Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2476/10.9YXLSB.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: LOPES DO REGO
Descritores: CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS
ACÇÃO INIBITÓRIA
CRÉDITO AUTOMÓVEL
RECONHECIMENTO DE DÍVIDA
DETERMINABILIDADE
LIVRANÇA EM BRANCO
TÍTULO EXECUTIVO
FORO CONVENCIONAL
Data do Acordão: 10/16/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA EM PARTE A REVISTA
Área Temática:
DIREITO DO CONSUMO - CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - ACÇÃO, PARTES E TRIBUNAL ( AÇÃO, PARTES E TRIBUNAL ) / TRIBUNAL / COMPETÊNCIA.
CUSTAS PROCESSUAIS / CUSTAS DE PARTE.
Doutrina:
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 71.º, N.º1, 95.º, 104.º, N.º1, AL. A), 533.º.
D. L. N.º 446/85: - ARTIGOS 30.º, 34.º.
REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS (RPC): - ARTIGOS 25.º, 26.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 20-01-2010, PROCESSO N.º 3062/05.0TMSNT.L1.S1.
Sumário :
1. Não padece de nulidade a cláusula contratual geral, inserida em contrato de adesão destinado ao financiamento de crédito automóvel, em que se prevê que o mutuário se confessa devedor do capital mutuado e respectivos juros, bem como dos encargos contratualmente previstos como estando a seu cargo, remetendo-se a determinação dos respectivos montantes para o Preçário do Banco – documento facilmente acessível ao interessado e que deverá, no momento da subscrição do contrato, ser objecto de adequado esclarecimento e informação ao aderente.

2. É nula, por afectar desproporcionalmente a posição do aderente, a cláusula que coloca a cargo do mutuário/aderente a ilimitada responsabilidade por todas e quaisquer despesas e honorários que o Banco realize, em caso de incumprimento contratual, sem qualquer remissão para a aplicabilidade das regras processuais atinentes às custas de parte e sem estabelecer de qualquer critério objectivo de determinação do montante possível de tais despesas e honorários.

3. É igualmente nula a cláusula que estabelece a obrigação, imposta ao mutuário/aderente, de, em reforço da tutela dos direitos do Banco no caso de alegado incumprimento, fazer entrega de uma livrança em branco, facultando-lhe, em termos claramente discricionários e incontrolados pelo cliente, o respectivo preenchimento pelas quantias que (unilateralmente) considere devidas, com base num pacto de preenchimento de conteúdo totalmente genérico e  indeterminado – permitindo-se por esta via ao autor da cláusula contratual geral criar, para sua conveniência, um título executivo , com a natureza de título cambiário, que imediatamente pode dar à execução pelos valores que considere em dívida.

4. É nula, por referência ao quadro contratual padronizado típico dos contratos de financiamento de crédito automóvel a cláusula que impõe a competência convencional do Tribunal da comarca de Lisboa – onde se situa a sede do Banco/mutuante - para todos os litígios emergentes do contrato.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. O MINISTÉRIO PÚBLICO propôs contra AA BANK (PORTUGAL), S.A. (actualmente com a denominação AA BANK EUROPE GMBH -SUCURSAL EM PORTUGAL, S.A.), acção declarativa, sob a forma de processo sumário, ao abrigo do disposto no artigo 26.°, n.° 1, alínea c), do DL n.° 446/85, de 25 de Outubro (Lei das Cláusulas Contratuais Gerais), com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.°s 220/95, de 31 de Agosto, 249/99, de 07 de Julho e 323/2001, de 17 de Dezembro, e no artigo 13.°, alínea c), da Lei de Defesa do Consumidor (Lei n.° 24/96, de 31 de Julho, com as alterações introduzidas pelo DL n.° 67/2003, de 8 de Abril), pedindo:

I - Que sejam declaradas nulas as cláusulas 3., 4.3., 13.2., 20.1, 20.2., 20.3. e 21, do contrato de crédito automóvel, junto como documento n.° 2, condenando-se o réu a abster-se de as utilizar em contratos que de futuro venha a celebrar e especificando-se na sentença o âmbito de tal proibição (artigo 30,°, n.° 1, do DL n.° 446/85);

II - Que o réu seja condenado a dar publicidade à decisão e a comprovar nos autos essa publicidade, em prazo a determinar na sentença, sugerindo que a mesma seja efectuada em anúncio a publicar em deis dos jornais diários de maior tiragem editados em Lisboa e no Porto, durante três dias consecutivos (artigo 30.°, n.° 2, do DL n.° 446/85), de tamanho não inferior a % de página.

III - Que seja remetido ao Gabinete de Direito Europeu certidão da sentença, para os efeitos previstos na Portaria n.° 1093, de 6 de Setembro (artigo 34.°, do DL n.° 446/85, de 25 de Outubro).

Para tanto alegou, em síntese, que a cláusula 3., sob a epígrafe "Confissão de Dívida", é nula por violação do artigo 19.°, alínea d), da Lei n.° 446/85 (Lei das Cláusulas Contratuais Gerais), uma vez que impõe uma confissão de dívida por parte do aderente com base em factos para tanto insuficientes-e, ainda, que tal confissão de dívida tem reflexos ao nível da repartição do ónus da prova, o que implica a sua nulidade, nos termos do artigo 21.°, alínea g), do mesmo diploma.
Alegou também que a cláusula 4.3., sob a epígrafe "Juros e Comissão de Contrato" é proibida num contrato deste tipo, nos termos do artigo 22.°, n.° 1, alínea c), e do artigo 22.°, n.° 2, alínea a), "a contrário", ambos da citada Lei das Cláusulas Contratuais Gerais.

Invocou que, com o funcionamento desta última cláusula, o Réu pode alterar unilateralmente a taxa de juro aplicável ao contrato e que a mesma não estipula a possibilidade de os aderentes terem o direito de resolução do contrato que lhes assiste quando o réu altere as condições financeiras.

Mais alegou que a cláusula 13.2., sob a epígrafe "Titulação e Convenção de Preenchimento" é nula, nos termos dos artigos 15.° e 16.°, ambos do mencionado diploma legal, por ofensa dos valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa fé, uma vez que provoca um desequilíbrio desproporcionado, em detrimento do aderente, penalizando-o gravemente em situações que podem não revestir especial gravidade, nomeadamente quando esteja em causa a falta de pagamento pontual de uma pequena quantia ou prestação acessória do contrato.

Alegou, ainda, que as cláusulas 20.1, 20.2. e 20.3., sob a epígrafe "Despesas e Encargos" são nulas; a Cláusula 20.1. por violação do princípio da boa fé, consagrado nos artigos 15.° e 16.°, da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, uma vez que agrava o desequilíbrio das prestações entre as partes contratantes, com prejuízo para os aderentes; disse também que a referida cláusula é nula por violação do disposto no artigo 19.°, alínea d), do mesmo diploma, uma vez que impõe uma ficção de aceitação do pagamento de diversas quantias com base em factos para tal insuficientes; e que a cláusula 20.2. é proibida por violação de valores fundamentais de direito defendidos pelo princípio da boa fé (artigos 15.° e 16.°, do mesmo diploma) e por violação de lei imperativa, já que modifica, por via contratual, regras imperativas sobre indemnizações autónomas a atribuir à parte vencedora, Mais invocou que a referida cláusula viola a regra contida no artigo 19.°, alínea d), do mencionado diploma, uma vez que impõe uma ficção de aceitação que equivale, na prática, a uma confissão de dívida por parte do aderente, com base em factos para tal insuficientes e sem lhe ser dada a possibilidade de contraditar a dívida ou de negar o pagamento da mesma.

E mais alegou que a cláusula 20.3. é nula por contender com o princípio da boa fé, previsto no citado artigo 15.°, na medida em que atribui ao Réu o direito de receber quantitativos pecuniários sem desenvolver qualquer actividade para o efeito, a coberto de "comissões" sem qualquer conteúdo, o que agrava o desequilíbrio das prestações entre as partes contratantes, com prejuízo para os aderentes.

Finalmente, alegou que a cláusula 21, sob a epígrafe "Lei Aplicável e Jurisdição" é nula, em face do quadro negocial padronizado, nos termos do disposto no artigo 19.°, alínea g), da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais.

O Réu apresentou contestação, impugnando, no essencial, a factualidade vertida na petição inicial.

Terminou pedindo que a acção fosse julgada improcedente e, em consequência, absolvido de todos os pedidos.

Finda a audiência, foi proferida sentença a julgar a acção totalmente improcedente e a absolver o R. de todos os pedidos.

2. Inconformado, apelou o A., tendo a Relação julgado parcialmente procedente a apelação, ao declarar nulas as cláusulas 3., 13.2., 20.1., 20.2., 20.3 e 21. do contrato de crédito automóvel em apreciação, decretando a proibição do seu uso e determinando a publicação da decisão - começado por fixar a matéria de facto provada nos seguintes termos:

A) - O réu AA BANK (PORTUGAL), S.A. encontra-se matriculada sob o n.° …. e com a sua constituição inscrita na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, conforme documentos juntos a fls. 19 a 32, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

B) - O réu AA BANK (PORTUGAL), S.A. foi incorporada, por fusão, na sociedade AA Bank Europe Gmbh, que constituiu uma sucursal em Portugal, com sede na Rua …, n.° …, em Lisboa, titular do número único de matrícula e de pessoa colectiva …, com a denominação AA BANK EUROPE GMBH - SUCURSAL EM PORTUGAL, S.A., conforme documentos juntos a fls. 826 a 835, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

C) - O réu tem por objecto social a "realização de todas as operações e a prestação de todos os serviços permitidos aos bancos", conforme documentos juntos a fls. 19 a 32 e a fls. 826 a 835, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

D) - No exercício de tal actividade, o réu procede à celebração do contrato de crédito automóvel, conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

E) - Para tanto, o réu apresenta aos interessados que com ela pretendem contratar um clausulado já impresso, previamente elaborado pelo réu, com o título:"CONDIÇÕES GERAIS - CRÉDITO AUTO", bem como um formulário denominado "CONTRATO DE FINANCIAMENTO PARA AQUISIÇÃO A CRÉDITO N.°", relativo
às Condições Particulares, conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

F) O referido clausulado com o título "CONDIÇÕES GERAIS - CRÉDITO AUTO" contém duas páginas impressas, que não incluem quaisquer espaços em branco para serem preenchidos pelos contratantes que em concreto se apresentem, com excepção dos destinados à data e às assinaturas, conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

G) O formulário denominado "CONTRATO DE FINANCIAMENTO PARA AQUISIÇÃO A CRÉDITO N.*, contém espaços em branco, destinados à identificação dos mutuários (clientes) e fiadores, assim como as Condições Particulares, as quais contêm espaços destinados ao preenchimento dos dados relativos a: (1) objecto - veículo, (2) preço de venda, (3) entrada inicial, (4) fornecedor, (5) montante do financiamento, (6) encargos, (7) total a liquidar em prestações, (8) prestações, (9) comissão de contrato, (10) forma de pagamento, (11) garantias e (12) imposto do selo, e os espaços destinados à data e às assinaturas, conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

H) A cláusula 16.6, sob a epígrafe "Dados Pessoais",das "Condições Gerais -Crédito Auto", estipula o seguinte;

«O presente contrato é composto pelas Condições Gerais, pelas Condições Particulares e pelos respectivos anexos, os quais fazem parte integrante para todos os efeitos legais e contratuais,».

Conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

I) A cláusula 18,4, sob a epígrafe "Disposições Diversas", das "Condições Gerais - Crédito Auto", estipula o seguinte:

«O presente contrato é composto pelas Condições Gerais e pelas Condições Particulares,».

Conforme documentos juntos a fls, 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

J) No referido "Contrato de Financiamento para Aquisição a Crédito n0', consta que: «é reciprocamente acordado e livremente aceite o presente contrato de financiamento para aquisição a crédito que se regerá pelo disposto nos artigos seguintes das Condições Particulares e pelo disposto nas Condições Gerais;»

Conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

K) A cláusula 3., sob a epígrafe "Confissão de Dívida", das "Condições Gerais - Crédito Auto", estipula o seguinte:

«O Cliente desde já se confessa devedor ao AA Bank da totalidade da quantia mutuada, juros e demais encargos previstos nas presentes Condições Gerais e nas Condições Particulares,»,

Conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

L) A cláusula 4.3., sob a epígrafe "Juros e Comissão de Contrato", das "Condições Gerais - Crédito Auto", estipula o seguinte:

«O Cliente reconhece expressamente o direito de o AA Bank proceder a alterações à taxa de juro em vigor, as quais serão comunicadas por escrito ao Cliente, entrando estas em vigor na primeira data de vencimento de rendas imediatamente seguinte àquele que estiver a decorrer aquando da expedição da referida comunicação.».

M) As cláusulas 13.1. e 13.2., sob a epígrafe "Titulação e Convenção de Preenchimento", das "Condições Gerais - Crédito Auto", estipulam o seguinte:

«13.1. Como forma adicional de titulação do seu crédito e sem que tal signifique novação, o Cliente entrega nesta data ao AA Bank uma livrança por si subscrita, a qual se encontra em branco quanto ao montante e data de vencimento.

13.2. A livrança referida no número anterior poderá ser preenchida pelo AA Bank, à sua melhor conveniência de lugar, tempo e forma de pagamento, pelos montantes correspondentes à totalidade ou a parte das prestações vincendas ou vencidas e não pagas de capital, juros e/ou encargos da responsabilidade do Cliente, em caso de não cumprimento pelo Cliente de alguma das obrigações pecuniárias decorrentes do presente financiamento ou se, por qualquer motivo contratualmente previsto, o AA Bank vier a decretar o vencimento antecipado ao abrigo do disposto no artigo 11 supra.»

Conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

N) As cláusulas 20,1., 20.2. e 20.3., sob a epígrafe "Despesas e Encargos", das "Condições Gerais - Crédito Auto", estipulam o seguinte: «20.1 O Cliente e o(s) Fiador(es), caso existam, são responsáveis por todas as despesas e encargos aplicáveis ao presente financiamento, conforme previstos no Preçário do AA Bank e no presente contrato, incluindo, sem limitação, as despesas de formalização contratual previstas nas Condições Particulares, bem como por quaisquer encargos tributários resultantes da celebração e execução do presente contrato.

20.2. O Cliente e o(s) Fiador(es), caso existam, são ainda responsáveis pelo pagamento de todas e quaisquer despesas de natureza judicial e/ou extrajudicial em que o AA Bank venha a incorrer com vista à protecção e exercício dos direitos que lhe assistem ao abrigo do presente contrato, incluindo honorários de advogados e solicitadores ou outros prestadores de serviços.

20.3. Designadamente, caso venha a ser necessário que o AA Bank efectue qualquer diligência de cobrança de quaisquer prestações vencidas e não pagas, o AA Bank cobrará, por cada prestação, a comissão de cobrança estabelecida no preçário do AA Bank, disponível em www.deutsche-bank.pt».

Conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

O) A cláusula 21., sob a epígrafe "Lei Aplicável e Jurisdição", das "Condições Gerais - Crédito Auto", estipula o seguinte: «O presente Contrato está sujeito à lei portuguesa e para todas as questões dele emergentes as partes elegem o foro do Tribunal da Comarca de Lisboa, com expressa renúncia a qualquer outro, ressalvadas as limitações legais.». Conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

P) O réu é uma empresa multinacional, sendo que em Portugal, para além da sua sede em Lisboa, dispõe de uma rede de balcões/delegações (denominados como "Centros Financeiros") nas seguintes localidades: dezassete em Lisboa; seis no Porto; dois em Braga; um em Espinho; um em Famalicão; um em Gaia; um em Guimarães; um na Maia; um em Matosinhos; um na Póvoa de Varzim; um em Viseu; um em Aveiro; um em Coimbra; um em Leiria; um em Évora; um em Santarém; um em Torres Novas; um em Cascais; um no Estoril; um em Linda-a-Velha; um em Oeiras; um na Parede; um em Torres Vedras; um em Setúbal; um em Almancil; um em Faro; um em Loulé; um em Portimão; e um no Funchal; Conforme documentos juntos a fls. 36 a 68, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

Q) Por carta datada de 30.07.2009, o réu remeteu ao ora Autor cópias de vários contratos por si utilizados, nomeadamente o contrato de crédito automóvel, supra referido em D) e E), conforme documentos juntos a fls. 700 a 772, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

R) A celebração do contrato de crédito automóvel, supra referido em D) e E), pressupõe a celebração de um contrato de abertura de conta, cujas "CONDIÇÕES GERAIS" constam dos documentos juntos a fls. 692 a 699, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

S) A cláusula 1,1., sob a epígrafe "Objecto", inserida na Subsecção H1 "Disposições Gerais", da Secção H "PRESTAÇÃO E UTILIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE PAGAMENTO", das "CONDIÇÕES GERAIS" referidas em R), estabelece o seguinte: A presente Secção contém as normas aplicáveis aos Serviços de Pagamento prestados pelo BANCO no âmbito de quaisquer instrumentos contratuais celebrados entre este e o CLIENTE.» Conforme documentos juntos a fls. 692 a 699, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

T) No documento junto a fls. 773 dos autos, subscrito pelo réu, referente ao contrato de mútuo celebrado em 29.10.2007, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta que:« (...) vimos comunicar o necessário ajustamento das condições contratuais relativas ao spread do Contrato de Mútuo referido em epígrafe que celebrámos, o qual passará a ser de 1.25% a partir do próximo Período de Contagem de Juros, conforme previsto na cláusula 5.3 do referido Contrato. Acreditamos que neste momento esta é a proposta mais competitiva que podemos apresentar. Face a estas novas condições comerciais, e caso o pretenda, poderá rescindir o Contrato mediante o envio de comunicação escrita ao Banco. (...) ».

3. Passando a apreciar o objecto do recurso – e após ter considerado que nos movemos manifestamente no âmbito de um contrato de adesão, contendo cláusulas contratuais gerais -considerou a Relação, no acórdão recorrido:

A cláusula 3., sob a epígrafe "Confissão de Dívida", das "Condições Gerais -Credito Auto", estipula o seguinte: «O Ciente desde já se confessa devedor ao AA Bank da totalidade da quantia mutuada, juros e demais encargos previstos nas presentes Condições Gerais e nas Condições Particulares.».

Dispõe o artigo 19.°, alínea d):

«São proibidas, consoante o quadro negociai padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que (...) imponham ficções de recepção, de aceitação ou de outras manifestações de vontade com base em factos para tal insuficientes.».

Mas, as referidas no seu artigo 19° são apenas "relativamente proibidas", ou seja, só são proibidas "consoante o quadro negocial padronizado", isto é, conforme as circunstâncias do caso, a apurar pelo julgador. O legislador pretendeu significar que o juízo a emitir sobre as cláusulas contratuais gerais relativamente proibidas não depende do circunstancialismo concreto que as rodeia, mas antes da sua compatibilidade e adequação ao ramo do sector de actividade negocial a que as mesmas pertencem.

O artigo 19.° (tal como o artigo 22.°) consagra "cláusulas relativamente proibidas", as quais dependem de um juízo valorativo, por referência ao "quadro negocial padronizado". Ou seja, uma determinada cláusula deverá ser apreciada, tendo como paradigma a sua compatibilidade/adequação ou divergência acentuada, em relação ao quadro negocial típico de determinado ramo ou sector de actividade"2. «A referência ao "quadro negocial padronizado" pretende, justamente, explicitar que a concretização das proibições relativas deve operar perante as cláusulas em si, no seu conjunto e segundo os padrões em jogo»3

Aquela cláusula, como bem se refere na sentença recorrida, insere-se num contrato de mútuo, do qual emergem direitos e obrigações para os contraentes, sendo que o "cliente", na qualidade de mutuário, assume a obrigação de restituição da quantia mutuada, bem como a obrigação de pagamento de juros (artigos 1142.° e 1145.°, ambos do Código Civil). Por outro lado prevê o reconhecimento da obrigação de pagamento da totalidade da quantia mutuada, juros e demais encargos, remetendo para as condições gerais e particulares do contrato de financiamento constantes das condições particulares de fls. 35.

Importa referir, ainda, que das condições particulares (assinadas pelo mutuário), consta a identificação do montante do financiamento, dos encargos, do total a liquidar em prestações, da comissão de contrato e da forma de pagamento do contrato de financiamento. Consta designadamente do facto dado como provado sob a alínea G: O formulário denominado "CONTRATO DE FINANCIAMENTO PARA AQUISIÇÃO A CRÉDITO A/.°", contém espaços em branco, destinados à identificação dos mutuários (clientes) e fiadores, assim como as Condições Particulares, as quais contêm espaços destinados ao preenchimento dos dados relativos a: (1) objecto - veículo, (2) preço de venda, (3) entrada inicial, (4) fornecedor, (5) montante do financiamento, (6) encargos, (7) total a liquidar em prestações, (8) prestações, (9) comissão de contrato, (10) forma de pagamento, (11) garantias e (12) imposto do selo, e os espaços destinados à data e às assinaturas, conforme documentos juntos a fls. 33 a 35, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

A cláusula 4.1. das condições gerais estipula: «Sobre o capital mutuado e em dívida incidirão juros calculados com base num ano de 360 dias». Por seu turno, a cláusula 5.1. das condições gerais estipula: «O Cliente compromete-se a proceder ao reembolso (...) da totalidade do capital mutuado, acrescido dos juros, encargos e impostos previstos no presente contrato, pela forma e no prazo consignados nas condições particulares».

No entanto, e salvo melhor opinião, pensamos que assiste razão ao Ministério Público.

Em relação ao pagamento das quantias mutuadas e juros não se suscitam grandes dúvidas quanto à validade da cláusula. Mas o mesmo não sucede quanto à determinação dos "demais encargos".

Com efeito, esta cláusula não se baseia em factos suficientemente determináveis, antes autorizando o apelado a cobrar aos aderentes quantias sem que sejam indicados os respectivos montantes ou os critérios para a sua determinação, o que corresponde a uma verdadeira declaração de dívida;
É claro que não está em causa saber se os mutuários são ou não responsáveis pelo pagamento dos encargos, mas sim o modo como estas quantias são calculadas.

Por outro lado, o MP sustenta também que tal confissão de dívida tem reflexos ao nível da repartição do ónus da prova, o que implicaria a sua nulidade nos termos do artigo 21.°, alínea g), da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, a qual dispõe que «são em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que (...) modifiquem os critérios de repartição do ónus da prova ou restrinjam a utilização de meios probatórios legalmente admitidos.».

Nos termos desta cláusula, o cliente confessa-se devedor da totalidade da quantia mutuada, juros e "demais encargos previstos nas presentes Condições Gerais e nas Condições Particulares". Assume, assim, a obrigação de pagar as quantias resultantes do contrato, o que é perfeitamente natural. E, como é evidente, estas vão sendo alteradas com o decorrer do tempo. Mas o cliente só está obrigado a pagar o que estiver em dívida em cada momento.

Acontece que, ao confessar-se devedor de todas as quantias, juros e encargos previstos nas condições gerais e particulares, terá de ser o cliente a reagir perante quantias não devidas, demonstrando que tais montantes não são devidos, pois, se não o fizer, terá de suportar esses encargos.

Perante esta cláusula existirá uma inadmissível inversão do ónus da prova, pois, tendo o aderente confessado a dívida, e perante os encargos invocados, terá de provar que não é aquele o seu montante e, se for caso disso, que não existem

Esta cláusula deve, pois, ser declarada nula por violação do disposto nos artigos 19.°, alínea d), e 21.°, alínea g), ambos da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, o que se determina. 2.

Das cláusulas 20.1., 20.2. e 20.3..

As cláusulas 20.1, 20.2 e 20.3 sob a epígrafe "Despesas e Encargos" têm a seguinte redacção:

«20.1 O Cliente e o(s) Fiador(es), caso existam, são responsáveis por todas as despesas e encargos aplicáveis ao presente financiamento, conforme previstos no Preçário do AA Bank e no presente contrato, incluindo, sem limitação, as despesas de formalização contratual previstas nas Condições Particulares, bem como por quaisquer encargos tributários resultantes da celebração e execução do presente contrato,

20.2. O Cliente e o(s) Fiador(es), caso existam, são ainda responsáveis pelo
pagamento de todas e quaisquer despesas de natureza judicial e/ou extrajudicial em
que o AA Bank venha a incorrer com vista à protecção e exercício dos direitos que lhe assistem ao abrigo do presente contrato, incluindo honorários de advogados e solicitadores ou outros prestadores de serviços.

20.3. Designadamente, caso venha a ser necessário que o AA Bank efectue qualquer diligência de cobrança de quaisquer prestações vencidas e não pagas, o AA Bank cobrará, por cada prestação, a comissão de cobrança estabelecida no preçário do AA Bank, disponível em www.deutsche-bank.pt.».

As cláusulas 20.1 e 20.3 atribuem ao aderente/mutuário a responsabilidade por todas as despesas e encargos, conforme previstos no preçário do réu e no contrato de financiamento, bem como pela comissão de cobrança estabelecida no preçário do predisponente, ora réu.

Resulta, com efeito, do Aviso n.° 4/2009 do Banco de Portugal que as "comissões" consistem nas prestações pecuniárias exigíveis aos clientes pelas instituições de crédito, como retribuição pelos serviços por elas prestados, ou subcontratados a terceiros, no âmbito da sua actividade; e as "despesas" traduzem encargos suportados pelas instituições, que lhes são exigíveis por terceiros, e repercutíveis nos clientes, nomeadamente os que tenham natureza fiscal. Ou seja, como se referiu na sentença, face ao quadro negocial padronizado, em que a cláusula se insere, nomeadamente a actividade bancária, é permitido ao ora réu exigir dos aderentes/clientes, o pagamento de comissões, de despesas e encargos.
Por outro lado, para a determinação dos montantes das despesas, encargos e comissões, a cláusula 2.1 remete para as demais cláusulas contratuais, bem como para o preçário do ora réu, (disponível em www.deutsche-bank.pt).

Mas o que está em causa não é saber se os mutuários são ou não responsáveis pelo pagamento das despesas e encargos, mas sim o modo como estas quantias devem se calculadas.

É geralmente entendido na doutrina e na jurisprudência que, nas cláusulas contratuais gerais, o princípio da boa fé prende-se com o equilíbrio das prestações, e com a ideia de reposição da igualdade, considerando-se, assim, proibidas as cláusulas que afectem significativamente o equilíbrio contratual, em prejuízo do destinatário A alínea d) do artigo 19.° do RCCG proíbe as cláusulas contratuais gerais que, considerando o quadro negocial padronizado em que se inserem, imponham uma ficção de aceitação do aderente, com base em factos para tanto insuficientes.

Ora, aquelas cláusulas não fornecem os montantes ou os critérios para a sua determinação, sendo certo que, salvo melhor opinião, não é suficiente que estejam descritos no preçário do Banco para onde se remete.

A descrição no preçário, ainda que detalhada, não substitui a necessidade de informação antecipada do cliente de tais quantias e, sobretudo, o critério de determinação, sendo certo que estas informações não se encontram incluídas no contrato.

Veja-se, por exemplo, a cláusula 20.1 em que o aderente se obriga a pagar todas as despesas e encargos "sem limitação". De igual modo, na cláusula 20.2 faz-se referência "a todos e quaisquer despesas".

Como bem refere o MP, a cláusula 20.2. implica uma aceitação do aderente relativamente a todas as dívidas futuras, judicias e extrajudiciais, em que a Recorrida venha a incorrer para cobrança do seu crédito, sendo que o alcance dessas dívidas não pode ser previsto no momento da celebração do contrato, ficcionando igualmente uma aceitação que equivale a uma confissão de dívida por parte do cliente com base em factos para tal insuficientes.

Com efeito obrigar-se o cliente a responsabilizar-se "por todas e quaisquer despesas de natureza judicial e/ou extrajudicial em que o Banco venha a incorrer com vista à protecção e exercício dos direitos que lhe assistem (...), incluindo honorários de advogados e solicitadores ou outros prestadores de serviços" é manifestamente excessivo, ficando o aderente praticamente à mercê do proponente.

É sabido que as instituições bancárias visam legitimamente o lucro, mas não devem, nas suas relações com os consumidores, deixar de ponderar que, em casos de contratos de mútuo, os mutuários estão geralmente sujeitos às vicissitudes de um contrato de longo prazo, em que não controlam as várias componentes do preço do dinheiro, pelo que a consideração dos limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim económico ou social do direito devem ser preservados.

Diz o apelado (n° 100 das alegações) que os clientes reconhecem o direito de o Banco lhes cobrar para além dos montantes em divida (...) as despesas em que o banco incorra para satisfação do respectivo crédito, no âmbito judicial e extrajudicial E acrescenta: o limite dos montantes que o banco poderá imputar ao cliente resulta do Código Civil, designadamente, das regras aplicáveis em matéria de responsabilidade obrigacional; isto é, independentemente de haver ou não um limite de montantes a cobrar ao cliente expressamente definido no clausulado, é evidente que tais montantes se encontram delimitados nos termos gerais de direito; tais montantes estão também balizados pelos artigos 447-D do CPC e 25.°, n.° 2 e 26.° n° 3, ambos do RCP. E diz também que a comissão prevista na Cláusula 20.3. do Contrato de Crédito Automóvel "destina-se a possibilitar ao Apelado suportar os serviços que este se vê obrigado a activar em virtude de um facto pelo qual não é responsável (ou seja, o não cumprimento pelo cliente das suas obrigações), não sendo reconduzível a uma sanção pelo não cumprimento em si".

A verdade é que o aderente (e é aqui que a questão se coloca) não sabe nem tem possibilidades de saber quanto poderá vir a pagar, não podendo ser responsabilizado por todas as despesas que o Banco decida fazer. Essas cláusulas impõem ao contraente a obrigação de pagar despesas cujo montante é para ele praticamente indeterminável. E aqueles alegados limites do CPC e do RCP também não podem servir de critério, pois também eles não fornecem um critério seguro.

Aquelas cláusulas são de tal maneira vagas que, no mínimo, comportam várias interpretações.

Entende-se, pois, que aquelas cláusulas impõem uma ficção de aceitação que equivale, na prática, a uma confissão de dívida por parte do aderente com base em factos insuficientes para o efeito, revelando um défice de informação por parte da Recorrida incompatível com os deveres gerais de conduta e de protecção que incumbem às entidades bancárias.

Aceita-se que ao cliente é dada a possibilidade de contraditar a dívida ou negar o pagamento da mesma, podendo contestar os valores, natureza e origem dos montantes que, porventura, lhe venham a ser cobrados. Simplesmente, na grande maioria dos casos, não estará em condições de o fazer.

Em síntese:

-  As cláusulas 20.1., 20.2 e 20.3. do Contrato de Crédito Automóvel da Recorrida são, por isso, nulas por violação do princípio da boa fé consagrado nos artigos 15.° e 16.°, ambos da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, uma vez que agravam o desequilíbrio das prestações entre as partes contratantes, com prejuízo para os aderentes.

-  As cláusulas 20.1. e 20.2. são igualmente nulas por violação do disposto no artigo 19.°, alínea d), da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, uma vez que impõem uma ficção de aceitação do pagamento de diversas quantias com base em factos para tal insuficientes e sem ser dada a possibilidade de contraditar a dívida ou de negar o pagamento da mesma.

Da cláusula 13.2., sob a epígrafe "Titulação e Convenção de Preenchimento ".

A cláusula 13.2. sob a epígrafe "Titulação e Convenção de Preenchimento", das "Condições Gerais - Crédito Auto" tem a seguinte redacção: «A livrança referida no número anterior poderá ser preenchida pelo AA Bank, à sua melhor conveniência de lugar, tempo e forma de pagamento, pelos montantes correspondentes à totalidade ou a parte das prestações vincendas ou vencidas e não pagas de capital, juros e/ou encargos da responsabilidade do Cliente, em caso de não cumprimento pelo Cliente de alguma das obrigações pecuniárias decorrentes do presente financiamento ou se, por qualquer motivo contratualmente previsto o AA Bank vier a decretar o vencimento antecipado ao abrigo do disposto no artigo 11 supra.»

Concretizando, o artigo 16.°, do mesmo diploma legal estabelece- "[n]a aplicação da norma anterior devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada, e, especialmente:

a) A confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e ainda por quaisquer outros elementos atendíveis;

b) O objectivo que as partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efectivação à luz do tipo de contrato utilizado".

Aquela cláusula diz no fundo o seguinte: a livrança pode ser preenchida pelo Banco pelos montantes correspondentes à totalidade ou a parte das prestações vincendas ou vencidas e não pagas de capital, juros e/ou encargos da responsabilidade do mutuário, caso este não cumpra alguma das obrigações pecuniárias decorrentes do financiamento ou se, por qualquer motivo contratualmente previsto, o AA Bank vier a decretar o vencimento antecipado ao abrigo do disposto na cláusula 11.

Ou seja, remete para o incumprimento, por parte do mutuário, das obrigações decorrentes das condições gerais e particulares, bem como do contratualmente estipulado na cláusula 11., que prevê o vencimento antecipado:
i) quando o incumprimento abranger pelo menos duas prestações e representar mais de 10% do montante total do crédito; e
ii) após ter concedido ao cliente, sem sucesso, um prazo de 15 dias para proceder ao pagamento das prestações em atraso, bem como dos demais valores calculados nos termos previstos em 10. supra,

Diz o apelante que esta cláusula confere ao apelado "o poder de resolver o contrato (...) num conjunto de situações inadmissíveis", que podem «originar uma injusta disparidade, prejudicial ao consumidor". Mas diz o apelado que a faculdade de considerar vencidas todas as obrigações assumidas no âmbito do Contrato de Crédito Automóvel pelo cliente e exigir o seu cumprimento imediato mais não é do que o Banco exercer antecipadamente o direito que lhe assiste, optando pelo interesse contratual positivo, em detrimento do interesse contratual negativo. E acrescenta que não tem qualquer razão de ser o argumento avançado pelo MP no sentido de que o Banco pode resolver o contrato "não só nos casos de falta de pagamento da prestação principal, mas também quando esteja em dívida qualquer quantia, ainda que seja acessória e diminuta (por exemplo, comissões por despesas administrativas), e, genericamente, quando não for cumprida qualquer uma das obrigações decorrentes do contrato, mesmo que seja acessória e pouco relevante."

Vejamos,

Consta da cláusula 13.1: "como forma adicional de titulação do seu crédito e sem que tal signifique novação, o cliente entrega nesta data ao AA Bank uma livrança por si subscrita, a qual se encontra em branco quanto ao montante e data de vencimento".

É certo que a livrança apenas poderá ser preenchida se o mutuário não cumprir as obrigações resultantes do contrato pelas quais é ele responsável. E não se ignora que, com muita frequência, são estabelecidos entre as partes. nomeadamente em contratos de concessão de crédito, pactos de preenchimento6 no sentido de o mutuante ver acautelado o seu direito caso o mutuário não cumpra.
Sucede, porém, que, como vimos no número anterior, as cláusulas 20.1., 20.2 e 2.3 impõem obrigações extremamente gravosas quer para o mutuário quer para os fiadores (caso existam).

Ora, há que ter em conta que a livrança é entregue em branco e que o Banco poderá preenchê-la por montantes com que o cliente não concorde, por entender que não são devidos, no todo ou em parte.

Sendo a livrança um título executivo, o Banco não tem necessidade de propor a acção declarativa. E, instaurada a execução, o cliente pode deduzir oposição, mas então tem ele o ónus de provar que toda ou parte da quantia constante do título não é devida. Verifica-se assim uma verdadeira inversão do ónus da prova, o que é proibido pelo artigo 21.°, alínea g), da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, a qual dispõe: «São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que (...) modifiquem os critérios de repartição do ónus da prova ou restrinjam a utilização de meios probatórios legalmente admitidos.».

Consta da cláusula 13.1 que a entrega da livrança não constitui novação. E assim é efectivamente. A verdade é que, com o preenchimento da livrança, o banco passa a ser portador dum título executivo que o próprio criou com base em elementos que o devedor dificilmente pode controlar.

Parece-nos assim, e ao contrário do que foi considerado na sentença recorrida, que a cláusula 13.2., provoca um desequilíbrio de prestações desproporcionado, em detrimento do aderente/mutuário e, consequentemente, contrária à boa fé, violando a citada alínea g) do artigo 21.° da Lei as CCG (inversão do ónus da prova).

Da cláusula 21., sob a epígrafe "Lei Aplicável e Jurisdição".

Cumpre, por último, apreciar a validade da cláusula 21., sob a epígrafe "Lei Aplicável e Jurisdição", das "Condições Gerais - Crédito Auto", a qual estabelece: «[o] presente Contrato está sujeito à lei portuguesa e para todas as questões dele emergentes as partes elegem o foro do Tribunal da Comarca de Lisboa, com expressa renúncia a qualquer outro, ressalvadas as limitações legais.».

Não há qualquer dúvida de que o campo de aplicação desta cláusula, após a entrada em vigor da Lei n.° 14/2006, de 26 de Abril, é diminuto. E também não há dúvida de que aquelas normas revestem carácter imperativo. Daí a natural necessidade de se estabelecer a restrição da parte final da cláusula; "ressalvadas as limitações legais".

Como é evidente, tal cláusula não poderia contrariar lei imperativa, pelo que esta ressalva sempre teria de ser observada, ainda que não constasse da cláusula.

A questão só se coloca, pois, nos casos em que a própria lei não determina imperativamente o tribunal competente.

Todavia, como vimos, resulta da exposição de motivos constante da proposta de lei "que se visou, não só reforçar o valor constitucional da defesa do consumidor, sobretudo perante os grandes litigantes, em regra bancos e sociedades financeiras, mas também descongestionar os Tribunais, tendo em consideração a obtenção de um maior equilíbrio da distribuição territorial da litigância, com especial ponderação para a chamada litigância de massa.",

Foram por meio daquela disposição normativa seleccionadas as acções que constituem a esmagadora maioria da litigância de massa, deixando de fora outras situações que mereceriam o mesmo tratamento.

E é precisamente nessas (poucas) acções não englobadas no âmbito de aplicação do artigo 74° do Código de Processo Civil que a regra consagrada no artigo 85°, n° 1 do CPC (acções propostas pela locadora no Tribunal do domicilio do réu), poderá ser afastada pela cláusula contratual em apreço, assim implicando um desequilíbrio entre o interesse do consumidor e o interesse do utilizador da mesma, com inconvenientes bem mais gravosos para o mutuante do que para o mutuário.

A cláusula favorece, portanto, a parte que dispõe de melhores condições de litigância, tornando ainda mais vulnerável a posição da contraparte aderente que, de resto, normalmente, não prefigura os aspectos anormais da relação contratual, confiando que tanto ele como o predisponente cumprirão as obrigações emergentes do contrato.

Não se justifica, por isso, que seja imposto ao aderente que, nestes casos, tenha de se deslocar a Lisboa, normalmente mais do que uma vez, custear a deslocação do seu mandatário ou procurar mandatário nesta cidade.

Em suma, não existe, da parte da Recorrida, um interesse relevante na atribuição da competência à comarca de Lisboa, que justifique os sacrifícios do cliente. Pelo contrário, o aderente tem todo o interesse em demandar ou ser demandado na área da sua comarca.

Assim sendo, parece não se justificar a atribuição de competência ao tribunal da comarca de Lisboa em contratos de adesão, com exclusão apenas das limitações legais.

A circunstância de a generalidade dos casos estar prevista na lei não justifica, salvo melhor opinião, a inclusão desta cláusula nos contratos de adesão.

Como vimos, o réu é uma empresa multinacional, tendo um poder económico muito superior ao da generalidade dos consumidores que são os destinatários prováveis deste contrato de adesão e dispõe também, em Portugal, para além da sua sede em Lisboa, de uma rede de balcões/delegações (denominados como "Centros Financeiros") em várias localidades do país.

Para que o pacto de competência possa considerar-se inválido à luz do RCCG, é necessário que: o foro em questão envolva graves inconvenientes para uma das partes; os interesses da outra parte não o justifiquem.

Ora, se num contrato livremente celebrado entre as partes (contratos de não adesão) não repugna que estas possam estabelecer um pacto de jurisdição, o mesmo parece não se justificar nos contratos de adesão, cujas características referimos, e que os aderentes não podem discutir.

É certo que a ré poderá ter necessidade de propor várias acções em vários tribunais do país. Mas, para o efeito dispõe de apetrechados serviços, não tendo grandes inconvenientes em propor uma acção em Lisboa ou em qualquer outra comarca do pais. O mesmo não acontece com a generalidade dos potenciais aderentes que, por residirem longe de Lisboa, podem ter graves inconvenientes em demandar o Banco nesta cidade. E o argumento de que só em poucos casos se porá a questão funciona em sentido contrário, pois só raramente o réu teria de propor uma acção (ou ser demandada) fora de Lisboa.

    Portanto a cláusula 21. Do aludido contrato é relativamente proibida e portanto, nula porque estabelece foro competente que envolve graves inconvenientes  para uma das partes (os potenciais  aderentes), sem que os interesses da outra (o proponente) o justifiquem, face ao preceituado no artigo 19 º alínea g), do Decreto-lei n.° 446/85, de 25 de Outubro.

Há assim que concluir, em face do quadro negocial padronizado, pela nulidade da referida cláusula, nos termos do disposto no artigo 19.°, alínea g, da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais.

           4. Inconformado com tal decisão, interpôs o Banco/R. a presente revista, que encerra com as seguintes conclusões:

A. Vem o presente recurso de revista interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que declarou nulas as cláusulas 3, 13.2, 20.1, 20.2, 20.3 e 21 do Contrato de Crédito Automóvel, denominado "CONDIÇÕES GERAIS - CRÉDITO AUTO", bem como as respetivas condições particulares denominadas "CONTRATO DE FINANCIAMENTO PARA AQUISIÇÃO A CRÉDITO", doravante apenas designado por "Contrato", condenando também o aqui Recorrente nos demais pedidos formulados pelo Autor, revogando, nessa medida, a sentença proferida em 1ª instância (totalmente absolutória).

B. O acórdão é NULO por contradição entre a decisão e a sua fundamentação, nos termos do disposto na alínea c) do n.° 1 do artigo 615.° do CPC.

C. A propósito da cláusula 3 (confissão de dívida), refere o Tribunal a quo que "Em relação ao pagamento das quantias mutuadas e juros não se suscitam grandes dúvidas quanto à validade da cláusula. Mas o mesmo não sucede quanto à determinação dos 'demais encargos "'. [realces nossos]

D. No entanto, ao contrário do raciocínio seguido aquando da sua fundamentação, o Tribunal a quo concluiu pela nulidade global da cláusula, sem salvaguardar a validade do segmento da cláusula que se reporta à quantia mutuada e aos juros, cuja validade havia anteriormente asseverado.

E. Determina o artigo 615.°, n.° 1, alínea c), do CPC, que é nula a sentença não só quando "[o]s fundamentos estejam em oposição com a decisão mas também, agora (com a nova redação dada pela Lei n.° 41/2013), "quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.

F. Conforme explicita, e bem, a Doutrina citada em sede de alegações, “[e]ntre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontado para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença" [...], "ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se”.

G. Também a Jurisprudência citada vai neste sentido.

H. A luz do exposto, a linha de raciocínio do Tribunal a quo foi precisamente no sentido de concluir que não subsistiam dúvidas quanto à validade da cláusula quanto às quantias mutuadas (capital) e aos juros mas, quanto aos "demais encargos", ficou clara a posição do Tribunal a quo no sentido de considerar a mesma nula, pelo que desde já se argui a nulidade do acórdão, no segmento apontado, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.°, n.° 1, alínea c), e n.° 4, do CPC.


I. Relativamente às ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS e aos FACTOS OCORRIDOS ANTES DA ENTRADA DA AÇÃO, cumpre referir que durante o ano de 2009 houve duas alterações legislativas que justificaram alterações às minutas contratuais utilizadas pelo Recorrente e a alteração mais relevante introduzida por força do Decreto-Lei n.° 317/2009, de 31 de outubro, consistiu na criação de uma nova secção relativa à prestação de serviços de pagamento (Secção H das Condições Gerais de Abertura de Conta).

J. E o Contrato de Abertura de Conta é aplicável a todos os contratos celebrados entre o Réu e os seus Clientes, tendo o Réu, ora Recorrente, logrado provar tal facto.

K. Ficou provado que "[a] celebração do contrato de crédito automóvel, supra referido em D) e E), pressupõe a celebração de um contrato de abertura de conta, cujas “CONDIÇÕES GERAIS" constam dos documentos juntos a fls. 692 a 699, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido" e da matéria de facto provada resulta igualmente que "[a] cláusula 1.1., sob a epígrafe "Objecto", inserida na Subsecção H1 "Disposições Gerais", da Secção H "PRESTAÇÃO E UTILIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE PAGAMENTO", das "CONDIÇÕES GERAIS" referidas em R), estabelece o seguinte: A presente Secção contém as normas aplicáveis aos Serviços de Pagamento prestados pelo BANCO no âmbito de quaisquer instrumentos contratuais celebrados entre este e o CLIENTE'. Conforme documentos juntos a fls. 692 a 699, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido" - cfr. o disposto nas alíneas R) e S) dos capítulos designados "Matéria de Facto Provada" constantes da sentença e do acórdão recorrido, mais concretamente, a fls. 862 dos autos e página 19 do acórdão recorrido.

L. Sucede que o Autor, ora Recorrido, não tomou em consideração as modificações feitas aos clausulados, sustentando a ação que deu origem aos presentes autos nas minutas antigas que lhes haviam sido remetidas pelo próprio Réu cerca de um ano e meio atrás - cfr. alíneas Q dos factos provados da sentença e do acórdão recorrido e que facilmente se atesta pelo mero confronto das minutas antigas e das minutas novas, que já se encontravam em vigor na data da apresentação da ação.

M. Relativamente às cláusulas individualmente consideradas, a CLÁUSULA 3 -CONFISSÃO DE DÍVIDA é válida, uma vez que (i) os montantes em apreço se encontram todos definidos no Clausulado do Contrato, sendo a quantia global em dívida sempre determinável, em cada momento, por simples cálculo aritmético - i.e., capital mutuado, acrescido de juros, cuja taxa e data de vencimento se encontram previstas no Contrato, tudo acrescido das comissões, taxas, despesas e encargos igualmente previstos no Contrato, quer nas condições gerais, quer nas condições particulares- e (ii) os demais encargos também se encontram previstos no Contrato, quer nas respetivas condições gerais, quer discriminados nas condições particulares.

N. Importa referir que o Tribunal a quo confirma, desde logo, a validade da referida cláusula no que respeita ao segmento que se reporta à confissão de dívida do capital e dos juros, apenas tendo formulado um juízo de nulidade quanto ao segmento relativo aos "demais encargos" (apesar da decisão final contrariar a fundamentação, o que foi suscitado em sede de nulidade do acórdão).

O. Entendeu o Tribunal a quo no acórdão ora sob censura que "[é] claro que não está em causa saber se os mutuários são ou não responsáveis pelo pagamento dos encargos, mas sim o modo como estas quantias são calculadas"  — cfr. página 26 do acórdão recorrido.

P. Salvo o devido respeito, as quantias devidas a título de encargos estão detalhadamente descritas nas condições particulares do contrato, formulário anexo às condições gerais designado "CONTRATO DE FINANCIAMENTO PARA AQUISIÇÃO A CRÉDITO N.°" o qual, aliás, foi também sindicado e declarado nulo pelo Tribunal a quo - cfr. página 49 do acórdão recorrido.

Q. É o próprio Tribunal que, partilhando do entendimento da sentença absolutória, reconhece que "das condições particulares (assinadas pelo mutuário), consta a identificação do montante do financiamento dos encargos, do total a liquidar em prestações, da comissão de contrato e da forma de pagamento do contrato de financiamento'". - cfr. página 25 do acórdão recorrido.

R. Pelo que não descortina o Recorrente como pode o Tribunal a quo concluir que a "cláusula não se baseia em factos suficientemente determináveis, antes autorizando o apelado a cobrar aos aderentes quantias sem que sejam indicados os respectivos montantes ou os critérios para a sua determinação, o que corresponde a uma verdadeira declaração de dívida" - cfr. página 26 do acórdão recorrido.

S. Aliás, as condições particulares fazem parte integrante das condições gerais, conforme resulta do disposto nas cláusulas 16.6 e 18.4 das condições gerais do Contrato e ficou provado nas alíneas H) e I) da Matéria de Facto Provada - cfr. página 16 do acórdão recorrido.

T. As condições gerais - cláusulas 5.1, 8.4 e 14.2 (as quais não foram declaradas nulas) fazem referência aos referidos encargos e as condições particulares discriminam-nos detalhadamente, conforme se exemplificou em sede de alegações.

U. De todo o modo, não há qualquer confissão de dívida com base em factos insuficientes, indeterminados e indetermináveis.

V. A Jurisprudência citada em alegações acautela que "[a] prestação é indeterminada mas determinável, quando, embora não se sabendo, num momento anterior, qual o seu teor, exista, no entanto, um critério que possibilite determiná-la. Sendo a mesma, ao invés, indeterminada quando inexiste qualquer critério para proceder à sua determinação."

W. Também não se descortina o alcance da conclusão extraída pelo Tribunal a quo, na medida em que as razões que levaram a 1ª instância a considerar válida a cláusula em discussão - necessária alusão ao "quadro negocial padronizado" - foram as mesmas que levaram o Tribunal a quo a fundar o seu juízo de nulidade, socorrendo-se este precisamente da fundamentação em que se ancorou a sentença de 1ª instância, conforme melhor exemplificado em sede de alegações.

X. O Tribunal de 1ª instância concluiu, na sequência das anteriormente premissas, "que a 'Confissão de Dívida' constante da cláusula 3., baseia-se em factos suficientemente determináveis (nas condições gerais e particulares do contrato em causa), e decorre das normas legais aplicáveis ao contrato de crédito, sob a forma de mútuo oneroso." [sublinhado nosso]

Y. No sentido diametralmente oposto, o Tribunal a quo entendeu, a final, que a cláusula em análise não se baseia em factos suficientemente determináveis e, portanto, é nula.

Z. Relativamente aos deveres gerais de conduta e de informação, conforme se expendeu extensamente em sede de alegações, cumpre apenas esclarecer que nunca foi objecto da presente ação o incumprimento, por parte do Réu, dos deveres gerais que sobre ele incide, enquanto instituição bancária. Até porque um eventual incumprimento de um dever de informar ou esclarecer só pode ser apreciado casuisticamente.

AA. Não é o escopo de uma ação inibitória a eventual violação dos deveres de informação e comunicação previstos nos artigos 4.° a 9.° do RCCG, até porque, por força do disposto no artigo 25.°, as obrigações constantes dos artigos 5.° e 8.°, alínea a) do RCCG não são, pela sua própria natureza, suscetíveis de violação "em abstracto".

BB. Toda a Jurisprudência e Doutrina citadas em sede de alegações têm entendido que só uma ponderação casuística é que pode determinar se o referido dever de comunicação ou informação foi ou não cumprido.

CC. Para além de resultar do contrato, cumpre referir que, na ausência de estipulação com o teor da cláusula 3, a solução que dela resulta sempre se verificaria por força da aplicação dos termos gerais da lei.

DD. Não obstante a constituição da dívida resulte dos próprios termos do objeto contratual inserto no mesmo clausulado - e da lei aplicável - a utilidade da referida cláusula 3 é a de, porém, tornar absolutamente claro e sem margem para dúvidas que, na eventualidade de o Cliente se encontrar numa situação de incumprimento definitivo, o Contrato constitui título executivo, nos termos do disposto no artigo 46.° n.° 1, alínea c) do CPC em vigor à data da elaboração do clausulado,

EE. decorrendo, ainda, do artigo 805.° do CPC que o exequente deve especificar os valores que considera compreendidos na quantia exequenda, devendo concluir o requerimento executivo com um pedido líquido.

FF. Muito embora se reconheça a recente alteração da legislação processual neste campo, a JURISPRUDÊNCIA, na data em que foi elaborado o clausulado, era pacífica quanto a esta matéria, admitindo que o contrato de mútuo constituía título executivo desde que preenchidos os demais requisitos gerais previstos na lei para o efeito - como era o caso dos autos.

GG. A este propósito, toda a Jurisprudência e Doutrina citadas em alegações.

HH. Face ao exposto, do Contrato não resulta qualquer imposição da confissão de uma dívida ao cliente na precisa medida em que, de acordo com as disposições conjugadas dos artigos 352.° do Código Civil, 46.° n.° 1, alínea c), e 805.°, ambos do anterior CPC (vigente à data do clausulado), os factos constitutivos da confissão da dívida decorrem das restantes disposições do Contrato.

II. A cláusula também não conduz a uma restrição dos meios probatórios legalmente admitidos, uma vez que, no ordenamento jurídico português a regra é a da admissibilidade de qualquer meio de prova idóneo a demonstrar a realidade de um facto, desde que obtido de forma lícita, de acordo com o disposto nos artigos 341.° do CC e 413.°do actual CPC.

JJ. E, ainda assim, não afasta, evidentemente, a prova em contrário, sendo que, a final, os meios de prova são, em regra, livremente apreciados pelo julgador, nos termos do disposto no artigo 358.°, n.° 3 e 4, 361.°, 366.°, 389.°, 391.° e 396.° do CC e 607.°, n.° 1, do CPC.

KK. E, ao contrário do que parece resultar do entendimento do Tribunal a quo, do Contrato não resulta que o cliente tenha de pagar (num momento posterior, em que já liquidou/amortizou parcialmente a dívida) a totalidade da quantia inicialmente mutuada.

LL. O Contrato estipula, isso sim, é a obrigatoriedade de pagar os valores totais em dívida, respetivos juros e encargos (sobre cuja natureza nos debruçaremos mais à frente).

MM. Em sede judicial não fica o mutuário "coartado" da possibilidade de defesa e contradição dos valores e até da não obrigação de pagamento já que, quer em ação declarativa, quer em ação executiva pode ser alegada a não exigibilidade do crédito, qualquer discrepância entre o valor exigido e o valor devido contratualmente e até o pagamento, caso este tenha ocorrido.

NN.  Não havendo lugar a qualquer inversão do ónus da prova, conforme refere o Tribunal a quo neste capítulo e, mais à frente, no capítulo da "titulação e convenção de preenchimento".

OO. Caso o Réu, ora Recorrente, pretenda obter o reconhecimento do seu direito de crédito e o respetivo pagamento, tal não o eximirá de alegar e provar: (i) todos os factos constitutivos do seu direito, tal como o impõe o disposto no artigo 342.°, n.° 1, do Código Civil; (ii) a origem do direito (sendo inócua a confissão já que a mesma se encontra incluída no mesmo contrato de onde emerge o direito creditício em causa); (iii) a transferência do montante mutuado a favor do mutuário; (iv) os prazos de vencimento, juros remuneratórios e encargos devidos; (v) os juros moratórios em dívida e vincendos.

PP. Já o mutuário, caso pretenda contraditar a natureza ou os valores em causa e de negar o dever de pagamento dos mesmos, poderá fazê-lo quer pela via da "defesa por impugnação", quer pela via da "defesa por exceção" (exemplo: pagamento), conforme se explanou em sede de alegações.

QQ. Nestes termos, não pode entender-se que tenham sido violadas as disposições do artigo 19.°, alínea d) e do artigo 21.°, alínea g), ambos do RCCG.

RR. No que tange às cláusulas 20.1 e 20.3 - DESPESAS E ENCARGOS, importa, desde logo, dar por reproduzido toda a alegação referente à cláusula da confissão de dívida, designadamente quanto aos deveres de informação e deveres gerais de conduta que incumbem às entidades bancárias.

SS. É a seguinte a fundamentação do acórdão recorrido: "como se referiu na sentença, face ao quadro negocial padronizado, em que a cláusula se insere, nomeadamente a actividade bancária, é permitido ao ora réu exigir dos aderentes/clientes, o pagamento de comissões, de despesas e encargos. § Por outro lado, para a determinação dos montantes das despesas, encargos e comissões, a cláusula 2.1 remete para as demais cláusulas contratuais, bem como para o preçário do ora réu, (disponível em www.deutschc-bank.pt)." - cfr. página 37 do acórdão recorrido.

TT. E conclui: "Mas o que está em causa não é saber se os mutuários são ou não responsáveis pelo pagamento das despesas e encargos, mas sim o modo como estas quantias devem ser calculadas'"

UU. De que forma, então, devem ser calculadas essas quantias?

VV. No prisma de uma eventual violação do princípio geral da boa fé, cumpre desde logo referir que o princípio da boa fé remete para a tutela da confiança e para o objetivo que as próprias partes procuram atingir com a celebração do contrato.

WW. No caso sub judice, estamos perante um contrato bancário, pelo que a referência à possibilidade de débitos em conta, relacionados com "despesas e encargos" e com "taxas e comissões", ainda que por remissão para preçários livremente acessíveis, se afigura suficiente, o que "corresponde a uma atuação esperada e consentânea com a realidade da negociação bancária", conforme se referiu na SENTENÇA PROFERIDA PELO 7.° Juízo CÍVEL, em 30.04.2013, no âmbito do processo n.° 2475/10.0YXLSB, na qual se decidiu pela validade de tais cláusulas insertas nas Condições Gerais de Abertura de Conta utilizadas pelo ora Recorrente e não tendo a referida sentença sido objeto de recurso por parte do Ministério Público.

XX. Para além de se tratar de prática admissível no setor bancário, tal matéria está extensamente regulada pelo Banco de Portugal, enquanto entidade reguladora, pelo que não alcança o Recorrente como pode o Tribunal a quo que as referidas cláusulas são vagas e concluir que "o aderente [...] não sabe nem tem possibilidades de saber quanto poderá vir a pagar"?!

YY. Pretender-se-á, com isto, dizer que deverá o aqui Recorrente transpor para os seus clausulados toda a legislação e regulamentação do Banco de Portugal aplicável aos contratos, bem como deverá transpor os preçários em vigor para o corpo dos clausulados?!?

ZZ. Conclui a referida sentença que se se impusesse conduta contrária - ou seja, a discriminação exaustiva, no próprio clausulado, de todos os débitos suscetíveis de decorrer da relação bancária -, tal configuraria um "encargo que tornaria muito mais complexa a vida em sociedade e apenas traria novos custos sem razões que o justifiquem" [...], "até por muitos deles [débitos] corresponderem a imposições legais em que o banco atua como instrumento de cobrança dos mesmos ou corresponderem a situações eventuais que poderão nunca ter aplicação prática ou apenas surgirem muitos anos depois do momento da celebração do contrato.''

AAA. Ponderadas as razões de tutela da confiança que subjazem ao princípio geral da boa fé, em nada viola a confiança e expetativas ou direitos dos clientes do ora Recorrente o facto de este proceder à sua discriminação nos extratos bancários periodicamente enviados aos seus clientes e através da sua divulgação em preçários acessíveis nos seus balcões e no seu site da internet.

BBB.  No que respeita concretamente à sindicância da cláusula 20.3 e para além dos argumentos relativos à remissão para o preçário (que de seguida se exporão), cumpre dizer ainda que a comissão prevista na Cláusula 20.3. do Contrato de Crédito Automóvel destina-se a possibilitar ao ora Recorrente suportar os serviços que este se vê obrigado a ativar em virtude de um facto pelo qual não é responsável (ou seja, o não cumprimento pelo cliente das suas obrigações), não sendo reconduzível a uma sanção pelo não cumprimento em si.

CCC. Assim, e sem prejuízo dos demais fundamentos invocados, a cláusula 20.3 do Contrato também não contende com o disposto nos artigos 15.° e 16.° do RCCG.

DDD. Resta-nos analisar a validade das cláusulas em questão em face do disposto na alínea d) do artigo 19.° do RCCG.

EEE. As despesas e encargos constituem custos advenientes da atividade bancária que, naturalmente, são repercutidos pelas instituições financeiras nos respetivos clientes, consumidores finais (onde se incluem, por exemplo, os impostos devidos pelos beneficiários das operações/aplicações financeiras realizadas pelos bancos, a pedido de cada um dos clientes - v.g. imposto do selo).

FFF. As taxas e comissões constituem a remuneração dos serviços prestados pelas mesmas instituições financeiras aos seus clientes.

GGG. Estas realidades encontram previsão no Aviso n.° 4/2009, do Banco de Portugal, onde se pode ler o seguinte: "Para efeitos do presente aviso, entende-se por: a) «Comissões»: as prestações pecuniárias exigíveis aos clientes pelas instituições de crédito como retribuição pelos serviços por elas prestados, ou subcontratados a terceiros, no âmbito da sua actividade;(...) c) «Despesas»: os encargos suportados pelas instituições, que lhes são exigíveis por terceiros, e repercutíveis nos clientes, nomeadamente os que tenham natureza fiscal”

HHH. Pelo que nenhuma ficção de aceitação de dívidas está em causa, sob pena de se entender não ser exigível ao aderente considerar que o serviço contratado ao banco - in casu, ao DB - é gratuito e não implica quaisquer custos, o que nunca se poderá razoavelmente aceitar, desde logo porque resultaria, certamente, no fim da prestação de serviços bancários.


II. Acresce que todos os montantes cobrados pelo DBP a este título encontram-se detalhadamente descritos nos extratos enviados ao cliente, assistindo sempre ao aderente a possibilidade de contestar os valores, natureza e origem desses montantes.

JJJ. Decorre da cláusula 4. da Subsecção B2 das Condições Gerais em vigor à data do clausulado sindicado pelo Ministério Público (condições gerais aplicáveis a todos os contratos celebrados entre o DB e os seus Clientes) que "(o) extracto da Conta será enviado pelo BANCO com a periodicidade acordada com o CLIENTE, devendo este contestar quaisquer valores por ele não aceites no prazo máximo de 15 (quinze) dias a contar da sua expedição."

KKK. Portanto, e como se deixou explanado atrás, é remetido mensalmente aos clientes o extrato da conta à ordem, o qual discrimina detalhadamente todos os montantes cobrados ao cliente, sendo-lhe dado um prazo para contestar os valores, natureza e origem desses montantes.

LLL. Pelo que jamais se aceitará que ao aderente não assiste a possibilidade de contraditar a natureza ou valor dos montantes cobrados ou debitados pelo banco, ora Réu, o que, aliás, foi aceite e reconhecido pelo Tribunal a quo!

MMM. No final reconhece o Tribunal a quo o seguinte:

"Aceita-se que ao cliente é dada a possibilidade de contraditar a dívida ou negar o pagamento da mesma, podendo contestar os valores, natureza e origem dos montantes que, porventura, lhe venham a ser cobrados. Simplesmente, na grande maioria dos casos, não estará em condições de o fazer" - cfr. topo da página 40 do acórdão recorrido.

NNN. Então, e não será caso a caso que se poderá averiguar se, num determinado caso concreto, o cliente não estava em condições (ou não lhe foram dadas essas condições) de contraditar a dívida ou negar o seu pagamento?!?

OOO. E, ainda que não tivesse condições de contraditar ou não lhas tivessem dado, é esse o escopo da ação inibitória? Ou será antes o âmbito de intervenção dos institutos jurídicos da boa fé na execução dos contratos, abuso de direito e, até, incumprimento contratual?

PPP. Por último, relativamente à necessidade de conformação com o "quadro negocial padronizado", in casu, atento o setor de atividade do ora Recorrente (que se dedica à realização de todas as operações e à prestação de todos o serviços permitidos aos bancos - de acordo com a alínea C) da Matéria de Facto Provada -, bem como a circunstância de os respetivos clientes terem consciência que a respetiva atividade bancária é remunerada mediante taxas, comissões e juros, afigura-se-nos que a aceitação do débito de tais quantias corresponde a um comportamento adequado e razoável e a um procedimento válido e aceite por parte de quem celebra com o Réu um Contrato de Crédito Automóvel.

QQQ. Em conclusão, não há ficção de aceitação de dívidas com base em factos insuficientes e, ainda que houvesse, decorre do quadro negocial padronizado -assente pelo próprio Banco de Portugal - que, no âmbito da atividade bancária, é lícito às instituições financeiras (i) exigir juntos dos respetivos clientes o pagamento de prestações pecuniárias enquanto retribuição pelos serviços prestados, ou subcontratados a terceiros - as comissões e taxas; e (ii) fazer repercutir nos clientes os encargos suportados pelas instituições - as despesas e encargos.

RRR. Quanto à possibilidade de o contrato remeter para o preçário, e conforme se disse atrás, é uma prática que se insere e que legalmente se coaduna com o "quadro negocial padronizado" do sector bancário e é, aliás, o fundamento do Aviso n.° 8/2009 e da Instrução n.° 21/2009, do Banco de Portugal.

SSS. Naturalmente, o ora Recorrente cumpre todas as disposições legais e regulamentares a que está sujeito, informando e dando publicidade aos seus clientes deste documento, quer na sua rede de balcões, como no seu sítio na Internet, como ficou demonstrado nos autos.

TTT. Face à clareza da regulamentação existente e à informação que é ao seu abrigo prestada aos clientes, não se vê como recusar às instituições de crédito predisponentes a possibilidade de, nos enunciados contratuais que elaboram, operarem remissões para o seu preçário.

UUU. Face ao exposto, as cláusulas declaradas nulas não se encontram redigidas de forma vaga, visando, aliás, salvaguardar o princípio do equilíbrio contratual, pelo que é forçoso concluir que as cláusulas 20.1 e 20.3 do Contrato de Crédito Automóvel não violam o disposto no artigo 19.°, alínea d), do RCCG.

VVV. Relativamente à CLÁUSULA 20.2 - DESPESAS JUDICIAIS E EXTRADUDICIAIS, esta não pretende substituir-se ou afastar a aplicabilidade das regras gerais, limitando-se a fazer referência aos elementos referidos quer pela lei processual civil, quer pelo Regulamento das Custas Processuais.

WWW. Nos termos da cláusula em questão, na eventualidade de necessidade de cobrança para satisfação do direito de crédito do banco, o cliente compromete-se a pagar as despesas de natureza judicial e/ou extrajudicial em que o Recorrente venha a incorrer, incluindo honorários de advogados e solicitadores ou outros prestadores de serviços.

XXX. Extrajudicialmente, o limite dos montantes que o banco poderá imputar ao cliente resultam do CC, designadamente das regras aplicáveis em matéria de responsabilidade obrigacional (incumprimento contratual definitivo, culpa presumida, dano e nexo de causalidade entre a verificação do dano e o incumprimento do agente).

YYY. O mesmo é dizer que, independentemente de haver ou não um limite de montantes a cobrar ao cliente expressamente definido no clausulado, é evidente que tais montantes se encontram delimitados nos termos gerais de Direito, tal como estão tais montantes igualmente balizados no que à cobrança judicial diz respeito, sendo as "balizas", em geral, constituídas pelo disposto nos artigos 533.° do CPC e 25.°, n.° 2, e 26.°, n.° 3, do Regulamento das Custas Processuais ("RCP").

ZZZ. Isto não significa, porém, que as partes não possam prever, desde logo, que a responsabilidade pelas despesas que se verifiquem nestas circunstâncias, sejam atribuídas à parte incumpridora.

AAAA. De resto, a fixação contratual dos direitos do credor, previamente e no âmbito do próprio contrato é perfeitamente possível e legal, como decorre do disposto no artigo 810.°doCC.

BBBB. Como bem notou o Tribunal de 1ª instância, esta cláusula limita-se "a atribuir a responsabilidade pelas despesas judiciais e extrajudiciais, mas não fixa o respetivo montante, pelo que ao aderente/mutuário sempre assistirá a possibilidade de contestar os valores que lhe forem exigidos pela entidade mutuante/predisponente”.

CCCC. Pelo que a cláusula 20.2 do Contrato de Crédito Automóvel em nada ofende a boa-fé ou a confiança que ambas as partes depositam no sentido global do clausulado (cfr. artigos 15.° e 16.° do RCCG).

DDDD. Finalmente, no que tange à eventual violação do disposto no artigo 19.°, alínea d) do RCCG, importa, desde logo, referir que do Contrato de Crédito Automóvel não resulta qualquer imposição da confissão de uma dívida ao cliente na precisa medida em que, de acordo com as disposições conjugadas dos artigos 352.° do Código Civil, 46.° n.° 1, alínea c), e 805.°, ambos do Código de Processo Civil, os factos constitutivos da confissão da dívida decorrem das restantes disposições do Contrato do Contrato de Crédito Automóvel.

EEEE. Pelo que, deve a referida cláusula 20.2 ser considerada válida, à luz dos normativos constantes do RCCG.

FFFF. Relativamente à CLÁUSULA 13.2 - TITULAÇÃO E CONVENÇÃO DE PREENCHIMENTO, cumpre, desde logo, referir que o Recorrente apenas poderá declarar o vencimento antecipado, nos termos e para os efeitos do disposto na cláusula 11. do Contrato de Crédito Automóvel quando (i) o incumprimento abranger pelo menos duas prestações de valor superior a 10% do montante total do crédito objeto do presente contrato; e (ii) após ter concedido ao cliente, sem sucesso, um prazo de 15 dias para proceder ao pagamento das prestações em atraso acrescidas de juros de mora.

GGGG. Assim, salvo o devido respeito, não tem qualquer razão de ser o argumento que o Autor defendeu ao longo do processo de que o Banco pode resolver o contrato "não só nos casos de falta de pagamento da prestação principal, mas também quando esteja em dívida qualquer quantia, ainda que seja acessória e diminuta (por exemplo, comissões por despesas administrativas), e, genericamente, quando não for cumprida qualquer uma das obrigações decorrentes do contrato, mesmo que seja acessória e pouco relevante."

HHHH. Ora, tal como, aliás, se decidiu em 1ª instância, não se pode aceitar posição contrária, na medida em que as condutas implicadas na referida cláusula consubstanciam incumprimentos de obrigações do cliente cuja gravidade é, em si mesma, suscetível de gerar o direito contratualmente previsto de "vencimento antecipado" do Contrato de Crédito Automóvel.

IIII. Não poderá, razoavelmente e à luz do princípio da boa-fé, querer exigir-se ao banco mutuante que se mantenha no Contrato de Crédito Automóvel num cenário em que, por exemplo, o cliente esteja em incumprimento de obrigações pecuniárias assumidas, ou num cenário em que se constata, a posteriori, a desconformidade das informações prestadas, das declarações emitidas e das garantias prestadas pelo cliente, na fase de formação do Contrato, em quebra do princípio da confiança mútua subjacente à relação entre banco e cliente.

JJJJ. Nada há, portanto, a interrogar sobre a legalidade da cláusula 13.2 do Contrato de Crédito Automóvel, tendo a utilização de uma cláusula similar sido já admitida pelo SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no seu acórdão de 14.11.2006.

KKKK. Relativamente ao argumento avançado ex novo pelo Tribunal a quo de que “[s]endo a livrança um título executivo, o Banco não tem necessidade de propor a acção declarativa. E, instaurada a execução, o cliente pode deduzir oposição, mas então tem o ónus de provar que toda ou parte da quantia constante do título não é devida. Verifica-se assim uma verdadeira inversão do ónus da prova”.

LLLL. Com a oposição à execução enxerta-se no processo executivo um incidente declarativo, podendo os executados, entre outras, fundamentar a sua oposição à execução com base (i) na inexistência ou inexequibilidade do título; (ii) na incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação; (ii) com a alegação de qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, ou seja, do direito de que se arroga o exequente; e (iii) quaisquer outros que possam ser invocados como defesa no processo de declaração - cfr. o disposto nos artigos 731.° e 729.°, aplicável por remissão daquele, ambos do CPC.

MMMM. E fá-lo exatamente na mesma medida em que o faria numa ação declarativa. Se, por exemplo, pagou parcialmente os montantes em dívida, invocará o pagamento, que assumirá a natureza de exceção peremtória extintiva do direito invocado pelo (aí) exequente.

NNNN. Razão pela qual não descortina o ora Recorrente como pode o Tribunal a quo entender que uma execução faz com que se opere a inversão do ónus da prova! Faz, isso sim (se não houver oposição à execução ou a novamente designada oposição mediante embargos), com que o processo seja mais célere!

OOOO. De forma a não repetir o anteriormente alegado, dão-se aqui por reproduzidos os argumentos avançados nos capítulos precedentes em matéria de inversão do ónus da prova e de confissão de dívida com base em factos insuficientes.

PPPP. Face ao exposto, não deve a referida cláusula 13.2 do Contrato ser considerada nula, porquanto não só não é contrária à boa fé, como não viola o disposto no artigo 21.°, alínea g), do RCCG.

QQQQ. Por último, quanto à CLÁUSULA 21 - LEI APLICÁVEL E JURISDIÇÃO, «importa realçar que a própria cláusula sob censura, ao estabelecer a competência convencional, ressalva as limitações legais.

RRRR. Face à atual redação do n.° 1 do artigo 74.° e alínea a) do n.° 1 do artigo 110.°, ambos do CPC (redação introduzida pela Lei 14/2006, de 26 de abril), conjugado com o teor do ACÓRDÃO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.° 12/2007, DE 18 DE OUTUBRO, a maioria das ações é abrangida pela previsão do artigo 74.° do CPC, segundo a qual "a ação destinada a exigir o cumprimento de obrigações, a indemnização pelo não cumprimento, ou pelo cumprimento defeituoso e a resolução do contrato por falta de cumprimento é proposta no tribunal do domicílio do réu".

SSSS. Para além do exposto, o aderente, na qualidade de autor sempre teria de propor a ação em Lisboa, porquanto:

a) o Réu, ora Recorrente, é uma pessoa coletiva e tem sede em Lisboa; ou

b) por ser em Lisboa o lugar do cumprimento da obrigação (2ª parte do n.° 1 do artigo 74.° e n.° 2 do artigo 86.° do CPC).

TTTT. Dispõe o artigo 95.°, n.° 2, do CPC: "o acordo deve satisfazer os requisitos de forma do contrato, fonte da obrigação, contanto que seja reduzido a escrito, nos termos do n.° 4 do artigo anterior, e deve designar as questões a que se refere o critério de determinação do tribunal que fica sendo competente".

UUUU. E, finalmente, que "[a] competência fundada na estipulação é tão obrigatória como a que deriva da ler - cfr. o disposto no artigo 95.°, n.° 3, do CPC.

VVVV. Ademais, a verificação dos supostos graves inconvenientes só pode ser aferida no caso concreto e não no âmbito de uma ação inibitória, com objetivo e escopo totalmente diferentes.

WWWW. Neste sentido, vejam-se todos os acórdãos identificados e sumariados em sede de alegações e, designadamente, o ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA DE 12.09.2013 (em que o aqui Recorrente é parte).

XXXX. Em conclusão, é admissível convenção entre as partes no que respeita à atribuição de competência a determinado Tribunal, respeitado que seja o limite resultante das disposições conjugadas dos artigos 71.° n° 1, 95.° e 104.°, todos do CPC, que são imperativas.

YYYY. Por fim, relativamente à PUBLICITAÇÃO DA SENTENÇA, o Tribunal a quo condenou o ora Recorrente a dar publicidade à parte decisória através de anúncio e ainda, a remessa da certidão da sentença ao Gabinete de Direito Europeu, dando-se cumprimento ao disposto no artigo 34.° do Decreto-Lei n.° 446/85, de 25 de outubro.

ZZZZ. A publicitação de uma condenação em jornais diários de maior triagem, editados em Lisboa e Porto, durante três dias consecutivos e de tamanho não inferior a 1/4 de página é pena desproporcionada ao eventual ilícito verificado.

AAAAA. Assim, vindo a ser ordenada outra publicação que não a já prevista no artigo 34.° do RCCG, parece notório o sacrifício desproporcional dos interesses jurídicos em causa, afetando-se de forma devastadora e contraproducente o direito de reputação, bom nome e imagem da Ré, sem que se vislumbram quais os bens jurídicos constitucionalmente tutelados, quando se encontra expressamente prevista uma forma de publicitação deste tipo de sentenças.

BBBBB. O Gabinete de Direito Europeu era (porque já substituído pelo Ministério da Justiça) "o serviço incumbido de organizar e manter actualizado o registo das cláusulas contratuais abusivas'' - cfr. Portaria n.° 1093/95, de 06 de setembro.

CCCCC. Foi este o sistema específico de registo instituído pelo artigo 35° do RCCG, competindo àquele a criação das condições que facilitam o seu conhecimento, prestando os esclarecimentos que lhe forem solicitados.

DDDDD. Nesta linha de raciocínio, ainda que o Réu venha a ser condenado pelos demais pedidos, o que se admite, sem conceder, não deverá ser duplamente condenado na publicação da decisão, porquanto há um meio específico para a divulgação das declarações de nulidade provenientes de ações inibitórias.

 

EEEEE. E isto porque, salvo o devido respeito por opinião diversa, não interessa dar publicidade a uma sentença através dos habitualmente sensacionalistas meios de Comunicação Social quando, para o caso concreto das ações inibitórias, existe uma forma de publicidade concreta (Ministério da Justiça, que sucedeu ao Gabinete de Direito Europeu)!

Nestes termos, e com o douto suprimento de V. Exas., Venerandos Juízes Conselheiros, deve ser declarada a nulidade do acórdão, no segmento impugnado e, a final, concedido provimento ao recurso e, em consequência, ser revogado o acórdão recorrido, substituindo-se por outro que mantenha a decisão da 1ª instância e absolva o Réu dos pedidos contra si formulados, como é de Direito e assim se fazendo Justiça!

O Mº Pº/ recorrido pugna pela confirmação do acórdão recorrido-

O Tribunal a quo, antes da subida do recurso, pronunciou-se sobre a nulidade arguida pelo recorrente , indeferindo-a.

5. O acórdão recorrido julgou nula a cláusula 3., onde se prescreve que o cliente se confessa devedor ao R. da totalidade da quantia mutuada, dos juros e demais encargos contratualmente previstos, por considerar – especialmente quanto à assunção dos encargos - que a confissão de dívida dela emergente se não baseia em factos suficientemente determináveis, podendo ainda envolver alteração às regras atinentes á repartição do ónus da prova.

Não parece, todavia, que tal cláusula, devidamente interpretada, envolva violação da norma constante dos arts. 19ºd) e 21º g) da Lei da Cláusulas Contratuais Gerais.

Desde logo – e como parece admitir o acórdão recorrido - não suscita particular reserva a circunstância de, num contrato de mútuo, o mutuário se considerar expressamente devedor do capital mutuado e dos respectivos juros, legal ou contratualmente devidos: na verdade, tal representa um efeito normal e inelutável do tipo ou espécie contratual em causa, carecendo de efeito inovatório tal acto recognitivo de um débito que já decorria claramente da natureza do contrato celebrado e das cláusulas que o integravam, não implicando tal reconhecimento explícito do débito, inserido em cláusula do próprio contrato, qualquer particular agravamento da posição do mutuário.

O mesmo se verifica., aliás, referentemente ao reconhecimento da responsabilidade pelos encargos – naturalmente apenas os encargos especificadamente previstos nas condições gerais e particulares: trata-se, apenas e tão somente, de reconhecer a responsabilidade pelo pagamento de débitos acessórios e eventuais, decorrentes nomeadamente de certas vicissitudes da relação contratual, não parecendo que possa fundar-se na cláusula do próprio contrato que contém tal acto recognitivo do débito qualquer inversão às regras atinentes à normal repartição do ónus da prova, podendo naturalmente o mutuário questionar, nos termos gerais de direito, quer a responsabilidade pelos encargos que, porventura, lhe sejam exigidos, quer os respectivos montantes.

E, assim sendo, entende-se que esta cláusula 3., em si mesma considerada, não envolve violação das normas legais indicadas.

6. A decisão impugnada na presente revista julgou também nulas as cláusulas 20.1, 20.2 e 20.3.

A cláusula 20.1 considera o mutuário e fiadores responsáveis pelas despesas e encargos aplicáveis ao mútuo celebrado, nos termos previstos no preçário do Banco e nas cláusulas contratuais estipuladas, incluindo, sem limitação, as despesas de formalização do contrato especificadas nas Condições Particulares, bem como pelos encargos tributários aplicáveis.

Mais uma vez, temos como seguro que esta cláusula carece se ser interpretada em termos adequados, só se verificando a responsabilidade do mutuário por quaisquer despesas e encargos que estiverem devidamente previstos no texto do contrato – e resultando os respectivos montantes do que estiver consagrado no preçário do Banco.

Em primeiro lugar, afigura-se que não seria efectivamente razoável obrigar a prever a concretização dos montantes correspondentes a despesas e encargos contratuais da responsabilidade do mutuário nas próprias cláusulas contratuais gerais – parecendo perfeitamente admissível que estas – por natureza dotadas de algum grau de generalidade e abstracção, por aplicáveis a uma multiplicidade de contratos concretamente celebrados – possa remeter para outros instrumentos, desde que facilmente acessíveis aos clientes/mutuários ( como sucederá com o preçário praticado pelo Banco). Ou seja: a circunstância de a cláusula contratual geral remeter a concretização ou liquidação dos encargos e despesas  postas contratualmente a cargo do mutuário para o dito preçário não representa, só por si, estando este facilmente acessível aos interessados, uma aceitação fictícia e em branco de responsabilidade pelo aderente, com base em factos insuficientemente determinados .

É certo que este método de densificação ou concretização do valor das despesas e encargos, por remissão para outros instrumentos que sejam acessíveis ao aderente, não preclude o dever de esclarecimento e informação adequada : porém, este dever do Banco/mutuante tem de ser cumprido, não no perímetro do regime das cláusulas contratuais gerais, mas antes no âmbito das relações contratuais concretamente celebradas , cabendo aos respectivos funcionários prestarem ao aderente todas as informações, nomeadamente acerca do dito preçário, que lhe permitam ter uma ideia consistente acerca das respectivas responsabilidades patrimoniais, ligadas ou decorrentes da celebração e das vicissitudes do contrato. A prestação da informação legalmente devida ao aderente terá, deste modo, de resultar, não integralmente do teor e conteúdo auto-suficiente das próprias cláusulas contratuais gerais, mas do concreto e casuístico cumprimento pelos funcionários do R. de um dever de informação, de modo a que, no momento da celebração do contrato, o aderente esteja consciente dos montantes que essencialmente poderão sobre ele ser repercutidos pelo Banco:

Ora, como é evidente, tal dever de esclarecimento e informação coloca-se a propósito e no momento da celebração de cada contrato de adesão, nada tendo que ver um eventual incumprimento - ou cumprimento deficiente - de tal dever com o plano da validade das ditas cláusulas contratuais gerais.

Por outro lado, importa salientar que não se vê qualquer obstáculo em colocar a cargo do mutuário/aderente as despesas de formalização do contrato especificadas nas Condições Particulares, bem como quaisquer encargos tributários legalmente devidos – e repercutidos pelo Banco no cliente (sendo evidente que a determinação do respectivo montante dependerá essencialmente das normas tributárias aplicáveis, e não de qualquer livre discricionariedade do mutuante).

Pelas mesmas razões, entende-se que a cláusula 20.3, ao remeter para o preçário do Banco o montante da comissão de cobrança ali estipulada, no caso de incumprimento, não viola as disposições legais invocadas, podendo o dever de informação e esclarecimento essencialmente devidos ao aderente decorrer, não do teor necessariamente auto-suficiente da referida cláusula, mas do comportamento dos funcionários da R., no momento em que sejam celebrados os concretos contratos de adesão a que se aplique tal cláusula contratual.

7- A cláusula 20.2 – igualmente julgada nula no acórdão recorrido – estabelece que o mutuário e fiadores são responsáveis pelo pagamento de todas e quaisquer despesas de natureza judicial e extrajudicial em que o Banco venha a incorrer, no caso de incumprimento, incluindo honorários de advogados e solicitadores ou outros prestadores de serviços.

Sustenta a entidade recorrente que esta cláusula não pretenderia afastar a aplicabilidade das regras gerais vigentes, em processo civil e em sede de custas, relativas à responsabilidade da parte vencida pelas diligências e encargos/custas de parte processuais, nomeadamente o disposto nos arts. 533º do CPC e 25º e 26º do RCP.

Sucede, porém, que não é este manifestamente o sentido objectivado da dita cláusula : o que dela resulta parece antes ser a imposição de uma responsabilidade ilimitada e autónoma por todas e quaisquer despesas e honorários que o Banco realize, em caso de incumprimento contratual, não se vislumbrando qualquer remissão para a aplicabilidade das referidas regras processuais, nem o estabelecimento de qualquer critério objectivo de determinação do montante de tais despesas e honorários.

Na verdade, enquanto nas duas cláusulas anteriormente avaliadas a indeterminabilidade do montante das despesas devidas ao Banco pelo mutuário, face ao teor das próprias cláusulas contratuais gerais, era suprida pelo conteúdo do preçário, para que expressamente se remetia (documento este  facilmente acessível e, aliás, objecto, como se referiu, de um especial dever de esclarecimento e informação ao aderente, no momento da celebração do contrato), na cláusula 20.2 ocorre efectivamente um grau total de indeterminação, impondo-se ao aderente /mutuário uma responsabilidade por encargos indeterminados e indetermináveis, aparentemente para além daqueles que já lhe incumbiria suportar por via da aplicação directa das disposições atinentes às custas de parte.

E, nesta perspectiva, nenhuma censura merece, nesta parte, o acórdão recorrido, ao concluir que tal cláusula, inserida em contrato de adesão, viola o indispensável equilíbrio contratual, ao impor encargos indetermináveis e potencialmente desproporcionados à parte mais fraca e desprotegida na relação contratual.

8. A decisão recorrida julgou identicamente inválida a cláusula 13.2, referente à titulação e convenção de preenchimento, em função da qual se reconhece que a livrança entregue pelo mutuário ao Banco, em branco no que se refere ao montante da dívida e data do vencimento da obrigação, pode ser por este preenchida, à sua melhor conveniência de tempo, lugar e forma de pagamento, pelos montantes correspondentes à totalidade ou parte das prestações vincendas ou vencidas, referentes a débitos de capital, juros ou encargos, no caso de não cumprimento pelo mutuário de alguma das obrigações decorrentes do financiamento concedido, bem como no caso de o Banco decretar o vencimento antecipado da obrigação, nos termos contratualmente previstos.

Entende-se que nenhuma censura merece este segmento do acórdão recorrido: na verdade, esta cláusula, facultando ao Banco a disponibilidade de um título cambiário em branco e outorgando-lhe o poder de discricionariamente o preencher pelas quantias que considere serem devidas em consequência do incumprimento, abrangendo quantias vencidas e vincendas e incluindo os resultados do exercício unilateral do direito a produzir o vencimento antecipado das obrigações, constitui um reforço desproporcional da tutela dos interesses da entidade que elaborou a cláusula contratual geral, relativamente à posição do mutuário/aderente: na verdade, esta cláusula faculta ao Banco a criação unilateral de um título executivo, com a natureza de título de crédito, ( e, portanto, dotado de plena força executiva, mesmo face às disposições do novo CPC que restringiram drasticamente a exequibilidade dos documentos particulares), permitindo-lhe o preenchimento , sem qualquer possibilidade de controlo do mutuário e  com laivos de discricionariedade ( dada a grande generalidade e indeterminação do pacto de preenchimento), pelas quantias globais que considere representarem o seu direito, podendo, sem mais, dá-lo à execução, forçando a parte contrária que discorde da liquidação feita pelo Bando a deduzir oposição já no âmbito do processo executivo em curso.

Em suma: considera-se que a obrigação, imposta ao mutuário/aderente, de, em reforço da tutela dos direitos do Banco no caso de alegado incumprimento, fazer entrega de uma livrança em branco, facultando-lhe, em termos claramente discricionários e incontrolados pelo cliente, o respectivo preenchimento pelas quantias que (unilateralmente) considere devidas, com base num pacto de preenchimento de conteúdo totalmente genérico e indeterminado – permitindo ao autor da cláusula contratual geral em questão criar, para sua conveniência, um título executivo , com a natureza de título cambiário, que imediatamente pode dar à execução – representa ou traduz uma desconsideração desproporcional dos interesses do aderente, incompatível com o funcionamento da regra da boa fé no domínio peculiar dos contratos de adesão.

9. O acórdão recorrido julgou ainda inválida a cláusula 21., enquanto impõe a competência convencional do Tribunal da comarca de Lisboa para todos os litígios emergentes do contrato.

Considera-se que este segmento do aresto recorrido nenhuma censura merece.

Como é evidente e a própria entidade recorrente reconhece, o âmbito de aplicabilidade desta cláusula, atributiva de competência territorial exclusiva ao tribunal onde está sedeada, está - desde que foi editada a Lei 14/06 -muito reduzido por força da norma imperativa constante do actual art. 71º, nº1, do CPC, conjugada com a dos arts. 95º e 104º, nº1, al. a) do mesmo Código.

Por outro lado – e apesar de obviamente a ponderação das vantagens/inconvenientes para ambas as partes de tal fixação da competência territorial apenas se poderem apurar plenamente em concreto, nada obsta a que se avalie a validade de uma cláusula de atribuição de competência desta natureza em função do quadro contratual padronizado, tendo em consideração quem são os normais destinatários e intervenientes em contratos de crédito automóvel, celebrados com entidades bancárias, bem como as finalidades de acrescida tutela do consumidor que iluminam o regime editado pela referida Lei 14/06 e mantido no novo CPC.

Como se decidiu , por exemplo, no Ac. de 20-01-2010, proferido pelo STJ no P. 3062/05.0TMSNT.L1.S1, a propósito de situação perfeitamente idêntica à dos presentes autos, não há razões bastantes para deixar subsistir tal cláusula, embora presentemente com aplicação residual, - afirmando-se, em termos a que inteiramente se adere:

41. Reconhecendo-se que a referida cláusula tem actualmente um âmbito muito reduzido considerada a nova redacção dada ao artigo 74.º/1 e à alínea a) do artigo 110.º ambos do C.P.C. e atenta ainda a prolação do acórdão de uniformização de jurisprudência de 18-10-2007 - tal cláusula será aplicável a situações em que a resolução se fundamenta na alteração das circunstâncias ou nas acções de anulação ou de declaração de nulidade que a ré possa intentar - a Relação considerou a aludida cláusula ilegal com base nestas razões:

Ora, o objectivo da Lei nº 14/2006 mostra-se explicitado na Proposta de Lei nº 47/X que foi discutida, na generalidade, na Assembleia da Republica, em 02.02.2006. Resulta da exposição de motivos constante da aludida Proposta de Lei que se visou, não só reforçar o valor constitucional da defesa do consumidor, sobretudo perante os grandes litigantes, em regra bancos e sociedades financeiras, mas também descongestionar os Tribunais, tendo em consideração a obtenção de um maior equilíbrio da distribuição territorial da litigância, com especial ponderação para chamada litigância de massa.

Foram, portanto, seleccionadas pelo legislador, as acções que constituem a esmagadora maioria da aludida litigância de massa – acções propostas por empresas com vista à recuperação dos seus créditos provenientes de situações de incumprimento contratual e que recorrem aos tribunais, de forma massiva e geograficamente concentrada – deixando de fora algumas situações em que sempre se justificaria idêntica protecção do consumidor, mas provavelmente tão só por terem escasso relevo estatístico.

E é precisamente nessas restritas acções não englobadas no âmbito de aplicação do artigo 74º do Código de Processo Civil que a regra consagrada no artigo 85º, nº 1 do CPC (acções propostas pela locadora no Tribunal do domicilio do réu), poderá ser afastada pela cláusula contratual em apreço, implicando um desequilíbrio entre o interesse do consumidor, afectado com o alcança dessa cláusula, e o interesse do utilizador da mesma, com inconvenientes bem mais gravosos para o locatário/consumidor do que para a locadora, atento o maior esforço, quer em termos económicos, quer em incomodidade que dela acarretará para o primeiro- – cf. no sentido aqui defendido o Ac. R. L. de 10.04.2008, acessível no supra identificado sítio da Internet, aresto esse que acompanhámos de perto.

42. Contra isto a ré apenas argumentou que só caso a caso esta situação poderia ser avaliada e decidida. No entanto, já anteriormente referimos que a ponderação deve ser feita - e assim se fez - à luz do quadro negocial padronizado, ou seja, à luz do contrato de aluguer de veículo em regime de longa duração, contrato este que a ré negoceia em regra com pequenos consumidores que se encontram, na sua grande maioria, sujeitos ao condicionalismo exposto e que não foi contrariado.

10. Questiona, finalmente, o Banco/recorrente a forma de publicitação em órgão de comunicação social, determinada quanto à decisão inibitória que vier a ser definitivamente proferida.

Saliente-se que esta publicitação, fundada no art. 30º do DL 446/85, nada tem a ver com a comunicação à entidade prevista no art. 34º, para fins perfeitamente diversos da divulgação ampla pelo leque de cidadãos/consumidores, potencialmente interessados, do teor da decisão condenatória proferida e da consequente inadmissibilidade de utilização das cláusulas contratuais gerais proscritas.

Como é evidente, esta divulgação pública não tem qualquer carácter sancionatório, não visando naturalmente penalizar a imagem pública da entidade condenada, mas apenas e tão somente transmitir à generalidade dos consumidores/interessados o resultado objectivo da acção e a disciplina jurídica a que passarão a estar inelutavelmente submetidos os contratos de adesão celebrados, mostrando-se plenamente adequada à vertente cívico/social da própria acção inibitória, direccionada para a protecção dos interesses difusos da generalidade dos consumidores/aderentes, informados precisamente dos seus direitos através da publicitação em órgãos de comunicação social, a todos os cidadãos plenamente acessíveis, do resultado final da causa.

E, nesta perspectiva, não se vê qualquer razão válida para determinar alteração quanto à forma de publicitação decretada pela Relação no acórdão recorrido.

11. Nestes termos e pelos fundamentos apontados concede-se parcial provimento à revista:

- revogando o acórdão recorrido no segmento em que julgou inválidas as cláusulas 3., 20.1 e 20.3;

- e confirmando-o na parte restante, nomeadamente no que se refere ao juízo de invalidade emitido quanto às cláusulas 13.2 ["Titulação e Convenção de Preenchimento": «A livrança referida no número anterior poderá ser preenchida pelo AA Bank, à sua melhor conveniência de lugar, tempo e forma de pagamento, pelos montantes correspondentes à totalidade ou a parte das prestações vincendas ou vencidas e não pagas de capital, juros e/ou encargos da responsabilidade do Cliente, em caso de não cumprimento pelo Cliente de alguma das obrigações pecuniárias decorrentes do presente financiamento ou se, por qualquer motivo contratualmente previsto o AA Bank vier a decretar o vencimento antecipado ao abrigo do disposto no artigo 11 supra.»], 20.2 [O Cliente e o(s) Fiador(es), caso existam, são ainda responsáveis pelo pagamento de todas e quaisquer despesas de natureza judicial e/ou extrajudicial em que o AA Bank venha a incorrer com vista à protecção e exercício dos direitos que lhe assistem ao abrigo do presente contrato, incluindo honorários de advogados e solicitadores ou outros prestadores de serviços.] e 21 [Lei Aplicável e Jurisdição: «[o] presente Contrato está sujeito à lei portuguesa e para todas as questões dele emergentes as partes elegem o foro do Tribunal da Comarca de Lisboa, com expressa renúncia a qualquer outro, ressalvadas as limitações legais.»] constantes das Condições Gerais do contrato de financiamento/crédito automóvel elaborado pelo Banco R.

Custas pelo recorrente, na proporção de 2/3 do que for devido.

Após trânsito, remeta-se certidão ao Gabinete de Direito Europeu.

Lisboa, 16 de Outubro de 2014

Lopes do Rego (Relator)

Orlando Afonso

Távora Victor