Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
381/12.3TTLSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: PINTO HESPANHOL
Descritores: DESPEDIMENTO COLECTIVO
FORMALIDADES
ILICITUDE
QUESTÃO NOVA
Data do Acordão: 09/12/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS / PRINCÍPIOS GERAIS - DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS DOS TRABALHADORES.
DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO POR INICITIVA DO EMPREGADOR / DESPEDIMENTO COLECTIVO / ILICITUDE DO DESPEDIMENTO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / RECURSOS.
Doutrina:
- GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, Artigos 1.º a 107.º, volume I, 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 709.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 660.º, N.º2, 676.º, N.º 1, 690.º, N.º 1, 713.º, N.º 2, 715.º, 726.º.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT) / 2009: - ARTIGOS 359.º, 360.º, 361.º, 362.º, 363.º, 364.º, 365.º, 366.º, 381.º, 383.º.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 13.º, 53.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 19 DE DEZEMBRO DE 2012, PROFERIDO NO PROCESSO N.º 1222/10.1TTVNG-A.P1.S1, DA 4.ª SECÇÃO.
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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
-N.º 64/91, DE 4 DE ABRIL DE 1991, PROCESSO N.º 117/91.
Sumário :
1.  Na ausência das estruturas representativas dos trabalhadores a que se refere o n.º 1 do artigo 360.º do Código do Trabalho de 2009 e não sendo designada a comissão ad hoc representativa dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo, aludida no n.º 3 do mesmo artigo, o empregador não é obrigado a promover a fase de informações e negociação tal como se acha desenhada no artigo 361.º seguinte.

2.  Os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais (artigos 676.º, n.º 1, e 690.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), através dos quais se visa reapreciar e modificar decisões e não criá-las sobre matéria nova, salvo quanto às questões de conhecimento oficioso.

3.  Não tendo o autor suscitado, perante o tribunal de primeira instância, uma questão enunciada nas conclusões da respectiva alegação do recurso de apelação, a qual, por este motivo, não foi apreciada pelo referido tribunal, e uma vez que o acórdão recorrido julgou improcedente a arguida nulidade da sentença por omissão de pronúncia relativamente a essa mesma matéria, não pode este Supremo Tribunal dela conhecer por se tratar de uma questão nova.
Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                                                    I

1. Em 27 de Janeiro de 2012, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, 4.º Juízo, 1.ª Secção, AA instaurou a presente acção, com processo especial, de impugnação de despedimento colectivo contra BB, S. A., pedindo que fosse declarado ilícito o despedimento colectivo promovido pela ré, «em virtude da violação do N.º 1 do art. 361.º do Código do Trabalho [de 2009]», e a condenação da ré a pagar-lhe «salários até ao trânsito em julgado da sentença, férias, subsídios de férias e de Natal vencidos e proporcionais e, finalmente, na reintegração do Autor».

 Alegou, na petição inicial, que «começou a trabalhar para a Ré em 21 de Julho de 2004» (artigo 1.º) e «a relação laboral entre a ré e o autor terminou em 30 de Dezembro do ano de 2011, no âmbito de um Despedimento Colectivo» (artigo 2.º); todavia, «a ré não cumpriu o iter processual legalmente imposto» (artigo 3.º), isto é, «não promoveu qualquer reunião de negociações com o Autor» (artigo 4.º), tal como «a lei vigente expressamente impõe» (artigo 5.º), donde, «a Ré não permitiu que o A. pudesse expor os seus pontos de vista sobre o processo de Despedimento Colectivo em curso» (artigo 6.º), nomeadamente, que «fora abrangido pelo Despedimento Colectivo por razões retaliatórias» (artigo 7.º), «porque a Ré se incompatibilizara com o Autor» (artigo 8.º), de modo que «o Autor se vira na necessidade de instaurar acção judicial (a qual ainda se encontra em curso) contra a Ré com fundamento em assédio moral» (artigo 9.º), visto que, «a partir do momento em que o A. se recusou a realizar trabalhos que considerava socialmente não éticos, a Ré começou a retaliar contra aquele» (artigo 10.º), daí que «sofreu uma penosa baixa psiquiátrica» (artigo 11.º) e, posteriormente, «foi-lhe diagnosticado o padecimento da doença denominada burnout» (artigo 12.º), sendo que «a Ré, aproveitando um processo de Despedimento Colectivo, incluiu o A. na lista dos trabalhadores a despedir» (artigo 13.º) e «não promoveu quaisquer negociações com o Autor» (artigo 14.º).

A ré contestou, alegando que, no período entre a data da recepção pelo autor da comunicação inicial do procedimento de despedimento colectivo e o momento em que este recebeu a decisão final tomada no âmbito daquele procedimento, as partes, por iniciativa da ré, encetaram diversos contactos com vista à obtenção de acordo, os quais «foram feitos quer directamente entre o A. e a Ré quer entre os respectivos mandatários», pelo que é «absolutamente falso o alegado no artigo 14.º da p. i. — o qual desde já se impugna — pois como o A. e o seu mandatário bem sabem a Ré promoveu várias e diversas negociações com o A.»; e mais impugnou o alegado nos artigos 7.º a 13.º da petição inicial, afirmando «que o despedimento do A. não teve qualquer intuito persecutório ou sequer alguma razão de natureza pessoal, sendo, simplesmente, uma decorrência da reorganização da estrutura interna da Ré, levada a cabo com o propósito de a adequar à actual situação económica da empresa», tendo concluído no sentido da improcedência da acção e da sua absolvição do pedido.

Entretanto, a ré juntou aos autos os documentos relativos ao procedimento de despedimento colectivo e o autor veio informar que à acção judicial mencionada no artigo 9.º da petição inicial correspondia o Processo n.º 3302/11.7TTLSB, a correr termos na 2.ª Secção do 4.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa.

Realizada audiência preliminar, em que, «discutidas as posições das partes, pelos ilustres mandatários foi dito que mantêm as posições expressas nos articulados, sendo certo que estão de acordo, no caso vertente, que não existe na empresa qualquer estrutura representativa dos trabalhadores, conforme a ré alega nos arts. 22.º e 23.º da contestação», proferiu-se sentença que, após ter indicado os factos provados e não provados, explicitou a fundamentação de direito seguinte:
                    «De harmonia com o disposto no art. 361.º, n.º 1, do Código do Trabalho, nos 5 dias posteriores à data do acto previsto nos n.os 1 ou 4 do artigo anterior, o empregador promove uma fase de informações e negociação com a estrutura representativa dos trabalhadores, com vista a um acordo sobre a dimensão e efeitos das medidas a aplicar e, bem assim, de outras medidas que reduzam o número de trabalhadores a despedir, designadamente:
                      a) Suspensão de contratos de trabalho;
                      b) Redução dos períodos normais de trabalho;
                      c) Reconversão ou reclassificação profissional;
                      d) Reforma antecipada ou pré-reforma.
                      No caso vertente, verifica-se que não existe comissão de trabalhadores, comissão intersindical ou comissão sindical de empresa representativa dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo (nos quais se inclui o autor), sendo, por isso, evidente que a entidade patronal não estava obrigada a dar cumprimento à disposição legal que no caso presente foi invocada por parte do trabalhador como tendo sido desrespeitada ou incumprida pela ré.
                      Assim, não ocorre a ilicitude prevista no art. 383.º, alínea a), do Código de Trabalho, devendo, nesta conformidade, a acção ser julgada improcedente, com as consequências legais.»

2. Inconformado, o autor veio apelar para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo arguido, em separado, a nulidade da sentença recorrida, nos termos seguintes:

                   «O A. em sede de Petição Inicial alegou o seguinte:
                     a) Que a Recorrida violara o N.º 1, art-361.º do Cód. do Trabalho em razão de não ter realizado a fase de “informações e negociação” ali prevista relativamente à extinção do contrato através de Despedimento Colectivo (art. 4.º a 6.º da PI);
                     b) Que a Ré, aproveitando um processo de Despedimento Colectivo, incluiu o A. na lista dos trabalhadores a despedir pois que já tinha realizado diversos actos de assédio moral (art. 13.º da PI);
                     c) Que o ora Recorrente, devido ao facto supra, sofria de doença denominada burnout e apresentou a respectiva prova documental (art. 12.º da PI);
                     d) Que o A. fora vítima de “Despedimento Colectivo por razões retaliatórias” (art. 7.º da PI).
                      Contudo,
                      O Tribunal não curou de uma única questão suscitada, quiçá, por as considerar prejudicadas pela única questão sobre a qual proferiu sentença.
                      Contudo, salvo o devido respeito, o Tribunal agiu em error juris porquanto violou a al. d), N.º 1, art. 668.º do CPC ao não se pronunciar sobre as questões colocadas pelo Autor. Pois que este alegou ter sido vítima de acção persecutória encoberta por Despedimento Colectivo.
                      E, trouxe ao conhecimento do Tribunal factos que podem muito bem ser qualificados como autêntico assédio moral, maxime, a sua situação de doença (burnout) causada pela Ré, e o seu posterior despedimento e ocupação do posto de trabalho por um outro trabalhador.
                      Em suma, o A. qualificou o Despedimento Colectivo de que foi vítima como sanção por não querer continuar a colaborar em falsas campanhas de promoção que visavam conseguir uma oferta de telemóveis a preços mais baixos, sem o conhecimento da casa-‑mãe!
                      Ora, porque o Tribunal não se pronunciou sobre matéria que lhe foi expressamente apresentada, se requer a V. Excelência se digne pronunciar sobre toda a matéria supra referida nas alíneas a) a d) e, desse modo, dar cumprimento ao dever de julgar.»

 E, na correspectiva alegação do recurso de apelação, o autor explicitou as conclusões que, de imediato, se passam a discriminar:

                     «A. O ora Recorrente alegou ter sido vítima de despedimento-sanção em razão daquele se ter recusado a colaborar em falsas campanhas que visavam permitir à Ré fazer ofertas de telemóveis mais baratos no mercado, sem conhecimento da casa-mãe.
                       B. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre as questões suscitadas pelo ora Recorrente em violação da al. d), N.º 1, art. 668.º do CPC e, assim, meramente se debruçou sobre o Despedimento Colectivo.
                       De qualquer modo,
                       C. Relativamente ao Despedimento Colectivo, o Tribunal a quo incorreu em error juris em razão de ser reconhecido constitucionalmente ao cidadão trabalhador o direito de não querer ser representado por outros colegas de trabalho…
                       Aliás,
                       D. A douta Jurisprudência assim o diz: “Os trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo não estão obrigados a constituir uma comissão representativa para efeitos comunicação e de negociação do despedimento colectivo. Cabe ao empregador efectuar todas as comunicações ou negociações com a comissão representativa de trabalhadores, caso exista, ou directamente com cada um dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo, sob pena de ilicitude do despedimento” (Tribunal da Relação de Lisboa, Acórdão de 13 Jul. 2010, Processo 486/08, realçados nossos).
                       Pelo que,
                       E. “O que se apresenta verdadeiramente essencial ou elementar em termos de comunicações e negociações a efectuar, obrigatoriamente, pelo empregador no âmbito do procedimento a que nos vimos reportando, é que as mesmas sejam dirigidas e tenham por objectivo os próprios trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo….” (Tribunal da Relação de Lisboa, Acórdão de 13 Abr. 2011, Processo 49/11, sublinhado nosso).
                       Ora,
                       F. A Recorrida nunca providenciou a fase das comunicações e negociação porque considerou que às mesmas não estava obrigada…»

 Requereu, a final, que fosse decretada a nulidade da sentença recorrida, por omissão de pronúncia, e a ilicitude do despedimento colectivo, «por incumprimento d[o] dever [de] realizar a fase de comunicações e negociação a que todo o trabalhador tem constitucionalmente direito».

A ré contra-alegou, explicitando a argumentação seguinte:

                   «I.  Começa o Recorrente por invocar a nulidade da sentença proferida nos presentes autos, por entender que a mesma não se pronunciou sobre algumas das questões por si colocadas e, em particular, pelas afirmações relacionadas com a alegação de que o despedimento promovido pela Recorrida foi uma consequência de uma suposta conduta persecutória.
                    II. Antes de mais, cumpre referir que diversas são as alegações do Recorrente que apenas em sede de recurso foram trazidas aos autos. É o caso da suposta ocupação do seu posto de [trabalho] por um outro trabalhador, ou da menção a supostas falsas campanhas de promoção, nas quais, alegadamente, o Recorrido se teria recusado a participar.
                   III. A nulidade da sentença a que faz referência a primeira parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do C.P.C. (o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar) só se verificará em relação a questões que tenham sido invocadas pelas partes nos respectivos articulados (e, mesmo assim, limitadas às que revistam interesse para a decisão da causa) e não a quaisquer outra[s] questões que nunca tendo sido alegadas em momento anterior e que só sejam suscitadas aquando da interposição de recurso, o que é o mesmo que dizer que, relativamente a estes factos, não se verifica qualquer nulidade da sentença.
                   IV. E no que concerne à suposta falta de pronúncia quanto aos alegados factos que suportam, no entender do Recorrente, uma aparente acção persecutória encoberta por Despedimento Colectivo não se poderá deixar de chegar a conclusão semelhante.
                   V.  Desde logo porque a única pretensão formulada pelo Recorrente nos presentes autos foi a que consta do pedido inserido na p.i. e de acordo com o qual o A. peticionava que (…) se requer a V. Excelência se digne considerar ilícito o despedimento colectivo promovido pela Ré em virtude da violação do n.º 1 do artigo 361.º do Código do Trabalho e, consequentemente, (…), sendo certo que, dos factos alegados ao longo da p.i. também não resulta que o Recorrente tenha pretendido que o tribunal se pronuncie sobre esta alegação, nem da mesma retira qualquer consequência.
                   VI. Ora, atendendo a que nunca foi pedido ao Tribunal a quo que apreciasse esta questão, não se verifica qualquer nulidade da sentença por omissão de pronúncia, pelo contrário, nulidade haveria, sim, se o Tribunal, ao decidir sobre o mérito da causa, apreciasse a validade do despedimento do Recorrente em função desta suposta atitude persecutória quando tal não lhe foi pedido pelo mesmo.
               VII.   Para mais, trata-se aqui de uma questão que também não pode ser apreciada em sede de recurso, pois que, como é sabido, os recursos visam modificar decisões recorridas e não criar decisões sobre matéria nova — Ac. do STJ de 15 de Abril de 1993, CJ-STJ Tomo II, pág. 62 e Ac. da Relação de Lisboa, de 2.11.1995, de 2.11.95, CJ, Tomo V, pag. 98.
              VIII.  E, note-se, que ainda que por absurdo se entendesse que o Tribunal deveria ter apreciado esta questão (o que não se concede e por mero dever de patrocínio se equaciona), não se poderia olvidar o facto (que o Recorrente, estranhamente — ou não —, se esquece de referir) de não ter resultado provado qualquer facto que pudesse suportar tão absurda alegação, o que levaria a que a sentença mantivesse a absolvição total da Recorrido.
                 IX.   E, ainda que na absurda hipótese de se considerar que nem mesmo no âmbito da análise dos factos trazidos ao processo, o Tribunal a quo os apreciou como lhe competia, o que também não se admite e por mero dever de patrocínio se equaciona, a composição do litígio nunca poderia passar pela procedência da pretensão do Recorrente.
                  X.   Na verdade, nesta absurda hipótese, ter-se-ia que concluir que houve um conjunto de factos, todos eles relacionados com uma alegada conduta persecutória da Recorrida alicerçada numa situação de assédio moral, que não foi devidamente apreciado e analisado pelo Tribunal a quo.
                 XI.   Mas, não se poderia esquecer que esse conjunto de factos é objecto de uma acção judicial autónoma, proposta pelo Recorrido contra a Recorrente e à qual este faz referência na p.i., mais concretamente, no artigo 9.º, tendo, posteriormente, vindo aos autos esclarecer que essa acção judicial corre termos na 2.ª Secção, do 4.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa, sob o número 3302/11.7TTLSB.
               XII.   Ora, esta acção, que deu entrada, como resulta da própria alegação do Recorrente, antes da propositura dos presentes autos, está numa relação de prejudicialidade com a discussão em causa nestes autos, pois que a alegada atitude persecutória da Recorrente que, no entender do Recorrido, esteve na génese do despedimento do mesmo, se baseia na situação de assédio moral que é discutida no processo judicial identificado nos autos.
             XIII.   Nestes casos, o Tribunal pode (e dir-se-ia mesmo que deve) ordenar a suspensão dos autos — artigo 279.º do C.P.C. — sob pena de a mesma questão de facto e de direito, que numa acção é apreciada a título principal e noutra é decidida a título secundário, ser objecto de decisões diversas, situação que, atenta a enorme insegurança jurídica que acarreta, é de evitar.
              XIV.   Pelo que, a considerar-se que a questão deve ser apreciada em sede de recurso (o que já se viu não ser o caso), sempre se teria que lançar mão do instituto da suspensão da instância previsto no artigo 279.º do C.P.C. e ordenar a suspensão dos presentes autos enquanto não fosse definitivamente decidida a acção onde se discute, a título principal, a eventual ocorrência de uma situação de assédio moral.
               XV.   Dispõe o n.º 1 do artigo 361.º do Código do Trabalho que “Nos cinco dias posteriores à data do acto previsto nos n.os 1 ou 4 do artigo anterior, o empregador promove uma fase de informações e negociação com a estrutura representativa dos trabalhadores (…) (sublinhado e itálico nossos).
              XVI.   Do teor desta disposição legal resulta, pois, que a fase de informações e negociação a que a mesma alude se processa somente entre o empregador e a estrutura representativa dos trabalhadores, não impendendo sobre o empregador qualquer obrigação de promover esta fase negocial directamente com os trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento.
             XVII.  Pelo que, na medida em que não existem na Recorrida estruturas de representação colectiva dos trabalhadores, e uma vez que não foi constituída a comissão a que faz referência o n.º 3 do artigo 360.º do Código do Trabalho, não estava a Recorrente obrigada a promover a fase de informações e negociação.
           XVIII. Pelo que bem andou a sentença recorrida quando considerou que não foi violada qualquer uma das formalidades a que está sujeito o processo de despedimento colectivo.
              XIX.   Mas, ainda que assim se não entenda, o que não se admite e por mero dever de patrocínio se equaciona, e seguindo a linha de raciocínio do Recorrido (bem como do acórdão pelo mesmo citado), sempre seria certo que a Recorrente estaria, apenas, obrigada a levar a cabo uma negociação com cada um dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento, e já não, atenta a falta de estruturas representativas dos trabalhadores, a promover qualquer reunião de negociação.
              XX.    Seguindo-se este entendimento, que não foi seguido pela sentença recorrida (e na perspectiva da Recorrente bem), sempre se teria que apurar se a Recorrente promoveu ou não algum tipo de negociação com os trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento colectivo e, em particular, com o Recorrido.
              XXI.   Ora, o Tribunal a quo não cuidou de verificar se tal tipo de negociação foi ou não levada a cabo, não obstante ter sido alegado pela Recorrente que a mesma se havia realizado quer com o Recorrido quer com os outros trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento colectivo, como decorre dos artigos 33.º, 34.º, 38.º, 40.º e 41.º da contestação.
            XXII.   Ou seja, a Recorrente alegou factos, alguns dos quais se encontram suportados por documentos juntos aos autos que não foram impugnados pelo Recorrido, que lhe permitiam demonstrar que foram encetadas diligências com vista à negociação da questão com todos os trabalhadores abrangidos pelo despedimento em análise.
           XXIII.  Sucede, porém, que o Tribunal a quo não cuidou de apreciar esta questão — atempadamente suscitada pela Recorrente — por ter entendido que a mesma estava prejudicada pela decisão que tomou quanto à obrigatoriedade de a Recorrente ter de levar a cabo a fase de informações e negociação.
           XXIV. Motivo pelo qual, na absurda hipótese de se entender que a sentença recorrida deve ser revogada, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 361.º do Código do Trabalho (o que, novamente se afirma, não se concede e por mero dever de patrocínio se equaciona), não se poderia, de imediato, concluir pela invalidade do despedimento promovido pela Recorrente.
            XXV.   Sendo, antes disso, necessário que o processo descesse à 1.ª instância para se apurar da veracidade dos factos alegados pela Recorrente a este propósito e em conformidade com os mesmos decidir a questão de direito, o que desde já se requer.»
     
O Tribunal da Relação de Lisboa, quanto à pretendida nulidade da sentença recorrida, concluiu que não se verificava «omissão de pronúncia em relação [a] uma pretensão que não foi deduzida, tendo sido, aliás, segundo o Autor, alvo de uma acção autónoma (vide artigos 7.º a 10.º da petição inicial — vide fls. 5)», e que «a questão fulcral a dirimir era a de saber se o despedimento era ou não ilícito, sendo que esta foi dirimida», pelo que julgou improcedente o recurso, neste segmento. Já relativamente à aduzida ilicitude do despedimento colectivo por falta de promoção da fase de informações e negociação, o recurso de apelação foi julgado procedente, sendo a ré condenada «a reintegrar o Autor no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade» e «a pagar ao Autor as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, sem prejuízo das deduções a que alude o n.º 2 do artigo 390.º do CT/2009», considerando-se prejudicada a apreciação da questão invocada pelo autor/recorrente, em sede de recurso de apelação, de «ter sido vítima de acção persecutória encoberta por Despedimento Colectivo», por «se ter recusado a colaborar em falsas campanhas que visavam permitir à Ré fazer ofertas de telemóveis mais baratos no mercado, sem conhecimento da casa-mãe».

É contra esta deliberação que a ré, agora, se insurge, mediante recurso de revista, ao abrigo das conclusões seguintes, tendo a ré arguido a nulidade do acórdão recorrido, expressa e separadamente, no requerimento de interposição do recurso de revista, invocando omissão de pronúncia, ao abrigo do preceituado na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil, na redacção aqui aplicável, conferida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, já que este entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2008, versão a que pertencem os demais preceitos a citar adiante:

                   «I.  De acordo com o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do C.P.C. (aplicável ao acórdão proferido pelo Tribunal da Relação por força do disposto na alínea c) do artigo 722.º do C.P.C.), o acórdão é nulo quando o Tribunal não se pronuncie sobre questões que devesse apreciar.
                    II. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre a ampliação do objecto do recurso oportunamente deduzida pela Recorrente nas suas contra-alegações de recurso de apelação, e no âmbito da qual a Recorrente pretendia que fossem conhecidos (através da remessa dos autos à l.ª instância) um conjunto de factos relacionados com o processo negocial que levou a cabo com o Recorrido, os quais, por si só, seriam suficientes para considerar a presente acção improcedente, mesmo na absurda hipótese de se manter o entendimento sufragado pelo Tribunal a quo.
                   III.          Nos termos conjugados da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º com a alínea c) do artigo 722.º do CPC, o não conhecimento de uma questão que devesse ser apreciada configura uma nulidade, a qual desde já se argui.
                   IV. Dispõe o n.º 1 do artigo 361.º do Código do Trabalho que “Nos cinco dias posteriores à data do acto previsto nos n.os 1 ou 4 do artigo anterior, o empregador promove uma fase de informações e negociação com a estrutura representativa dos trabalhadores (...) (sublinhado e itálico nossos).
                   V.  Do teor desta disposição legal resulta, pois, que a fase de informações e negociação a que a mesma alude se processa somente entre o empregador e a estrutura representativa dos trabalhadores, não impendendo sobre o empregador qualquer obrigação de promover esta fase negocial directamente com os trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento.
                   VI. Pelo que, na medida em que não existem na Recorrente estruturas de representação colectiva dos trabalhadores, e uma vez que não foi constituída a comissão a que faz referência o n.º 3 do artigo 360.º do Código do Trabalho, não estava a Recorrente obrigada a promover a fase de informações e negociação.
               VII.   Por assim não ter entendido, o acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 361.º e 383.º do Código do Trabalho.
              VIII.  Mas, ainda que assim se não entenda, o que não se admite e por mero dever de patrocínio se equaciona, e seguindo a linha de raciocínio do acórdão recorrido, sempre seria certo que a Recorrente estaria, apenas, obrigada a levar a cabo uma negociação com cada um dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento, e já não, atenta a falta de estruturas representativas dos trabalhadores, a promover qualquer reunião de negociação.
                IX.    Seguindo-se este entendimento, que não foi seguido pela sentença proferida nos autos (e na perspectiva da Recorrente bem), sempre se teria que apurar se a Recorrente promoveu ou não algum tipo de negociação com os trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento colectivo e, em particular, com o Recorrido.
                   X.  Ora, o Tribunal a quo não cuidou de verificar se tal tipo de negociação foi ou não levada a cabo, não obstante ter sido alegado pela Recorrente que a mesma se havia realizado quer com o Recorrido quer com os outros trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento colectivo, como decorre dos artigos 33.º, 34.º, 38.º, 40.º e 41.º da contestação.
                   XI. Ou seja, a Recorrente alegou factos, alguns dos quais se encontram suportados por documentos juntos aos autos que não foram impugnados pelo Recorrido, que lhe permitiam demonstrar que foram encetadas diligências com vista à negociação da questão com todos os trabalhadores abrangidos pelo despedimento em análise.
               XII.   Motivo pelo qual, na absurda hipótese de se entender que o acórdão recorrido deve ser mantido (o que, novamente se afirma, não se concede e por mero dever de patrocínio se equaciona), não se poderia, de imediato, concluir pela invalidade do despedimento promovido pela Recorrente.
              XIII.  Sendo, antes disso, necessário que o processo descesse à l.ª instância para se apurar da veracidade dos factos alegados pela Recorrente a este propósito e em conformidade com os mesmos decidir a questão de direito, o que desde já se requer.»

Termina afirmando que «deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, revogando-se o acórdão proferido e substituindo-o por outro que acolha a pretensão da Recorrente, assim se fazendo a tão costumada JUSTIÇA».

O autor não contra-alegou, sendo que o tribunal recorrido apreciou a arguida nulidade do aresto recorrido, conforme o previsto nos conjugados artigos 716.º, 668.º e 670.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, tendo-a suprido nos termos seguintes:

                    «Cumpre, pois, apreciar a verificação da invocada nulidade.
                      E analisado o acórdão em causa constata-se que o mesmo acaba por não aludir (tratar de forma expressa), como devia ter feito a invocada ampliação do objecto do recurso (vide artigo 684.º-A do CPC).
                      E, efectivamente, tal ampliação mostra-se referida em sede de conclusões das contra- ‑alegações.
                      Como tal, como bem refere a recorrente, a questão em apreço devia ter sido expressamente tratada no acórdão, sendo que o não foi.
                      Todavia também, agora, se constata que o particular em apreço (de ampliação do recurso) redunda (consubstancia), em bom rigor, uma implícita impugnação da matéria de facto.
                      Porém, nesse particular a então recorrida (agora recorrente) não observou, como se lhe impunha, o disposto no n.º 1 do artigo 685.º-B do CPC, sendo que o devia ter feito como decorre do n.º 5 dessa mesma norma.
                      Assim, por tal motivo sempre se nos afigura que não cumpriria, nem cumpre, levar a cabo tal apreciação.
                      E nem se esgrima com o ponto n.º 53 das contra-alegações, visto que ali o que se fez foi uma alusão genérica a matéria alegada em sede de contestação, bem como a documentos.
                      Daí que não se afigure ser de aplicar, ao caso concreto, o disposto no n.º do artigo 684.º-A do CPC, [ordenando], pois, a baixa dos autos para o apuramento dessa matéria.»

Notificada do acórdão que supriu a nulidade invocada em sede de recurso de revista, a ré veio alargar o âmbito do recurso de revista por si interposto, ao abrigo do estipulado nos combinados artigos 670.º, n.º 3, e 716.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, formulando as proposições conclusivas seguintes:

                 «I.    A sentença proferida pelo Tribunal de l.ª instância considerou (e bem) que, não existindo na Recorrente estruturas de representação colectiva dos trabalhadores (tais como, comissões de trabalhadores, comissões sindicais ou comissões intersindicais) e não tendo sido constituída a comissão ad hoc a que alude o n.º 3 do artigo [360.º] do Código do Trabalho, a Recorrente não estava obrigada a promover a fase de informações e negociação regulada no artigo 361.º do Código do Trabalho.
                     II.      Por seu turno, o Tribunal da Relação de Lisboa perfilhou entendimento diverso, concluindo pela obrigatoriedade de promoção da fase de informações e negociação independentemente da existência (ou não) de estruturas de representação colectiva dos trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento colectivo.
                   III.       Não podendo, nem querendo, conformar-se com esta decisão, dela recorreu a Recorrente, através de recurso interposto em 9 de Novembro de 2012, no qual requereu a modificação do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa e a sua substituição por outro que siga o entendimento do Tribunal da l.ª instância (o qual, aliás, foi recentemente perfilhado pelo Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão proferido em 19 de Dezembro de 2012).
                   IV. No entanto, para a absurda eventualidade de se entender que a Recorrente, não obstante não haver estruturas representativas dos trabalhadores, sempre teria de ter promovido uma fase de negociações com os trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento colectivo, a Recorrente, na sua contestação, alegou um conjunto de factos que, caso viessem a ser discutidos em sede de audiência de discussão e julgamento, permitiriam concluir que, apesar de a tanto não estar obrigada, a Recorrente, efectivamente, promoveu uma fase negocial com o Recorrido.
                   V.  Ora, o Tribunal de l.ª instância não cuidou de verificar se tal tipo de negociação foi ou não levada a cabo, dado que, tendo decidido que a Recorrente não estava obrigada a promover a fase de negociações, considerou prejudicada a tomada de qualquer decisão de facto sobre a veracidade do que havia sido alegado pela Recorrente a este propósito.
                   VI. Por este motivo, aquando da apresentação das suas contra-alegações em juízo, a Recorrente ampliou o objecto do recurso, invocando que, caso este fosse procedente, sempre teria o processo de baixar à l.ª instância para apurar da existência ou não de uma fase de negociações promovida directamente junto do Recorrido.
               VII.   O Tribunal a quo, no acórdão em conferência proferido recentemente, entendeu que a Recorrente estava implicitamente a recorrer da matéria de facto e, consequentemente, uma vez que não cumpriu o disposto no n.º 1 do artigo 685.º-B do C.P.C., indeferiu a pretensão da Recorrente.
              VIII.  Ora, para que a Recorrente pudesse recorrer da matéria de facto, cumprindo o disposto no n.º 1 do artigo 685.º-B do C.P.C., seria necessário que os factos por si alegados em sede de contestação tivessem sido objecto de produção de prova, o que não sucedeu.
                 XI.   E, assim, a seguir-se o entendimento do acórdão recorrido, e dado que os factos em questão não foram objecto de produção de prova, a decisão a tomar pelo Tribunal de recurso não configuraria uma reapreciação da questão, mas, sim, uma verdadeira nova decisão.
                 X. Ora, não tendo o Tribunal de 1.ª instância emitido qualquer juízo, de provado ou não provado, quanto aos factos constitutivos do direito invocado pela Recorrente, não era possível ao Tribunal de recurso exercer o poder censório não só quanto à própria matéria de facto provada, como também sobre o direito aplicado e aplicável.
                XI.    Devendo o mesmo, em consequência, remeter o processo à l.ª instância para julgamento dos factos referidos pela Recorrente na contestação.
               XII.   Por assim não ter entendido, o Tribunal a quo violou o disposto no n.º 4 do artigo 712.º, bem como o artigo 685.º-B, ambos do C.P.C.»

Neste Supremo Tribunal, no exame preliminar do processo e prevenindo o eventual conhecimento da questão que o Tribunal da Relação de Lisboa deixou de apreciar por a ter considerado prejudicada pela solução dada ao litígio, conforme resulta do disposto no n.º 2 do artigo 715.º do Código de Processo Civil, aplicável ao recurso de revista nos termos do artigo 726.º do mesmo Código, foi determinada a notificação das partes para que se pronunciassem, querendo, no prazo de dez dias, sobre a mencionada questão, ao abrigo do preceituado no n.º 3 do artigo 715.º citado.

O autor reportou a sua pronúncia à pretensa nulidade do acórdão recorrido arguida pela ré, tendo concluído que o recurso de revista interposto, neste segmento, improcedia, em virtude de não ter cumprido o ónus processual imposto pelo n.º 1 do artigo 685.º-B do Código de Processo Civil.

A ré, por sua vez, aludindo à questão que o Tribunal da Relação de Lisboa considerou prejudicada pela solução dada ao litígio e que relacionou com a suposta qualificação do despedimento colectivo efectivado «como um despedimento sanção, alicerçado numa alegada (e infundada) conduta susceptível de ser subsumível na noção de assédio moral», concluiu que aquela questão, posta pelo autor na respectiva alegação do recurso de apelação, não deve ser conhecida, «em virtude de se tratar de uma questão nunca antes trazida aos autos», e, mesmo que assim se não entendesse, «deve considerar-se tal questão improcedente e, em consequência, declarar-se lícito o despedimento do A. promovido pela Ré», tendo, outrossim, propugnado a suspensão da instância, estatuída no artigo 279.º do Código de Processo Civil, «enquanto não fosse definitivamente decidida a acção onde se discute, a título principal, a eventual ocorrência de uma situação de assédio moral», concretamente, a acção a que se refere o Processo n.º 3302/11.7TTLSB, que correu termos na 2.ª Secção do 4.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa e no qual «foi já proferida sentença que absolveu integralmente a Ré do pedido, decisão essa que se encontra em fase de recurso».

Subsequentemente, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta emitiu parecer, nos termos do n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho, tendo sustentado que os autos deviam «baixar à 1.ª instância a fim de que se “proceda ao julgamento dos factos” referidos pela Ré, na sua contestação, conforme reclamado por esta, subsidiariamente, na parte alargada da sua Revista, nos termos do Art. 729.º, n.º 3, do CPC, a fim de que, provados que sejam, permitam uma decisão mais justa do pleito», termos em que devia «merecer provimento o pedido subsidiário constante do recurso de Revista alargada da Ré», parecer que, notificado às partes, não suscitou resposta.

3. No caso vertente, as questões suscitadas são as que se passam a enunciar, segundo a ordem lógica que entre as mesmas intercede:

                Se o despedimento colectivo operado não é ilícito por falta de promoção da fase de informações e negociação prevista no artigo 361.º do Código do Trabalho (conclusões IV a VII da alegação do recurso de revista);
                No caso de improcederem as conclusões IV a VII da alegação do recurso de revista, se o processo deve ser remetido ao tribunal de 1.ª instância para julgamento dos factos alegados nos artigos 33.º, 34.º, 38.º, 40.º e 41.º da contestação, de acordo com os quais teria sido desenvolvida uma fase de negociação com os trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo (conclusões do alargamento do âmbito do recurso de revista);
                No caso de improcederem as conclusões IV a VII da alegação do recurso de revista, se deve ser ampliada a matéria de facto (conclusões VIII a XIII da alegação do recurso de revista);
                Caso procedam as conclusões IV a VII da alegação do recurso de revista, se o despedimento colectivo operado configura um despedimento-sanção, motivado por o autor «se ter recusado a colaborar em falsas campanhas que visavam permitir à Ré fazer ofertas de telemóveis mais baratos no mercado, sem conhecimento da casa-mãe» (conclusão A. da alegação do recurso de apelação do autor).

Refira-se que o tribunal recorrido supriu a nulidade do acórdão invocada no recurso de revista, logo não há que apreciar as conclusões I a III da atinente alegação.

Corridos os «vistos», cumpre decidir.

                                               II

1. O tribunal recorrido deu como assente a seguinte matéria de facto:
1) O autor começou a trabalhar para a ré em 21 de Julho de 2004;
2) A relação laboral entre a ré e o autor terminou em 30 de Dezembro de 2011, no âmbito de um despedimento colectivo, por virtude da seguinte decisão:
                    «Exmo. Senhor
                      AA
                      Av. …., …, ...º ..o.
                      …-… Lisboa
                      Assunto: Processo de Despedimento Colectivo/Decisão final
                      Exmo. Senhor,
                      Em 21 de Outubro de 2011, a BB, S. A. (BB), remeteu-lhe a documentação final do processo de despedimento colectivo, iniciado no dia 23 de Setembro do corrente, nos termos do qual foi decidido fazer cessar a relação laboral entre nós existente.
                      A referida comunicação foi enviada para a residência que indicou à BB e que consta dos respectivos ficheiros, tendo, porém, sido devolvida pelos CTT, em virtude de a entrega da mesma não se ter revelado possível.
                      Uma vez que a falta de recepção da documentação final do processo de despedimento colectivo, e, em particular, da decisão de fazer terminar o contrato de trabalho que celebrou com esta empresa, não lhe foi entregue por motivos que lhe são totalmente imputáveis, entende-se, nos termos legais, que se considera notificado dos documentos em questão, e, em especial, da decisão tomada pela BB, na data em que os CTT tentaram proceder à sua entrega, ou seja, no dia 25 de Outubro de 2011.
                      Sem prejuízo do exposto, a BB decidiu fazer uma nova tentativa de entrega dos documentos aqui em causa, cuja cópia se anexa à presente missiva, e, simultaneamente, alargar o prazo de aviso prévio que está obrigada a conceder-lhe, pelo período de 6 (seis) dias. Naturalmente que, por força deste facto, os valores que lhe são devidos em virtude da cessação do contrato de trabalho, e que constavam da comunicação que lhe foi enviada no dia 21 de Outubro do corrente, que celebrou connosco foram recalculados.
                      Deste modo, em completo [será, «complemento»] dos elementos constantes da decisão final (cuja cópia, repete-se, se anexa à presente missiva apesar de se considerar que já foi por si recebida), informamos que o contrato de trabalho que celebrou connosco termina no dia 30 de Dezembro de 2011 data em que se completam os 60 (sessenta) dias de aviso prévio que estamos obrigados a conceder-lhe, acrescidos do alargamento de tal prazo mencionado no parágrafo anterior.
                      Como adiantado, por força deste facto, procedemos a um novo cálculo dos valores que lhe são devidos por força da cessação do contrato de trabalho, os quais ascenderão, assim, a € 22.859,73 (vinte e dois mil oitocentos e cinquenta e nove euros e setenta e três euros — será «cêntimos») dos quais € 16.859,35 (dezasseis mil oitocentos e cinquenta e nove euros e trinta e cinco cêntimos) correspondem à compensação que lhe é legalmente devida, € 3.737,38 (três mil setecentos e trinta e sete euros e trinta e oito cêntimos) aos créditos laborais emergentes da cessação, e € 2.263,00 (dois mil duzentos e sessenta e três euros) à retribuição do mês de cessação do contrato.
                      O valor referido no parágrafo anterior será pago na data anteriormente indicada, ou seja, no dia 23 de Dezembro de 2011.
                      Com os melhores cumprimentos,
                      […]
                      Pela BB, S. A.»
3) No dia 23 de Setembro de 2011, a ré comunicou a 12 trabalhadores, entre os quais o autor, a sua intenção de levar a cabo um processo de despedimento colectivo;
4) Juntamente com tal comunicação, a ré entregou ao autor um documento contendo a descrição dos motivos que estavam na base do processo de despedimento colectivo ora posto em causa, o quadro de pessoal, um documento indicando quais os critérios de base para a selecção dos trabalhadores a despedir, um documento indicando quais os trabalhadores abrangidos pelo despedimento e respectivas categorias, um documento informando-o de qual o período de tempo em que se pretendia efectuar o despedimento e um documento indicando qual o método de cálculo da compensação a pagar aos trabalhadores;
5) No mesmo dia, a ré enviou à Direcção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho os documentos referidos no n.º 2 do artigo 360.º do Código do Trabalho;
6) No dia 21 de Outubro de 2011, a ré enviou, para a morada do autor, uma comunicação onde o informava da sua intenção de proceder ao seu despedimento, bem como dos motivos de tal despedimento, da data em que o mesmo ocorreria, e ainda do valor, data e forma de pagamento da compensação a que tinha direito em virtude do despedimento de que tinha sido alvo;
7) Tal carta, porém, não foi recebida pelo autor, porquanto, alegadamente, este havia mudado de residência;
8) Motivo pelo qual, no dia 27 de Outubro de 2011, a ré enviou nova missiva ao autor, reiterando o que já lhe havia comunicado em 21 de Outubro de 2011;
9) Por carta recebida pela ré no dia 29 de Dezembro de 2011, o autor comunicou-lhe que não aceitava o seu despedimento e, consequentemente, informou que iria proceder à devolução da compensação que já lhe havia sido paga;
           10) Como resulta dos fundamentos do processo de despedimento colectivo em causa nos presentes autos, o despedimento do autor baseou-se nos seguintes factos:
a) A ré é uma sociedade comercial anónima que se dedica à comercialização de equipamentos eléctricos e electrónicos;
b) A ré é integralmente detida pela sociedade CC (B...), a qual, por seu turno, reporta à casa-mãe na C...;
c) Actualmente, a ré encontra-se dividida em 4 grandes áreas: DD; EE; FF;
d) As áreas de DD e de EE desenvolvem actividades directamente relacionadas com o objecto social da ré, ao contrário das áreas de FF que correspondem a áreas de apoio, cuja actividade é transversal a toda a sociedade, dado tratar-se de áreas que não estão directamente relacionadas com a comercialização de equipamentos eléctricos e electrónicos;
e) Por seu turno, cada uma das áreas referidas está dividida em departamentos ou unidades, organizados, no que concerne às áreas operacionais, de acordo com o tipo de produto que se pretende comercializar, e, no que respeita às áreas de apoio, em função do tipo de actividade a desenvolver;
f) A estrutura organizativa da ré está pensada para, por um lado, fazer face às necessidades de trabalho associadas à venda de produtos eléctricos e electrónicos e, por outro, para potenciar o crescimento da empresa, fomentando a sua inserção e implementação no mercado em que esta actua;
g) A actual situação económica que se vive no país tem vindo a reflectir-se na actividade comercial da ré, que sofreu uma contracção significativa, traduzida já numa redução de cerca de 28% do seu volume de vendas;
h) Com efeito, se, em 2010, o volume de vendas da sociedade atingiu os € 178.000,00 (cento e setenta e oito mil euros), os primeiros oito meses de 2011 revelam uma diminuição significativa da actividade da empresa, constatando-se que, até ao final de Agosto, o volume de vendas atingiu apenas € 89.000,00 (oitenta e nove mil euros);
i) Esta tendência decrescente do volume de vendas da sociedade manter-se-‑á, certamente, não só até ao final do corrente ano, mas no decurso do próximo ano;
j) Na verdade, não pode esquecer-se que, na sequência do denominado Memorando da Troika, quer as medidas que já foram implementadas, quer as que serão adoptadas num futuro próximo, têm reflexos significativos na actividade desenvolvida pela ré (sendo as mais significativas as que se traduziram nas reduções salariais e no aumento de impostos);
k) Com efeito, a ré dedica-se ao comércio por grosso de produtos eléctricos e electrónicos, estando as suas vendas, natural e evidentemente, dependentes da capacidade de compra do consumidor final desses mesmos produtos que, na maioria das situações, é uma pessoa individual que procura os produtos da ré nas diversas unidades de comércio a retalho que constituem os clientes da empresa;
l) Deste modo, pese embora a ré não se dedique ao comércio por retalho, a redução do poder de compra dos consumidores — sejam estes pessoas individuais ou colectivas — tem um reflexo directo no volume de vendas dos seus produtos, dado que implicam uma diminuição acentuada das encomendas feitas pelos seus clientes (os quais, sim, desenvolvem a actividade de comércio a retalho) e das vendas subsequentes;
m) Ora, não só o poder de compra dos consumidores do mercado nacional tem vindo a diminuir (como se atesta pela redução do volume de vendas verificada nos primeiros oito meses do ano), como tal tendência decrescente se irá, certamente, acentuar;
n) Com efeito, o anunciado aumento do IVA na água e na electricidade associado a outras medidas de natureza fiscal, implicará, certamente, uma redução acentuada do consumo, a qual, por seu turno, terá reflexos francamente negativos no desenvolvimento da actividade da ré;
o) Assim, prevê-se que, no final de 2011, o volume de vendas da ré seja de apenas € 129.000,00 (cento e vinte e nove mil euros), ou seja, menos 28% do que no ano transacto;
p) Note-se que este decréscimo no volume de vendas da empresa é particularmente significativo e relevante quando analisado em comparação com a evolução do mesmo nos anos anteriores a 2010;
q) Na verdade, desde a data da sua constituição, que a ré tem conseguido aumentar o volume de vendas, o qual apresenta sempre uma tendência crescente. Se é certo que, em parte, esta evolução positiva é uma simples decorrência da constituição da empresa, em boa medida tal tendência crescente demonstra uma capacidade de implementação da marca no mercado português e um aumento de quota de mercado;
r) Deste modo, a circunstância de não só o volume de vendas ter decrescido, mas de tal decréscimo ser superior a 25% é particularmente preocupante, pois demonstra que a marca esgotou a sua capacidade de crescimento, estando já suficientemente implementada no mercado;
s) Por outro lado, os próprios resultados líquidos da sociedade não são de molde a permitir colmatar esta redução acentuada da actividade da empresa;
t) Assim, se, em 2009, a ré apresentou um resultado líquido positivo de € 2.496.892 (dois milhões, quatrocentos e noventa e seis mil, oitocentos e noventa e dois euros), em 2010, os resultados sofreram uma quebra abrupta, apresentando a empresa prejuízos de € 2.254.169 (dois milhões, duzentos e cinquenta e quatro mil, cento e sessenta e nove euros);
u) E, naturalmente, face ao volume de vendas da sociedade até ao mês de Agosto, não é expectável, nem previsível, que os resultados do exercício de 2011 sejam positivos (tanto assim é que, neste momento, os resultados do exercício têm uma expressão negativa de € 6.076.000,00);
v) Para mais, não pode esquecer-se que, até 2009, a ré apresentou sempre resultados negativos, os quais mais não eram do que uma decorrência inevitável de se tratar de uma empresa ainda em fase de implementação no mercado português, o que facilmente se atesta pela redução desses valores negativos ao longo dos anos;
w) Passado esse período de implementação e consolidação da actividade da empresa, em 2009, esta conseguiu começar a ter resultados líquidos positivos. Porém, logo no ano seguinte (2010), os resultados voltam a ser negativos e a ter uma expressão que consome os lucros do único ano em que a empresa conseguiu ter resultados positivos;
x) A estrutura interna da ré, mais concretamente no que concerne aos recursos humanos, foi pensada e construída com base numa tendência sempre crescente da actividade da empresa, de modo a permitir quer a manutenção da mesma, quer, acima de tudo, a continuidade deste crescimento e consolidação de actividade;
y) Deste modo, perante uma redução acentuada do volume de vendas, e atendendo à circunstância de a fase de crescimento, consolidação e implementação no mercado ter terminado, a ré viu-se forçada a adequar a sua estrutura organizativa à realidade do mercado em que se insere;
z) Com efeito, considerando as sãs práticas de eficiência na gestão e alocação dos recursos humanos que devem fatalmente reger qualquer organização produtiva, principalmente numa altura em que o País e a Europa vivem, há vários anos consecutivos, uma conjuntura recessiva, de fraco crescimento económico, a ré terá, necessariamente, de eliminar do seu tecido produtivo todas as situações de duplicação, inutilidade ou ineficiência de funções;
aa) O departamento de Marketing é constituído por duas secções: a secção de M... e a secção de I…, cada uma das quais inclui um cargo de chefia intermédia que reporta ao Director de Marketing;
bb) A secção de I… integra cinco postos de trabalho: um posto de R…P.L., dois postos de trabalho de M… (BU Marketing), um posto de trabalho de B… e um posto de trabalho de M…;
cc) Cada um dos postos de trabalho de M…  (BU Marketing) está adstrito a uma concreta área de negócio da ré, de modo a assegurar uma correcta e eficaz interligação entre a área comercial (vendas) e as actividades de marketing que lhe estão associadas. Assim, um destes postos desempenha as suas funções no âmbito da área de HA (electrodomésticos) e o outro no domínio de HE (aparelhos de alta fidelidade);
dd) Os postos de trabalho de M... e o posto de B… reportam ao … P.L., o qual, por seu turno, reporta ao Director de Marketing;
ee) O departamento inclui ainda dois outros postos de trabalho de M..., cada um adstrito a uma concreta área de negócio: MC (telemóveis) e IS (produtos informáticos). O M... da área de MC tem sob a sua alçada um M…. Estes dois postos de trabalho reportam hierarquicamente ao Director de Marketing e funcionalmente ao Director de Vendas;
ff) A estratégia de redução de custos seguida pela ré conjuntamente com a presente reestruturação implica, entre outras matérias, uma redução significativa dos montantes gastos anualmente com a área de Marketing, o que, por seu turno, tem consequências imediatas no volume de trabalho a que é preciso fazer face;
gg) Por outro lado, a acentuada redução do volume de vendas, que incide particularmente sobre a unidade de MC (relembra-se que a quebra de vendas nesta unidade atingiu 48%), associada à dificuldade de penetrar neste mercado, fez com que a Ré decidisse reduzir as actividades de marketing relativamente a esta área de negócio;
hh) Destes dois factos decorre, naturalmente, uma redução significativa das tarefas que serão levadas a cabo na área do Marketing, e, em particular, na sua ligação com a unidade de MC, o que origina a necessidade de adaptar a estrutura existente às funções que continuarão a ser desempenhadas;
ii) Assim, desde logo, como a redução do volume de trabalho se verifica, essencialmente, na área de MC, decidiu-se extinguir o posto de trabalho de M... adstrito a esta unidade;
jj) Para mais, optou-se por eliminar a actual associação de cada posto de trabalho de M... a uma unidade de negócio específica, passando os remanescentes postos de trabalho de M... a exercer as suas funções para todas as unidades de negócio da Ré;
kk) Exceptua-se, apenas, desta nova forma de organização as funções de Marketing da Unidade de AE, que continuarão inalteradas;
ll) Assim, o Departamento de Marketing passará a integrar, apenas, dois postos de trabalho de M... contra os quatro actualmente existentes. Um dos postos de trabalho extinto é, naturalmente, o posto adstrito à unidade de IS, visto não se encontrar ocupado por nenhum trabalhador;
mm) O outro posto de trabalho extinto será, como já referido, o posto de M… alocado à Unidade de MC, por se tratar da unidade de negócio da ré que apresenta uma maior e mais significativa redução de actividade;
11) Na ré, não existem comissões de trabalhadores, comissões intersindicais ou comissões sindicais;
12) Os trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento colectivo em análise nos presentes autos não constituíram a comissão representativa a que faz referência o n.º 3 do artigo 360.º do Código do Trabalho.

Eis os factos materiais a atender para resolver as questões postas no recurso.

2. A recorrente alega que do estatuído no n.º 1 do artigo 361.º do Código do Trabalho resulta que a fase de informações e negociação se processa apenas entre o empregador e a estrutura representativa dos trabalhadores, não impendendo sobre o empregador qualquer obrigação de promover esta fase negocial directamente com os trabalhadores abrangidos pelo procedimento de despedimento colectivo, donde, «na medida em que não existem na Recorrente estruturas de representação colectiva dos trabalhadores, e uma vez que não foi constituída a comissão a que faz referência o n.º 3 do artigo 360.º do Código do Trabalho, não estava a Recorrente obrigada a promover a fase de informações e negociação».

A sentença do tribunal de primeira instância, tal como já se referiu, entendeu que, não existindo comissão de trabalhadores, comissão intersindical ou comissão sindical de empresa representativa dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo, nos quais se inclui o autor, «a entidade patronal não estava obrigada a dar cumprimento à disposição legal que no caso presente foi invocada por parte do trabalhador como tendo sido desrespeitada ou incumprida pela ré», pelo que não se verificava a ilicitude prevista no artigo 383.º, alínea a), do Código de Trabalho.

Diversamente, o acórdão recorrido considerou que, no caso, a preterição da fase de informações e negociação determinava a ilicitude do despedimento colectivo, «até por violação — que não se afigura justificada — do princípio da igualdade», com as consequências previstas nos artigos 389.º e seguintes do Código do Trabalho.

2.1. Os artigos 359.º a 366.º do Código do Trabalho de 2009 estabelecem o regime jurídico do despedimento colectivo aplicável no caso, porque o despedimento ocorreu no dia 30 de Dezembro de 2011, isto é, em data posterior à entrada em vigor daquele Código do Trabalho, que se verificou em 17 de Fevereiro de 2009.

A noção de despedimento colectivo acha-se explicitada no artigo 359.º do Código do Trabalho de 2009, diploma a que pertencem os demais preceitos a citar adiante, sem menção da origem, de acordo com o qual «[c]onsidera-se despedimento colectivo a cessação de contratos de trabalho promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate, respectivamente, de microempresa ou de pequena empresa, por um lado, ou de média ou grande empresa, por outro, sempre que aquela ocorrência se fundamente em encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou redução do número de trabalhadores determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos».

O despedimento colectivo caracteriza-se, deste modo, pela cessação de uma pluralidade de contratos de trabalho promovida pelo empregador num dado período, simultânea ou sucessivamente, que se fundamente em (i) encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou (ii) redução do número de trabalhadores determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos.

Por conseguinte, no despedimento colectivo, os fundamentos da cessação de contratos de trabalho respeitam à empresa, relevam do conjunto de circunstâncias ou condições em que se desenvolve a actividade da própria organização produtiva, e são de natureza essencialmente económica, podendo estar relacionados com a estrutura empresarial, as alterações tecnológicas ou a evolução das tendências do mercado.

A densificação desses fundamentos é operada nas alíneas do n.º 2 do artigo 359.º, em que são considerados, nomeadamente: a) motivos de mercado – a redução da actividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens ou serviços ou impossibilidade superveniente, prática ou legal, de colocar esses bens ou serviços no mercado; b) motivos estruturais – o desequilíbrio económico-‑financeiro, mudança de actividade, reestruturação da organização produtiva ou substituição de produtos dominantes; c) motivos tecnológicos – as alterações nas técnicas ou processos de fabrico, automatização dos instrumentos de produção, de controlo ou de movimentação de cargas, bem como informatização de serviços ou automatização de meios de comunicação.

A tramitação a adoptar para promover um despedimento colectivo figura nos artigos 360.º a 363.º e inicia-se com a comunicação da intenção de proceder ao despedimento (artigo 360.º), seguindo-se a fase de informações e negociação (artigos 361.º e 362.º) e a fase decisória do despedimento (artigo 363.º).

Os direitos dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo são enunciados nos artigos 364.º a 366.º, especificamente, o direito a utilizar, durante o prazo de aviso prévio, «um crédito de horas correspondente a dois dias de trabalho por semana, sem prejuízo da retribuição» (artigo 364.º, n.º 1), o direito de denunciar o contrato de trabalho, durante o prazo de aviso prévio (artigo 365.º) e o direito a receber uma compensação (artigo 366.º).

Refira-se que, nos termos do artigo 381.º, «[s]em prejuízo do disposto nos artigos seguintes ou em legislação específica, o despedimento por iniciativa do empregador é ilícito», (a) se for devido a motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos, ainda que com invocação de motivo diverso, (b) se o motivo justificativo do despedimento for declarado improcedente, (c) se não for precedido do respectivo procedimento, (d) em caso de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante ou de trabalhador durante o gozo de licença parental inicial, em qualquer das suas modalidades, se não for solicitado o parecer prévio da entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, e, também, que, nos termos do artigo 383.º, o despedimento colectivo é ilícito se o empregador não tiver (a) feito a comunicação prevista nos n.os 1 ou 4 do artigo 360.º ou promovido a negociação prevista no n.º 1 do artigo 361.º, (b) observado o prazo para decidir o despedimento, referido no n.º 1 do artigo 363.º, (c) posto à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 366.º e os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho, sem prejuízo do disposto na parte final do n.º 4 (será do n.º 5) do  artigo 363.º

No caso, questiona-se se foi observado o estatuído no artigo 361.º quanto à promoção de uma fase de informações e negociação do despedimento colectivo.

O artigo 360.º, com a epígrafe «Comunicações em caso de despedimento colectivo», estabelece que o empregador que pretenda proceder a um despedimento colectivo comunica essa intenção, por escrito, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ou às comissões sindicais da empresa representativas dos trabalhadores a abranger (n.º 1), devendo constar da referida comunicação, (a) os motivos invocados para o despedimento colectivo, (b) o quadro de pessoal, discriminado por sectores organizacionais da empresa, (c) os critérios para selecção dos trabalhadores a despedir, (d) o número de trabalhadores a despedir e as categorias profissionais abrangidas, (e) o período de tempo no decurso do qual se pretende efectuar o despedimento, e (f) o método de cálculo de compensação a conceder genericamente aos trabalhadores a despedir, se for caso disso, sem prejuízo da compensação estabelecida no artigo 366.º ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho (n.º 2), sendo que, na falta das entidades referidas no n.º 1, «o empregador comunica a intenção de proceder ao despedimento, por escrito, a cada um dos trabalhadores que possam ser abrangidos, os quais podem designar, de entre eles, no prazo de cinco dias úteis a contar da recepção da comunicação, uma comissão representativa, com o máximo de três ou cinco elementos consoante o despedimento abranja até cinco ou mais trabalhadores» (n.º 3) e remete à comissão aludida no n.º 3 «os elementos de informação discriminados no n.º 2» (n.º 4).

Mais determina o artigo 360.º que o empregador, na data em que procede à comunicação prevista no n.º 1 ou no n.º 4, «envia cópia da mesma ao serviço do ministério responsável pela área laboral com competência para o acompanhamento e fomento da contratação colectiva» (n.º 5).

Por sua vez o artigo 361.º, intitulado «Informações e negociação em caso de despedimento colectivo», reza que, nos cinco dias posteriores à data do acto previsto nos n.os 1 ou 4 do artigo 360.º, «o empregador promove uma fase de informações e negociação com a estrutura representativa dos trabalhadores, com vista a um acordo sobre a dimensão e efeitos das medidas a aplicar e, bem assim, de outras medidas que reduzam o número de trabalhadores a despedir, designadamente, (a) suspensão de contratos de trabalho, (b) redução de períodos normais de trabalho, (c) reconversão ou reclassificação profissional e (d) reforma antecipada ou pré-reforma (n.º 1), podendo o empregador e a estrutura representativa dos trabalhadores fazer-se assistir cada qual por um perito nas reuniões de negociação (n.º 4) e devendo ser elaborada acta das reuniões de negociação, contendo a matéria acordada, bem como as posições divergentes das partes e as opiniões, sugestões e propostas de cada uma (n.º 5).

Enfim, o artigo 362.º, subordinado à epígrafe «Intervenção do ministério responsável pela área laboral», comanda que «[o] serviço competente do ministério responsável pela área laboral participa na negociação prevista no artigo anterior, com vista a promover a regularidade da sua instrução substantiva e procedimental e a conciliação dos interesses das partes» (n.º 1), que o referido serviço, «caso exista irregularidade da instrução substantiva e procedimental, deve advertir o empregador e, se a mesma persistir, deve fazer constar essa menção da acta das reuniões de negociação» (n.º 2) e que, a pedido de qualquer das partes ou por iniciativa daquele serviço, «os serviços regionais do emprego e da formação profissional e da segurança social indicam as medidas a aplicar, nas respectivas áreas, de acordo com o enquadramento legal das soluções que sejam adoptadas».

2.2. Decorre do exposto que a solução do problema submetido à apreciação deste Supremo Tribunal passa, necessária e fundamentalmente, pela interpretação do preceituado nos conjugados artigos 360.º, n.os 1 a 4, 361.º, n.º 1, e 383.º, alínea a).

Este Supremo Tribunal, em acórdão de 19 de Dezembro de 2012, proferido no Processo n.º 1222/10.1TTVNG-A.P1.S1, da 4.ª Secção, apreciou questão idêntica, tendo, a propósito, explicitado a fundamentação seguinte:

                  «Em matéria de interpretação das leis, o artigo 9.º do Código Civil consagra os princípios a que deve obedecer o intérprete ao empreender essa tarefa, começando por estabelecer que “[a] interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada” (n.º 1); o enunciado linguístico da lei é, assim, o ponto de partida de toda a interpretação, mas exerce, igualmente, a função de um limite, já que não pode “ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” (n.º 2); além disso, “[n]a fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” (n.º 3).
                      Sucede que do texto das sobreditas normas [os referidos artigos 360.º, n.os 1 a 4, 361.º, n.º 1, e 383.º, alínea a)] não se extrai qualquer elemento interpretativo no sentido de que o empregador, na falta de comissão de trabalhadores, comissão intersindical ou comissões sindicais, e comissão ad hoc representativa dos trabalhadores, deve enviar a cada um dos trabalhadores a abranger no despedimento as informações complementares a que alude o n.º 2 do artigo 360.º, nem sequer a lei inclui a não comunicação daquelas informações aos trabalhadores entre as causas de ilicitude do despedimento colectivo (artigo 383.º).
                      Na verdade, segundo o artigo 360.º, o empregador que pretenda proceder a um despedimento colectivo comunica essa intenção, por escrito, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ou às comissões sindicais da empresa representativas dos trabalhadores a abranger (n.º 1), comunicação que deve ser acompanhada de informação relativa aos elementos constantes do n.º 2 do artigo 360.º, e, em simultâneo, deverá enviar cópia da mesma comunicação ao serviço do ministério responsável pela área laboral com competência para o acompanhamento e fomento da contratação colectiva (n.º 5), e, na falta das entidades aludidas naquele n.º 1, “o empregador comunica a intenção de proceder ao despedimento, por escrito, a cada um dos trabalhadores que possam ser abrangidos, os quais podem designar, de entre eles, no prazo de cinco dias úteis a contar da recepção da comunicação, uma comissão representativa, com o máximo de três ou cinco elementos consoante o despedimento abranja até cinco ou mais trabalhadores” (n.º 3), devendo, neste caso, enviar à comissão ad hoc representativa dos trabalhadores e ao serviço do pertinente ministério “os elementos de informação discriminados no n.º 2” (n.os 4 e 5).
                      E, neste conspecto, a alínea a) do artigo 383.º só determina a ilicitude do despedimento colectivo quando o empregador não tiver feito a comunicação prevista nos n.os 1 ou 4 do artigo 360.º, não incluindo entre as causas específicas de ilicitude do despedimento o caso do empregador não proceder ao envio das informações a que se reporta o n.º 2 do artigo 360.º aos trabalhadores, seja com a comunicação inicial, seja no caso dos trabalhadores não designarem uma comissão ad hoc representativa.
                      Ora, não pode ser considerado pelo intérprete um sentido que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, devendo ainda presumir-se que o legislador soube expressar o seu pensamento em termos adequados e que consagrou as soluções mais acertadas, como referem os n.os 2 e 3 do artigo 9.º do Código Civil.
                      Tudo para concluir que, na falta de comissão de trabalhadores, comissão intersindical ou comissões sindicais, a circunstância do empregador não proceder ao envio das informações aludidas no n.º 2 do artigo 360.º aos trabalhadores que possam ser abrangidos pelo despedimento colectivo e estes não designem a comissão ad hoc prevista nos n.os 3 e 4 do artigo 360.º, não constitui motivo determinante da ilicitude do despedimento colectivo.
                      E o mesmo se deve afirmar relativamente à não promoção, pelo empregador, da fase de informação e negociação quando não existam as estruturas representativas dos trabalhadores referidas no n.º 1 do artigo 360.º e os trabalhadores que possam ser abrangidos pelo despedimento colectivo não tiverem designado a comissão ad hoc representativa a que alude o n.º 3 do artigo 360.º
                      Efectivamente, o sentido literal do artigo 361.º é o de que “o empregador promove uma fase de informações e negociação com a estrutura representativa dos trabalhadores, com vista a um acordo sobre a dimensão e efeitos das medidas a aplicar e, bem assim, de outras medidas que reduzam o número de trabalhadores a despedir” (n.º 1), e que “o empregador e a estrutura representativa dos trabalhadores podem fazer-se assistir cada qual por um perito nas reuniões de negociação” (n.º 4).
                      Adite-se que a alínea a) do artigo 383.º só prevê a ilicitude do despedimento colectivo quando o empregador não tiver promovido a negociação prevista no n.º 1 do artigo 361.º, normativo que, literalmente, pressupõe a existência das estruturas representativas dos trabalhadores referidas nos n.os 1 e 4 do artigo 360.º
                      Tal como afirma PEDRO FURTADO MARTINS (Cessação do Contrato de Trabalho, 3.ª edição, revista e actualizada, Princípia, Cascais, Julho 2012, p. 319), “o texto da lei é claro quando indica que as negociações têm lugar entre o empregador e a estrutura representativa dos trabalhadores. Dizer que na ausência dessa estrutura as negociações que a lei prevê têm de decorrer com os trabalhadores individualmente é sustentar uma interpretação que não tem na letra da lei aquele mínimo de correspondência verbal que exigem os princípios gerais da interpretação (artigo 9.º, 2 do Código Civil). Acresce que, a vingar esta leitura, concluir-se-ia que cada trabalhador se poderia fazer assistir por um perito nas reuniões de negociação, o que, além de ser totalmente irrazoável, também não corresponde ao que a lei prevê quando menciona a faculdade do empregador e a estrutura representativa dos trabalhadores se fazerem assistir cada qual por um perito (artigo 361.º, 4).”
                      No mesmo sentido, JÚLIO GOMES (Direito do Trabalho, vol. I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 988) sustenta que “a constituição da comissão ad hoc representa um ónus para os trabalhadores sob pena de não haver negociações”.
                      Em conformidade, conclui-se que, na ausência das estruturas representativas dos trabalhadores referidas no n.º 1 do artigo 360.º e não sendo designada a comissão ad hoc representativa dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo a que alude o n.º 3 do artigo 360.º, o empregador não é obrigado a promover a fase de informações e negociação estabelecida no artigo 361.º
                      É óbvio, conforme bem acentua PEDRO FURTADO MARTINS (ob. cit., p. 320), que “nada impede o empregador de promover uma negociação direta com os trabalhadores abrangidos pelo despedimento, convocando-os para uma reunião. Nesta eventualidade, desenvolver-se-á uma negociação facultativa, na qual o Ministério do Trabalho não participará, uma vez que entende não dever fazê-lo quando não exista uma das estruturas de representação previstas na lei”.»

Reapreciada a questão, sufraga-se inteiramente a fundamentação transcrita, que tem perfeito cabimento no caso em apreço, e porquanto se demonstrou  que, «na ré, não existem comissões de trabalhadores, comissões intersindicais ou comissões sindicais» [facto provado 11)] e que «[o]s trabalhadores abrangidos pelo processo de despedimento colectivo em análise nos presentes autos não constituíram a comissão representativa a que faz referência o n.º 3 do artigo 360.º do Código do Trabalho» [facto provado 12)], é forçoso concluir que a ré não estava obrigada a promover a fase de informações e negociação estipulada no n.º 1 do artigo 361.º, pelo que não se configura a ilicitude do despedimento colectivo prevista na alínea a) do artigo 383.º

2.3. Apenas se acrescentará, porque o acórdão recorrido aduz que a afirmada dimensão normativa no sentido de que o empregador não é obrigado a promover a fase de informações e negociação tal como prevê o artigo 361.º, em caso de ausência das estruturas representativas dos trabalhadores e de não designação da comissão ad hoc representativa dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo, pode  padecer de inconstitucionalidade, desde logo, por ofensa do princípio constitucional da igualdade, que não se vislumbra que aquela dimensão normativa possa configurar a violação da qualquer norma constitucional.

O primeiro dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores é o direito à segurança no emprego, com ênfase para a garantia contra despedimentos sem justa causa, proclamando, neste conspecto, o artigo 53.º da Constituição que «[é] garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos».

No dizer de GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA (Constituição da República Portuguesa Anotada, Artigos 1.º a 107.º, volume I, 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 709), «o conceito de justa causa é relativamente aberto, excluindo seguramente os despedimentos por vontade discricionária do empregador, mas não excluindo despedimentos por motivos objectivos, não imputáveis nem ao empregador nem ao trabalhador, designadamente por motivos económicos (de mercado, estruturais e tecnológicos), tais como a redução da actividade da empresa (justificando os despedimentos colectivos), extinção do posto de trabalho, inadaptação ao posto de trabalho», sendo certo que, em relação aos despedimentos colectivos, exige-se que tais situações sejam «suficientemente fundadas em causas adequadamente determináveis e submetidas a um apropriado procedimento de controlo (não bastando a decisão da entidade patronal), de modo a impedir que a via dos despedimentos colectivos se transforme, através de discriminações individualizadas, em instrumento de despedimentos individuais».

E tal como afirma o Tribunal Constitucional (Acórdão n.º 64/91, de 4 de Abril de 1991, Processo n.º 117/91) é possível «defender que a Constituição não veda formas de despedimento do trabalhador com fundamento em motivos objectivos», «[i]sto sem prejuízo de o despedimento por estes últimos motivos dever obedecer a uma regulamentação específica, rodeada de adequadas garantias», sendo de entender «que, ao lado da “justa causa” (disciplinar), a Constituição não vedou em absoluto ao legislador ordinário a consagração de certas causas de rescisão unilateral do contrato de trabalho pela entidade patronal com base em motivos objectivos, desde que as mesmas não derivem de culpa do empregador ou do trabalhador e que tornem praticamente impossível a subsistência do vínculo laboral. […]. Há-de considerar-se que tem de verificar-se uma prática impossibilidade objectiva e que tais despedimentos hão-de ter uma regulamentação substantiva e processual distinta da dos despedimentos por justa causa (disciplinar), de tal forma que fiquem devidamente acauteladas as exigências decorrentes do princípio da proporcionalidade, não podendo através desse meio conseguir-se, em caso algum, uma “transfiguração” da regulamentação que redunde na possibilidade, mais ou menos encapotada, de despedimentos imotivados ou ad nutum ou de despedimentos com base na mera conveniência da empresa.»

Determinante deste juízo de constitucionalidade relativamente à cessação do contrato de trabalho por causas objectivas é, pois, «que a regulamentação substantiva e processual seja distinta da prevista para os despedimentos com justa causa, os conceitos utilizados não sejam vagos ou demasiado imprecisos […] e que as garantias concedidas ao trabalhador, quer no plano da fiscalização (por entidade estranha ao vínculo) da existência de uma situação de impossibilidade objectiva, quer no que toca à indemnização a conceder-lhe, estejam asseguradas».

Ora, o envio das informações complementares justificativas da intenção de proceder ao despedimento colectivo, indicadas no n.º 2 do artigo 360.º, às estruturas representativas dos trabalhadores previstas no n.º 1 do artigo 360.º e à comissão ad hoc representativa dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento a que alude o n.º 3 do artigo 360.º visa facilitar a obtenção de informações úteis sobre a projectada medida de despedimento colectivo e a subsequente negociação com o empregador.

Na falta das ditas estruturas representativas dos trabalhadores, e posto que a constituição da comissão ad hoc representativa dos trabalhadores a abranger pelo despedimento consubstancia um ónus, cujo não exercício determina o afastamento do carácter obrigatório da fase de negociações, fica destituído de sentido útil o envio da documentação indicada no n.º 2 do artigo 360.º aos trabalhadores abrangidos, sendo que, então, a explicitação dos motivos justificativos do despedimento fica reservada para a decisão final do despedimento a comunicar a cada um dos trabalhadores e ao ministério responsável pela área laboral [artigo 363.º, n.os 1 e 3, alínea a)], pelo que, neste quadro, a não promoção da fase de informações e negociação prevista no artigo 361.º, não ofende os princípios constitucionais da segurança no emprego e da proibição dos despedimentos sem justa causa, visto que ainda são compatíveis com as mencionadas garantias constitucionais, havendo, além disso, fundamento material para a adopção de um tal regime jurídico.

Por outro lado, a questionada dimensão normativa não tem a virtualidade de ofender o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Lei Fundamental.

Como é sabido, a proibição de discriminação ínsita no âmbito de protecção do princípio da igualdade não significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciações de tratamento, o que se exige é que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da proporcionalidade, da justiça e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo constitucionalmente impróprio.

Ora, nos termos que se deixaram expostos, a adopção de tal regime jurídico tem fundamento material, é compatível com a dimensão constitucional do direito à segurança no emprego e a proibição dos despedimentos sem justa causa e assegura o  tratamento de forma igual de todos os cidadãos que estejam na mesma situação.

Procedem, pois, as conclusões IV a VII da alegação do recurso de revista.
Assim sendo, fica prejudicado o conhecimento das matérias enunciadas nas conclusões do pedido de alargamento do âmbito do presente recurso e nas conclusões VIII a XIII da alegação do recurso de revista.

De facto, o n.º 2 do artigo 660.º do Código de Processo Civil, aplicável aos acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos dos artigos 713.º, n.º 2, e 726.º desse Código, prevê que o tribunal deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, como sucede em relação às aludidas matérias.

3. Atenta a procedência do recurso de revista no tocante à não verificação da ilicitude do despedimento colectivo estabelecida na alínea a) do artigo 383.º, importa examinar, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 715.º do Código de Processo Civil, aplicável ao recurso de revista por força do artigo 726.º do mesmo Código, a questão suscitada pelo autor, na conclusão A) da respectiva alegação do recurso de apelação, que a Relação não apreciou por a considerar prejudicada pela solução dada ao litígio.

Na conclusão A) da alegação do recurso de apelação, o autor invocou «ter sido vítima de despedimento-sanção em razão daquele se ter recusado a colaborar em falsas campanhas que visavam permitir à Ré fazer ofertas de telemóveis mais baratos no mercado, sem conhecimento da casa-mãe».
      
O certo é que o autor, na presente acção, pediu apenas para se «considerar ilícito o Despedimento Colectivo promovido pela Ré em virtude da violação do N.º 1 do art. 361.º do Código do Trabalho e, consequentemente, [se] condenar a Ré ao pagamento de salários até ao trânsito em julgado da sentença, férias, subsídios de férias e de Natal vencidos e proporcionais e, finalmente, na reintegração do Autor».

E, para tanto, alegou que «a relação laboral entre a ré e o autor terminou em 30 de Dezembro do ano de 2011, no âmbito de um Despedimento Colectivo» (artigo 2.º), mas «a ré não cumpriu o iter processual legalmente imposto» (artigo 3.º), isto é, «não promoveu qualquer reunião de negociações com o Autor» (artigo 4.º), tal como «a lei vigente expressamente impõe» (artigo 5.º), donde, «a Ré não permitiu que o A. pudesse expor os seus pontos de vista sobre o processo de Despedimento Colectivo em curso» (artigo 6.º), nomeadamente, que «fora abrangido pelo Despedimento Colectivo por razões retaliatórias» (artigo 7.º), «porque a Ré se incompatibilizara com o Autor» (artigo 8.º), de modo que «o Autor se vira na necessidade de instaurar acção judicial (a qual ainda se encontra em curso) contra a Ré com fundamento em assédio moral» (artigo 9.º), visto que, «a partir do momento em que o A. se recusou a realizar trabalhos que considerava socialmente não éticos, a Ré começou a retaliar contra aquele» (artigo 10.º), daí que «sofreu uma penosa baixa psiquiátrica» (artigo 11.º) e, posteriormente, «foi-lhe diagnosticado o padecimento da doença denominada burnout» (artigo 12.º), tendo a ré aproveitado um processo de despedimento colectivo para incluir «o A. na lista dos trabalhadores a despedir» (artigo 13.º) e «não promoveu quaisquer negociações com o Autor» (artigo 14.º).

Em suma: o autor, no único articulado que produziu no tribunal de primeira instância, não formulou a pretensão de que os factos alegados fossem qualificados como assédio, nem de que o despedimento colectivo fosse declarado ilícito por via da existência de uma alegada acção persecutória motivadora do atinente despedimento, limitando-se a pedir que o despedimento colectivo promovido pela ré fosse declarado ilícito, «em virtude da violação do N.º 1 do art. 361.º do Código do Trabalho».

Acresce que o autor, na petição inicial, reconduz o mencionado assédio a acção judicial já instaurada contra a ré, a correr termos na 2.ª Secção do 4.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa, sendo que, nesse articulado, não explicita «ter sido vítima de despedimento-sanção em razão daquele se ter recusado a colaborar em falsas campanhas que visavam permitir à Ré fazer ofertas de telemóveis mais baratos no mercado, sem conhecimento da casa-mãe», pretensão apenas deduzida em sede de recurso de apelação e com respaldo em factos nunca antes alegados.
Os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais (artigos 676.º, n.º 1, e 690.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), através dos quais se visa reapreciar e modificar decisões e não criá-las sobre matéria nova, salvo quanto às questões de conhecimento oficioso, o que não é o caso.

Ora, não tendo o autor suscitado, perante o tribunal de primeira instância, a questão enunciada na conclusão A) da respectiva alegação do recurso de apelação, a qual, por este motivo, não foi apreciada pelo referido tribunal, entendimento que foi expressamente sufragado pelo acórdão recorrido, que julgou improcedente a arguida nulidade da sentença por omissão de pronúncia relativamente a tal matéria, não pode este Supremo Tribunal dela conhecer por se tratar de uma questão nova.

                                             III

Pelo exposto, delibera-se: a) conceder a revista, revogar o acórdão recorrido, na parte em que declarou ilícito o despedimento colectivo promovido relativamente ao autor, mantendo-se, quanto ao mais, o nele deliberado, e absolver a ré dos pedidos deduzidos na presente acção; b) não conhecer da questão versada na conclusão A) da alegação do recurso de apelação do autor.

Custas, nas instâncias e neste Supremo Tribunal, a cargo do autor, isto sem prejuízo do apoio judiciário entretanto requerido.

Anexa-se o sumário do acórdão.

                           Lisboa, 12 de Setembro de 2013

Pinto Hespanhol (Relator)

Fernandes da Silva

Gonçalves Rocha