Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
26881/15.5T8SNT.L1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: OLIVEIRA ABREU
Descritores: ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
REVISTA EXCECIONAL
RECURSO DE REVISTA
DUPLA CONFORME
FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PODERES DE COGNIÇÃO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
QUESTÃO NOVA
NULIDADE DE ACÓRDÃO
Data do Acordão: 05/11/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. Verificada a dupla conforme, impõe-se ao Supremo Tribunal de Justiça que não conheça do objeto da revista, em termos gerais, por inadmissibilidade, podendo colocar-se a questão da remessa à Formação para apreciar do interposto recurso excecional de revista.

II. O que delimita o recurso e constitui o seu ponto de cognoscibilidade é a decisão impugnada, não podendo, o respetivo âmbito, exceder o que foi fixado e delimitado pela atividade cognoscente do órgão jurisdicional.

III. Os recursos são meios de obter a reponderação das questões já anteriormente colocadas e a eventual reforma de decisões dos tribunais inferiores, e não de alcançar decisões novas, só assim não acontecendo nos casos em que a lei determina o contrário, ou relativos a matéria indisponível, sujeita por isso a conhecimento oficioso.

IV. As nulidades são irrelevantes para o efeito de admissibilidade do recurso interposto, pois, apesar de constituírem fundamento de revista nos termos do art.º 674º n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, não são elas próprias definidoras da admissibilidade desse recurso, a qual está prevista no art.º 671º n.ºs 1 e 2 do citado Código de Processo Civil, ficando a sua arguição dependente da sua admissibilidade, a par de que a sua invocação não prejudica a existência da dupla conformidade.

V. Reconhecendo-se que a revista excecional está sujeita a formalidades próprias, em razão da respetiva particularidade, designadamente, para além de ter de satisfazer um dos pressupostos previstos no art.º 672º n.º 1 do Código de Processo Civil, só é possível desde que a revista, em termos gerais, seja admissível, mas não permitida por efeito da conformidade de julgados, importa reconhecer que, não estando preenchidos os pressupostos para que a Formação se pronuncie sobre os fundamentos aduzidos com vista a atribuir, ou não, excecionalidade à interposta revista, não faz sentido invocar a excecionalidade da revista para ultrapassar o obstáculo recursório decorrente da conformidade das decisões, quando o conhecimento do objeto da revista está vedado ao Supremo Tribunal de Justiça por estar fora do âmbito da sua competência decisória.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



I. RELATÓRIO


1. AA interpôs a presente ação comum, contra, BB, CC, DD e EE, peticionando:

a) Sejam os RR. CC, DD e EE condenados a reconhecerem o crédito de AA, nos termos constante da sentença proferida no âmbito do processo n° 22946/11...., que correu termos na Comarca da Grande Lisboa - Noroeste, Juízo de Grande Instância Cível ... - ... Secção - Juiz ..., e que contra o Réu BB já se encontra reconhecido na dita sentença;

b) Sejam os Réus condenados a reconhecer, o direito de o Autor aceitar a herança aberta por óbito de FF, repudiada pelo Réu BB;

c) Subsidiariamente, seja o ato de repúdio constante da escritura pública lavrada a 10-12-2014, no Cartório Notarial ..., a fls. 40 a fls. 40v. no Livro de Notas para escrituras Diversas n° 519, declarado nulo e de nenhum efeito, por simulado, e, consequentemente, ordenado o cancelamento de eventuais registos prediais efetuados a favor de CC, DD e EE relativamente aos prédios da herança aberta por óbito de FF.

Articula, com utilidade, que o Réu, BB foi condenado por sentença transitada em julgado a quantia de 90.500,00€, executou tal sentença, tal Réu não tem bens suficientes para garantirem o pagamento do seu crédito, tal R. repudiou o direito à herança aberta por óbito de sua mãe, a qual tem bens de valor bastante, pelo que está a ser prejudicado pelo repúdio.

Por ter ocorrido o decesso do Réu, BB foram habilitados no Apenso A. por sentença transitada em julgado os Réus, CC, DD e EE.

2. Regularmente citados, contestaram os Réus, invocando, por exceção, a caducidade do direito de ação por terem decorrido mais de seis meses a contar do conhecimento pelo A. do repúdio; erro na forma de processo por ter sido instaurada ação declarativa de condenação e não processo de jurisdição voluntária; a ineptidão da petição inicial; a simulação processual por ter sido invocado um crédito que inexiste, uma vez que devedora era a sociedade S..., Lda., declarada insolvente tendo o A. aí reclamado créditos, os quais não lhe foram reconhecidos; a existência de causa prejudicial por ainda não ter havido decisão no recurso de revisão interposto da sentença que condenou BB a pagar ao A. a quantia de 90.500,00€, outrossim, por impugnação, negaram a ocorrência de factos alegados pelo Autor.

3. Notificado o Autor para, querendo, responder à matéria de exceção invocada, veio o mesmo pugnar pela improcedência das exceções invocadas.

4. Foi realizada audiência prévia na qual foi suspensa a instância até ser proferida decisão transitada em julgado no Processo n.º 22946/11.... de recurso de revisão da sentença proferida nos autos principais.

5. Proferida decisão final no referido apenso do Processo n.º 22946/11...., foi julgada cessada a suspensão da instância.

6. Foi proferido despacho saneador, relegando para final o conhecimento da exceção de caducidade do direito de ação; julgando verificado o erro na forma de processo mas admitindo a cumulação de pedidos e julgando improcedente a simulação processual por já se mostrar verificado o crédito do Autor no Processo n.º 22946/11.....

7. Em 15 de dezembro de 2020, foi proferido despacho de não admissão do articulado superveniente apresentado pelos Réus, em 8 de outubro de 2020.

8. Os Réus recorreram deste despacho, apelação essa que deu origem ao apenso B dos presentes.

9. Realizada audiência final, foi proferida sentença, em 11 de abril de 2022, em cujo dispositivo se consignou:

“Face ao exposto julgo a presente acção totalmente procedente por provada e, consequentemente:

A) Condeno os RR. CC, DD e EE a reconhecerem o crédito de AA, nos termos constante da sentença proferida no âmbito do processo n° 22946/11...., que correu termos na Comarca da Grande Lisboa - Noroeste, Juízo de Grande Instância Cível ... - ... Secção - Juiz ..., sobre BB.

B) Declaro a aceitação pelo A. AA, da herança deixada por óbito de FF, até ao limite da quota que caberia ao R. falecido BB, e no limite do crédito reconhecido no processo n° 22946/11...., que correu termos na Comarca da Grande Lisboa - Noroeste, Juízo de Grande Instância Cível ... - ... Secção - Juiz ....

Custas a cargo dos RR..

Valor: 104.890,74€.”

10. Em 26 de abril de 2022, foi proferido acórdão no referido apenso B, pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou improcedente a apelação interlocutória, mantendo o despacho recorrido.

11. Os Réus interpuseram recurso de revista desse aresto, para o Supremo Tribunal de Justiça, que foi rejeitado por despacho de 13 de julho de 2022.

12. Inconformados relativamente à sentença proferida nestes autos, os Réus interpuseram recurso de apelação, tendo a Relação conhecido do objeto da apelação ao proferir acórdão, do qual consta:

“Assim, em face do que se acaba de expor e das conclusões apresentadas, são as seguintes as questões a resolver por este Tribunal:

Nulidade da sentença proferida.

IV. O Direito

Da nulidade da sentença proferida.

A única questão neste recurso consistirá na análise da alegada nulidade da sentença proferida.

Entendem os recorrentes que a referida sentença é nula, nos termos do disposto no art. 615º, nº1, c) e d) do Código de Processo Civil, pela seguinte ordem de razões:

1. Por não poderem os ora Recorrentes aceitar a douta Sentença, que desde logo enferma de nulidade ao abrigo do disposto no artigo 615.º 1) c) e d) do CPC, que desde já se argui;

2. Uma vez que, a mesma é proferida quando ainda não decorreu o trânsito em julgado do Recurso interposto pelos aqui Réus quanto à não admissibilidade do articulado superveniente, que apresentou nos Autos aos 08.10.2020 e que corre termos sob o n° de processo 26881/15.5T8SNT-B.L1, ... Secção deste Venerando Tribunal da Relação de Lisboa.

3. Bem como, se arguiu nulidade da Douta Sentença, pelo facto de o Tribunal a quo, pelo menos em Audiência de Julgamento e Produção de Prova, tomou conhecimento, oficiosamente, de factos que, notoriamente, demonstram a simulação de negócio, geradora de nulidade.”

Tendo concluído no respetivo dispositivo: “Pelo exposto, os Juízes da 6.ª Secção da Relação de Lisboa acordam em, na improcedência da apelação, manter a decisão recorrida.”

13. É contra esta decisão que os Réus/BB e outros se insurgem, interpondo revista excecional ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do art.º 672º do Código de Processo Civil, formulando as seguintes conclusões:

“1 - AS “RAZÕES PELAS QUAIS A APRECIAÇÃO DA QUESTÃO É CLARAMENTE NECESSÁRIA PARA UMA MELHOR APLICAÇÃO DO DIREITO”, NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ARTIGO 672.º/2/A) DO CPC, assenta na necessidade de que se faça justiça em nome do seu falecido Pai, e que a verdade, aliás, a única verdade, seja reposta, e que seja proferida uma Decisão que consubstancie exactamente isso, sob pena de se violar a sagrada segurança jurídica dos cidadãos e a constitucionalidade do direito.

2 - Efectivamente, os aqui Recorrentes esperam que este Colendo Supremo Tribunal de Justiça faça uma análise detalhada e aos olhos da Lei aplique a Justiça no tocante à Decisão da Causa de Pedir e origem do facto, e dado como provado, o montante entregue pelos Autores ao falecido pai dos aqui Réus e habilitados nos Autos.

3 - Torna-se assim relevante a estes Autos e à justeza na ponderação das razões e consequente aplicação do direito ter em conta e consideração que o montante pecuniário, entregue pelo Recorrido ao Pai dos aqui Recorrentes se traduzia num pagamento efectuado a título de sinal e por conta do preço de um imóvel, no âmbito do Contrato de Promessa de Compra e Venda outorgado entre os AA enquanto promitentes compradores e a sociedade comercial, representada pelo falecido pai dos RR enquanto construtora e promitente vendedora.

4 - Cumpre apreciar em nome do princípio da verdade material e da segurança jurídica, que não se trata de modo algum de um mútuo, como tem ficado assente e que leva à injustiça das decisões até agora proferidas, mas que este Colendo Tribunal não pode aceitar, e por conseguinte, revogá-las na estrita obediência ao que é de Justiça!

5 - O Tribunal a quo assim como o da Relação de Lisboa entendem que não podem apreciar matéria, in casu, a origem do crédito dos AA, uma vez que já decidido, por decisão transitada em julgado, invocando o princípio da segurança do transito em julgado.

6 - Cumpre saber e decidir, atento o conflito dos direitos em causa, por um lado uma decisão transitada em julgada por falta de contestação do Réu, em que tão pouco foi apreciada e provada a origem do crédito e por outro lado a verdade material confessada pela própria Autora em ambos os processos, que acaba por se contradizer nos autos em que invoca o mútuo e em audiência de discussão e julgamento destes autos em que confessa que o dinheiro que entregou foi para pagamento de um sinal de um imóvel da sociedade construtora.

7 - Dúvidas não restarão que os AA invocaram factos falsos na Decisão já transitada em julgada a seu favor, sendo notória a simulação processual, que impõe a nulidade da decisão já transitada em julgado tendo em conta o superior interesse e princípio da descoberta da verdade material.

8 - Não se aprecia a verdade em beneficio de um trânsito em julgado assente em premissas falsas!

9 - Razão pela qual, e para contextualizar os motivos que impõem uma apreciação da questão para uma melhor aplicação do direito, expõe-se a este Colendo Supremo Tribunal de Justiça a cronologia dos processos e factos ao longo dos anos e do motivo que justifica o conhecimento tardio por parte dos Recorrentes da Decisão proferida no âmbito de uma acção declarativa não contestada pelo pai dos RR.

10 - O Autor AA, nos Autos Principais, instaurou aos 06/06/2011 contra o Réu BB, pai dos aqui Recorrentes, Acção Declarativa de Condenação para pagamento da quantia de Euros 90.500,00, acrescida de juros, invocando para tanto, e como causa de pedir a existência de um contrato de mútuo celebrado entre si e o Réu BB, pai dos Recorrentes, empréstimo que lhe terá feito, cujo processo correu termos sob o nº Processo N.º 22946/11.....

11 - O Réu BB foi citado aos 28/05/2012, mas não apresentou a sua Defesa, tendo por isso sido condenado nos termos e para os efeitos no disposto no artigo 567.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, conforme decisão junta aos Autos.

12 - A Sentença transitou em julgado no dia 05/12/2013.

13 - O Réu veio a falecer aos .../02/2016, conforme assento de óbito habilitação de herdeiros, juntos aos autos.

14 - Aos 06/06/2016, no seguimento do falecimento do Pai dos aqui Recorrentes, os mesmos foram habilitados e chamados na Acção Declarativa de Condenação com o nº de processo 26881/15.5T8SNT a correr termos no Juiz ... – Juízo Central Cível ... – Tribunal Judicial da Comarca ....

15 - Acção que tem por objecto e causa de pedir, em suma, o reconhecimento do Autor como credor dos aqui RR, reclamando a sua posição creditícia, na herança da Avó Paterna dos ora Recorrentes, FF, uma vez repudiada pelo falecido Réu BB, tendo-lhe aqueles sucedido pelo repudio.

16 - O Autor motivou essa acção atendendo ao crédito detido sobre o primitivo Réu, e pai dos ora RR no valor de Euros 104.890,74, resultante da condenação deste nos Autos Principais desta acção [Processo N.º 22946/11....].

17 - À data do falecimento do Pai os irmãos, aqui RR, tinham, 27 anos de idade (os gémeos) e 20 vinte anos de idade.

18 - Contudo, logo que tomaram conhecimento da existência daqueles Autos, os Recorrentes interpuseram, por apenso, Recurso Extraordinário de Revisão perante o Digníssimo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste ..., fundamentando-o nos termos das alíneas b), c) e g) do disposto no artigo 696.º do C. P. C. , nomeadamente, porque foram reunindo documentação junto do processo de insolvência da sociedade de construção que o pai era sócio e gerente, S... Lda, que contrariava a Decisão condenatória nomeadamente a causa de pedir.

19 - Para a motivação do pedido de condenação do Réu, pai dos aqui Recorrentes na primitiva acção declarativa, no pagamento do valor apresentado, o Autor invocou o incumprimento de um alegado empréstimo pessoal que lhe tinha feito, celebrado entre si e o Réu, quando, na realidade, o valor creditício existente resultou do incumprimento de um contrato de promessa de compra e venda de imóvel celebrado entre si (Autor) e a sociedade S..., Lda., da qual o Réu era seu mero representante legal.

20 - A sociedade S..., Lda. havia construído uns imóveis, e na qualidade de proprietária, vendeu uma fracção ao ali Autor, AA, tendo celebrado contrato de promessa de compra e venda com o falecido BB, entregue o sinal de Euros 90.500,00,

21 - Sem que, contudo, a Escritura Pública tenha sido realizada, pela entretanto declarada insolvência da sociedade promitente vendedora S... Lda.

22 - Foi entregue pelo Autor ao falecido BB a quantia de Euros 90.500,00 a título de sinal, mas que o Autor reclamou o dobro do sinal entregue, no âmbito da reclamação de créditos junta aos Autos do Tribunal de Comércio em ....

23 - Pelo que, a verdade é só uma, o Autor nunca mutuou tal quantia ao falecido, BB, Pai dos Recorrentes, razão pela qual jamais poderia arrogar-se de um crédito, pessoal, que tão pouco mutuou!

24 - Deste modo, apela-se a este Colendo Supremo Tribunal de Justiça a notória inconstitucionalidade de a verdade material não se impor à verdade formal, porque o que deve prevalecer é a descoberta da verdade.

25 - E a verdade no caso concreto é apenas uma, o Recorrido entregou quantias ao Pai dos RR a título de sinal para compra de um imóvel cujo negócio ficou por finalizar, celebrando Escritura de Compra e Venda no âmbito do processo de insolvência tal como referido pela própria administradora de insolvência, em declarações que prestou em Audiência, deduzindo as quantias que entregou a titulo de sinal, vindo ainda assim, exigir aos aqui RR, enquanto herdeiros do seu falecido Pai, o pagamento do sinal em dobro, como se o tivesse perdido, não tendo feito o negocio.

26 - O Recorrido mentiu ao Tribunal a quo na indicação de causa de pedir que o levou a ganhar a acção por falta de contestação do Recorrido, e jamais se pode conceber que a mentira mais do que demonstrada possa prevalecer.

27 - A descoberta da verdade material é a pedra chave da filosofia do processo civil, não podendo, nem devendo, ser postergada através duma aplicação tabelar, que esquece a própria tempestividade do inquisitório atribuído ao juiz e seus efeitos quanto à aplicação do direito substantivo.

28 - A necessidade de que o tribunal decida de acordo com a verdade material não significa que esta deva ser obtida de qualquer modo. O que seria mais adequado a um tribunal norteado pelo populismo e pelo justicialismo, característico de situações sociais de anarquia em que as instituições vão surgindo e funcionando de forma espontânea.

29 - A obtenção da verdade material tem regras e leva-nos àquilo que é normalmente chamado de verdade formal, ou seja, aquela que é obtida por certa forma, ou por certas formas processuais. A verdade formal não é uma mentira, mas a verdade material que foi possível obter. Daqui que a qualidade processual de um sistema de justiça avalie-se pela capacidade de aproximar a "sua" verdade da verdade "real", que é apenas o que os aqui Recorrentes pretendem!

30 - Assim sendo, os Recorrentes tomaram conhecimento, da Reclamação de Créditos Reconhecidos | Reclamação de Créditos apresentado pelo Autor no processo de insolvência da sociedade S..., Lda., que correu termos com o n.º 1347/08.... - em conjugação com toda a demais factualidade, apresentando-se susceptível de operar numa mudança da Decisão alcançada, agora em sentido mais favorável à parte vencida.

31 - Na Reclamação de Créditos, verifica-se que o Autor reclamou créditos perante aquela sociedade (representada pelo Réu) resultantes do incumprimento de um contrato de promessa de compra e venda de um imóvel comercializado pela sociedade, valores esses que pediu, por seu turno, na acção civil invocando o mútuo!

32 - Só em resultado do não reconhecimento desses créditos pela Administradora de Insolvência, porquanto parte do montante pago a título de sinal estava titulado por cheque passado à ordem do falecido e não à ordem da sociedade, é que o Autor veio instaurar a presente acção agora apenas contra o Réu BB e a título particular, subvertendo a realidade, efabulando uma nova versão da história apresentada.

33 - A litigância processual do Autor sustentou-se numa verdadeira simulação de acto negocial.

34 - O Autor, ludibriou o entendimento do Digníssimo Tribunal a quo, ao motivar a sua acção com base na existência de um contrato de mútuo celebrado entre si e o Réu – BB.

35 - Quando na realidade, também o Autor já havia reclamado os mesmos valores aqui peticionados, mas perante o Tribunal de Comércio no processo de insolvência da sociedade comercial representada pelo Réu, como tendo outorgado um CPCV exigindo o sinal em dobro.

36 - O Autor “conta” a versão da história que, no seu entendimento, melhor alcançará os seus intentos processuais, tudo com o propósito de enriquecer à custa dos aqui Recorrentes conforme se demonstrará e que terá, necessariamente, de ter a apreciação deste Colendo Supremo Tribunal de Justiça!

37 - Trata-se de um acto simulado.

38 - Tendo os Recorrentes procurado apresentar a defesa que o Pai nã apresentou, viram tal hipótese completamente negada, tendo sido proferida Sentença em 1ª Instância, em sentido completamente improcedente para os aqui Recorrentes.

39 - E com base em todo este circunstancialismo os Recorrentes fundamentaram as suas Alegações de Recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa no cumprimento do ónus da alegação, com indicação das razões por que entendiam que a decisão recorrida deveria ser revertida ou modificada, tendo especificado as falhas e as incorrecções que a mesma, notoriamente, padecia.

40 - Mas mais, os Recorrentes fundamentaram as razões pelas quais a Douta Sentença padecia de nulidades e que para uma melhor aplicação do direito, mui respeitosamente, se requer que sejam analisadas por este Colendo Supremo Tribunal de Justiça.

41 - Desde logo, a Douta Sentença, pelo facto de o Tribunal a quo, pelo menos em Audiência de Julgamento e Produção de Prova, tomou conhecimento, oficiosamente, de factos que, notoriamente, demonstram a simulação de negócio, geradora de nulidade, que impõe uma decisão distinta, com reapreciação do já decidido e transitado em julgado, no tocante ao crédito do ora Recorrido, Autor destes Autos sobre o falecido BB, pai dos aqui Recorrentes.

42 - Os aqui Recorrentes alegaram terem tido conhecimento que o Autor, aqui Recorrido, havia prometido comprar, através de Contrato de Promessa de Compra e Venda, celebrado aos 3 de Setembro de 2008, (fracção autónoma letra H que corresponde ao terceiro direito da Urbanização ..., na ..., concelho ... e distrito ...) à sociedade, com a firma S... Lda da qual o falecido BB, pai dos aqui Recorrentes, era gerente e sócio, sem que tenha outorgado escritura, à raiz da insolvência então declarada da sociedade, tendo no entanto por acordo da credora privilegiada, o Banco ... realizado a escritura de aquisição a seu favor aos 01/2/2013.

43 - Sem prejuízo do alegado pelo Autor, Recorrido, no Processo declarativo 22946/11...., no âmbito dos presentes autos o Recorrido apenas alegou que entregou ao falecido BB, pai dos aqui Recorrentes, o montante de € 90.500,00 (noventa mil e quinhentos euros), valor a que este último foi condenado por Sentença proferida naquele Processo 22946/11...., e obrigado que foi a restituir aquele.

44 - No aludido Processo 22946/11.... o Autor, alegou por sua vez, que entregou ao falecido pai dos aqui Recorrentes a quantia de € 90.500,00, a título de mútuo, contudo e conforme aliás se encontra junto aos Autos, existe é um Contrato de Promessa de Compra e Venda de Imóvel que não veio a ser cumprindo pela ocorrida Insolvência da sociedade proprietária do imóvel.

45 - Entre o Recorrido e o falecido BB (este último em representação da Sociedade S..., Lda., da qual este era sócio gerente), foi sim, celebrado aos 3 de Setembro de 2008 um Contrato Promessa de Compra e Venda sobre um imóvel, propriedade daquela sociedade (fracção autónoma letra H que corresponde ao terceiro direito da Urbanização ..., na ..., concelho ... e distrito ...), assumindo o Recorrido a qualidade de promitente-comprador e a sociedade S..., Lda. a qualidade de promitente-vendedora.

46 - No âmbito do referido Contrato Promessa de Compra e Venda, o Autor, aqui Recorrido, foi procedendo a vários pagamentos, a título de sinal e princípio de pagamento, tendo tais factos, aliás, sido confessados pela aqui Recorrida, mulher do aqui Recorrido, GG, no âmbito destes Autos e por declarações que prestou em sede de Audiência de Discussão e Julgamento a 4 de Fevereiro de 2022, e que jamais poderia ter sido desconsiderado pelo Tribunal a quo, que em face do conhecimento oficioso dos mesmos, impunha-se a reapreciação do crédito do Recorrido.

47 - É que a aqui Recorrida, GG, em sede de Audiência de Discussão e Julgamento a 4 de Fevereiro de 2022, no seu depoimento com inicio ao 08:58 m, confessou que assinou um Contrato Promessa de Compra e Venda com a empresa do Sr. BB, e uma vez que a empresa entrou em insolvência, foram reclamar créditos ao processo de insolvência.

48 - É deveras relevante ter presente que a reclamação de créditos do Recorrido, no seguimento da insolvência da Sociedade S..., Lda. Declarada(no âmbito Processo n.º 1347/08.... que correu termos no ... Juízo do Tribunal de Comércio ...), é mais do que demonstrativa, de que o Recorrido bem sabia que a origem do seu crédito era perante a Sociedade, pessoa colectiva (e não perante o falecido BB, pessoa singular, pai dos aqui Recorrentes), o que não poderá ser desconsiderado por este Venerando Tribunal da Relação de Lisboa.

49 - Uma vez que, o próprio montante reclamado no processo de Insolvência, pelo então Credor Reclamante nos Autos de Insolvência, aqui Recorrido, no montante de €201.000,00, respeita ao “dobro do sinal do contrato de promessa de compra e venda relativo à fracção autónima letra H que corresponde ao 3.º Direito da Urbanização ..., ...”. Tendo todos estes factos sido confirmados pela Recorrida no seu depoimento (09:21m aos 10:07m).

50 - Ora, como resulta evidente o mesmo crédito não pode ter subjacente dois Contratos distintos, não restando dúvidas que a verdadeira causa de pedir é a restituição dos sinais prestados pelo Autor, no âmbito do Contrato Promessa de Compra e Venda.

51 - Razão pela qual, a relevância de tais factos, dos quais o Tribunal a quo deles tomou conhecimento oficioso no decurso da Audiência de Discussão e Julgamento demonstram de forma clara que a venda do Imóvel ao credor dos Autos de Insolvência, aqui Recorrido, o qual lhe foi entregue na data da assinatura do Contrato Promessa de Compra e Venda com a S... Lda ao abrigo desse Contrato, cuja escritura foi entretanto formalizada aos 01.02.2013, com a credora privilegiada e hipotecária – C... – por um preço inferior ao prometido comprar.

52 - o que na prática significa que somando o valor pago à C... e montante entregue à Sociedade S... Lda (10.000,00 ) e ao falecido BB (€90.000,00), a existir prejuízo do Autor não corresponde aos €100.000,00 que entregou ao falecido e à sua sociedade, mas tão só a diferença dos dois valores que se cifra em €47.000,00, porquanto comprou por €175.000, 00 e prometeu comprar por €225.000,00, como aliás, consta da própria reclamação de credito entregue e junta aos Autos.

53 - E por isso, ao preço do Imóvel teriam sido descontadas as quantias entregues pelo Autor, aqui Recorrido, uma vez que, o preço fixado no Contrato Promessa era de €225.000,00, e o Imóvel foi vendido ao Autor, aqui Recorrido, pelo credor – Banco ... a quem foi adjudicado o imóvel no âmbito dos Autos de insolvência pelo montante de €178.000,00, sendo certo que o Credor, viu o imóvel ser-lhe adjudicado, no âmbito dos Autos de Insolvência, pelo valor de €178.100,00.

54 - No entanto, apenas o montante de €35.600,00 reverteu a favor da Massa Insolvente, existindo assim dúvidas fundamentadas quanto aos termos e condições da Venda do Imóvel, que podem importar a inutilidade superveniente da lide, revelando-se necessário produzir prova quanto a esta questão controvertida, por se demonstrar de extrema relevância tudo o que foi alegado pela Recorrida.

55 - Reitera-se que não podem os mesmos montantes, e as mesmas circunstâncias, validar dois negócios e duas situações distintas, sob pena de estarmos perante um notório Enriquecimento Sem Causa por parte dos aqui Recorridos e que para uma melhor aplicação do direito requer-se a apreciação deste Colendo Supremo Tribunal de Justiça.

56 - Nos termos do disposto no Código de Processo Civil, o Tribunal deve ser flexível e ajustar as formalidades rígidas, quando valores superiores se descortinarem, nomeadamente, se vislumbrar uma hipótese séria de apreciação de factualidade que possa servir e permitir a descoberta da verdade material em causa.

57 - Pelo que, impunha-se que o Tribunal a quo tivesse apreciado os factos que lhe chegaram ao conhecimento através do depoimento da aqui Recorrida, e tivesse reapreciado o crédito do pai dos aqui Recorrentes como sinal entregue por conta do contrato de promessa de compra e venda, que veio a concretizar-se por valor inferior ao outorgado, tendo, a bem da verdade, as quantias entregues a título de sinal sido consideradas.

58 - É que se assim não for, perante uma forte e notória denegação da Justiça, já que o Autor, aqui Recorrido, locupletou-se com um imóvel, pedindo por esta via que lhe seja devolvido o preço que pagou, num claro Enriquecimento Sem Causa que não poderá ser desconsiderado por este Douto Tribunal ad quem!

59 - Deste modo, e com o devido respeito, não podem os aqui Recorrentes conformar-se com o alegado na Douta Sentença de que ora se recorre que “está vedado ao Tribunal voltar a pronunciar-se quanto ao crédito do A. sobre o falecido R. BB, por se nos impor a autoridade do caso julgado”,

60 - quando em sede de Audiência e Discussão de Julgamento o Tribunal de 1ª Instância tomou conhecimento, através do depoimento da aqui Recorrida, de que todas as quantias entregues, num total de €90.500, 00, eram para a compra do imóvel que, efectivamente, os Recorridos compraram, por um valor inferior aos constante do Contrato de Promessa de Compra e Venda, pelo que, abatido o valor entregue a título de sinal.

61 - Razão pela qual, apelam os aqui Recorrentes, filhos do falecido Autor, junto deste Colendo Supremo Tribunal de Justiça, que o crédito que os Recorridos alegam deter sob os Recorrentes, nos termos constantes da sentença proferida no âmbito do processo n.º 22946/11...., que correu termos na Comarca da Grande Lisboa – Noroeste, Juízo de Grande Instância Cível ... – ... Secção – Juiz ..., foi abatido como sinal na Escritura de Compra e Venda respeitante ao imóvel que assinaram Contrato de Promessa de Compra e Venda com o falecido pai dos aqui Recorrentes, não correspondendo a nenhum mútuo, e por conseguinte, é um crédito divergente ao da decisão proferida naqueles Autos, contrariando-a !

62 - O Crédito é referente a incumprimento de contrato de promessa de compra e venda assinado com uma sociedade de que BB era sócio e gerente, e não de um mútuo que tenha contraído com aqueles, o que desde logo faria improceder o pedido de recebimento do crédito nos termos constantes da Sentença proferida do processo 22946/11.....

63 - Deste modo, a admissibilidade do aqui Recorrido aceitar a herança que o falecido pai dos Recorrentes repudiou, é permitir um Enriquecimento Ilegítimo por parte do aqui Recorrido, cujo crédito encontra-se satisfeito, conforme resulta claramente demonstrado, pelo que, a Douta Sentença de que ora se recorre jamais poderia ter decidido pela procedência do pedido do Autor, e que não pode passar ao lado deste Colendo Supremo Tribunal de Justiça.

64 - Termos em que V.Ex.as Juízes Conselheiros deverão julgar totalmente improcedente o pedido dos aqui Recorridos, absolvendo os aqui Recorrentes como é de inteira e manifesta Justiça!”.

14. Notificados os Recorrentes/Réus/BB e outros e o Recorrido/Autor/AA para os termos dos artºs. 655º n.º 1 ex vi art.º 679º, ambos do Código de Processo Civil, somente aqueles se pronunciaram, continuando a pugnar pelo conhecimento da revista, ao passo que o Recorrido/Autor/AA, nada disse.

15. Foram dispensados os vistos.

16. Cumpre decidir.


II. FUNDAMENTAÇÃO


II.1 Questão prévia. Da (in)admissibilidade da revista

A previsão expressa dos tribunais de recurso na Lei Fundamental, leva-nos a reconhecer que o legislador está impedido de eliminar a faculdade de recorrer em todo e qualquer caso, ou de a inviabilizar na prática, porém, já não está impedido de regular, com larga margem de liberdade, a existência dos recursos e a recorribilidade das decisões.

Assim, a lei processual civil estabelece regras quanto à admissibilidade e formalidades próprias de cada recurso, reconhecendo-se que a admissibilidade dum recurso depende do preenchimento cumulativo de três requisitos fundamentais, quais sejam, a legitimidade de quem recorre, ser a decisão proferida recorrível e ser o recurso interposto dentro do prazo legalmente estabelecido para o efeito.

Na verdade, não se discute que o recurso deve cumprir os pressupostos da legitimidade, decorrentes do art.º 631º do Código de Processo Civil, a par da respetiva tempestividade estabelecida no art.º 638° do Código de Processo Civil, bem como, a recorribilidade, tendo em atenção o estatuído no art.º 671º do Código de Processo Civil.

No caso que nos ocupa está reconhecida a tempestividade e legitimidade dos Recorrentes/Réus/BB e outros, uma vez que o requerimento de interposição de recurso obedeceu ao prazo legalmente estabelecido, sendo pacificamente aceite, outrossim, que a decisão de que recorrem lhes foi desfavorável, questionando, porém, este Tribunal ad quem se a decisão proferida é recorrível.

Impõe-se, pois, a apreciação desta questão preliminar relativa à admissibilidade da revista, nos termos gerais, sendo certo que os Recorrentes/Réus/BB e outros, salvaguardando o putativo bloqueio recursório, determinado pela dupla conforme, interpuseram revista excecional.

Neste particular, importa convocar as regras recursivas adjetivas civis, concretamente o art.º 671º n.º 3 do Código de Processo Civil, atinente à irrecorribilidade das decisões do Tribunal da Relação em consequência da dupla conforme, nos precisos termos aí concretizados (…não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância …).

Do art.º 671º n.º 3 do Código do Processo Civil condizente ao n.º 3 do art.º 721º do anterior Código do Processo Civil, com a redação do Decreto-Lei n.º 303/2007 de 24 de Agosto, decorre que a decisão da segunda instância não tenha uma fundamentação essencialmente diferente da decisão de primeira instância para que produza a dupla conforme, ao contrário do que acontecia com a alteração adjetiva civil, imposta pelo DL n.º 303/2007, de 24 de Agosto, em que se abstraía da fundamentação do acórdão da segunda instância para que se verificasse a dupla conforme.

Levado a cabo a exegese do consignado normativo adjetivo civil o Supremo Tribunal de Justiça tem perfilhado o entendimento de que somente deixa de atuar a dupla conforme a verificação de uma situação, conquanto o acórdão da Relação, conclua pela confirmação da decisão da 1ª Instância, sem voto de vencido, em que o âmago fundamental do respetivo enquadramento jurídico seja diverso daqueloutro assumido neste aresto, quando a solução jurídica prevalecente na Relação seja inovatória, esteja ancorada em preceitos, interpretações normativas ou institutos jurídicos diversos e autónomos daqueloutros que fundamentaram a decisão proferida na sentença apelada, sendo irrelevantes discordâncias que não encerrem um enquadramento jurídico alternativo, ou, simplesmente, seja o reforço argumentativo aduzido pela Relação para sustentar a solução alcançada.

No caso sub iudice, confrontadas as decisões proferidas em 1ª e 2ª Instâncias, divisamos, com clareza, para além de o acórdão da Relação ter concluído, sem voto de vencido, pela confirmação da decisão da 1ª Instância, uma identidade dos respetivos enquadramentos jurídicos, não encerrando um qualquer enquadramento jurídico alternativo.

Verificada a dupla conforme, decorrente da aplicação do art.º 671º n.º 3 do Código de Processo Civil, impõe-se que este Tribunal ad quem não conheça do objeto da revista, em termos gerais, por inadmissibilidade, nos termos enunciados, podendo, assim, colocar-se a questão da obrigatoriedade da remessa à Formação para apreciar do interposto recurso excecional de revista.

Entendemos, no entanto, que não se impõe a remessa dos autos à Formação para ponderação do fundamento invocada ao reconhecimento da excecionalidade da interposta revista.

Vejamos:

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões dos Recorrentes/Réus/BB e outros, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, conforme prevenido no direito adjetivo civil - artºs. 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil. Outrossim, decorre do direito adjetivo civil que o Tribunal de recurso não pode conhecer de questões que não tenham sido objeto da decisão recorrida ou que as partes, deixaram de suscitar perante o Tribunal recorrido (artºs. 627º, n.º 1 e 635º, n.º 2 e 4 do Código de Processo Civil).

O que delimita o recurso e constitui o seu ponto de cognoscibilidade é a decisão impugnada, não podendo, o respetivo âmbito, exceder o que foi fixado e delimitado pela atividade cognoscente do órgão jurisdicional.

Os recursos são meios de obter a reponderação das questões já anteriormente colocadas e a eventual reforma de decisões dos tribunais inferiores, e não de alcançar decisões novas, só assim não acontecendo nos casos em que a lei determina o contrário, ou relativos a matéria indisponível, sujeita por isso a conhecimento oficioso, estando o Tribunal de recurso, sublinhamos, limitado nos seus poderes de cognição às questões que, tendo sido ou devendo ter sido objeto da decisão recorrida, sejam submetidas à sua apreciação, isto é, constituam objeto da impugnação, neste sentido, Castro Mendes, in, Recursos, 1980, página 27; Armindo Ribeiro Mendes, in, Recursos em Processo Civil, 1992, páginas 140 e 175, Miguel Teixeira de Sousa, in, Estudos Sobre O Novo Processo Civil, página 395, António Abrantes Geraldes, in, Recursos Em Processo Civil - Novo Regime, Almedina, 2ª Edição, páginas 25 e seguintes e 94 e seguintes, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Julho de 2008 (Processo n.º 08B1846), de 18 de Novembro de 2008 (Processo n.º 08B2758), de 15 de Setembro de 2010 (Processo n.º 322/05.4TAEVR.E1.S1), de 29 de Outubro de 2013 (Processo n.º 1410/05.2TCSNT.L1.S1), e de 14 de Janeiro de 2015 (Processo n.º 2881/07.8TTLSB.L1.S1).

Ou seja, o procedimento definido pelo legislador ordinário quanto ao modo do exercício do direito de recurso, não garante aos interessados a faculdade de alegar de forma ilimitada e em qualquer fase processual os factos constitutivos do seu direito e/ou os factos impeditivos, extintivos ou modificativos do direito invocado pela contraparte.

Cotejado o objeto do recurso de apelação, conforme decorre do acórdão proferido, distinguimos que os Apelantes/Réus/BB e outros apenas suscitaram a nulidade da sentença proferida em 1ª Instância, sendo que o acórdão recorrido decidiu, sem voto de vencido, e suportado em enquadramento jurídico, sem fundamentação essencialmente diferente daqueloutro enunciado na sentença proferida em 1ª Instância.

As nulidades arguidas são irrelevantes para o efeito de admissibilidade do recurso interposto, pois as nulidades, apesar de constituírem fundamento de revista, nos termos do art.º 674º n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, não são elas próprias definidoras da admissibilidade desse recurso, a qual está prevista no art.º 671º n.ºs 1 e 2 do citado Código de Processo Civil, ficando a sua arguição dependente da sua admissibilidade, como facilmente se depreende do art.º 615º n.º 4, do Código de Processo Civil, sendo que a sua arguição, como já adiantamos, não prejudica a existência da dupla conformidade, acentuando-se que só estas é que delimitam o recurso, constituindo o seu ponto de cognoscibilidade, não podendo, como já adiantamos, o respetivo âmbito, exceder o que foi fixado e delimitado pela atividade cognoscente do órgão jurisdicional de que se recorre.

Reconhecendo-se que a revista excecional está sujeita a formalidades próprias, em razão da respetiva particularidade, designadamente, para além de ter de satisfazer um dos pressupostos previstos no art.º 672º n.º 1 do Código de Processo Civil, só é possível desde que a revista, em termos gerais, seja admissível, mas não permitida por efeito da conformidade de julgados, importa concluir que não estão preenchidos os pressupostos para que a Formação se pronuncie sobre os fundamentos aduzidos com vista a atribuir, ou não, excecionalidade à interposta revista, na medida em que não faz sentido invocar a excecionalidade da revista para ultrapassar o obstáculo recursório decorrente da conformidade das decisões, quando o conhecimento do objeto da revista está vedado ao Supremo Tribunal de Justiça por estar fora do âmbito da sua competência decisória.


III. DECISÃO

Pelo exposto, em razão dos fundamentos aduzidos, decidem os Juízes que constituem este Tribunal em rejeitar o presente recurso de revista, em termos gerais, por motivo distinto da conformidade de julgados, encontrando-se, por isso, excluída a admissibilidade da revista excecional, daí que, não reunindo o recurso as condições de admissibilidade, não pode conhecer-se do respetivo objeto.

Custas pelos Apelantes/Réus/BB e outros.

Notifique.

Lisboa, Supremo Tribunal de Justiça, 11 de maio de 2023

                                                     

Oliveira Abreu (Relator)

Nuno Pinto Oliveira)

Ferreira Lopes