Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4/15.9YFLSB
Nº Convencional: SECÇÃO DO CONTENCIOSO
Relator: JOÃO TRINDADE
Descritores: FUNDAMENTAÇÃO
DISCRICIONARIEDADE TÉCNICA
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
CLASSIFICAÇÃO DE SERVIÇO
PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE
JUIZ
RECURSO CONTENCIOSO
GRADUAÇÃO.
CONCURSO CURRICULAR
SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Data do Acordão: 11/24/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO CONTENCIOSO
Sumário :

I - O cumprimento do dever de fundamentação permite firmar a legitimidade democrática e proporcionar ao cidadão e às partes o conhecimento das a razão ou razões seja do ganho de causa seja do decaimento nas pretensões formuladas. A fundamentação deve, no mínimo, ser suficiente, intelegível e congruente, sendo que, nas decisões vinculadas, a administração deve identificar a situação real (ou de facto) ocorrida e subsumi-la na previsão legal e tirando a respectiva consequência; nas decisões discricionárias está em causa a exposição do processo de escolha da medida adoptada, que permita compreender quais foram os interesses e os factores que o agente considerou nessa opção..
II - A falta de fundamentação apenas é identificável quando ocorra a total omissão dos fundamentos de facto ou de direito da decisão, irrelevando a deficiência da fundamentação ou a pouca apetência da mesma para convencer.
III - A magnitude e abrangência do Concurso Curricular de Acesso ao STJ torna impossível uma ponderação isolada de cada concorrente, havendo apenas que efectuar uma ponderação relativa entre os vários concorrentes que se situem dentro dum patamar, a qual muito dificilmente pode ser de igualdade, mas de aproximação e em que intervirá, forçosamente, alguma discricionariedade subjectivada. A justificação do resultado parcial final da valorização entre candidatos de “muito boa qualidade” colocados dentro do mesmo patamar decorrerá, forçosamente, dentro de uma margem subjectiva mínima do recorrido e do júri, a qual, salvo ocorrência de erro manifesto ou ostensiva desadequação, não é sindicável pelo STJ.
IV - O CSM, em matéria de graduação, cumpre o dever de fundamentação sempre que explane o iter seguido para a determinação classificativa, o que passa pela fixação descriminada e objectivada dos dotes de cada candidato.
V - Apontando o aviso de abertura do concurso no sentido de que relevariam as três últimas classificações de serviço, inexistem motivos para que se possa considerar que a recorrente (de que, atempadamente, teve conhecimento) foi surpreendida pelo emprego desse critério, não obstando a tal a circunstância de, em anteriores concursos, ter sido relevada a última classificação, pois tal não cria um precedente.
VI - Tendo o critério referido em V sido aplicado uniformemente em relação a todos os candidatos necessários, inexistem razões para considerar infringido o princípio da igualdade.


Decisão Texto Integral:

Acordam na secção do contencioso do Supremo Tribunal de Justiça :

1- AA, a exercer funções como Juíza Desembargadora no Tribunal da relação de ..., veio nos termos do disposto nos arts. 164.º nº 1 e 168.º nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), interpor recurso contencioso da deliberação do  Plenário do Conselho Superior da Magistratura(CSM),  de 04 de Novembro de 2014, que aprovou a graduação final dos deliberações dos concorrentes necessários ao XIV Concurso Curricular de acesso ao STJ por discordância da pontuação que lhe foi atribuída nessa graduação, pedindo a anulação das deliberações impugnadas.


2 - Para tanto e em síntese alegou que o parecer do júri e as deliberações do CSM que aprovaram a graduação dos concorrentes necessários ao XIV Concurso Curricular de acesso ao STJ enferma de insuficiente fundamentação e o facto de ter sido adoptado já em fase de deliberação final uma ponderação das três últimas classificações de serviço, quando os concorrentes contavam com um critério que levasse à consideração de apenas a última classificação ou, no limite, das duas últimas classificações, o que viola os princípios da imparcialidade e da igualdade.

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3- Admitido o recurso, determinou-se o cumprimento do disposto no artigo 174.º do E.M.J.

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4- O Conselho Superior da Magistratura respondeu salientando não resultar demonstrada a ofensa de qualquer norma legal ou de algum dos princípios jurídico-administrativos fundamentais que ordenam e regem a actividade do CSM, na apreciação e valoração concursal , nem tendo ocorrido alguma falta de fundamentação do respectivo acto deliberativo.

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5- Citados os interessados (artº 175º do E.M.J.),nenhum apresentou resposta.

Determinou-se o cumprimento do disposto no artigo 176.º do E.M.J.

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6- A recorrente encerra as alegações com as seguintes conclusões:
DA INSUFICIENTE FUNDAMENTAÇÃO
A.  Neste item, está fundamentalmente em causa saber se, em relação ao critério identificado no ponto n.° 6, f) - idoneidade dos concorrentes - do aviso de abertura do concurso, o acto recorrido padece ou não de insuficiência de fundamentação.
B. Na sua resposta, o CSM sustenta que a insuficiência da fundamentação apenas constituiria vício de forma se e quando fosse manifesta, absurda ou contraditória, o que, no caso em apreço, não ocorreria - cfr. arts. 41.° e 81.°. E fundamenta a pontuação atribuída reproduzindo o que já consta do parecer formulado, mas sem esclarecer o caminho que levou o júri e o CSM a atribuírem, neste subcritério, a pontuação de 92 pontos à ora Recorrente e uma pontuação entre 93 e 97 pontos a vários candidatos que ficaram graduados à sua frente (não considerando os três primeiros graduados e sem qualquer desconsideração em relação a todos os outros concorrentes, como é evidente).
C.         Não se duvida que, em matéria concursal, quando se faz uma avaliação curricular, existe uma boa margem de discricionariedade técnica e de liberdade do júri e do órgão decisor, que não são sindicáveis. Também não se imputa à deliberação recorrida um cariz absurdo ou contraditório. O problema está em saber se a fundamentação é suficiente, e manifestamente não o é, porque, em relação ao item “idoneidade”, não é possível que um destinatário normal se aperceba da verdadeira justificação que decidiu o júri acerca da diferente pontuação atribuída à Recorrente em relação aos outros concorrentes mais pontuados (e com excepção dos três primeiros graduados).
D.         Deve particularmente ter-se presente que, em matéria concursal, aquilo que sobreleva não é apenas a ponderação feita sobre cada concorrente, mas a ponderação relativa entre os vários concorrentes, de forma a que o destinatário — e qualquer terceiro - compreenda a graduação efectuada.
E.          Marginalizemos, tal como fez o júri, pelas razões já expostas, os subcritérios i), iv), v) e vi) e concentremos a nossa observação no subcritério iii) - grau de empenho revelado pelo magistrado na sua formação contínua e na adaptação às novas tecnologias - e sobretudo no subcritério ii) - qualidade dos trabalhos apresentados.
F. De qualquer forma, sempre se sublinha o seguinte: quanto ao subcritério i), foram-lhe reconhecidas "altas qualidades pessoais e profissionais para o exercício da função quanto ao subcritério iv), do seu registo disciplinar não consta a aplicação de qualquer sanção; quanto ao subcritério v), foi sublinhada a sua “muito boa produtividade quanto ao subcritério vi), os relatórios evidenciam que a concorrente é “Magistrada educada, discreta e afável no trato e de bom relacionamento humano”, tendo sido positiva a discussão pública do seu currículo e confirmativa deste.
G.  Quanto ao subcritério iii), o júri concluiu pelo elevado empenho e interesse da concorrente, bem como pelo seu domínio das novas tecnologias de informação, transcrevendo o parecer um elenco muito vasto e variado das suas participações em encontros/acções/cursos/colóquios formativos. Compaginando o que o parecer sublinha quanto à Recorrente com aquilo que reporta relativamente aos outros concorrentes, a única conclusão possível é que não há qualquer desvalor da apreciação feita ao seu currículo em relação à que foi feita quanto aos outros concorrentes. Bem pelo contrário, feita essa compaginação, a única ilação possível é a de que à Recorrente é apontado um número mais vasto e variado de participações do que acontece em relação a boa parte dos concorrentes necessários, que, neste item, foram melhor classificados do que ela.
H.  Por outro lado, em relação ao subcritério “qualidade dos trabalhos”, o parecer do júri também não permite ao destinatário normal apreender a justificação de uma menor pontuação da Recorrente, quando comparada com a dos outros concorrentes mais pontuados do que ela nesse item.
I. Não considerando os três primeiros graduados, em que o júri considerou que a excelência dos seus trabalhos justificava uma valoração especial, a verdade é que a Recorrente — e certamente o destinatário normal não vislumbra qualquer juízo valorativo que justifique uma diferenciação entre o que foi apurado em relação à Recorrente e aquilo que foi considerado em relação aos restantes concorrentes mais graduados do que ela.
J. Os trabalhos da Recorrente foram apreciados no sentido de evidenciarem “muito boa qualidade”, pelo que nem sequer, pela adjectivação utilizada, se retira qualquer sinal que possa justificar uma pontuação mais elevada atribuída, neste item, aos concorrentes necessários que ficaram colocados à sua frente.
K. Basta, em seguida, como se fez na petição recursória, comparar a fundamentação relativa à Recorrente com os incisos correspondentes efectuados a propósito dos concorrentes mais pontuados, nesse segmento, do que a Recorrente.
L. Não se vislumbra - nem à Recorrente, nem ao destinatário normal, nem certamente aos Senhores Juízes Conselheiros a quem caberá a apreciação deste recurso - nada que justifique uma menor valoração dos trabalhos da Recorrente, em relação aos desses outros concorrentes ora em análise.
M. Justificar-se-á ainda ter presente o parecer elaborado no âmbito do XIII Concurso Curricular, no qual se fez, ao contrário do que aqui acontece - onde se usa e abusa de expressões tabelares —, uma apreciação minimamente fundamentada da maioria das situações que importava ponderar, em relação à situação concreta de cada concorrente.
N. Em suma, em relação ao item “idoneidade”, não é possível que um destinatário normal se aperceba da verdadeira justificação que decidiu o júri acerca da diferente pontuação atribuída à Recorrente em relação aos outros concorrentes mais pontuados (e com excepção dos três primeiros graduados).
O. Ora, como o júri certamente não “jogou aos dados” para pontuar os concorrentes, impõe-se que se compreenda porque é que os classificou nos termos em causa.
P. Não é, pois, um problema de discricionariedade técnica, mas uma questão de violação de um dever de fundamentação, que impede uma avaliação da ponderação e racionalidade da decisão administrativa em pauta, inquinando os actos recorridos, por vício de forma, uma vez que a insuficiente fundamentação equivale à falta de fundamentação, como resulta do art. 125.° do C.P.A., o que gera a sua anulabilidade.
DAS ANTERIORES CLASSIFICAÇÕES DE SERVIÇO
Q. Neste item, o tema nuclear é o seguinte: sendo, por força de lei, as anteriores classificações de serviço um dos critérios a contemplar na avaliação curricular dos concorrentes (cfr. art. 52.° do EMJ) e tendo o aviso de abertura do concurso estabelecido um critério de ponderação desse elemento entre 50 e 70 pontos, pode o júri, já em fase de deliberação, estabelecer um critério geral e abstracto quanto à pontuação a atribuir às três últimas classificações de serviço?
R. Defende-se o CSM, dizendo que “«o caso em apreço, não resulta da enunciação levada a cabo no projecto de parecer do Júri algum factor que, com autonomia, tenha redundado na consideração de um diverso critério avaliativo dos enunciados na lei ou no aviso de abertura do concurso- cfr. art. 114.° da resposta.
S. O CSM responde à questão errada. É que a Recorrente nunca disse que tinha sido aplicado um critério diverso do estabelecido na lei, porque naturalmente a consideração de uma, duas ou três classificações de serviço corresponde a subcritérios admissíveis em face do que está estabelecido pelo art. 52.°, n.° 1, a) do EMJ. O problema é diferente. E antes de mais tem a ver com a exigência de divulgação atempada dos subcritérios que, no concurso, vão ser adoptados pelo júri como factores de avaliação no quadro definido pela lei.
T. Todavia, a Recorrente reconhece que a questão pode ser de difícil solução, uma vez que, como se escreve no Ac. do STA de 13/10/2004, nem sempre é fácil “traçar a fronteira entre aquilo que pode ser considerado como um subcritério e aquilo que o não é já que, por vezes, a distinção entre um subcritério e o discurso fundamentador da decisão adoptada é bem ténue". Tal aresto sugere que se deve considerar como criação de um subfactor que extravasa o discurso fundamentador da decisão “a construção de um elemento avaliativo com autonomia em relação ao critério que visa subdividir, de tal forma que lhe seja possível atribuir uma valoração separada'". Perfilhamos essa orientação.
U. Ora, aplicando esta jurisprudência ao caso dos autos, não restará dúvida quanto à conclusão de que a definição de uma grelha de pontuações para as várias situações em que se podem desdobrar as últimas três classificações de serviço - como o júri fez, na fase final da sua deliberação - corresponde a um elemento avaliativo autónomo, com uma valoração própria, o qual até obedece a um critério geral e abstracto.
V. Isto é, o júri estabeleceu um subcritério para as anteriores classificações de serviço - considerando as três últimas, que valorou de acordo com uma grelha que o júri elaborou para o efeito o que não é susceptível de se confundir com o discurso fundamentador da decisão adoptada, a qual, bem pelo contrário, acabou por ser condicionada por essa grelha classificativa, que, a ser definida, devia ter sido prevista aquando da abertura do concurso.
W. Pelo exposto, foi efectivamente ilegal, por lesiva do princípio da imparcialidade, e bem assim dos princípios da transparência e da igualdade, a definição de um subcritério quanto à ponderação das três últimas classificações de serviço, o qual não se encontrava estabelecido no aviso de abertura do concurso, nada impedindo que o tivesse sido, atendendo à sua natureza objectiva.
X. Acresce uma circunstância que agrava a intensidade lesiva do princípio em pauta: o subcritério encontrado não tem correspondência com o que fora praticado no último concurso, o XIII, o primeiro realizado após a alteração introduzida ao regime do concurso, por força da Lei n.° 28/2008.
Y. Se tivesse sido mantido tal critério - o que seria expectável em face do antecedente -, teria sido bem diferente o resultado da graduação dos concorrentes necessários, como é sabido. Daí a enorme relevância de não se estabelecerem subcritérios “à última hora”. A fim de também salvaguardar a imagem de isenção, transparência e imparcialidade do júri e do órgão decisor.
Z. Ademais, in casu, até se deu a circunstância de ter sido adoptado um subcritério inaplicável a todos os concorrentes, porque pelo menos um deles - logo, o primeiro classificado - até só tinha duas classificações de serviço, o que gerou a necessidade de, para este, se ter de “distorcer’ a solução aplicada a todos os outros, situação que também acarreta, como oportunamente alegado, a violação do princípio da igualdade.
Termos em que se conclui como na petição recursória, com as legais consequências.

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7- O Conselho Superior da Magistratura formula as seguintes alegações:
I) Enquadramento
1º-Interpôs a Exma. Magistrada Judicial em questão recurso contencioso da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 04 de Novembro de 2014, que procedeu à graduação dos candidatos ao XIV Concurso Curricular de Acesso ao Supremo Tribunal de Justiça.
2º)De acordo com tal deliberação, a recorrente foi graduada, enquanto «concorrente necessário», em 21.° lugar.
3º)A recorrente, não se conformando com o deliberado, interpôs o presente recurso, requerendo seja anulada a deliberação de graduação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 4 de Novembro de 2014, publicada no Diário da República, 2.a Série, n.° 217, de 10 de Novembro de 2014 e respectiva fundamentação, constante, ainda, da deliberação tomada na Sessão Plenária do CSM de 28 de Outubro de 2014.
Divisou a recorrente, nas deliberações do CSM que aprovaram a graduação dos concorrentes necessários ao XIV Concurso Curricular de Acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, as seguintes “invalidades”:
a) «Lido e relido o parecer do júri e as deliberações do CSM (...), a Recorrente - tal como certamente o destinatário normal - não apreende a justificação da vontade do órgão decisor quanto à pontuação que lhe foi atribuída de 92 pontos, referente ao item “idoneidade” (...)» (cfr. conclusão A da petição de recurso), o que, em seu entender, gera um vício de forma, por insuficiente fundamentação (cfr. conclusões B, C e D da petição de recurso); e porque,
b) «Em relação ao critério “anteriores classificações de serviço”, que a Recorrente também não se conforma com a circunstância de o júri ter adoptado, já em fase de deliberação final - o que foi sancionado pelo CSM -, uma ponderação das três últimas classificações de serviço, quando os concorrentes contavam com um critério que levasse à consideração de apenas a última classificação ou, no limite, das duas últimas classificações, como foi a regra nos anteriores concursos curriculares» (cfr. conclusão K da petição de recurso), situação que, em seu entender, gera os seguintes vícios:
«- Primeiro, violação do princípio da imparcialidade, porque foi adoptado um critério, já na fase final de deliberação - após a apresentação das candidaturas, a realização das provas públicas e da própria finalização da graduação dos concorrentes necessários - , que não só não se encontrava densificado no aviso de concurso - nada impedindo que o tivesse sido, atendendo à sua natureza objectiva -, como diverge do que até então fora praticado (maxime no último concurso), com o que todos os concorrentes contavam;
-Segundo, a violação do princípio da igualdade, porque não se adoptou sequer um critério que colocasse todos os candidatos na mesma situação, uma vez que todos tinham 2 classificações de serviço, mas nem todos tinham 3 ou mais (...)» (cfr. alíneas N e O das conclusões da petição de recurso).
5º)Debalde o fez, pois, como se concluiu na resposta formulada pelo ora recorrido, de acordo com a fundamentação expressa em tal articulado, não se divisava - nem divisa - padecer a deliberação impugnada de algum dos apontados vícios ou violações.
6º)Nessa conformidade, o recorrido apresentou a sua resposta onde concluiu pela completa improcedência do presente recurso contencioso.
II)Das alegações da recorrente
7°)Todavia, a recorrente reitera, agora em sede de produção de alegações – fazendo fé na formulação anteriormente produzida no seu articulado inicial – o carácter inválido da deliberação tomada.
De facto, sem novidade, não obstante o preenchimento de mais de duas dezenas de páginas de alegação, a recorrente pugna pela anulação da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura supra identificada.
9º)Por facilidade de análise pelo recorrido da alegação expendida, considera-se a delimitação invocatória efectuada pela recorrente, apreciando-se, assim, sucessivamente, cada um dos vícios invocados pela recorrente.
a) Da “INSUFICIENTE FUNDAMENTAÇÃO” (parte I da alegação, pontos 1 a 16):
10°)Invoca a recorrente, na alegação apresentada, que «o CSM sustenta que a insuficiência da fundamentação apenas constituiria vício deforma se e quando fosse manifesta, absurda ou contraditória, o que, no caso em apreço, não ocorreria (...). E fundamenta a pontuação atribuída reproduzindo o que já consta do parecer formulado, mas sem esclarecer o caminho que levou o júri e o CSM a atribuírem, neste subcritério, a pontuação de 92 pontos à ora Recorrente e uma pontuação entre 93 e 97 pontos a vários candidatos que ficaram graduados à sua frente...»([1]).
11°)Ora, desde já se diga, que a suficiência da fundamentação não se afere em face da resposta do CSM neste recurso, mas sim, de acordo com a motivação fundamentadora que consta enunciada na deliberação objeto de impugnação, a qual é, de facto, suficiente, clara e congruente.
12°)Efectivamente, ao contrário do aludido pela recorrente, encontra-se perfeitamente revelada, na formulação expressa na fundamentação do Parecer do Júri, qual o caminho percorrido pelos membros que integravam tal órgão, para a atribuição à recorrente da pontuação - não só a respeito da alínea f) do ponto 6.1. do Aviso, mas também, de todas as demais alíneas daquele ponto - que lhe foi atribuída, a qual assenta, na detalhada descrição e especificação curricular, alusiva à recorrente, efectuada por referência a todos e a cada um dos critérios e subcritérios constantes do ponto 6.1. do Aviso de Abertura do XIV Concurso Curricular de Acesso ao Supremo Tribunal de Justiça.
13º)- Não obstante, refere a recorrente, nas alegações a que se responde que ” o problema está em saber se a fundamentação é suficiente e manifestamente não o é, porque, em relação ao item “idoneidade”, não é possível que um destinatário normal se aperceba da verdadeira justificação que decidiu o júri, acerca da diferente pontuação atribuída à Recorrente em relação aos outros concorrentes mais pontuados»([2])
14°)Como se disse já, carece de sentido e, por isso, improcede a arguição de violação de lei, referida a um domínio do acto onde não existe vinculação legal e, portanto, não é possível a sua ofensa. É o que ocorre relativamente à deliberação objecto da presente impugnação.
15°)É realidade insofismável que, da mera leitura da fundamentação exarada a respeito da recorrente resulta evidente ter sido ponderado todo o percurso profissional desempenhado pela mesma, nas suas múltiplas facetas e enquanto concretizadas ou com enquadramento, nos critérios e subcritérios considerados tendo o Júri enunciado, com o devido detalhe, todos os elementos curriculares que, a respeito de cada alínea do ponto 6.1. do Aviso de Abertura do Concurso determinaram a classificação que entendeu conferir, sequentemente, em termos valorativos, a cada concorrente, o que, também sucedeu quanto à recorrente e, bem assim, no que respeita à consideração dos subcritérios enunciados a respeito da alínea f) do mencionado ponto 6.1.
16°)Como se salientou na resposta apresentada pelo recorrido, especificamente quanto à alínea f), divisam-se os seguintes - detalhados e circunstanciados - aspectos na apreciação do Júri - constante do Parecer - formulada a respeito da recorrente: o «grande prestígio profissional e cívico» grangeado; as «altas qualidades pessoais e profissionais para o exercício da função, à qual sempre se dedicou com zelo e eficiência»-, o prestígio pessoal que esteve na base da sua nomeação para a docência no Centro de Estudos Judiciários; a circunstância de os trabalhos apresentados - em matérias jus-laborais - revelarem «sólidos e actualizados conhecimentos jurídicos» e «grande domínio dos atinentes conceitos», neles se fazendo o «uso de uma linguagem acessível, directa e clara, servida por uma escrita gramaticamente correcta, de fácil compreensão e uma adequada, fundamentação», abordando-se os assuntos «com segurança e desenvoltura» e «com recurso a doutrina e a jurisprudência com interesse para cada caso»', a qualificação dos arestos - trabalhos - em causa como «de muito boa qualidade, que confirmam a notação do último relatório de inspecção, e mostram uma panóplia alargada de conhecimentos específicos e aprofundados em matéria jus-laboral, mesmo em questões técnico-jurídicas específicas», tendo - alguns - pelo seu interesse  inquestionável merecido publicação na Colectânea de Jurisprudência e em wwwdgsi.pt; o “elevado empenho e interesse, revelado pela recorrente na sua própria formação contínua ilustrado pela participação /frequência em vários em cursos e acções/cursos formativos; que os seus acórdãos e trabalhos se encontram processados em computador, «com o texto devidamente formatado, neles sendo usados diversos tipos de letra, itálicos e sublinhados, tudo a comprovar a adesão e adaptação da Exmª Concorrente a esta tecnologia”; o facto de do seu registo disciplinar não constar a aplicação de qualquer sanção; A consideração de os elementos estatísticos, comprovarem uma «muito boa produtividade»; e que dos relatórios inspectivos consta que a recorrente «é Magistrada educada, discreta e afável no trato e de “bom relacionamento humano”».
17°)Perante este detalhe e especificação, sobre a natureza das questões que envolveu a sua feitura e sobre a análise realizada pelo Júri e que resulta ínsita das considerações efectuadas no respectivo Parecer, com as quais a recorrente pode ou não estar em concordância, mas perante as quais, inequivocamente, não pode retirar-se existir alguma insuficiente ou deficiente fundamentação.
18°)Como resulta do escrito no Parecer do Júri, claramente se considerou, no mesmo, que o próprio Aviso incorporou elementos que «contribuem para reduzir o grau de generalidade do conceito de idoneidade, constituindo auxiliares na concretização dos elementos de ponderação dentro da amplitude de pontuação prevista» para o factor da alínea f) do ponto 6.1. do Aviso de Abertura do Concurso em questão.
19°)A recorrente - e quem quer que seja que leia o Parecer do Júri do Concurso - adoptado pelo Plenário do CSM, por via da deliberação subsequentemente tomada, consegue alcançar, com o detalhe possível, qual a razão de ser da atribuição de uma determinada valoração à recorrente, a propósito de cada um dos factores, singularmente considerados, na avaliação efectuada.
20°)E, isso não colide com a circunstância - também assinalada no Parecer, de forma clara, objectiva e precisa - de que os critérios das várias subalíneas da alínea f) do ponto 6.1. do Aviso de Abertura do Concurso foram «tomados em conjunto», conferindo-se, contudo, maior relevância ao critério referenciado subalínea ii) da mencionada alínea f)
21º)Em face do exposto não é possível extrair ilações de mimetismo aritmético ou quantitativo da razão da diferença de pontuação atribuída a recorrente e aos demais candidatos que identifica, razão pela qual não é possível concluir de modo inserto nos pontos 7 a 16 das alegações a que ora se responde.
22°)Na realidade, não há de facto qualquer desvalor da apreciação feita do curriculum da recorrente – tal como a mesma reconhece no ponto 7 da alegação a que se responde. Agora não é possível é procurar obter algum desvalor ou errada análise na apreciação do Júri com base numa comparação parcelar e descontextualizada da apreciação global efectuada pelo Júri e assente numa análise pari e passu de cada termo e adjectivação utilizada entre os concorrentes, sendo certo que, como é sabido as diferenças pontuais têm expressões gradativas, que a mera análise vocabular e linguística não consegue espelhar.
23°)De todo o modo, mesmo comparando o que não é comparável, ainda assim, a linguagem utilizada no parecer do Júri do concurso não inculca qualquer identidade (expressando-se a diferença na divergente amplitude conceptual da linguagem utilizada ou na diversa adjectivação ponderada, ainda que espelhada, quantitativamente, numa diferença marginal de um ou poucos pontos de classificação), com reflexo em idêntica graduação, entre a pontuação atribuída à recorrente e aquela que foi considerada quanto ao concorrente que identifica no ponto 12 da sua alegação (abandonando a recorrente, aliás, alguma comparação com os demais concorrentes que tinha enunciado em sede de petição recursória).
24°)Como salientou o recorrido, certo é que, não demonstra a recorrente qualquer desrespeito dos deveres vinculados decorrentes dos princípios fundamentais (igualdade, legalidade, fundamentação) ou alguma perpetração de erro manifestamente crasso com desajuste de critérios e o caminho trilhado pelo Júri «quanto à avaliação do mérito dos concorrentes» no âmbito da «margem de livre apreciação ou prerrogativa de avaliação...».
25°)Foi este percurso de livre apreciação que o Júri levou a efeito, em estrita e absoluta objectivação em grelhas classificativas (com meticuloso escrutínio do que seja susceptível de ser inserido em elenco), que não constitui pressuposto dos procedimentos tidos por necessários para assegurar a transparência e a imparcialidade de um júri, ao menos para finalidades como as que aqui estão em causa... circunscrevendo, assim, ao controlo jurisdicional o que apenas em sede de arbitrariedade tem cabimento - mas que aqui não encontra acolhimento -, que não já na permitida discricionariedade.
26°)A exigência de fundamentação (também dos actos administrativos) prossegue dois objectivos fundamentais: um, de natureza endoprocessual; outro de ordem extraprocessual. O primeiro visa permitir aos interessados o conhecimento das razões de facto e de direito que enformaram a decisão que lhes respeita, convencendo-os da sua bondade/acerto ou habilitando-os a reagir, fundadamente, se for essa a opção; o segundo é directa decorrência dos princípios da legalidade, da Justiça e da imparcialidade e visa, além do mais, assegurar a sua adequada sindicabilidade([3]).
27°)Mas, «existindo uma declaração do autor que pretenda fundamentar o acto, só não estará cumprido o dever formal respectivo se essa declaração não puder ser considerada uma fundamentação daquele acto - (...) por impossibilidade de determinação do seu conteúdo, por falta evidente de racionalidade ou por manifesta inaptidão justificativa - sendo dado que a fundamentação visa aqui esclarecer concretamente as razões que determinaram a decisão tomada e não encontrar a base substancial que porventura a legitime»([4]).
28°)Ora, estando presente na deliberação impugnada a escorreita, clara e congruente fundamentação do acto de que se recorre, sem desprimor para o diverso entendimento da recorrente e para não tornar imprestável a compreensão da presente alegação, reproduz o ora recorrido, ipsis verbis, tudo o já supra alegado nesta sede e na resposta, cuja pertinência se mantém.
29°)Assim, a resposta à pergunta enunciada no ponto 12 das alegações a que ora se responde só pode ter sentido afirmativo, no sentido de que, ponderadas as fundamentações - global e pormenorizadamente consideradas - dos vários concorrentes necessários em questão, não se alcança qualquer erro, lapso ou alguma contradição ou incompatibilidade, que inculque a violação de algum normativo ou princípio jurídico legal aplicável, sendo certo que, alguma variação de pontuação se situa, neste conspecto, perfeitamente dentro da margem subjectiva de apreciação do Júri e do CSM, que se encontra subtraída, s.m.j., à apreciação do Supremo Tribunal de Justiça.
30°)No mais, mantendo completa e plena validade, são de ter por inteiramente aplicáveis as demais considerações expendidas pelo ora recorrido nos artigos 71°) a 83°) da sua resposta, rejeitando-se, pois, a ocorrência de algum vício atinente à insuficiência de fundamentação que vem invocada no espírito da recorrente.
b) Do “CRITTÉRIO RELATIVO ÀS ANTERIORES CLASSIFICAÇÕES DE SERVIÇO” (parte II da alegação, pontos 17 a 26):
31°)Numa segunda parte da sua alegação, vem a recorrente enunciar um suposto vício deliberativo, decorrente de uma putativa lesão dos princípios da imparcialidade, da transparência e da igualdade, que assentaria numa resposta negativa à questão que enuncia no ponto 17 da sua alegação.
32°)O recorrido já teve ocasião de, longamente, explicitar - em sede de resposta ([5])-    não se verificar a ofensa de algum dos invocados princípios fundamentais que regem a sua actividade, nem de quaisquer outros.
33°)Explicita, todavia, o recorrido - porque a recorrente não parece (atento o alegado no artigo 20° da alegação a que se responde) ter compreendido o alcance da alegação expendida nos artigos 114°) e seguintes da resposta apresentada por este Conselho Superior da Magistratura - que, não houve a enunciação pelo Júri de algum novo critério avaliativo, nem de algum subcritério inovador e materialmente constitutivo.
34°)De facto, o aviso concursal enunciou a pontuação ponderativa em que poderia variar a aferição do item «anteriores classificações de serviço».
35°)O Júri preenchendo e densificando - sem qualquer «criação» inovadora - tal ponderação, enunciou quais os termos e “balizas” em que se situava a aludida avaliação, de forma paritária, sem postergação de qualquer igualdade ou imparcialidade e em perfeita auto-vinculação respeitadora de inteira «transparência» administrativa, aliás, em maior medida do que aquela que o próprio aviso e a lei habilitante do concurso lhe impunham que observasse.
36°)Como se teve ocasião de salientar, não tem aplicação ao caso do concurso em questão, atenta a sua especificidade (assente numa ulterior deliberação do Plenário do C.S.M., seguindo ou não, o parecer - e não a deliberação - do Júri), a jurisprudência enunciada no artigo 21 da alegação da recorrente.
37°)Relativamente a este ponto, julgou o recorrido ter explicitado convenientemente, na resposta apresentada, que não houve a fixação superveniente de algum «critério» (qualquer que ele seja) por banda do júri após o conhecimento do «universo» de concorrentes
38°)Na realidade, atento o invocado nos artigos 84°) a 180°) da resposta apresentada pelo recorrido, que ora se reitera, entende este Conselho Superior da Magistratura ter dado cabal e precisa resposta à invocação anulatória efectuada pela recorrente.
39°)De facto, inexistiu a adopção de qualquer critério inovador, por banda do Plenário do C.S.M., para além dos constantes na lei e no regulamento concursal. Este critério consistiu e consistia na ponderação das anteriores classificações de serviço.
40°)Por outro lado, rejeita-se o conclusivamente invocado no ponto 23 da alegação da recorrente, pois, ao invés do aí vertido, a consideração da exemplificação levada a efeito no artigo 140°) da resposta apresentada pelo recorrido não consubstancia alguma admissão de «falta de razão», mas sim, a evidenciação de que a recorrente não tinha, de facto, qualquer direito ou expectativa de manutenção do deliberado noutros concursos curriculares anteriores a respeito deste critério.
41°)Tal resulta expresso da convocação que se efectua no artigo 139°) da resposta (aspecto que, aliás, não é objecto de contestação pela recorrente) e, se dúvidas subsistissem, elas dissipar-se-iam perante a mera leitura do vertido nos artigos 141°) a 146°) da aludida resposta deste C.S.M.
42°)Assim, tudo exposto, conclui-se não ter ocorrido alguma lesão ou qualquer colocação em crise de algum dos princípios fundamentais de raiz constitucional e administrativa que regem a actividade do recorrido.
43°)Em consequência, por não resultar demonstrada a ofensa de qualquer norma legal ou de algum dos princípios jurídico-administrativos que ordenam e regem a actividade do Conselho Superior da Magistratura, relativamente à deliberação objecto de impugnação, não assistindo ao recorrente o direito de que se arroga, o recurso em apreço deverá soçobrar.
Por tudo o exposto e sem prejuízo da Superior apreciação dos Venerandos Juizes Conselheiros desse Supremo Tribunal de Justiça, em sede das presentes alegações conclui-se como na resposta oportunamente apresentada devendo, a final, ser julgado improcedente o presente recurso contencioso.

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8- A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste STJ emitir Parecer, no qual formulou juízo de concordância com o recorrido, consentâneo com a improcedência do recurso, que rematou nos seguintes termos:
I
…………..
II
7. Invoca a senhora Juiz Desembargadora Recorrente dois vícios, os seguintes vícios de que enfermam a deliberações recorridas:
a) vício de forma, por insuficiente fundamentação, relativamente aos subcritérios, de valoração da idoneidade, do "grau de empenho na formação contínua e actualizada e na adaptação às modernas tecnologias", e da "qualidade dos trabalhos" enunciados nas subalíneas iii) e ii, respectivamente, do ponto 6.1. alínea f) do aviso de abertura do concurso;
b) violação dos princípios da imparcialidade da Administração e da igualdade, por referência ao factor enunciado no ponto 6.1. alínea a) do aviso de abertura do concurso (anteriores classificações de serviço e fixação, pelo júri, como critério a atender a ponderação das três últimas notações)os quais se apreciarão pela ordem a seguir indicada.
I  - vício de forma, por insuficiente fundamentação, relativamente aos subcritérios, de valoração da idoneidade, do "grau de empenho na formação contínua e actualizada e na adaptação às modernas tecnologias", e da "qualidade dos trabalhos" enunciados nas subalíneas iii) e ii), respectivamente, do 6.1.alínea f) do aviso de abertura do concurso
8. A fundamentação dos actos administrativos, imposta pelo artigo 124º do Código do Procedimento Administrativo([6]) [correspondente actualmente ao artigo 152  do CPA], corolário do direito constitucionalmente garantido aos administrados pelo artº 268º, nº 3 da CRP, devendo observar os requisitos previstos no artigo 125º do C.P.A., consiste na exposição das razões da sua pratica([7]), visando, além do mais, dar a conhecer as razões por que foi decidido de uma maneira e não de outra, ou seja, como se afirmou no acórdão deste Supremo Tribunal de 21.6.2001, Proc2 464/98, "consiste na indicação das razões justificativa da graduação do recorrente no lugar que lhe foi atribuído, de sorte a que aquele possa reconstituir o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pela entidade recorrida ao colocá-lo  naquela posição", de molde a permitir aos seus destinatários uma opção consciente entre a sua aceitação e a sua impugnação contenciosa.
A fundamentação é um conceito relativo, que varia em função do tipo legal de acto, dos seus antecedentes e de todas as circunstâncias com ele relacionadas que permitam dar a conhecer o iter cognoscitivo e valorativo que levou a que fosse decidido dessa maneira e não de outra, estando o acto suficientemente fundamentado quando um destinatário normal se aperceba das razões de ser da decisão. Ou seja, a fundamentação é suficiente quando proporcione aos destinatários do acto a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o acto, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente.
A generalidade da doutrina ([8]) tem entendido que em relação aos actos praticados no exercício de poderes discricionários - em que se inscrevem designadamente os factores de ponderação a que se reporta a norma em branco da al. f) do nº l do EMJ, e o juízo do Plenário do CSM sobre tais factores de ponderação, no caso vertente os constantes das subalíneas da alínea f) do ponto 6 do Aviso do Concurso - não dispensam o dever de fundamentação. Segundo Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, Edição, II Vol. p. 825-826, nestes casos a fundamentação é mesmo um requisito essencial, visto que sem ela ficaria substancialmente frustrada a possibilidade de impugnar os seus vícios mais típicos.
9. Em consonância com a doutrina, o Supremo Tribunal de Justiça, nos acórdãos de 25.9.2003, Procº nº 2375/03, e de 29.11.2005, Procº nº 2383/04, já teve ocasião de afirmar que a discricionariedade técnica ou liberdade administrativa que, em grande medida preside às deliberações sobre o mérito ou aptidão dos candidatos aos concursos públicos, não pode, em caso algum, servir de dispensa do dever de fundamentar, de justificar, em concreto, a deliberação, no respeito pelo sistema de classificação e pelos critérios de avaliação anteriormente aprovados, e com a sumária indicação dos elementos considerados, quer os previstos naqueles critérios quer os que, em puro juízo discricionário, tiverem sido entendidos como decisivos, tendo considerado, no arestos citados, que a deliberação que, a seguir à enunciação dos documentos relativos ao currículo de cada candidato, se serve de uma fórmula padrão universal, a par de um elenco pré-definido de adjectivos, a introduzir naquela consoante os diversos níveis de mérito, não atinge o grau mínimo do concreto esclarecimento da motivação que se impõe.
Mas tem sido também entendimento do Supremo Tribunal de Justiça , sufragando a posição de José Carlos Vieira de Andrade, ob. citada, que a insuficiência da fundamentação, para conduzir a um vício de forma, deve ser manifesta, no sentido de ser tal que fiquem por definir os factos ou considerações que levaram o órgão a agir ou tomar determinada decisão, devendo entender-se que há vício de forma quando a fundamentação for absurda, contraditória ou insuficiente, considerando que, estando em causa apreciações com inafastáveis elementos pessoais e zonas de avaliação não inteiramente racionalizáveis por mecanismos lógico-dedutivos, como é o caso dos actos de classificação, notação e avaliação do mérito e desempenho, de que é exemplo típico o concurso de graduação curricular para o STJ, a objectividade do juízo decisório só dificilmente pode ser manifestada e comprovada mediante um enunciado linguístico lógico-racional, sendo impossível justificar de modo silogisticamente perfeito uma qualificação ou classificação atribuída.
10.Ponto é, estando aqui em causa uma graduação da densidade do conteúdo declarativo exigível, como defende Vieira de Andrade, ob. citada, p. 265, que fique garantido o "quantum" indispensável ao cumprimento dos "requisitos mínimos" de uma fundamentação formal: a revelação da existência de uma reflexão, a indicação das razões principais que moveram o agente.
11.No caso vertente a senhora Juiz Desembargadora recorrente invoca a insuficiência da fundamentação referindo que, do parecer do júri, referente ao item "idoneidade" não se apreende a justificação da vontade do órgão decisor quanto à pontuação, de 92 pontos, que lhe foi atribuída, questionando concretamente a fundamentação relativamente a duas subalíneas, ou subscritérios, da alínea f) do ponto 6.1. do aviso de abertura do concurso, onde se prevê, como factor de avaliação, a idoneidade dos requerentes para o cargo a prover: o "grau de empenho na formação contínua e actualizada e na adaptação às modernas tecnologias" (subalínea iii), e a "qualidade dos trabalhos", subalínea ii).
12.Alega a senhora Juiz Desembargadora recorrente, quanto ao primeiro dos referidos subcritérios, "que o júri concluiu pelo elevado emprenho e interesse da concorrente, bem como pelo seu domínio das novas tecnologias a informação, transcrevendo o parecer um elenco muito vasto e variado das suas participações em encontros/cursos/colóquios formativos", concluindo a senhora Juiz Recorrente que, comparativamente com grande parte dos concorrente necessários, que neste item, foram melhor classificados do que ela, lhe é apontado um número mais vasto e variado de participações do que àqueles.
Todavia, na ausência de concretização, quer no que respeita aos concorrentes a que a Recorrente faz alusão, quer à respectiva classificação neste item, e estando a afirmação do júri relativamente à Recorrente devidamente sustentada e exteriorizada, até pela transcrição das participações da Recorrente em acções de carácter formativo, e concretizada, não se alcança onde se situe o déficit da fundamentação.
13.No que concerne ao subcritério "qualidade dos trabalhos", contemplado na subalínea ii) do ponto 6.1.      do aviso de abertura do concurso, alega a senhora Juiz Desembargadora recorrente que, a fundamentação da apreciação efectuada a seu respeito comparada com a fundamentação apresentada, neste subcritério, relativamente a cada um dos concorrentes graduados dos 42 a 142 lugar. Srs. Desembargadores ...., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., não permitem a um destinatário normal alcançar 0 que possa ter determinado uma menor valoração dos trabalhos da Recorrente, qualificados de muito boa qualidade, em relação ao desses concorrentes, todos qualificados de muito boa qualidade.
14.O que se constata, porém, é que, nos termos da respectiva fundamentação, a qualidade dos trabalhos apresentados pela senhora Juiz Desembargadora recorrente foi, como relativamente aos concorrentes mencionados, qualificada de muito boa, referindo 0 parecer as razões em que se fundou tal apreciação, pelo que, salvo o devido respeito, também não se vislumbra aqui insuficiência da fundamentação, sendo certo que, se ao critério referenciado na subalínea ii) da alínea f) do aviso de abertura do concurso, foi atribuída maior relevância pelo júri, os outros subcritérios da mesma alínea não deixaram de merecer ponderação, não sendo possível concluir que, ou se, a diferença de pontuação da Recorrente nesse critério de avaliação relativamente aos concorrentes mencionados, resulta, ou resulta exclusivamente, da ponderação do subcritério em questão.
Ao invocar a insuficiência da fundamentação, comparativamente com a dos demais candidatos, neste critério de avaliação, a senhora Juiz Desembargadora recorrente questiona indirectamente o mérito ou substância da avaliação contida na deliberação impugnada, a qual, todavia, salvo erro grosseiro ou manifesto, que não se descortina, não é sindicável em juízo, por se situar na margem ou espaço de discricionariedade do CSM na valoração dos factores ou critérios atendíveis para aferir do mérito relativo.
II - violação dos princípios da imparcialidade da Administração e da igualdade, por referência ao factor enunciado no ponto 6.1. alínea a) do aviso de abertura do concurso (anteriores classificações de serviço e fixação, pelo júri, como critério a atender a ponderação das três últimas notações)
15.Defende a Recorrente que no tocante ao factor enunciado no ponto 6.1. alínea a) do aviso de abertura do concurso (anteriores classificações de serviço) a deliberação impugnada incorre em violação dos princípio da imparcialidade da Administração e de igualdade, invocando, quanto ao primeiro, a violação do princípio da imparcialidade, que a definição pelo júri do critério a atender, da ponderação das três últimas notações atribuídas, não densificada no aviso de abertura do concurso, foi adoptado já na fase final de deliberação, após a apresentação das candidaturas, a realização das provas públicas e da própria finalização da graduação dos concorrentes necessários, e, quanto ao segundo, que resultou violado o princípio da igualdade porque não se adoptou um critério que colocasse todos os candidatos na mesma situação, uma vez que todos tinham 2 classificações de serviço, mas nem todos tinham 3 ou mais.
16.Relativamente à invocada violação do princípio da igualdade - com assento no artigo 139 da CRP, que na sua faceta negativa, implica que, uma vez apurada a identidade substancial entre situações, não se trate desigualmente o que é igual, e, em termos positivos obriga a tratar igualmente situações idênticas - constata-se que a senhora Juiz Desembargadora recorrente tinha 4 classificações de serviço, das quais 3 foram consideradas, pelo que, com o devido respeito, não se vislumbra como é que, relativamente à Recorrente, a definição pelo júri do critério a atender, da ponderação das três últimas notações atribuídas, redundou em tratamento desigual e afronta, em concreto, o princípio da igualdade.
17.A divulgação atempada dos critérios de selecção, entendida como anterior ao conhecimento dos elementos curriculares dos candidatos, visa dar transparência ao recrutamento, sendo o mínimo exigível como forma de assegurar que os critérios que virão a ser utilizados para graduação dos candidatos não são adaptados em função do perfil curricular dos candidatos, por forma a permitir beneficiar ou prejudicar algum deles. Trata-se de uma regra que é corolário do princípio constitucional da imparcialidade, cuja observância é constitucionalmente imposta à generalidade da actividade da Administração Pública (art. 266.º, n. 2, da CRP e 6.º do CPA)([9]) .
18.Este tem sido também o entendimento deste Supremo Tribunal de Justiça que em vários arestos([10])  tem afirmado que "para a garantia da igualdade de oportunidades dos concorrentes ao concurso curricular de acesso ao STJ tudo o que possa interessar à selecção, classificação e graduação dos concorrentes tem que estar definidos e publicitado em momento anterior ao conhecimento da identidade dos concorrentes, ou, pelo menos, em momento anterior àquele em que o júri tenha possibilidade de acesso aos currículos, ou, quando muito, em momento anterior ao da classificação e graduação".
19.A jurisprudência deste Supremo tribunal([11])  tem também perfilhado o entendimento de que não ofende os princípios constitucionais da igualdade, justiça e imparcialidade, a circunstância de a publicitação da deliberação que define os critérios de avaliação e ponderação a usar no concurso de acesso ao Supremo ter ocorrido quando o CSM já dispunha dos currículos de muitos dos candidatos se aquela deliberação não contiver nenhum elemento de avaliação verdadeiramente novo, susceptível de constituir surpresa para os candidatos, em face dos já estabelecidos no artigo 522 da Lei ns 21/85, de 30 de Julho, que aqueles, por força da sua condição de magistrados judiciais, não pudessem desconhecer.
Recentemente, no acórdão de 21.11.2012, proferido no Procº nº 2/12.4YFLSB, sobre a densificação dos critérios de avaliação do mérito pelo júri do concurso, entendeu este Supremo Tribunal o seguinte:
I- O actual modelo de concurso curricular de acesso ao STJ comporta uma objectivação adequada e razoável dos critérios de valoração do mérito relativo dos candidatos, decorrente da previsão, desde logo no próprio EMJ, dos parâmetros fundamentais relevantes.
II - Na verdade, é a própria Lei - o EMJ - que começa, no art. 52. °, por tipificar e objectivar o método de selecção — avaliação curricular — e os critérios e parâmetros fundamentais para a realização de tal tarefa, ao prescrever os diversos factores a ter em conta (n° 1). Por outro lado, esta indispensável tarefa de densificação e objectivação dos critérios e parâmetros legais de aferição do mérito foi aprofundada pelo aviso que determinou a abertura do concurso, onde o Plenário do CSM estabeleceu, nomeadamente, o sistema de classificação dos candidatos - definindo certas balizas numéricas para quantificar a aferição dos parâmetros relevantes para a avaliação curricular.
IV- Assim, na segunda reunião do júri, mediante deliberação, procedeu-se a uma complementar densificação dos critérios subjectivos de apreciação dos trabalhos e à definição dos critérios avaliativos e, na acta que contém a deliberação sobre o parecer do júri, introduziram-se algumas concretizações adicionais quanto a certos critérios valorativos. Efectuaram os membros do júri as discussão e análise pormenorizadas dos curricula dos concorrentes, dos trabalhos apresentados e dos relatórios preliminares. Procedeu-se à defesa pública, por cada concorrente, dos respectivos currículos, sendo as respectivas avaliações tidas também em conta na avaliação global a efectuar. Nas avaliações globais dos candidatos foram igualmente, para efeitos de apreciação relativa do respectivo mérito, tidas em conta as três «categorias» a que os mesmos pertencem (concorrentes necessários, voluntários e juristas de reconhecido mérito e idoneidade cívica).
V - Ao definir tais parâmetros adicionais e supervenientes o júri limitou-se a explicitar algo que já se devia ter por compreendido numa correcta e adequada interpretação dos parâmetros valorativos inicialmente definidos - por carecerem tais concretizações ou densificações adicionais de carácter materialmente constitutivo e substancialmente inovatório - não se vendo que possam resultar afectados aqueles princípios fundamentais que regem o concurso de admissão ao exercício de funções públicas".
20.No caso sub judice o ponto nº 12 do aviso de abertura do concurso mencionava expressamente que "relativamente a cada concorrente é aberto um processo individual de candidatura, no qual (...) se integram os elementos relevantes, designadamente os extraídos do respectivo processo individual (v.g., percurso profissional, classificações de serviço, relatórios das três últimas inspecções (...)".
21.Face ao aviso de abertura do concurso, a definição pelo júri, no tocante ao factor enunciado no ponto 6.1. alínea a) do aviso de abertura do concurso (anteriores classificações de serviço), como critério a atender a ponderação das três últimas notações atribuídas, nada tem de inovador ou de incongruente ou violador da "lei habilitante", o artigo 522 do EMJ, não legitimando, por parte dos concorrentes obrigatórios, qualquer expectativa de continuidade no sentido de que o critério a atender fosse, como em concurso anterior, o da última notação/classificação de serviço, sendo que os concorrentes não tinham o direito de que se mantivesse inalterado anterior critério, nem tinham razões fundadas para crer que assim seria, não se verificando, portanto, a invocada violação do princípio da imparcialidade.
III         - Nestes termos, e é esse o nosso parecer, deve o presente recurso ser julgado improcedente.

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9- Fundamentação de facto
A) Na Sessão Plenária Ordinária do CSM, realizada em 8/07/14, foi tomada a seguinte deliberação:
 “Aprovar por unanimidade o parecer do júri, que aqui se dá por integralmente reproduzido, ficando em anexo a esta acta, com as alterações supra referidas.

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10- Fundamentação de direito:

As questões a resolver são as seguintes:

A. Fundamentação - Artigo 125º do referido CPA.

B. Violação dos princípios da transparência e da igualdade - Anteriores classificações de serviço.

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A- Fundamentação- Artº 125º  do CPA

Como se refere no acórdão proferido em 9-7-15 (processo 51/14.8YFLSB da Secção do Contencioso deste STJ , o dever de fundamentação encontra, desde logo, fundamento jurídico-constitucional, seja com referência à Administração [Artigo 268º/3 da Constituição da República (CRP): «Os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei,e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos»] seja com referência aos Tribunais [Artigo 205º/1 CRP:  «As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei».

É, aliás, como se entende, pelo cumprimento do dever de fundamentação que tanto a decisão administrativa quanto a iuris dictiologram, de uma parte, firmar a sua legitimação democrática e, de outra, proporcionar ao cidadão e/ou às partes no processo a razão ou razões seja do ganho de causa seja do decaimento nas pretensões formuladas, propiciando, relativamente a estas, a formulação de um juízo quanto à viabilidade de uma impugnação via reclamação ou recurso.

Fundamentação: com que limites?

O entendimento praticamente unânime, ao nível deste Supremo Tribunal de Justiça, aponta para limites apertados, de acordo com os quais, em formulação negativa, a falta de fundamentação apenas é identificável com a «total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão» ([[12]]), com a «falta absoluta da fundamentação de direito e não também (com) a sua eventual sumariedade ou erro» ([[13]]), não bastando, enfim, «que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente» ([[14]]), que seja «uma justificação deficiente ou pouco convincente, antes impondo ausência de motivação que impossibilite a revelação das razões que levaram à opção final». ([[15]])

Menos restritamente, dever-se-á entender, se bem se ajuíza, que a fundamentação não poderá obviar a uma parametrização gizada à luz do princípio fundamental da adequação e/ou razoabilidade e/ou proporcionalidade, exigindo-se, desta arte, que a mesma seja, no mínimo, suficiente, inteligível, congruente.

Na assunção de um critério geral, dir-se-á, ainda, com Rogério Soares e Vieira de Andrade «[q]ue sob o conceito de fundamentação, se encontram duas exigências de natureza diferente: por um lado, está em causa a exigência de o órgão administrativo justificar a decisão, identificando a situação real (ou de facto) ocorrida, subsumindo-a na previsão legal e tirando a respetiva consequência; por outro lado, nas decisões discricionárias está em causa a motivação, ou seja, a exposição do processo de escolha da medida adotada, que permita compreender quais foram os interesses e os fatores (motivos) que o agente considerou nessa opção.» ([[16]])

Dando os primeiros passos no sentido do conhecimento concreto da questão sub specie, atender-se-á, desde logo, à imperatividade, in casu, do dever da fundamentação, já por via do sobredito fundamento constitucional, já por exigência imediata da lei ordinária – artigo 124º, nº1 al. b ) do Código do Procedimento Administrativo (CPA) quando dispõe:

«Para além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem ser fundamentados os atos administrativos que, total ou parcialmente: b)Decidam reclamação ou recurso».

Ter-se-ão em conta, outrossim, os «Requisitos da fundamentação» definidos, em particular nos itens 1 e 2 do artigo 125º do referido CPA:

«1. A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato; 2. Equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.»

Uma breve nota de referência ao pressuposto de que a exposição ou expressão dos fundamentos do ato deve ser sucinta, para significar, transcrevendo Mário Esteves de Oliveira/Pedro Costa Gonçalves/ J.Pacheco de Amorim, que «como se diz «no Ac. do STA de 8.VI.95, 1ªSecção, “a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo legal de ato a fundamentar…» : «Trata-se, no fundo, de harmonizar a necessidade de uma fundamentação suficiente com a da sua clareza, da sua apreensibilidade».([[17]])

Postos estes considerandos importa agora debruçarmo-nos sobre o concreto dos autos.

A recorrente entende que, em relação ao critério identificado no ponto n.° 6, f) - idoneidade dos concorrentes - do aviso de abertura do concurso, o acto recorrido, conquanto não tenha um cariz absurdo ou contraditório, padece de insuficiência de fundamentação já que não se encontra esclarecido o caminho que levou o júri e o CSM a atribuírem, a pontuação de 92 pontos à ora Recorrente e uma pontuação entre 93 e 97 pontos a vários candidatos que ficaram graduados à sua frente.

Defende que em matéria concursal , aquilo que sobreleva não é apenas a ponderação feita sobre cada concorrente, mas a ponderação relativa entre os vários concorrentes, de forma a que o destinatário — e qualquer terceiro - compreenda a graduação efectuada.

No caso a recorrente considera que a fundamentação não é suficiente, porque, em relação ao item “idoneidade”, não é possível que um destinatário normal se aperceba da verdadeira justificação que decidiu o júri acerca da diferente pontuação atribuída à Recorrente em relação aos outros concorrentes mais pontuados (e com excepção dos três primeiros graduados).

Tal insuficiência equivale á falta de fundamentação como resulta do artº 125º do CPA, o que geraria a sua anubalilidade.

Afigura-se-nos não assistir razão á recorrente.

Na verdade num concurso com a magnitude e abrangência daquele sobre o qual nos debruçamos não há possibilidade de fazer a ponderação/ fundamentação sobre cada concorrente isoladamente, mas a ponderação relativa entre os vários concorrentes que se situem dentro dum patamar, que muito dificilmente pode ser de igualdade ,mas de aproximação. Neste âmbito terá que funcionar forçosamente alguma discricionariedade subjectivada, donde se possa retirar a razão porque o decisor se inclinou mais por um ou outro ponto.([18])

Plasmados os méritos e deméritos de cada um , a justificação do  resultado parcial/final da valorização entre candidatos de “muito boa qualidade” colocados dentro do mesmo patamar e que determina a variação milimétrica da pontuação, terá que decorrer forçosamente dentro de uma margem subjectiva mínima de apreciação, do Júri e do CSM, difícil ou mesmo impossível de ser alcançada por qualquer destinatário. Por isso já se defendeu que não cabe ao STJ sindicar o juízo valorativo formulado pelo CSM, a menos que enferme de erro manifesto ou se os critérios de avaliação forem ostensivamente desajustados,o que não é visível no caso.([19])

Neste sentido também o acórdão deste STJ de 05-07-2012- Proc.n.º 141/11.9YFLSBII quando defende que o CSM goza, nas matérias de graduação  e  classificação,  da  chamada  discricionariedade técnica,  insindicável,  caracterizada  por  um  poder  que,  embora  vinculado  aos  preceitos legais,  lhe  deixa  margem  de  liberdade  de  apreciação  dos  elementos  fácticos. 

Relativamente a deliberações do CSM para graduação de concorrentes ao STJ cumpre o dever de fundamentação, a explanação do iter seguido para a determinação classificativa.

Nestes casos, mostra-se respeitado o dever de fundamentação, tal como o deixamos caracterizado supra, com a fixação descriminada e objectivada dos dotes de cada candidato. Só esta não se encontra subtraída, à apreciação do Supremo Tribunal de Justiça.

III -… num  concurso  curricular,  a  avaliação  do  mérito  profissional  dos  candidatos,  ainda  que “partindo  da  apreciação  de  elementos  objectivos/formais”,  “realiza-se  num  espaço  de liberdade de valoração para a realização dos fins e necessidades que, em certo momento, a  administração  da  Justiça  reclame.  Trata-se,  aí,  de  uma  discricionariedade  típica  da Administração”.

IV -Não  existindo  qualquer regra  técnica,  ou  preceito jurídico,  que  permita  ao  STJ considerar como bons ou maus os juízos de valor feitos pelo CSM–e não sendo patente que se tenha praticado qualquer erro grosseiro na apreciação dos elementos curriculares, com a adopção de   um tratamento discriminatório,   visando   ostensivamente   prejudicar,   no   balanço comparativo, o recorrente–não há razão válida para censurar a deliberação, que se moveu no estrito âmbito dos critérios que presidiram à respectiva operação.([20])

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B- Violação dos princípios da transparência e da igualdade- Anteriores classificações de serviço

Neste ponto, em relação ao critério “anteriores classificações de serviço”, a Recorrente não se conforma com a circunstância de o júri ter adoptado, já em fase de deliberação final - o que foi sancionado pelo CSM -, uma ponderação das três últimas classificações de serviço, quando os concorrentes contavam com um critério que levasse à consideração de apenas a última classificação ou, no limite, das duas últimas classificações, como foi a regra nos anteriores concursos curriculares» (cfr. conclusão K da petição de recurso), situação que, em seu entender, gera os seguintes vícios:

«- Primeiro, violação do princípio da imparcialidade, porque foi adoptado um critério, já na fase final de deliberação - após a apresentação das candidaturas, a realização das provas públicas e da própria finalização da graduação dos concorrentes necessários - , que não só não se encontrava densificado no aviso de concurso - nada impedindo que o tivesse sido, atendendo à sua natureza objectiva -, como diverge do que até então fora praticado (maxime no último concurso), com o que todos os concorrentes contavam;

-Segundo, a violação do princípio da igualdade, porque não se adoptou sequer um critério que colocasse todos os candidatos na mesma situação, uma vez que todos tinham 2 classificações de serviço, mas nem todos tinham 3 ou mais (...)» (cfr. alíneas N e O das conclusões da petição de recurso).

Vejamos:

Mais uma vez afigura-se-nos não assistir razão à recorrente.

Na verdade, como nota o recorrido, após discussão sobre o número de notações a considerar, a posição que fez vencimento respeita o aviso de abertura do concurso, pois, no ponto 12 deste aviso, se refere que no processo individual dos concorrentes constam, além do mais, as classificações de serviço e os relatórios das três últimas inspecções.

Deste modo não se pode concluir que a recorrente tenha sido surpreendida, já que a deliberação que fez vencimento se situa dentro do âmbito dos limites do aviso concursal que, atempadamente ,teve conhecimento.

A tal conclusão não obsta o facto de apenas a última classificação ou, no limite, das duas últimas classificações, ter sido a regra nos anteriores concursos curriculares.

Neste sentido o Ac. do STJ de 26-06-13 (Proc. Nº 114/12.4YFLSB)”As anteriores decisões não consubstanciam fonte de direito, não criam precedente vinculativo, não condicionam a actuação futura do órgão administrativo, que a cada momento tem plena liberdade de decidir de modo diferente do que no passado, revendo orientações e adoptando critérios que, a cada momento considere mais adequados e mais de acordo com a lei”.

Acresce que não se verifica violação do princípio da igualdade. A este respeito referem Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da Republica Anotada pag 801) que “Pretende-se, especificamente, salientar a vinculação da Administração Pública, que, nas relações com as pessoas, físicas ou colectivas, deve adoptar igual tratamento. Em termos negativos, o princípio da igualdade proíbe tratamentos preferenciais; em termos positivos, obriga a Administração a tratar de modo igual situações iguais. O princípio da igualdade aponta ainda para o princípio da auto vinculação da Administração, estruturalmente associado ao princípio da imparcialidade, querendo-se significar com isto a exigência de as normas jurídicas dadoras de poderes discricionários à Administração serem concretizadas consistentemente segundo os mesmos critérios, as mesmas medidas e as mesmas condições a todos os particulares a quem venham a ser aplicadas e se encontrem em situação idêntica”.

No caso, fixados os critérios, foram estes aplicados de forma uniforme a todos os candidatos, pelo que também não se vislumbra como pode ter sido violado o princípio da imparcialidade.

11-DECISÃO:


Nesta conformidade, acorda-se em julgar improcedente o recurso contencioso interposto pela Exma Desembargadora Dra. AA
Custas a cargo da recorrente, conforme art. 527.º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil, com taxa de justiça que se fixa em 6 Ucs, nos termos do disposto na Tabela I-B, anexa ao Regulamento das Custas Judiciais, e art. 7.º, nº 1 deste mesmo diploma, sendo o valor da presente acção de 30.000,01€, atento o disposto no art. 34.º, nº 2 do CPTA.
Notifique.


   Nestes termos e pelos fundamentos apontados julgam-se parcialmente procedentes as revistas interpostas pelos AA. e pela R. II e improcedente a revista interposta pela R. HH, e, em consequência, revogando em parte o acórdão recorrido:

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Lisboa, 2015-10-29      

João Trindade (Relator)
Martins de Sousa
Santos Cabral
Mário Belo Morgado
Souto de Moura
Ana Paula Boularot
Sebastião Póvoas (Presidente da Secção)
                                                                                                                                

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[1] -Cfr. Ponto 3 da alegação
[2] -cfr. Ponto 4 das alegações da recorrente
[3] -Cfr. O acórdão do STJ de 7-12-2005, no Processo 2381/04
[4] Idem p. 239
[5] Cfr. Artigos 84º) a 10º) de tal articulado.
[6] -Aprovado pelo D.L: nº 442/91 de 15 de Novembro, com as alterações introduzidas pelos D.L. 6/96 de 31 de Janeiro, e 18/2008 de 29 de Janeiro, aplicável na situação sub iudice, entretanto revogado pelo D.L. nº 4/2015 de 7 de Janeiro ,recentemente entrado em vigor.
[7] Cfr. João Caupers, Direito Administrativo, Notícias editorial,1998,p. 217
[8] -Cfr. José Carlos Vieira de Andrade, “O dever de fundamentação Expressa dos Actos Administrativos”,1991-Boletim da faculdade de Direito,Coimbra,Suplemento,CVol. XXXVII,pags. 233-235 e 260-270
[9] Cfr. Acórdão do Pleno da secção do CA do STA de 13-11-2007,Procº nº 01140/06
[10] Cfr. Acórdãos STJ de 29.6.2005,Procº 2382 e de 19.2.2013,procº 103/12, 9YFLSB
[11]-Cfr. Acórdão citado de 2005
[12] Ac. STJ de 05.05.2005, Proc. 05B839.dgsi.Net
[13] Ac. STJ de 12.05.2005, Proc. 05B840.dgsi.Net
[14] Ac. STJ de 05.11.2002, Proc.047814.dgsi.Net
[15] Ac. STJ de 18.04.2006, Proc.06A871.dgsi.Net
[16] Citados por MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES,J.PACHECO DE AMORIM – CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO, COMENTADO, 2ª EDIÇÃO, Almedina, pág. 591
[17] Ibidem, 601 e 603
[18] .II -Numa  graduação existe sempre uma inescapável margem de subjectividade e de liberdade de  apreciação.  Com  efeito,  a  avaliação  não  tem  apenas  por  suporte  elementos  objectivos- Ac. STJ 19-09-2012Proc. n.º 136/11.2YFLSB
[19] Ac. STJ de 19-9-12 – Proc. Nº 10/12
[20] Ac. STJ de 19-09-2012 Proc. n.º 138/11.9YFLSB