Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
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| Nº Convencional: | JSTJ00010595 | ||
| Relator: | ALBUQUERQUE DE SOUSA | ||
| Descritores: | TRIBUNAL ARBITRAL CLAUSULA COMPROMISSORIA RECTIFICAÇÃO DE SENTENÇA ERRO MATERIAL CADUCIDADE | ||
| Nº do Documento: | SJ199105290789812 | ||
| Data do Acordão: | 05/29/1991 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Referência de Publicação: | BMJ N407 ANO1991 PAG458 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | AGRAVO. | ||
| Decisão: | PROVIDO. | ||
| Área Temática: | DIR PROC CIV. | ||
| Legislação Nacional: | CCIV66 ARTIGO 332 N1. CPC67 ARTIGO 106 ARTIGO 111 ARTIGO 497 ARTIGO 666 N2 ARTIGO 667 N1 ARTIGO 670 N2 ARTIGO 671 ARTIGO 1512 ARTIGO 1513 N5. L 31/86 DE 1986/08/29 ARTIGO 1 ARTIGO 2 N4 ARTIGO 5 - ARTIGO 7 ARTIGO 14 N1 ARTIGO 15 N1 ARTIGO 19 - ARTIGO 22 ARTIGO 24 N2 ARTIGO 29 N1. | ||
| Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO STJ DE 1954/03/12 IN BMJ N42 PAG193. ACÓRDÃO STJ DE 1958/06/06 IN BMJ N78 PAG315. ACÓRDÃO STJ DE 1962/02/23 IN BMJ N114 PAG421. ACÓRDÃO STJ DE 1977/01/20 IN BMJ N263 PAG210. ACÓRDÃO STJ DE 1981/03/19 IN BMJ N305 PAG230. | ||
| Sumário : | I - A caducidade da clausula compromissoria não implica a caducidade de todos os outros meios processuais, extra-arbitrais a que as partes poderiam recorrer se não tivessem estipulado tal clausula. II - A rectificação da sentença arbitral, efectuada tempestivamente pelos arbitros, e inatacavel. III - Os erros, lapsos ou inexactidões materiais so se verificam quando se escreveu coisa diversa do que se quis escrever, quando o teor da decisão não coincide com o que se tinha em mente escrever, com exclusão dos erros ou inaxactidões que se verifiquem no processo interno de formação do juizo expresso na decisão. | ||
| Decisão Texto Integral: | ■ Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Em 18 de Julho de 1972, "Setenave - Estaleiros Navais de Setubal, SARL", com sede em Almada (que, entretanto, se tornou empresa publica, com sede em Mitrena - Setubal - Decretos-Leis n. 478/75, de 1 de Setembro, e n. 182/76, de 9 de Março), e "Sociedade de Empreitadas Somague, SARL", com sede em Lisboa, celebraram entre si um contrato de empreitada para construção das docas secas, plataforma de construção e caldeiraria do estaleiro naval de Setubal da Setenave. No n. 1 da clausula 2 daquele contrato consideraram-se parte integrante do mesmo contrato os documentos a ele anexos, descriminados na clausula 3, entre os quais figuram o "caderno de encargos n. 3656 - empreitada de execução da doca seca, ecluse e obras maritimas" e as "condições gerais e particulares". No referido contrato de empreitada acordaram as partes na seguinte clausula compromissoria (clausula 10): "Qualquer questão surgida entre as partes sobre a interpretação ou execução deste contrato sera decidida por um tribunal arbitral, que se instalara na comarca de Lisboa, e que julgara segundo a equidade, nos termos do disposto nos artigos mil e quinhentos e treze e seguintes do Codigo de Processo Civil". A clausula 67 das "Condições Gerais" (relativa ao "regulamento dos litigios" e a "arbitragem"), com a alteração nela introduzida pelas "Condições Particulares", dispõe: "Qualquer litigio ou diferendo relativo ao contrato, sobrevindo entre o empresario ou o engenheiro, por um lado, e o empreiteiro, por outro lado, quer no decorrer da execução dos trabalhos ou apos a sua conclusão, quer antes ou depois da rescisão, abandono ou interrupção do contrato, sera primeiro submetido ao engenheiro, que decidira e, no prazo de 90 dias apos o requerimento da sua intervenção, dara a sua decisão por escrito ao empresario e ao empreiteiro. Salvo as disposições mencionadas a seguir, esta decisão sobre qualquer ponto de litigio submetido ao engenheiro sera definitiva e ligara o empresario e o empreiteiro ate a conclusão das obras. "O empreiteiro devera obedecer-lhe imediatamente e continuar a execução com toda a diligencia requerida, quer ele ou o empresario tenham ou não formulado pedidos de arbitragem. Se, dentro dos 90 dias que seguem a entrega por escrito da decisão do engenheiro as duas partes interessadas, nem o empresario nem o empreiteiro formularem pedido de arbitragem, esta decisão sera considerada definitiva e ligara o empresario e o empreiteiro. "Se, no prazo de 90 dias apos lhe terem requerido a sua intervenção, o engenheiro não der a sua decisão, ou se o empresario ou o empreiteiro não ficarem satisfeitos com ela, o empresario ou o empreiteiro poderão, nos 90 dias que se seguirem a notificação da decisão do engenheiro, ou dentro dos 90 dias seguintes a expiração do primeiro periodo de 90 dias (como pode acontecer), requerer que o assunto seja submetido a arbitragem, segundo o seguinte processo: "Todos os litigios ou diferendos a respeito dos quais a decisão do engenheiro (se a houver) se não tenha tornado decisiva e obrigatoria de acordo com o atras dito, serão resolvidos por arbitragem "ex aequo et bono" em conformidade com a Lei Portuguesa. (...)" A obra, a medida que ia sendo executada, foi sendo entregue a Setenave, por partes, em datas sucessivas. E, ao que esta diz, na altura das entregas, não revelava defeitos. Mas, entretanto, veio a surgir um diferendo entre as partes, por a Setenave entender que a execução da empreitada se tinha revelado defeituosa, em varios aspectos, por culpa da Somague. Tal diferendo entre "empresario" (Setenave) e "empreiteiro" (Somague) foi submetido a "Profabril-Centro de Projectos, SARL", empresa especializada que exerceu as funções de "engenheiro" nos termos das aludidas "condições gerais e particulares" - clausula 67, a qual tomou uma decisão, favoravel a Setenave, que foi comunicada a Somague em 6 de Abril de 1981. Esta, porem, não tomou qualquer medida, no sentido de cumprir a decisão do "engenheiro" por, em seu ver, nomeadamente, haverem ja caducado quaisquer direitos da Setenave, fundados na execução do contrato de empreitada. Por isso, em conformidade com a dita clausula compromissoria e ao abrigo do artigo 1513 do Codigo de Processo Civil, a Setenave, em 2 de Julho de 1981, requereu, perante o 3 juizo civel da comarca de Lisboa, a constituição do tribunal arbitral voluntario. Nesse processo, apos diversas vicissitudes, a nomeação dos arbitros so veio a realizar-se em 27 de Julho de 1982, mediante acordo das partes, sancionado pelo juiz da causa. No dia anterior, tinham ja as partes, em requerimento conjunto, definido, por acordo, o objecto do litigio que aos arbitros competia apreciar e julgar nos seguintes termos: Setenave e Somague acordaram em: "1 - Estabelecer que a remuneração dos arbitros se regule (...) "2 - Definir o objecto do litigio que consistira no apuramento das alterações verificadas nas Docas do estaleiro da Setenave, em Setubal, e respectivas causas; na determinação dos prejuizos delas resultantes; e na consequente imputação de responsabilidades; devendo o Tribunal Arbitral, porem, julgar preliminarmente, se para tanto dispuser dos elementos necessarios, a questão da aplicabilidade da propria clausula compromissoria". Fixadas oportunamente pelos arbitros as regras processuais a observar na arbitragem, a Setenave, em 12 de Novembro de 1982, apresentou a petição inicial do processo de arbitragem, em que, concluindo, formulou os seguintes pedidos: "Como pedido preliminar: "Que o Tribunal Arbitral decida não se haver operado a caducidade dos direitos da Autora provenientes da ma execução pela Re do contrato referido no artigo 1, tal como se demonstra nas partes separadas e destacaveis marcadas G) e H); "Se parecer ao Tribunal Arbitral que não pode conhecer desta questão sem apreciar elementos de facto, decida então reservar o conhecimento dela para a sentença final. "Como pedidos principais da acção: "Que a Re seja condenada na reparação dos defeitos que a obra revela em termos de a tornar capaz para o fim a a que se destina; ou "Que a Re seja condenada no pagamento a Autora do custo dessa reparação a ser levada a cabo por outrem, custo que sera fixado em execução de sentença, mas se computa desde ja em pelo menos escudos 280000000; e "Que a Re seja condenada no pagamento a Autora da indemnização correspondente aos prejuizos ja pela Autora suportados, que neste momento atingem o montante de 17550000 escudos, e no pagamento dos prejuizos que se vierem a verificar e serão avaliados em liquidação de sentença (...); "Com juros da lei, custas e selos dos autos e procuradoria condigna". Na sua contestação, a Somague defendeu-se por excepção, de duplo modo, e por impugnação e, por sua vez, deduziu reconvenção contra a autora. Começou, na verdade, por arguir a excepção de caducidade da clausula compromissoria, a qual, segundo a sua tese, teria caducado logo em 19 de Outubro de 1976, data em que o contrato teria sido pelas partes considerado "inteira e perfeitamente cumprido e, portanto, extinto". Para tanto, sustentou, designadamente, que, a luz do contrato, sendo certo que o conjunto dos trabalhos contratados se decompunha em varias obras, que eram entregues a medida da sua conclusão, e que o respectivo periodo de garantia decorria, relativamente a cada obra, a partir da sua recepção provisoria, coincidindo a conclusão do conjunto dos trabalhos com a entrega da ultima obra, o mesmo contrato teria de considerar-se cumprido com a recepção definitiva realizada no termo do ultimo periodo de garantia, devendo entender-se que, cumprido o contrato, este se extinguiu, deixando de vincular as partes, e que, extinto o contrato, não e possivel fazer valer a clausula compromissoria, a qual, naturalmente, se extinguiu tambem. Alegou, seguidamente, propondo-se prova-la, "a caducidade dos direitos que a autora pretende fazer valer e que a re contesta", sustentando, nomeadamente, que, por haverem decorrido os prazos de garantia das obras realizadas e entregues a autora, por os defeitos das obras não terem sido denunciados nos prazos legais e por os pedidos de eliminação dos defeitos e de indemnização não terem sido formulados em tempo, caducaram, quer o direito a eliminação dos invocados defeitos da obra, quer o direito ao pagamento do custo da reparação desses defeitos, a executar por outrem, bem como o direito a indemnização pelos prejuizos ja verificados e por verificar - direitos estes que a autora pretende fazer valer contra a re e que por esta foram contestados. Na contestação se invocou, ainda, a prescrição da responsabilidade delitual da re. Num segundo capitulo do mesmo articulado, desenvolveu a re sua defesa por impugnação (artigos 252 a 421). Por ultimo, em reconvenção, pediu a condenação da autora no pagamento duma indemnização de 100000000 escudos pelos danos causados ao seu credito e bom nome com a propositura da acção. Na replica, esforçou-se a autora por demonstrar que não se verificava a excepção de caducidade da clausula compromissoria, arguida pela re na contestação, e, em face desta, a autora aditou "mais um pedido preliminar - o pedido de que o Tribunal Arbitral decida não se haver operado a caducidade da clausula compromissoria, que logicamente deve antepor-se ao pedido preliminar ja formulado". Deste modo, a Setenave, nos artigos 238 e seguintes da replica, formulou expressamente a pretensão de que o tribunal arbitral, antes de entrar na apreciação da questão de saber se, sim ou não, se operara a caducidade dos direitos da autora provenientes da ma execução pela re do contrato de empreitada, decidisse preliminarmente essa outra questão que consistia em saber se, sim ou não, se verificava a caducidade da propria clausula compromissoria. No mais, reiterou a sua posição, definida no articulado inicial e, contestando o pedido reconvencional, concluiu no sentido de se dever decidir pela incompetencia absoluta do tribunal arbitral para dele conhecer, ou, caso assim não se entendesse, pela sua improcedencia. Houve, ainda treplica da "Somague", em que esta manteve o que alegara na contestação, impugnando os pedidos da autora e insistindo na procedencia do pedido reconvencional, bem como na procedencia da excepção da caducidade da clausula compromissoria. E, em reforço da sua tese quanto a caducidade da clausula compromissoria, juntou posteriormente a re um notavel e desenvolvido parecer do Professor Gomes da Silva, que passou a formar todo um volume do processo de arbitragem - folhas 1078 a 1411. (Anteriormente, a Setenave juntara um outro parecer, do Professor João de Castro Mendes - folhas 601 a 664) Pelas partes foi sendo sucessivamente prorrogado, ate 31 de Dezembro de 1986, o prazo a que se refere o artigo 1512, n. 1, alinea d), do Codigo de Processo Civil. Por decisão de 30 de Dezembro de 1986, o tribunal arbitral por maioria, julgou ter efectivamente ocorrido a caducidade da clausula compromissoria, por entender que "a vigencia da clausula compromissoria esta dependente do prazo de intervenção do Engenheiro e finda com ele" e que "o recurso a arbitragem e possivel durante o periodo de execução das obras e apos a sua recepção provisoria pelo Engenheiro, ate a recepção definitiva". E, considerando que seria contra a equidade não respeitar o esquema contratual (conscientemente querido pelas partes e, alias, licito, quanto ao seu objecto, para aos artigos 1225 e 330 do Codigo Civil), "pois colocaria um dos contraentes numa posição francamente desigual em relação ao outro, se se considerasse como não caduca, para alem da possibilidade de intervenção do Engenheiro, a clausula compromissoria", o tribunal arbitral concluiu assim: "(...) termos nos quais se declara expressamente a caducidade desta (da clausula compromissoria), com a consequente absolvição da Re do pedido". Julgou, ainda, o tribunal arbitral "não poder, em face do exposto, proceder igualmente o pedido reconvencional" (que, alias, nunca poderia proceder, face a delimitação do litigio que ao mesmo tribunal cumpria conhecer, tal como a estabeleceram as partes"), concluindo: "Decai, pois a Re desse pedido, absolvendo-se consequentemente a Autora nos termos mencionados". Os arbitros concluiram, pois, por declarar expressamente a caducidade da clausula compromissoria, com a consequente absolvição da re do pedido. Esta conclusão final veio, no entanto, a ser objecto de uma rectificação, em 31 de Dezembro de 1986, ou seja, no dia seguinte ao da prolação da sentença (e ultimo dia do periodo de prorrogação do prazo referido no artigo 1512, n. 1, alinea d), do Codigo de Processo Civil), rectificação essa que, por unanimidade dos arbitros, foi efectuada nos seguintes termos: "Tendo-se verificada que, por lapso material, alias facilmente constatavel no contrato, se escreveu erradamente na parte final da sentença " a caducidade desta, com a consequente absolvição da Re do pedido", aqui se consigna, para todos os efeitos legais, dever ler-se "a caducidade desta, com a consequente absolvição da Re". Assim, por força da emenda, foi suprimida, na transcrita conclusão final, a expressão "do pedido", tendo o tribunal arbitral declaradamente reconhecido que houvera um "lapso material, alias facilmente detectavel no contexto". Tal decisão do tribunal arbitral, com a rectificação introduzida pelos arbitros, não tendo sido objecto de recurso nem de reclamação, transitou em julgado. (Os mandatarios das partes foram notificados da sentença e da rectificação do erro material, respectivamente, por cartas registadas que lhes foram remetidas nos dias 5 e 26 de Janeiro de 1987). Em face da sentença do tribunal arbitral e da rectificação introduzida pelos arbitros na sua versão inicial, a Setenave, entendendo que a Somague foi absolvida da instancia, intentou contra esta, no tribunal da comarca de Setubal, uma nova acção, visando fazer valer pretensão identica a que formulara perante o tribunal arbitral. Com efeito, na presente "acção declarativa de condenação com processo ordinario", que no tribunal judicial daquela comarca, em 2 de Março de 1987, propos contra a Somague, a Setenave, alem de pedir a assistencia judiciaria, formulou na petição inicial os seguintes pedidos: "b) Que a Re seja condenada a reparar os defeitos que a obra revela, em termos de a tornar capaz para o fim a que se destina; ou Que a Re seja condenada no pagamento a Autora do custo dessa reparação, a ser levada a cabo por outrem, custo que sera fixado em execução de sentença, mas se computa, para efeitos do valor da acção, em, pelo menos, 400000000 escudos; "determinando-se que a escolha pertence a Autora; "c) Que a re seja condenada no pagamento a autora da indemnização correspondente aos prejuizos ja pela autora suportados: I - 8700000 escudos, supra, artigos 97 e 217;' - 3250000 escudos, supra, artigo 219; - 5600000 escudos, supra, artigo 220; num total de 17550000 escudos, a que acrescem os maximos encargos legais de mora, desde a data da citação da Re (16-11-82) no Tribunal Arbitral, que neste momento atingem o montante de 16575816 escudos e cinquenta centavos; II- Mais a importancia de 54800000 escudos (supra, artigo 222), com os maximos encargos legais de mora desde a data dos efectivos e sucessivos pagamentos parcelares dessa importancia, num total, neste momento, de 21867435 escudos e noventa centavos; d) E seja ainda condenada a pagar os prejuizos que se vierem a verificar e serão avaliados em execução de sentença, consoante a explanada supra, na alinea F); e) Tudo com juros, custas e selos dos autos, e o maximo de procuradoria a favor da A.". Posteriormente (folhas 184 a 214 - 2 volume da presente acção), a autora juntou um parecer do Professor Antunes Varela e do Doutor Sampaio e Nara, em apoio da sua tese de a decisão do tribunal arbitral consistir numa absolvição da instancia e de esta nova acção poder ainda ser oportunamente proposta perante o tribunal judicial. A re - a Somague - defendeu-se na forma da sua contestação de folhas 60 a 181 (2 volume), em que deduziu as seguintes excepções, que no artigo 855 desse articulado alinha por esta ordem: - Caso julgado e subsidiariamente - Preterição do tribunal arbitral voluntario (artigos 26 a 72); - Caducidade do direito de propor a acção (artigos 73 a 119); - Caducidade dos direitos alegados pela autora (artigo 120 a 435); - Extinção dos direitos alegados pela autora, "por renuncia posteipada da autora aos direitos que agora invoca" (artigos 436 a 445) Nos artigos 446 a 853 defendeu-se a re por impugnação. E nos artigos 856 e seguintes deduziu reconvenção contra a autora, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe uma indemnização de 100000000 escudos pelo prejuizo do seu credito e bom nome com a propositura desta acção, nos termos em que foi proposta, e, bem assim, no pagamento dos prejuizos que possam vir a verificar-se, a apurar em liquidação de sentença. Na organização da sua defesa, a re apoiou-se, fundamentalmente, no ja atras citado parecer do Professor Gomes da Silva; posteriormente, em apoio da sua tese quanto a verificação da excepção peremptoria do caso julgado e de que a absolvição proferida pelo tribunal arbitral recaiu sobre o fundo ou merito da causa, sendo absolvição do pedido e não da instancia, juntou a re outro notavel parecer do Professor Almeida Costa e do Doutor Tavares de Sousa (folhas 249 a 383 - 3 volume); entretanto, a mesma re apresentara ja um outro não menos douto parecer, do Professor Ferrer Correia e do Doutor Almeno de Sa, no sentido de, face a clausula compromissoria e a decisão do tribunal arbitral, final e definitiva, não ser possivel submeter o litigio em questão aos tribunais comuns (este parecer encontra-se junto por apenso). Houve, ainda, replica da Setenave. Pelas partes foram juntos multiplos documentos, constituindo seis processos apensos os que não foram directamente incorporados nos autos. Findos os articulados, foi, a folhas 386 e seguintes, proferido o despacho saneador. Entendeu o Meritissimo Juiz da causa poder e dever, desde logo, conhecer das excepções do caso julgado e da preterição do tribunal arbitral, em apreciação conjunta, por, embora de diferente natureza, essas duas excepções estarem interligadas. Quanto as restantes excepções deduzidas pela re (caducidade do direito de propor a acção, caducidade dos direitos da autora, e renuncia pela autora aos seus direitos), entendeu ser de relegar para momento ulterior o conhecimento delas (a não procederem as de caso julgado e de preterição do tribunal arbitral), ate porque considerou estar dependente de indagação e prova o conhecimento de tais excepções. E, apreciando a materia das referidas excepções de caso julgado e de preterição do tribunal arbitral, concluiu que esta ultima não se verifica, mas que se verifica a excepção peremptoria do caso julgado, que julgou procedente, e, em consequencia, absolveu a re Somague do pedido. Para tanto, o Meritissimo Juiz entendeu que a re fora efectivamente absolvida do pedido, não obstante a rectificação da sentença do tribunal arbitral; que este, ao declarar a caducidade da clausula compromissoria dera realmente como verificada a caducidade do direito da autora, tendo havido, assim, uma verdadeira decisão sobre o merito ou fundo da causa; e que, uma vez transitada, a decisão do tribunal arbitral constitui caso julgado material, quanto a inexistencia do direito alegado pela autora, o que obsta a sua reapreciação pelos tribunais comuns e impõe a improcedencia da acção. Inconformada, a Setenave interpos recurso para a Relação de Evora, a qual, todavia, em seu acordão de folhas 442 e seguintes, negou provimento ao agravo, confirmando a decisão recorrida. Desse acordão recorre agora a Setenave para o Supremo Tribunal de Justiça, na sua respectiva alegação formulando as seguintes conclusões: "1 - O conhecimento do presente recurso impõe a interpretação do acordão do Tribunal Arbitral que declarou caduca a clausula compromissoria; "2 - A interpretação tem de fazer-se para se descobrir o sentido da sua parte decisoria e definir se adquiriu força de caso julgado formal (artigo 671 do Codigo de Processo Civil) ou material (artigo 672); "3 - O caso julgado, realmente, so se forma, em principio sobre a decisão contida na sentença - nos precisos termos dela - e não sobre os seus fundamentos (artigo 673 do Codigo de Processo Civil); "4 - Para a interpretação da decisão do acordão do Tribunal Arbitral hão-de valer os seus elementos estruturais (relatorio, fundamentos, decisão - artigo 659 do Codigo de Processo Civil) e os elementos que lhe sejam exteriores mas possam esclarecer a decisão, como e o caso, por exemplo, da convenção de arbitragem; "5 - Tambem releva para a interpretação e propria vontade dos julgadores expressa no acto da rectificação do decidido; "6 - O elemento preponderante sera, no entanto, a fundamentação do julgado, a menos que a sua motivação e decisão sejam contraditorias, porque então e a parte decisoria que deve prevalecer; "7 - Na fixação do sentido e alcance da decisão tem de presumir-se que os julgadores consagraram as soluções mais acertadas e souberam exprimir o seu pensamento em termos adequados (artigo 9, n. 3, do Codigo Civil); "8 - Não pode, porem, atribuir-se a decisão um sentido que não tenha o minimo de correspondencia verbal, ainda que imperfeitamente expresso, com o seu texto (artigo 9, n. 2, do Codigo Civil); "9 - Pela conjugação ponderada de todos estes elementos, mas muito particularmente pela consideração dos seus fundamentos, dos termos da decisão proferida quanto a reconvenção, da declaração de voto do vencido e do proprio alcance da clausula compromissoria, e de entender que apenas a declaração de caducidade desta clausula integra a decisão e so essa declaração de caducidade constitui caso julgado; "10- Pelo teor da rectificação do acordão de 30 de Dezembro, ficou patente ter sido essa a intenção dos juizes e ficou decidido que em consequencia da caducidade da clausula compromissoria a Re, na acção, e a Autora, na reconvenção, foram absolvidas da instancia; "11- E essa interpretação a unica que se adequa a letra do acordão e e a unica que corresponde ao tratamento processual da incompetencia absoluta em razão da materia que necessariamente resulta da caducidade da clausula (artigos 510, n. 1, alinea a), 288, n. 1, alinea a), 105, n. 1, 106 e 96, n. 2, do Codigo de Processo Civil); "12- E e tambem a que melhor corresponde aos efeitos praticos decorrentes da clausula compromissoria e ao seu sentido normal, alem de ser a unica que possibilita o julgamento do pleito (artigos 236 e 239 do Codigo Civil); "13- Sendo essa a decisão, so em relação a ela se pode constituir caso julgado (artigo 673 do Codigo de Processo Civil); "14- E mero caso julgado formal, por a decisão não ter valor algum fora do processo (artigos 106, 288, n. 1, e 672 do Codigo de Processo Civil); "15- Não tem, por isso, acolhimento na decisão do Tribunal Arbitral - nem o minimo de correspondencia no seu texto uma vez que a rectificação se tornou inatacavel - a tese do douto acordão recorrido que a re foi absolvida do pedido nem a de que foi decidida a caducidade do proprio direito substancial da Autora; "16- Não se encontra assim vedada a Autora o recurso aos tribunais comuns para o conhecimento do merito da causa que o Tribunal Arbitral se absteve de julgar (artigos 493, n. 2, 288, n. 1, 66 e 2 do Codigo de Processo Civil); "17- Deve, pelo exposto, ser revogado o douto acordão recorrido, decidindo-se: I - Que o Tribunal Arbitral apenas decidiu da caducidade da clausula compromissoria; II - Que, em consequencia da caducidade dela, apenas absolveu a Re e a Autora da instancia; III- Que a decisão não produz efeitos fora do processo arbitral; e IV - Que, consequentemente, não ha caso julgado a respeitar". Posteriormente, com o seu requerimento de folhas 486, a recorrente - Setenave - juntou novo parecer do Professor Antunes Varela e da Doutora Maria dos Prazeres Beleza, no sentido de ter havido absolvição da instancia, por caducidade da clausula compromissoria e consequente incompetencia do tribunal arbitral, podendo a Setenave ingressar nos tribunais estaduais com uma nova acção destinada a apreciação da mesma pretensão que deduziu perante os arbitros. Em sentido contrario se pronunciou a recorrida - Somague - -, sustentando os fundamentos do acordão recorrido, que quer ver mantido, e defendendo, nomeadamente, que com o decurso do prazo (contratual) de garantia (com o qual coincidiria o prazo para a propositura da acção) caducou o direito de recorrer a arbitragem, "rectins", caducou o direito de acção da recorrente e, consequentemente, a propria clausula compromissoria, do acordão do tribunal arbitral decorrendo, com efeito necessario, a absolvição da re do pedido, e que, em qualquer caso, a convenção de arbitragem e o acordão arbitral transitado em julgado obstam a que o litigio possa ser conhecido de novo por qualquer outra instancia jurisdicional, nos termos dos artigos 493, 496 e 497 do Codigo de Processo Civil e do artigo 26 da Lei n. 31/86, de 29 de Agosto. O Ministerio Publico teve vista no processo e nada requereu. Corridos os vistos da lei, cumpre-nos decidir. Em face do que atras ficou desenvolvidamente relatado, analisando-se a sentença do tribunal arbitral e o teor da rectificação que lhe foi introduzida pelos arbitros, atendendo as posições no processo definidas pelas partes e ao que por estas vem alegado, bem como as autorizadas opiniões expendidas nos ja referidos seis doutissimos Pareceres de sabios, conhecidos e muito ilustres Mestres de Direito (como são os Professores Doutores Gomes da Silva, Ferrer Correia, Almeida Costa e Antunes Varela e o saudoso Professor Doutor João de Castro Mendes), em que cada uma das partes foi buscar apoio para a sua respectiva tese, dado o que se julgou no despacho saneador e no acordão recorrido, apura-se que a questão que no presente recurso vem submetida a nossa apreciação - e que se analisa em se decidir se, sim ou não, se verifica a excepção peremptoria do caso julgado, invocada pela re, - consiste, tão so em saber se, tendo a sentença do tribunal arbitral, na parte decisoria, concluido por declarar expressamente a caducidade da clausula compromissoria, "com a consequente absolvição da Re do pedido" (e por, nos mesmos termos, absolver igualmente a Autora do pedido reconvencional), mas havendo logo os arbitros, por verificarem ter cometido manifesto lapso material ao escreverem "absolvição da Re do pedido", procedido a rectificação da mesma sentença - da sua aludida conclusão final -, com a emenda suprimindo a expressão "do pedido", não obstante tal rectificação, a absolvição decretada pelo tribunal arbitral foi, ainda assim, a absolvição do pedido (por, ao declarar a caducidade da clausula compromissoria, o tribunal arbitral ter dado como verificada a caducidade do direito de autora), conforme pretende a re, recorrida, ou se, diversamente, como sustenta a autora, recorrente, devera entender-se que se trata de absolvição da instancia. De qualquer modo, põe-se sempre o problema de saber se, efectivamente, existe obstaculo legal a que a autora proponha, perante os tribunais estaduais, uma nova acção destinada a apreciação da mesma pretensão que deduziu perante os arbitros. Iremos seguidamente apreciar tal questão, sob os varios aspectos em que ela e encarada pelas partes e nos vem posta, sem esquecer que o que neste momento esta em causa e somente a materia de excepção peremptoria do caso julgado. Segundo o raciocinio, "prima facie" correcto, desenvolvido no douto e bem elaborado despacho saneador, chegou-se ai a conclusão de que, uma vez transitada, a decisão do tribunal arbitral constituiu caso julgado material quanto a inexistencia do direito alegado pela autora, o que obsta a reapreciação, pelos tribunais comuns, do mesmo litigio que fora submetido aos arbitros. Esse raciocinio, porem, assentando em premissas que não são verdadeiras, levou, necessariamente, a uma conclusão errada. Nomeadamente, ai se teve como existente o falso pressuposto de que, ao declarar a caducidade da clausula compromissoria, o tribunal arbitral deu como verificada a caducidade do direito da autora (o que constitui excepção peremptoria) e entendeu-se que houve, assim, uma verdadeira decisão sobre o merito ou fundo da causa, - o que tudo se mostra inexacto. Ai se aceitou tambem, infundadamente, quanto a nos, que a sentença do tribunal arbitral interpretou e qualificou a questão preliminar da caducidade da clausula compromissoria como de caducidade do direito da autora. E partiu-se do errado principio de que a caducidade da clausula compromissoria e consequencia da caducidade do direito de acção da ora recorrente. A relação seguiu identico raciocinio, que desenvolveu com base nas conclusões dos Pareceres dos Profs. Drs. Ferrer Correia, Almeida Costa e Gomes da Silva, juntos aos autos pela re e nos quais tambem esta apoiou a sua defesa. No acordão em apreço, entendeu-se, erradamente, em nosso ver, que o tribunal arbitral tinha que (devia) decidir, desde logo, se caducara o direito de accionar, ainda antes de decidir a questão da caducidade da clausula compromissoria, esquecendo que da decisão desta questão dependia poder-se concluir se ainda se mantinha, ou não, a competencia do proprio tribunal arbitral, pelo que sempre este tinha de começar por apreciar a questão da caducidade da clausula compromissoria. Adiantou-se no mesmo acordão que a sentença arbitral "tem valor proprio e e inatacavel em qualquer outro Tribunal" (inatacavel sendo, igualmente, a rectificação dessa sentença, efectuada tempestivamente pelos arbitros). E ponderou-se que, "sendo a caducidade uma excepção peremptoria, o seu conhecimento e a decisão sobre a verificação da sua existencia, reconhecendo que ela se verifica, implica a absolvição do pedido", e que "as partes acordaram em que o tribunal arbitral preliminarmente indagasse sobre se ainda poderia decidir a divergencia entre as partes em litigio" (tanto em relação a caducidade da clausula compromissoria, como em relação a caducidade do direito de acção da autora) pelo que "o tribunal arbitral teria de, desde logo, decidir se caducara ou não o direito de accionar". E entendeu-se que "a totalidade da clausula compromissoria" e formada por um duplo problema: saber se o tribunal arbitral ainda poderia decidir a relação em litigio e, em caso afirmativo, decidir sobre a relação material controvertida; ao decidir-se pela intempestividade da acção, ainda dispunha de jurisdição para tanto, mas, tomada essa decisão, esgotou-se o seu poder jurisdicional, com a consequencia necessaria de as partes não poderem ja recorrer a outra justiça. Na alegação do recurso, a recorrente - Setenave - insiste na tese de que o unico sentido possivel da decisão arbitral e o de ter absolvido a re da instancia, como consequencia necessaria da falta de jurisdição do tribunal arbitral, derivada da caducidade da clausula compromissoria. Ora, dado que a decisão se traduziu na absolvição da re, em consequencia da caducidade da clausula compromissoria, ha que precisar o efectivo sentido da absolvição decretada para se poder concluir pela existencia ou inexistencia do caso julgado material, quanto a procedencia ou improcedencia da pretensão da autora e, pois, quanto a posisibilidade legal de a mesma pretensão ser submetida a um tribunal estadual. E isto importa, naturalmente, que se tenha em consideração a natureza e o fundamento da convenção de arbitragem e dos direitos e vinculações dela resultantes, o seu conteudo e os seus efeitos, a extinção dessa convenção e/ou o seu efeito para o litigio, bem como o campo de aplicação do caso julgado. Consiste a convenção de arbitragem, fundamentalmente, numa manifestação concordante de vontades, no sentido de cometer a decisão de arbitros um litigio actual ou eventuais litigios (futuros) emergentes de determinada relação juridica (confere artigo 1 da Lei n. 31/85, de 29 de Agosto) o seu conteudo essencial ou geral e formado, pois, pela manifestação de vontade de constituir um tribunal arbitral para a decisão de um litigio. (Professor Doutor Raul Ventura, "Convenção de Arbitragem" - estudo publicado na Revista da Ordem dos Advogados, Ano 46 - - Setembro de 1986, paginas 291 e seguintes). Uma tal convenção tem, assim, natureza meramente adjectiva, relativamente a relação juridica a que respeita e que por ela não e directamente afectada, cujo conteudo não e modificado pela mesma convenção. De notar e, ainda, que a convenção de arbitragem, por si, não soluciona nem visa solucionar qualquer litigio, somente se destinando a providenciar sobre meios de solução. Nada, na nossa lei, aponta para algum efeito obrigacional da convenção de arbitragem, da qual para cada uma das partes nasce um direito potestativo, com a correlativa sujeição a uma vinculação, consistindo o conteudo desse direito na faculdade de fazer constituir um tribunal arbitral para o julgamento de certo litigio. (Autor e loc. citadas). Essencial e manifestar a vontade de constituir um tribunal arbitral para a decisão de um litigio, o que e permitido pelas leis que admitem os tribunais arbitrais. E, assim, a convenção de arbitragem produz, como efeitos principais (ou funções distintas), um efeito positivo e um efeito negativo. O efeito positivo de uma convenção de arbitragem valida consiste em facultar a qualquer das partes a constituição de um tribunal arbitral competente para o julgamento de litigios nela previstos. (E, assim, criado um direito potestativo, a que corresponde uma vinculação da outra parte. Sera esta, pois, a função positiva da convenção de arbitragem). Mas as leis que admitem os tribunais arbitrais criam o efeito negativo, ou reflexo (função negativa da convenção de arbitragem), que consiste na exclusão da competencia dos tribunais estaduais para o conhecimento do mesmo litigio. Note-se, todavia, que o efeito negativo da convenção de arbitragem não constitui conteudo desta: a vontade das partes não se dirige a excluir a jurisdição estatal, mas sim a constituir um tribunal arbitral, e a exclusão das jurisdições estatais resulta, quanto a vontade das partes, so reflexamente, ou implicitamente, do conteudo positivo da convenção, e a sancionada pela lei atraves de um meio tecnico, que, entre nos, e e excepção de preterição do tribunal arbitral (tambem chamada excepção de convenção de arbitragem). Esta excepção, porem, não sanciona o incumprimento de uma obrigação do demandante, pois que apenas efectiva o direito potestativo do demandado, relativamente a constituição do tribunal arbitral. (Tambem ao demandante, obviamente, a lei faculta meios tecnicos adequados a efectivação do seu direito potestativo que permitem vencer a resistencia do demandado quanto a constituição do tribunal arbitral, caso surja essa resistencia - ver artigos 11 e 12 da Lei 31/86). Se os interessados podem, pela sua convenção, criar um tribunal para conhecimento de um certo ou de eventuais litigios, os tribunais do Estado, como consequencia natural, devem ficar excluidos, temporaria ou definitivamente, do conhecimento do mesmo litigio. Mas nada garante absolutamente a efectivação da arbitragem. Existem condicionamentos da procedencia da excepção de arbitragem, relativos a respectiva convenção, como seja, por exemplo, o valor juridico actual desta. A primeira investigação, por parte do tribunal arbitral, respeita, na verdade, a existencia, validade e eficacia da propria convenção de arbitragem, pois que a excepção de arbitragem improcedera se o tribunal verificar que a convenção invocada e juridicamente inexistente ou nula, ou que a mesma caducou, deixou de produzir efeitos ou não e susceptivel de ser aplicada. Se a convenção for nula, ou inaplicavel, se caducou, se deixou de produzir efeitos não podera o tribunal arbitral, com base nela julgar o pleito. Por outro lado, a parte que invoca a convenção de arbitragem para evitar que a acção seja julgada por um tribunal estadual, deve estar pronta e disposta a que o litigio seja julgado no tribunal arbitral, pois, de contrario, conseguiria fazer paralizar a acção num e noutro foro. A procedencia da defesa baseada na convenção de arbitragem importa a extinção do processo no tribunal estadual. (Certas legislações estrangeiras, contudo, apenas estabelecem a suspensão da acção judicial como efeito negativo da convenção de arbitragem. Segundo outras - - sistema ingles -, as partes não podem, na convenção de arbitragem, excluir a jurisdição dos tribunais estaduais, podendo, no entanto, estipular uma especie de condição suspensiva para a propositura duma acção respeitante a algum assunto a que a convenção se aplique, convencionando que não havera direito de acção, perante o tribunal judicial, a respeito de um litigio que possa surgir entre elas ate que tal litigio seja julgado por um arbitro. Confere Raul Ventura, op. e loc. citadas). Se uma das partes propõe acção no tribunal judicial depois de iniciado ou, mesmo, findo o processo arbitral, varias hipoteses podem surgir, nomeadamente, a de ser intentada no tribunal judicial numa acção que, quanto ao fundo, coincide com o litigio submetido a um tribunal arbitral e neste ainda pendente. Podera, neste caso, ser arguida a excepção de preterição do tribunal arbitral, como ja se disse (não importando aqui saber se podera ser usada a excepção de litispendencia). A excepção de preterição do tribunal arbitral paralisa a jurisdição estadual, sendo oportunamente arguida. Mas, se o reu a não arguir, a acção prosseguira na jurisdição estadual. E a procedencia da excepção depende, como ja se viu, da existencia, validade, eficacia e aplicabilidade da convenção arbitral, na existencia dela se incluindo, não so a sua estipulação inicial, mas tambem a sua subsistencia no momento em que e invocada, ou seja, não ter caducado. A acção proposta podera eventualmente respeitar a propria convenção de arbitragem, e não ao fundo do litigio, designadamente, tendo directa e exclusivamente como pedido a declaração de inexistencia, de invalidade, de caducidade ou de inaplicabilidade da convenção. Como tambem a nulidade a caducidade ou a inaplicabilidade da convenção podem ser nessa acção invocadas, como questão preliminar, tão so, para justificar a introdução do pedido quanto ao fundo do litigio perante o tribunal judicial. Em qualquer dos casos, o reu podera arguir a excepção de arbitragem, que se funda na competencia do tribunal arbitral para conhecer da sua propria competencia. (Dado que a convenção de arbitragem atribui ao tribunal arbitral esse poder, deixa ele de caber ao tribunal estadual, ressalvada, claro esta, a necessidade de apreciação da excepção de preterição do tribunal arbitral). Outra hipotese sera a de a acção judicial ser proposta apos se extinguir a instancia no tribunal arbitral mediante a prolação duma decisão que passou em julgado, como sucede no caso em apreço, hipotese esta que, na verdade, podera levantar o problema da verificação da excepção peremptoria do caso julgado. (Segundo o disposto no artigo 26 da Lei n. 31/86, "a decisão arbitral, notificada as partes e, se for caso disso, depositada no tribunal judicial nos termos do artigo 24, considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptivel de recurso ordinario" - n. 1 - e "tem a mesma força executiva que a sentença do tribunal judicial de 1 instancia" - n. 2). Antes da publicação do Decreto-Lei n. 243/84, de 17 de Julho, e da Lei n. 31/86, de 29 de Agosto, no dominio do Codigo de Processo Civil (artigos 1508 e seguintes), a doutrina, entre nos, sobretudo, em face do disposto no n. 2 do artigo 1513 daquele Codigo, inclinava-se para atribuir a clausula compromissoria a natureza juridica de um contrato-promessa, por isso que, conforme se entendia, quem o subscrevesse obrigava-se a realizar o compromisso arbitral em caso de controversia que, por força dessa clausula, devesse ser levada ao tribunal arbitral. (Conforme, por exemplo Professor Doutor Galvão Telles, "Clausula compromissoria", in "o Direito", ano 89, pagina 264, e Professor Doutor A. Palma Carlos, "La Procedure Arbitrale", no "Jornal do Foro", n. 154, pagina 23) A lei exigia a celebração de um compromisso (artigo 1508); e da necessaria passagem pelo compromisso a doutrina e a jurisprudencia induziam que a clausula compromissoria tinha caracter preliminar e criava a obrigação de celebrar o compromisso; o mecanismo criado pelo artigo 1513 para atribuir relevancia a clausula compromissoria, no caso de uma das partes se mostrar remissa quanto a celebração do compromisso, era considerada o meio de conseguir a execução especifica da promessa contratada, e era isso que permitia que a clausula compromissoria levasse a constituição do tribunal arbitral; não fora esse preceito (artigo 1513), a violação, por uma das partes, da obrigação de outorgar o compromisso arbitral acarretaria apenas a sanção normal (ao tempo) das violações de contratos-promessa, que era a indemnização de perdas e danos. Por outro lado, a doutrina e a jurisprudencia mostravam-se divididas quanto ao ambito da excepção de preterição do tribunal arbitral, entendendo uma corrente que a excepção era arguivel tanto com fundamento em compromisso arbitral como em clausula compromissoria, ao passo que outra orientação apenas abrangia na excepção o compromisso arbitral e entendia que, em caso de clausula compromissoria, o reu devia requerer a suspensão da instancia,so podendo arguir a excepção depois de outorgado o compromisso arbitral ou de a celebração deste ser substituida por decisão judicial. São problemas que agora deixaram de existir, perante os textos legais actualmente vigentes, perdendo a controversia a sua justificação. Na vigencia do artigo 1508 do Codigo de Processo Civil, a clausula compromissoria nunca era bastante, so por si, para a constituição do tribunal arbitral, pois a arbitragem tinha de assentar num compromisso arbitral ou numa decisão judicial que excepcionalmente substituia o compromisso. Presentemente, a Lei 31/86 (assim como ja o depois revogado Decreto-Lei 243/84), esbatendo acentuadamente a distinção entre compromisso e clausula compromissoria e fazendo desaparecer uma diferença, quanto aos efeitos, que antes separava radicalmente aquelas duas figuras, centra-se na convenção de arbitragem, que, e certo, reveste a dupla modalidade de compromisso arbitral e de clausula compromissoria, consoante tem por objecto um litigio actual ou litigios eventuais (artigos 1, ns. 1 e 2, e 2, n. 3). A clausula compromissoria não necessita mais de ser completada por um compromisso e da acesso, directamente, a constituição do tribunal arbitral. Se ela e valida, não e ja necessario, quando se concretize algum litigio, celebrar um compromisso. Abarcando a clausula compromissoria litigios eventuais, indeterminados, mas não, necessariamente, todos os litigios que possam surgir da relação juridica a que aquela clausula se reporta (note-se que a Lei 31/86 não estabelece qualquer "regra de globalidade"), segue-se que as partes, dentro da esfera de litigios definidos pela relação juridica, podem escolher, como entendam, os litigios a decidir por arbitragem, desde que concretamente os definam na clausula. Podem, contudo, surgir questões de prejudicialidade entre litigios abrangidos e não abrangidos pela clausula. Quanto a extinção da convenção de arbitragem ou do seu efeito para o litigio, a Lei n. 31/86 refere expressamente o acordo revogatorio (artigo 2, n. 4) e os factos produtores de caducidade (artigo 4). (Atente-se na distinção feita no n. 1 do artigo 4: - "O compromisso arbitral caduca" " e a clausula compromissoria fica sem efeito, quanto ao litigio considerado". A distinção resulta logicamente do facto de o compromisso ter por objecto um litigio actual, para cuja decisão e constituido o tribunal arbitral, e de a clausula compromissoria abranger um numero indefinido de eventuais, futuros, litigios. Deixando de ter efeito para o litigio existente, o compromisso caduca, ao passo que a clausula compromissoria, embora deixando de ter efeito para o litigio determinado, pode manter-se e em regra mantem-se em vigor para o eventual aparecimento de outros litigios, que possam surgir entre as partes, emergentes da mesma relação juridica. Assim, em bom rigor, so pode falar-se em caducidade da clausula compromissoria havendo circunstancias que obstem a sua utilização, no futuro, para outros eventuais futuros litigios). Ha, efectivamente, que distinguir entre os factos que atingem a propria convenção de arbitragem (em qualquer das suas duas modalidades), fazendo-a terminar, e os factos que apenas fazem cessar o efeito da clausula compromissoria para o litigio considerado. Como ja se observou, nada, em boa verdade, garante absolutamente a efectivação da arbitragem. Antes de mais, pode a convenção de arbitragem ser revogada nos termos do n. 4 do artigo 2 da Lei 31/86. No caso de ser proposta a acção no tribunal judicial, se o reu não exigir o cumprimento da convenção de arbitragem, não arguindo a excepção de preterição do tribunal arbitral, havera de entender-se que ha renuncia de uma das partes a convenção de arbitragem e que essa renuncia basta para fixar a competencia do tribunal judicial. A convenção de arbitragem tambem se extingue (ou deixa de ter efeito para o litigio considerado) quando a instancia se extingue por desistencia ou confissão totais ou por transacção. Tendo a finalidade de permitir as partes a constituição de um tribunal arbitral para a decisão de um ou mais litigios, a convenção de arbitragem deixa de ter efeito, decidido que seja o litigio, por esgotada aquela finalidade (isto, com a ja referida ressalva quanto a clausula compromissoria). E o que sucede, por exemplo, quando o litigio for solucionado por decisão dos arbitros, transitada, sobre o fundo da causa. Mas a decisão arbitral pode consistir numa absolvição da instancia. E, sendo assim, ha que ponderar se a absolvição da instancia ocorreu, ou não, por incompetencia do tribunal arbitral e se, por força da sentença de absolvição da instancia, terminou ou não a convenção de arbitragem. Segundo o artigo 25 da Lei n. 31/86, "o poder jurisdicional dos arbitros finda com a notificação do deposito da decisão que pos termo ao litigio ou, quando tal deposito seja dispensado, com a notificação da decisão as partes". E esta uma disposição paralela do artigo 666, n. 1, do Codigo de Processo Civil, o que, todavia, não significa que aquele preceito da Lei 31/86 não tem em vista o valor da convenção de arbitragem e, designadamente, a sua extinção. Em conformidade com o tratamento dado pelo regime legal da arbitragem voluntaria a hipoteses em que o tribunal arbitral não chega a pronunciar-se sobre o merito da causa (tais como, por exemplo, as previstas nas tres alineas do n. 1 do artigo 4 da citada Lei 31/86), verificando-se que, nesses casos, a convenção de arbitragem e afectada, pois caduca, parece que a hipotese de absolvição da instancia deve ser dado tratamento semelhante. A propria lei, visando as hipoteses que, respeitando a convenção de arbitragem ou ao contrato principal, são susceptiveis de influir na competencia do tribunal arbitral, parece apontar no sentido de que o poder de examinar a existencia, a validade, a eficacia ou a aplicabilidade da convenção de arbitragem, ou do contrato em que ela se insere, e concedido ao tribunal arbitral, precisamente, para o fim de este se pronunciar sobre a sua propria competencia. Na verdade, o artigo 21, n. 1, da Lei n. 31/86 determina que o tribunal arbitral pode pronunciar-se sobre a sua propria competencia, mesmo que para esse fim seja necessario apreciar a existencia, a validade ou a eficacia da convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insira ou a aplicabilidade da referida convenção. Pelo exame efectuado, o tribunal arbitral pode considerar-se competente ou incompetente. No primeiro caso, "a decisão pela qual o tribunal arbitral se declara competente so pode ser apreciada pelo tribunal judicial depois de proferida a decisão sobre o fundo da causa e pelos meios especificados nos artigos 27 e 31". (n. 4 do artigo 21 da Lei 31/86) Desde que se julgue competente, portanto, o tribunal arbitral pode e deve conhecer do merito da causa. O conhecimento "de meritis" ficara, assim, dependente da posição assumida pelo tribunal arbitral quanto aos pressupostos da sua competencia, designadamente, quanto a aplicabilidade e/ou a eficacia da convenção de arbitragem. A caducidade, nomeadamente, pode respeitar apenas a convenção de arbitragem e, quando assim seja, o tribunal arbitral pode conhecer dessa caducidade. No caso de o tribunal arbitral se considerar incompetente (por exemplo, por julgar inaplicavel ou caduca, ou que ficou sem efeito a convenção de arbitragem), tal questão - - da incompetencia do tribunal arbitral - não podera ser reexaminada pelo tribunal judicial. Convem ter tambem presente que a convenção de arbitragem, para alem do seu conteudo essencial e do conteudo facultativo previsto na lei (V., nomeadamente, artigos 1, 2, 4, n. 2, 5, 6, n. 2, 7, n. 1, 14, n. 1, 15, n. 1, 19, n. 1, 20, ns. 1 e 2, 22, 24, n. 2, e 29, n. 1, da Lei n. 31/86), podera conter ainda elementos acessorios que podem constar da generalidade dos negocios juridicos (tais como condição ou termo, suspensivos ou resolutivos). Podera, designadamente, como e frequente, prever que, antes de alguma das partes recorrer a arbitragem, sejam feitos reforços ou tenha lugar determinada actuação para se encontrar uma solução amigavel do litigio, ou uma solução rapida, eficiente e equilibrada da controversia. Licito parece ser, tambem, estipular uma clausula compromissoria em termos tais que, se o processo de arbitragem não for iniciado dentro de certo tempo, as pretensões a que as partes se julguem habilitadas se considerem extintas. A este proposito, convira, no entanto, não esquecer a distinção entre clausulas compromissorias que limitam o tempo para ser requerida a arbitragem , mas não afectam a possibilidade de, decorrido esse tempo, o litigio ser submetido aos tribunais estaduais, e clausulas compromissorias que, pelo decurso do tempo fixado, impedem o ulterior conhecimento do litigio por qualquer jurisdição, arbitral ou estadual. Em termos gerais, no nosso direito positivo, e licito as partes de um negocio estipular prazos de caducidade para o exercicio de um direito, podendo esse proposito ser conseguido pela estipulação de um prazo para a propositura da respectiva acção (artigo 332, n. 1, do Codigo Civil). Podem, assim, aparecer clausulas compromissorias sujeitas a um termo final e clausulas que, a respeito da arbitragem, estipulam um prazo de caducidade do proprio direito subjectivo. (A primeira hipotese aparece em ligação com a clausula compromissoria sujeita a caducidade, ao passo que a 2 tanto pode ser expressamente prevista na clausula compromissoria, como ser "desdobrada" no contrato, por ex:, estabelecendo que se devera fazer valer o direito nascido do contrato num prazo determinado e estipulando, depois, uma clausula compromissoria para todos os litigios emergentes do contrato). O Codigo de Processo Civil, no seu artigo 1512, indicava diversos casos de caducidade do compromisso arbitral, determinando, na alinea d) do n. 1, que "o compromisso fica sem efeito, se os arbitros não proferirem a decisão dentro do prazo fixado no compromisso ou em escrito posterior ou, quando não tenha sido fixado, dentro do prazo de seis meses salvo se as partes acordarem na prorrogação". Não previa o Codigo semelhante hipotese para a clausula compromissoria, pela singela razão de que esta não bastava para a constituição do tribunal arbitral, sendo sempre necessaria a outorga do compromisso, ao qual acabaria por se reconduzir a caducidade. Presentemente, a lei e expressa no sentido da caducidade (ou falta de efeito da clausula compromissoria para o caso considerado - artigo 4, n. 1, alinea c), da Lei n. 31/86). E tal caducidade tem de considerar-se abrangida pela alinea b) do n. 1 do artigo 27 dessa Lei, pois o tribunal arbitral, depois do decurso do referido prazo, torna-se incompetente para proferir a decisão. Note-se, por fim, que a caducidade da convenção de arbitragem não tem um efeito automatico. Designadamente, o tribunal arbitral não esta inibido de apreciar (preliminarmente) a validade, a eficacia e a aplicabilidade da convenção de arbitragem, para o fim de conhecer da sua propria competencia, conforme ja se viu e como se dispõe no n. 1 do artigo 21 da Lei n. 31/86. Se a caducidade respeita apenas a convenção de arbitragem, o tribunal arbitral podera conhecer dessa caducidade. (Confere, no sentido que ficou exposto, o ja citado estudo do Professor Doutor Raul Ventura, que vimos seguindo de perto, sob o titulo "Convenção de Arbitragem", publicado na Revista da Ordem dos Advogados, ano 46, paginas 289 e seguintes). Apos as considerações que atras deixamos desenvolvidas, e chegada a altura de procedermos a analise da decisão proferida pelos arbitros e por eles rectificada, a fim de determinarmos o sentido dela. Designadamente, ha que saber se o tribunal arbitral "interpretou e qualificou" a questão preliminar da caducidade da clausula compromissoria como de caducidade do direito subjectivo da autora e se a sentença arbitral, ao decretar a caducidade da clausula compromissoria, conheceu do merito da causa ou deu como verificada a caducidade do direito da autora. Importa ainda saber, nomeadamente, se a mesma sentença julgou que a clausula compromissoria, no caso dos autos, comporta um prazo convencional de caducidade, referida pelas partes a propositura da acção, tratando-se duma clausula compromissoria que implica o recurso a arbitragem dentro de um prazo limite, decorrido o qual as pretensões das partes relativas ao contrato não mais podem fazer-se valer em juizo, impedindo o conhecimento da causa, para alem daquele prazo, por qualquer tribunal, arbitral ou estadual. E ha que saber, tambem, se os arbitros entenderam que as partes tiveram em vista que os eventuais litigios emergentes do contrato fossem submetidos exclusivamente a jurisdição arbitral, e de modo peremptorio, dentro de um certo prazo, estipulando, para isso, na clausula compromissoria ( ou em articulação com ela ) um prazo de caducidade do proprio direito, por referencia ao direito de accionar. Sintetizando, importa determinar o que e que a decisão arbitral julgou que efectivamente caducou. Na sua parte decisoria, a sentença arbitral concluiu por declarar expressamente a caducidade da clausula compromissoria, "com a consequente absolvição da Re do pedido". Esta conclusão final logo foi, porem, objecto duma rectificação, a que os arbitros, por unanimidade, procederam no dia imediato ao da prolação da sentença, nos seguintes termos: "Tendo-se verificado que, por lapso material, alias facilmente constatavel no contexto, se escreveu erradamente na parte final da sentença "a caducidade deste, com a consequente absolvição da Re do pedido", aqui se consigna, para todos os efeitos legais, dever ler-se "a caducidade desta, com a consequente absolvição da Re". Consistiu, pois, essa emenda na supressão da expressão "do pedido" na conclusão final da sentença, havendo o tribunal arbitral declaradamente reconhecido que, na redacção da parte decisoria, se cometera um lapso material, do proprio contexto da sentença resultando manifesta a verificação desse erro material, ao escrever-se ai "com a consequente absolvição da Re do pedido". Segundo o proprio tribunal arbitral, portanto, do proprio contexto da sentença resulta não ter tido o tribunal a intenção de absolver a re do pedido. Trata-se, na verdade, da rectificação, por iniciativa do tribunal, dum erro material - de escrita - devido a lapso manifesto, permitida pelo artigo 666, n. 2, do Codigo de Processo Civil, tendo sido a sentença corrigida, quanto a esse erro, pelo proprio tribunal arbitral, em conformidade com o disposto no n. 1 do artigo 667 do mesmo Codigo. Repetidamente tem vindo este Supremo Tribunal a decidir que os erros, lapsos ou inexactidões materiais, cuja rectificação e consentida por aqueles preceitos, so se verificam quando se escreveu coisa diversa do que se quis escrever, quando o teor da decisão não coincide com o que se tinha em mente escrever, podendo acontecer que se tenha omitido o que se quis consignar ou que se verifique manifesto lapso no que se consignou , isto e, quando seja manifesto que as palavras trairam a intenção do julgador ou que este, por lapso, disse coisa diversa do que tinha em mente. (Confere, entre outros, os acordãos de 12 de Março de 1954: BMJ 42 - - 193, de 6 de Junho de 1958: BMJ 78 - 315, de 23 de Fevereiro de 1962: BMJ 114- 421, de 20 de Janeiro de 1977: BMJ 263 - 210, de 19 de Março de 1981: BMJ 305 - 230, e, ainda, Rodrigues Bastos, "Notas ao Codigo de Processo Civil", volume 3, pagina 244, e A. Reis, na Revista de Legislação e Jurisprudencia, Anos 84, pagina 166, e 87, pagina 144). Assim, como parece evidente, estão fora da possibilidade de rectificação os erros ou inexactidões intelectuais verificados no processo interno de formação do juizo expresso na decisão. Na verdade, conforme se julgou no citado acordão de 23 de Fevereiro de 1962, "os erros materiais a que alude o artigo 667 do Codigo de Processo Civil abrangem as inexactidões que respeitem exclusivamente a expressão material da decisão, opondo-se-lhes os erros ou inexactidões que se verificam no processo interno de formação do juizo expresso na decisão". Significa isto que so podem ser objecto de rectificação os erros meramente materiais, e não os erros de julgamento. Para se saber se o erro que foi cometido e, ou não, meramente material e, pois, rectificavel nos termos do artigo 667, n. 1, do Codigo de Processo Civil, ha, efectivamente, que indagar e verificar qual foi a vontade real, a intenção do julgador, o que e que este tinha em mente, para depois se fazer o confronto com o que se consignou na sentença, com a vontade ou intenção que ai foi delcarada, e tirar disso as devidas conclusões. So havera lugar, porem, a essa actividade, implicando censura do acto de correcção da sentença atraves de rectificação de suposto erro ou inexactidão, se estiver em causa o uso indevido do poder conferido ao juiz pelo artigo 667, n. 1, ja varias vezes citado, ou seja, no caso de ser impugnada a propria rectificação. E não e este o caso. Com efeito, não se trata aqui de saber se foi, ou não, cometido erro rectificavel. A rectificação, uma vez efectuada, considera-se complemento e parte integrante da sentença, podendo as partes, em caso de recurso, alegar perante o tribunal superior o que entendam de seu direito no tocante a rectificação. (Artigos 670, n. 2, e 667, n. 2, do Codigo de Processo Civil) Conforme se acentua no acordão recorrido, a rectificação da sentença arbitral, efectuada tempestivamente pelos arbitros, e inatacavel. A decisão arbitral, que tem a mesma força executiva que a sentença do tribunal judicial da 1 instancia, considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptivel de recurso ordinario, sendo certo que, no caso presente, a decisão em apreço não foi impugnada, nem pela via de recurso, nem atraves de acção de anulação. (Ver artigos 26 a 29 da Lei n. 31/86) Alias, tal decisão nem sequer foi, por qualquer modo, atacada por alguma das partes, as quais - ambas - com ela se conformaram e a acataram. Importa, na verdade, ter isto presente e não esquecer que não se trata, nestes autos, de recurso da sentença arbitral, que não foi impugnada. Precisamente porque essa sentença pos definitivamente fim ao processo do tribunal arbitral, e que na presente acção se põe o problema da existencia ou inexistencia da excepção peremptoria do caso julgado (Artigo 497 do Codigo de Processo Civil). Fora de causa esta, portanto, saber se o erro verificado pelos arbitros e por eles corrigido e, ou não, um simples erro material e, como tal, rectificavel nos termos do artigo 667, n. 1, do Codigo de Processo Civil, não se podendo, neste momento, apreciar a questão de saber se, sim ou não, havia motivo para se corrigir a sentença arbitral, se nela se cometeu, ou não, o aludido erro, se tal erro era meramente material e rectificavel, nos ditos termos, ou, pelo contrario, era, antes, erro de julgamento, ou respeitava, propriamente ao "processo interno de formação do juizo expresso na decisão". Tem, pois, de aceitar-se que, decretando a absolvição do pedido, o tribunal arbitral escreveu, na conclusão final da sentença, coisa diversa daquilo que quis escrever, não coincidindo o teor da decisão com o que os arbitros tinham em mente escrever, havendo manifesto lapso no que se consignou (absolvição do pedido), tendo ai as palavras - a expressão "do pedido" - traido a intenção dos arbitros, escrevendo-se coisa diversa daquilo que o tribunal arbitral tinha em mente. Como tem tambem necessariamente de aceitar-se que, ao procederem a dita rectificação, os arbitros não tiveram em vista corrigir a sentença, quanto a quaisquer erros ou inexactidões (intelectuais) que eventualmente se tivessem verificado no processo interno de formação do juizo expresso na conclusão final da sentença (na sua parte decisoria), i. e, não pretenderam corrigir a sentença quanto a um qualquer erro de julgamento. Como assente tem, pois, de considerar-se que o tribunal arbitral não quis decretar a absolvição do pedido. A decisão arbitral limitou-se a declarar - "expressamente" - a caducidade da clausula compromissoria ("com a consequente absolvição da Re"). E da sentença proferida pelo tribunal arbitral não se ve que este, ao declarar a caducidade da clausula compromissoria, tenha julgado verificada, tambem, a caducidade do direito da autora, o que não resulta do contexto da sentença. Tambem não e exacto que alguma vez as partes hajam acordado em que o tribunal arbitral preliminarmente indagasse sobre se ainda poderia decidir as divergencias existentes entre as partes, tanto em relação a caducidade da clausula compromissoria, como em relação a caducidade do direito de acção da autora, inexacta se mostrando, desde logo, a ilação de que o tribunal arbitral teria de, preliminarmente, antes de mais nada, decidir se caducara ou não o direito de accionar. Igualmente não e verdade que a sentença arbitral tenha interpretado e qualificado a questão preliminar da caducidade da clausula compromissoria como de caducidade do direito da autora. A clausula compromissoria (clausula 10 do contrato de empreitada, ja inicialmente transcrita) e do seguinte teor: "Qualquer questão surgida entre as partes sobre a interpretação ou execução deste contrato sera decidida por um tribunal arbitral, que se instalara na comarca de Lisboa, e que julgara segundo a equidade, nos termos do disposto nos artigos 1513 e seguintes do Codigo de Processo Civil". Por esta convenção, as partes expressaram a sua vontade no sentido de submeterem a decisão de um tribunal arbitral, a instalar na comarca de Lisboa, os litigios eventuais emergentes do contrato de empreitada que celebraram em 18 de Julho de 1972, e concederam aos arbitros autorização para julgarem segundo a equidade (nos termos e para os efeitos dos artigos 1513, 1519, 1520, 1522 e 1524 do Codigo de Processo Civil). Em conformidade com o disposto no n. 5 do citado artigo 1513, as partes vieram oportunamente a fixar com precisão o objecto do litigio, que entre si surgira, entretanto, e pretendiam submeter a decisão dos arbitros, nos seguintes termos: "Setenave e Somague acordaram em "2. Definir o objecto do litigio, que consistira no apuramento das alterações verificadas nas Docas do estaleiro da Setenave, em Setubal, e respectivas causas; na determinação dos prejuizos delas resultantes; e na consequente imputação de responsabilidades; devendo o tribunal arbitral, porem, julgar preliminarmente se para tanto dispuser dos elementos necessarios, a questão da aplicabilidade da propria clausula compromissoria". Efectivamente, a controversia que surgira entre as partes respeitava a alterações nas docas dos estaleiros da Setenave, em Setubal, e respectivas causas, a determinação dos prejuizos delas resultantes e a imputação de responsabilidades. Mas, segundo a versão da Setenave, para alem disso, tambem entre as partes surgira divergencia quanto a interpretação e alcance da estipulação da clausula compromissoria em conjugação de determinadas clausulas das "condições gerais" e das "condições particulares" (do contrato de empreitada), pretendendo a Somague que, mediante a atribuição de certas funções ao "engenheiro" e a fixação de "prazos de garantia", fora convencionado um prazo de caducidade para o exercico dos direitos emergentes do contrato, entendendo que, no caso, a estipulação da clausula compromissoria comportava um prazo convencional de caducidade, referido a propositura da acção, implicando o recurso a arbitragem dentro dum prazo limite, findo o qual ja não poderiam fazer-se valer em juizo as pretensões das partes relativas ao contrato, e sustentando que havia ja decorrido tal prazo e, por isso, se operara a caducidade dos direitos da Setenave emergentes da execução do contrato. Por tal motivo, logo na petição inicial que apresentou no processo que promoveu perante o tribunal arbitral que, entretanto, fizera instaurar, a Setenave, formulando um primeiro pedido, que designou por pedido preliminar, requereu "que o tribunal arbitral decidisse não se haver operado a caducidade dos direitos da Autora provenientes da ma execução, pela Re, do contrato de empreitada", adiantando que, caso o tribunal arbitral entendesse que o conhecimento dessa "questão preliminar" dependia da produção de prova, então se relegasse para a sentença final o conhecimento de tal questão. Pos, assim, a autora ao tribunal arbitral, de modo expresso, com questão preliminar, a questão da caducidade do direito dela, autora, sustentando que tal caducidade (que a Somague perante ela vinha invocando) não se verificava e que não se operara a caducidade do direito de recorrer a arbitragem para ver derimido o litigio. Na sua contestação, a Somague, tomando posição quanto a essa questão, alegou a excepção peremptoria da caducidade dos direitos que a autora pretendia fazer valer (" e que a re contesta" - sic), sustentando que, por diversas razões, haviam caducado os direitos da autora a eliminação dos defeitos da obra ou a reparação deles, por outrem, por conta da re, bem como a indemnização dos prejuizos dai resultantes para a autora. Mas, independentemente disso, e antes disso, ou seja, antes de invocar essa excepção peremptoria, a Somague arguiu a excepção dilatoria da caducidade da clausula compromissoria com o cumprimento do contrato (que, no seu ver, teria ficado inteiramente cumprido e se extinguira logo em Outubro de 1976) Por isso mesmo, na replica, a Setenave se esforçou por mostrar que não se verificava essa excepção dilatoria invocada pela re, e aditou um novo pedido, "mais um pedido preliminar" - o pedido de que o tribunal arbitral decidisse não se haver operado a caducidade da clausula compromissoria. E adiantou que este novo pedido preliminar "logicamente devia antepor-se ao pedido preliminar ja formulado na petição inicial, ou seja, ao pedido de declaração de não se ter verificado a caducidade do direito da autora. Deste modo, a Setenave submeteu a apreciação do tribunal arbitral, distinta e separadamente, duas questões ("preliminares") diferentes, de natureza diversa, a saber: em primeiro lugar, a questão da caducidade da clausula compromissoria - excepção dilatoria; em segundo lugar, a questão da caducidade do direito da autora - excepção peremptoria. Não poderia, assim, ser confundida a questão preliminar da caducidade da clausula compromissoria com a da caducidade do direito da autora. Nem se pode afirmar que o tribunal arbitral teria de começar por decidir se caducara ou não o direito de accionar. Trata-se, na verdade, de questões bem distintas, de duas excepções - dilatoria e peremptoria - de natureza diferente e que tem alcance diferente e produzem efeitos diversos (artigo 493 do Codigo de Processo Civil), sendo certo que, antes de decidir sobre a procedencia ou improcedencia da excepção peremptoria, tinha o tribunal de conhecer da excepção dilatoria (artigo 510, n. 1, alineas a) e b), do Codigo de Processo Civil) Nem, alias, na sentença arbitral se faz a mais leve referencia a procedencia da excepção peremptoria de caducidade ou se fala, sequer, da caducidade dos direitos da autora ou da caducidade do direito de accionar. De modo algum se podera aceitar o entendimento de que as partes hajam acordado em que o tribunal arbitral indagasse preliminarmente se ainda poderia decidir as divergencias existentes entre as partes, tanto em relação a caducidade da clausula compromissoria, como em relação a caducidade do direito de acção da autora. Na fixação do objecto do litigio a decidir pelos arbitros, o que as partes estabeleceram a este respeito, foi, antes, que o tribunal arbitral deveria, se para tanto dispusesse ja dos elementos necessarios, julgar preliminarmente a questão da aplicabilidade da propria clausula compromissoria, e que não e bem a mesma coisa. Do que ja atras ficou dito se infere que pode pedir-se a declaração de não verificação de inexistencia, de invalidade de caducidade ou de inaplicabilidade da propria clausula compromissoria, como questão preliminar, apenas para justificar a introdução do pedido quanto ao fundo do litigio perante o tribunal arbitral. Trata-se, nesta hipotese, de questão preliminar que respeita, tão so, a propria convenção de arbitragem, e não ao fundo do litigio, e que se relaciona com a competencia do tribunal arbitral para decidir sobre a propria competencia. E que, efectivamente, pode, eventualmente, operar-se a extinção da convenção de arbitragem (ate, mesmo, na modalidade de clausula compromissoria) por virtude de factos produtores da sua caducidade, designadamente, quando ocorram circunstancias que a inutilizem, i. e, que obstem a sua utilização, no futuro, para quaisquer eventuais litigios. Serão factos - esses - que atingem a propria convenção de arbitragem, fazendo-a terminar. E teria sido isto o que se verificara, relativamente a clausula compromissoria inserta no contrato de empreitada (clausula 10), segundo os arbitros que fizeram a maioria. Estes, com efeito, entenderam que a vigencia da clausula compromissoria estava contratualmente dependente do prazo de intervenção do "Engenheiro", findando com esse prazo, e que o recurso a arbitragem so era possivel durante o periodo de execução das obras e apos a sua recepção provisoria pelo "Engenheiro", ate a recepção definitiva, e, por isso, consideraram que, para alem da possibilidade de intervenção do "Engenheiro", a clausula compromissoria não mais poderia produzir efeitos, caducando. Dai que o tribunal arbitral, por maioria, tenha expressamente declarado a caducidade da clausula compromissoria, por haver julgado que efectivamente se operara a caducidade dessa clausula. Limitou-se, com isso, o tribunal arbitral a decidir a "questão preliminar" da caducidade da clausula compromissoria - materia de excepção dilatoria deduzida pela re na contestação e que foi objecto do "novo pedido preliminar" formulado pela autora na replica -, sem, pois, entrar no conhecimento da excepção peremptoria da caducidade do direito da autora, tambem deduzida pela re, materia esta que, todavia, a autora se antecipara a incluir no objecto do "pedido preliminar" que começou por formular na petição inicial. O tribunal arbitral necessitou, assim, de apreciar a existencia, a eficacia e a aplicabilidade da clausula compromissoria, a fim de, atraves do exame efectuado, poder julgar-se competente ou incompetente para conhecer do fundo do litigio. Respeitando a caducidade apenas a clausula compromissoria, o tribunal arbitral podia dela conhecer preliminarmente, conforme ja se disse. E, portanto, julgando a clausula compromissoria caduca e inaplicavel, não podendo ja produzir efeitos, o tribunal arbitral considerou-se incompetente para conhecer do merito da causa. Trata-se, na verdade, de circunstancias que, respeitando a propria convenção de arbitragem, eram susceptiveis de influir na competencia do tribunal arbitral, sendo certo que a este e pela lei conferido o poder de apreciar a aplicabilidade da convenção de arbitragem, precisamente, como parece, para o fim de se pronunciar sobre a sua propria competencia. (Confere artigo 21, n. 1, da Lei 31/86). A sentença arbitral, a dado passo, pos em grande destaque o papel do "Engenheiro", segundo um determinado esquema, que as partes teriam adoptado, considerando ser "admissivel a consequencia de, fora desse esquema ou com o respectivo alheamento, não poderem as partes esperar a apreciação das pretensões que entendam formular", e ser "inadmissivel pretender qualquer delas ver uma causa conhecida, quando o recurso ao "Engenheiro" seja de facto ou contratualmente impossivel". E nesses termos se entendeu que "a vigencia da clausula compromissoria esta dependente do prazo de intervenção do Engenheiro e finda com ele". Nessa sentença se transcreveram depois alguns trechos do "Guidelines for Contracting for Industrial Projects", ai se vendo "os parametros a sombra dos quais se devem interpretar as clausulas 48, 49 - 1 e 2, 62 e 67 das Condições Gerais e Particulares, adiantando-se seguidamente: "A respectiva finalidade e a delimitar no tempo a situação contratual em causa, nomeadamente, quanto a situação de sujeição em que se traduz a responsabilidade eventualmente dela decorrente. O recurso a arbitragem e possivel durante o periodo de execução das obras e apos a sua recepção provisoria pelo Engenheiro, ate a recepção definitiva. Este esquema contratual (...) e, alias, sem sombra de duvida, licito quanto ao seu objecto, face aos artigos 1225 e 330 do Codigo Civil (...) Seria, alias, contra a equidade não o respeitar, pois colocaria um dos contraentes numa posição francamente desigual em relação ao outro, se se considerasse como não caduca, para alem da possibilidade de intervenção do Engenheiro, a clausula compromissoria, termos nos quais se declara expressamente a caducidade desta, com a consequente absolvição da Re do pedido". Não se pode, contudo, ver nisto "a interpretação e qualificação da questão preliminar da caducidade da clausula compromissoria como de caducidade do direito da autora" e, menos ainda, uma decisão sobre a caducidade do direito de accionar. O que o tribunal arbitral, essencialmente, entendeu foi que a vigencia da clausula compromissoria estava contratualmente dependente do prazo de intervenção do "engenheiro", findando com esse prazo, e que se tornara definitivamente irrealizavel a finalidade da clausula compromissoria com a extinção do contrato, pelo que, perdida a sua razão de ser, a clausula compromissoria caducara automaticamente. Isto, porem, respeitava a "possibilidade de o tribunal decidir quanto a clausula compromissoria", conforme na propria sentença arbitral se observou. Ai, alias, acentuando-se a importancia das multiplas funções do "engenheiro", ponderou-se, mesmo, "não se poder dizer que qualquer das funções do Engenheiro se destine a assegurar, mediante a prova da respectiva pratica, a exoneração de responsabilidade que hipoteticamente possa caber a um dos contraentes", embora a conduta de cada uma das partes não deva ser "ajuizada sem atenção a participação efectiva do Engenheiro no estabelecimento de tal juizo". Duvidas não existiam quanto a estipulação da clausula compromissoria e quanto ao respectivo conteudo. O que sucedeu foi que as partes adoptaram o mencionado "esquema" (constante das "Condições de Contrato (Internacional) - Trabalhos de Construção de Engenharia Civil"), segundo o qual a uma entidade designada por "Engenheiro" são atribuidas multiplas e importantes funções, designadamente, quanto a resolução de diferendos ou litigios relativos ao contrato de empreitada. (Vide, nomeadamente, a clausula 67 das "Condições Gerais", relativa ao "regulamento de litigios"). Tal mecanismo foi previsto, alem do mais, para se encontrar solução rapida, eficiente e equilibrada para as eventuais controversias na execução dos trabalhos ou, mesmo, apos a sua conclusão. Estipulou-se, todavia, que "todos os litigios ou diferendos a respeito dos quais a decisão do Engenheiro (se a houver) se não tenha tornado decisiva e obrigatoria, de acordo com o atras dito, serão resolvidos por arbitragem ex aequo et bono em conformidade com a Lei Portuguesa "(alteração introdizida pelas "Condições Particulares" na dita clausula 67 das "Condições Gerais"). Mas, evidentemente, esse "esquema" não afectou a clausula compromissoria, constante da clausula 10 do contrato de empreitada. Nem seria licito entender-se que, independentemente da clausula compromissoria pelas partes estipulada ao celebrarem o contrato de empreitada (referida clausula 10), atraves das "condições de contrato (internacional) para trabalhos de construção de engenharia civil" as partes teriam tido em vista estipular uma outra clausula compromissoria, em termos de se considerarem extintas as pretensões, relativas ao contrato, a que as partes se julguem habilitadas, no caso de o processo de arbitragem não ser iniciado dentro de certo tempo. Em si mesma, a clausula compromissoria - clausula 10 do contrato - não estabelece qualquer limitação de tempo para ser requerida a arbitragem. As referidas clausulas das "condições gerais e particulares" e que estabelecem um condicionalismo para ser requerida a arbitragem, mas sem afectarem a possibilidade de, decorridos os prazos a que se alude na clausula 67 das "condições gerais" (alterada na forma atras indicada), o litigio ser submetido aos tribunais. De qualquer modo, não foi estipulada clausula compromissoria que, pelo decurso de algum prazo, impeça o ulterior conhecimento do litigio por qualquer jurisdição. Efectivamente, as partes de um negocio e licito estipular prazos de caducidade para o exercicio de um direito, designadamente, mediante a estipulação de um prazo para a propositura da respectiva acção. Mas não e este o caso dos autos e nem isso se diz na sentença arbitral. Na verdade, dessa sentença não resulta haverem os arbitros entendido que, a respeito da arbitragem, a clausula compromissoria estipulara um prazo de caducidade do proprio direito subjectivo, ou que no contrato de empreitada se estabeleceu que as partes teriam de fazer valer os direitos emergentes desse contrato em determinado prazo, estipulando depois a clausula compromissoria para tais litigios. Nem, mesmo, da sentença arbitral se depreende haverem os arbitros entendido que, estabelecendo o referido mecanismo permanente regulador de diferendos entre o dono da obra (proprietario) e o empreiteiro, mediante a intervenção do "Engenheiro", as partes tiveram a intenção de estipular alguma condição suspensiva, ou outra. Pode, como ja se viu, a decisão arbitral concluir pela absolvição da instancia. E tem de entender-se ser este o sentido da conclusão final da sentença proferida pelos arbitros, no caso em apreço. A absolvição decorreu do facto de o tribunal arbitral se considerar incompetente (para conhecer do fundo do litigio), em consequencia da caducidade, expressamente declarada, da clausula compromissoria, e foi por força daquela sentença que terminou a convenção de arbitragem. Verificando que a clausula compromissoria fora afectada e caducara, o tribunal arbitral não chegou a pronunciar-se sobre o merito da causa. A declaração da caducidade da clausula compromissoria e que constitui o essencial da decisão arbitral. Na sua conclusão final, apos declarar a caducidade da clausula compromissoria, a sentença arbitral, todavia, acrescentou: "com a consequente absolvição da Re do pedido". Mas, corrigindo-a nessa parte, por conter manifesto erro (material) de escrita, os arbitros eliminaram a expressão "do pedido", devendo entender-se, com isso, que o tribunal arbitral não quis decretar a absolvição do pedido. Sendo assim, não se podera, sem se cair em contradição, senão mesmo num absurdo, afirmar que a absolvição proferida pelo tribunal arbitral recaiu sobre o fundo ou merito da causa, sendo, afinal, uma absolvição do pedido, e não da instancia, como tambem não se podera dizer que a absolvição , "não sendo do pedido", tem, contudo, "o mesmo valor, pelo menos, para a formação do caso julgado, que aquela em que sobre o merito se decidiu". E a unica conclusão a tirar dai, natural e logica, e a de que se declarou a caducidade da clausula compromissoria, com a consequente absolvição da instancia. So nesses precisos termos e limites e que a sentença arbitral constitui caso julgado (artigo 673 do Codigo de Processo Civil), e caso julgado formal, não tendo a decisão valor algum fora do processo (artigo 672, confere artigos 106 e 111 do Codigo de Processo Civil. Ora, a absolvição da instancia não obsta a que se proponha outra acção sobre o mesmo objecto, não tendo a decisão arbitral força de caso julgado material (artigo 671 do citado Codigo). Consideraram, alias, as instancias que a declaração da caducidade da clausula compromissoria e que constitui a decisão sobre que incide o caso julgado, sendo a consequente absolvição mera decisão processual. So que, infundadamente, se entendeu que o tribunal arbitral decidiu declarar a caducidade da clausula compromissoria, "dando como verificada a caducidade do direito da Autora", por considerar que as partes convencionaram um prazo especial - peremptorio - de caducidade de um ano, o que não e exacto. E a caducidade da clausula compromissoria não implica a caducidade de todos os outros meios processuais, extra-arbitrais, a que as partes poderiam recorrer se não tivessem estipulado tal clausula. Concluindo, entendemos que não se verifica a excepção peremptoria do caso julgado material, com a consequente absolvição da re do pedido, não estando, pois, afastada a possibilidade de o litigio ser submetido ao tribunal judicial. Improcede, portanto, a excepção peremptoria do caso julgado, deduzida na contestação da re e dada como verificada pelas instancias. Por tudo o exposto, da-se provimento ao recurso e, consequentemente, revoga-se o acordão recorrido, determinando-se que, na 1 instancia, o despacho saneador na parte em que julgou procedente a excepção do caso julgado e, em consequencia, absolveu a re do pedido, seja substituido por outro despacho que julgue improcedente tal excepção e proceda em conformidade. Custas, neste Supremo Tribunal e nas instancias, a cargo da recorrida. Lisboa, 29 de Maio de 1991 Albuquerque de Sousa, Mario Noronha, Pereira da Silva. |