Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | SOUSA PEIXOTO | ||
| Descritores: | NULIDADES DA SENTENÇA SUPRIMENTO JUDICIAL IMPOSSIBILIDADE DE SEREM SUPRIDAS PELO SUPREMO REMESSA À RELAÇÃO | ||
| Nº do Documento: | SJ200610040018304 | ||
| Data do Acordão: | 10/04/2006 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | DETERMINADA A BAIXA DO PROCESSO À RELAÇÃO | ||
| Sumário : | 1. Os artigos 77.º, n.º 3, do CPT e 668.º, n.º 4, do CPC não obrigam o juiz a pronunciar-se sobre as nulidades da sentença arguidas em via de recurso. 2. Como resulta da letra dos referidos normativos (“o juiz pode sempre suprir a nulidade”, “é lícito ao juiz supri-la”) e do preâmbulo do D.L. n.º 329-A/95. de 12/12 que aditou o n.º 4 ao art.º 668.º, o poder conferido ao juiz traduz-se numa mera faculdade e não num poder-dever. 3. E o mesmo se diga da Relação, relativamente à nulidades dos seus acórdãos, quando arguidas em via de recurso. 4. A remissão que o n.º 4 do art.º 668.º do CPC faz para o art.º 744.º do mesmo código não leva a concluir de modo diferente, uma vez que a aplicação do disposto no art.º 744.º (“com as necessárias adaptações”) depende de o juiz ou a Relação terem feito uso da referida faculdade. 5. Nos termos do art.º 754.º, n.º 2, do CPC, o agravo continuado pressupõe que a questão sobre que versa o recurso interposto do acórdão da Relação já tenha sido objecto de decisão na 1.ª instância. 6. E tal não acontece relativamente às nulidades da sentença arguidas no recurso de apelação, salvo se o juiz as tiver suprido. 7. Face ao disposto no art.º 726.º do CPC, o Supremo não pode suprir, ao contrário do que acontece com a Relação, a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, devendo nesse caso remeter o processo à Relação para que a nulidade aí seja suprida, com a consequente reformulação do acórdão. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na secção social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA propôs a presente acção, no Tribunal do Trabalho de Santo Tirso, contra BB, L.da, pedindo que a ré fosse condenada a pagar-lhe a importância global de 34.668,58 euros, a título de diferenças salariais (1.207,36 euros), diferenças no prémio TIR (428,52 euros), diferenças no pagamento da retribuição prevista no n.º 7 da cláusula 74.ª do CCTV aplicável (1.332,86 euros), não inclusão da referida retribuição no subsídio de férias de 2000 (301,07 euros), trabalho prestado em dias de descanso e feriados (17.149,91 euros), pagamento do trabalho prestado em dias de descanso compensatório (8.266,00 euros), indemnização por rescisão com justa causa do contrato de trabalho (1.703,52 euros), pagamento da retribuição e respectivos acréscimos relativa ao mês de Abril de 2003 (882,46 euros), retribuição e subsídio das férias vencidas em 1.1.2003 e proporcionais (3.016,22 euros), desconto que indevidamente lhe foi feito no vencimento de Setembro de 2000 referente a dois pneus do semi-reboque que rebentaram quando o autor se encontrava no exercício das suas funções (215,66 euros) e de reembolso referente de duas multas por ele pagas em França e Espanha (165,00 euros). Em resumo, o autor alegou o seguinte: - foi admitido ao serviço da ré, em 15 de Novembro de 1999, para, subordinadamente, exercer as funções de motorista de transporte internacional de mercadorias; - as importâncias por si auferidas a título de retribuição de base, ajudas de custo (prémio TIR) e retribuição prevista na cláusula 74.ª, n.º 7, do CCT aplicável (o CCT celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU, publicado no BTE, 1.ª série, n.º 9, de 8.3.80 e n.º 16 de 29.4.82 e posteriores alterações) foram inferiores às fixadas nas tabelas salariais em vigor; - a ré não inclui, no subsídio de férias de 2000, a retribuição prevista no n.º 7 da cláusula 74.ª; - não lhe pagou os dias de descanso semanal e feriados passados em viagem no estrangeiro; - não permitiu que, na chegada de cada viagem, ele gozasse um número de dias descanso igual ao número de dias de descanso semanal e feriados que tinha passado em serviço no estrangeiro; - não permitiu que, imediatamente antes de cada viagem, ele tivesse gozado o dia de descanso a que tinha direito; - por carta datada de 22 de Abril de 2003, rescindiu com justa causa o contrato de trabalho que mantinha com a ré; - a ré não lhe pagou a retribuição mensal, nem o prémio TIR nem a retribuição prevista no n.º 7 da cláusula 74.ª referentes ao mês de Abril de 2003 (22 dias); - não lhe pagou a retribuição nem o subsídio das férias vencidas em 1.1.2003; - o mesmo acontecendo com os proporcionais de férias e de Natal; - em Setembro de 2000, a ré descontou-lhe na retribuição a importância de 215,66 euros referente a dois pneus do semi-reboque que rebentaram, sem qualquer culpa sua; - contrariando o que havia sido acordado com a ré, esta não lhe pagou a quantia de 165,00 euros correspondente a duas multas que ele teve de pagar no estrangeiro. A ré contestou alegando, em síntese, o seguinte: - nada deve ao autor, exceptuando a retribuição relativa às férias vencidas em 1 de Janeiro de 2003 e aos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal; - nos termos do acordo que com ele tinha feito, pagava-lhe uma determinada importância por cada viagem ao estrangeiro, para o compensar dos fins de semana passados nos estrangeiro e das folgas não gozadas; - a rescisão do contrato foi feita sem justa causa. E, em reconvenção, pediu que o autor fosse condenado a pagar-lhe a quantia de 1.565,10 euros de indemnização, por ter rescindido o contrato sem justa causa e sem aviso prévio e, para o caso de se entender que o referido acordo salarial era nulo, pediu que o autor também fosse condenado a pagar-lhe a importância de 42.796,92 euros que recebeu com base no dito acordo. O autor respondeu, sustentando a improcedência da reconvenção. Realizado o julgamento, sem gravação da prova, e decidida a matéria de facto, foi proferida sentença julgando parcialmente procedente a acção e totalmente improcedente a reconvenção, tendo a ré sido condenada a pagar ao autor a importância de 17.540,74 euros, acrescida de juros de mora, contados desde a citação, sendo 103,73 euros de diferenças referentes à retribuição prevista no n.º 7 da cláusula 74.ª do CCTV aplicável, 275,52 euros de diferenças na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal resultantes de no cômputo daquelas retribuições não ter sido levada em conta a retribuição referida no n.º 7 da cláusula 74.ª, 9.697,44 euros pelo trabalho prestado em dias de descanso e feriados passados em viagem no estrangeiro, 2.514,15 euros referentes aos dias de descanso compensatório não gozados, 2.449,10 euros de indemnização pela rescisão com justa causa do contrato de trabalho e 2.500,80 euros de retribuição de férias e de subsídios de férias e de Natal referentes ao ano de cessação do contrato (proporcionais) Inconformada com a decisão da 1.ª instância, dela interpuseram recurso, quer a ré, quer o autor (este subordinadamente), para o Tribunal da Relação do Porto. No seu recurso, a ré suscitou várias questões e no requerimento de interposição do recurso arguiu a nulidade da sentença, alegando omissão de pronúncia relativamente ao segundo dos pedidos reconvencionais (o pagamento da quantia de 42.796,92 euros, correspondente às importâncias que o autor recebeu, nos termos do acordo salarial por ela alegado - pagamento de determinada importância por cada viagem ao estrangeiro). Conhecendo dos recursos, o Tribunal da Relação começou por apreciar a questão da nulidade da sentença invocada pela ré, julgando a mesma improcedente com os fundamentos que adiante serão referidos e debruçando-se, de seguida, sobre as restantes questões colocadas pelos recorrentes, julgou parcialmente procedentes ambos os recursos. No que diz respeito ao recurso da ré (recurso principal), a Relação decidiu que a rescisão do contrato tinha sido efectuada sem justa causa e absolveu a ré do pagamento da quantia de 1.565,10 euros que, a título de indemnização de antiguidade, tinha sido condenada a pagar ao autor. E, no que toca ao recurso do autor (recurso subordinado), a Relação decidiu alterar os valores que àquele tinham sido atribuídos a título da retribuição prevista no n.º 7 da cláusula 74.ª do CCT aplicável, a titulo de trabalho prestado em dias de descanso e feriados passados em viagem no estrangeiro, a título da retribuição e subsídio das férias vencidas em 1.1.2003 e dos proporcionais, respectivamente de 275,52, 9.697,44 e 2.500,80 euros para 2.822,72, 16.169,51 e 2.583,54 euros. O autor conformou-se com a decisão da Relação, mas o mesmo não aconteceu com a ré que dela interpôs recurso de revista, suscitando nas conclusões - (1) da respectiva alegação as seguintes questões: - saber se o acórdão recorrido é nulo por não ter conhecido do pedido reconvencional de condenação do autor a pagar à ré a quantia de 1.565,10 euros a título de indemnização por ter rescindido o contrato de trabalho sem justa causa e sem aviso prévio; - saber se a decisão da 1.ª instância é nula por não ter conhecido do pedido reconvencional de condenação do autor a pagar à ré a importância de 42.796,92 euros por ele recebida ao abrigo do acordo salarial que entre eles havia sido feito; - saber se o processo deve baixar à Relação para que a decisão proferida sobre a matéria de facto aí seja devidamente fundamentada, repetindo-se, para tanto, a produção da prova; - saber se os factos dados como provados são suficientes para condenar a ré a pagar ao autor o trabalho por ele prestado nos dias de descanso semanal e feriados; - saber se os factos dados como provados permitiam condenar a ré a pagar ao autor a retribuição correspondente aos dias de descanso compensatório não gozados; - saber se o autor deve ser condenado a pagar à ré a indemnização por falta de aviso prévio; - saber se o autor deve ser condenado a pagar à ré a importância de 42,796.92 euros correspondente a quantia de 65.000$00 (324,22 euros) que ele recebeu por cada viagem ao estrangeiro; - saber se a retribuição prevista no n.º 7 da cláusula 74.º do CTT aplicável deve ser calculada em função da retribuição fixada nas tabelas salariais em vigor ou se deve ser calculada em função da retribuição que efectivamente era auferida pelo autor; - saber se aquela retribuição é devida em todos os dias do calendário ou se apenas é devida nos dias em que o trabalhador tiver prestado serviço efectivo nos transportes internacionais rodoviários de mercadorias; - saber se a retribuição especial prevista no n.º 7 da cláusula 74.ª deve entrar no cálculo da retribuição devida pelo trabalho suplementar, ou se apenas deve ser levada em conta a retribuição de base; - saber se a retribuição prevista no n.º 7 da cláusula 74.ª deve integrar a retribuição de férias e os subsídios de férias e de Natal. O autor contra-alegou, pedindo a confirmação da decisão recorrida e, neste Supremo Tribunal, a magistrada do Ministério Público emitiu parecer, a que as partes não responderam, suscitando duas questões prévias (omissão de pronúncia por parte das instâncias relativamente à arguição de nulidades das respectivas decisões feita em via de recurso e não conhecimento do recurso relativamente à questão da nulidade da sentença, por se tratar de agravo continuado) e sustentando a improcedência do recurso, excepto no que diz respeito ao pedido de condenação do autor a pagar à ré a quantia de 1.565,10 euros por rescisão do contrato de trabalho sem aviso prévio. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir. 2. Os factos Os factos que foram dados como provados são os seguintes: 1. Por contrato celebrado em 15.11.99, o autor foi admitido ao serviço da ré para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, exercer as funções de motorista nos transportes internacionais rodoviários de mercadorias. 2. No âmbito da sua categoria profissional, competia ao autor exercer as funções de motorista na condução de veículos pesados de transportes internacionais de mercadorias, o que fez até 22.04.03, data em que rescindiu unilateralmente o seu contrato de trabalho. 3. A ré dedica-se à actividade da indústria de transportes rodoviários pesados de mercadorias e encontra-se inscrita na ANTRAM - Associação Nacional dos Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias. 4. O autor é associado no STRUN - Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Norte, associação filiada na FESTRU. 5. Ao serviço da ré o autor auferiu os seguintes vencimentos mensais: Novembro de 1999................57.409$00 De 01.12.99 a 28.02.00.........98.200$00 De 01.03.00 a 31.07.01.......101.146$00 De 01.08.01 a 31.10.02.......109.984$00 A partir de 01.11.02......€ 563,06 (sendo € 548,60 de vencimento base + €14,46 de uma diuturnidade). 6. A título de ajudas de custo mensal, a ré pagou ao autor as seguintes quantias: de 15.11.99 a 30.04.00......21.200$00 de 01.05.00 a 31.12.01......21.836$00 de 01.01.02 a 31.03.03.........€ 108,90. 7. A ré pagou, também, ao autor, ao longo da vigência do contrato, uma verba que, ultimamente, era de € 37,40 e que apelidava de subsídio de alimentação, mas que só pagava se os motoristas fizessem, pelo menos, duas viagens ao estrangeiro. 8. Por cada viagem efectuada ao estrangeiro e em substituição do pagamento das refeições à factura, a ré pagava ao autor a quantia de € 324,22 (65.000$00). 9. Desde a data da admissão, cumpriu o autor, por ordem e no interesse da ré, o horário de trabalho semanal de 40 horas, distribuídas de 2.ª a sexta-feira, com descanso semanal ao domingo e complementar ao sábado. 10. A título de retribuição relativa a duas horas de trabalho extraordinário por dia (Cláusula 74.ª, n.º 7), a ré, mensalmente, pagou ao autor as seguintes quantias: Novembro de 99................28.173$00; Dezembro de 99.........................0$00; De 01.01.00 a 30.04.00......56.346$00; De 01.05.00 a 31.12.01.......58.036$00; De 01.01.02 a 31.03.03……...€ 289,52. 11. A ré não integrou no subsídio de férias de 2000, o valor relativo às duas horas diárias de trabalho extraordinário. 12. No período compreendido entre 12.11.99 e 31.12.99, por ordem da ré, o autor efectuou 6 viagens ao estrangeiro, tendo trabalhado em 6 dias de descanso semanal, 6 dias de descanso complementar e 2 feriados. 13. No período compreendido entre 01.01.00 e 31.12.00, por ordem da ré, o autor efectuou 40 viagens ao estrangeiro, tendo trabalhado em 29 dias de descanso semanal, 37 dias de descanso complementar e 7 feriados. 14. No período compreendido entre 01.01.01 e 31.12.01, por ordem da ré, o autor efectuou 41 viagens ao estrangeiro, tendo trabalhado em 42 dias de descanso semanal, 43 dias de descanso complementar e 6 feriados. 15. No período compreendido entre 01.01.02 e 31.10.02, por ordem da ré, o autor efectuou 35 viagens ao estrangeiro, tendo trabalhado em 39 dias de descanso semanal, 39 dias de descanso complementar e 7 feriados. 16. No período compreendido entre 01.11.02 e 31.12.02, por ordem da ré, o autor efectuou 7 viagens ao estrangeiro, tendo trabalhado em 5 dias de descanso semanal, 7 dias de descanso complementar. 17. No período compreendido entre 01.01.03 e 22.04.03, por ordem da ré, o autor efectuou 10 viagens ao estrangeiro, tendo trabalhado em 10 dias de descanso semanal, 11 dias de descanso complementar e 1 feriado. 18. Por CR/AR, datada de 22.04.03, o autor rescindiu unilateralmente o contrato de trabalho que havia celebrado com a ré, invocando os seguintes motivos: a) Falta de cumprimento das tabelas salariais em vigor para o sector de transportes rodoviários de mercadorias, encontrando-se em dívida diferenças salariais desde o mês de Novembro de 1999; b) Diferenças de pagamento das ajudas de custo mensais "TIR" desde Novembro 1999; c) Falta de pagamento integral da cláusula 74.ª, n.º 7, desde o mês de Novembro de 1999; d) Falta de adiantamento em dinheiro, em quantidade suficiente, para fazer face às despesas da viagem enquanto deslocado no estrangeiro; e) Desconto do valor de € 215,66 na retribuição do mês de Setembro de 2000, referentes a dois pneus do semi-reboque que rebentaram, quando aquele se encontrava no exercício das suas funções ao serviço da ré; f) Falta do reembolso do pagamento de uma contra-ordenação de € 90,00 em França e falta do reembolso do pagamento de metade da contra-ordenação de €75,00 em Espanha, a primeira sem culpa do autor e a segunda por obedecer à ré ao não respeitar os tempos de descanso obrigatórios devido à urgência de a carga chegar ao destino; g) Falta de pagamento do trabalho prestado em dias feriados e dias de descanso, com o acréscimo de 200%; h) Sujeição a um processo disciplinar injusto, quer pela falsidade dos factos alegados na nota de culpa, quer porque o autor não violou nenhum dos deveres a que está adstrito como trabalhador. 19. Com a cessação do contrato de trabalho, a ré não pagou ao autor as férias e subsídio de férias vencidas em 01.01.03, bem como os respectivos proporcionais e de natal relativos ao ano da cessação do contrato. 3. Das questões prévias suscitadas pelo M.º P.º A primeira questão prévia suscitada pela magistrada do M.º P.º diz respeito ao facto de a 1.ª e 2.ª instância não se terem pronunciado, antes da subida dos respectivos recursos, sobre a arguição da nulidade da decisão que por elas foi proferida. Embora a magistrada do M.º P.º não o diga expressamente, deprende-se que, na sua opinião, o juiz tem o dever de se pronunciar sobre a arguição de nulidades da sentença que tiver sido feita em via de recurso, o memso acontecendo com a Relação relativamente à arguição de nulidades de que os seus acórdãos venham a ser alvo, pela mesma via. E, segundo aquela magistrada, a falta de pronúncia sobre aquela arguição levaria à baixa do processo para que tal omissão fosse suprida. Aquela magistrada não indica a norma que obrigaria a tal pronúncia, mas depreende-se que terá tido em mente o disposto no art.º 744.º do CPC, para que o n.º 4 do art.º 668.º do mesmo código remete. No caso em apreço, aquela magistrada acaba por não requerer a baixa do processo, por entender (e bem) que a omissão praticada na 1.ª instância estaria sanada e por lhe parecer que o Supremo devia conhecer do recurso, quanto mais não seja por razões de economia processual. Mas, apesar disso, importa averiguar se o facto de a Relação não se ter pronunciado sobre a arguição de nulidade do acórdão constitui motivo para que o processo baixe ao tribunal recorrido, uma vez que se o disposto no art.º 744.º, mais concretamete o disposto no seu n.º 5 -(2), for aqui aplicável, a remessa do processo ao tribunal recorrido será oficiosa. E, adiantando, desde já, a resposta àquela questão, diremos que a lei não impõe ao juiz nem à Relação a obrigação de se pronunciarem sobre a arguição de nulidades que, em via de recurso, venham a ser assacadas às suas decisões. Senão vejamos. Nos termos do art.º 77.º do CPT, as nulidades da sentença, quando dela tenha sido interposto recurso, têm de ser arguidas expressa e separadamente no requerimentto de interposição de recurso (n.º 1) e, embora a competência para decidir de tal arguição pertença ao tribunal superior, “o juiz pode sempre suprir a nulidade antes da subida do recurso” (n.º 3). Conforme tem vindo a ser reiteradamente afirmado por este tribunal, o disposto naquele art.º 77.º aplica-se à arguição das nulidades dos acórdãos da Relação, por se entender que, mandando o art.º 716.º, n.º 1, do CPC aplicar às nulidades dos acórdãos proferidos na 2.ª instância o regime previsto no art.º 668.º do mesmo código para as nulidades da sentença, faz todo o sentido que naquela remissão se inclua o especial regime de arguição das nulidades da sentença previsto no CPT, uma vez que a validade da razão justificativa daquele especial regime (a celeridade do processo laboral) também se verifica no que toca às decisões proferidas na 2.ª instância - (3). E, sendo o disposto no art.º 77.º do CPC aplicável à 2.ª instância, então também a Relação poderá suprir as nulidades que das suas decisões venham a ser arguidas, em via de recurso. De qualquer modo, mesmo que se entendesse que o disposto no art.º 77.º do CPT não era aplicável à 2.ª instância, sempre teríamos de reconhecer que a Relação goza hoje desse poder, face ao disposto no n.º 4 - (4) do art.º 668.º do CPC (aplicável à 2.ª instância nos termos do art.º 716.º do CPC e subsidiariamente aplicável ao processo laboral nos termos do art.º 1.º, n.º 2, alínea a), do CPT), nos termos do qual “[a]rguida qualquer das nulidades da sentença em recurso dela interposto, é lícito ao juiz supri-la, aplicando-se, com as necessárias adapatações e qualquer que seja o tipo de recurso, o disposto no artigo 744.º ”. Acontece, porém, que, ao contrário do que implicitamente sustenta a magistrada do M.º P.º, nem o art.º 77.º, n.º 3, do CPT nem o art.º 668.º, n.º 4, do CPC impõem ao juiz, e consequentemnente à Relação, a obrigação de se pronunciarem sobre as referidas nulidades. A letra dos normativos em causa não deixa margem para dúvidas, uma vez que o n.º 3 do art.º 77.º do CPT se limita a dizer que “o juiz pode sempre suprir a nulidade” e uma vez que o no n.º 4 do art.º 668.º do CPC se limita a dizer que “é lícito ao juiz supri-la” (sublinhados nossos). O elemento literal referido leva-nos a conluir que o poder conferido ao juiz não é um poder-dever, mas uma mera faculdade, como, aliás, enfaticamente se disse no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, que aditou o n.º 4 ao art.º 668.º do CPC. Aí se escreveu efectivamente o seguinte: “E faculta-se ao juiz a possibilidade de reparar a decisão relativamente às nulidades da sentença arguidas em via de recurso, face às alegações que as partes logo devem necessariamente produzir perante o tribunal a quo, adoptando-se, nesta sede, um regime análogo ao da reparação do agravo, relativamente à parte do recurso que se reporta às nulidades da decisão recorrida” (sublinhado nosso). É certo que o disposto no n.º 4 do art.º 668.º manda aplicar, com as adapatações necessárias, o disposto no art.º 744.º e que este artigo, regulando o recurso de agravo interposto na 1.ª instância, impõe ao juiz a obrigação de sustentar ou reparar o agravo (n.º 1) e, caso esse despacho não tenha sido proferido, determina que o relator mande baixar o processo para que o memso seja proferido (n.º 5). Todavia, daí não podemos inferir que igual obrigação existe quando em causa esteja a arguição de nulidades da decisão, feita em via de recurso. Na verdade, como decorre da primeira parte do n.º 4 do art.º 668.º, o disposto no art.º 744.º só é de aplicar, “com as necessárias adaptações”, quando o juiz, usando da faculdade que lhe é concedida, tiver suprido a nulidade da sentença. Só nesse caso é que o art.º 744.º se torna aplicável, com as necessárias adaptações, adaptações que na prática se restringem à aplicação do disposto no seu n.º 3 que, em caso de reparação do agravo, concede ao recorrido a faculdade de, no prazo de dez dias contados da notificação do despacho de reparação, requerer que o agravo suba ao tribunal superior, para que este aprecie a questão sobre que recaíram os dois despachos. Assim, adaptando aquele disposição aos casos em que o juiz ou a Relação tenham supridos as nulidades arguidas da respectiva decisão, o recorrido terá dez dias, contados a partir da notificação do despacho ou acórdão de suprimento, para requerer que o tribunal de recurso aprecie as nulidades em causa. Não vislumbramos que seja outro o alcance da remissão que no n.º 4 do art.º 668.º é feita para o art.º 744.º. E, sendo assim, como entendemos que é, improcede a primeira questão prévia suscitada pela magistrad do M.º P.º. 4. Da segunda questão prévia suscitada pelo M.º P.º A segunda questão prévia suscitada no parecer do M.º P.º diz respeito à nulidade da sentença que a ré tinha arguido no requerimento de interposição do recurso de apelação. Recordando o que já foi dito, na sua contestação/reconvenção, a ré alegou que o autor tinha rescindido o contrato de trabalho sem justa causa e com esse fundamento pediu que ele fosse condenado a pagar-lhe a importância de 1.565,10 euros a título de indemnização por falta de aviso prévio. E alegou, também, que tinha acordado com ele pagar-lhe determinada importância por cada viagem que ele fizesse ao estrangeiro, para assim o compensar dos fins de semana e feriados passados no estrangeiro e dos descansos compensatórios não gozados, impugnando assim o direito às retribuições por ele peticionadas pelo trabalho alegadamente prestado naqueles dias. E, caso se viesse a entender que esse acordo era nulo, a ré pediu que o autor fosse condenado a pagar-lhe as importâncias recebidas no cumprimento daquele acordo, no montante global de 42.796,92 euros, invocando para tal o disposto nos artigos 289.º e 473.º do C. C.. No recurso de apelação, a ré arguiu a nulidade da sentença, com o fundamento de que a M.ma Juíza não se tinha pronunciado sobre o segundo pedido reconvencional, mas a Relação decidiu que a nulidade invocada não se verificava, por entender que o pedido reconvencional em causa era meramente subsidiário do outro pedido reconvencional (pagamento de 1.565,10 euros a título indemnização por rescisão do contrato sem aviso prévio) e que a improcedência deste deixou prejudicado o conhecimento daquele. E acrescentou que a sentença não tinha de conhecer de tal pedido, uma vez que nada decidira acerca do alegado acordo salarial. A recorrente discorda da decisão da Relação, por considerar que o pedido em questão não era subsidiário do outro, como claramente se constata, diz ela, dos termos em que o pedido reconvencional foi formulado. Relativamente a esta questão, a magistrada do M.º P.º emitiu parecer no sentido de não se tomar conhecimento do recurso, por se tratar de uma questão processual da qual não caberia, isoladamente, agravo em 2.ª instância nos termos do art.º 754.º do CPC. Salvo o devido respeito, não perfilhamos o entendimento daquela magistrada, quando diz que o recurso de agravo não seria admissível nos termos do art.º 754.º. Vejamos porquê. A nulidade da sentença constitui, sem dúvida, um caso de violação da lei processual e o despacho que dela caberia seria, em princípio, o recurso de agravo (artigos 691.º e 733.º do CPC). Por outro lado, o fundamento específico do recurso de revista é a violação da lei substantiva, mas acessoriamente também podem ser alegadas as nulidades do acórdão, previstas no artigos 668.º e 716.º do CPC (art.º 721.º, n.os 1 e 2, do CPC). E, sendo o recurso de revista o próprio, além da violação da lei substantiva, o recorrente também pode alegar a violação da lei processual, desde que desta fosse admissível recurso, nos termos do n.º 2 do art.º 754.º. Ora, o que no caso em apreço está em causa é saber se a decisão da Relação relativamente à questão da nulidade da sentença seria passível de recurso de agravo nos termos do n.º 2 do art.º 754.º do CPC. E, adiantando, desde já, a resposta diremos que sim. Vejamos porquê. Nos termos do n.º 2 do art.º 754.º (que se refere às decisões de que cabe agravo na 2.ª instância), [n]ão é admitido recurso do acórdão da Relação sobre decisão da 1.ª instância, salvo se o acórdão estiver em oposição com outro, proferido no domínio da mesma legislação pelo Supremo tribunal de Justiça ou por qualquer Relação, e não houver sido fixada pelo Supremo, nos temos dos artigos 732.º-A e 732.º-B, jurisprudência com ele conforme”. Ora, como emerge do elemento literal do normativo transcrito, o recurso de agravo do acórdão da Relação só não é permitido quando o acórdão da Relação tenha incidido sobre decisão da 1.ª instância, decisão essa que terá de ser obviamente a decisão proferida sobre a questão que foi apreciada no acórdão da Relação. De outro modo, a referência à decisão da primeira instância ficaria sem sentido útil, uma vez que os acórdãos da Relação incidem normalmente sobre decisões da 1.ª instância. A história do normativo em causa não deixa margem para dúvidas a esse respeito. Na sua redacção primitiva (dada pelo D. L. n.º 329-A/95, de 12/12), o n.º 2 do art.º 754.º tinha o seguinte teor: “Não é admitido recurso do acórdão da Relação que confirme, ainda que por diverso fundamento, sem voto de vencido, a decisão proferida na primeira instância, salvo se (...)”. E, como expressamente se disse no preâmbulo do referido Decreto-Lei, acerca daquele normativo, a inadmissibilidade do agravo para o Supremo foi prevista apenas relativamente aos acórdãos da Relação que confirmassem, sem voto de vencido, a decisão já proferida na 1.ª instância. Aí se consignou efectivamente o seguinte: “Estabelece-se, por outro lado, a inadmissibilidade do agravo para o Supremo Tribunal de Justiça dos acórdãos das Relações que – versando naturalmente sobre questões processuais – confirmem por unanimidade a decisão proferida em 1.ª instância, salvo se o recorrente mostrar que a decisão está em oposição com outra, provinda de qualquer tribunal superior – por essa via se procurando obstar a que um tribunal de revista como é, no nosso sistema judiciário, o Supremo, se veja sistematicamente solicitado para resolver questões meramente processuais, já decididas uniformemente nas várias instâncias e de acordo com a jurisprudência pacífica”. A redacção do n.º 2 -(5): (...)” do art.º 754.º foi alterada pelo D.L. n.º 375-A/99, de 20/9, mas o pressuposto principal da inadmissibilidade do recurso continuou a ser o mesmo: que a questão apreciada pela Relação já sido objecto de decisão na 1.ª instância. Eliminou-se o requisito da dupla conforme e deixou de ser necessário que o acórdão fosse proferido sem voto de vencido, mas manteve-se o pressuposto do duplo grau de jurisdição, como se infere não só da letra do preceito, mas do teor do preâmbulo do D.L. n.º 375-A/99, onde se diz o seguinte: “Também em matéria de recursos, como medida mais incisiva, avança-se na supressão dos agravos continuados para o Supremo relativos a decisões interlocutórias, alterando-se, nesse sentido, o n.º 2 do artigo 754.º.” Como se diz no sumário do acórdão deste tribunal, de 8 de Março de 2005, proferido no proc. 4179/04, da 1,ª Secção de que foi relator o Conselheiro Alves Velho - (6), “[a] ratio do art.º 754.º do CPC – “aliviar a actividade do Supremo”, sem prescindir de um duplo grau de jurisdição – aponta para que o pressuposto negativo geral de inadmissibilidade do recurso se restringe aos agravos continuados, ou melhor, à matéria própria do recurso de agravo interposto em 1.ª instância sobre expressa decisão por esta proferida e com a inerente tramitação, nomeadamente no que se refere à reparação ou sustentação da decisão.” E como diz Lopes do Rego -(7), em comentário ao art.º 754.º do CPC, se a decisão da Relação for uma decisão interlocutória, proferida sobre matéria processual e se já tiver sido exercido o duplo grau de jurisdição (em consequência de a decisão da Relação ter conhecido do objecto do recurso interposto, incidindo, deste modo, sobre a decisão proferida em 1.ª instância), a regra será a inadmissibilidade de agravo para o Supremo, sendo consequentemente irrelevante que tenha ou não havido dupla conforme e que a decisão da Relação tenha ou não sido tomada por unanimidade. Deste modo (continua aquele autor, no que diz respeito ao requisito agora em apreço), apenas haverá recurso para o Supremo das decisões da 2.ª instância que versem sobre a relação processual “se o acórdão da Relação que se pretende impugnar não tiver sido proferido sobre decisão da 1.ª instância, isto é, se não versar sobre tal decisão, apreciando-a e representando já o exercício, relativamente a ela, de um duplo grau de jurisdição: não fica, pois, precludido o recurso para o Supremo relativamente aos casos em que a Relação conhece em 1.ª instância do objecto da causa, bem como quanto às “decisões novas” que, em via de recurso, a Relação venha a proferir, nomeadamente, quando se abstenha de conhecer do objecto do recurso interposto, com base na falta de pressupostos de admissibilidade deste ou quando se trate de “agravos novos”, surgidos no decurso do processo pendente na Relação”. Pondo de lado as situações excepcionais referidas na segunda parte do n.º 2 e no n.º 3 do art.º 754.º, parece evidente que o legislador apenas quis suprimir o agravo para o Supremo nos casos de se tratar de agravo continuado, como se disse no preâmbulo do D.L. n.º 375-A/99 e, como é lógico, agravo continuado será apenas aquele que tenha por objecto questão que já tinha sido apreciada em anterior recurso de agravo. Ora, no caso em apreço, não é isso o que acontece, uma vez que a nulidade da sentença, arguida no recurso de apelação, não foi objecto de qualquer apreciação na 1.ª instância -(8), tendo sido apreciada pela primeira vez apenas na Relação. Por isso, ela, isoladamente considerada, era susceptível de recurso de agravo para o Supremo e, sendo assim, podia ter sido suscitada, como foi, no recurso de revista. Nada obsta, pois, a que se passe a conhecer dessa questão. 5. Da nulidade da sentença Como já foi referido, no requerimento do recurso de apelação a ré arguiu a nulidade da sentença, por alegadamente não se ter pronunciado sobre o segundo pedido reconvencional (pagamento da quantia de 42.796,92 euros correspondente a importância recebida por cada viagem ao estrangeiro (65.000$00), nos termos do acordo feito com o autor). E, como também já foi referido, a Relação decidiu que a sentença não enfermava daquela, com o fundamento de que o pedido reconvencional em causa era meramente subsidiário do outro pedido reconvencional (pagamento de 1.565,10 euros a título indemnização por rescisão do contrato sem aviso prévio) e que a improcedência deste deixara prejudicado o conhecimento daquele. E acrescentou que a sentença não tinha de conhecer de tal pedido, uma vez que nada decidira acerca do alegado acordo salarial. A ré continua a defender a existência da nulidade e, adiantando desde já a resposta, diremos que tem razão. De facto, analisando a sentença, constatamos que ela é totalmente omissa acerca do referido pedido reconvencional, dado que, relativamente à reconvenção, a M.ma Juíza limitou-se a dizer que a ré tinha deduzido pedido reconvencional, baseando-se na resolução do contrato sem aviso prévio e sem justa causa e que, tendo o tribunal concluído pela verificação da justa causa, tal pedido teria de improceder. Deste modo, a M.ma Juíza não fez a menor referência ao outro segundo pedido reconvencional. Estamos, por conseguinte, perante um caso de manifesta omissão de pronúncia sobre uma questão que na contestação/reconvenção havia sido expressamente suscitada pela ré, ora recorrente e que o tribunal devia apreciado e decidido, por força do disposto no n.º 2 do art.º 660.º do CPC, uma vez que o conhecimento da mesma não se mostra prejudicado pela solução dada às outras questões. E, por via disso, a sentença ficou ferida da nulidade prevista na primeira parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC. A Relação não entendeu assim, pelas razões já acima referidas, mas que não merecem o nosso apoio. Em primeiro lugar, porque o segundo pedido reconvencional não é subsidiário do primeiro, como à evidência resulta dos termos em que os pedidos reconvencionais foram formulados (“E em reconvenção deve o A. ser condenado: 1- A pagar à ré o valor de € 1 565,10 pela falta do período de aviso prévio; 2- No caso de se decidir pela nulidade da estrutura salarial, deve o A. ser condenado a pagar à ré o valor de € 42 796,92 a título de valores recebidos com base na alteração da estrutura salarial.”). Tal formulação não deixa margem para dúvidas acerca da natureza cumulativa dos dois pedidos reconvencionais. Na verdade, quer na formulação do pedido, quer no decurso das suas alegações, a ré nunca fez depender a apreciação do pedido reconvencional formulado em segundo lugar da improcedência do pedido formulado em primeiro lugar. É certo que o segundo pedido foi formulado para o caso de se vir a entender que o acordo salarial feito com o autor era nulo, mas, como é óbvio, isso não torna o segundo pedido subsidiário do primeiro. Em segundo lugar, pois ainda que se entendesse que o segundo pedido era subsidiário do primeiro, a improcedência deste não prejudicava o conhecimento daquele, como linearmente decorre do disposto no art.º 469.º, n.º 1, do CPC que diz precisamente o contrário: “Podem formular-se pedidos subsidiários. Diz-se subsidiário o pedido que é apresentado ao tribunal para ser tomado em consideração somente no caso de não proceder um pedido anterior.” Deste modo, tendo-se decidido na sentença que o primeiro pedido reconvencional (pagamento da indemnização por falta de aviso prévio) era improcedente, com o fundamento de que a rescisão do contrato por parte do autor tinha ocorrido com justa causa, estando, por isso, dispensado de dar o aviso prévio, sempre seria obrigatório passar a conhecer do pedido “subsidiário”. E, finalmente, em terceiro lugar, não sufragamos a tese perfilhada na 2.ª instância por entendermos que o facto de nada ter sido dito na sentença acerca do alegado acordo salarial invocado pela ré não dispensava a M.ma Juíza de pronunciar-se sobre o segundo pedido reconvencional. O facto de nada se ter dito acerca do referido acordo constitui já de si uma omissão de pronúncia, uma vez que os termos do acordo era uma das questões controvertidas na acção e o seu conhecimento não estava prejudicado pela solução dada às outras questões que foram apreciadas na sentença. Estamos em crer que foi o facto de a M.ma Juíza nada ter dito acerca do alegado acordo salarial que a levou a nada dizer acerca do pedido reconvencional (o segundo) que com aquele acordo estava relacionado. Acontece, porém, que o conhecimento daquele pedido reconvencional não ficou prejudicado pela omissão de pronúncia ocorrida relativamente ao acordo salarial em que o mesmo se baseava. A prática de uma omissão não consome a outra, por se tratar de questões diferentes, embora conexas entre si. Concluindo, diremos que a Relação errou ao decidir que a sentença não era nula. A questão que agora se coloca é a de saber se o Supremo pode suprir a referida nulidade, substituindo-se, para isso, ao tribunal recorrido, ou se, pelo contrário, terá de mandar baixar o processo à Relação para que a nulidade da sentença aí seja suprida, nos termos do art.º 715.º, n.º 1, do CPC. A resposta decorre do disposto nos artigos 715.º, n.º 1, 726.º e 731.º do CPC. Com efeito, extrai-se do primeiro daqueles normativos que a Relação não deixará de conhecer do objecto da apelação pelo facto de ter declarado nula a sentença, mas o mesmo já não acontece relativamente ao Supremo no que toca às nulidades da decisão da Relação. De facto, embora o art.º 726.º mande aplicar ao recurso de revista as disposições relativas ao julgamento da apelação interposta para a Relação, das quais o art.º 715.º faz parte, expressamente ressalva dessa aplicação (salvo o prescrito nos artigos seguintes) o disposto no art.º 712.º e no n.º 1 do art.º 715.º. Tal significa que a regra de substituição do Supremo relativamente à Relação é mais restritiva do que a regra de substituição da Relação relativamente à 1.ª instância. Assim, nos termos do art.º 731.º, nos casos de nulidade do acórdão da Relação, a regra de substituição do Supremo só funciona se a nulidade julgada procedente for alguma das previstas nas alíneas c) e e) e na segunda parte da alínea d) - excesso de pronúncia - do art.º 668.º ou quando o acórdão se mostre lavrado contra o vencido. Se a nulidade julgada procedente for alguma das outras, o Supremo mandará “baixar o processo, a fim de se fazer a reforma da decisão anulada, pelos mesmos juízes quando possível” (n.º 2 do art.º 731.º). No caso em apreço, não se pode dizer que o acórdão recorrido seja nulo, por ter decidido que a nulidade arguida da sentença não existia. Embora mal, a Relação conheceu da questão referente à nulidade da sentença. Errou no seu julgamento, mas não incorreu em omissão de pronúncia, não sendo, por isso, nulo no que à questão em apreço diz respeito. E sendo assim, o disposto no art.º 731.º não teria aplicação ao caso e o Supremo não poderia mandar baixar o processo. Entendemos, porém, que uma tal solução afronta claramente o regime de substituição previsto para o Supremo, uma vez que, se o acórdão da Relação fosse nulo por omissão de pronúncia, o Supremo teria de mandar baixar o processo à Relação, mas o mesmo já não sucederia se em causa estivesse a nulidade da sentença, pelo mesmo motivo. Se, como diz A. Reis -(9), a razão que está na base da excepção relativa ao n.º 1 do art.º 715.º é a ideia de que não é lícito ao Supremo substituir-se à Relação, eliminando-se um grau de jurisdição, ao contrário do que sucede entre a Relação e o tribunal da 1.ª instância, então, dizemos nós, por maioria de razão devemos entender que o Supremo não pode substituir-se à Relação quando em causa esteja a nulidade da sentença, por razões diferentes das referidas no n.º 1 do art.º 731.º, pois tal implicaria a supressão de dois graus de jurisdição. E sendo assim, como entendemos que é, o facto de a sentença ser nula por omissão de pronúncia implica que o processo tenha de baixar à Relação para que a nulidade seja suprida e a decisão recorrida devidamente reformulada, pelos mesmos juízes desembargadores, se possível, ficando, assim, prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas na revista. 5. Decisão Nos termos expostos decide-se revogar o acórdão recorrido e ordenar a remessa do processo à Relação, para os fins acima consignados. Custas pelo vencido a final. Lisboa, 4 de Outubro de 2006 Sousa Peixoto (relator) Sousa Grandão Pinto Hespanhol _________________________________________ (1) - Não se transcrevem as conclusões de recurso por serem demasiado extensas. (2) - O art.º 744.º refere-se aos recurso de agravos em 1.ª instância e obriga o juiz a sustentar ou reparar o agravo e no seu n.º 5 estipula que se o juiz omitir aquele despacho, “o relator mandará baixar o processo para que seja proferido”. (3)- Nesse sentido, vejam-se, entre muitos outros, os acórdãos de 8.3.95 (BMJ, 445.º-371); de 8.2.2001 (AD, 480.º-1664); e de 23.2.2000, 30.1.2002, 7.5.2003, 15.6.2005 e 20.9.2006, proferidos, respectivamente, nos processos 263/99, 1433/01, 1408/02, 783/05 e 574/06, todos da 4.ª secção. (4) - O n.º 4 foi introduzido pelo D. L. n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro. (5) - Com o D. L. n.º 375-A/99, o n.º 2 do art.º 754.º passou a ter a seguinte redacção: “Não é admitido recurso do acórdão da Relação sobre decisão da 1.ª instância, salvo se (...)” (6) - Vide Sumários dos Acórdãos, n.º 89, pag. 23. (7) - Comentários ao Código de Processo Civil, Almedina, 2.ª ed., p. 641. (8) - A solução seria eventualmente diferente se a M.ma Juíza tivesse suprido a nulidade da sentença, uma vez que nesse caso já haveria duas decisões sobre a mesma questão. Nada tendo dito, é óbvio que o seu silêncio não tem valor de decisão. (9 )- Código de Processo Civil anotado, vol. VI, Reimpressão, Coimbra Editora, 1985, p. 66.) |