Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3980/17.3T8CBR-B.C1.S2
Nº Convencional: 6º SECÇÃO
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: REVISTA EXCEPCIONAL
ADMISSIBILIDADE
REQUISITOS
VALOR DA CAUSA
CASO JULGADO
Data do Acordão: 06/27/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / RECURSO DE REVISTA / REVISTA EXCECIONAL.
Doutrina:
- Cristina Queiroz, Direitos Fundamentais - Teoria Geral, p. 202;
- Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª Edição Revista, p. 63 e 164.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 672.º, N.ºS 1, ALÍNEA A) E 3.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 17-02-2011, RELATOR SEBASTIÃO PÓVOAS, IN WWW.STJ.PT;
- DE 18-02-2012, RELATOR BETTENCOURT DE FARIA, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 22-01-2014, RELATOR SEBASTIÃO PÓVOAS, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 31-01-2014, RELATOR SILVA SALAZAR, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 06-02-2014, RELATOR SILVA SALAZAR, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 27-03-2014, RELATOR MOREIRA ALVES, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 08-04-2014, RELATOR MOREIRA ALVES, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 29-04-2014, RELATOR SEBASTIÃO PÓVOAS, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 17-09-2014, RELATOR SANTOS CABRAL, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 27-01-2016, RELATOR ALVES VELHO, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 07-04-2016, RELATOR BETTENCOURT DE FARIA, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 15-09-2016, RELATOR JOÃO BERNARDO, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 22-02-2017, RELATOR BETTENCOURT DE FARIA, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 25-05-2017, RELATOR PAULO SÁ, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 22-06-2017, RELATOR PAULO SÁ, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 21-09-2017, RELATOR GARCIA CALEJO, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 19-10-2017, RELATOR JOÃO BERNARDO, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 09-11-2017, RELATOR JOÃO BERNARDO, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 29-01-2019, RELATORA ANA PAULA BOULAROT, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 12-02-2019, RELATOR HÉLDER ALMEIDA, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :

I Tem sido entendimento unânime da Formação a que alude o normativo inserto no artigo 672º, nº3 do CPCivil, que a admissibilidade da Revista excepcional pressupõe: i) que a Revista autónoma-regra só não seja admissível por se verificar a situação de dupla conformidade, pois se aquela não existisse e a Revista não fosse de admitir, não se poderá lançar mão da Revista excepcional; ii) que a competência da Formação se limita aos pressupostos específicos deste preciso recurso, sendo atribuição do Relator/Colectivo a quem o processo for distribuído a aferição dos pressupostos gerais.

II Tendo sido admitida pela Formação uma Revista excepcional  com fundamento na alínea a) do nº1 do artigo 672º do CPCivil e remetidos os autos à distribuição, deve o Relator/Colectivo verificar se estão ou não reunidos os requisitos gerais da admissibilidade da impugnação, máxime, o valor da causa, não se conhecendo do objecto no caso de o valor o não permitir.

III A decisão colegial  da Formação apenas é definitiva, fazendo caso julgado, quanto à existência do pressuposto específico da sua admissibilidade, aliás, única temática abrangida pela mesma.

IV O eventual direito das partes a recorrerem ao Supremo Tribunal de Justiça, está totalmente dependente de normas conformadoras do legislador ordinário e que transcendem o  direito consagrado no artigo 20º da CRPortuguesa.

(APB)

Decisão Texto Integral:

I R, nos autos de insolvência de P, LDA, recorrente nos presentes autos de Revista excepcional, notificado da decisão singular da aqui Relatora que faz fls 221 a 224, vem dela reclamar para a conferência, nos termos do artigo  652º, nº3 do CPCivil, aplicável ex vi do artigo 679º, este como aquele do CPCivil, com os seguintes fundamentos:

- O presente recurso de revista excepcional do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18.09.2018, foi admitido por decisão da Formação do presente Tribunal, datada de 07.03.2019.

- Foi entendimento da Senhora Conselheira-Relatora que, atendendo ao facto de o valor da acção ser inferior ao valor da alçada deste Tribunal, a revista excecional não seria admissível, tendo procedido à audição prévia da Recorrente, ao abrigo do disposto no art. 655° do CPC,

- Tendo o Recorrente, por requerimento de 02.04.2019, apresentado os seus argumentos acerca da admissibilidade do recurso.

- Com o devido respeito, e como o Recorrente teve oportunidade de expor no requerimento de 02.04.2019, tal entendimento quanto à inadmissibilidade do recurso não é correcto, considerando as circunstâncias do caso concreto.

- O Recorrente interpôs o presente recurso de revista excecional invocando quer a contradição entre o acórdão recorrido e outros acórdãos do Tribunal da Relação, quer o relevo jurídico e social da situação em apreço.

- A Formação do Supremo Tribunal de Justiça considerou que "...os arestos apresentados pelo recorrente revelam, ao menos, uma margem de discussão que justifica uma intervenção qualificada deste Supremo Tribunal de Justiça, suscetível de se expandir para as instâncias. " Motivo pelo qual o recurso veio a ser admitido, com fundamento na alínea a) do n.° 1 do artigo 672.° do Código de Processo Civil.

- O Recorrente concorda plenamente com a decisão da Formação, entendendo que a mesma não merece qualquer reparo ou censura.

- A situação dos autos, conforme melhor resulta, aliás, da enunciação factual e jurídica feita constar da Alegação de Recurso, é uma situação que é enquadrável nos pressupostos da revista excepcional, por preenchimento dos seus pressupostos - art. 672°, n° 1, do CPC - uma vez que está em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do Direito;

- Ao referido pressuposto acresce um outro, previsto na al. c) do mesmo número, qual seja o de o acórdão recorrido estar em oposição com outros proferidos por Relação, no domínio da mesma legislação, sobre a mesma questão fundamental de direito, suportado pela insolvente. Contudo tanto a cobrança da remuneração à insolvente como o seu pagamento são encargo do tribunal que nomeou o Administrador. Se o tribunal não consegue cobrar essa importância da insolvente deve a mesma ser adiantada pelo IGFEJ. Ou seja aquele Tribunal da Relação considerou a remuneração do Administrador Judicial deve ser incluída nas custas do processo e adiantadas pelo IGFEJ.

- Cfr. Documento 1, que se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

- E o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 22.03.2011 onde ficou decidido que a graduação dos créditos do gestor Judicial, correspondentes às retribuições vencidas e não pagas pelo exercício das suas funções no âmbito de processo de recuperação da empresa deve ser reconhecido como privilegiado com precipuidade sobre qualquer outro crédito

-Cfr. documento 2, idem.

- Entende o Recorrente que a decisão da Formação é definitiva, não sendo suscetível de reclamação ou recurso, tal como preceitua o n.° 4 do artigo 672° do Código de Processo Civil.

- Pelo que, sempre terá o mesmo que ser apreciado, não podendo agora, depois de admitido ser recusado.

- Além disso, está em causa a contradição de acórdãos e o relevo jurídico e social.

- Ora, diz-nos a alínea d) do n.° 2 do artigo 629.° do Código de Processo Civil que:

“(…)

2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:

d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.”

- A manutenção desta decisão sem apreciação do STJ, se traduz-se numa manifesta denegação de justiça, colocando irremediavelmente fim a uma questão que merece ser apreciada, dada a sua relevância jurídica e a sua importância para uma melhor aplicação do direito.

- Crê-se que no espírito do legislador não estaria a intenção de cercear o direito de acesso à justiça, nos casos em que se deve salvaguardar direitos fundamentais de acesso à jurisdição, como no presente caso, admitindo-se o recurso quando este tiver por fundamento específico a violação dos princípios básicos da igualdade e do contraditório.

- O acórdão recorrido afecta de forma irremediável os direitos do Recorrente impossibilitando-o de se ver ressarcido da remuneração a que tem direito depois de ter desempenhado de forma cabal as suas funções de Administrador Judicial, ter despendido tempo, meios e recursos no âmbito de uma nomeação promovida pelo tribunal.

- Sem prejuízo, sempre se dirá que o direito à retribuição é um direito fundamental consagrado na Constituição da República Portuguesa (CRP), tanto que se encontra plasmado no artigo 59.°, n.° 1, ai. a) da CRP.

- Pelo que a sua negação é manifestamente inconstitucional, afectando de forma irreversível os direitos do Recorrente.

- Além do mais, o direito à retribuição pode considerar-se como sendo um direito análogo aos direitos, liberdades e garantias, razão pela qual a sua limitação apenas pode verificar-se nos casos expressamente previstos na Lei Fundamental devendo as restrições  limitar-se  ao necessário para salvaguardar outros direitos  ou interesses constitucionalmente protegidos.

- Urge concluir que a não admissão do recurso interposto tornaria qualquer outra diligência absolutamente inútil, uma vez que, sendo o crédito do Recorrente graduado como comum, nunca irá receber qualquer quantia.

- A este propósito vejam-se Jorge Miranda e Rui Medeiros, in Constituição Portuguesa Anotada. Tomo I, 2a ed., 2010: “(-..) num Estado de Direito, a plenitude do acesso à jurisdição e os princípios da juridicidade e da igualdade postulam um sistema que assegure a protecção dos interessados contra os próprios actos jurisdicionais (...)”

- É, possível, portanto, fundar constitucionalmente um genérico direito de recorrer das decisões jurisdicionais, e, sendo certo que cabe ao legislador concretizar, com maior ou menor amplitude o seu âmbito de aplicação, está-lhe vedado afectar de forma substancial o direito ao recurso, através de soluções que restrinjam de tal modo o direito de o exercer que, na prática, se traduzam na sua supressão.

- Por outro lado, e de acordo com a decisão da Formação deste STJ, parece reconhecida a clara necessidade de reapreciação da questão, para uma melhor aplicação do direito, dada a sua relevância jurídica.

- Vem-se acolhendo, o entendimento de que a relevância jurídica de uma questão, apresentando-se como autónoma, se revista de ineditismo ou novidade que aconselhem a respetiva avaliação pelo Supremo Tribunal de Justiça, com vista à obtenção de decisão suscetível de contribuir para a formação de uma orientação jurisprudencial.

- A questão suscitada, reveste-se de particular importância social, por estarem em causa direitos fundamentais na aplicação do direito.

- Nomeadamente a retribuição do trabalho, consagrada no art.° 59.° da CRPortuguesa, entendimento aplicável ao desempenho da função de Administrador da Insolvência nomeado, como nos presentes autos, tornando-se por essa via, inadmissível a prestação de serviços a título de gratuitidade, em benefício de terceiros.

- A manter-se a decisão proferida pela Relação de Coimbra, a qual, com o devido respeito, se limitou a apreciar de forma aligeirada e parcial (no sentido de não atender a todos os elementos factuais relevantes), abrir-se-á um precedente, que põe em causa todos os princípios constitucionalmente consagrados.

- É grande a desproporção e o sacrifício que está a impor o Recorrente, que se virá privado da remuneração a que efectivamente tem direito depois de ter exercido cabalmente as funções para as quais foi nomeado pelo tribunal.

- 0 presente recurso, dada a sua relevância para os interesses da Recorrente, tem necessariamente que ser conhecido desse Alto Tribunal.

- A cautela, dir-se-á ainda que perante as circunstâncias do caso concreto, a não admissão do presente recurso de revista, configura uma violação dos princípios do Estado de direito, do acesso à Justiça e à tutela jurisdicional efectiva, consagrados, designadamente nos arts. 2º e 20° da CRP, e bem assim aos direito à retribuição plasmado no artigo 59.°, n.° 2, al. a) do mesmo diploma legal,

- Inconstitucionalidade que igualmente se arguem, além de todas as que já constam das alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente, para todos os legais efeitos.

Não foi produzida qualquer resposta.

II A questão solvenda consiste em saber se a decisão da Formação constante de fls 188 fez ou não caso julgado e com que amplitude.

Na decisão singular, aqui em reclamação a Relatora fundou a sua conclusão no seguinte raciocínio:

«[I]nterpôs aquele Reclamante recurso de Revista excepcional, nos termos do artigo 672º, nº1, alíneas a), b) e c) do CPCivil, admitido pela Formação a que alude o nº3 do mesmo normativo, com fundamento naquela alínea a), cfr Acórdão de fls 188.

Porque a Relatora entendeu que a decisão da Formação apenas faria caso julgado quanto à existência do pressuposto específico, existência essa que não prescinderia da verificação dos demais pressupostos processualmente exigíveis, nomeadamente, o valor da causa, foi ordenada a audição das partes de harmonia com o disposto no artigo 655º, nº1, aplicável ex vi dos arigos 679º, este como aquele do CPCivil e 17º, nº1 do CIRE, para se pronunciarem acerca desta questão.

Apenas o credor Reclamante, aqui Recorrente se pronunciou, alinhando as seguintes razões:

- O Recorrente interpôs o presente recurso de revista excecional invocando quer a contradição entre o acórdão recorrido e outros acórdãos do Tribunal da Relação, quer o relevo jurídico e social da situação em apreço.

- Tal recurso veio a ser admitido pela Formação, com fundamento na alínea a) do n.° 1 do

artigo 672.° do Código de Processo Civil.

- Acontece que se vê agora o recorrente confrontado com a possibilidade de o mesmo não ser admitido devido ao facto de a causa ter um valor inferior à alçada do Supremo Tribunal de Justiça.

- Ora, não pode o Recorrente deixar de discordar com aquele entendimento, pugnando pela admissibilidade do recurso por si interposto.

- Antes de mais porque, conforme se disse supra o presente Recurso já foi admitido pela

Formação.

- A decisão da Formação é definitiva, não sendo suscetível de reclamação ou recurso, tal como preceitua o n.° 4 do artigo 672° do Código de Processo Civil.

- Assim, sendo aquela decisão definitiva e irrecorrível e tendo a mesma admitido o recurso interposto, entende o Recorrente que sempre terá o mesmo que ser apreciado, não podendo agora, depois de admitido ser recusado.

- Além disso, o recorrente interpôs o presente recurso de revista excecional invocando a contradição de acórdãos e o relevo jurídico e social.

- Ora, diz-nos a alínea d) do n.° 2 do artigo 629.° do Código de Processo Civil que:

"(...)

2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:

d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito,  e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.

- O acórdão recorrido está em contradição com outro de um diferente Tribunal da Relação, tal como aliás o recorrente fez questão de demonstrar.

- Pelo que, entende o recorrente que também por tal facto o seu recurso sempre deverá ser admitido.

Analisemos.

O Recorrente interpôs recurso de Revista excepcional do Acórdão da Relação de Coimbra que confirmou a sentença de primeira instância, no apenso de reclamação e verificação de créditos, por apenso aos autos de insolvência de PB, PFB, LDA, sendo que o seu crédito, aqui em questão, se cifra em 17 280 euros.

Tem sido entendimento unânime da Formação a que alude o normativo inserto no artigo 672º, nº3 do CPCivil, que a admissibilidade da Revista excepcional pressupõe que a Revista autónoma-regra só não seja admissível por se verificar a situação de dupla conformidade, pois se aquela não existisse a Revista não fosse de admitir, não se poderá lançar mão da Revista excepcional, bem como que a respectiva competência se limita aos pressupostos específicos deste preciso recurso, sendo atribuição do Relator/Colectivo a quem o processo for distribuído a aferição dos pressupostos gerais, cfr inter alia os Ac da Formação deste STJ de 17 de Fevereiro de 2011 (Relator Sebastião Póvoas), 18 de Fevereiro de 2012 (Relator Bettencourt de Faria), 22 de janeiro de 2014 (Relator Sebastião Póvoas), 29 de Abril de 2014 (Relator Sebastião Póvoas), 31 de Janeiro de 2014 (Relator Silva Salazar), 6 de Fevereiro de 2014 (Relator Silva Salazar), 27 de Março de 2014 (Relator Moreira Alves), 8 de Abril de 2014 (Relator Moreira Alves), 27 de Janeiro de 2016 (Relator Alves Velho), 7 de Abril de 2016 (Relator Bettencourt de Faria), 15 de Setembro de 2016 (Relator João Bernardo), 22 de Fevereiro de 2017 (Relator Bettencourt de Faria), 25 de Maio de 2017 (Relator Paulo Sá), 22 de Junho de 2017 (Relator Paulo Sá), 21 de Setembro de 2017 (Relator Garcia Calejo), 19 de Outubro de 2017 (Relator João Bernardo), 9 de Novembro de 2017 (Relator João Bernardo), in SASTJ, site do STJ.

Ora, in casu, verificamos que a Revista regra nunca poderia seria admissível, por razões que se prendem com a alçada, de harmonia com o disposto no artigo 629º do CPCivil, com referência ao artigo 44º, nº1 da Lei 62/2013, de 26 de Agosto, o que seria sempre um facto impeditivo do conhecimento do objecto do recurso, o que o Recorrente não poderia ignorar já que o valor da reclamação corresponde ao valor que aquele reclamou, isto é, 17 280 euros; de outra banda, a intervenção da Formação limitou-se a aferir dos requisitos atinentes à bondade da Revista excepcional, isto é dos pressupostos referidos na alínea a) do nº1 do artigo 672º do CPCivil, tendo entendido que se estaria face a uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, era claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, sendo contudo omissa no que tange à apreciação dos pressupostos gerais da admissibilidade da impugnação encetada, aferição essa que por extravasar a competência da Formação, se integra de pleno nas competências do Relator/Colectivo a quem calhar em sorte a análise final do processo.

Nestas precisas circunstâncias, sem embargo da apreciação liminar efectuada pela Formação ser definitiva, nos termos do nº4 do artigo 672º do CPCivil, a aludida definição confina-se à mera análise dos requisitos e pressupostos específicos da Revista excepcional, não abrangendo o caso julgado formal obtido com a apreciação verificada, quaisquer outros pressupostos gerais, próprios de quaisquer Revistas, os quais nem sequer, implícita ou explicitamente, foram abarcados por tal decisão, vg o valor da causa que aqui se cura e impede o conhecimento do objecto do recurso.

Ademais, ex adverso do que é esgrimido pelo Recorrente, nunca o presente recurso poderia vir a ser conhecido por lhe ser inaplicável do disposto no artigo 629º, nº2, alínea d) do CPCivil, porquanto a admissibilidade recursiva aí prevenida encontra-se limitada aos casos em que o recurso nunca seja admissível por razões estranhas à alçada (caso dos procedimentos cautelares, processos de expropriações e/ou processos de jurisdição voluntária), o que aqui se não verifica, cfr neste sentido os Ac STJ de 29 de Janeiro de 2019, da ora Relatora e de 12 de Fevereiro de 2019 (Relator Hélder Almeida), in www.dgsi.pt.

Nestes termos, entendendo que a decisão da Formação apenas é definitiva em relação à apreciação dos pressupostos da Revista excepcional, confinando-se a admissibilidade da mesma apenas à verificação do hipotético requisito da alínea a) do nº1, do artigo 672º do CPCivil, verificando-se que, a montante, não se antolha que o valor da acção suporte a admissibilidade de recurso ordinário, nos termos do artigo 629º, nº1 do CPCivil, fica prejudicado o conhecimento do objecto da impugnação, claudicando as razões oferecidas pelo Recorrente.

Destarte, de harmonia com o preceituado no artigo 652º, nºº1, alínea b) do CPCivil, aplicável ex vi dos artigos 679º do mesmo diploma e 17º, nº1 do CIRE, não se conhece do objecto do recurso.».

O Recorrente, aqui Reclamante, funda a sua reclamação para a Conferência praticamente nas mesmas razões em que se arrimou para sustentar a bondade da sua pretensão impugnatória, aquando da audição nos termos do artigo 655º, nº1 do CPCivil, sendo certo que as mesmas não têm agora, como não tiveram antes, qualquer vocação para alterar a tese ali sustentada, a qual se mantém na íntegra.

Mostram-se, pois, analisadas, todas as questões suscitadas no que tange à impossibilidade de conhecimento do objecto do recurso por razões atinentes à alçada, não consideradas no Acórdão da Formação, o qual apenas fez caso julgado nos precisos limites em que apreciou a questão que lhe foi colocada, isto é, apenas no que tange à verificação dos pressupostos referidos no nº1 do artigo 672º, como deflui do nº4 daquele mesmo ínsito legal.

Sempre se acrescenta, ex adverso do mais agora alegado pelo Recorrente:

Quanto à apontada denegação de justiça, crime previsto e punido pelo artigo 369º do CPenal, significa que este Supremo Tribunal ao decidir não conhecer agora do objecto do recurso, o está a fazer não só contra legem, mas voluntária e conscientemente, em manifesta violação dos seus deveres funcionais: está assumidamente a agir contra direito, cfr a este propósito o Ac STJ de 17 de Setembro de 2014 (Relator Santos Cabral), in www.dgsi.pt.

Ora, como ficou devidamente exposto na decisão singular reclamada, a Revista excepcional não prescinde da verificação dos requisitos gerais da Revista-regra, por um lado e por outro, a decisão da Formação apenas se considera definitiva no que tange à verificação dos respectivos pressupostos, nada mais.

Sem embargo de podermos admitir que esta posição possa causar dúvidas ao Recorrente, aqui Reclamante, a mesma não envolve qualquer prevaricação funcional, nem um agir contra direito, já que a mesma se encontra devidamente fundada nas disposições legais aplicáveis e fundamentada em variegada jurisprudência que a propósito tem vindo a ser «tirada» por este Supremo Tribunal de Justiça.

De outra banda, não se lobriga, nem alcança, por que forma, perante as circunstâncias do caso concreto, a não admissão do presente recurso de Revista, configura uma violação dos princípios do Estado de direito, do acesso à Justiça e à tutela jurisdicional efectiva, consagrados, designadamente nos artigos 2º e 20° da CRPortuguesa, e bem assim ao direito à retribuição plasmado no artigo 59º, nº2, alínea a) do mesmo diploma legal.

 

O princípio fundamental do Estado de Direito implica essencialmente a sujeição do poder a princípios e regras jurídicas, que garantem aos cidadãos liberdade, igualdade e segurança, cfr Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª Edição Revista, 63.

Nesta asserção, não se antolha ter ocorrido qualquer tratamento discriminatório do Recorrente, ao qual foram aplicados os normativos de direito considerados pertinentes, tendo em atenção a pretensão que o mesmo formulou.

Do mesmo modo não se mostra violado o disposto no artigoo 20º, nº1 da CRPortuguesa, na vertente do direito ao acesso ao direito e do direito de acesso aos tribunais, direitos esses que se mostram plenamente exercidos pelo Recorrente, sendo patente o exercício pelo mesmo de tais direitos, tendo o mesmo visto o seu pedido ser discutido e apreciado em duas instâncias jurisdicionais.

Questão diversa dessa é o eventual direito a recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça que o Reclamante se arvora, direito este que está totalmente dependente de normas conformadoras do legislador ordinário e que transcendem aquele específico direito que se mostra plenamente satisfeito: a garantia judiciária consiste no direito de recurso a um Tribunal e de obter dele uma decisão jurídica sobre a questão colocada, qual seja o Tribunal a que se tem direito dependerá dos preceitos constitucionais e legais que regem a repartição da competência jurisdicional, cfr Gomes Canotilho e Vital Moreira, ibidem, 164.

Embora o legislador não «disponha» dos direitos fundamentais, o exercício dos mesmos e das liberdades fundamentais no seu conjunto, necessitam de leis em ordem a garantir o seu exercício, daí a possibilidade daquele em determinar os respectivos conteúdos jurídico-normativos, autorizando-lhe a Constituição a preencher o âmbito normativo carecido de conformação jurídico-normativa, maxime, na regulamentação recursiva que aqui se cura, cfr Cristina Queiroz, Direitos Fundamentais (Teoria Geral), 202.

Não ocorreu, assim, qualquer afronta àquele principio fundamental do acesso ao direito.

No que tange à pretensa violação do direito à retribuição consagrado no texto Constitucional, direito esse análogo ao dos direitos, liberdades e garantias, tem a ver com a concatenação das apontadas disposições supra analisadas, já que a sua violação implicaria a violação do preceituado no artigo 59º, na medida em que impede a análise da questão de fundo a qual passaria pela qualificação do crédito do Recorrente, e que fica prejudicada pela solução dada ao pleito, na medida em se concluiu, como se conclui, pelo não conhecimento do objecto do recurso

III Destarte, indefere-se a reclamação, mantendo-se a decisão inserta no despacho singular da Relatora.

Custas pelo Reclamante, com taxa de justiça em 3 Ucs.

Lisboa, 27 de Junho de 2019

Ana Paula Boularot (Relatora)

Pinto de Almeida

José Rainho