Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3582/19.0T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: JOSÉ FETEIRA
Data do Acordão: 10/28/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Sumário :

1. Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 56º, 57º e 212º n.º 2 do Código do Trabalho, compete ao empregador – naturalmente com respeito pelos limites da lei e com base na escolha horária que lhe tenha sido apresentada pelo trabalhador – determinar o horário flexível de trabalho do trabalhador que, com responsabilidades familiares, lhe tenha solicitado a prestação laboral nesse regime de horário, definindo, dentro da amplitude de horário escolhido por este, quais os períodos de início e termo do trabalho diário;

2. O empregador apenas em determinadas circunstâncias, relacionadas com exigências imperiosas do funcionamento da empresa ou com a impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável, poderá recusar a atribuição do solicitado horário flexível e ainda assim, mediante parecer positivo da entidade competente na área de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres.

José Feteira (relator)

Decisão Texto Integral:
Processo nº 3582/19.0T8LSB.L1.S1

Relator: José Feteira.

1º Adjunto: Cons. Leones Dantes.

2º Adjunto: Cons. Júlio Gomes.

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça.

I

Relatório

O Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, com sede na Rua de São José, n.º 131, 1169-046 Lisboa instaurou a presente ação emergente de contrato de trabalho, com processo comum contra AA, residente na Urbanização …., BB.

Pede que seja “… declarado que o horário pedido pela Ré não é um horário flexível na aceção do art.º 56º do C.T., não lhe conferindo o direito a exigir que o horário seja fixado de 2ª a 6ª no período das 08h às 16h. Ainda que assim não se entenda deve ser reconhecida como legítima a recusa do Autor  em adotar o regime de horário pedido pela Ré”.

A Ré contestou, por impugnação, concluindo pela improcedência da ação.

Realizado o julgamento, o Tribunal de 1ª instância proferiu sentença julgando a ação improcedente e absolvendo a Ré dos pedidos.

Inconformado com esta sentença, o Autor interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa que prolatou acórdão concluindo com o seguinte dispositivo:

«Pelo exposto, este Tribunal julga a apelação procedente, revoga a sentença e declara que o horário em causa não é flexível, nos termos do art.º 56 do CT, sendo legítima a recusa do Autor em adotar o horário pedido pela Ré».

Irresignada com este acórdão veio a Ré interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando alegações que termina mediante a formulação das seguintes conclusões:

A - O presente recurso vem interposto do douto Acórdão que julgou a apelação do ora Recorrido procedente, revogando a sentença, declarando que o horário em causa não é flexível, nos termos do artigo 56º do Código do Trabalho, sendo legitima a recusa daquele em adotar o horário pedido pela agora Recorrente.

B - A Recorrente não se conforma com o Acórdão recorrido, porquanto nele se entende, em suma, que o pedido de horário flexível deverá ter uma margem mínima de manobra da empregadora e que o trabalhador ao indicar as horas de início e termo, referidas no artigo 56º n.º 2 do Código do Trabalho, o deve fazer deixando alguma margem ao empregador;

C - O douto Acórdão recorrido interpretou incorretamente o direito aplicável ao caso sub judice, incorrendo no vício de erro de julgamento por erro de interpretação das normas jurídicas aplicáveis.

D - A Recorrente requereu, ao abrigo do disposto no artigo 56º do Código do Trabalho, ao ora Recorrido, a atribuição de horário flexível, solicitando trabalhar entre as 8h e as 16h, com descanso semanal aos sábados e domingos, pelo período de 10 anos, em detrimento do atual regime de trabalho por turnos entre as 08h e as 20h, conforme documentado nos autos.

E – O fundamento do pedido apresentado pela Recorrente assentou no facto de ter uma filha menor, com 18 meses de idade, com quem vive em comunhão de mesa e habitação, circunstância que implica a necessidade de prestar assistência inadiável na sua educação e formação, algo que só será possível com a prática de horário flexível, uma vez que o seu marido trabalha por turnos, com horário rotativo hospitalar.

F – Em cumprimento do disposto no n.º 5 do artigo 57º do Código do Trabalho, o Recorrido, remeteu o processo à Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), que emitiu parecer desfavorável à intenção de recusa do Recorrido, relativamente ao requerimento de trabalho em regime de horário flexível apresentado pela Recorrida, conforme se encontra, também, documentado nos autos.

G – Quanto à alegada ilegitimidade por o pedido configurar horário rígido e não flexível, e que sustenta a decisão do douto acórdão recorrido em revogar a sentença proferida, caberá recordar o teor do artigo 56º do diploma legal já mencionado, que refere no seu n.º 3 que este horário, a elaborar pelo empregador, deve conter um ou dois períodos de presença obrigatória, com duração igual a metade do período normal de trabalho diário, deve indicar os períodos para início e termo do trabalho normal diário, cada um com duração não inferior a um terço do período normal de trabalho diário, podendo esta duração ser reduzida na medida do necessário para que o horário se contenha dentro do período de funcionamento do estabelecimento e deve estabelecer, também, um período para intervalo de descanso não superior a duas horas.

H - A Recorrente indicou o período compreendido das 8h às 16h, com descanso semanal aos sábados e domingos, como o período dentro do qual o horário flexível deveria ser elaborado pelo Recorrido, por ser aquele o mais favorável à conciliação da sua atividade familiar com a atividade profissional;

I - A Recorrente requereu que lhe fosse concedido o regime de trabalho de horário flexível entre as 08h e as 16h, com descanso semanal aos sábados e domingos, pelo período de 10 anos, devendo o Recorrido elaborar o horário de trabalho a praticar dentro destes limites, não fazendo sentido falar em prática de horário rígido, tal como a Recorrido insistiu em fazer na sua argumentação;

J - O entendimento da Recorrente sobre este ponto concreto é acolhido pela doutrina proferida pela CITE e pela jurisprudência existente sobre esta matéria.

L - Tal como referido pela CITE no presente processo, é de “considerar enquadrável no artigo 56º do Código do Trabalho, a indicação pelo/a requerente, de um horário flexível a ser fixado dentro de uma amplitude temporal diária e semanal apontada como a mais favorável à conciliação da actividade profissional com a vida familiar, por tal circunstância não desvirtuar a natureza do horário flexível se essa indicação respeitar o seu período normal de trabalho diário. Importa ainda, que a amplitude indicada pelo/a trabalhador/a seja enquadrável na amplitude dos turnos que lhe podem ser atribuídos”.

M - E que a “indicação pelos/as trabalhadores/as da amplitude horária diária em que pretendem exercer a sua atividade profissional por forma a compatibilizá-la com a gestão das suas responsabilidades familiares, não consubstancia um pedido de horário rígido ou uma limitação ao poder de direção do empregador, a quem compete determinar o horário (…)”;

N - Fazendo-se também referência para a jurisprudência existente sobre esta matéria, nomeadamente a indicada na sentença revogada pelo Acórdão recorrido.

O - O artigo 68º da Constituição da República Portuguesa dispõe no seu n.º1 que “Os pais e as mães têm direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível ação em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país” e o seu n.º 2 que “ A maternidade e paternidade constituem valores sociais eminentes”.

P - Veja-se o artigo 59º n.º 1 do mesmo diploma, que dispõe que todos os trabalhadores têm direito à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar.

Q - Esta proteção da conciliação da vida profissional com a vida familiar tem sido fortemente reforçada através de Diretrizes Europeias.

R - A Recorrente requereu a atribuição de regime de horário de trabalho flexível para prestar assistência inadiável na educação e formação da sua filha de 18 meses.

S - O marido da Recorrente e pai da menor exerce as suas funções profissionais para o próprio Recorrido em regime de turnos, em horários rotativos hospitalares.

T - A Recorrente não tem ninguém que, na sua falta, possa prestar o acompanhamento necessário a uma criança de 18 meses, nem lhe é possível com o regime de turnos imposto pelo Recorrido, das 08h às 20h, ir buscá-la ao Infantário tanto mais que a avó materna e os avós paternos se encontram impossibilitados de o fazer, a primeira por residir em ... e os segundos por questões de saúde.

U - Verifica-se assim, salvo devido respeito, que julgou mal o acórdão recorrido em considerar procedente o recurso apresentado pelo ora Recorrido, afigurando-se não merecer a sentença agora revogada qualquer censura, face à apreciação das normas invocadas e à prova produzida em audiência de discussão e julgamento.

V - A decisão revogada assentou na convicção de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, analisando criteriosa e ponderadamente o conjunto da prova produzida, sem que se mostrem violadas as regras da experiência comum e sem que se verifique qualquer erro de julgamento, carecendo de razão o recurso sobre a matéria de direito e de facto.

X - O douto Acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento, pelo que se impõe a revogação da decisão, o que se requerer a V. Exas. com as legais consequências, tendo neste sentido se pronunciado a Exma. Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta, junto do Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do recurso apresentado pelo Recorrido e para o qual se remete na íntegra.

Termos em que e nos demais de direito, vem a Recorrente requerer a Vossas Excelências que seja concedido provimento ao presente recurso e em consequência o douto Acórdão revogado, com as legais consequências.

Contra-alegou o Autor deduzindo as seguintes conclusões:

a)         O Horário pretendido pela recorrente não é subsumível no horário flexível previsto no art. 56° do Código do Trabalho;

b)         A adoção do horário pretendido pela recorrente sempre acarreta um prejuízo para o funcionamento do Serviço, na medida em que fixa um dos turnos, num Serviço em que é praticado o regime de turnos rotativos;

c)         A adoção do horário de trabalho pretendido pela recorrente colide com os direitos e interesses subjetivos dos colegas em geral e, em particular, institui um tratamento privilegiadamente injustificado para os 4 da equipa de 6, com a mesma categoria e funções que compõem a equipa em que esta se encontra inserida, que também têm filhos menores.

d)         A redução da margem gestionária do recorrente na organização e estipulação dos horários de trabalho (arts. 97°, n°1 e 212°, n°1 do Código do Trabalho) é por demais desproporcionada, se for implementado o horário em apreço.

e)         A recusa do recorrente na adoção do horário solicitado é legítima, conforme reconhece o acórdão sub iudice.

Admitido o recurso com adequado regime de subida e efeito, subiram os autos a este Supremo Tribunal de Justiça.

Mantido o recurso, foi dado cumprimento ao disposto no n.º 3 do art. 87º do CPT, tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido douto parecer no sentido de ser negada revista e confirmado o acórdão recorrido.

Não houve resposta a este parecer.

Cumpre apreciar e decidir do mérito de recurso em causa.

II

Apreciação

Dado que, como se sabe, com exceção de questões de natureza oficiosa o objeto do recurso é delimitado pelas suas conclusões (artigos 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ambos do CPC), em face das que são formuladas pela Recorrente, coloca-se à apreciação deste Supremo Tribunal a questão de saber se houve (ou não) erro de julgamento, por errada interpretação das normas legais, por parte do Tribunal da Relação de Lisboa, ao considerar como fixo o horário indicado pela Recorrente como horário flexível, para ser praticado de 2ª a 6ª no período compreendido entre as 08h às 16h e com folga ao Sábado e ao Domingo, e ao considerar como legítima a recusa do mesmo por parte do Recorrido.

Fundamentos de facto

As instâncias consideraram provada a seguinte matéria de facto:

1- A Ré é trabalhadora do Autor desde 07.11.1994, com a categoria profissional de ..., prestando as suas funções no Departamento ... do Hospital dos SAMS - Serviço de Assistência Médica-Social do Autor, sito na Rua ...em Lisboa.

2- O período normal de horário de trabalho da Ré é de 35 horas semanais, conforme decorre do respetivo contrato de trabalho, junto com a petição inicial sob doc. 1, a fls. 5v. dos autos, e se dá por integralmente reproduzido.

3- Em cumprimento da respetiva carga horária semanal, a Ré atualmente exerce funções em regime de turnos rotativos, nos seguintes períodos definidos no serviço:

. Manhã: das 08h às 14h;

. Tarde: das 14h às 20h;

. Manhã/Tarde: das 09h às 20h ou das 08h às 19h.

4- Os referidos turnos são organizados/definidos no interesse do serviço, em condições de igualdade entre os trabalhadores, compreendendo os horários das 08h às 14h, das 08h às 19h, das 12h às 20h, das 08h às 15h, das 09h às 20h, das 14h às 20h, das 08h às 16h e das 10h às 20h.

5- No identificado Serviço ... do Autor trabalham 6 auxiliares de ação médica, dos quais 4 em regime de 40h semanais e 2 em regime de 35h semanais, distribuídos da seguinte forma:

. Manhã: 3 auxiliares de ação médica;

. Tarde: 2 auxiliares de ação médica;

. Manhã/Tarde: 1 ...

6- De entre os 6 auxiliares de ação médica do referido Serviço ..., 4 têm filhos menores de 12 anos e, atualmente, a própria Ré encontra-se em regime de redução de horário para aleitação.

7- Por carta datada de 06.12.2018, a Ré, invocando o disposto no art. 56º do Código do Trabalho, solicitou ao Autor a atribuição de “um regime de horário de trabalho flexível para prestar assistência inadiável da Educação e Formação a uma filha com 18 meses de idade (...) pelo período de Dez anos com o seguinte horário de trabalho: Das 08:00 horas às 16:00 horas, períodos de 8 horas, Sendo o descanso semanal Sábado e Domingo", conforme doc. 2, junto com a petição inicial, a fls. 6 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido.

8- Em resposta a tal solicitação da Ré, o Autor comunicou à Ré o respetivo indeferimento, por carta datada de 19.12.2018, cujo teor se dá aqui por reproduzido como consta de fls. 7v., 8 e 9 dos autos (doc. 3 junto com a petição inicial), sendo o seu teor parcial o seguinte:

“(…) (…)

Pese embora seja invocado o disposto no art.º 56º do Código do Trabalho, para fundamentar o pedido de horário flexível, verifica-se que a pretensão de colocação em horário de “segunda a sexta-feira, no período compreendido entre as 08h00 e as 16h00”, não configura um regime de horário flexível

Com efeito, o regime de horário flexível encontra-se definido no nº 2 do art. 56º do Código do Trabalho, como sendo aquele em que o trabalhador pode escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do horário de trabalho.

Cabendo ao trabalhador, nos termos da alínea a) do mencionado preceito legal, indicar as horas de presença obrigatória, a que se denomina plataformas fixas.

Assim, na referida modalidade de horário de trabalho fica o trabalhador na disponibilidade de organizar as horas de início e termo do período de trabalho normal diário, ficando obrigado à presença física obrigatória nas denominadas plataformas fixas, e, bem assim, a gerir aquelas plataformas flexíveis, de forma a cumprir a carga de horário do trabalho semanal e mensal.

Em bom rigor, a pretensão de colocação em horário de ‘‘segunda a sexta-feira, no período compreendido entre as 08h00 e as 16h00”, subsume-se na modalidade de horário rígido, aquele em que os turnos de entrada e saída são fixos e permanentes. Sendo que, tal pretensão não se insere no escopo da proteção dos trabalhadores com responsabilidades parentais.

Ainda assim, procedemos com a maior atenção à análise de viabilidade do pedido de V. Exa., no sentido de verificar do impacto da sua implementação no serviço. Todavia, propendem para o indeferimento imperiosos motivos relacionados com o funcionamento da empresa que, em seguida, se dilucidarão.

O departamento ... do hospital do SAMS, onde V. Exa. está colocada, labora em regime de turnos rotativos, que são distribuídos da seguinte forma:

Hospital funciona em regime de laboração contínua de 24h/dia, sendo que os Auxiliares de ação Médica terminam a sua jornada às 20h00, com os seguintes turnos rotativos:

a)         Manhã, no período das 08h às 14h, composto por 3 Auxiliares de ação Médica;

b)         Tarde: no período das 14h às 20h, composto por 2 Auxiliares de ação Médica;

c)         Manhã/Tarde: das 09h às 20h ou das 08h às 19h por 1 Auxiliar de acção Médica;

Neste último horária c), há 2 dias em que de acordo com uma escala definida (doc. 1), fazem horário prolongado para assegurar o normal funcionamento do serviço, conforme mapa demonstrativo.

Importa ainda compreender que os Auxiliares de ação Médica detêm diferentes cargas horárias de trabalho, em função dos respetivos contratos. Assim, num total de 6 Auxiliares de ação Médica, 4 encontram-se em regime de 40h semanais e 2 em regime de 35h semanais, e, de entre estes 6, 4 têm filhos menores de 12 anos e, atualmente, a própria requerente encontra-se com redução de horário para aleitação.

Ora, face à exiguidade dos quadros de pessoal da área de atividade em apreço, a necessidade de compatibilização e respeito pelos direitos dos demais trabalhadores, o cumprimento dos limites legais em matéria de horário de trabalho, verifica-se que o regime de turnos rotativos é o único modo possível de assegurar o funcionamento do serviço em laboração contínua, com o número de trabalhadores necessários para o apoio aos gabinetes médicos e, que distribui de forma equitativa entre os trabalhadores condições de compatibilização da vida profissional e familiar.

Por todo o exposto, a ser deferido o horário peticionado, revela-se impossível manter a rotatividade equitativa de horários até então praticada, na medida em que os turnos de tarde e de noite deixariam de ficar convenientemente assegurados, colocando em causa o funcionamento do serviço, com prejuízos sérios para a entidade empregadora.

Assim, impõe-se recusar o formulado pedido de alegado horário flexível, porque, como ficou demonstrado, o solicitado deferimento acarretaria sérios prejuízos para o normal e eficiente funcionamento do Departamento ou Unidade em que se integra V. Exa., consubstanciado na impossibilidade de assegurar a existência de trabalhadores em número suficiente no período da tarde.

Face ao exposto, considera-se indeferido o pedido de horário apresentado por V. Exa. por necessidade imperiosa de funcionamento e organização da Unidade.

(...) (...)”.

9- Na sequência, o Autor remeteu à CITE - Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, em 27.12.2018, a comunicação a que a alude o nº 5, do art. 57º do Código do Trabalho, relativa ao expediente do pedido de alteração de horário de trabalho da Ré, conforme doc. 4, junto com a petição inicial, a fls. 10v. e 11 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido.

10- Na reunião de 23 de Janeiro de 2019, por maioria dos seus membros, a CITE - Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego emitiu o parecer nº 35/CITE/2019, que foi desfavorável à intenção de recusa do pedido da ora Ré, nos termos do nº 5 do art.º 57º do Código do Trabalho, sendo tal parecer do seguinte teor (conforme doc. 5, junto com a petição inicial, a fls. 13 a 18 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido - também o documento de fls. 46 a 51 dos autos, doc. 2 junto com a contestação):

PARECER N.º 35/CITE/20i9

Assunto: - Parecer prévio à intenção de recusa do pedido de autorização de trabalho em regime de horário flexível, nos termos do n.º 5 do artigo 57.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

Processo n.º 4015/FH/2018

I-OBJETO

1.1.      A CITE recebeu em 28.12.2018, por correio registado, com aviso de receção, do Hospital dos SAMS do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas (SBSI), cópia do processo relativo ao pedido de autorização de trabalho em regime de horário flexível, apresentado pela trabalhadora AA, ..., a exercer funções no Serviço ... do Hospital SAMS, para efeitos da emissão de parecer nos termos do n.º 5 do artigo 57.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

1.2.      O pedido de horário flexível apresentado pela trabalhadora, datado de 06.12.2018, foi rececionado pela entidade empregadora na mesma data, e vem solicitar trabalhar entre 8:00h e as 16:00h, com descanso semanal aos sábados e domingos, pelo período de 10 (dez) anos.

1.3.      Para tanto alegou ter uma filha menor com 18 (dezoito) meses de idade, com quem vive em comunhão de mesa e habitação, que necessita do horário flexível para lhe permitir prestar assistência inadiável na educação e formação à sua filha, dado que o seu marido trabalha por turnos, com horário rotativo...

1.4.      Em 20.12.2018, a entidade empregadora comunicou à trabalhadora, por carta registada, com aviso de receção, a intenção de recusa, nos termos e com os fundamentos que, de seguida, se reproduz o que se reputa essencial para análise do pedido de parecer prévio:

(…)

Pese embora seja invocado o disposto no art.º 56.º do Código do Trabalho, para fundamentar o pedido de horário flexível, verifica-se que a pretensão de colocação em horário de "segunda a sexta-feira, no período compreendido entre as 08h00 e as 16h00", não configura um regime de horário flexível.

(…)

O departamento ..., do ..., onde V. Exa. está colocada, labora em regime de turnos rotativos, que são distribuídos da seguinte forma:

... funciona em regime de laboração contínua de 24h/dia, sendo que os Auxiliares de ação Médica terminam a sua jornada às 20h00, com os seguintes turnos rotativos;

a)         Manhã, no período das 08h às 14h, composto por 3 Auxiliares de ação Médica;

b)         Tarde, no período 14h às 20h composto por 2 Auxiliares de Ação Médica;

c)         Manhã/Tarde: das 9h00 às 20h00 ou das 08h00 às 19h00 por 1 ....

Neste último horário c), há 2 dias em que de acordo com uma escala definida (doc.1), fazem horário prolongado para assegurar o normal funcionamento do serviço, conforme mapa demonstrativo.

Importa ainda compreender que os Auxiliares de Ação Médica detêm diferentes cargas horárias de trabalho, em função dos respetivos contratos. Assim, num total de 6 Auxiliares de ação Médica, 4 encontram-se em regime de 40h semanais e 2 em regime de 35h semanais;

E, de entre estes 6, 4 têm filhos menores de 12 anos e, atualmente, a própria requerente encontra-se com redução de horário para aleitação.

Ora, face à exiguidade dos quadros de pessoal na área de atividade em apreço, a necessidade de compatibilização e respeito pelos direitos dos demais trabalhadores, o cumprimento dos limites legais em matéria de horário de trabalho, verifica-se que o regime de turnos rotativos é o único modo possível de assegurar o funcionamento do serviço em laboração contínua, com o número de trabalhadores necessários para o apoio aos gabinetes médicos e, que distribui de forma equitativa entre os trabalhadores condições de compatibilização da vida profissional e familiar.

Por todo o exposto, a ser deferido o horário peticionado, revela-se impossível manter a rotatividade equitativa de horários até então praticada, na medida em que os turnos de tarde e noite deixariam de ficar convenientemente assegurados, colocando em causa o funcionamento do serviço, com prejuízos sérios para a entidade empregadora.

Assim, impõe-se recusar o formulado pedido de alegado horário flexível, porque, como ficou demonstrado, o solicitado deferimento acarretaria sérios prejuízos para o normal e eficiente funcionamento do Departamento ou Unidade em que se integra V. Exa., consubstanciado na impossibilidade de assegurar a existência de trabalhadores em número suficiente no período da tarde.

Face ao exposto, considera-se indeferido o pedido de horário apresentado por V. Exa, por necessidade imperiosa de funcionamento e organização da Unidade.

No entanto, o SBSI sensível à compatibilidade de vida laboral, com a vida familiar e sendo que é do conhecimento do mesmo que o progenitor é também trabalhador do Hospital dos SAMS, como aliás refere na sua carta, propõe-se ajustar o horário deste, fazendo com que não seja coincidente com o da ora requerente, de forma a compatibilizar os horários, do pai e da mãe, ao necessário apoio aos filhos menores.

(…)”

1.5.      Do processo não consta que a trabalhadora tenha apresentado apreciação à intenção de recusa.

1.6.      Em cumprimento do n.º 5 do artigo 57.º do Código do Trabalho, a entidade empregadora remeteu o processo a esta Comissão em 19.12.2018, por correio eletrónico.

*

1.7.      Cabe à CITE, nos termos do Decreto-Lei n.º 76/2012, de 26 de março, que aprova a lei orgânica, artigo 3.° sob a epígrafe: "Atribuições próprias e de assessoria”:

“(...) c) Emitir parecer prévio no caso de intenção de recusa, pela entidade empregadora, de autorização para trabalho a tempo parcial ou com flexibilidade de horário a trabalhadores com filhos menores de 12 anos (...)”.

II- ENQUADRAMENTO JURÍDICO

2.1.      A igualdade entre homens e mulheres é um princípio fundamental da União Europeia. Em conformidade com o parágrafo segundo do n.º 3 do artigo 3.º do Tratado da União Europeia (TUE), a promoção da igualdade entre os homens e as mulheres é um dos objetivos da União.

2.2.      O Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) dispõe no seu artigo 8.º que a União, na realização de todas as suas ações, tem por objetivo eliminar as desigualdades e promover a igualdade entre homens e mulheres, mais dispondo alínea i) do n.º 1 do artigo 153.º que “A fim de realizar os objetivos enunciados no artigo 151.º, a União apoiará e completará a ação dos Estados-Membros nos seguintes domínios: (...) (i) Igualdade entre homens e mulheres quanto às oportunidades no mercado de trabalho e ao tratamento no trabalho”.

2.3.      A Carta Social Europeia Revista, ratificada por Portugal em 21 de setembro de 2001, reconhece como objetivo de política a prosseguir por todos os meios úteis, nos planos nacional e internacional, a realização de condições próprias a assegurar o exercício efetivo de direitos e princípios como o que estabelece que todas as pessoas com responsabilidades familiares que ocupem ou desejem ocupar um emprego têm direito de o fazer sem ser submetidas a discriminações e, tanto quanto possível, sem que haja conflito entre o seu emprego e as suas responsabilidades familiares.

2.4.      A Diretiva 2006/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 5 de julho de 2006, trata da aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de emprego e atividade profissional com vista a facilitar a conciliação da vida familiar com a vida profissional.

2.5.      A Diretiva 2010/18/EU do Conselho, de 8 de março de 2010, que aplica o Acordo-Quadro revisto sobre licença parental, que revogou a Diretiva 96/34/CE, com efeitos a partir de 8 de março de 2012, retomou a necessidade de as “políticas da família /deverem] contribuir para a concretização da igualdade entre homens e mulheres e ser encaradas no contexto da evolução demográfica, dos efeitos do envelhecimento da população, da aproximação entre gerações, da promoção da partilha das mulheres na vida ativa e da partilha das responsabilidades de cuidados entre homens e mulheres” (Considerando 8), de “tomar medidas mais eficazes para encorajar uma partilha mais igual das responsabilidades familiares entre homens e mulheres” (Considerando 12), e de garantir que “o acesso a disposições flexíveis de trabalho facilita aos progenitores a conjugação das responsabilidades profissionais e parentais e a sua reintegração no mercado de trabalho, especialmente quando regressam do período de licença parental.”(Considerando 21).

2.6.      A Recomendação (UE) 2017/761 da Comissão, de 26 de abril de 2017 sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais adotou, no seu ponto 9 (capítulo II), sob a epígrafe “Equilíbrio entre a vida profissional e a vida privada” recomendar que “Os trabalhadores com filhos e familiares dependentes têm o direito de beneficiar de licenças adequadas, de regimes de trabalho flexíveis e de aceder a serviços de acolhimento. As mulheres e os homens têm igualdade de acesso a licenças especiais para cumprirem as suas responsabilidades familiares e devem ser incentivados a utilizá-las deforma equilibrada”.

2.7.      O Pilar Europeu dos Direitos Sociais1, proclamado pelos líderes da União Europeia no dia 17 de novembro de 2017, em Gotemburgo, é constituído por três capítulos: I - Igualdade de oportunidades e de acesso ao mercado de trabalho; II - Condições justas no mercado de trabalho e III - Proteção social e inclusão, e integra 20 princípios fundamentais a prosseguir pela Europa, nomeadamente o da conciliação da atividade profissional com a vida familiar e privada.

2.8.      O ordenamento jurídico português, na Lei Fundamental consagra as orientações, acima expostas, de direito internacional e de direito europeu, desde logo, no artigo 9.° da Constituição da República Portuguesa (CRP), ao estabelecer como tarefas fundamentais do Estado a garantia dos direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático; a promoção do bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efetivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais; e, promover a igualdade entre homens e mulheres.

2.9. No artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) vem consagrado o princípio fundamental da igualdade, princípio estruturante do Estado de Direito democrático, impetrando o tratamento igual do que é igual e o tratamento diferenciado do que é diferente, concretizando-se em dois vetores, designadamente, a proibição do arbítrio legislativo e a proibição da discriminação.

2.10. O n.º 1 do artigo 68.º, da Constituição da República Portuguesa (CRP), estabelece que “Os pais e as mães têm direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível ação em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país.”, e o n.º 2 do mesmo dispositivo legal dispõe que “A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes.”

2.11. Consagra-se na alínea b) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), todos os trabalhadores têm direito “(...) à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar.”

2.12. Passando, agora, a analisar a legislação laboral, importa, antes de mais, referir que a mesma consubstancia a concretização dos princípios constitucionais atrás enunciados.

2.13. Na subsecção IV, do capítulo I, do título II, do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, é tratada a matéria dedicada à parentalidade, e sob a epígrafe “horário flexível de trabalhador com responsabilidades familiares”, prevê o artigo 56.º daquele diploma legal, que o trabalhador, com filho menor de 12 (doze) anos ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica, que com ele viva em comunhão de mesa e habitação, tem direito a trabalhar em regime de horário flexível, entendendo-se que este horário é aquele em que o trabalhador pode escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do período normal de trabalho diário.

2.14. O/A trabalhador/a que pretenda exercer o direito estabelecido no citado artigo 56.º designadamente trabalhar em regime de horário flexível, deverá solicitá-lo ao empregador, por escrito, com a antecedência de 30 dias, indicando qual o horário pretendido e a justificação da sua pretensão, bem como indicar o prazo previsto, dentro do limite aplicável, e declarar que o menor vive com ele/a em comunhão de mesa e habitação - cfr. artigo 57.º, do Código do Trabalho (CT).

2.15. Uma vez solicitada autorização de trabalho em regime de horário flexível, a entidade empregadora apenas poderá recusar o pedido com fundamento em uma de duas situações, quando alegue e demonstre, deforma objetiva e concreta, a existência de exigências imperiosas do funcionamento da empresa que obstem à recusa, ou a impossibilidade de substituir o/a trabalhador/a se este/a for indispensável, nos termos do disposto no n.º 2, do mencionado artigo 57.º.

2.16. Dispõe o n.º 3 daquele preceito legal, que o empregador tem de comunicar a sua decisão, por escrito, ao/à trabalhador/a, no prazo de 20 (vinte) dias, contados a partir da receção do pedido. No caso de não observância pelo empregador do prazo indicado, considera-se aceite o pedido do/a trabalhador/a, nos termos da alínea a) do n.º 8 do artigo 57.º do Código do Trabalho.

2.17. Quando o empregador pretenda recusar a solicitação, é obrigatório o pedido de parecer prévio à CITE, nos 5 (cinco) dias subsequentes ao fim do prazo estabelecido para apreciação pelo/a trabalhador/a da intenção de recusa, implicando a sua falta a aceitação do pedido, nos termos da alínea c) do n.º 8 do artigo 57.º do Código do Trabalho.

2.18. Nos termos do nº, 3 do mesmo artigo, caso o parecer desta Comissão seja desfavorável, a entidade empregadora só poderá recusar o pedido do trabalhador/a após decisão judicial que reconheça a existência de motivo justificativo.

2.19. Regressando ao conceito de horário flexível, previsto no artigo 56.º, n.º 2 do Código do Trabalho, já citado, note-se que o n.º 3 do mesmo artigo esclarece que “O horário flexível, a elaborar pelo empregador, deve:

a)         Conter um ou dois períodos de presença obrigatória, com duração igual a metade do período normal de trabalho diário;

b)         Indicar os períodos para início e termo do trabalho normal diário, cada um com duração não inferior a um terço do período normal de trabalho diário, podendo esta duração ser reduzida na medida do necessário para que o horário se contenha dentro do período de funcionamento do estabelecimento;

c)         Estabelecer um período para intervalo de descanso não superior a duas horas”.

2.20. Neste regime de trabalho, o/a trabalhador/a poderá efetuar até 6 (seis) horas consecutivas de trabalho e até 10 (dez) horas de trabalho em cada dia e deve cumprir o correspondente período normal de trabalho semanal, em média de cada período de quatro semanas.

2.21. A intenção do legislador que subjaz à feitura da norma, prende-se com a necessidade de harmonizar o direito do trabalhador/a à conciliação da atividade profissional com a vida familiar, conferindo-lhe a possibilidade de solicitar ao seu empregador a prestação de trabalho em regime de horário flexível, sempre que tenha filhos/as menores de 12 (doze) anos ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica. Tal direito é materializável mediante a escolha, pelo/a trabalhador/a, e dentro de certos limites, das horas para início e termo do período normal de trabalho diário, cabendo ao empregador elaborar esse horário flexível, observando, para tal, as regras indicadas no n.º 3 daquele artigo 56.°.

Assim, incumbe ao empregador estipular, dentro da amplitude de horário escolhida pelo/a trabalhador/a requerente, períodos para início e termo do trabalho diário, cada um com duração não inferior a um terço do período normal de trabalho diário, podendo esta duração ser reduzida na medida do necessário para que o horário se contenha dentro do período de funcionamento do estabelecimento/serviço.

2.22. É doutrina maioritária desta Comissão considerar enquadrável no artigo 56.º do Código do Trabalho, a indicação, pelo/a requerente, de um horário flexível a ser fixado dentro de uma amplitude temporal diária e semanal apontada como a mais favorável à conciliação da atividade profissional com a vida familiar, por tal circunstância não desvirtuar a natureza do horário flexível se essa indicação respeitar o seu período normal de trabalho diário. Importa, ainda, que a amplitude indicada pelo/a trabalhador/a seja enquadrável na amplitude dos turnos que lhe podem ser atribuídos.

2.23. Assim, entende-se a indicação pelos/as trabalhadores/as       da amplitude horária diária em que pretendem exercer a sua atividade profissional, por forma a compatibilizá-la com a gestão das suas responsabilidades familiares, não consubstancia um pedido de horário rígido ou uma limitação ao poder de direção do empregador, a quem compete determinar o horário, nos termos previstos no artigo 212.º do Código do Trabalho, observando o dever de facilitar a conciliação da atividade profissional com a vida familiar, tal como expressamente referido na alínea b) do n.º 2, do referido preceito legal.

2.24. Refira-se, ainda, a propósito desta matéria, que é dever da entidade empregadora proporcionar às/aos trabalhadores/as condições de trabalho que favoreçam a conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal [a este propósito vide o n.º 3 do artigo 127.º, do Código do Trabalho (CT)], bem como, deve facilitar ao/à trabalhadora a conciliação da atividade profissional com a vida familiar [alínea b) do n.º 2, do artigo 212.º do Código do Trabalho (CT)].

2.25. Atenda-se a que no horário flexível a elaborar pelo empregador, nos termos do n.º 3 do artigo 56.º do Código do Trabalho, cabe sempre a possibilidade de ser realizado um horário fixo, o que até é mais favorável ao empregador, na medida em que naquele tipo de horário, o/a trabalhador/a poderia não estar presente até metade do período normal de trabalho diário, desde que cumpra o correspondente período normal de trabalho semanal, em média de cada período de quatro semanas, conforme dispõe o n.º 4 do referido artigo 56º do mesmo Código.

2.26. Da aplicação das normas legais citadas, resulta a obrigação de a entidade empregadora elaborar horários de trabalho destinados a facilitar a conciliação dos/as trabalhadores/as com responsabilidades familiares, de acordo com o disposto nos artigos 56.º e 57.º do Código do Trabalho (CT), sendo legítimo ao empregador recusar o pedido com fundamento em exigências imperiosas do funcionamento da empresa, ou na impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável, o que equivale a afirmar que impende sobre a entidade empregadora um dever acrescido de demonstrar nestes casos, concretizando objetiva e coerentemente, na prática, em que se traduzem tais exigências imperiosas.

2.27. No caso em análise, a trabalhadora vem requerer que lhe seja concedido o regime de trabalho em horário flexível entre as 8:00h e as 16:00h, com descanso semanal aos sábados e domingos, pelo período de 10 (dez) anos.

2.28. Para tanto alegou ter uma filha menor, com 18 (dezoito) meses de idade, com quem vive em comunhão de mesa e habitação, que necessita do horário flexível para lhe permitir prestar assistência inadiável na educação e formação, dado que o seu marido trabalha por turnos no hospital, com horário rotativo.

2.29. No que concerne à intenção de recusa, a entidade empregadora alega que as necessidades de funcionamento do serviço não são compatíveis com o horário solicitado, pelos motivos seguintes:

- O pedido de horário não obedece aos pressupostos do regime de horário flexível nos termos definidos no artigo 56.º, do Código do Trabalho; mas antes subsume-se na modalidade horário rígido, aquele em que os turnos de entrada e de saída são fixos e permanentes, pelo que, a pretensão da trabalhadora não se insere no escopo da proteção dos trabalhadores com responsabilidades parentais;

- O Serviço funciona em laboração contínua, 24h/dia;

- O pessoal ... termina a prestação de trabalho diária às 20:00h;

- Os turnos rotativos do serviço estão organizados em 3 (três) períodos:

Manhã - 8:00h/14:00h; Tarde - 14:00h/20:00h; Manhã/Tarde - 9:00h/20:00h ou 8:00h/ 19:00h;

- O turno da Manhã integra 3 (três) trabalhadores/as;

- O turno da Tarde integra 2 (dois) trabalhadores/as;

- O turno Manhã/ Tarde integra 1 (um) trabalhador/a;

- No turno Manhã/Tarde, há 2 (dois) dias em que, de acordo com a escala definida, os/as Auxiliares de Ação Médica realizam “horário prolongado para assegurar o normal funcionamento do serviço”

- Os/As Auxiliares de Ação Médica detêm diferentes cargas horárias de trabalho semanais, em função dos respetivos contratos de trabalho;

- Num total de 6 (seis) Auxiliares de Ação Médica, 4 (quatro) têm uma carga horária semanal de 40 horas e 2 (dois) têm carga de 35 horas;

- De entre os/as 6 (seis) auxiliares, 4 (quatro) têm crianças menores de 12 anos e, atualmente, a própria requerente encontra-se com redução de horário para aleitação;

- Assevera que o regime de turnos rotativos é o único modo possível de assegurar o serviço em laboração contínua, face à exiguidade dos quadros de pessoal naquela área de atividade e à necessidade de salvaguardar os direitos dos/as demais trabalhadores/as;

- O deferimento do pedido tornaria impossível manter a rotatividade equitativa dos horários em vigor, na medida em que os turnos da tarde e da noite deixariam de ficar convenientemente assegurados, colocando em causa o funcionamento do serviço, acarretando prejuízos sérios para o empregador.

2.30. Posto isto, analisemos.

Compete à entidade empregadora gerir de forma equilibrada o horário de trabalho dos/as seus/suas trabalhadores/as, por forma a garantir a plenitude do funcionamento do serviço, organizando-o com ponderação dos direitos de todos/as e de cada um/a deles/as, onde se inclui o direito à conciliação da vida profissional com a vida familiar.

2.31. Resulta claro da exposição da requerida que o pedido se enquadra na organização dos tempos de trabalho em vigor no serviço onde trabalha, que decorrem entre as 8:00h/ 14:00h, 14:00h/20:00/h e as 9:00h/20:00h ou 8:00h/19:00h, pelo que se conclui que o horário solicitado se contém dentro do período de funcionamento do serviço, incluindo-se no primeiro turno.

2.32. Resta saber se a trabalhadora caso lhe fosse atribuído o primeiro turno (Turno da Manhã) cumpriria a carga horária semanal a que se encontra obrigada por força do seu contrato de trabalho.

2.33. Ora, a requerente pede para trabalhar 8 (oito) horas diárias e para que os dias de descanso semanal coincidam com o sábado e domingo.

2.34. Não resulta da leitura do pedido de horário da trabalhadora, nem da intenção de recusa, qual o número de horas a que se encontra obrigada a trabalhar semanalmente. No entanto, a trabalhadora afirma querer realizar períodos de 8 (oito) horas diárias, cinco dias por semana, o que perfaz um total de 40 (quarenta) horas semanais, facto não contestado pelo empregador.

2.35. O turno da Manhã decorre entre as 8:00h e as 14:00h, com duração de 6 (seis) horas diárias, o que perfaz um total de 35 (trinta e cinco) horas semanais.

2.36. Ora, de acordo com os turnos comunicados pela entidade empregadora, a trabalhadora ao ter de trabalhar mais 2 (duas) horas diárias terminaria o turno da manhã às 14:00h e teria de iniciar o segundo turno (14:00h/20:00h) aí permanecendo até às 16:00h, ficando a descoberto o período até às 20:00h.

2.37. Todavia, integram o presente processo dois mapas do serviço, que constituem doc. 1 e doc. 2. (a folhas do processo instrutor)

2.38. Analisados os referidos mapas constata-se existirem 8 (oito) horários diferentes, a saber 8:00h/14:00h, 8:00h/19:00h, 12:00h/20:00h, 8:00h/15.00h, 9:00h/20:00h, 14:00h/20:00h, 8:00h/16:00h e 10:00h/20:00h.

2.39. Assim sendo, o horário solicitado pela Requerente tem correspondência com um dos turnos praticados no serviço ao qual se encontra afeta.

2.40. Entende a entidade empregadora que o pedido não preenche os requisitos do regime de horário flexível. Contudo, será de chamar à colação o exposto nos pontos 2.22 a 2.26.

2.41. Acresce que será também de remeter para o entendimento da jurisprudência patente no Acórdão da Relação do Porto, de 02.03.2017, de que se transcreve o seguinte excerto: - “(...) Entende-se por flexibilidade de horário de acordo com o art. 56.º, n.º 2 do CT., aquele em que o trabalhador pode escolher, dentro de certos limites, a que se refere o n.º 3 e 4 do mesmo preceito, as horas de início e termo do período normal de trabalho diário. Assim, será um horário flexível para os efeitos em causa, todo aquele que possibilite a conciliação da vida profissional com a vida familiar de trabalhador com filhos menores de 12 anos, ainda que tal horário, uma vez definido, na sua execução seja fixo.”(negrito e sublinhado nossos).

2.42. Esclarece aquele Acórdão, quanto ao poder de direção do empregador, que:-

“São constitucionalmente protegidos os direitos ao livre exercício da iniciativa económica privada e à liberdade de organização empresarial (cfr. arts. 61.º, e 80.º, n.º 1, al. c) da Constituição da República Portuguesa). Tais interesses e direitos enfrentam, porém, as restrições decorrentes dos direitos fundamentais dos trabalhadores como os supra referidos direitos à conciliação da atividade profissional com a vida familiar, o direito à proteção da família como elemento fundamental da sociedade e o direito à maternidade e paternidade em condições de satisfazer os interesses da criança e as necessidades do agregado familiar, já que estes se sobrepõem àqueles quando em confronto e que estes só cedem perante aqueles, quando em presença de interesses imperiosos.” (negrito e sublinhado nossos).

2.43. O horário flexível surge como resposta à necessidade de pais mães que trabalham prestarem apoio às suas crianças, acudindo às necessidades destas enquanto dependentes e, simultaneamente, continuarem a cumprir com as suas obrigações laborais, pelo que, o direito plasmado no artigo 56.º do Código do Trabalho é resultado do reconhecimento pelo legislador e com consagração nas normas laborais de valores humanos básicos relacionados com a parentalidade e que aqui encontram tutela especial.

2.44. Argumenta o empregador que 4 (quatro) de 6 (seis) trabalhadores/as do serviço têm filhos/as menores de 12 (doze) anos, porém nada dizendo quanto à modalidade de horário praticada, designadamente se algum/a deles/as presta trabalho em regime de horário flexível ou a tempo parcial. com os' direitos de outros/as trabalhadores/as, resultantes do exercício da atividade profissional

2.44. -Quanto à colisão de direitos, concretamente do direito da Requerente com os direitos de outros/as trabalhadores/as, resultantes do exercício da atividade profissional em regime de horário flexível ou decorrentes do gozo de outros direitos iguais ou da mesma espécie, máxime relacionados com a parentalidade, entende-se que “O direito à conciliação da atividade profissional com a vida familiar e o direito à proteção da paternidade e maternidade estão inseridos na Parte I da Constituição da República Portuguesa relativa aos Direitos e Deveres Fundamentais e, não podem ser postergados por outros direitos ou deveres profissionais, mas sim conformar-se com eles.” (Parecer n.º 25/CITE/2014).

2.45. Face ao que antecede, não ficou demonstrado de que forma a atribuição do regime de horário flexível à requerente pode ser determinante para concluir pela inexistência de outros/as trabalhadores/as para realizarem os demais horários, impossibilitando a rotatividade equitativa dos horários pelos elementos da equipa, na medida em que não se concretizam factos que permitam concluir pela verificação de exigências imperiosas do funcionamento do serviço e eventuais prejuízos daí resultantes.

2.46. Analisados o pedido e os fundamentos da intenção de recusa e a apreciação da trabalhadora, afigura-se que não existem impedimentos legais ou contratuais que impeçam a realização do horário solicitado e conclui-se que se encontram prDDnchidos todos os requisitos consignados nos artigos 56.º e 57.º do Código do Trabalho.

2.47. De salientar que o reconhecimento dos direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras com responsabilidades familiares não implica a desvalorização da atividade profissional que prestam nem a depreciação dos interesses dos empregadores. Pelo contrário, o direito à conciliação da atividade profissional com a vida familiar, consignado na Constituição da República Portuguesa, é um direito especial que visa harmonizar ambas as conveniências, competindo à entidade empregadora organizar o tempo de trabalho de modo a dar cumprimento ao previsto na lei sobre a proteção ao exercício da parentalidade.

III - CONCLUSÃO

Face ao exposto:

3.1.      A CITE emite parecer desfavorável à intenção de recusa da entidade empregadora Hospital dos SAMS do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas (SBSI), relativamente ao pedido de trabalho em regime de horário flexível apresentado pela trabalhadora com responsabilidades familiares AA, para trabalhar em horário flexível entre 8:00h e as 16:00h, com descanso semanal ao sábado e ao domingo, até que a sua filha perfaça os 12 (doze) anos de idade.

3.2.      O empregador deve proporcionar condições de trabalho que favoreçam a conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal, e, na elaboração dos horários de trabalho, deve facilitar essa mesma conciliação, nos termos, das disposições conjugadas do n.º 3 do artigo 127.º, da alínea b) do n.º 2 do artigo 212º e do n.º 2 do artigo 221.º, todos do Código do Trabalho(CT), concretizadores do direito fundamental à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, consagrado na alínea b) do n.º 1 do artigo 59.º, da Constituição da República Portuguesa.

11- O Autor em resposta ao solicitado e sensível às necessidades da Ré, cujo companheiro e progenitor da filha menor trabalha também no hospital do SAMS, propôs-se ajustar o horário deste, em regime de turnos, em horários rotativos, de forma a não coincidir com o da Ré, mas tal não veio a ser possível porque o companheiro da Ré e progenitor do filho menor trabalha também noutros locais para além do hospital do SAMS.

12- A Ré vive em comunhão de mesa e habitação com o seu companheiro, CC, progenitor da filha menor de 18 meses, DD.

13- A menor DD tem ficado até à data aos cuidados dos avós paternos, estando inscrita num infantário/jardim infantil, cujo horário é das 7.30h às 19:30h de segunda a sexta-feira, no qual está previsto ingressar em Setembro de 2019, uma vez que os avós paternos sofrem de doenças que não aconselham continuar a ter a menor aos seus cuidados em permanência.

Fundamentos de direito

Como se referiu, no recurso em causa coloca-se à apreciação do Supremo Tribunal de Justiça a questão de saber se houve (ou não) erro de julgamento, por errada interpretação das normas legais, por parte do Tribunal da Relação, ao considerar como sendo fixo o horário indicado pela Ré/Recorrente como flexível, para ser praticado de segunda a sexta-feira no período compreendido entre as 08h00 às 16h00 e com folga ao Sábado e ao Domingo, bem como ao considerar legítima a recusa de atribuição do mesmo àquela por parte do Autor/Recorrido.

Antes de mais, importa referir que na análise desta questão de recurso se deve levar em consideração o estabelecido, desde logo, na Constituição da República Portuguesa (CRP), sem se perder de vista eventuais normas de Direito Europeu, bem como o estabelecido no Código do Trabalho (CT) aprovado pela Lei n.º 7/2009 de 12 de fevereiro e subsequentes alterações que neste foram introduzidas.

Posto isto e em síntese, alega a Recorrente que o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento por incorreta interpretação das normas jurídicas aplicáveis ao caso, porquanto, tendo solicitado ao Recorrido a atribuição de horário flexível ao abrigo do disposto no artigo 56º do CT, de forma a poder trabalhar de segunda a sexta-feira entre as 08:00 e as 16:00 horas, com descanso semanal aos sábados e domingos – período dentro do qual o horário flexível deveria ser elaborado pelo Recorrido por ser o mais favorável à conciliação da sua atividade familiar com a atividade profissional –, em detrimento do atual regime de trabalho por turnos entre as 08:00 e as 20:00 horas, fê-lo com fundamento no facto de ter uma filha menor, com 18 meses de idade, com quem vive em comunhão de mesa e habitação, circunstância que implica a necessidade de prestar assistência inadiável na sua educação e formação, algo que só será possível com a prática de horário flexível, uma vez que o seu companheiro trabalha por turnos, com horário rotativo, não tendo ninguém que, na sua falta, possa prestar o acompanhamento necessário à sua filha, nem lhe sendo possível, com o regime de turnos imposto pelo Recorrido, ir buscá-la ao infantário, tanto mais que a avó materna e os avós paternos se encontram impossibilitados de o fazer, a primeira por residir em ... e os segundos por questões de saúde.

Alega ainda que a ilegitimidade em que se sustenta a decisão do acórdão recorrido ao revogar a sentença proferida pela 1ª instância, por, em seu entender, o pedido configurar horário rígido, vai contra o estabelecido no n.º 3 do art. 56º do CT, sendo que a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) emitiu parecer desfavorável à intenção de recusa do Recorrido.

Vejamos!

Como refere a Sr.ª Prof.ª Maria do Rosário Palma Ramalho em Direito do Trabalho – Parte II – Situações Laborais Individuais – 3.ª Edição – pág.ª 508, «[o] regime legal do tempo de trabalho é, tradicionalmente, um regime de acentuada rigidez, no sentido em que corresponde a um modelo fixo de distribuição do período normal de trabalho diário e semanal: em regra, o trabalhador fica adstrito a um número invariável de horas de trabalho, por dia e por semana, e o seu horário de trabalho é sempre o mesmo».

Todavia, dispõe o art. 59º n.º 1 al. b) da CRP que «[t]odos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito:… b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar» (realce nosso), sendo que no art. 67º n.º 2 al. h), também da CRP, se estabelece que «[i]ncumbe, designadamente, ao Estado para protecção da família:… h) Promover, através da concertação das várias políticas sectoriais, a conciliação da actividade profissional com a vida familiar» – o que está em linha com o previsto no n.º 1 do art. 33º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (CDFUE) ao consagrar que «[é] assegurada a proteção da família nos planos jurídico, económico e social» –, enquanto no art. 68º n.os 1 e 2 da CRP se prevê, respetivamente, que «[o]s pais e as mães têm direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível ação em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país» e que «[a] maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes».

Concretizando o estabelecido nos mencionados preceitos da nossa Lei Fundamental, verifica-se que o legislador, depois de estipular no art. 33º n.os 1 e 2 do CT, respetivamente, que, «[a] maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes» e que «[o]s trabalhadores têm direito à protecção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível acção em relação ao exercício da parentalida», estabeleceu no art. 212º n.º 1 do mesmo diploma que, «[c]ompete ao empregador determinar o horário de trabalho do trabalhador, dentro dos limites da lei, designadamente do regime de período de funcionamento aplicável», sendo que no n.º 2 do mesmo preceito e no que aqui releva, dispôs que «[n]a elaboração do horário de trabalho, o empregador deve:… b) Facilitar ao trabalhador a conciliação da actividade profissional com a vida familiar» (realce nosso).

Para além disso e sob a epígrafe «[h]orário flexível de trabalhador com responsabilidades familiares», estipulou no art. 56º, também do CT, que:

«1 - O trabalhador com filho menor de 12 anos ou, independentemente da idade, filho com deficiência ou doença crónica que com ele viva em comunhão de mesa e habitação tem direito a trabalhar em regime de horário de trabalho flexível, podendo o direito ser exercido por qualquer dos progenitores ou por ambos.

2 - Entende-se por horário flexível aquele em que o trabalhador pode escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do período normal de trabalho diário.

3 - O horário flexível, a elaborar pelo empregador, deve:

a) Conter um ou dois períodos de presença obrigatória, com duração igual a metade do período normal de trabalho diário;

b) Indicar os períodos para início e termo do trabalho normal diário, cada um com duração não inferior a um terço do período normal de trabalho diário, podendo esta duração ser reduzida na medida do necessário para que o horário se contenha dentro do período de funcionamento do estabelecimento;

c) Estabelecer um período para intervalo de descanso não superior a duas horas.

4 - O trabalhador que trabalhe em regime de horário flexível pode efectuar até seis horas consecutivas de trabalho e até dez horas de trabalho em cada dia e deve cumprir o correspondente período normal de trabalho semanal, em média de cada período de quatro semanas.

(…)».

Finalmente e no que aqui também releva, estabelece o art. 57º, ainda do CT, que:

«1 - O trabalhador que pretenda trabalhar… em regime de horário de trabalho flexível deve solicitá-lo ao empregador, por escrito, com a antecedência de 30 dias, com os seguintes elementos:

a) Indicação do prazo previsto, dentro do limite aplicável;

b) Declaração da qual conste:

(i) Que o menor vive com ele em comunhão de mesa e habitação;

(…)

2 - O empregador apenas pode recusar o pedido com fundamento em exigências imperiosas do funcionamento da empresa, ou na impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável.

3 - No prazo de 20 dias contados a partir da recepção do pedido, o empregador comunica ao trabalhador, por escrito, a sua decisão.

4 - No caso de pretender recusar o pedido, na comunicação o empregador indica o fundamento da intenção de recusa, podendo o trabalhador apresentar, por escrito, uma apreciação no prazo de cinco dias a partir da recepção.

5 - Nos cinco dias subsequentes ao fim do prazo para apreciação pelo trabalhador, o empregador envia o processo para apreciação pela entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, com cópia do pedido, do fundamento da intenção de o recusar e da apreciação do trabalhador.

6 - A entidade referida no número anterior, no prazo de 30 dias, notifica o empregador e o trabalhador do seu parecer, o qual se considera favorável à intenção do empregador se não for emitido naquele prazo.

7 - Se o parecer referido no número anterior for desfavorável, o empregador só pode recusar o pedido após decisão judicial que reconheça a existência de motivo justificativo.

8 - Considera-se que o empregador aceita o pedido do trabalhador nos seus precisos termos:

a) Se não comunicar a intenção de recusa no prazo de 20 dias após a recepção do pedido;

b) Se, tendo comunicado a intenção de recusar o pedido, não informar o trabalhador da decisão sobre o mesmo nos cinco dias subsequentes à notificação referida no n.º 6 ou, consoante o caso, ao fim do prazo estabelecido nesse número;

c) Se não submeter o processo à apreciação da entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres dentro do prazo previsto no n.º 5.

(…)».

Ora, perante este quadro legislativo, verifica-se que, com o mesmo, se procura proporcionar a existência de uma equilibrada conjugação entre aspetos essenciais na vivência do trabalhador por conta de outrem, em particular no que concerne à vertente da maternidade ou da paternidade enquanto valores sociais de relevo, de forma que, na organização do trabalho, o acesso à flexibilidade de horário facilite aos trabalhadores/progenitores a conjugação das suas responsabilidades profissionais com as suas responsabilidades parentais, a sua vida familiar.

Na verdade, sem se pôr em causa que, no âmbito dos poderes de direção de que goza, compete ao empregador determinar o horário de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço, com respeito pelos limites da lei, designadamente do regime de período de funcionamento aplicável ao estabelecimento ou empresa onde estes devam prestar a sua atividade laboral, o certo é que, na determinação do horário de trabalho, o empregador deve facilitar ao trabalhador a conciliação da sua atividade profissional com a sua vida familiar, de forma que esta, sob o ponto de vista parental, seja tão normal quanto possível.

É, pois, no âmbito deste dever mais geral, digamos assim, que surge o dever que recai sobre o empregador, de concessão de um horário flexível a trabalhador com responsabilidades familiares que, por escrito, lhe solicite a possibilidade de trabalhar nesse regime de horário de  trabalho, designadamente porque tenha filho(s) menor(es) de 12 anos que com ele viva(m) em comunhão de mesa e habitação, podendo, em tais circunstâncias, o trabalhador escolher, dentro de certos limites – desde logo, levando em consideração o período de funcionamento da empresa e horários nela praticados –, as horas de entrada e de saída do trabalho de forma a cumprir o período normal de trabalho a que contratualmente se obrigara com a sua entidade empregadora.

Ainda assim, importa frisar que compete ao empregador – naturalmente com respeito pelos limites da lei e com base na escolha horária que lhe tenha sido apresentada pelo trabalhador – determinar o horário flexível de trabalho do trabalhador que, com responsabilidades familiares, lhe tenha solicitado a prestação laboral nesse regime de horário, definindo, dentro da amplitude de horário escolhido por este, quais os períodos de início e termo do trabalho diário, cada um com duração não inferior a um terço do período normal de trabalho diário, podendo esta duração ser reduzida na medida do necessário para que o horário se contenha dentro do período de funcionamento do estabelecimento, como decorre do estabelecido no n.º 3 al. b) do mencionado art. 56º, sendo que o empregador apenas em determinadas circunstâncias, relacionadas com exigências imperiosas do funcionamento da empresa ou com a impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável, poderá recusar a atribuição do solicitado horário flexível e ainda assim, mediante parecer positivo da entidade competente na área de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, como resulta do estabelecido nos n.os 2 e 5 do referido art. 57º do CT.

Na verdade, como também refere a Sr.ª Prof.ª Maria do Rosário Palma Ramalho (ob. cit. pag.ª 533), «[s]e o trabalhador pretender exercer este direito, é ainda ao empregador que cabe fixar o horário de trabalho (art. 56.º n.º 3, corpo), mas deve fazê-lo dentro de alguns parâmetros fixados pela lei (art. 56.º n.º 3, alíneas a), b) e c) e n.º 4), sendo, designadamente previsto que o trabalhador possa prestar a sua actividade durante seis horas consecutivas (solução que recupera a anteriormente designada «jornada contínua») e até dez horas seguidas num dia, para compensar as reduções do tempo de trabalho noutros dias», acrescentando logo de seguida que «… a sujeição a este regime de horário de trabalho depende da iniciativa do trabalhador, embora o horário de trabalho continue a ser determinado pelo empregador. O procedimento para a instituição deste tipo de horário é fixado no art. 57.º, que apenas admite a recusa da atribuição deste horário pelo empregador com fundamento em exigências imperiosas do funcionamento da empresa e mediante parecer positivo da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (art. 57.º n.os 2 e 5)

Trata-se de uma medida importante para a conciliação da vida familiar e profissional».

Importa ainda ter presente que, como se afirma, a dado passo do parecer de que se dá conta no ponto 10 dos factos provados, a indicação feita pelo trabalhador, da amplitude horária diária em que pretende exercer a sua atividade profissional, de forma a compatibilizá-la com a gestão das suas responsabilidades familiares, não consubstancia um pedido de horário rígido ou uma limitação ao poder de direção do empregador, a quem compete determinar o horário, observando o dever de facilitar a conciliação da atividade profissional com a vida familiar.

Ora, tendo em consideração todos estes aspetos e debruçando-nos mais concretamente sobre o caso em apreço, resulta da matéria de facto provada que a Ré AA é trabalhadora do Autor desde 07 de novembro de 1994, com a categoria profissional de «...», prestando as suas funções no Departamento ... do Hospital dos SAMS - Serviço de Assistência Médica Social pertencente ao Autor Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas e que o período normal de horário de trabalho daquela é de 35 horas semanais, conforme decorre do respetivo contrato de trabalho (matéria que consta dos pontos 1 e 2 dos factos provados).

Também se demonstrou que em cumprimento da respetiva carga horária semanal, a Ré atualmente exerce funções em regime de turnos rotativos, nos seguintes períodos definidos no serviço: turno de manhã entre as 08:00 e as 14:00 horas; turno da tarde: entre as 14:00 e as 20:00 horas e turno de manhã/tarde das 09:00 às 20:00 horas ou das 08:00 às 19:00 horas (v. matéria que consta do ponto 3 dos factos provados).

Para além disso, também se provou que no referido Serviço ... do Hospital dos SAMS trabalham 6 auxiliares de ação médica, dos quais 4 em regime de 40 horas semanais e 2 em regime de 35 horas semanais, distribuídos da seguinte forma: de manhã 3 auxiliares de ação médica; de tarde 2 auxiliares de ação médica e de manhã/tarde 1 ... (v. matéria que consta do ponto 5 dos factos provados).

 Provou-se ainda que os referidos turnos são organizados/definidos no interesse do serviço, em condições de igualdade entre os trabalhadores, compreendendo os horários das 08:00 às 14:00 horas, das 08:00 às 19:00 horas, das 12:00 às 20:00 horas, das 08:00 às 15:00 horas, das 09:00 às 20:00 horas, das 14:00 às 20:00 horas, das 08:00 às 16:00 horas e das 10:00 às 20:00 horas (v. matéria que consta do ponto 4 dos factos provados).

Também se provou que, por carta datada de 06 de dezembro de 2018, a Ré, invocando o disposto no art. 56º do Código do Trabalho, solicitou ao Autor a atribuição de “um regime de horário de trabalho flexível para prestar assistência inadiável da Educação e Formação a uma filha com 18 meses de idade (...) pelo período de Dez anos com o seguinte horário de trabalho: Das 08:00 horas às 16:00 horas, períodos de 8 horas, Sendo o descanso semanal Sábado e Domingo" (v. matéria que consta do ponto 7 dos factos provados) e que, em resposta a esta solicitação da Ré, o Autor comunicou-lhe o respetivo indeferimento, tudo nos termos de carta datada de 19 de dezembro de 2018, com parcial reprodução no ponto 8 dos factos provados, mas em cuja parte final se refere que «… face à exiguidade dos quadros de pessoal da área de atividade em apreço, a necessidade de compatibilização e respeito pelos direitos dos demais trabalhadores, o cumprimento dos limites legais em matéria de horário de trabalho, verifica-se que o regime de turnos rotativos é o único modo possível de assegurar o funcionamento do serviço em laboração contínua, com o número de trabalhadores necessários para o apoio aos gabinetes médicos e, que distribui de forma equitativa entre os trabalhadores condições de compatibilização da vida profissional e familiar.

Por todo o exposto, a ser deferido o horário peticionado, revela-se impossível manter a rotatividade equitativa de horários até então praticada, na medida em que os turnos de tarde e de noite deixariam de ficar convenientemente assegurados, colocando em causa o funcionamento do serviço, com prejuízos sérios para a entidade empregadora.

Assim, impõe-se recusar o formulado pedido de alegado horário flexível, porque, como ficou demonstrado, o solicitado deferimento acarretaria sérios prejuízos para o normal e eficiente funcionamento do Departamento ou Unidade em que se integra V. Exa., consubstanciado na impossibilidade de assegurar a existência de trabalhadores em número suficiente no período da tarde.

Face ao exposto, considera-se indeferido o pedido de horário apresentado por V. Exa. por necessidade imperiosa de funcionamento e organização da Unidade».

Provou-se, para além disso, que, na sequência da referida comunicação, o Autor solicitou parecer ao CITE – Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, o qual, por maioria dos seus membros, emitiu o parecer n.º 35/CITE/2019 – transcrito no ponto 10 dos factos provados e que aqui se dá por reproduzido – parecer que foi desfavorável à intenção de recusa do pedido da Ré (v. matéria que consta dos pontos 9 e 10 dos factos provados).

Ainda com interesse, demonstrou-se que a Ré vive em comunhão de mesa e habitação com o seu companheiro e pai da filha menor DD, o qual também trabalha no Hospital do SAMS em regime de turnos e em horários rotativos, para além de trabalhar em outros locais, que o Autor não logrou ajustar os horários deste com os da Ré, enquanto trabalhadores do referido Hospital, de forma a não coincidirem um com o outro, e que a menor tem ficado, até à data, aos cuidados dos avós paternos, estando, no entanto, inscrita num infantário cujo horário é das 07:30 às 19:30 horas, de segunda a sexta-feira, no qual está previsto ingressar em setembro de 2019 uma vez que os avós paternos sofrem de doenças que não aconselham continuar a ter a menor aos seus cuidados (v. matéria que consta dos pontos 11 a 13 dos factos provados).

Perante esta matéria de facto provada, uma primeira conclusão a extrair é a de que a menor de 18 meses DD, filha da Ré e do seu companheiro, necessita de quem a possa colocar no infantário em que vai ingressar, o qual tem abertura às 07:30 horas, e de quem a vá buscar ao mesmo infantário que encerra às 19:30 horas, sendo que os avós paternos da menor não têm possibilidade de cuidar dela devido aos problemas de saúde que os afetam.

Uma outra conclusão a extrair é a de que a Ré e o seu companheiro trabalham em regime de turnos, com horários rotativos, no Hospital do SAMS pertencente ao Autor, sendo que o companheiro da Ré também trabalha noutros locais, não tendo sido possível ao Autor conciliar os horários de ambos de forma a não coincidirem, enquanto trabalhadores daquele Hospital.

É certo haver-se demonstrado que a Ré, por carta datada de 06 de dezembro de 2018 e invocando o disposto no art. 56º do Código do Trabalho, solicitou ao Autor a atribuição do regime de horário de trabalho flexível para poder prestar assistência inadiável a sua filha menor, com 18 meses de idade, indicando, para tal, o horário de trabalho das 08:00 às 16:00 horas, com descanso semanal ao sábado e ao domingo e a vigorar durante o período de 10 anos, o que, à primeira vista, parece configurar a pretensão de concessão de um horário de trabalho rígido durante este período de tempo, contrariamente à pretensão de atribuição de um horário flexível com aquela finalidade.

Sucede que essa indicação de horário feita pela Ré ao Autor nos referidos termos, com fundamento no mencionado preceito legal e tendo em consideração a circunstância que lhe estava na base (existência de uma filha menor, com 18 meses de idade e a necessitar de cuidados parentais), não pode, a nosso ver, deixar de ser entendida como uma escolha de horas de entrada e de saída do período normal de trabalho diário e de dias de folgas que a Ré, no limite, digamos assim, se predispõe a cumprir, de forma que o Autor possa, no âmbito dos seus poderes de direção, estabelecer, dentro dos indicados parâmetros e com respeito pelo estabelecido no n.º 3 do art. 56º do CT, um horário de trabalho flexível a ser observado pela Ré nos subsequentes dez anos, ou seja, até sua filha atingir os 12 anos de idade previstos na lei.

Não se nos afigura estranha a indicação das mencionadas horas de entrada e de saída em termos de horário de trabalho indicado pela Ré ao Autor, tendo em consideração que essa pretensão se enquadra no âmbito da organização dos tempos de trabalho em vigor no Departamento ... do Hospital SAMS onde a Ré trabalha em regime de turnos e que decorrem entre as 08:00 e as 14:00 horas, entre as 14:00 e as 20:00 horas e entre as 09:00 e as 20:00 horas ou entre as 08:00 e as 20:00 horas, isto porquanto o horário por aquela indicado se contém dentro do período de funcionamento do Serviço em causa do Hospital pertencente ao Autor, sendo que, como demonstrado também ficou, os referidos turnos eram organizados e definidos no interesse do serviço, compreendendo os horários das 08:00 às 14:00 horas, das 08:00 às 19:00 horas, das 12:00 às 20:00 horas, das 08:00 às 15:00 horas, das 09:00 às 20:00 horas, das 14:00 às 20:00 horas, das 08:00 às 16:00 horas e das 10:00 às 20:00 horas (v. matéria do ponto 4 dos factos provados) e o horário indicado pela Ré tem correspondência com um destes turnos já praticados no Departamento do Hospital SAMS ao qual a mesma se encontra afeta.

Acresce, de novo, frisar que, pese embora nas circunstâncias descritas no n.º 1 do art. 56º do CT tenha de haver uma pretensão deduzida, por escrito, pelo trabalhador ao empregador no sentido da atribuição de um horário flexível de trabalho, dando-se àquele a possibilidade de escolher as horas diárias de entrada e de saída do trabalho, cabe a este definir os parâmetros concretos desse horário de trabalho, levando naturalmente em consideração, na medida do possível, a indicação de horas de entrada e de saída escolhidas pelo trabalhador como sendo as mais convenientes face às obrigações de índole parental ou familiares que este tenha de acautelar, sendo certo que, na fixação desse horário flexível de trabalho, o empregador deve levar em consideração o estabelecido nas diversas alíneas do n.º 3 do referido art. 56º do CT.

É certo que nos termos do disposto no n.º 8 do art. 57º do CT, considera-se que o empregador aceita o pedido do trabalhador nos seus precisos termos se não assumir qualquer das atitudes a que se reporta cada uma das alíneas desse preceito, o que inculca a ideia de que o trabalhador quando formula a pretensão de horário em regime de flexibilidade deva indicar um concreto horário de trabalho a cumprir. Só que, ainda que assim suceda, não se pode, a nosso ver, entender essa indicação como a pretensão do cumprimento de um horário rígido, inalterável pelo empregador no âmbito dos seus poderes de direção e, consequentemente, de concessão de um horário flexível a cumprir pelo trabalhador com necessidades parentais.

Finalmente importa acentuar que, não podendo o empregador recusar a atribuição de um horário flexível de trabalho ao trabalhador que lho haja solicitado nas circunstâncias previstas no n.º 1 do art. 56º do CT, senão em face de razões motivadas por exigências imperiosas do funcionamento da empresa ou face à impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável, necessitando, ainda assim, de parecer positivo da entidade competente na área de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, como decorre do estabelecido nos n.os 2 e 5 do referido art. 57º do CT, a verdade é que no caso em apreço o Autor não logrou demonstrar factos que nos possam levar a concluir pela verificação de exigências imperiosas do funcionamento do Departamento ... do Hospital do Autor, onde labora a Ré, que impeçam a adoção de um horário de trabalho flexível dentro dos parâmetros indicados por esta, ou da indispensabilidade da Ré no funcionamento desse Departamento sem ser em regime de turnos com horários rotativos de trabalho nos termos em que tal se vinha verificando, para mais quando também se sabe que o CITE emitiu parecer desfavorável à intenção de recusa por parte do Autor em conceder à Ré o regime de horário flexível de trabalho dentro dos parâmetros indicados por esta.

É certo haver-se demonstrado que no identificado Serviço ... do Hospital do Autor trabalham 6 auxiliares de ação médica, dos quais 4 em regime de 40 horas semanais e 2 em regime de 35 horas semanais, estando 3 auxiliares a laborar no turno da manhã, 2 no turno da tarde e 1 no turno da manhã/tarde, demonstrando-se também que de entre os referidos 6 auxiliares de ação médica do serviço ... do Hospital SAMS, 4 têm filhos menores de 12 anos. Contudo, nada logrou o Autor demonstrar no sentido de se saber quais os concretos regimes de horário de trabalho de qualquer desses outros auxiliares de ação médica, designadamente se algum deles trabalha (ou não) em regime de horário flexível devido à circunstância de ter filhos menores a seu cargo e, na afirmativa, em que termos tal lhe tenha sido atribuído.

Deste modo e contrariamente ao decidido pelo Tribunal recorrido, não se pode, sem mais, concluir estar-se perante a pretensão de atribuição de um horário fixo, a que decorre da indicação feita pela Ré/Recorrente, por escrito, ao Autor/Recorrido de um horário de segunda a sexta-feira no período compreendido entre as 08:00 horas da manhã e as 16:00 horas da tarde, com folga ao sábado e ao domingo, tendo em vista a concessão de um regime de horário flexível de forma a que a Ré possa conciliar a sua vida profissional com a sua vida familiar decorrente da circunstância de ter uma filha menor com 18 meses de idade, com quem vive em comunhão de mesa e habitação, a carecer de frequência em infantário com horário de abertura às 07:30 horas e de encerramento às 19:30 horas, não existindo, portanto e a nosso ver, obstáculos, designadamente de ordem legal ou contratual que, demonstradamente, impeçam o Recorrido de atribuir à Recorrente um horário em regime flexível dentro dos parâmetros que por esta foram indicados.

Consequentemente, também não ocorrem motivos para uma recusa, sem mais, da atribuição de um horário de trabalho flexível, dentro desses mesmos parâmetros, por parte do Recorrido à Recorrente.

III

Decisão

Nestes termos concede-se revista, revogando-se a decisão recorrida e repristinando-se a sentença proferida pelo Tribunal da 1ª instância.

Custas a cargo do Recorrido.

Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-lei n.º 10-A/2020, de 13 de março (aditado pelo art. 3º do Decreto-Lei n.º 20/2020 de 01 de maio), consigna-se que o presente acórdão obteve voto de conformidade dos Exmos. Juízes Conselheiros Adjuntos, António Leones Dantas e Júlio Manuel Vieira Gomes, sendo assinado apenas pelo relator.

      Lisboa, 28/10/2020

                                                     

       José António Santos Feteira (relator)

Sumário (art. 663º n.º 7 do CPC)