Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 2.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | MARIA DA GRAÇA TRIGO | ||
| Descritores: | INTERMEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA CONTRATO DE COMPRA E VENDA PRÉDIO URBANO COMISSÃO LEGITIMIDADE PROCESSUAL LEGITIMIDADE PASSIVA LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO NEGÓCIO FORMAL NULIDADE DO CONTRATO FALTA ASSINATURA ABUSO DO DIREITO PRINCÍPIO DA CONFIANÇA NEXO DE CAUSALIDADE INTERVENÇÃO DE INTERESSADO | ||
| Data do Acordão: | 11/27/2025 | ||
| Nº Único do Processo: | |||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | NEGADAS AS REVISTAS | ||
| Sumário : | I. A matéria de facto é omissa em relação a dois dados de facto que seriam determinantes para se poder afirmar, como fez o Tribunal da 1.ª instância, que foi a actividade de uma outra imobiliária, e não a da autora, que levou a que o contrato de compra e venda fosse celebrado, isto é, que tal actividade foi causal da concretização do negócio. II. Tratando-se de factos essenciais integrantes de uma eventual defesa por excepção (art. 570.º, n.º 2, segunda parte, do CPC), tais factos teriam de ter sido oportunamente alegados pela ré nos termos do art. 5.º, n.º 1, segunda parte, do CPC; não o foram, nem consequentemente foi facultada à autora a possibilidade de os contraditar, pelo que não podem ser considerados pelo tribunal. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - Relatório 1. E..., Sociedade de Mediação Imobiliária Unipessoal, lda. propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra C..., Lda, pedindo a condenação da ré no pagamento da retribuição acordada pelos serviços de mediação imobiliária que lhe foram prestados, no montante de €218.325,00 (duzentos e dezoito mil, trezentos e vinte e cinco euros), acrescido de juros de mora calculados à taxa legal desde a data da outorga da escritura de compra e venda até efectivo e integral pagamento. Para tanto alegou, em síntese, que prestou serviços de mediação imobiliária à ré, tendo por objecto determinado bem imóvel de sua propriedade, através dos quais foi celebrado o negócio de compra e venda entre esta e a interessada por si angariada, pelo que lhe é devida a remuneração acordada entre as partes. 2. A ré contestou, invocando a nulidade do contrato de mediação imobiliária e a ineptidão da petição inicial por contradição entre o pedido e a causa de pedir; e impugnando os factos alegados, concluindo pela improcedência do pedido. 3. A autora apresentou resposta, pronunciando-se pela improcedência da excepção dilatória de nulidade por ineptidão da petição inicial. 4. Realizada audiência prévia foi proferido despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a excepção dilatória de nulidade invocada. 5. Veio a ser proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo a ré do pedido. 6. Inconformada, a autora interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora, pedindo a reapreciação da decisão de direito. 7. Por acórdão de 25.06.2025 foi proferida a seguinte decisão: “Considerando o exposto, acordam em julgar o recurso parcialmente procedente, e em consequência, em revogar a sentença recorrida e condena-se a Ré a pagar à Autora sessenta e cinco por cento da comissão acordada para os serviços de mediação imobiliária que lhe foram prestados, acrescida de juros legais desde a data da celebração da escritura, até integral pagamento. Custas da ação e do recurso na proporção do decaimento por Autora e Ré 527º, nº1 do Código de Processo Civil).”. 8. Desta decisão veio a ré interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões: “[não se incluem as conclusões que se limitam a descrever o processado] 14-Com a consequente declaração de procedência parcial do recurso interposto não se conforma a Ré. Atenta a inconformidade dá entrada do presente recurso. 15-Com o recurso que interpõe pretende a Recorrente ver analisadas algumas questões suscitadas: *Nulidade por inobservância da forma legal (artigo 16.º, n.º 1 e 7 da Lei n.º 15/2013) *Nexo de causalidade entre a actuação da mediadora e o negócio celebrado (artigo 19.º da Lei n.º 15/2013) *Inadmissibilidade da compensação por enriquecimento sem causa (artigo 473.º do Código Civil) *Divisão da comissão. Aplicação do critério de repartição proporcional *Inadmissibilidade da modificação do pedido em sede de recurso *Ilegitimidade passiva da aqui Recorrente *Violação dos princípios da segurança jurídica, da estabilidade e da instância e do contraditório 16-Nos termos do artigo 16.º, n.º 1 da Lei n.º 15/2013, “o contrato de mediação imobiliária é obrigatoriamente reduzido a escrito”, sendo esta exigência reforçada com a afirmação de que “o incumprimento […] determina a nulidade do contrato”. 17-Ora, resulta provado que não existiu qualquer contrato assinado entre a Recorrida e a Recorrente. Foi entregue minuta para análise, mas o contrato nunca foi formalizado. Perante isso, o tribunal não poderia reconhecer qualquer direito à comissão, pois a nulidade legal é insanável, nos termos do artigo 294.º do Código Civil. 18-A ausência da forma escrita do contrato de mediação imobiliária imposta pela lei determina a nulidade do contrato, sendo inaplicável qualquer excepção baseada em actuações parciais ou comunicações informais. A obrigatoriedade de celebração por escrito do contrato entre mediadora imobiliária e o cliente exigida por este artigo decorre da necessidade de protecção das partes, da clareza das obrigações e a validade do próprio direito à comissão. Esta exigência não é meramente formalista trata-se de um requisito ad substantiam, ou seja, a falta de forma escrita determina a nulidade do contrato. 19-Sem contrato escrito a mediadora não pode exigir comissão nem invocar a prestação de serviços como base para enriquecimento sem causa ou outro fundamento subsidiário. 20-Defende a Recorrente que a publicitação da moradia, as visitas efectuadas e todos os actos praticados no sentido da venda – que não aconteceu nos termos propostos pela Ré, aqui Recorrida, e que foi efectuado por diversas imobiliárias da região – deve ser entendida como actividade própria tendente a ganhar uma comissão – às vezes ganha-se outras não, é a realidade inerente ao negócio. Atento o exposto deverá o acórdão proferido ser revogado com todas as consequências legais. 21-Ainda que, por mera hipótese, se admitisse que a actuação da Recorrida pudesse ser considerada válida, sempre se exigiria a demonstração de um nexo causal directo entre essa actuação e a celebração do negócio. 22- “A remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação.” Tal significa que a comissão apenas se constitui como obrigação do cliente se o mediador tiver efectivamente sido o factor determinante na concretização do contrato entre comprador e vendedor. 23-No caso dos autos: -A proposta apresentada pela Recorrida não foi aceite; -O negócio foi posteriormente celebrado com uma proposta diferente e mais elevada, apresentada por outra mediadora, com quem a Ré celebrou contrato válido; -A Autora pagou a comissão à mediadora que concluiu na perfeição o negócio, não se furtando a qualquer responsabilidade. -A actuação da Recorrida não foi o “elo causal” adequado à perfeição do negócio. 24-Para que o direito à comissão se constitua é necessário que o negócio se tenha realizado por virtude da actividade ou actuação do mediador. Não basta que o negócio seja celebrado, é essencial que o cliente tenha sido colocado na posição de contratante por acção directa da mediadora. 25-Não é devida a comissão sempre que a mediação não seja a causa adequada do negócio, pelo que deverá o acórdão proferido ser revogado com todas as consequências legais. 26-Na tentativa de contornar a nulidade do contrato e a ausência de nexo causal, a Recorrida invoca, em sede de recurso, a figura do enriquecimento sem causa. Contudo, tal pretensão não é admissível. 27-Antes de mais resulta do processo que não houve enriquecimento sem causa. A Recorrente pagou uma comissão. 28-Depois, nos termos do artigo 473.º, n.º 1 do Código Civil, o enriquecimento sem causa só é admissível na ausência de outro meio legal de obtenção da reparação. 29-Ora, no caso em apreço, existe uma norma imperativa (artigo 16.º da Lei 15/2013) que prevê a nulidade como sanção pela omissão da forma escrita. Assim, permitir o recurso ao enriquecimento sem causa equivaleria a frustrar a ratio legis da forma legal. 30-A exigência de forma escrita sob pena de nulidade visa a protecção de interesses públicos e é incompatível com a ressarcibilidade baseada no enriquecimento sem causa. Também por esta via deverá o acórdão proferido ser revogado com todas as consequências legais. 31-Não entende a Recorrente como se chega aos 65%...E não entende porque: - várias imobiliárias publicitaram a moradia; - várias imobiliárias mostraram a moradia; - várias imobiliárias apresentaram propostas 32-Porém, só uma conseguiu concretizar o negócio nos termos em que foi aceite pela Recorrente e foi essa agência imobiliária que recebeu a comissão. 33-Como é efectuada esta avaliação pelo Tribunal da Relação? Porquê 65% e não 25% ou 5% ou mesmo 85%? Tudo quando sabemos é que a Recorrente disse à Recorrida que não queria celebrar o contrato por ela proposto. Não havendo contrato não há comissão. E a Recorrente disse NÃO. Por isso não podia, entende a Recorrente, pelo que pugna pela revogação do acórdão objecto do presente recurso. 34-A Recorrida, na petição inicial, pediu a condenação da Recorrente no pagamento da totalidade da comissão (€218.325,00) acrescido de juros de mora calculados à taxa legal desde a data da outorga da escritura de compra e venda até efectivo e integral pagamento, com fundamento em alegado contrato e actuação exclusiva. Só em sede de recurso é que formula um novo pedido - a repartição da comissão numa proporção de 80/20. 35-Esta inovação, no entender da Recorrente é ilegal. Nos termos do artigo 5.º, n.º 1 do CPC, as partes estão vinculadas à causa de pedir e aos pedidos inicialmente formulados, não podendo alterá-los no decurso da instância. Tal limitação visa garantir o contraditório, a estabilidade da instância e a imparcialidade da decisão. A inovação do pedido em sede de recurso constitui violação dos princípios do dispositivo e da estabilidade da instância. 36-Ora, sem necessidade de muito: -parece-nos evidente que estamos perante dois pedidos diferentes, o que não é legalmente admissível. -parece-nos, também, que a Autora recorreu de uma sentença que não existe – veja-se o que decide o Tribunal de primeira instância, veja-se o que a Autora pede ao Tribunal a quo e o que vem pedir ao Venerando Tribunal da Relação de Évora. Repartição de comissão? Numa proporção de 80-20%? No montante de 136.000,00€? Efectiva tutela do direito de crédito? Enriquecimento sem causa da Ré? (que efectivamente pagou a comissão à mediadora que efectuou o trabalho). 37-A Recorrida está vinculada ao pedido efectuado e é relativamente a este que o Tribunal a quo se pronunciou. Não pode a Recorrida alterar o pedido ou a causa de pedir, compondo o litigio conforme entenda mais conveniente na defesa da sua tese e que o venha fazer na fase de recurso depois de não ter colocado essas questões para apreciação em primeira instância, ao arrepio da estabilidade da instância, regra geral do nosso Código de Processo Civil, com sérias repercussões e um forte constrangimento para as partes e in casu com implicações na relação jurídica, que passará a ser diversa da controvertida. 38-A Recorrente já efectuou o pagamento da comissão. Pagou à empresa que efectivamente prestou os serviços e que concretizou o negócio de molde a ser aceite pela Ré, aqui Recorrente. 39-Pedindo-se repartição da comissão necessário será trazer ao processo a principal afectada com a decisão proferida – falamos da mediadora imobiliária que recebeu a comissão. Foi esta que recebeu e será esta que terá que se pronunciar relativamente a eventual repartição do valor recebido. 40-A Recorrida não celebrou qualquer contrato com a ora Recorrente, nem recebeu qualquer serviço desta (falamos em serviço que se tenha comprometido pagar). 41-A comissão de mediação foi paga integralmente à mediadora "Exclusive Living", com quem foi celebrado contrato de mediação imobiliária, que efectivamente apresentou a proposta aceite e conduziu à formalização da venda. 42-Sem a referida empresa imobiliária o negócio não se teria concretizado – vontade manifestada pela Recorrente à Recorrida por diversas vezes (via e-mail e por contacto pessoal e telefónico). 43-A ausência de citação ou intervenção dessa entidade nos autos gera uma situação de litisconsórcio passivo necessário não suprido, violando os artigos 30.º e 33.º do CPC, bem como os princípios do contraditório e do juiz natural. 44-Entende a Recorrente que a decisão de que ora se recorre ofende os princípios estruturantes do processo civil, ao permitir uma condenação com base em factos e pedidos não submetidos ao escrutínio da 1.ª instância, e em relação aos quais a Ré, aqui Recorrente não pôde exercer cabalmente o contraditório. 45-Esta violação do princípio da protecção da confiança e da estabilidade da instância determinará, com a capacidade argumentativa de Vªs. Exªs., a revogação do Acórdão recorrido. 46-A não concordância resulta da factualidade entendida como provada e não questionada pela aqui Recorrida e, bem assim, da factualidade dada como não provada, que também não se mostra questionada pela ora Recorrida, que a aceitou como certa atenta a fundamentação que consta de fls. 7 a 12 da sentença proferida. 47-Aceitando-se os factos constantes de fls. 2 a 7 da decisão objecto do recurso interposto pela Autora nos autos, não se pode comprovar que tenha sido em consequência da actividade da Autora que o negócio de compra e venda do imóvel se veio a concretizar. 48-Na verdade a Ré celebrou um contrato, em regime de não exclusividade, com uma outra agência de mediação imobiliária, a quem pagou a totalidade da comissão acordada. 49-Essa agência apresentou proposta de mediação no valor de mais de três milhões e meio de Euros que foi aceite pela Ré, vindo a compradora a liquidar um sinal no valor de setecentos e tinta e cinco mil euros e a celebrar a escritura de compra e venda no dia 25 de Maio de 2023, pelo valor de três milhões e quatrocentos mil euros – a diferença refere-se a equipamentos/recheios. 50-De realçar que o valor acordado é superior ao valor proposto pela Recorrida e que o valor do sinal também é superior – tudo condições obtidas em resultado do trabalho desenvolvido pela mediadora que recebeu a comissão, por ter sido ela a realizar e, concluir, de forma perfeita o trabalho. 51-A aqui Recorrente não aceitou o valor proposto pela aqui Recorrida e na ausência de concretização do negócio, a Ré continuou a promover o imóvel através de outras agências imobiliárias, na qual se inclui a sociedade denominada de “E..., Lda”. 52-Sendo que foi esta sociedade quem conseguiu a proposta que viria a ser aceite pela ora Recorrente, não tendo a Autora conseguido obter um acordo de vontades entre as partes no que se refere à celebração do negócio. Sem a intervenção da “E..., Lda” o negócio não se concretizaria. 53-A Recorrida não alcançou acordo quanto a todos os pontos do negócio, nomeadamente quanto ao sinal e quanto ao preço, quanto aos equipamentos e quanto à data de celebração. Esse acordo apenas aconteceu no seguimento da intervenção da sociedade denominada de “E..., Lda”, que logrou a imprescindível aproximação de vontades, tendo sido por esta apresentada uma proposta de valor mais elevado. 54-De realçar que o mesmo acontece relativamente ao valor do sinal que aumenta substancialmente na proposta apresentada pela sociedade denominada de “E..., Lda”. Passamos de quatrocentos e noventa e cinco mil euros para setecentos e trinta e cinco mil Euros. 55-Sendo certo que estamos a falar de negócios diferentes. Esta circunstância determina que se conclua no sentido de que não se verifica a condição de que dependia o reconhecimento do direito à remuneração. “O que vale por dizer que, nos termos do disposto no artº. 19, da Lei nº. 15/2013, de 8 de Janeiro, no qual se define que a remuneração apenas é devida com a conclusão e perfeição do negócio, não se tendo concretizado o negócio nos termos em que foram propostos aquando da intervenção da Autora como mediadora não se verificam os pressupostos para o reconhecimento do direito à comissão.” (fls. 23 da sentença proferida nos autos). 56-Assim sendo, entende a Recorrente que não se pode concluir como demonstrado o nexo de causalidade entre a actividade do mediador e a celebração do negócio. 57-Conforme resulta da doutrina e jurisprudência citada em sede de alegações, para estabelecer-se o direito à remuneração acordada deve recorrer-se à teoria da causalidade adequada para definir a relação entre a actividade e o negócio efectivamente celebrado. Isto é, “…para que haja tal nexo de causalidade tem que haver efectiva actividade da mediadora e essa actividade tem de ser causalmente adequada ao resultado que se veio a verificar, no sentido de esse resultado ser previsível segundo o referido juízo de prognose póstuma.” (fls. 25 de sentença). 58-E ainda que assim não fosse cabia à Autora, aqui Recorrida, o ónus da alegação e prova, o que não logrou conseguir. 59-O certo é que, perante a factualidade dada como provada e não questionada pela Autora não se verifica o nexo de causalidade adequada entre a actividade de promoção junto da potencial compradora (AA) e a celebração do contrato de compra e venda do imóvel – Vejam-se as declarações da testemunha AA que afirma de forma clara e frontal que a agência imobiliária determinante para a realização do negócio foi a “E..., Lda” e não a ora Recorrida. 60-Assim, deve concluir-se nos termos da douta sentença, ou seja, pela improcedência da acção na sua totalidade, absolvendo-se a aqui Recorrente, aí Ré, do pedido, com a necessária revogação do acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora.”. 9. Interpôs a autora recurso subordinado, concluindo nos termos seguintes: “A. A Recorrente Subordinada, E..., Sociedade de Mediação Imobiliária Unipessoal, lda., interpôs o presente recurso subordinado em resposta ao Recurso de Revista da Recorrida Principal, C..., Lda, visando a reforma do douto Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora. Esta interposição fundamenta-se na dupla necessidade de refutar os argumentos da Recorrida e de corrigir a decisão na parte em que lhe foi desfavorável. B. Com efeito, a Recorrente Subordinada não se conforma integralmente com a percentagem da comissão de mediação imobiliária fixada em 65% pelo Tribunal da Relação, por entender que a sua atuação determinante na concretização do negócio justifica uma atribuição de 80% do valor acordado, garantindo assim a efetiva tutela do seu direito de crédito e impedindo o enriquecimento sem causa da Recorrida. C. No que concerne à arguição da nulidade do contrato por inobservância da forma legal, com base no artigo 16.º, n.º 1 e 7 da Lei n.º 15/2013, a Recorrida Principal insiste numa tese já amplamente debatida e devidamente afastada pelo Tribunal da Relação de Évora. D. A fundamentação do acórdão recorrido, neste particular, é sólida e irrefutável, merecendo ser integralmente mantida por este Colendo Tribunal. E. O Tribunal da Relação concluiu, de forma acertada, pela inalegabilidade da nulidade por abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium. A Recorrida Principal, ao longo de todo o processo de mediação, criou na Recorrente Subordinada uma legítima e fundada confiança na validade da sua atuação, não podendo agora invocar a nulidade. F. A conduta da Recorrida Principal, ao solicitar documentos, permitir a publicitação do imóvel, aceitar propostas e negociar ativamente com os compradores angariados pela Recorrente Subordinada, é manifestamente contraditória com a posterior invocação da nulidade formal. Tal comportamento excede, de forma clara e manifesta, os limites impostos pela boa-fé. G. A doutrina de Menezes Cordeiro, amplamente acolhida, sublinha que a inalegabilidade formal ocorre quando a nulidade derivada da falta de forma legal não pode ser alegada sob pena de se verificar um abuso de direito, contrário à boa-fé, conforme se extrai do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 02.05.2023 (Processo n.º 384/22.0T8PRG.G1): "A inalegabilidade formal à situação em que a nulidade derivada da falta de forma legal não possa ser alegada sob pena de se verificar um abuso de direito, contrário à boa fé.” H. Relativamente ao nexo de causalidade entre a atuação da mediadora e o negócio celebrado, nos termos do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, a Recorrida Principal argumenta a sua inexistência. Contudo, esta alegação desconsidera os factos provados e a jurisprudência aplicável, que foram corretamente interpretados pelo Tribunal da Relação. I. O douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora já reconheceu, de forma inequívoca, a existência de um nexo causal entre a atividade da Recorrente Subordinada e a concretização da venda. A Recorrente Subordinada desenvolveu uma atividade causal e preponderante, angariando os compradores e promovendo o negócio. J. O facto de o negócio ter sido formalizado por outra agência, a "Exclusive Living", não quebra o nexo de causalidade. A identidade dos compradores e do imóvel permaneceu, e a aproximação inicial e o amadurecimento do negócio foram, em grande parte, resultado da atuação da Recorrente Subordinada, conforme reiteradamente provado nos autos. K. A jurisprudência tem sido clara ao afirmar que não é necessário que a atuação da mediadora seja a causa exclusiva da celebração do contrato de compra e venda, nem que a mediadora tenha participado em todos os eventos da cadeia de factos que levaram à conclusão do negócio, entendimento corroborado pelo Acórdão da Relação de Lisboa de 04.06.2024 (Processo n.º 1563/21.2YIPRT.L1), que reforça o seguinte: "O direito à comissão do mediador imobiliário depende da verificação de um nexo de causalidade entre a sua atuação e a celebração do negócio visado, não sendo, contudo, exigível que a sua intervenção seja a causa exclusiva ou que tenha participado em todas as fases do processo negocial." L. Quanto à inadmissibilidade da compensação por enriquecimento sem causa, prevista no artigo 473.º do Código Civil, a argumentação da Recorrida Principal é falaciosa. Uma vez que o Tribunal da Relação validou o contrato de mediação e reconheceu o nexo causal, a remuneração é devida por força do contrato. M. A Recorrida Principal obteve uma vantagem patrimonial (a venda do imóvel) à custa da atividade desenvolvida pela Recorrente Subordinada, sem que esta receba a justa contraprestação pelo seu trabalho. A não atribuição da comissão justa configuraria um enriquecimento sem causa à custa do trabalho e do esforço da Recorrente Subordinada. N. No que tange à alegada inadmissível modificação do pedido em sede de recurso, a Recorrida Principal incorre em erro. A pretensão da Recorrente Subordinada de obter 80% da comissão, em vez dos 100% inicialmente peticionados, constitui uma redução do pedido inicial, e não uma modificação. O. O Código de Processo Civil permite expressamente a redução do pedido, não a considerando uma alteração substancial que prejudique a defesa da parte contrária. A Recorrida Principal teve plena oportunidade de se defender quanto ao pedido inicial de 100%, e a redução para 80% apenas diminui a sua potencial condenação. P. A alegação de ilegitimidade passiva da Recorrida Principal é manifestamente improcedente. A ação foi intentada contra a C..., Lda, na qualidade de comitente e devedora da comissão de mediação imobiliária, sendo a obrigação de remunerar a mediadora recai sobre quem se beneficiou dos serviços prestados. Q. Não existe qualquer litisconsórcio passivo necessário com a "E..., Lda". A obrigação de pagamento da comissão é da Recorrida Principal, e a forma como esta gere a repartição com outras agências é uma questão interna que não impede a Recorrente Subordinada de exigir a sua parte da comissão ao devedor principal. R. Por fim, a alegação de violação dos princípios da segurança jurídica, da estabilidade da instância e do contraditório por parte da Recorrida Principal é totalmente infundada. Toda a matéria de facto e de direito foi amplamente discutida em primeira instância e reavaliada pelo Tribunal da Relação. S. A Recorrida Principal teve pleno conhecimento de todas as questões levantadas e exerceu cabalmente o seu direito ao contraditório em todas as fases processuais. A decisão do Tribunal da Relação resultou de uma reanálise da prova e da aplicação do direito aos factos provados, sem qualquer introdução de factos novos ou questões não debatidas. T. Quanto à repartição da comissão, este é o ponto fulcral do presente recurso subordinado, no qual a Recorrente Subordinada busca a justa eequitativa atribuição da comissão que lhe é devida. U. O douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, ao fixar a percentagem devida em 65%, embora reconhecendo a intervenção causal, não reflete adequadamente a superior relevância da sua atuação. V. Os factos provados demonstram, de forma cabal e inequívoca, que a atuação da Recorrente Subordinada foi determinante para a aproximação das partes e para o amadurecimento do negócio. W. Foi a Recorrente Subordinada quem, em primeiro lugar, angariou os compradores, BB e AA, que viriam a adquirir o imóvel. X. A Recorrente Subordinada não se limitou a uma mera apresentação. A publicitação do imóvel no seu website, a parceria estabelecida com a "A...", o acompanhamento dos compradores em diversas visitas ao imóvel e a apresentação de propostas concretas, incluindo uma de € 3.500.000,00, que foi aceite pela Recorrida Principal, são elementos que atestam a preponderância da sua intervenção. Y. É crucial salientar que o valor final da venda, constante da escritura pública (€ 3.425.000,00), é até inferior à proposta de € 3.500.000,00 obtida pela Recorrente Subordinada. Este facto reforça, de forma irrefutável, a tese de que a intervenção da "E..., Lda" se limitou, essencialmente, à formalização de um negócio já substancialmente preparado e amadurecido pela Recorrente Subordinada. Z. A outra agência apenas interveio numa fase posterior, beneficiando-se da base sólida e do trabalho exaustivo já desenvolvido pela Recorrente Subordinada. A sua contribuição, embora existente, foi de menor impacto e complexidade na cadeia causal que conduziu à venda do imóvel. AA. A jurisprudência, conforme o Acórdão da Relação de Lisboa de 18.01.2024 (Processo n.º 2005/22.0YLPRT.L1), admite a repartição da comissão em caso de concorrência de mediadoras, de modo proporcionado à contribuição da atividade de cada uma para o êxito do contrato celebrado, ao clarificar que: “Quando haja intervenção de mais de um mediador, a comissão deve ser repartida de forma proporcional à contribuição de cada um para a concretização do negócio, atendendo ao grau de intervenção e à eficácia da sua atuação.” BB. A atribuição de apenas 65% da comissão, embora reconhecendo a intervenção, subestima de forma flagrante o papel fulcral da Recorrente Subordinada na cadeia causal que levou à venda. A sua atuação foi o motor inicial e principal da transação, superando obstáculos e aproximando as vontades das partes. CC. A Recorrente Subordinada não apenas introduziu os compradores ao imóvel, mas também manteve o fluxo comunicacional e negocial, demonstrando um empenho e uma eficácia que justificam uma maior fatia da comissão. A percentagem de 65% não reflete a realidade dos factos provados. DD. A atribuição de 80% da comissão à Recorrente Subordinada e 20% à "E..., Lda" seria uma divisão justa e proporcional, alinhada com a realidade dos factos e com o grau de intervenção de cada mediador. Esta percentagem reflete a superior relevância da atuação da Recorrente Subordinada e a sua contribuição preponderante. EE. O não reconhecimento desta percentagem justa configuraria um enriquecimento sem causa da Recorrida Principal, que se beneficiou do trabalho preponderante da Recorrente Subordinada sem a devida contraprestação. A tutela do direito de crédito da Recorrente Subordinada exige a atribuição de 80% da comissão. FF. A manutenção da percentagem de 65% desincentiva o trabalho das agências de mediação imobiliária que realizam o esforço inicial e mais complexo de angariação e aproximação, permitindo que outras agências formalizem o negócio com um contributo menor, mas recebam uma fatia desproporcional da comissão, o que é iníquo. GG. Assim, o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto garante da uniformidade da jurisprudência e da correta aplicação do direito, deve reformar o Acórdão recorrido nesta parte, reconhecendo o direito da Recorrente Subordinada a 80% da comissão, em conformidade com a sua atuação determinante, e condenando a Recorrida Principal ao pagamento do valor devido, acrescido de juros de mora desde o vencimento da obrigação até ao seu integral pagamento.”. Termina pedindo que se: “a) Julgue improcedente o Recurso de Revista interposto pela Recorrida Principal, C..., Lda, mantendo o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora na parte em que afastou a nulidade do contrato por abuso de direito e reconheceu o nexo de causalidade entre a atuação da Recorrente Subordinada e a concretização do negócio, por se encontrar em perfeita conformidade com a lei e a jurisprudência pátria; b) Julgue procedente o presente Recurso Subordinado, revogando-se parcialmente o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora na parte em que fixou a comissão devida à Recorrente Subordinada em 65% e, em consequência, condene-se a Recorrida Principal a pagar à Recorrente Subordinada o montante correspondente a 80% da comissão acordada, isto é, € 136.000,00 (cento e trinta e seis mil euros), valor que reflete a superior relevância e o caráter determinante da sua atuação na concretização do negócio; c) Acresça-se ao montante da condenação os juros de mora legais, contados desde a data da celebração da escritura pública de compra e venda do imóvel até ao seu integral e efetivo pagamento, garantindo assim a efetiva tutela do direito de crédito da Recorrente Subordinada e impedindo o enriquecimento sem causa da Recorrida Principal”. 10. A ré contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso subordinado e reiterando o alegado no recurso principal. II – Objecto dos recursos Tendo em conta o disposto no n.º 4 do art. 635.º do Código de Processo Civil, o objecto do recurso delimita-se pelo conteúdo da decisão recorrida e pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso. Deste modo, o recurso principal da ré tem como objecto as seguintes questões (por ordem de precedência do seu conhecimento): • Alteração do pedido em sede de recurso de apelação; • Ilegitimidade da ré por preterição de litisconsórcio passivo necessário; • Nulidade do contrato de imediação imobiliária; • Falta de nexo causal entre a actividade desenvolvida pela autora e a celebração do contrato de compra e venda do imóvel, propriedade da ré; • Subsidiariamente, erro no juízo de ponderação da contribuição causal da actividade desenvolvida pela autora para a celebração contrato de compra e venda; • Inexistência de enriquecimento sem causa; • Violação de princípios estruturantes do processo civil. Por sua vez, o recurso subordinado da autora tem por objecto unicamente a seguinte questão: • Alteração da ponderação da contribuição causal da actividade desenvolvida pela autora para a celebração contrato de compra e venda, que deverá ser fixada em 80%, com o consequente aumento do valor da comissão a que a autora tem direito. III – Fundamentação de facto Foram dados como provados os factos seguintes (mantém-se a redacção das instâncias): 1. A Autora é uma agência de mediação imobiliária que se dedica à atividade de intermediação na venda de imóveis (cf. certidão do registo comercial com o código de acesso à certidão permanente 3537-1038-8359). 2. A Ré era proprietária do prédio urbano, denominado Lote n.º 1, composto por moradia unifamiliar com 3 pisos, destinada a habitação T4 com garagem e piscina, sito em ..., União de freguesias de Estômbar e Parchal, concelho de Lagoa (Algarve), descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagoa sob o n.º ..96, inscrito na matriz cadastral sob o art.º ..95 o qual pretendia vender (cf. docs 1 juntos com a petição, cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 3. Em data não concretamente apurada, a Autora contatou a Ré para promover a respetiva venda deste prédio urbano. 4. No dia 26.08.2021 a Autora solicitou à Ré que enviasse os documentos da propriedade para que fosse elaborado um contrato de mediação imobiliária (cf. doc. 13 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 5. O legal representante da Ré enviou à Autora fotos e plantas do prédio urbano (cf. doc. 13 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 6. Posteriormente, o colaborador da Autora, CC, teve uma reunião com o sócio-gerente da Ré, DD, na qual lhe entregou uma minuta do contrato de mediação imobiliária. 7. O sócio-gerente da Ré ficou com o documento e referiu que iria analisá-lo, não o tendo devolvido. 8. A Autora publicitou a venda do prédio urbano no seu website, através de anúncios e junto dos seus clientes. 9. BB e AA procuravam um prédio urbano para adquirir com caraterísticas idênticas às daquele prédio urbano, tendo para o efeito contatado a agência imobiliária “A...”, na qual era colaborador EE. 10. Este, sabendo da existência do prédio urbano através do website da Autora, contatou-a e acordou com esta uma parceria com vista à conclusão da respetiva compra e venda. 11. O colaborador da Autora CC acompanhou BB e AA nas visitas que realizaram ao prédio urbano, nas quais esteve por vezes presente o sócio-gerente da Ré, dando a conhecer a este as propostas enviadas por aqueles e contrapropostas (cf. docs 2 e 3 juntos com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 12. No dia 18.02.2022 o colaborador CC informou o sócio-gerente da Ré da obtenção de uma proposta de compra pelo valor de € 3.300.000,00 (cf. doc 4 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 13. Na mesma comunicação fez referência ao valor da comissão devida pela mediação (5% do valor da venda com IVA incluído) (cf. doc 4 junto com a pi, cujo teor se dá por reproduzido). 14. No dia 19.02.2022 o sócio-gerente da Ré respondeu dizendo concordar com a proposta e com o valor da comissão (cf. doc 5 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 15. No dia 14.03.2022 o colaborador da Autora enviou ao sócio-gerente da Ré uma minuta que redigiu do Contrato-Promessa de Compra e Venda do prédio urbano (cf. doc 6 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 16. No dia 18.03.2022 o sócio-gerente da Ré informou o colaborador da Autora que tinha sugestões de alterações que o seu advogado iria enviar ao advogado dos clientes na segunda-feira e quando tivesse notícias avisava (cf. doc 7 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 17. No dia 27.04.2022 o colaborador da Autora informou o sócio-gerente da Ré que os compradores tinham uma proposta no valor de € 3.500.000,00 (cf. doc 8 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 18. No mesmo dia informou a Mandatária da Ré do aumento da proposta, frisando a necessidade de o contrato-promessa de compra e venda ser celebrado com urgência (cf. doc 9 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 19. No dia 29.04.2022 o sócio-gerente da Autora manifestou à Mandatária da Ré surpresa por não ter recebido nenhuma resposta da mesma e informou que naquela manhã um colaborador confrontou o sócio-gerente da Ré que disse que “nem queria dar chance do nosso cliente de subir a proposta pelo mesmo valor” (cf. doc 10 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 20. A ilustre mandatária da Ré responde dizendo: “Boa tarde, Acredite que não sei o que lhe posso dizer. Eu fiz uma pergunta e aguardo resposta. Acredite também não sei trabalhar assim. As conversas diretas entre compradores e vendedores dificultam claramente o nosso trabalho. Com elevada estima e consideração, FF Advogada”. (cf. doc. 10 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 21. No dia 27.05.2022 o sócio-gerente da Autora questionou a Mandatária da Ré se já havia previsão para assinatura do contrato-promessa de compra e venda (cf. doc. 11 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 22. Esta respondeu que estava prevista para a semana seguinte (cf. doc. 11 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 23. No dia 09.06.2022 o sócio-gerente da Autora congratulou a Mandatária da Ré pela assinatura do contrato-promessa de compra e venda (cf. doc. 12 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 24. No dia 13.06.2022 o sócio-gerente da Autora questionou a Mandatária da Ré acerca do pagamento da comissão acordada, no valor de €177.500,00, a que esta respondeu dizendo que “Eu não tenho nenhuma informação para efetuar qualquer pagamento”, “Essa é uma questão a tratar com a outra agência, como me disse” (cf. doc 12 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 25. O sócio-gerente da Autora insistiu pelo pagamento da comissão e a Mandatária da Ré respondeu (…) “Desconheço o combinado” (…) “Falem entre agências e depois digam a quem deverá ser faturado o valor” (…) (cf. doc. 12 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 26. No dia 21.07.2020 a Ré celebrou com a sociedade de mediação imobiliária “E..., Lda.” contrato de mediação com vista à angariação de comprador para o prédio urbano, pelo preço de €3.500.000,00, em regime de não exclusividade, ficando acordado o pagamento de uma comissão de 5% do preço incluindo IVA de 23% (cf. doc. junto em audiência de julgamento, cujo teor se dá por reproduzido). 27. O colaborador desta sociedade apresentou uma proposta de AA no valor de € 3.550.000,00, que foi aceite pelo sócio-gerente da Ré. 28. Por escritura pública de compra e venda, outorgada no dia 25.05.2023, no Cartório Notarial a cargo de GG, a Ré declarou vender a AA, que aceitou comprar, pelo preço de €3.425.000,00, o prédio urbano composto por moradia unifamiliar de três pisos, destinada a habitação, com garagem e piscina, denominado Lote 1, situado em ... União de Freguesias de Estômbar e Parchal, concelho de Lagoa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagoa, sob o n.º ..96 e inscrito na matriz sob o art.º P..95, declarando a Ré que na venda teve intervenção a mediadora imobiliária “E..., Lda”, titular da licença número ..16- AMI (doc junto com a refª ......82, cujo teor se dá por reproduzido). Factos dados como não provados: a) o sócio-gerente da Ré não assinou o documento alegando não ter consigo o carimbo da empresa, comprometendo-se a entregá-lo à Autora, assinado e carimbado, nos dias seguintes; b) em resultado da atuação da Autora foi apresentada a proposta que foi aceite pela Ré; c) apenas os colaboradores da Autora e da sociedade “A...” tiveram atuação que levou à celebração da escritura pública de compra e venda do prédio urbano. IV – Fundamentação de direito 1. Questões recursórias Recorde-se que o recurso principal da ré tem como objecto as seguintes questões (por ordem de precedência do seu conhecimento): • Alteração do pedido em sede de recurso de apelação; • Ilegitimidade da ré por preterição de litisconsórcio passivo necessário; • Nulidade do contrato de imediação imobiliária; • Falta de nexo causal entre a actividade desenvolvida pela autora e a celebração do contrato de compra e venda do imóvel, propriedade da ré; • Subsidiariamente, erro no juízo de ponderação da contribuição causal da actividade desenvolvida pela autora para a celebração contrato de compra e venda; • Inexistência de enriquecimento sem causa; • Violação de princípios estruturantes do processo civil. E que o recurso subordinado da autora tem como objecto unicamente a seguinte questão: • Alteração da ponderação da contribuição causal da actividade desenvolvida pela autora para a celebração contrato de compra e venda, que deverá ser fixada em 80%, com o consequente aumento do valor da comissão a que a autora tem direito. 2. Alteração do pedido em sede de recurso de apelação Alega a recorrente que a autora “pediu a condenação da Recorrente no pagamento da totalidade da comissão (€218.325,00) acrescido de juros de mora calculados à taxa legal desde a data da outorga da escritura de compra e venda até efectivo e integral pagamento, com fundamento em alegado contrato e actuação exclusiva. Só em sede de recurso é que formula um novo pedido - a repartição da comissão numa proporção de 80/20”, verificando-se, assim, uma inadmissível alteração do pedido. Ora, como invocado pela autora, ora recorrida, na petição inicial esta peticionou a condenação da ré no pagamento da totalidade da comissão e na apelação reduziu o pedido para quantia correspondente a 80% daquele pedido. Estando em causa uma redução meramn te quantitativa, em conformidade com o disposto no n.º 1 do art. 609.º do CPC (“A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir”) é a mesma admissível. Sem necessidade de mais considerações, improcede, nesta parte, a pretensão da recorrente. 3. Ilegitimidade da ré por preterição de litisconsórcio passivo necessário A este respeito, alega a recorrente essencialmente o seguinte: - A comissão de mediação foi paga integralmente à mediadora E..., Lda, com quem foi celebrado contrato de mediação imobiliária, que efectivamente apresentou a proposta aceite e que conduziu à formalização da venda; - A ausência de citação ou intervenção nos autos dessa entidade gera uma situação de litisconsórcio passivo necessário não suprido, violando os arts. 30.º e 33.º do CPC. Pugna a recorrida pela improcedência desta pretensão. Vejamos. Ainda que a questão da ilegitimidade apenas tenha sido suscitada em sede de revista, sendo de conhecimento oficioso (cfr. arts. 577.º, alínea e), e 578.º do CPC), dela cumpre conhecer. Sob a epígrafe Litisconsórcio necessário prescreve o art. 33.º do CPC o seguinte: “1 - Se, porém, a lei ou o negócio exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade. 2 - É igualmente necessária a intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal. 3 - A decisão produz o seu efeito útil normal sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado.”. No caso sub judice a relação material controvertida corresponde à relação contratual entre a autora e a ré, partes no contrato de mediação imobiliária, sendo a imobiliária E..., Lda um terceiro pelo que não se aplica ao caso o regime do n.º 1 do art. 33.º do CPC. Na medida em que a obrigação de pagamento da comissão devida pela concretização do negócio de compra e venda impende unicamente sobre a ré, proprietária do imóvel, tampouco é aplicável a norma do n.º 2 do mesmo preceito. Se assim o entendesse, poderia a ré ter requerido – mas não o fez – a intervenção acessória da imobiliária E..., Lda ao abrigo do art. 321.º, n.º 1 do CPC (“O réu que tenha ação de regresso contra terceiro para ser indemnizado do prejuízo que lhe cause a perda da demanda pode chamá-lo a intervir como auxiliar na defesa, sempre que o terceiro careça de legitimidade para intervir como parte principal”). Improcede, pois, também nesta parte, a pretensão da recorrente. 4. Nulidade formal do contrato de imediação imobiliária A recorrente invoca a questão da nulidade formal do contrato de imediação imobiliária, a qual foi apreciada pelo acórdão recorrido em termos que merecem a nossa inteira concordância e que em seguida se reproduzem: “O contrato de mediação imobiliária, que se encontra regulado pela Lei n.º 15/2013, de 08.02, a qual entrou em vigor em 01.03.2013 (art.º 45.º, n.º 1) e revogou o DL n.º 211/2004, de 20.08. foi adequadamente caracterizado pelo Tribunal Recorrido, pelo que aqui apenas cabe, com interesse para a boa decisão da causa, salientar que nos termos do disposto no artigo 16.º, n.º 1 do referido diploma, na redação introduzida pelo DL n.º 102/2017, de 23.08, estipula-se quanto à forma que “é obrigatoriamente reduzido a escrito”, prevendo o n.º 2 do mesmo preceito os elementos que deve conter obrigatoriamente. E que se trata de contrato oneroso, dele devendo constar as condições da remuneração, podendo ainda ser acordado um regime de exclusividade. A inexistência de contrato reduzido a escrito gera, pois, como referiu o Tribunal Recorrido, a respetiva nulidade não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação (artigo 16º n.º 1 e 7 da Lei n.º 15/2013, de 8/02, com as alterações pelo Decreto-Lei n.º 102/2017, de 23/08). (…) No caso, não existindo dúvidas de que o contrato de mediação não foi assinado pela ora Ré, importa, em face dos factos provados, analisar a inalegabilidade do incumprimento do formalismo contratual, por verificação de uma situação de abuso do direito, por parte da Ré. A propósito das inalegabilidades formais, Menezes Cordeiro, depois de dar nota de ter defendido “não ser possível um bloqueio direto, ex bona fide e na base da confiança, da alegação de nulidades formais” , afirma, no entanto, que “a persistência da nossa jurisprudência e confrontados com casos nos quais a via da inalegabilidade permite uma solução justa e imediata, enquanto o circunlóquio pela responsabilidade civil se apresenta problemático, entendemos rever a nossa posição. Assim, em casos bem vincados, admitimos hoje que as próprias normas formais cedem perante o sistema, de tal modo que as nulidades derivadas da sua inobservância se tornam verdadeiramente inalegáveis”. Mas – acrescenta – “as inalegabilidades formais não podem ser abandonadas ao sentimento ou à deriva linguística dos “casos clamorosos contrários à Justiça”. Apesar da dificuldade há que compor, para elas um modelo de decisão. (...) A inalegabilidade aproxima-se, assim, do venire, requerendo como ele: - a situação de confiança; - a justificação para a confiança; o investimento de confiança; - a imputação de confiança ao responsável que irá, depois, arcar com as consequências. Todavia, tratando-se de inalegabilidades formais, teríamos de introduzir, ainda, três proposições: - devem estar em jogo apenas os interesses das partes envolvidas; nunca, também os de terceiros de boa-fé; - a situação de confiança deve ser censuravelmente imputável à pessoa a responsabilizar; - o investimento de confiança apresentar-se-á sensível, sendo dificilmente assegurado por outra via”. E conclui: “Nessa altura, a tutela da confiança impõe, ex bona fide, a manutenção do negócio vitimado pela invalidade formal. Summo rigore, passará a ser uma relação legal, apoiada no artigo 334.º em tudo semelhante à situação negocial falhada por vício de forma”. (…) O abuso do direito só se revela, pois, num exercício manifestamente contrário à boa-fé exigível. E se assim é, pela própria definição que nos surge no artigo 334º do Código Civil, importará acentuar e acrescentar que o comportamento contraditório definidor de uma situação abusiva definível como venire contra factum proprium nulli conceditur, exige nessa contraditoriedade o mesmo excesso manifesto e uma responsabilidade efetiva pela criação de uma situação de confiança, alicerçada nesse comportamento contraditório e aceite, pela contraparte, na sequência de num juízo de normalidade e adequação entre o comportamento (factum proprium) e a sua aceitação como gerador (da situação de) confiança. Acresce que, se sempre assim é, nos casos em que se suscita o problema da inalegabilidade de um vício formal, desde logo atendendo às razões fundantes da observação da forma no negócio jurídico, a excecionalidade do venire, ou seja, do abuso do direito, é ainda mais vincada, não podendo prescindir da efetiva contribuição do alegante para a celebração do negócio viciado, ou melhor, da sua efetiva contribuição para o vício do negócio e, é claro, para a criação de uma situação de confiança na contraparte. No caso importa atentar que se demonstrou que: - No dia 26.08.2021 a Autora solicitou à Ré que enviasse os documentos da propriedade para que fosse elaborado um contrato de mediação imobiliária (cf. doc 13 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). - O legal representante da Ré enviou à Autora fotos e plantas do prédio urbano (cf. doc 13 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). - Posteriormente, o colaborador da Autora, CC, teve uma reunião com o sócio-gerente da Ré, DD, na qual lhe entregou uma minuta do contrato de mediação imobiliária; - O sócio-gerente da Ré ficou com o documento e referiu que iria analisá-lo, não o tendo devolvido; - A Autora publicitou a venda do prédio urbano no seu website, através de anúncios e junto dos seus clientes; BB e AA procuravam um prédio urbano para adquirir com caraterísticas idênticas às daquele prédio urbano, tendo para o efeito contatado a agência imobiliária “A...”, na qual era colaborador EE; - Este, sabendo da existência do prédio urbano através do website da Autora, contatou-a e acordou com esta uma parceria com vista à conclusão da respetiva compra e venda; - O colaborador da Autora CC acompanhou BB e AA nas visitas que realizaram ao prédio urbano, nas quais esteve por vezes presente o sócio-gerente da Ré, dando a conhecer a este as propostas enviadas por aqueles e contrapropostas (cf. docs 2 e 3 juntos com a petição, cujo teor se dá por reproduzido); - No dia 18.02.2022 o colaborador CC informou o sócio-gerente da Ré da obtenção de uma proposta de compra pelo valor de € 3.300.000,00 (cf. doc 4 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido); - Na mesma comunicação fez referência ao valor da comissão devida pela mediação (5% do valor da venda com IVA incluído) (cf. doc 4 junto com a pi, cujo teor se dá por reproduzido); - No dia 19.02.2022 o sócio-gerente da Ré respondeu dizendo concordar com a proposta e com o valor da comissão (cf. doc 5 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido); - No dia 14.03.2022 o colaborador da Autora enviou ao sócio-gerente da Ré uma minuta que redigiu do Contrato-Promessa de Compra e Venda do prédio urbano (cf. doc 6 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido); - No dia 18.03.2022 o sócio-gerente da Ré informou o colaborador da Autora que tinha sugestões de alterações que o seu advogado iria enviar ao advogado dos clientes na segunda-feira e quando tivesse notícias avisava (cf. doc 7 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). Perante tais factos não pode validamente pôr-se em dúvida que a Ré criou na Autora uma situação de confiança manifestando a sua vontade de negociar, intervindo ativamente nas visitas ao prédio, respondendo e aceitando propostas apresentadas pela Autora enquanto mediadora, criando essa certeza na Autora de que validava a sua atividade de mediação imobiliária e dos seus colaboradores no âmbito da promoção da venda do imóvel em causa nos autos - ou seja, a Ré fez crer à contraparte que o contrato celebrado era formalmente válido, para que a mesma exercesse a sua atividade, o que a Autora fez, confiando no comportamento da Ré, vindo posteriormente esta pedir a declaração de nulidade daquele contrato. Neste contexto, a invocação posterior da nulidade do contrato de mediação por falta da sua assinatura, pela Ré, única parte à qual seria, em abstrato, lícita, tal invocação, como vimos, excede clara e manifestamente os limites da boa fé, tornando, consequentemente, ilegítima tal arguição. Assim, a nulidade invocada por falta de cumprimento das formalidades apontadas deve improceder.”. [bold nosso] Perante a factualidade dada como provada, considera-se, nas palavras do acórdão recorrido, que “não pode validamente pôr-se em dúvida que a Ré criou na Autora uma situação de confiança manifestando a sua vontade de negociar, intervindo ativamente nas visitas ao prédio, respondendo e aceitando propostas apresentadas pela Autora enquanto mediadora, criando essa certeza na Autora de que validava a sua atividade de mediação imobiliária e dos seus colaboradores no âmbito da promoção da venda do imóvel em causa nos autos - ou seja, a Ré fez crer à contraparte que o contrato celebrado era formalmente válido, para que a mesma exercesse a sua atividade, o que a Autora fez, confiando no comportamento da Ré, vindo posteriormente esta pedir a declaração de nulidade daquele contrato.”. Pelo que “a invocação posterior da nulidade do contrato de mediação por falta da sua assinatura, pela Ré, única parte à qual seria, em abstrato, lícita, tal invocação, como vimos, excede clara e manifestamente os limites da boa fé, tornando, consequentemente, ilegítima tal arguição”. Conclui-se, também nesta parte, pela improcedência da pretensão da recorrente. 5. Falta de nexo causal entre a actividade desenvolvida pela autora e a celebração do contrato de compra e venda do imóvel, propriedade da ré 5.1. Não vem posto em causa que, de acordo com o disposto no n.º 1 do art. 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro (“A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação (…)”), o direito da mediadora a receber a comissão acordada depende da verificação do nexo causal entre a actividade desenvolvida pela mesma e a venda do imóvel dos autos. O Tribunal da 1.ª instância considerou não verificado o nexo causal entre a actividade desenvolvida pela autora e a celebração do contrato de compra e venda do imóvel pertencente à ré, fundamentando a decisão da seguinte forma: “Como resultou igualmente provado, a Autora efetuou mais do que um contacto com os potenciais compradores do imóvel, fazendo algumas deslocações/visitas para o mostrar e intermediando as propostas apresentadas para a sua aquisição. Com a comunicação de 29.04.2022 a Autora apercebeu-se que a Ré não aceitava a proposta que havia aumentado, sem que resulte que a Ré a tenha informado de que pretendia ela própria diligenciar pela venda do imóvel ou que prescindia da mediação. Pelo exposto, ainda que posteriormente as negociações se tenham desenrolado com uma terceira sociedade de mediação imobiliária, dúvidas não restam de que a Autora deu a conhecer o imóvel à compradora. Porém, já não se comprova que tenha sido em consequência da atividade da Autora que o negócio de compra e venda do imóvel se veio a celebrar. Na verdade, segundo ficou provado, que a Ré havia celebrado com uma outra agência de mediação imobiliária um contrato de mediação imobiliária, em regime de não exclusividade, com um preço de venda de €3.500.000,00. Essa agência de mediação imobiliária apresentou uma proposta de aquisição de €3.550.000,00 que foi aceite pela Ré, vindo a compradora a liquidou um sinal correspondente ao contrato-promessa de compra e venda em junho de 2022, no valor de €735.000,00 e a celebrar a escritura de compra e venda em 25.05.2023 pelo valor de €3.450.000,00 (a diferença refere-se a equipamento/recheio). Este valor diverge do que havia sido objeto de negociação e de proposta apresentada pela sociedade Autora de €3.300.000,00, na comunicação enviada em 18.02.2022. Na altura, essa proposta foi aceite pela Ré, apesar de posteriormente a ter rejeitado, vindo a mesma a apresentar uma proposta de €3.500.000,00, que também não foi aceite pela vendedora. Evidenciando-se que, na sequência da falta de acordo quanto à concretização do negócio, a Ré continuou a promover o imóvel através de outras agências imobiliárias, nas quais se incluiu a sociedade E..., Lda. Logrando esta obter a apresentação de uma proposta pela compradora, no valor de €3.550.000,00, sendo €735.000,00 pagos no contrato-promessa de compra e venda, acabando a compra e venda do imóvel por ser celebrada por um valor final de €3.425.000,00. Em suma, se por um lado ficou demonstrado ter a Autora cumprido as obrigações a que se obrigou no contrato de mediação imobiliária celebrado com a Ré de encontrar um interessado para o imóvel, no seguimento das diligências e da mediação promovida pela Autora não chegou a haver um acordo de vontades entre as partes no que se refere à celebração do negócio. Designadamente, por não ter sido alcançado um acordo, nos termos do art.ºs 405.º e 406.º do Código Civil, quanto a todos os pontos ou aspetos do negócio, em concreto quanto ao preço, uma vez que nunca houve uma aceitação da proposta apresentada por esta que permitisse concluir pela formação de um contrato, nos termos do artºs 224.º e 232.º do Código Civil. Esse acordo apenas ocorreu, no seguimento da intervenção e da mediação promovida pela mediadora acima identificada (E..., Lda) que, sem prejuízo de não ter ficado demonstrado ter sido quem primeiro angariou a cliente interessada, logrou essa aproximação de vontades, tendo sido apresentada através desta uma proposta num valor superior que acabou por ser aceite pela Ré. Note-se que, também quanto ao sinal a pagar, verificamos diferenças, já que no contrato-promessa de compra e venda redigido pela Autora teria um valor de €495.000,00, resultando da escritura de compra e venda que no que foi celebrado com aquela sociedade de mediação foi obtido um sinal de €735.000,00, o que também terá pesado na aceitação da Ré. Pelo que se conclui que, materialmente, o negócio que foi celebrado e que se consubstanciou na compra e venda realizada no dia 25.05.2023 não foi o mesmo que era visado e que foi objeto da mediação desenvolvida pela Autora.”. [bold nosso] Tendo a autora apelado (sem impugnar a matéria de facto), o Tribunal da Relação reapreciou a questão, dando como verificado o nexo causal (ainda que não exclusivo) entre a actividade por aquela desenvolvida e a concretização da venda do imóvel em causa, com a seguinte fundamentação: “Entendemos, não obstante o teor dos argumentos apresentados pelo Tribunal Recorrido, que, diversamente do ali decidido, foi também, na sequência da atividade da ora Autora que foi concretizada a venda. Na verdade, os factos demonstram que a Autora desenvolveu atividade causal para a venda, tendo praticado atos correspondentes à divulgação, negociação, apresentação e aceitação de propostas conducentes à aproximação da vendedora e dos compradores, até em termos de valores de venda, pois o valor final que acabou por constar da escritura é até inferior ao proposto pela ora Autora. Não se negando a atividade da outra mediadora que acabou por constar na escritura de compra e venda do imóvel aos clientes que a Autora apresentou à Ré, e a inexistência de exclusividade na mediação, importa considerar que a Autora desenvolveu atividade relevante e causal para a conclusão do negócio. Como se decidiu no Acórdão da Relação de Lisboa de 04.06.2024, proferido no âmbito do processo n.º 1563/21.2YIPRT.L1, “[c]onforme se afirma, com pertinência, na jurisprudência acima citada, não é necessário demonstrar que a atuação da autora seja a causa exclusiva da celebração do contrato de compra e venda, nem que a mediadora tenha participado em todos os eventos da cadeia de factos que levaram à conclusão do negócio, irrelevando outrossim que os termos finais do contrato tenham derivado de negociações diretas entre os interessados que a mediadora pôs em contacto, como é o caso.” Saliente-se, ainda, por de relevância para o caso em apreço que, “no caso de existir concorrência de atividade por parte de duas empresas mediadoras, que conduziu à realização da transação mediada, a comissão devida, prevista no artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro, se nada tiver sido convencionado, deve ser repartida equitativamente por ambas as empresas – artigo 400.º do Código Civil –, de modo proporcionado à contribuição da atividade de cada uma para o êxito do contrato celebrado.” No caso, temos efetivamente intervenção de duas empresas mediadoras na concretização do mesmo negócio de compra e venda do imóvel em questão, sendo que a intervenção de ambas as mediadoras foi causal para a concretização do negócio, pois a compradora foi cliente da Autora, que fez as diligências até encontrar o comprador que veio a comprar o imóvel, por um valor declaro [rectius: declarado] na escritura inferior ao proposto. Existiu aqui, por conseguinte, uma concorrência de esforços, de atividade específica entre duas mediadoras na concretização de um único contrato de compra e venda de imóvel.”. [bold nosso] 5.2. Insurge-se a recorrente contra este entendimento, alegando essencialmente o seguinte: - Não se verifica nexo de causalidade porque no caso dos autos a proposta apresentada pela ré recorrida não foi aceite; - O negócio foi posteriormente celebrado com uma proposta diferente e mais elevada, apresentada por outra mediadora, com quem a ré celebrou contrato válido; - A autora pagou a comissão à mediadora que concluiu na perfeição o negócio, não se furtando a qualquer responsabilidade; - A actuação da recorrida não foi o “elo causal” adequado à perfeição do negócio. E ainda: - Na verdade, a ré celebrou um contrato, em regime de não exclusividade, com uma outra agência de mediação imobiliária, a quem pagou a totalidade da comissão acordada; - Essa agência apresentou proposta de mediação no valor de mais de três milhões e meio de euros que foi aceite pela ré, vindo a compradora a liquidar um sinal no valor de setecentos e tinta e cinco mil euros e a celebrar a escritura de compra e venda no dia 25.05.2023, pelo valor de três milhões e quatrocentos mil euros (a diferença refere-se a equipamentos/recheios); - De realçar que o valor acordado é superior ao valor proposto pela recorrida e que o valor do sinal também é superior, tudo condições obtidas em resultado do trabalho desenvolvido pela mediadora que recebeu a comissão, por ter sido ela a realizar e, concluir, de forma perfeita o trabalho; - A ré não aceitou o valor proposto pela aqui recorrida e, na ausência de concretização do negócio, a ré continuou a promover o imóvel através de outras agências imobiliárias, na qual se inclui a sociedade denominada de E..., Lda; - A autora não alcançou acordo quanto a todos os pontos do negócio, nomeadamente quanto ao sinal e quanto ao preço, quanto aos equipamentos e quanto à data de celebração. Esse acordo apenas aconteceu no seguimento da intervenção da sociedade E..., Lda; - De realçar que o mesmo acontece relativamente ao valor do sinal que aumenta substancialmente na proposta apresentada pela sociedade denominada de E..., Lda. Passamos de quatrocentos e noventa e cinco mil euros para setecentos e trinta e cinco mil euros; Por sua vez, a autora recorrida alega o seguinte: - A autora não se limitou a uma mera apresentação; a publicitação do imóvel no seu website, a parceria estabelecida com a A..., o acompanhamento dos compradores em diversas visitas ao imóvel e a apresentação de propostas concretas, incluindo uma de €3.500.000,00, que foi aceite pela recorrida principal, são elementos que atestam a preponderância da sua intervenção; - É crucial salientar que o valor final da venda, constante da escritura pública (€3.425.000,00), é até inferior à proposta de €3.500.000,00 obtida pela autora; este facto reforça a tese de que a intervenção da E..., Lda se limitou, essencialmente, à formalização de um negócio já substancialmente preparado e amadurecido pela intervenção da autora. 5.3. Do confronto entre a fundamentação da sentença da 1.ª instância e a fundamentação do acórdão do Tribunal da Relação resulta que, naquela, foi atribuída relevância decisiva – no sentido da demonstração da ausência de nexo causal entre a actividade desenvolvida pela autora e a concretização do negócio de compra e venda –, aos seguintes dados de facto (assinalados a bold) referidos nas alegações de revista da ré, mas a que o Tribunal da Relação não se refere nem constam da matéria de facto dada como provada pela 1.ª instância (a qual, sublinhe-se, não foi impugnada): i. A ré, tendo aceitado a proposta da E..., Lda de aquisição por € 3.550.000,00, veio a celebrar a escritura de compra e venda, em 25.05.2023, por um valor mais baixo (€3.425.000,00 - cfr. facto provado 28), o que não terá sido devido a uma descida do preço, mas antes a um acerto em função do acordado entre as partes sobre o equipamento/recheio do imóvel; ii. O contrato-promessa de compra e venda foi celebrado em Junho de 2022 mediante o pagamento de sinal no montante de €735.000,00 (constante da proposta obtida pela E..., Lda), superior ao montante de €495.000,00 que integrava a melhor proposta conseguida pela aqui autora. Temos, pois, que a matéria de facto é omissa em relação a dois dados de facto (determinação do preço constante da escritura pública, que corresponderia à proposta de aquisição por €3.550.000,00, com um acerto em função de equipamentos/recheio; valor do sinal) que seriam determinantes para se poder afirmar, como fez o Tribunal da 1.ª instância, que foi a actividade da imobiliária E..., Lda, e não a da autora, que levou a que o contrato de compra e venda fosse celebrado, isto é, que tal actividade foi causal da concretização do negócio. Tratando-se de factos essenciais integrantes de uma eventual defesa por excepção (cfr. art. 570.º, n.º 2, segunda parte, do CPC), tais factos teriam de ter sido oportunamente alegados pela ré nos termos do art. 5.º, n.º 1, segunda parte, do CPC. E não o foram, nem consequentemente foi facultada à autora a possibilidade de os contraditar. Não podem, por isso, ser considerados pelo tribunal. Compulsada a contestação da ré, constata-se não terem sido alegados quaisquer factos relativos à intervenção da imobiliária E..., Lda na venda do imóvel e à proposta de aquisição por esta apresentada. Porém, o Tribunal da 1.ª instância levou os factos 26 e 27 à matéria de facto, sem que tal viesse a ser impugnado pelas partes pelo que a factualidade não pode ser alterada. 5.4. Temos, assim, que, no que ora importa, se encontra assente a seguinte factualidade: 8. A Autora publicitou a venda do prédio urbano no seu website, através de anúncios e junto dos seus clientes. 9. BB e AA procuravam um prédio urbano para adquirir com caraterísticas idênticas às daquele prédio urbano, tendo para o efeito contatado a agência imobiliária “A...”, na qual era colaborador EE. 10. Este, sabendo da existência do prédio urbano através do website da Autora, contatou-a e acordou com esta uma parceria com vista à conclusão da respetiva compra e venda. 11. O colaborador da Autora CC acompanhou BB e AA nas visitas que realizaram ao prédio urbano, nas quais esteve por vezes presente o sócio-gerente da Ré, dando a conhecer a este as propostas enviadas por aqueles e contrapropostas (cf. docs 2 e 3 juntos com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 12. No dia 18.02.2022 o colaborador CC informou o sócio-gerente da Ré da obtenção de uma proposta de compra pelo valor de € 3.300.000,00 (cf. doc 4 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 13. Na mesma comunicação fez referência ao valor da comissão devida pela mediação (5% do valor da venda com IVA incluído) (cf. doc 4 junto com a pi, cujo teor se dá por reproduzido). 14. No dia 19.02.2022 o sócio-gerente da Ré respondeu dizendo concordar com a proposta e com o valor da comissão (cf. doc 5 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 15. No dia 14.03.2022 o colaborador da Autora enviou ao sócio-gerente da Ré uma minuta que redigiu do Contrato-Promessa de Compra e Venda do prédio urbano (cf. doc 6 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 16. No dia 18.03.2022 o sócio-gerente da Ré informou o colaborador da Autora que tinha sugestões de alterações que o seu advogado iria enviar ao advogado dos clientes na segunda-feira e quando tivesse notícias avisava (cf. doc 7 junto com a petição, cujo teor se dá por reproduzido). 17. No dia 27.04.2022 o colaborador da Autora informou o sócio-gerente da Ré que os compradores tinham uma proposta no valor de € 3.500.000,00 18. No mesmo dia informou a Mandatária da Ré do aumento da proposta, frisando a necessidade de o contrato-promessa de compra e venda ser celebrado com urgência 19. No dia 29.04.2022 o sócio-gerente da Autora manifestou à Mandatária da Ré surpresa por não ter recebido nenhuma resposta da mesma e informou que naquela manhã um colaborador confrontou o sócio-gerente da Ré que disse que “nem queria dar chance do nosso cliente de subir a proposta pelo mesmo valor”. 20. A ilustre mandatária da Ré responde dizendo: “Boa tarde, Acredite que não sei o que lhe posso dizer. Eu fiz uma pergunta e aguardo resposta. Acredite também não sei trabalhar assim. As conversas diretas entre compradores e vendedores dificultam claramente o nosso trabalho. Com elevada estima e consideração, FF Advogada”. 21. No dia 27.05.2022 o sócio-gerente da Autora questionou a Mandatária da Ré se já havia previsão para assinatura do contrato-promessa de compra e venda. 22. Esta respondeu que estava prevista para a semana seguinte. 23. No dia 09.06.2022 o sócio-gerente da Autora congratulou a Mandatária da Ré pela assinatura do contrato-promessa de compra e venda. 27. O colaborador [da E..., Lda] apresentou uma proposta de AA no valor de €3.550.000,00, que foi aceite pelo sócio-gerente da Ré. 28. Por escritura pública de compra e venda, outorgada no dia 25.05.2023, no Cartório Notarial a cargo de GG, a Ré declarou vender a AA, que aceitou comprar, pelo preço de €3.425.000,00, o prédio urbano” dos autos. Verifica-se, deste modo, que a autora angariou os clientes que vieram a adquirir o imóvel da ré; e que, após uma sucessão de contactos negociais, a mesma autora apresentou à ré uma proposta de aquisição do imóvel pelo valor de € 3.500.000,00. Através de uma outra imobiliária, com quem a ré tinha celebrado contrato anos antes, os mesmos interessados apresentaram, em data não concretamente apurada, uma proposta de aquisição por valor mais elevado (€ 3.550.000,00) que foi aceite pela ré. O contrato de compra e venda veio a ser celebrado pela interessada (AA) pelo preço de € 3.425.000,00, valor que se situa abaixo de ambas as propostas. Com esta matéria de facto dada como provada – e só a ela podemos atender –, constata-se que tanto a proposta de aquisição obtida pela autora como a proposta de aquisição obtida pela imobiliária E..., Lda foram causais em relação à concretização da compra e venda por € 3.425.000,00. Isto é, por razões que não foram alegadas nem provadas, a cliente AA, angariada originalmente pela autora, apresentou duas propostas – através de imobiliárias distintas – que levaram à concretização do negócio. 6. Erro no juízo de ponderação da contribuição causal da actividade desenvolvida pela autora para a celebração do contrato de compra e venda (questão suscitada tanto no recurso principal como no recurso subordinado). Invoca a ré, recorrente principal, a arbitrariedade da ponderação em 65% da actividade desenvolvida pela autora para a concretização do contrato de compra e venda. Por sua vez, a autora, recorrente subordinada, pretende que seja alterada a ponderação da contribuição causal da actividade desenvolvida pela autora para a celebração do contrato de compra e venda, que deverá ser fixada em 80%. O acórdão recorrido apreciou a questão da seguinte forma que merece a nossa inteira concordância: “Como distribuir a remuneração devida pela mediação? A Lei n.º 15/2013 regula no seu artigo 19.º a remuneração da empresa referindo como regra que «A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra» - seu n.º 1 -, mas não regula casos como o presente em que há concorrência de atividade de duas mediadoras casual para o sucesso do contrato visado pela atividade de mediação. Se nada tiver sido estipulado entre as mediadoras ou se não resultar provado, em caso de litígio, o modo de repartição da comissão, cumpre lançar mão do disposto no n.º 1 do artigo 400.º do Código Civil, onde se prescreve que «A determinação da prestação pode ser confiada a uma ou outra das partes ou a terceiro; em qualquer dos casos deve ser feita segundo juízos de equidade, se outros critérios não tiverem sido estipulados». A solução natural será a divisão em partes iguais se não existirem motivos para distinguir a atividade de cada empresa e valorizar mais uma que outra. Neste sentido pronunciou-se o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16 de outubro de 2007, no processo n.º 408/05.5TBCTB.C1 (Jorge Arcanjo), «4. A lei não prevê expressamente o concurso de mediadores, devendo entender-se que, uma vez concluído o negócio com a intermediação de mais de um mediador, a remuneração será paga a todos e em partes iguais, salvo convenção em contrário», bem como Fernando Batista de Oliveira quando refere que «…não prevendo a lei o “concurso de mediadores”, a melhor solução, nesta situação de intervenção/participação de vários mediadores para a conclusão do negócio visado, parece ser a “salomónica”, de remunerar todos eles em partes iguais. A não ser, é claro, que tenha sido convencionada outra forma de remuneração». “O princípio da igualdade conduz a esta solução. Mas tal princípio também deve orientar uma divisão diversa, se o caso o justificar, pois, como referiu Claus-Wilhelm Canaris, o «…reconhecido postulado da justiça, de tratar o igual de modo igual e o diferente de forma diferente, de acordo com a medida da sua diferença: tanto o legislador como o juiz estão adstritos a retomar “consequentemente” os valores encontrados, “pensando-os, até ao fim”, em todas as suas consequências singulares e afastando-os apenas justificadamente, isto é, por razões materiais – ou, por outras palavras: estão adstritos a proceder com adequação». E é o caso.” A intervenção causal da Autora no contrato, não pode deixar de considerar-se mais importante que a da terceira mediadora – publicitou o imóvel, estabeleceu contacto com a compradora, aproximou as partes relativamente ao preço, acabando o imóvel por ser vendido à pessoa que apresentou à Ré. Face ao exposto, é de concluir que existindo concorrência de atividade por parte de duas empresas mediadoras, que conduziu à realização da transação mediada, a comissão devida, se nada tiver sido convencionado, deve ser repartida por ambas as empresas de modo proporcionado à contribuição da atividade de cada uma para o êxito do contrato celebrado. No caso, pelo que fica ponderado, afigura-se proporcionado ao caso fixar a repartição da comissão a receber pela Autora em 65% do estipulado no contrato de mediação.”. [bold nosso] Conclui-se, assim, a respeito desta questão, pela improcedência da pretensão de ambas as partes. 7. Inexistência de enriquecimento sem causa por parte da ré A respeito desta questão alega a recorrente principal o seguinte: - Na tentativa de contornar a nulidade do contrato e a ausência de nexo causal, a autora invocou, em sede de recurso de apelação, a figura do enriquecimento sem causa; - Tal pretensão não é admissível; antes de mais resulta do processo que não houve enriquecimento sem causa porque a ré, ora recorrente, pagou uma comissão. - Depois, nos termos do art. 473.º, n.º 1 do Código Civil, o enriquecimento sem causa só é admissível na ausência de outro meio legal de obtenção da reparação. Analisado o processado, verifica-se que, efectivamente, em sede de apelação, a autora convocou o enriquecimento sem causa. Porém, e tal como alegado pela autora, ora recorrida, o acórdão recorrido em momento algum perspectivou a sua análise em função desse instituto, antes tendo sempre apreciado o objecto da acção em função da relação contratual existente entre as partes. Não cabe assim pronúncia sobre a invocada questão. 8. Violação de princípios estruturantes do processo civil Por fim, alega a recorrente principal “que a decisão de que ora se recorre ofende os princípios estruturantes do processo civil, ao permitir uma condenação com base em factos e pedidos não submetidos ao escrutínio da 1.ª instância, e em relação aos quais a Ré, aqui Recorrente não pôde exercer cabalmente o contraditório”. Pugna a recorrida pela correcção do acórdão recorrido. A alegação da ré é inteiramente infundada. Por um lado, porque, tal como se esclareceu supra, no ponto IV, 2., não se verificou qualquer alteração qualitativa do pedido, mas apenas uma diminuição quantitativa legalmente admissível (cfr. art. 609.º, n.º 1, do CPC). Por outro lado, porque, como se explicou supra, no ponto IV, 5.3. foi o Tribunal da 1.ª instância, e não a Relação, que considerou factos essenciais integrantes de excepção não deduzida pela ré em sede de contestação e, por isso, não submetidos a contraditório. Violação de regras processuais existiria se o acórdão recorrido tivesse considerado factos que a sentença teve em conta na fundamentação da decisão de direito e que não foram oportunamente alegados pela ré nem sujeitos a contraditório. Improcede, assim, também nesta parte, o recurso da ré. V – Decisão Pelo exposto, julgam-se ambos os recursos improcedentes, confirmando-se a decisão do acórdão recorrido. Custas nos recursos pela ré. Custas na acção na proporção do decaimento. Lisboa, 27 de Novembro de 2025 Maria da Graça Trigo (relatora) Teles Pereira Orlando Nascimento |