Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4913/20.5T8GMR.G1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: MARIA JOSÉ MOURO
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
SUBEMPREITADA
ADJUDICAÇÃO
PREÇO
ACEITAÇÃO TÁCITA
DECLARAÇÃO NEGOCIAL
DETERMINAÇÃO DO PREÇO
INTERPRETAÇÃO DA VONTADE
FORMAÇÃO DO NEGÓCIO
Data do Acordão: 06/28/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: REVISTA IMPROCEDENTE.
Sumário :
I – Tendo sido celebrado entre a A. e a R. um contrato de subempreitada e sendo o preço um elemento integrador e caracterizador daquele contrato, consistindo no correspectivo da obra, muito embora, em regra, o preço seja fixado até, ou quando, da adjudicação, no caso dos autos tal não ocorreu; todavia, a perfeição do contrato de empreitada não dependia da fixação da retribuição, podendo esta ser determinada em momento posterior.
II – Vindo a R./subempreiteira, já no decurso da execução da obra, a indicar  um preço relativamente ao qual a A., inicialmente, manifestou a sua discordância, mas de que posteriormente, perante a inflexibilidade da R. em mantê-lo, diligenciou pelo pagamento que foi integralmente satisfeito, tal corresponde a uma declaração tácita de aceitação da proposta de preço da R; tanto mais que foi subscrito pelos representantes da A. documento autenticado, que reflecte o reconhecimento dos preços a que se reportam facturas emitidas pela R..
 III – A A. tinha prazos a cumprir, com consequências de multas pecuniárias e a R. sabia da urgência e da importância para a A. da entrega da obra, bem como dos prejuízos que o incumprimento lhe acarretaria – estas circunstâncias relevariam em termos da formação da vontade da A. e eventuais vícios na mesma, que não no segmento atinente à própria declaração (aqui tácita) de aceitação.
Decisão Texto Integral:



Proc. nº 4913-20.5T8GMR.G1.S1

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção):

                                               *

I - «Laborial – Soluções para Laboratório, SA»  intentou a presente acção declarativa com processo comum contra «Mibilbanho – Mobiliário de Banho, Sociedade Unipessoal, Lda.».
Alegou a A., em resumo:
A A., no exercício da sua actividade comercial acordou com a R. a execução de determinado número de cacifos em resina fenólica, ao custo unitário de € 50,00, acrescido de um prémio de € 20,00 por unidade, caso a produção fosse terminada até data anterior a 7-9-2019.
Já na fase de execução dos cacifos e após ser realizada a entrega de parte deles, a R. impôs à A. o pagamento de um preço superior ao contratado, sob pena de não prosseguir a produção; a R. sabia que os cacifos se destinavam à obra de construção e de instalação de equipamentos de uma escola em Gibraltar e que a execução dos cacifos tinha sido adjudicada à A. por uma outra sociedade que tinha ganho um concurso público internacional lançado pelo Governo de Gibraltar, bem como que a falta de execução e entrega dos cacifos determinaria o incumprimento da A. perante a empreiteira, o que seria causa de aplicação de penalidades contratuais.
Face à ameaça da R. e ao risco de vir a sofrer sanções de natureza económica, a A., embora tenha contestado o preço que aquela lhe exigiu, pediu a manutenção da produção, disponibilizando-se à resolução do diferendo; a R. veio a reclamar da A. o pagamento das faturas com os preços por ela definidos, vindo a empreiteira a fazer-lhe adiantamentos, tendo em conta  as consequências que poderiam advir para ambas do incumprimento perante o dono da obra.
Assim, foi efectuado o pagamento imposto pela R., no montante total de € 128.014,12, e que não era devido, face ao que havia sido acordado entre os representantes da A. e da R., tendo sido pagos a mais € 114.464,12.
Acresce que a mercadoria foi entregue fora de prazo, o que originou despesas adicionais quanto ao seu transporte, no valor de € 4.371,06.
Pediu a A.:
a) A modificação do negócio jurídico celebrado entre a Autora e a Ré, nos termos dos artigos 282.º e 283.º, do Código Civil, adequando-o ao preço inicialmente contratualizado entre a Autora e a Ré, ordenando-se, em consequência, a repetição do indevido no valor de € 114.464,12 (cento e catorze mil quatrocentos e sessenta e quatro euros e doze cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal desde a data de pagamento das quantias até à data de trânsito em julgado da presente ação;
b) Alternativamente, a declaração de nulidade o negócio jurídico celebrado entre as partes, nos termos e para os efeitos dos artigos 255.º e 256.º, do Código Civil, na parte em que o valor pago pela Autora excedo o valor inicialmente contratado entre a Autora e a Ré, ordenando-se a repetição do indevido no valor de € 114.464,12 (cento e catorze mil quatrocentos e sessenta e quatro euros e doze cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal desde a data de pagamento das quantias até à data de trânsito em julgado da presente ação;
c) Subsidiariamente, a condenação da Ré a pagar à Autora a quantia de € 114.464,12 (cento e catorze mil quatrocentos e sessenta e quatro euros e doze cêntimos), correspondente ao valor em excesso ao inicialmente contratado entre a Autora e a Ré, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data de pagamento das quantias até à data de trânsito em julgado da presente ação, a título de restituição dos valores com a Ré injustamente se locupletou à custa da Autora, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 473.º e 479.º, do Código Civil;
d) A condenação da Ré a pagar a quantia de € 4.371,06 (quatro mil trezentos e setenta e um euros e seis cêntimos), a título de prejuízos sofridos pelo dispêndio que a Autora teve de realizar com transportes não efetuados;
e) A condenação da Ré a pagar à Autora o valor de € 4.945,46 (quatro mil novecentos e quarenta e cinco euros e quarenta e seis cêntimos), respeitante à aquisição das ferramentas que a Ré de forma abusiva e ilegítima detém.
Citada, a R. contestou. Na contestação apresentada invocou as exceções da ilegitimidade e da caducidade e sustentou, a título subsidiário, que a ter havido um negócio anulável, houve confirmação do negócio através do pagamento realizado e pela confissão extrajudicial da existência da dívida realizada por meio de documento; além de que apresentou uma versão diversa da apresentada pela A. quanto aos factos ocorridos.
O processo prosseguiu e, no saneador, foi julgada improcedente a excepção da ilegitimidade.
Na audiência final a A. reduziu o pedido, desistindo do que formulara na al. E), desistência que foi julgada válida e homologado.
Foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
 «… julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência:
i)       Condena-se a Ré MIBILBANHO – MOBILIÁRIO DE BANHO, SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA, a restituir à Autora LABORIAL – SOLUÇÕES PARA LABORATÓRIO, SA, o montante de € 29.002,25 (vinte e nove mil e dois euros e vinte e cinco cêntimos), sobre o qual vencem juros, à taxa legal aplicável às obrigações comerciais, desde a citação até integral pagamento;
ii)      Absolve-se a Ré MIBILBANHO – MOBILIÁRIO DE BANHO, SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA, do restante peticionado;
iii)     Juga-se improcedente o pedido de condenação da Autora como litigante de má-fé».
A R. apelou e o Tribunal da Relação de Guimarães veio a julgar procedente a apelação, revogando a «decisão proferida pela sentença em i), do seu dispositivo, e, em conformidade, absolvendo a Ré do respectivo pedido».
Interpôs a A. recurso de revista, terminando a sua alegação de recurso com as seguintes conclusões:

A Autora, no exercício da sua atividade comercial, acordou com a Ré o fabrico, fornecimento e instalação de 233 cacifos em resina fenólica resistente ao fogo nas áreas de circulação das escolas ... em Gibraltar, mais 38 cacifos da tipologia 4x4, para as zonas dos ginásios, designadas por “sports”

Esta obra fazia parte da subempreitada destinada ao apetrechamento do complexo de escolas ... em Gibraltar, adjudicada à Autora em 2019 pela empresa “C...”, com uma expressão financeira na ordem dos € 5.000.000,00, decorrendo tal subempreitada de um concurso público internacional lançado pelo Governo de Gibraltar, enquanto dono da obra, que foi ganho pela empresa C....

Os termos da encomenda foram acordados entre as partes em 19.08.2019, apesar de não terem sido reduzidos a escrito, data em que pela Autora foi adjudicado à Ré o trabalho a realizar, assentes que haviam ficado as especificações técnicas que deveriam ser respeitadas na produção dos cacifos, as quantidades a fabricar, bem como o prazo de entrega e demais condições necessárias ao fornecimento das unidades.

O contrato foi celebrado depois de duas reuniões prévias realizadas com os respetivos técnicos de Autora e Ré; na primeira reunião, realizada nas instalações da Ré, foi feita uma primeira análise dos desenhos e especificações técnicas apresentadas pela Autora, quantidades do produto a fornecer, capacidade produtiva da Ré, preço e prazo de entrega; na 2ª reunião, realizada em 16.08.2019, desta vez nas instalações da Autora, foi feita uma análise mais detalhada dos termos da encomenda a executar, tendo sido analisado o protótipo que, para o efeito, havia sido desenvolvido pela Autora, tendo o mesmo, para além de outros aspectos, servido de base para a análise das capacidades produtivas da Ré, quanto às quantidades a fabricar e respectivo prazo de entrega, bem como para a análise de possíveis ajustamentos que se tornassem necessários por forma a adequar aquela a tais capacidades, de modo a optimizar os trabalhos a realizar e a garantir o prazo de entrega.

A Autora forneceu e entregou nas instalações da Ré as quantidades de placas necessárias para a produção dos cacifos contratados, bem como dobradiças e parafusos para tal fim, tudo no valor aproximado de € 150.000,00, tendo ficado ainda a cargo da Autora os custos de aquisição das ferramentas diversas de que a Ré não dispusesse, tais como fresas e brocas de vários tipos, e com a obrigação de esta devolver à Autora tais ferramentas.

O investimento por parte da Autora na contratação da Ré para produção dos referidos cacifos ascendeu a um valor superior a 150.000,00 €, pois incluiu não só as placas necessárias à produção dos cacifos, dobradiças e parafusos, que a Autora entregou nas instalações da Ré, mas também os custos da conceção, desenho e elaboração de protótipos e ainda os custos associados às ferramentas utilizadas na montagem dos cacifos, o que tudo ficou a cargo da Autora.

Nessas reuniões a Autora propôs o preço de € 50 por cacifo e estava convencida de que esse valor tinha ficado acordado com a Ré, como decorre da troca de mensagens entre as partes em 19.08.2019, pelo que, mesmo não tendo ficado provada a existência de acordo quanto ao preço de € 50 por cacifo, o certo é que este foi o único valor falado entre as partes aquando da celebração do contrato e até ao dia posterior à entrega de parte da encomenda pela Ré, de modo que esta tinha consciência ser este o valor que a Autora contava pagar e que nunca questionou.

Assim, é no mínimo reprovável o comportamento da Ré ao não ter avisado, ao longo do processo de produção dos cacifos, da avultada subida do valor que viria a exigir pelo serviço prestado, não se compreendendo igualmente que essa imposição tenha apenas surgido um mês após a definição dos termos da encomenda e após a entrega de 60 cacifos.

Quer isto dizer que a Ré, ao ter a perceção que o valor que viria a exigir era muito superior ao que a Autora julgava ter de pagar, podia e devia ter informado a Autora dessa oscilação, dando-lhe tempo para decidir livremente se pretendia ou não aceitar as condições exigidas, ou se pretendia mudar de fornecedor.
10º
Porém, a Autora foi confrontada e surpreendida com os preços estabelecidos pela Ré - um preço por cacifo cinco a seis vezes superior àquele valor de €50 - através da “Fact. Pro-Forma” datada de 18/09/2019, relativa à produção de parte dos cacifos encomendados,
11º
isto um mês depois de ter negociado com a Ré e de lhe ter confirmado a encomenda (em 19/08/2019), já depois de todo o material necessário à produção dos cacifos (placas de resina fenólica, dobradiças e parafusos) se encontrar nas instalações da Ré e depois desta ter procedido à entrega de 60 cacifos (entrega feita em 17.09.2019).
12º
A Autora de imediato reagiu e reclamou, contestando esses preços, com o argumento de que o que lhe estava a ser exigido era muito superior àquilo que havia sido combinado, conforme e-mails junto aos autos, designadamente e-mails de 20.09.2019, de fls. 59/verso, 60/2.ª parte da folha, 61/verso a 62.
13º
A Ré foi totalmente indiferente às comunicações e a todas as tentativas da Autora no sentido de alterar aqueles preços, tendo a Autora chegado a deslocar-se às instalações da Ré com esse intuito, mas aquela manteve-se intransigente,
14º
ameaçando a Autora de que a não aceitação das condições por si impostas teria como consequência o não carregamento dos cacifos que já estariam quase concluídos, bem como a imediata suspensão da produção dos que ainda se encontravam por produzir.
15º
Além da troca de comunicações escritas foram realizadas reuniões entre as partes tendo em vista a obtenção de uma solução equilibrada, razoável e justa para ambas as partes.
16º
A Ré foi sempre intransigente, mostrou-se indisponível para qualquer negociação e agiu de forma prepotente e arrogante e de forma claramente abusiva, cobrando à Autora, para além dos cacifos, o valor de ferramentas, despesas com ocupação de espaço e com a produção de outro tipo de material (tampos) e despesas com o advogado, o que tudo a Autora pagou para ver a sua encomenda satisfeita.
17º
A Ré foi totalmente indiferente aos apelos da Autora e recusou todas as tentativas que por esta foram feitas tendo em vista aquela alterar a sua pretensão.
18º
Acontece que na altura deste conflito sobre o preço, a Autora estava a ser pressionada por parte da empreiteira C... sobre a necessidade de cumprimento de prazos, sob pena de lhe serem aplicadas penalizações (multas contratuais e eventual resolução do contrato por incumprimento definitivo deste).
19º
A Ré sabia da urgência e da importância que a Autora tinha na entrega dos cacifos em falta e da sua imprescindibilidade para a conclusão da empreitada supra referida e dos prejuízos materiais e reputacionais que o incumprimento acarretaria à Autora e à empreiteira C..., a qual, já em 14.09.2019, se tinha deslocado às instalações da Ré.
20º
Na iminência de sofrer consequências decorrentes de multas pecuniárias, a Autora, mesmo sem concordar com os valores apresentados pela Ré, pediu a colaboração da C... para a resolução do diferendo com a Ré, pelo que, por forma a tornar ainda possível a conclusão do fornecimento dos cacifos encomendados à Ré, a Autora propôs à C... que lhe disponibilizasse as quantias que lhe possibilitassem pagar à Ré os valores que por esta lhe eram exigidos para a conclusão do fornecimento.
21º
A C... acabou por aceitar disponibilizar à Autora, através de pagamentos antecipados e por conta do preço entre elas ajustado, as ajudas financeiras necessárias para que o fornecimento dos cacifos pudesse ser concluído, tendo a Autora conseguido, assim, assegurar, através daquela empresa, o pagamento à Ré da quantia total de € 128.014,12, por via de duas transferências bancárias que, para o efeito, por parte daquela foram realizadas em 04.10.2019 e 15.10.2019, nos montantes de € 74.925,31 e € 53.088,81, respectivamente.
22º
Mesmo assim, numa atitude completamente desprovida de razoabilidade e bom senso, a Ré impôs à Autora a assinatura de um documento de confissão de dívida, sob pena de não lhe fornecer os cacifos em falta, isto quando a totalidade do preço exigido já estava pago, e “só por razões de ordem burocrática ainda não se encontra na conta da Mibilbanho” (conforme consta do referido documento).
23º
A situação de desespero da Autora era tal que, em virtude da pressão exercida pela sua cliente C... e da irredutibilidade da Ré em todo o processo, viu-se obrigada a assinar tal documento, porque se tratava do único meio eficaz à satisfação da sua pretensão em tempo útil.
24º
Não lhe sendo já possível nesta altura contratar outra empresa para fabricar os cacifos e conseguir tê-los prontos para entregar à C... em tempo útil, dado que todo o material para o fabrico dos cacifos estava com a Ré e a mesma negou-se a devolve-lo, como se pode ver pelos e-mails de 7 e 8 de Out/2019, que se encontram junto aos autos (apresentados no requerimento probatório de 11/10/2020, referência citius nº ...45), e quando a Ré já tinha produzido praticamente toda a encomenda.
25º
Da conjugação de todos estes meios de prova só pode concluir-se que nunca a Autora concordou nem aceitou, expressa ou tacitamente, o preço que lhe foi apresentado pela Ré e que a realização do pagamento das faturas não foi efetuado por a Autora ter aceitado o preço, mas em virtude dos condicionalismos referidos.
26º

É certo que o documento junto com o nº 23 da contestação, faz parte da matéria de facto, mas o mesmo não foi elaborado por a Autora concordar com o preço que no decurso da execução da encomenda a Ré lhe exigiu, mas para que a mercadoria fosse liberta a fim de ser transportada para Gibraltar (evitando-se atrasos na entrega e eventual aplicação de penalizações), tendo sido subscrito já após a realização da transferência bancária da sociedade C..., de modo a garantir à Ré o pagamento.
27º
Neste contexto, esta confissão de divida não pode, com todo o respeito, ser interpretada da forma como a Relação a interpreta, de assentimento dos valores das faturas envolvidas, devendo ser interpretada como um homem médio a interpretaria no contexto em que foi elaborada, tendo em conta todas as circunstâncias do caso que rodearam a assinatura deste documento, que não passou da satisfação de mais uma condição/exigência unilateral imposta pela Ré neste negócio, a somar às demais.
28º
Assim, a factualidade dada como provada não permite concluir, como concluiu o Tribunal da Relação, que todo o comportamento da Autora deve ser interpretado no sentido de aceitação (expressa e tácita) do preço determinado pela Ré.
29º
A Autora não aceitou o preço imposto pela Ré, a Autora pagou as faturas (o que não é a mesma coisa) para evitar todas as consequências patrimoniais e reputacionais que sofreria caso não procedesse à entrega da mercadoria naquela data.
30º
Dispõe o artigo 217º nº1 do Código Civil que “a declaração negocial pode ser expressa ou tácita; é expressa quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio direto de manifestação da vontade, e tácita quando se deduz de factos que com toda a probabilidade a revelam”.
31º
A jurisprudência tem entendido, sobretudo o STJ, que a aceitação tácita de um preço deve ser interpretada de forma restritiva e somente ocorrerá em situações específicas e bem delimitadas, o que significa que essa forma de aceitação do preço não pode ser presumida de forma generalizada, mas deve ser comprovada em cada caso concreto.
32º
Por outras palavras, a aceitação tácita do preço deve ser comprovada por meio de elementos que demonstrem claramente a intenção do comprador concordar com o preço estipulado, sendo necessário avaliar as circunstâncias específicas de cada caso, pelo que é entendimento dos nossos tribunais que a aceitação tácita do preço deve ser aplicada com moderação e prudência.
33º
A aceitação tácita do preço não pode ser presumida ou deduzida de silêncio ou inércia do destinatário, ou mesmo da circunstância de que o pagamento tenha sido efetuado pelo preço indicado, isto porque a obrigação de pagar o preço e a aceitação do preço são questões distintas, e a simples circunstância do pagamento ter sido efetuado não implica necessariamente que o preço tenha sido aceite.
34º
Para que a aceitação do preço seja presumida é necessário que haja provas concretas e inequívocas que demonstrem a concordância do destinatário com o preço praticado.
35º
Ora, no caso sub judice, manifestamente não existem provas concretas e inequívocas que demonstrem que a Autora concordou com o preço determinado pela Ré para os cacifos.
36º
Toda a factualidade dada como provada indicia claramente que a Autora nunca concordou com o preço determinado/imposto pela Ré e que só procedeu ao pagamento das faturas para não atrasar mais o processo e não correr o risco de perder o contrato que tinha celebrado com a cliente “C...”, contrato esse cuja expressão financeira ascendia a cinco milhões de euros, uma vez que estava a ser ameaçada por esta com multas contratuais e com a resolução do contrato por incumprimento definitivo.
37º
Assim, as consequências que poderiam advir para a Autora com a não entrega dos cacifos seriam consequências extremamente gravosas, a nível de danos patrimoniais e danos reputacionais, quer presentes quer futuros, e foi neste contexto e considerando todas estas circunstâncias que a Autora procedeu ao pagamento à Ré, e não porque tenha aceitado/concordado com os valores que esta lhe exigiu, dado que era a única forma de conseguir que a mercadoria fosse entregue pela Ré e de poder dar satisfação em tempo útil ao compromisso que tinha assumido com a sua cliente “C...”.
38º
Deste modo, com todo o respeito e salvo melhor opinião, o Tribunal da Relação fez uma errada interpretação e aplicação do direito aos factos, devendo o acórdão recorrido ser revogado e mantida a sentença da 1ª instância, condenando-se a Ré a restituir à Autora o montante de € 29.002,25, acrescido de juros, à taxa legal comercial, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.
39º
Tal quantia é devida, porquanto o preço da obra executada pela Ré, segundo as regras de mercado (aqui relevantes por força do artigo 883.º/1, do CCiv), era de € 82.105,82 (IVA incluído) e a Autora efetuou o pagamento de € 111.108,47, resultando uma diferença de € 29.002,25.
40º
Deste modo, tendo pagado a Autora à Ré o montante de € 111.108,47 e sendo o preço devido pela obra de € 82.105,82 (€ 66.752,70 + IVA de 23%), foi satisfeito a mais da obrigação devida a quantia de € 29.002,25 (€ 111.108,47 - € 82.105,82), sendo esta a importância a restituir, por consistir no recebimento de uma contrapartida patrimonial sem a existência de uma concomitante causa que o justifique, conforme decidiu, e bem, a sentença da 1ª instância, que não merece assim, qualquer reparo, e deve ser mantida.
A recorrida contra alegou nos termos de fls. 333 e seguintes.
                                                        *

II – São as conclusões da alegação de recurso, no seu confronto com a decisão recorrida, que delimitam o objecto do mesmo recurso, sem prejuízo de questões de conhecimento oficioso que possam ser decididas com base nos elementos constantes do processo.
Deste modo, face às conclusões da alegação da recorrente, a questão que essencialmente se nos coloca é a de ponderar se, atentos os factos provados, será de considerar que a proposta de preços apresentada pela R. foi aceite pela A. – ou se, pelo contrário, não ocorreu tal aceitação, havendo que recorrer às regras supletivas formuladas na lei.
                                                        *
III – 1 - De acordo com o decidido pelas instâncias, os factos provados são os seguintes:
1) A Autora é uma sociedade comercial que tem como objecto o fornecimento de soluções de laboratório e mobiliário técnico, engenharia, e projetos chave na mão para espaços laboratoriais e outros espaços, nomeadamente na área do ensino, em sectores tão diversos como universidades, escolas, hospitais, indústria, centros de investigação e pesquisa.
2) Em 2019, foi adjudicada à Autora pela empresa C..., SA, (C...) a execução de uma subempreitada destinada ao apetrechamento do complexo de escolas ..., em Gibraltar, sendo os equipamentos a fornecer e a instalar, nomeadamente bancadas, armários e estações de trabalho, para salas de aula, laboratórios, espaços de espetáculo, biblioteca, halls (salas polivalentes) e espaços de circulação, cuja expressão financeira ascendeu a € 5.000.000,00.
3) A obra acordada entre a Autora e a Ré tinha por objecto o fornecimento e instalação de 233 cacifos em resina fenólica resistente ao fogo nas áreas de circulação das escolas referenciadas (“main hall”/ corredores principais).
4) Com as tipologias e quantidades a seguir indicadas: − 3x4: 85 unidades; − 3x3: 28 unidades; − 4x3: 38 unidades; − 4x4: 82 unidades.
5) Posteriormente, foi adjudicado pela Autora à Ré o fornecimento e a instalação de mais 38 cacifos da tipologia 4x4, para as zonas dos ginásios, designadas por “sports”.
6) A Autora acordou com a Ré para que esta lhe fabricasse e fornecesse os indicados cacifos.
7) O acordo celebrado entre as partes não foi reduzido a escrito.
8) O trabalho de produção a realizar pela Ré consistia no corte mecânico de placas de resina fenólica e na assemblagem dos indicados cacifos através da montagem das peças assim obtidas com o descrito corte mecânico, de acordo com os desenhos técnicos e especificações que para o efeito lhe foram disponibilizados pela Autora.
9) A Autora obrigou-se a fornecer à Ré as quantidades de placas necessárias para a produção dos cacifos contratados, bem como dobradiças e parafusos para tal fim, o que efectivamente fez, tendo as placas de resina fenólica e ferragens, o valor aproximado de € 150.000,00.
10) A Autora e a Ré acordaram igualmente que a Autora suportaria os custos de aquisição das ferramentas diversas de que a Ré não dispusesse, tais como fresas e brocas de vários tipos, e com a obrigação de esta devolver à Autora tais ferramentas.
11) Previamente à celebração do referido contrato, a Autora e a Ré, através dos respectivos técnicos, reuniram para negociarem entre si as condições do trabalho a realizar.
12) Depois de uma reunião levada a efeito nas instalações da Ré para uma primeira análise dos desenhos e especificações técnicas apresentadas pela Autora, quantidades do produto a fornecer, capacidade produtiva da Ré, preço e prazo de entrega, em que estiveram presentes AA, por parte da Autora, e BB, por parte da Ré, as partes realizaram nova reunião em 16.08.2019, desta feita nas instalações da Autora, para uma análise mais detalhada dos termos da encomenda a realizar.
13) Na sequência dessa reunião, acordaram os termos da encomenda no dia 19.08.2019, data em que pela Autora foi adjudicado à Ré o trabalho a realizar, assentes que haviam ficado as especificações técnicas que deveriam ser respeitadas na produção dos cacifos, as quantidades a fabricar, bem como o prazo de entrega e demais condições necessárias ao fornecimento das unidades [salvo quanto ao indicado em a) e b), dos factos não provados].
14) Na reunião de 16.08.2019, as partes tiveram oportunidade de analisar o protótipo que, para o efeito, havia sido desenvolvido pela Autora, tendo o mesmo, para além de outros aspectos, servido de base para a análise das capacidades produtivas da Ré, quanto às quantidades a fabricar e respectivo prazo de entrega, bem como para a análise de possíveis ajustamentos que se tornassem necessários por forma a adequar aquela a tais capacidades, de modo a optimizar os trabalhos a realizar e a garantir o prazo de entrega.
15) A Ré, em 19.08.2019, comunicou à Autora que confirmava a encomenda nos termos que já haviam sido negociados quanto a quantidades e prazo de entrega.
16) A Ré, no dia 07.09.2019, não entregou à Autora os cacifos por motivos totalmente alheios á Ré e imputados aos atrasos na entrega do material necessário á sua execução pela Autora.
17) Em 14.09.2019, o funcionário da empresa C..., CC, acompanhado do director de operações da Autora, deslocou-se às instalações da Ré para, conjuntamente com a Ré e com a Autora, analisarem as possibilidades de fixação de uma nova data para a entrega dos cacifos em falta.
18) No dia 17.09.2019, a Ré forneceu à Autora 60 dos 233 cacifos contratados para o “main hall”.
19) Sem que para o efeito a Autora tivesse entregado qualquer fatura ou documento respeitante ao fornecimento e à carga que foram realizadas nas suas instalações.
20) A Ré, em 18.09.2019, após ter executado o fornecimento dos referidos 60 cacifos, confrontou a Autora com o documento de fls.59, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, acompanhado do e-mail de fls. 60/verso, datado de 18.09.2019 (enviado pelas 12h05m), cujo conteúdo também aqui se dá por reproduzido.
21) A Autora reagiu ao e-mail referido na al. anterior através do envio do que consta de fls. 60 (enviado no dia 20.09.2019, pelas 11h07m).
22) A Ré, sabendo da urgência e da importância que a Autora tinha na entrega dos cacifos em falta e da sua imprescindibilidade para a conclusão da empreitada supra referida e dos prejuízos materiais e reputacionais que o incumprimento acarretaria à Autora e à empreiteira C..., ainda no dia 20.09.2019 informou a Autora de que a não aceitação das condições impostas teria como consequência o não carregamento dos cacifos que nessa data, segundo informou, já estariam quase concluídos, bem como a imediata suspensão da produção dos que ainda se encontravam por produzir.
23) Malgrado as comunicações da Autora, a Ré recusou as tentativas que por aquela foram feitas com o intuito de a demover da sua pretensão.
25) Os atrasos verificados no fornecimento dos cacifos por parte da Autora à C..., levaram a que esta, em 02.10.2019, tivesse efectuado a comunicação que consta do e-mail que consta de fls. 65/verso a 66, com o conteúdo que se dá por reproduzido.
26) Na iminência de sofrer consequências decorrentes de multas pecuniárias, a Autora pediu a colaboração da C... para a resolução do diferendo com a Ré.
27) Assim, e por forma a tornar ainda possível a conclusão do fornecimento dos cacifos encomendados à Ré, a Autora propôs à C... que lhe disponibilizasse as quantias que lhe possibilitassem pagar à Ré os valores que por esta lhe eram exigidos para a conclusão do fornecimento.
28) A C... acabou por aceitar disponibilizar àquela, através de pagamentos antecipados e por conta do preço entre elas ajustado, as ajudas financeiras necessárias para que o fornecimento dos cacifos pudesse ser concluído.
29) A Autora assegurou, através da C..., o pagamento da quantia total de € 128.014,12, por via de duas transferências bancárias que, para o efeito, por parte daquela foram realizadas em 04.10.2019 e 15.10.2019, nos montantes de € 74.925,31 e € 53.088,81, respectivamente.
30)    A mercadoria a que se alude nas facturas n.º ...91, de fls. 101,  encontrava-se pronta no dia 21.09.2019.
31) A mercadoria a que se alude nas facturas n.ºs ...92, ...92, de fls. 101/verso e 102, encontrava-se pronta no dia 26.09.2019.
32) A mercadoria a que se alude na fatura n.º ...16, de fls. 103/verso, encontrava-se pronta no dia 09.10.2019.
33)    O         preço   de        mercado,         para     a          execução         do serviço a que se alude nas als. 4), 5), 6) e 8), praticado por empresas com características similares à Ré, na zona geográfica onde esta opera, era, em agosto/setembro de 2019, de € 66.752,70, acrescido IVA à taxa de 23%, o que totaliza € 82.105,82.
34) O pagamento a que se alude na al. 29) destinou-se à liquidação das facturas n.ºs ...93, ...09, ...16, ...17, ...18, ...72, ...90, ...91, ...92 e ...94.
35) Apenas as facturas com os n.ºs ...93 (no montante de € 38.955,79), 119/291 (na parte relativa às parcelas de € 8.035,60, € 11.153,00 e € 690,00) e 119/292 (no montante de € 16.255,68) reportam-se à execução dos cacifos, as quais totalizam € 111.108,07 (IVA incluído).
36) Consta de documento junto com o nº 23 da contestação (que aqui se dá por integralmente reproduzido), cuja autenticação revela ter como outorgantes DD e EE, por si e na qualidade de legais representantes da sociedade comercial Laborial – Soluções Para Laboratório, S.A., e reportar-se a uma “confissão de dívida” na qual estes, “declaram por si e na qualidade de administradores, com poderes para o acto”, da referida sociedade:
- Que a referida sociedade LABORIAL (…) deve à MILBIBANHO (…) o montante de 53088,81 (cinquenta e três mil e oitenta e oito euros e um cêntimo) referente às facturas ...93, ...09, ...16, ...17, ...18, as quais já se encontram vencidas;
- Que a referida sociedade garante que o referido montante já foi transferido para a conta da MILBIBANHO (…) pela sociedade C..., LIMITED) só que por razões de ordem burocrática ainda não se encontra na conta da MILBIBANHO (…);
- Que se o referido montante de 53 088,81 não estiver na conta da MILBIBANHO (…) no prazo de 5 dias, os declarantes e a sociedade que representam assumem solidariamente a responsabilidade pelo pagamento de tal montante à MILBIBANHO (…), acrescido da existência de uma cláusula penal de 5000 euros (…). (…) ..., 17 de Outubro de 2019”
                                                        *
III – 2 - Das instâncias, vieram como não provados os seguintes factos:
a) A Autora e a Ré acordaram o preço final unitário de € 50,00 pelos cacifos referidos em 4) e 5).
b) Entre a Autora e a Ré ficou também acordada a atribuição à Ré de um 119/317 (na parte relativa à quantia de € 3.960,00 por trabalhos extra), 119/316 (no montante de € 4.250,16), 119/290 (no montante de € 27.807,84), prémio de desempenho, de € 20,00 por unidade, a acrescer ao preço unitário de € 50,00, sob condição de a Ré entregar os 233 cacifos em data anterior a 07.09.2019.
c) A Autora entregou o material à Ré com vista à execução atempada dos trabalhos.
d) Nas datas indicadas em 14) e 15), a Autora fez saber à Ré, uma vez mais, que o fornecimento em causa e o escrupuloso cumprimento dos prazos definidos assumiam uma importância excepcional, não compatível com qualquer atraso, por permitir a conclusão da obra contratada entre a Autora e a empreiteira C... e a abertura, por parte do dono da obra, na data para o efeito prevista, das aulas dos estabelecimentos de ensino em que a empreitada se realizava, em Gibraltar,
e) Na data indicada em 15), a Autora voltou a sublinhar à Ré que, embora tivesse capacidade produtiva própria, a mesma não lhe permitiria satisfazer, no prazo ajustado com a empreiteira C..., as quantidades que com ela havia contratado, e que só admitia a possibilidade de à Ré encomendar os cacifos em causa pela inequívoca garantia que aquela lhe dava quanto ao absoluto cumprimento dos prazos acordados, tendo a Ré reafirmado à Autora, a tal propósito, que nenhuma dificuldade ocorreria.
f)      A Ré, na data indicada na al. 16), limitou-se a justificar o atraso com avarias que, entretanto, haviam ocorrido na sua máquina de corte CNC, de maior  capacidade    produtiva,  sem que à Autora tivesse sido dada uma data alternativa para a conclusão do fabrico e entrega dos cacifos em falta.
g) Na visita a que se alude em 17), foi acordado que a nova data de entrega da totalidade dos cacifos seria a de 17.09.2019.
h) A visita referida em 17) visou confrontar a Ré com a gravidade do seu incumprimento e das suas possíveis consequências (mormente multas pecuniárias, rescisões contratuais consequentes indemnizações).
i) No dia 17.09.2019, a Autora não se comprometeu com a data de entrega dos cacifos que ainda se encontravam por produzir.
j)       A Autora teve de suportar o pagamento de fretes de transportes que havia contratado e que não puderam ser realizados por força da não entrega pela Ré dos cacifos nas datas que para o efeito haviam ficado acordadas, e sem que disso aquela tivesse dado prévio conhecimento à Autora, o que lhe acarretou um prejuízo de € 4.371,06.
l) Por não lhe ser possível o recurso alternativo a outros fornecedores, uma vez que todas as placas de resina fenólica necessárias à produção dos cacifos já se encontravam nas instalações da Ré, a Autora disso deu conta à C... com o intuito de a prevenir.
                                                        *
IV – 1 - Entendeu o Tribunal de 1ª instância que a situação dos autos não deveria ser perspectivada face aos vícios da usura e da coacção moral, não estando em causa esses vícios na formação da vontade conducente à celebração do negócio, havendo sim, uma exigência unilateral, por parte da R. quanto ao preço da empreitada a encarar sob o prisma do enriquecimento sem causa – daí ter concluído improcederem os pedidos deduzidos sob as alíneas A) e B), baseadas em vícios da vontade. Mais entendeu que tratando-se o negócio celebrado entre as partes de um contrato de subempreitada, a que é aplicável o art. 833 do CC, não se havendo apurado o preço estipulado pelas partes nem que tenham convencionado o modo pelo qual deveria ser determinado, apurou-se o preço de mercado; tendo a A. pago a mais o valor de 29.002,25 €, porque a R. lho exigiu e para evitar o protelamento da discussão com a R. e consequências patrimoniais para si, esse valor foi satisfeito para além da obrigação devida e deverá ser restituído.
Daí a condenação/absolvição da R. nos termos em que teve lugar.
Já a Relação de Guimarães, embora houvesse alterado a decisão da matéria de facto proveniente da 1ª instância, considerou que aquelas modificações não tinham reflexos em termos de mérito; todavia, julgou verificar-se uma declaração de aceitação do preço por parte da A., não havendo lugar a qualquer restituição.
Vejamos, então.
Sabemos que em 2019, foi adjudicada à A. pela empresa “C..., SA” a execução de uma subempreitada destinada ao apetrechamento do complexo de escolas ..., em Gibraltar, tendo, na sequência, A. e R. acordado o fabrico e fornecimento por esta de 233 cacifos em resina fenólica, resistente ao fogo, nas áreas de circulação daquelas escolas e que, posteriormente, foi adjudicado pela A. à R. o fornecimento e a instalação de mais 38 cacifos.
Sabemos, também que o acordo de fabrico e fornecimento dos cacifos celebrado entre A. e R. não foi reduzido a escrito.
A. e R. acordaram que a A. suportaria os custos de aquisição das ferramentas diversas de que a R. não dispusesse, tais como fresas e brocas de vários tipos (com a obrigação de a R. devolver à A. tais ferramentas), bem como a A. disponibilizou para o efeito os desenhos técnicos e especificações e obrigou-se a fornecer à R. as quantidades de placas necessárias para a produção dos cacifos contratados, bem como dobradiças e parafusos para esse fim, o que efectivamente fez.
Previamente à celebração do contrato, a A. e a R., através dos respectivos técnicos, reuniram para negociarem entre si as condições do trabalho a realizar: depois de uma reunião levada a efeito nas instalações da R. para uma primeira análise dos desenhos e especificações técnicas apresentadas pela A., quantidades do produto a fornecer, capacidade produtiva da R., preço e prazo de entrega, as partes realizaram nova reunião em 16-8-2019, nas instalações da A., para uma análise mais detalhada dos termos da encomenda a realizar. Tratou-se, pois, de reuniões preparatórias, com apresentação das informações necessárias para que o acordo se alcançasse.
Os termos do acordo foram assentes  em 19-8-2019, data em que pela A. foi adjudicado à R. o trabalho a realizar, assentes que haviam ficado as especificações técnicas que deveriam ser respeitadas na produção dos cacifos, as quantidades a fabricar, bem como o prazo de entrega e demais condições necessárias ao fornecimento das unidades, tendo nesta data a R. comunicado à A. que confirmava a encomenda nos termos que já haviam sido negociados quanto a quantidades e prazo de entrega.
Todavia, não se provou que A. e R. tivessem então e até aí acordado a retribuição pelos trabalhos que esta iria realizar – nomeadamente o preço final unitário de € 50,00 pelos cacifos e o prémio de desempenho de € 20,00 alegados pela A. na p.i. e que segundo ela teriam sido definidos na reunião de 16-8-2019; nem mesmo que as partes tivessem, então, acordado um preço, ainda que não apurado o seu valor - muito embora nas reuniões preparatórias a questão preço tivesse sido abordada.
No dia 17-9-2019, a R. forneceu à A. 60 dos 233 cacifos inicialmente contratados e em 18-9-2019, após ter executado o fornecimento daqueles 60 cacifos, confrontou a A. com o documento de fls. 59 (factura pro-forma), acompanhado do e-mail de fls. 60/verso, datado de 18-9-2019 (enviado pelas 12h05m),  dizendo que «No seguimento do trabalho executado e a executar anexamos, sob forma de proforma, nossa proposta relativamente ao custo unitário de cada versão».
A A. reagiu àquele e-mail através do envio do e-mail de fls. 60 (enviado no dia 20-9-2019, pelas 11h07m), dizendo que os preços não estavam de acordo com o combinado e que o «que fora proposto e conversado foi um valor aproximado de 50 euros de montagem por cada cacifo e com acréscimo de mais 20 euros caso a entrega fosse realizada … antes do dia 7 de Agosto».
Destes factos resultará que entre a A. e a R. foi celebrado um contrato de subempreitada – sendo a A., já subempreiteira da «C...» - o que aliás, não é posto em causa nos autos. Atento o disposto no art. 1213 do CC, a subempreitada é o contrato pelo qual alguém se obriga perante o empreiteiro a executar a obra de que este está encarregado, ou uma parte dela. É um subcontrato em que o empreiteiro assume a posição de dono da obra perante um novo empreiteiro, tratando-se de um contrato idêntico ao da empreitada, ao qual se aplicam as mesmas regras.
No contrato de empreitada (e, logo, também na subempreitada) a obrigação principal do dono da obra (correspondente na subempreitada ao empreiteiro) é a prestação do preço, da retribuição acordada – o preço é um elemento integrador e caracterizador daquele contrato (ver a noção constante do art. 1207 do CC), sendo o correspectivo da obra.
Em regra, o preço da empreitada é fixado até, ou quando, do momento da celebração do negócio – todavia, no caso dos autos os termos do acordo entre as partes foram assentes  em 19-8-2019, data em que pela A. foi adjudicado à R. o trabalho a realizar, sem que o preço estivesse definido nessa ocasião.
Apenas em 18-9-2019, após ter fornecido à A., no dia 17-9-2019, 60 dos 233 cacifos inicialmente contratados, a R. enviou à A. a sua proposta de preço (“ proposta relativamente ao custo unitário de cada versão” dos cacifos), proposta que a A. de imediato não aceitou (e-mail de 20-9-2019).
Sucede que a perfeição do contrato de empreitada não depende da fixação do preço, podendo este ser determinado em momento posterior, embora, como vimos, seja um elemento integrador/caracterizador da noção de empreitada ([1]).
Questão é, aqui, se A. e R. vieram a acordar num determinado preço, ou se isso não sucedeu.
                                                        *
IV – 2 - O Tribunal de 1ª instância entendeu: «No caso concreto, não se apurou o preço estipulado pelas partes nem que estas tenham convencionado o modo pelo qual seria determinado». Na sequência procedeu à aplicação das regras supletivas constantes do art. 883 do CC, por remissão do art. 1211 do mesmo Código, considerando que «antes do último recurso à equidade, resta a consideração do preço do mercado no momento do contrato e no lugar em que o comprador deva cumprir» e concluindo pelo preço a propósito consignado.
Já o Tribunal da Relação ponderou que sendo «certo que existem factos que nos permitem concluir que, pelo menos no momento retractado nos itens 20. a 23., estava instalada a discórdia sobre esse aspecto, continuando essa questão em aberto, a verdade é que, posteriormente, a dada altura, a Autora não só manteve o propósito de receber a prestação da Ré, sabendo do preço que esta estabelecera como condição para a prestar, como, acresce, diligenciou pelo seu pagamento … de acordo com os valores exigidos por esta última (27. a 29.), sem que se conheça qualquer ressalva da sua parte (e que era seu ónus demonstrar – art. 342º, nº 2, do C.C.)». Concluindo que por declaração tácita e expressa (isto no que concerne às declarações constantes do escrito mencionado em 36) dos factos provados) a A. aceitou os valores indicados pela R..
Como assinalado supra, em 18-9-2019, já após ter fornecido à A., 60 dos 233 cacifos inicialmente contratados, a R. enviou à A. a sua proposta de preço, proposta essa que pela A. não foi aceite, conforme resulta do e-mail da A. de 20-9-2019.
A R., sabendo da urgência e da importância que a A. tinha na entrega dos cacifos em falta e da sua imprescindibilidade para a conclusão da empreitada a que os trabalhos se destinavam, bem como dos prejuízos materiais e reputacionais que o incumprimento acarretaria à A. e à empreiteira «C...», ainda no mesmo dia 20-9-2019, informou a A. de que a não aceitação das condições impostas teria como consequência o não carregamento dos cacifos que nessa data, segundo informou, já estariam quase concluídos, bem como a imediata suspensão da produção dos que ainda se encontravam por produzir, vindo a recusar as tentativas que pela A. foram feitas com o intuito de a demover da sua pretensão.
Até aqui, inegavelmente não houve qualquer acordo das partes.
No seguimento, decorre dos factos provados que:
- Na iminência de sofrer consequências decorrentes de multas pecuniárias, a A. pediu a colaboração da «C...» para a resolução do diferendo com a R.; assim, e por forma a tornar ainda possível a conclusão do fornecimento dos cacifos encomendados à R., a A. propôs à «C...» que lhe disponibilizasse as quantias que lhe possibilitassem pagar à R. os valores que por esta lhe eram exigidos para a conclusão do fornecimento, sendo que a «C...» acabou por aceitar disponibilizar à A., através de pagamentos antecipados e por conta do preço entre elas ajustado, as ajudas financeiras necessárias para que o fornecimento dos cacifos pudesse ser concluído.
- A A. assegurou, através da «C...», o pagamento da quantia total de € 128.014,12, por via de duas transferências bancárias que, para o efeito, por parte daquela foram realizadas em 4-10-2019 e 15-10-2019, nos montantes de € 74.925,31 e € 53.088,81, respectivamente, destinado à liquidação das facturas n.ºs ...93, ...09, ...16, ...17, ...18, ...72, ...90, ...91, ...92 e ...94, sendo que apenas as facturas com os n.ºs ...93 (no montante de € 38.955,79), 119/291 (na parte relativa às parcelas de € 8.035,60, € 11.153,00 e € 690,00) e 119/292 (no montante de € 16.255,68) se reportam à execução dos cacifos, as quais totalizam € 111.108,07 (IVA incluído).
A questão que se coloca é a de se, perante a intransigência da R. em manter a proposta de preço que remetera à A. em 18-9-2019 (apesar da discordância que esta manifestara em 20-9-2019 e das tentativas a que procedera de demover a R.) desta factualidade que supra transcrevemos resultará a aceitação tácita, pela A., daquele mesmo preço.

Vejamos, então.

A declaração negocial equivale a uma manifestação de vontade humana dirigida à produção de efeitos jurídicos, carecendo de ser exteriorizada. Apresenta um elemento externo, correspondente a um comportamento - expresso ou tácito - e um elemento interno, reconduzível à vontade.

O CC distingue entre a declaração negocial expressa e a declaração tácita - art. 217; a declaração é expressa quando feita por palavras, escrito ou qualquer meio de manifestação da vontade e é tácita quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade a revelam.

A declaração expressa obriga, pelo menos, à utilização de um meio de comunicação típico, seja este universal ou apenas utilizado por um determinado grupo social ([2]) – assim, por escrito, através da linguagem verbal ou gestual, por meio de movimentos com relevância declarativa típica.

Já a declaração tácita é aquela que é feita mediante factos que tendo como finalidade primária algo de diferente, permitem deduzir com toda a probabilidade uma vontade funcional ou negocial. Na declaração tácita, os actos em que ela se traduz são meramente significativos de uma vontade funcional ou negocial pré-existente. São factos concludentes ou significativos. Entre os factos concludentes e a declaração há um nexo de presunção - a declaração não é formada pelos factos concludentes, deduz-se deles ([3]). Aqui, a vontade manifesta-se não através de um acto de comunicação a tanto destinado, mas mediante um comportamento que, nas condições em que ocorre, permite inferi-la ([4]).  

Não esqueçamos que o sentido do comportamento declarativo se determina de fora, do ponto de vista do declaratário e que a chamada univocidade dos facta concludentia se afere  por um critério prático, empírico ([5]).

A existência de uma declaração negocial é determinada através das regras da interpretação que, «num processo incindível, decide não apenas sobre o conteúdo da declaração negocial, mas também sobre a questão da sua existência, seja esta expressa ou tácita» ([6]).

A lei não exige que a dedução «seja forçosa ou necessária, bastando que conforme os usos do ambiente social, ela possa ter lugar com toda a probabilidade».  Acresce que, considerando o critério da interpretação dos negócios jurídicos consagrado no CC, «deve entender-se que a concludência dum comportamento, no sentido de permitir concluir “a latere” um certo sentido negocial, não exige a consciência subjectiva por parte do seu autor desse significado implícito, bastando que, objectivamente, de fora, numa consideração de coerência, ele possa ser deduzido do comportamento do declarante» ([7]).
Ora, afigura-se que, mantendo a R. o preço que indicara, ter a A. acabado por proceder ao pagamento do preço pretendido (apesar da discordância inicial), utilizando um critério prático, empírico, conforme os usos atinentes, corresponde a um comportamento que traduz uma posterior aceitação daquele mesmo preço, perante a inflexibilidade da R. ao mantê-lo. Isto na óptica de “toda a probabilidade” que a lei refere  - objectivamente, de fora, numa consideração de coerência, é o que se deduz  do comportamento da A..
A A. submeteu-se aos preços indicados pela R., não revelando, após a discordância inicial, que procedeu aos pagamentos “com reserva”, ou ressalvando que o fazia atenta a situação em que se encontrava perante a empreiteira.
Sabemos que, consoante se provou, a A. tinha prazos a cumprir, encontrando-se na iminência de sofrer consequências decorrentes de multas pecuniárias, e que a R. sabia da urgência e da importância que a A. tinha na entrega dos cacifos e da sua imprescindibilidade para a conclusão da empreitada a que os trabalhos se destinavam, bem como dos prejuízos materiais e reputacionais que o incumprimento acarretaria à A..
Poder-se-á dizer que a R. se valeu da situação da A. e que foi essa mesma situação e a posição assumida pela R. que levou a A. a proceder aos pagamentos (por via da “C...”). Todavia, isso não invalidará que entendamos que os pagamentos dos preços exigidos pela R. traduzam a referida aceitação, sendo significativos  da mesma – encontramo-nos no “segmento” declaração (aqui tácita) e não no que respeita à formação da vontade que a declaração veio a manifestar.
 Lembremos que o Tribunal de 1ª instância afastou a hipótese de considerar o vício na formação da vontade da coacção moral, previsto nos arts. 255 e 256 do CC ([8]), bem como o vício da usura previsto nos arts. 282 e 283 do mesmo Código ([9]) e que estavam na base da formulação dos pedidos que a A. deduzira sob as alíneas “A.” e “B.” do seu petitório, sendo certo que a A. não reagiu contra tal afastamento.
Acresce  que, consta do documento que se encontra a fls. 111-112 cuja autenticação revela «ter como outorgantes DD e EE, por si e na qualidade de legais representantes da sociedade comercial Laborial – Soluções Para Laboratório, S.A., e reportar-se a uma “confissão de dívida” na qual estes, “declaram por si e na qualidade de administradores, com poderes para o acto”, da referida sociedade:
- Que a referida sociedade LABORIAL (…) deve à MILBIBANHO (…) o montante de 53088,81 (cinquenta e três mil e oitenta e oito euros e um cêntimo) referente às facturas ...93, ...09, ...16, ...17, ...18, as quais já se encontram vencidas;
- Que a referida sociedade garante que o referido montante já foi transferido para a conta da MILBIBANHO (…) pela sociedade C..., LIMITED) só que por razões de ordem burocrática ainda não se encontra na conta da MILBIBANHO (…);
- Que se o referido montante de 53 088,81 não estiver na conta da MILBIBANHO (…) no prazo de 5 dias, os declarantes e a sociedade que representam assumem solidariamente a responsabilidade pelo pagamento de tal montante à MILBIBANHO (…), acrescido da existência de uma cláusula penal de 5000 euros (…). (…) ..., 17 de Outubro de 2019».
Este documento, datado de 17-10-2019, reflecte o reconhecimento pela A. dos preços a que se reportam as facturas ...93, ...09, ...16, ...17, ...18, nele referidas.
Deste modo, não tendo a A. logrado provar que, consoante alegara, as partes haviam acordado o preço unitário de 50,00 € (alínea a) dos factos não provados), antes se encontra demonstrada, em face da factualidade apurada, a aceitação tácita, posterior, dos preços que a R. veio a indicar.
Ainda, uma nota:
Os factos em que nos baseamos são, tão só, os que constam do elenco dos factos provados. A A., na sua alegação de recurso de revista alude a circunstancialismo de facto que não integra os factos provados e a que, por isso, este Tribunal não poderá atender ([10]).
                                                        *
IV – 3 - Como vimos, a perfeição do contrato de empreitada (no caso, de subempreitada) não depende da fixação do preço, podendo ser determinado em momento posterior.
Dispõe o nº 1 do art. 1211 do CC ser aplicável à determinação do preço, na empreitada, com as necessárias adaptações, o disposto no art. 883, sobre a determinação do preço na compra e venda, prevendo este:
«1. Se o preço não estiver fixado por entidade pública, e as partes o não determinarem nem convencionarem o modo de ele ser determinado, vale como preço contratual o que o vendedor normalmente praticar à data da conclusão do contrato ou, na falta dele, o do mercado ou bolsa no momento do contrato e no lugar em que o comprador deva cumprir; na insuficiência destas regras, o preço é determinado pelo tribunal, segundo juízos de equidade.
       2. Quando as partes se tenham reportado ao justo preço, é aplicável o disposto no número anterior».
Os critérios supletivos para fixação do preço aludidos no nº 1 do art. 883 valem para os casos em que não haja preço tabelado pela entidade pública nem as partes o tenham fixado. No caso que nos ocupa, e como vimos, os preços dos cacifos foram determinados pelas partes, não havendo que recorrer àqueles critérios supletivos.
Neste contexto, a R. não está obrigada a “devolver” à A. qualquer montante que àquela não fosse devido.
                                                        *

V – Pelo exposto, acordam os Juízes do Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção) em negar a revista

Custas pela A.

                                                           *

Lisboa,  28 de Junho de 2023

Maria José Mouro (Relatora)

Maria Olinda Garcia  

Ricardo Costa



SUMÁRIO (da responsabilidade da relatora).


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[1]              Ver Pedro Romano Martinez, «Direito das Obrigações – Contratos» , Almedina, 2ª edição,  pág. 397.
[2]              Ver Evaristo Mendes e Fernando Sá «Comentário ao Código Civil – Parte Geral», Universidade Católica Editora, 2014, pág. 491.
[3]              Castro Mendes, «Direito Civil», III vol., lições publicadas pela AFDL, págs. 82 e seguintes.
[4]              Ver Menezes Cordeiro, «Código Civil Comentado, I Parte Geral», coordenação de Menezes Cordeiro, Almedina, 2020, pág. 626.
[5]              Ver Manuel de Andrade, «Teoria Geral da Relação Jurídica», vol. II, Almedina, 1987, pág. 132.
[6]              Evaristo Mendes e Fernando Sá, obra citada pág. 489.
[7]              Mota Pinto, «Teoria Geral do Direito Civil», Coimbra Editora, 1976, pág. 337.
[8]              Nas situações de coacção moral o processo formativo da vontade é perturbado pela ocorrência de uma ameaça a qual gera um medo que vai determinar a decisão negocial do coagido cuja vontade é condicionada por esse medo que o faz querer aquilo que, de outro modo, não quereria. A ameaça deverá ser a causa do medo e este a causa da declaração negocial - a chamada dupla causalidade.
[9]              Segundo o nº 1 do art. 282 do CC é anulável, por usura, o negócio jurídico quando alguém, explorando a situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de benefícios excessivos ou injustificados; todavia, atento o art. 283, em lugar da anulação poderá ser requerida a modificação do negócio.
[10]            Assim, designadamente, a recorrente refere: que nas reuniões preparatórias “propôs o preço de € 50 por cacifo e estava convencida de que esse valor tinha ficado acordado com a Ré” (conclusão 7ª); “a Ré impôs à Autora a assinatura de um documento de confissão de dívida, sob pena de não lhe fornecer os cacifos em falta, isto quando a totalidade do preço exigido já estava pago” (conclusão 22ª);  o documento junto com o nº 23 da contestação “não foi elaborado por a Autora concordar com o preço que no decurso da execução da encomenda a Ré lhe exigiu, mas para que a mercadoria fosse liberta a fim de ser transportada para Gibraltar” (conclusão 26ª).