Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
04B4416
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SALVADOR DA COSTA
Descritores: MATÉRIA DE FACTO
MATÉRIA DE DIREITO
OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
VERIFICAÇÃO
Nº do Documento: SJ200502100044167
Data do Acordão: 02/10/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL ÉVORA
Processo no Tribunal Recurso: 112/04
Data: 03/25/2004
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO - INCIDENTE.
Decisão: INDEFERIMENTO.
Sumário : 1. As questões de direito delimitam-se no confronto com as questões de facto, envolvendo as últimas o apuramento das ocorrências pretéritas da vida real nas suas vertentes de tempo, modo e lugar, e as primeiras a interpretação e a aplicação da lei, ou seja, quando a respectiva solução dependa da interpretação e aplicação de determinadas normas jurídicas.

2. A oposição de acórdãos relativa à mesma questão fundamental de direito para efeito de admissibilidade de recurso, a que se reporta o nº 4 do artigo 678º do Código de Processo Civil, ocorre quando, num e noutro, a mesma disposição legal for objecto de interpretação ou aplicação oposta, ou seja, quando o caso concreto é decidido, com base nela, num acórdão e no noutro, em sentido oposto.

3. À verificação dessa oposição não obsta que os casos concretos decididos em ambos os acórdãos apresentem contornos e particularidades diferentes, desde que a questão de direito seja fundamentalmente a mesma, mas não prescinde da identidade do núcleo central das concernentes situações de facto.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
I
Sob o fundamento de contradição com acórdãos de outros tribunais da Relação, A, B, C e D, E e F, G e H, I, J e K, L, M e N, O, P e Q, R, S e T, U e V, X, Z e AA interpuseram, no dia 22 de Abril de 2004, recurso de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação de Évora proferido no dia 25 de Março de 2004, no tribunal da 1ª instância, que julgou improcedente o recurso de agravo interposto da decisão final proferida no procedimento cautelar de restituição provisória de posse relativa ao prédio designado por Herdade do Vale Sobrigo, localizado em Torrão, instaurado pelos recorrentes, no dia 29 de Abril de 2003, contra AB, AC, AD, AE, AF e AG, AH, AI e AJ, AK.

A faleceu, tendo ingressado na lide, em sua substituição, os restantes litisconsortes.
O relator da Relação recebeu o recurso por despacho proferido no dia 29 de Abril de 2004 com base naquele fundamento, os agravantes alegaram no dia 25 de Maio de 2004 e os agravados, na resposta, apresentada no dia 14 de Junho de 2004, pronunciaram-se no sentido da não admissibilidade do recurso por inverificação da contradição de julgados invocada pelos recorrentes.

Neste Tribunal, por despacho proferido no dia 30 de Novembro de 2004, o relator não admitiu o recurso, sob o fundamento de na espécie não ocorrer a contradição jurisprudencial em que os recorrentes fundamentaram a sua interposição.

Os recorrentes reclamaram do referido despacho para a conferência, insistindo essencialmente em que se verifica a contradição de acórdãos justificativa da admissão do recurso.

II
É a seguinte a dinâmica processual que releva na decisão da reclamação:

1. Os requerentes instauraram, no dia 29 de Abril de 2003, procedimento cautelar de restituição provisória de posse, pedindo que lhes fosse facultado o acesso ao prédio Vale do .., localizado no Torrão, e se ordenasse aos requeridos a retirada da vedação por eles colocada, ou que o 2º requerente fosse restituído provisoriamente à sua posse ou, a entender-se não terem sido os primeiros requerentes violentamente esbulhados, fosse ordenada provisoriamente a facultação do livre acesso ao prédio, retirando a vedação, ou a passagem a fim poderem continuar a exercer a sua posse, ou caso assim se não entendesse por o segundo requerente ser arrendatário e ter a posse à data do esbulho, fosse ordenado aos requeridos o facultar do seu livre acesso ou a passagem para o referido prédio, a fim de poder exercer a sua posse.

2. Fundamentaram a sua pretensão em termos de posse no facto de serem os actuais proprietários do prédio, na sua deslocação ao mesmo algumas vezes por ano, embora não o cultivando, no seu arrendamento em 1999, no esbulho por via de colocação nele de uma vedação em finais de 2001 como obstáculo ao respectivo acesso, no adiamento do julgamento na acção de reivindicação para Outubro de 2003 como causa da urgência da providência a fim de evitar caducidade da acção, acrescentando que o prédio foi objecto de contrato-promessa e que este foi inviabilizado em razão da instauração, em 2000, daquela acção.

3. Os requeridos excepcionaram caducidade do direito de acção e a ilegitimidade activa dos cônjuges dos primeiros requerentes, a inexistência dos requisitos para o decretamento da providência, e impugnaram o direito de propriedade dos requerentes, ao que estes responderam no sentido da inexistência daquelas excepções.

4. Foi proferida sentença, no dia 31 de Julho de 2003, com base nos factos articulados pelos requerentes e pelos requeridos admitidos por acordo, na qual foi decidido absolver os requeridos do pedido, por não terem sido alegados elementos bastantes para concluir pela existência de actos materiais integradores do corpus da posse dos requerentes, não resultar do alegado a violência do esbulho por os requerentes não terem estado presentes aquando da colocação da vedação e não ter havido alegação suficiente do fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável, acrescentando-se perguntar-se a que título se avançava com uma providência deste teor alguns meses antes do julgamento de acção onde as partes discutem a propriedade sobre o terreno, em especial sem o ser por apenso àquela acção.

5. Agravaram os requerentes para a Relação e esta, por acórdão de 25 de Março de 2004, negou provimento ao recurso, sob a motivação de os requerentes fundarem a posse no direito de propriedade, de esta ser contestada pelos requeridos no procedimento cautelar e em acção de reivindicação, na falta de prova sumária do direito dos requerentes, no facto de a vedação não poder significar esbulho, na comunhão com o juiz da 1ª instância ao questionar a razão por que estando pendente uma acção de reivindicação de propriedade sobre o prédio não lhe foi apenso o procedimento cautelar, não servir este para tomar ou antecipar decisões definitivas sobre os direitos em litígio e não relevar o argumento da caducidade invocado pelos requerentes.

6. No acórdão da Relação de Lisboa de 30 de Janeiro de 1990, citando um autor, afirmou-se que se os agravados eram são partes legítimas para a acção principal, também o eram relativamente ao procedimento cautelar respectivo dada a natureza instrumental deste em relação àquela, e que por isso a pessoa que requereu a providência há-de ser a mesma que depois vai propor a acção de que a providência é acto preparatório.

7. No acórdão da Relação de Lisboa de 29 de Março de 1990 afirmou-se, por seu turno, citando um autor, decorrer do explanado que o réu na acção principal não tem a faculdade de usar de meios cautelares como incidente dessa mesma acção, a menos que tenha deduzido reconvenção, e que só ao autor ou ao reconvinte - e este apenas quanto à matéria relativa à reconvenção - era lícito requerer o procedimento cautelar e que as providências cautelares não podiam ser requeridas e decretadas para acautelar o direito invocado pelo réu, como fundamento da sua contestação, e que na hipótese sub judice, a providência cautelar de restituição provisória da posse fora requerida por determinada pessoa e apensada à acção de despejo em que ela própria era ré não reconvinte, pelo que a apensação fora incorrecta.

8. No acórdão da Relação de Lisboa datado de 15 de Janeiro de 1991, citando um autor, expressa-se que o objecto da acção de que o procedimento cautelar é preliminar há-de ser o mesmo que pelo procedimento se pretende acautelar e, porque visa a definição provisória do que na acção se há-de determinar definitivamente, é dependência dela, e que a função da providência cautelar é instrumental, sendo instruída na pressuposição ou na previsão da hipótese de vir a ser favorável ao autor a decisão a proferir no processo principal, acrescentando-se que o direito a acautelar mediante o processo preventivo só pode ser o que na causa principal pudesse vir a ser declarado constituído ou exigido.

9. No acórdão da Relação do Porto proferido no dia 25 de Novembro de 1991 expressou-se, por seu turno, que para a existência do elemento material ou corpus da posse não era necessário um permanente contacto físico com a coisa e que bastava que ele se encontrasse virtualmente dentro do âmbito do poder de facto do possuidor ou detentor.

10. No acórdão da Relação de Lisboa proferido no dia 14 de Janeiro de 1997
afirmou-se, citando professores de direito, não ser necessário um permanente contacto físico com a coisa, bastando que a mesma esteja virtualmente dentro do âmbito do poder de facto do possuidor, não carecer a actividade de ser sempre efectiva, já que uma vez adquirida a posse, o corpus permanece como que espiritualizado, e que haverá corpus enquanto a coisa estiver submetida à vontade do sujeito por forma a que possa renovar a actuação material sobre ela, mas que nada disso resultou provado, e que era necessário que se praticassem actos de intensidade suficiente para se afirmar que o sujeito colocou a coisa sob o seu poder, tendo faltado aos autores provar a relação com a coisa que exprimisse a subordinação desta à sua vontade, traduzida na possibilidade de continuar o gozo, e que também se não demonstrou ter existido da sua parte intenção de agir como titulares do direito a que o exercício do poder de facto se referia, e que isso significava não terem os autores provado a existência de corpus nem de animus.

11. No acórdão da Relação de Lisboa proferido no dia 17 de Dezembro de 1998 afirmou-se que para haver posse não era necessário o contacto pessoal e/ou material com a coisa possuída, bastando a possibilidade de contacto, e que a intenção de agir como titular de certo direito resultava do exercício do poder de facto que se compreendia nesse direito.

12. Inexiste, no caso, jurisprudência uniformizada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

III
A questão essencialmente decidenda se o recurso em causa não é admissível e, consequentemente, se deve ou não manter-se o despacho do relator.
Tendo em conta o conteúdo do despacho reclamado e o que os recorrentes afirmaram no instrumento de reclamação, a resposta à referida questão pressupõe a análise da seguinte problemática:

- exclusão ou não de caso julgado formal relativamente ao despacho de recebimento do recurso pelo relator na Relação;

- lei adjectiva aplicável à questão da admissibilidade ou não do recurso em análise;

- limites legais à admissibilidade do recurso de agravo de acórdãos da Relação proferidos em procedimentos cautelares;

- pressupostos específicos da admissibilidade do recurso com fundamento na contradição de acórdãos;

- ocorrem ou não, no caso espécie, os referidos pressupostos?

Vejamos, de per se, cada uma das referidas sub-questões.

1.

Comecemos com a problemática da exclusão ou não de caso julgado formal relativamente ao despacho de recebimento do recurso pelo relator na Relação.
Os despachos que incidam sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo, salvo se, por sua natureza, não admitirem recurso de agravo (artigo 672º do Código de Processo Civil).

O caso julgado formal inexiste, face aos tribunais superiores, no que concerne ao despacho do juiz ou do relator que admita o recurso, ou uma sua determinada espécie, certo que a lei expressa que o mesmo os não vincula (artigo 687º, n.º 4, do Código de Processo Civil).

Assim, o facto de o relator da Relação ter admitido o recurso para este Tribunal, com fundamento na contradição de acórdãos não implica que nesta sede liminar se não possa questionar a sua admissibilidade por esse ou por outro fundamento que resulte da lei.

2.
Vejamos agora qual a lei adjectiva aplicável à questão da admissibilidade ou não do recurso em análise.
Salvo disposição legal inter-temporal em contrário, a lei adjectiva é imediatamente aplicável aos actos processuais que ocorram durante a sua vigência (artigos 12º, n.º 1, do Código Civil e 142º, n.º 1, do Código de Processo Civil).

Considerando a data em que foi interposto o recurso em causa - o dia 14 de Junho 2004 - é aplicável na espécie o disposto no artigo 678º, n.º 4, do Código de Processo Civil, este na versão decorrente do artigo 1º do Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março.

Por isso, ao invés do que ocorria no pretérito, o recurso em causa não é processado nos termos da revista ampliada a que se reportam os artigos 732-A e 732-B do Código de Processo Civil, antes o devendo ser nos termos gerais, isto é, com a intervenção do colectivo normal de juízes, salvo se for requerida e ou ordenada a intervenção no julgamento do plenário das secções cíveis ao abrigo do primeiro dos mencionados artigos.

3.
Atentemos, ora, nos limites legais à admissibilidade do recurso de agravo de acórdãos da Relação proferidos em procedimentos cautelares.
Estamos, conforme resulta do exposto perante um recurso de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão proferido pelo tribunal da Relação em recurso de agravo de decisão proferida na 1ª instância no âmbito de um procedimento cautelar especificado de restituição provisória de posse.

Das decisões proferidas nos procedimentos não cabe recurso de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça, salvo nos casos em que o recurso é sempre admissível (artigo 387-A do Código de Processo Civil).

E é sempre admissível recurso de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação que esteja em oposição com outro, dessa ou de diferente Relação, sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se a orientação nele perfilhada estiver de acordo com a jurisprudência já anteriormente fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça (artigo 678º, n.º 4, do Código de Processo Civil).

A referida excepção é harmónica com aquela que consta, a contrario, do artigo 754, n.º 2, do Código de Processo Civil, segundo o qual é admissível recurso do acórdão da Relação sobre a decisão da 1ª instância que esteja em oposição com outro, proferido no domínio da mesma legislação pelo Supremo Tribunal de Justiça ou por qualquer Relação, e não houver sido fixada jurisprudência com ele conforme pelo Supremo Tribunal de Justiça nos termos dos artigos 732-A e 732-B daquele diploma.

4.
Vejamos agora os pressupostos específicos da admissibilidade do recurso com fundamento na contradição de acórdãos.
Estabelece o n.º 4 do artigo 678º do Código de Processo Civil ser sempre admissível recurso do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, sobre a mesma questão fundamental de direito e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se a orientação nele perfilhada estiver de acordo com a jurisprudência anteriormente fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

Assim, a admissibilidade do recurso a que o mencionado normativo se reporta depende da existência de dois acórdãos da mesma ou de diferente Relação em oposição sobre a mesma questão fundamental de direito, ser o acórdão fundamento anterior e haver transitado em julgado, ser o acórdão recorrido insusceptível de recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal e não estar a solução jurídica adoptada no acórdão recorrido de acordo com a jurisprudência anteriormente fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça em assento ou acórdão de fixação de jurisprudência.
As questões de direito delimitam-se no confronto com as questões de facto, envolvendo estas o apuramento das ocorrências pretéritas da vida real nas suas vertentes de tempo, modo e lugar, e aquelas a interpretação e aplicação da lei, ou seja, quando a respectiva solução dependa da interpretação e aplicação de determinadas normas jurídicas. A oposição de acórdãos quanto à mesma questão fundamental de direito ocorre quando, num e noutro, a mesma disposição legal for objecto de interpretação ou aplicação oposta, ou seja, quando o caso concreto é decidido, com base nela, num acórdão e no noutro em sentido oposto.

À referida oposição não obsta o facto de os casos concretos decididos em ambos acórdãos apresentarem contornos e particularidades diferentes, desde que a questão de direito seja fundamentalmente a mesma. Todavia, pela própria natureza das coisas, o núcleo central da concernente situação de facto, no confronto das normas jurídicas a interpretar e ou a aplicar, tem em ambos os casos de assumir identidade.

5.

Atentemos, finalmente, se ocorrem ou não no caso espécie os pressupostos de admissibilidade do recurso em causa.

Conforme acima se referiu, no tribunal da primeira instância, com base nos factos articulados pelos requerentes e pelos requeridos, foi decidido não resultarem elementos bastantes para concluir pela existência de actos materiais integradores do corpus da posse dos requerentes, nem dos elementos alegados decorrer a violência do esbulho por os requerentes não terem estado presentes aquando da colocação da vedação, nem o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável, e acrescentou-se perguntar-se a que título se avançava com uma providência deste teor alguns meses antes do julgamento de acção onde as partes discutem a propriedade sobre o terreno, em especial sem o ser por apenso àquela acção.

No acórdão recorrido mencionando-se os artigos 384º, nº 1, 393º, 394º do Código de Processo Civil e 1305º do Código Civil, a Relação negou provimento ao recurso de agravo interposto do decidido no tribunal da 1ª instância, sob a motivação de os requerentes fundarem a sua posse no direito de propriedade, de este ser contestado pelos requeridos no procedimento cautelar e na acção de reivindicação, de falta de prova sumária do seu direito, de a vedação não poder significar esbulho, acrescentando comungar com o juiz da 1ª instância ao questionar a razão por que, estando pendente uma acção de reivindicação de propriedade sobre o prédio, não lhe foi apenso o procedimento cautelar, este não servir para tomar ou antecipar decisões definitivas sobre os direitos em litígio e não servir o argumento da caducidade invocado por os requerentes poderem logo avançar para a acção definitiva.

Entre a data do primeiro acórdão fundamento e a data do acórdão recorrido houve alteração meramente formal das normas processuais em todos eles interpretadas e aplicadas (artigos 1º a 3º do Decreto-Lei nº 180/96, de 25 de Setembro).
Como se tratou de alteração meramente formal, sem incidência sobre o respectivo conteúdo normativo, a conclusão é no sentido de que todos os mencionados acórdãos foram proferidos no domínio da mesma legislação.

Ignora-se, porém, se os mencionados acórdãos-fundamentos transitaram ou não em julgado, situação que teria de ser previamente esclarecida no sentido positivo pelos recorrentes como condição da admissibilidade do recurso em causa, não fora a circunstância que torna essa condição irrelevante, a que abaixo se fará referência.

No acórdão recorrido, tal como na sentença proferida na 1ª instância, a não apensação do procedimento cautelar ao processo da acção de reivindicação não serviu de fundamento para a decisão negativa em relação à pretensão formulada pelos recorrentes.

Decorrentemente, não tem qualquer fundamento legal, como é óbvio, a afirmação de contradição entre o acórdão recorrido e os acórdãos-fundamentos mencionados sob II 6 a 8.
Acresce que, no que concerne ao acórdão recorrido e aos acórdãos-fundamentos mencionados sob II 9 a 11, o que ocorre é a expressão de argumentação jurídica sobre os elementos estruturais da posse, nos últimos sob mera reprodução de afirmações doutrinais.

Todavia, conforme acima se referiu, a motivação da decisão no acórdão recorrido assentou essencialmente na circunstância de os recorrentes fundarem a sua posse no direito de propriedade e este ser contestado pelos recorridos no procedimento cautelar e na acção de reivindicação, na falta de prova sumária do seu direito e no facto de a vedação não poder significar esbulho.

Assim, no acórdão recorrido e nos acórdãos-fundamentos, ao invés do que os recorrentes expressaram, não ocorreu resolução em sentido contrário da mesma questão fundamental de direito, ou seja, na decisão de cada um dos respectivos casos concretos não atribuíram sentidos diferentes à mesma disposição lega no confronto com similares situações de facto.

Decorrentemente, não ocorre na espécie a contradição jurisprudencial em que a recorrente fundamenta a excepção de admissibilidade de recurso de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça, a que se reportam a parte final do artigo 387º-A e os artigos 678º, n.º 4 e 754º, n.º 2, segunda parte, todos do Código de Processo Civil, ou seja, não ocorre na espécie o fundamento do recurso por contradição de julgados.

Em consequência, não pode ser admitido o recurso de agravo do acórdão da Relação interposto pelos recorrentes para o Supremo Tribunal de Justiça, impondo-se a sua rejeição.

Improcede, por isso, a reclamação para a conferência formulada pelos recorrentes do despacho do relator.

Vencidos no incidente, são os reclamantes responsáveis pelo pagamento das custas respectivas (artigos 446º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, 15º, n.º 1, alínea x), e 16º do Código das Custas Judiciais, e 14º n.º 1, do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro).
Julga-se adequado, considerando a estrutura do incidente e o princípio da proporcionalidade, fixar a taxa de justiça respectiva no valor correspondente três unidades de conta (artigo 16º do Código das Custas Judiciais).

IV
Pelo exposto, indefere-se a reclamação e condenam-se os reclamantes no pagamento das custas respectivas, com taxa de justiça correspondente a duzentos e sessenta e sete euros.

Lisboa, 10 de Fevereiro de 2005
Salvador da Costa,
Ferreira de Sousa,
Armindo Luís.