo Coletivo de Trabalho e aquela que recebe do Centro Nacional de Pensões em cujo cálculo foi considerado, para além do mais, o período de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário.

Assim, as Instituições de Crédito, por força da referida cláusula, irão garantir aos trabalhadores que passem à situação de reforma, abrangidos pelo Regime Geral da Segurança Social, as mensalidades a que tiverem direito, nos termos do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário, entregando estes à Instituição a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social, a título de benefícios da mesma natureza.

A referida cláusula, no seu número 3.º, ao referir “entregando estes à Instituição a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza” pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e que efetuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários.

A questão que agora se coloca consiste em saber como se deve calcular o montante devido à Instituição de Crédito, sobretudo nas situações, como a presente, em que na pensão que o autor recebe do Centro Nacional de Pensões foram tidas em conta duas fases contributivas distintas, em que os valores das remunerações e respetivas contribuições foram diferentes.

Ou seja, há que determinar se para além do fator tempo também se deverá atender à relevância das remunerações sobre as quais incidiram as contribuições efetuadas naquele período.

O Tribunal da 1.ª Instância entendeu que há que considerar apenas o fator tempo pois o montante das contribuições já foi ponderado no cálculo do valor da pensão por parte do Centro Nacional de Pensões, a quem compete fixá-la.

Assim, nesta perspetiva a Instituição de Crédito só tem direito a compensar na pensão de reforma que paga ao autor a percentagem correspondente ao tempo de exercício dessa atividade bancária com descontos para a Segurança Social.

Por seu turno, o Tribunal da Relação entendeu de forma diferente, considerando que, para além do fator tempo, também se deverá atender à relevância das remunerações sobre as quais incidiram as contribuições efetuadas no período em que o autor fez descontos para a Segurança Social no exercício da atividade bancária.

A questão foi desenvolvida nos seguintes termos, que passamos a transcrever:

“O n.º 2 da cl.ª 136.ª é claro quando estabelece que para efeitos da 2.ª parte do número anterior (ou seja, para a determinação do que será garantido pelas instituições de crédito, quando benefícios da mesma natureza - isto é, no que ao caso releva, pensões - sejam atribuídas por instituições ou serviços de segurança social) apenas são considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de segurança social com fundamento na prestação de serviço que seja contada na antiguidade do trabalhador nos termos previstos no próprio ACT.

O Decreto-Lei n.º 187/2007, de 12/5 que alterou o regime jurídico de segurança social no que toca à proteção na invalidez e velhice alude, para efeitos de apuramento do prazo de garantia (estabelecido, no que respeita à pensão por velhice, no respetivo art.º 19.º), a “densidade contributiva”, definindo-o no artigo 12.º como os anos civis em que o total de dias com registo de remunerações seja igual ou superior a 120, o que todavia só releva a partir de 1994 (cfr. art.º 96.º n.º 2). Também o art.º 29.º, que dispõe sobre “taxa de formação da pensão” estabelece no n.º 3 que “são relevantes para a taxa de formação da pensão os anos civis com densidade contributiva igual ou superior a 120 dias com registo de remunerações.” O conceito de densidade contributiva já constava, aliás, do Decreto-Lei n.º 329/93, de 25/9, que, até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 187/2007, estabelecia o regime de proteção na invalidez e velhice e vigorou desde Janeiro de 1994 (daí, certamente o disposto pelo n.º 2 do citado art.º 96.º).

Não nos parece, todavia, que seja neste preciso sentido que a R. e recorrente utiliza (na contestação, tendo-a abandonado nas alegações de recurso) a expressão “densidade contributiva”, afigurando-se-nos que se pretende referir antes (maxime quando alude ao “peso das contribuições”) ao valor das remunerações propriamente ditas, sobre as quais incidem as contribuições, já que são, enquanto determinantes da remuneração de referência, um dos elementos essenciais do cálculo da pensão.

Com efeito, sendo a pensão estatutária a que resulta da aplicação das regras de cálculo da pensão (cfr. art.º 26.º n.º 1) e o montante mensal da pensão estatutária igual ao produto da remuneração de referência pela taxa global de formação da pensão e pelo fator de sustentabilidade (art.º 26.º n.º 2), estabelece o art.º 33.º as regras aplicáveis aos beneficiários inscritos até 31/12/2001 (como é o caso do A. e no que para o caso releva), nos seguintes termos:

“1 - A pensão estatutária dos beneficiários inscritos até 31 de Dezembro de 2001 e que iniciem pensão até 31 de Dezembro de 2016 resulta da aplicação da fórmula seguinte:

P = (P1 x C1 + P2 x C2)/C

2 – (…)

3 - Para efeitos da aplicação das fórmulas referidas nos números anteriores, entende-se por:

“P” o montante mensal da pensão estatutária;

“P1” a pensão calculada por aplicação da regra de cálculo prevista no artigo seguinte;

“P2” a pensão calculada por aplicação das regras de cálculo previstas no artigo anterior;

“C” o número de anos civis da carreira contributiva com registo de remunerações relevantes para os efeitos da taxa de formação de pensão;

“C1” o número de anos civis da carreira contributiva com registo de remunerações relevantes para os efeitos da taxa de formação de pensão completados até 31 de Dezembro de 2006;

“C2” o número de anos civis da carreira contributiva com registo de remunerações relevantes para os efeitos da taxa de formação de pensão completados a partir de 1 de Janeiro de 2007;

(…)

Ora, compulsando os elementos que serviram de base ao cálculo da pensão pelo CNP constantes de fls. 29/31 (dado por reproduzido no ponto 8 da matéria de facto) constata-se que os valores das remunerações (sobre as quais incidiram as pertinentes contribuições) relativas ao período de 1/1/2011 a 2015 (5 anos civis) foram significativamente superiores às relativas ao período de 1966 a 1979 (14 anos civis), revalorizadas em conformidade com o disposto pelo art.º 27.º, sendo respetivamente, de € 194.105,72 e € 125.920,77, tendo pois assumido maior peso na determinação da remuneração de referência.

Porque para o cálculo da pensão relevam a taxa global de formação da pensão (correspondente ao produto de 2% por cada ano civil relevante) e a remuneração de referência (para além do fator de sustentabilidade), afigura-se-nos mais consentâneo com as regras de cálculo que na determinação da parte da pensão da Segurança Social que corresponde apenas ao período de trabalho na banca, ou seja, posterior a janeiro de 2011 se atenda não apenas à percentagem corresponde àquele tempo de trabalho relativamente ao todo (ou seja, aos cinco em dezanove anos e que corresponde à percentagem de 26,31% do total considerado), mas também à relevância das remunerações sobre as quais incidiram as contribuições efetuadas nesse período, atendendo, pois, não apenas ao fator tempo, mas também ao fator remunerações ou contribuições, já que estas são determinadas pelo valor daquelas, correspondendo à aplicação sobre elas da taxa social única.

Afigura-se-nos correta e adequada a fórmula encontrada pela R. para determinar o valor a descontar e que consta de fls. 23.

Partindo do valor da pensão do RGSS determinado para a carreira completa do A. perante a Segurança Social, isto é, € 805,56 apurou o valor da pensão que caberia só com a carreira anterior ao banco, chegando ao valor de € 271,40 (correspondente a uma percentagem de 44,4% relativamente à que cabe pela carreira completa) e, por outro lado, apurou a que caberia só com a carreira no banco, chegando ao valor de € 340,38 (correspondente a uma percentagem de 55,6% da apurada para a carreira completa). Porque a soma de ambas (100%) perfaz € 611,78, havendo uma diferença de € 193,78 para atingir o valor da pensão efetivamente paga pelo CNP (805,56), fez então incidir sobre aquele valor (de 193,78) as percentagens anteriormente mencionadas correspondentes às pensões parcelares, obtendo os valores de € 85,97 e € 107,81, respetivamente, que somou aos valores anteriormente apurados relativos respetivamente à carreira anterior ao banco e à carreira no banco, assim obtendo os valores de € 357,37 e € 448,19.

Não se vislumbra como o cálculo, assim efetuado, do valor da parcela da pensão da Segurança Social correspondente apenas ao período contributivo apresentado pelo A. posteriormente à integração da CAFEB no ISS possa de algum modo violar o preceituado pelo n.º 4 do art.º 63.º da Constituição, uma vez que se nos afigura inequívoco que todo o tempo de trabalho do A. contribuiu para o cálculo da respetiva pensão, independentemente do sector de atividade em que foi prestado. Tão pouco se descortina como possa a mesma fórmula violar de algum modo o princípio constitucional da igualdade.”

Vejamos pois se é de sufragar este raciocínio, feito na decisão recorrida, atentas as disposições legais que devem ser tidas em conta para apreciar a questão.

Da análise do Decreto-Lei n.º 187/2007 de 10 de maio, verificamos que de acordo com o art.º 26.º, a pensão estatutária é a que resulta da aplicação das regras de cálculo da pensão (n.º 1), sendo o montante mensal da pensão estatutária igual ao produto da remuneração de referência pela taxa global de formação da pensão e pelo fator de sustentabilidade (n.º 2).

A remuneração de referência é calculada nos termos do artigo 28.º deste diploma, tendo como base as remunerações anuais de toda a carreira contributiva revalorizadas nos termos do artigo 27.º, e o número de anos civis com registo de remunerações, com as correções e ajustamentos que aquele dispositivo consagra.

A pensão estatutária dos beneficiários inscritos até 31 de dezembro de 2001 e que iniciem pensão até 31 de dezembro de 2016 (como é o caso do autor) é a que resulta da fórmula de cálculo prevista no art.º 33.º, do mesmo diploma.

O Supremo Tribunal de Justiça, no já citado Acórdão de 06-12-2016, proferido no Processo n.º 4044/15.0T8VNG.P1.S1, já se pronunciou acerca do cálculo do valor das pensões, tendo-se aí referido que “o cálculo de valor da pensão é uma operação em que intervém uma pluralidade de fatores, não existindo uma proporcionalidade direta entre o valor final da pensão atribuída e o valor das remunerações registadas para o cálculo da remuneração de referência.

A pensão surge, deste modo, como um produto final dessa pluralidade de fatores (…)”.

Como também se afirmou no mesmo aresto, mantém total atualidade a orientação assumida no acórdão desta Secção de 27 de outubro de 2010, proferido no processo n.º 1889/06.5TTLSB.L1.S1, tendo por base a cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para Setor Bancário, ao tempo em vigor, em que se referiu:

“Ora, este n.º 3 da cl.ª 136.ª determina que a ré adiante (avance/antecipe) ao autor a quantia correspondente à pensão que resulta do ACTV (que decorre dos oito anos de trabalho no B CC) - devendo o autor devolver-lhe a totalidade das quantias que da Segurança Social receber a esse mesmo título, ou seja, relativos aos oito anos de trabalho no B CC. Assim, utilizando as expressões da Lei e do ACTV, “as prestações emergentes do mesmo facto” atribuídas pela Segurança Social ou “a título de benefícios da mesma natureza” são aquelas que deram origem à pensão do recorrente pela sua prestação de trabalho no B CC, durante oito anos.

Deste modo, sem prejuízo da salvaguarda consagrada no n.º 2 da cl.ª 137.ª, a ré apenas pode descontar do montante da pensão prevista no ACTV a parte proporcional da pensão da Segurança Social que corresponda ao período em que o trabalhador exerceu funções no setor bancário pois, como se viu, não pode receber duas pensões pela mesma prestação de trabalho de oito anos no B CC.”

Neste último aresto sumariou-se:

I - Atendendo a que o trabalhador se reformou pela Segurança Social com base num período contributivo de vinte anos, dos quais oito respeitam a atividade profissional no sector bancário, o banco empregador deverá descontar da pensão que lhe paga o correspondente a oito vinte avos do valor da pensão da Segurança Social atribuída ao mesmo trabalhador, referente ao período em que trabalhou no banco empregador e sobre o qual foi calculada a pensão resultante da aplicação do ACTV do sector bancário.

II - Na verdade, o banco empregador apenas pode descontar do montante da pensão prevista no ACTV aplicável a parte proporcional da pensão da Segurança Social que corresponda ao período em que o trabalhador exerceu funções no sector bancário, uma vez que o trabalhador não pode receber duas pensões pela mesma prestação de trabalho de oito anos na instituição bancária.

III - Só assim é respeitado o princípio da não acumulação de prestações emergentes do mesmo facto, bem como o princípio constitucional, consagrado no n.º 4 do artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa, de acordo com o qual todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de atividade em que tiver sido prestado.

De facto, nem a Lei, nem o Acordo Coletivo de Trabalho em causa, exigem que se pondere no desconto a realizar não só o “fator tempo” como também o “fator das contribuições efetuadas”.

As expressões utilizadas na cláusula 136.ª “a diferença entre o valor desses benefícios” na parte final do n.º 1, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” no segundo segmento do n.º 2 e “benefícios da mesma natureza” na parte final do n.º 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respetivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas.

Na verdade, todos os fatores em causa já foram considerados no cálculo de valor da pensão por parte do Centro Nacional de Pensões, pelo que, independentemente do peso que as contribuições efetuadas pelo exercício da atividade bancária relativas ao período de 01/01/2011 até 2015 possam ter tido no cálculo do valor da pensão de reforma atribuída ao autor, afigura-se-nos que a ré só tem direito a compensar na pensão de reforma que lhe é paga nos termos do ACT a parte proporcional da pensão da segurança social que corresponde ao período em que o trabalhador exerceu funções no sector bancário com descontos para a Segurança Social, pois só aí existe uma sobreposição das prestações por serem da mesma natureza.

 

                                                           III

            Decisão:

           Face ao exposto acorda-se em conceder a revista, revogando-se o acórdão recorrido e repristinando-se a sentença do Tribunal da 1.ª Instância.

Custas na segunda instância e no Supremo Tribunal de Justiça a cargo da ré.

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 22/02/2018

Chambel Mourisco (Relator)

Pinto Hespanhol

Gonçalves Rocha