Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 1.ª SECÇÃO | ||
Relator: | PEDRO DE LIMA GONÇALVES | ||
Descritores: | REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA TAXA DE JUSTIÇA FUNDAMENTAÇÃO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE ESPECIAL COMPLEXIDADE PARTES APRECIAÇÃO PODERES DO JUIZ | ||
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Data do Acordão: | 09/16/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | DEFERIDA | ||
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Sumário : |
I. A referência ao “juiz” no artigo 6.º n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais só é compatível com o pensamento do legislador quando se refira ao magistrado que esteja em condições de formular um juízo de apreciação global do processo, sobre a complexidade da causa e sobre a conduta processual das partes e de avaliar da adequação da totalidade da taxa de justiça prevista ao caso concreto. II. Nos termos do nº7 do artigo 6º do RCP “nas causas de valor superior a €275 000 o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. Notificadas do Acórdão de 27 de maio de 2025, vieram AA, BB e CC requerer a reforma do Acórdão quanto a custas, pretendendo a dispensa do pagamento de remanescente da taxa de justiça, nas instâncias e no Supremo Tribunal de Justiça. 2. O Digno Magistrado do MºPº, no seu parecer, conclui que: “I – A pronúncia acerca da dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente não pode contemplar a atividade processual desenvolvida na 1.ª e 2.ª instâncias; II – Deve dispensar-se as recorrentes do pagamento da taxa de justiça remanescente respeitante à presente instância recursória em 70% daquele valor.” a “dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça não deverá ser deferida em mais de 20%”. 3. Cumpre apreciar e decidir. II. Delimitação do objeto As Recorrentes pretendem a reforma do Acórdão quanto a custas. III. Fundamentação A dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça Proferido o Acórdão, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa (n.º1 do artigo 613.º do Código de Processo Civil; cf., ainda, artigo 666.º do mesmo diploma). Contudo é lícito ao juiz retificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença/Acórdão (artigo 613.º, n.º2 do Código de Processo Civil). Nos termos do disposto no n.º1 do artigo 616.º do Código de Processo Civil, a parte pode requerer, no Tribunal que proferiu a sentença (acórdão), a sua reforma quanto a custas e multa. Antes de mais, importa referir se esta decisão sobre a dispensa do pagamento do remanescente das custas se reporta somente à decisão deste Supremo Tribunal, como defende o Magistrado do M.º P.º, ou também as decisões das instâncias,, como defendem as Recorrentes. Esta questão vem sendo discutido, mas sempre temos entendido que abrange as decisões das instâncias e do Supremo Tribunal de Justiça. Como se refere no Acórdão do STJ, de 19/09/2024 (processo n.º18679/21.8T8SNT-A.L1.S1), “Considera-se que a referência ao “juiz” no artigo 6.º n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais só é compatível com o pensamento do legislador quando se refira ao magistrado que esteja em condições de formular um juízo de apreciação global do processo, sobre a complexidade da causa e sobre a conduta processual das partes e de avaliar da adequação da totalidade da taxa de justiça prevista ao caso concreto. “A competência exclusiva das instâncias para a fixação da responsabilidade tributária em cada acção, incidente ou recurso em função dos critérios legais estabelecidos no artigo 527.º e seguintes do Código de Processo Civil, que é inerente à sua autonomia para efeitos tributários, não se confunde inteiramente com a competência para apreciação dos fundamentos da limitação do valor da taxa de justiça a suportar em concreto – através da redução ou dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida a final – e que deve ser feita com a decisão final, por esta pressupor exactamente esse juízo de valoração global do processo, sua complexidade e da conduta das partes” – escreveu-se, pertinentemente, no cit. ac. do STJ de 31.03.2023 (proc. 8281/17.4T8LSB.L1.S1).” Assim, a eventual dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça abrangerá toda a atividade processual (nas instâncias e no Supremo Tribunal de Justiça). Prescreve o nº7 do artigo 6º do RCP que “nas causas de valor superior a €275 000 o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”. Como se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional nº421/2013, “a taxa de justiça assume, como todas as taxas, natureza bilateral ou correspetiva, constituindo contrapartida devida pela utilização do serviço público da justiça por parte do respetivo sujeito passivo. Por isso que, não estando nela implicada a exigência de uma equivalência rigorosa de valor económico entre o custo e o serviço, dispondo o legislador de uma «larga margem de liberdade de conformação em matéria de definição do montante das taxas», é, porém, necessário que a «causa e justificação do tributo possa ainda encontrar-se, materialmente, no serviço recebido pelo utente, pelo que uma desproporção manifesta ou flagrante com o custo do serviço e com a sua utilidade para tal utente afeta claramente uma tal relação sinalagmática que a taxa pressupõe”. Tendo presente os princípios do acesso ao direito e da proporcionalidade (cf. artigos 2.º, 18.º, n.º2, e 20.º da Constituição da República Portuguesa), a taxa de justiça deverá ter tendencial equivalência ao serviço público prestado, concretamente, ao serviço de justiça a cargo dos tribunais, no exercício da função jurisdicional, devendo a mesma corresponder à contrapartida pecuniária de tal exercício e obedecer, além do mais, aos critérios previstos nos artigos 530.º, n.º7, do CPC e 6.º n.º7 do RCP (Acórdão desta secção de 22/05/2018). Ora, no caso presente, o o processo teve uma tramitação longa, ocupando, o nosso sistema de justiça, em todos os seus diversos graus durante quase 23 anos; interpostos diversos recursos, 4 desses recursos no STJ, tendo os presentes autos mais de duas dezenas de volumes. Deste modo, e atendendo ao grau de complexidade dos autos (mediana complexidade), e ao comportamento processual das partes (o processo desenvolveu-se na mais completa normalidade, limitando-se as partes em usar os meios procedimentais ao seu dispor e que tiveram por mais adequados, sem violação de qualquer dever processual ou utilizando qualquer forma de prolongar artificialmente o processo), reputa-se como adequado e proporcional que seja considerado na conta final apenas 30% de tal remanescente, assim se dispensando os devedores do pagamento de 70% do mesmo, como sugere o Magistrado do M.º P.º. IV. Decisão Posto o que precede, acorda-se, em conferência, em reformar o Acórdão de 27 de maio de 2025, dispensando de pagamento do remanescente da taxa de justiça, de modo a que na conta final seja considerado apenas na proporção de 30%. Sem custas. Lisboa, 16 de setembro de 2025 Pedro de Lima Gonçalves (Relator) Maria João Tomé António Magalhães |